Distribuição geográfica e patologias associadas à metilação do DNA genómico em Helicobacter pylori. Vale, F. F. 2008 Resumo A bactéria Helicobacter pylori coloniza cerca de metade da população mundial e é responsável por diversas patologias, como a gastrite, úlcera péptica ou o cancro gástrico. A sequenciação de três estirpes de Helicobacter pylori revelou um número abundante de sistemas de restrição e modificação (R-M) putativos num genoma de pequena dimensão (1.60 a 1.67 Mb). Estes são de facto os genes estirpe específicos maioritários com função conhecida. Inicialmente foi estudada a expressão de 31 metiltransferases através da digestão do DNA genómico de 50 estirpes de H. pylori com 31 endonucleases de restrição. A expressão de 31 metiltransferases foi determinada através da hidrólise do DNA genómico de cada estirpe com a endonuclease de restrição cognata. Sempre que ocorre hidrólise o DNA não está metilado, enquanto que a ausência de hidrólise pressupõe uma metiltransferase activa. Conclui-se que a diversidade das metiltransferases é suficientemente elevada para permitir a utilização do estado de metilação genómica como um método de tipagem. Verificou-se ainda que existe estabilidade da expressão das metiltransferases in vivo da ordem dos 95%, avaliada pela comparação do estado da metilação do DNA genómico de estirpes isoladas do mesmo doente com um intervalo temporal ou de diferentes locais do estômago (corpo e antro). Cada sistema R-M contém uma endonuclease de restrição (REase) que cliva uma sequência de DNA específica e uma metiltransferase (MTase) que metila uma adenosina ou uma citosina na mesma sequência de DNA. Nos sistemas R-M do Tipo II a REase impõe uma pressão selectiva elevada sobre a MTAse acompanhante, o que torna a perda do sistema R-M menos provável do que a sua aquisição. Os métodos de análise de cluster clássicos não reflectem esta tendência. Com o objectivo de mostrar esta propensão para a aquisição de sistemas R-M foi desenvolvido um novo algoritmo para a construção de dendrogramas após análise do estado de metilação do DNA genómico de 52 estirpes de H. pylori de origens geográficas distintas, recorrendo ao programa Matlab R12 (The Mathworks, Inc.). O algoritmo do número mínimo comum de sistemas R-M (MCRM) presentes começa por agrupar as estirpes que partilham o número mínimo comum de sistemas R-M e adiciona gradualmente estirpes de acordo com o número de sistemas R-M adquiridos. Os dendrogramas produzidos mostram um cluster de estirpes Africanas, o que sugere que os sistemas R-M estão presentes no genoma de H. pylori desde que o seu hospedeiro humano migrou de África. As diferenças entre os isolados de H. pylori provenientes de regiões geográficas distintas evidenciam cinco populações ancestrais principais. Uma vez que H. pylori coevoluiu com o homem interessou compreender se os sistemas R-M também são uma ferramenta útil na avaliação da distribuição geográfica de H. pylori. Assim, recorreu-se à tipagem pelo método da modificação genómica de 221 estirpes provenientes de quatro Tese apresentada à UCP para obtenção do grau de doutor em Engenharia Biomédica 1 Distribuição geográfica e patologias associadas à metilação do DNA genómico em Helicobacter pylori. Vale, F. F. 2008 continentes: Africa, América, Ásia e Europa (incluindo as estirpes supra citadas), avaliando a expressão de 30 metiltransferases. A regressão logística múltipla e multinomial, testes de independência e a determinação de intervalos de confiança a 95% para os isolados dos quatro continentes estudados revelou que alguns sistemas R-M estão claramente associados a isolados de diferentes continentes. Os isolados Asiáticos são aqueles que apresentam maior divergência, comparativamente com os isolados de outros continentes. Todos os continentes apresentam pelo menos uma metiltransferase associada. No entanto, algumas metiltransferase surgem associadas a mais do que um continente. Apenas duas metiltransferases são expressas em todos os isolados: M.HhaI e M.NaeI. Estas duas últimas observações estão de acordo com a teoria de co-evolução do homem e da bactéria desde a diáspora humana para fora de África. As metiltransferases parecem reflectir a origem geográfica de cada isolado, podendo por isso ser úteis na avaliação da estrutura populacional de H. pylori, no estudo das migrações humanas e, ainda, para compreender a evolução do microrganismo. Foi também pesquisado se a classe dos genes estirpe específicos maioritários, codificantes de sistemas de restrição e modificação, está associada às patologias gastrite, úlcera péptica, metaplasia intestinal e cancro gástrico e ainda a um grupo de estirpes provenientes de indivíduos assintomáticos colonizados por H. pylori com mucosa gástrica normal. Mais uma vez foi avaliada a expressão de 30 metiltransferases em 167 estirpes (incluídas no grupo de 221 estirpes anteriores). A determinação de testes de independência, de intervalos de confiança a 95% e a construção de modelos de regressão logística múltipla e multinomial sugerem que existem metiltransferases associadas às diferentes patologias. As metiltransferases candidatas a factores de virulência poderão actuar através da variação do padrão de metilação do DNA genómico, que por sua vez poderá levar à alteração da expressão de genes de virulência envolvidos na patogenicidade. A metilação do DNA genómico pode modular a transcrição dos genes, induzindo a expressão de outros genes de patogenicidade da própria bactéria, ou alterando o próprio estado de metilação do DNA genómico das células epiteliais gástricas, que se verifica estar aumentado nos casos de cancro gástrico. A terapêutica de erradicação de H. pylori falha em aproximadamente 20% dos doentes, maioritariamente devido à existência de bactérias multiresistentes a antibióticos. A terapia fagica consiste na utilização de bacteriófagos líticos para tratar infecções bacterianas. Não existe uma colecção de bacteriófagos de H. pylori disponível. Foi efectuada uma pesquisa de fagos lisogénicos em 20 estirpes de H. pylori, recorrendo à concentração dos sobrenadantes das culturas bacterianas, que foram posteriormente cruzados e incubados com cada uma das 20 estirpes analisadas. A pesquisa de bacteriófagos líticos foi efectuada num conjunto de 20 estirpes, que foram expostas a concentrados de amostras de águas residuais e balneares e de fezes humanas. Foram observadas estruturas semelhantes a placas fágicas em quatro estirpes de H. pylori, expostas a concentrados de águas residuais e balneares e de fezes humanas. As estirpes que originaram placas fágicas hipotéticas foram expostas a indutores do ciclo lítico (radiação UV, mitomicina C, brometo de etídeo e laranja de acridina), para Tese apresentada à UCP para obtenção do grau de doutor em Engenharia Biomédica 2 Distribuição geográfica e patologias associadas à metilação do DNA genómico em Helicobacter pylori. Vale, F. F. 2008 pesquisar a existência de fagos lisogénicos presentes na própria estirpe, cujo ciclo lítico poderia ter sido induzido pelos concentrados aplicados. Uma das quatro estirpes originou placas fágicas hipotéticas após exposição à radiação UV. Contudo, os métodos de virologia clássica não suportam a existência de bacteriófagos, uma vez que não foi possível a determinação do título fágico ou a extracção do ácido nucleico. Para confirmar a presença ou ausência de partículas fágicas foram efectuadas observações das placas fágicas hipotéticas por microscopia electrónica de transmissão e de varrimento. Foram observadas extracelularmente e em baixo número estruturas semelhantes a bacteriófagos icosaédricos e intracelularmente estruturas compatíveis com bacteriófagos filamentosos. Tese apresentada à UCP para obtenção do grau de doutor em Engenharia Biomédica 3 Distribuição geográfica e patologias associadas à metilação do DNA genómico em Helicobacter pylori. Vale, F. F. 2008 Abstract Helicobacter pylori colonizes half of the world population and is associated with several diseases, such as gastritis, peptic ulcer or gastric cancer. The three H. pylori sequenced genomes revealed a high number of restriction and modification systems (RM) in a small genome (1.60 a 1.67 Mb). These are the strain specific majority genes with known function. Initially it was studied the expression of H. pylori methyltransferases, by digesting the genomic DNA of 50 strains with 31 restriction endonucleases. The observation of a digestion occurs when the DNA is unmethylated, and the absence of digestion suggests an active methyltransferase. It was concluded that the methyltransferase diversity is sufficiently high to enable the use of the genomic methylation status as a typing method. The determined stability of the methyltransferase expression in vivo was 95%, accessed by comparing the methylation status of the genomic DNA from strains that were isolated either from the same patient at different times or from a different stomach location, antrus or corpus. A Type II R-M system is defined by the association of at least two genes: one codes for a restriction endonuclease (REase) that recognizes a specific DNA sequence and cuts both strands; the other gene codes for a cognate MTase that methylates the same DNA sequence. In Type II R-M systems the restriction endonuclease imposes high pressure on the expression of the cognate methyltransferase that hinder R-M system loss. Conventional cluster methods do not reflect this tendency. An algorithm was developed for dendrogram construction reflecting the propensity for conservation of R-M Type II systems, using Matlab R12 (The Mathworks, Inc.). The new algorithm was applied to 52 H. pylori strains from different geographical regions. The algorithm designated Minimum Common Restriction and Modification (MCRM) systems works by first grouping strains that share a common minimum set of R-M systems and gradually adds strains according to the number of the R-M systems acquired. Dendrograms revealed a cluster of African strains, which suggest that R-M systems are present in H. pylori genome since its human host migrates from Africa. The study of H. pylori isolates from different geographic regions revealed five ancient main populations. Knowing that H. pylori coevolved with its human host it was important to understand if R-M systems could also be used to access the geographic distribution of H. pylori. 221 H. pylori strains from four continents (Africa, America, Asia and Europe) where typed using the genomic methylation method to evaluate the expression of 30 methyltransferases. Multinomial and multiple logistic regression, independence tests, and 95% confidence intervals revealed that some R-M systems are clearly associated with isolates of specific continents. The higher divergence was observed for Asian strains. All continents have at least one associated MTase, but some Tese apresentada à UCP para obtenção do grau de doutor em Engenharia Biomédica 4 Distribuição geográfica e patologias associadas à metilação do DNA genómico em Helicobacter pylori. Vale, F. F. 2008 MTases are associated with more than a continent. Only two MTases are expressed in all isolates: M.HhaI and M.NaeI. These last two observations are in agreement with the hypothesis of man and bacteria coevolution since the out of Africa migration event. MTases seams to reflect the geographic origin of each isolate and might be useful for studying H. pylori population structure, human migrations and to understand the bacteria evolution. These class strain specific majority genes coding for R-M systems were also analyse for their association with several pathologies, including strains isolated from patients with gastritis, peptic ulcer, intestinal metaplasia and gastric cancer, and also with a group of strains isolated from patients colonized by H. pylori but with normal gastric mucosa. The expression of 30 methyltransferease where determined as described above for 167 H. pylori strains (included in the previsous 221 strains). Multinomial and multiple logistic regression and 95% confidence intervals suggest that there are methyltransferases associated with different pathologies. Virulence factor candidate methyltransferases may act by modifying the genomic DNA methylation status, which may alter the expression of virulence genes involved in pathogenicity. Genomic DNA methylation may modulate gene transcription, inducing the expression of bacteria pathogenicity genes, or changing the methylation status of gastric epithelial cells, which are known to have a higher methylayion level of methylation in gastric cancer. H. pylori eradication therapy fails in about 20% of patients, mainly due to the existence of antibiotic multiresistant bacteria. Phage therapy is the therapeutic use of lytic bacteriophages to treat pathogenic bacterial infections and H. pylori is a good target. However there are no available H. pylori phage collections. It was developed a screening for lysogenic phages in 20 H. pylori strains, using concentrated bacterial culture supernatants, which were incubated with each of the 20 tested strains. The screening for lytic phages was performed in the same 20 strains, which were exposed to recreational and residual concentrated water and to concentrated human faeces. It was observed structures similar to phagic plaques in four H. pylori strains exposed to human faeces and recreational and residual water concentrates. Strains that developed lysis plaques were exposed to lytic phage inducers (UV radiation, mytomicin C, ethidium bromide, and acridine orange) to search for lysogenic phages that might have been induced by the exposition to water and faeces concentrates. One out of four strains developed lysis plaques after UV radiation exposition. However, the classical virology methods did not support the presence of a phage, once it was not possible to determine bacteriophage title or to extract the nucleic acid. In order to check for the presence or absence of phage particles, the lysis plaques were observed by transmission and scanning electronic microscopy. It was observed in reduced numbers icosaedric viruslike particles in the extracellular environment, and filaments compatible with bacteriophages in the cytoplasm. Tese apresentada à UCP para obtenção do grau de doutor em Engenharia Biomédica 5