Capítulo 2 Doenças inflamatórias intestinais: avanços patogênicos e terapêuticos Adérson Omar Mourão Cintra Damião Aytan Miranda Sipahi Introdução A doença inflamatória intestinal (DII), na sua conceituação mais ampla, corresponde a qualquer processo inflamatório envolvendo o trato gastrointestinal, seja este agudo, seja crônico. Assim, podemos classificá-la em DII com causa conhecida (exs., infecções, parasitoses, enterocolite actínica, isquemia etc.) e DII com causa não totalmente esclarecida. Neste último grupo, 80% a 90% dos casos são diagnosticados como retocolite ulcerativa inespecífica ou idiopática (RCUI) e doença de Crohn (DC). Os demais, 10% a 20%, são representados principalmente pelas colites linfocítica e colagênica, bolsite ou pouchitis (inflamação da bolsa ileal póscolectomia para RCUI), doença de Behçet e enterocolite eosinofílica. Assim, do ponto de vista prático, quando falamos em DII, tradicio- FBG pre congresso 155x225.pmd 35 nalmente nos referimos à RCUI e à DC.12, 15 A RCUI é conhecida desde o século XIX e a DC recebeu esse nome por causa da sua descrição, em 1932, pelos médicos americanos Crohn, Ginzburg e Oppenheimer.11, 24 A RCUI e a DC são hoje consideradas entidades distintas, embora compartilhem alguns aspectos semelhantes, sobretudo do ponto de vista clínico. 12-14, 47 Neste capítulo, abordaremos os conceitos atuais sobre a patogenia da RCUI e da DC e as implicações terapêuticas desse conhecimento. Etiopatogenia da DII Nos últimos anos, um grande impulso aconteceu na pesquisa sobre a etiopatogenia da DII. Isto se deveu à incorporação das técnicas de biologia molecular à pesquisa laboratorial, à 10/5/2007, 17:35 Gastroenterologia: da Patogenia à Prática Clínica padronização de modelos experimentais de DII, à maior compreensão dos aspectos imunológicos e inflamatórios ligados à mucosa do trato gastrointestinal, à evolução do conhecimento sobre a microbiota intestinal e sua interação com as células imunológicas e ao desenvolvimento na área da genética.6, 25, 42 Desta forma, após muitos anos, passamos a entender melhor o que ocorre na DII e, como resultado desse maior conhecimento, novas modalidades terapêuticas, bem mais eficazes, têm sido desenvolvidas, com nítidos benefícios para os pacientes.25 A etiopatogenia da DII envolve, basicamente, quatro aspectos, que interagem entre si e com fatores ambientais: a) fatores genéticos; b) fatores luminais, relacionados a microbiota intestinal, seus antígenos e produtos metabólicos, e os antígenos alimentares; c) fatores relacionados à barreira intestinal, incluindo os aspectos referentes à imunidade inata e à permeabilidade intestinal; e d) fatores relacionados à imunorregulação, incluindo a imunidade adaptativa ou adquirida. 6, 15, 18, 27, 41, 42 Fatores genéticos Nos últimos anos, vários pesquisadores têm concentrado seus esforços na busca de genes que predisponham à RCUI ou à DC. 6, 17 Em 1996, os ingleses identificaram loci de suscetibilidade para as duas doenças nos cromossomos 3, 7 e 12.18 Contudo, coube aos franceses, liderados por Hugot et al.,22 a identificação de um locus de susceptibilidade para a DC localizado na região pericentromérica do cromossomo 16. Essa região passou a ser conhecida como IBD1 (locus 1 da doença inflamátoria intestinal). A seguir, três grupos independentes 19, 23, 36 identificaram mutações no gene NOD2/CARD15 (localizado na região IBD1) e que estão presentes em 15% a 30% dos portadores de DC. O gene NOD2/ CARD15 é responsável pela codificação de uma proteína também chamada NOD2, presente nas células apresentadoras de antígenos como macrófagos, células dendríticas, células epiteliais etc., células essas que compõem o sistema imune inato, nossa primeira barreira imunológica de defesa no trato gastrointestinal. Pelo menos três variantes mutacionais do gene NOD2/CARD15 foram descritas, e a mais freqüente parece ser aquela (3020insC) em que há geração de uma proteína NOD2 anormal, isenta dos 33 últimos aminoácidos. 49 A proteína NOD2 pertence à família CATERPILLAR de proteínas intracelulares (caterpillar = Caspase Recruitment Domain [CARD] transcription enhancer R – purine – binding , pyrin, lots of leukinrich repeats). Essas proteínas têm em comum três domínios, a saber: 35 a) terminal de carbono rico em leucina (C-Terminal Leucine-rich Repeat Domain [LRR]), local onde existe interação com o muramil dipeptídeo (MDP), produto da ação de hidrolases intracelulares sobre o antígeno bacteriano peptidoglicano; b) domínio de oligomerização de nucleotídeo (Nucleotide-binding Oligomerization Domain [NOD]); e c) região terminal de nitrogênio contendo CARD ou pirina. Inicialmente, a proteína NOD2 foi conside- 36 FBG pre congresso 155x225.pmd 36 10/5/2007, 17:35 Adérson Omar Mourão Cintra Damião/Aytan Miranda Sipahi reconhecida no cromossomo 12 e parece relacionar-se com a RCUI.15, 18 Os estudos envolvendo o sistema HLA (Human Leukocyte Antigen) têm fornecido resultados mais consistentes no caso da RCUI que no da DC. Na RCUI, há associação com o HLA-DR2 e o HLA-DRB1*15. A associação com HLA-DRB1*0103 ocorre mais naqueles com doença extensa e manifestações extra-intestinais. Na DC, as associações mais descritas são com o HLA-DR1/ DQw5, o HLA-A2 e o HLADRB3*0301.15, 18, 41,42, 47 Outro aspecto de interesse dentro do âmbito genético diz respeito aos estudos em parentes assintomáticos de pacientes com DII. Assim, parentes de primeiro grau de pacientes com DC, assintomáticos, podem apresentar aumento da permeabilidade intestinal, especialmente após uso de AINE.15, 41, 42 Tysk et al. 48 também descreveram deficiência seletiva de mucina em gêmeos monozigóticos, e um deles apresentava RCUI, mas o outro era sadio. Outrossim, familiares de pacientes com RCUI ou colangite esclerosante primária têm freqüência aumentada de anticorpos séricos do tipo ANCA (anticorpo contra estruturas citoplasmáticas do neutrófilo).15, 18, 41, 42 rada um receptor intracelular (citosólico) para o lipopolissacarídeo, um antígeno bacteriano. Entretanto, trabalhos subseqüentes revelaram que era um derivado do peptidoglicano, o MDP, o antígeno de fato reconhecido. Assim, em condições normais, o receptor TLR2 (Toll-Like Receptor [TLR]), expresso na superfície das células apresentadoras de antígenos, reconhece o peptidoglicano bacteriano e é hidrolisado por enzimas (hidrolases) intracelulares, gerando MDP, o qual é, então, reconhecido pelo domínio LRR da proteína NOD2 com conseqüente inibição da via de produção de citocinas denominada NF-kB (Fator Nuclear Kappa B). Já a forma mutante de NOD2, presente em pacientes com DC, não reconhece o MDP e deixa de exercer seu efeito normal inibitório. O resultado é a estimulação da via de produção de citocinas NF-kB (exs., fator de necrose tumoral [TNF], interleucina-12, interleucina-18 etc.), levando à amplificação do processo inflamatório.17, 35 Sem dúvida, a descoberta da mutação no gene NOD2 na DC respresentou um marco na história da etiopatogenia da DII e descortinou novas possibilidades para o diagnóstico, prognóstico e tratamento da DII, incluindo-se a correção da mutação genética. Além disso, essa descoberta genética vai ao encontro das evidências sobre a relevância dos fatores luminais (exs.: bactérias e seus produtos) na etiopatogenia da DII. 15, 18, 27, 41, 42 Certamente outros genes deverão ser identificados nos próximos anos, começando pelos cromossomos 6, 12 e 14. Aliás, uma região de susceptibilidade denominada IBD2 foi Fatores luminais Correspondem àqueles presentes no lúmen intestinal. Pacientes com DII apresentam alterações quantitativas e qualitativas da microbiota intestinal.15, 41, 42 Na DC, as concentrações de bactérias anaeróbicas Gram-positivas (Streptococcus intermedius, Peptostrepto37 FBG pre congresso 155x225.pmd 37 10/5/2007, 17:35 Gastroenterologia: da Patogenia à Prática Clínica coccus productus, Coprococcus comes, Eubacterium contortum) e Gramnegativas (Bacteroides e Fusobacterium) estão aumentadas, o mesmo acontecendo com os filhos assintomáticos.41 Na RCUI, por sua vez, foram descritas bactérias cujos produtos metabólicos são sobremaneira agressivos à mucosa intestinal (exs., produção de citotoxinas, hialuronidase etc.). Aumento de sulfato de hidrogênio, produzido a partir do metabolismo colônico de bactérias, também foi descrito na RCUI e é responsável pela inibição do metabolismo do butirato, a fonte energética do colonócito.15, 41 Certos produtos bacterianos que ocorrem em condições normais (ex., lipopolissacarídeos [LPS], formilmetionil-leucil-fenilalanina [FMLP]), na DII, geram reações inflamatórias intensas, em virtude do aumento de receptores para esses produtos nos neutrófilos e monócitos dos pacientes.1,2 Os modelos experimentais de DII também têm contribuído para a compreensão do papel das bactérias intestinais no desenvolvimento da inflamação intestinal. 18, 41, 42 Com a utilização de técnicas de genética molecular, é possível gerar animais transgênicos, em que há expressão dominante de um determinado gene (ex., ratos HLA-B27), e linhagem de animais knockout, nos quais há deleção seletiva de um determinado gene (ex., knockout para interleucina-10). Esses animais, quando mantidos em condições ambientais habituais, desenvolvem DII. No entanto, quando mantidos em ambientes esterilizados (germ-free condition), não desenvolvem inflamação intestinal ou o fazem de forma atenuada. O mesmo ocorre com outras formas de enterocolite experimental, como é o caso da provocada por indometacina e por “carrageenan”, um extrato da alga marinha Eucheuma spinosum. 18, 41,42 Em condições normais, a microbiota intestinal é útil e, mais do que isso, vital para o ser humano. De fato, atuando sobre substratos alimentares, as bactérias geram ácidos graxos de cadeia curta (ex., butirato) que vão propiciar o metabolismo normal das células epiteliais colônicas (colonócitos).41 Ao mesmo tempo, o organismo tem um eficiente mecanismo de proteção contra bactérias mais agressivas (patogênicas) e seus produtos, por vezes não menos virulentos. Essa proteção é representada pela ação antibacteriana do ácido gástrico e da bile, pela motilidade intestinal, pela produção de IgA secretora, pela camada de mucina e fator trefoil sobre as células epiteliais e pela própria barreira de células justapostas, firmemente aderidas umas às outras.29, 46 Porém, um dos aspectos mais importantes nesse contexto de proteção é o desenvolvimento de tolerância às bactérias e a seus componentes antigênicos que compõem a microbiota intestinal normal ou própria do indivíduo.6, 47 Na DII, há evidências de perda da tolerância aos antígenos da própria microbiota intestinal, fazendo com que o organismo reaja exageradamente a esses antígenos. 16, 26, 27, 34, 42 Tal fato, acrescido do aumento da permeabilidade intestinal mencionado anteriormente, acaba por hiperestimular o sistema imune de mucosa.15, 42 38 FBG pre congresso 155x225.pmd 38 10/5/2007, 17:35 Adérson Omar Mourão Cintra Damião/Aytan Miranda Sipahi Fatores relacionados à barreira intestinal: aspectos referentes à imunidade inata e à permeabilidade intestinal mesmas células, além de sintetizar a mucina, produzem o chamado fator intestinal trefoil (FIT), envolvido na restituição da célula epitelial e na reparação da mucosa lesada, além de compor e incrementar a camada protetora viscosa em conjunto com a mucina. 28, 37, 44, 50 Mashimo et al. 31 demonstraram que camundongos não produtores de FIT (knockout para FIT) apresentavam elevada taxa de mortalidade (50%) após indução de colite com o dextran sulfato sódico (DSS), quando comparados com o grupo controle (5%). Também as lesões macro e microscópicas foram bem mais acentuadas no grupo knockout e não houve evidências de reepitelização. Além disso, a instilação retal de FIT nos camundongos knockout para FIT promoveu proteção contra a colite induzida por ácido acético. 31 Semelhantemente, Tran et al., 46 na colite em ratos induzida pelo DNBS (ácido dinitrobenzeno sulfônico), verificaram redução da inflamação e rápida reparação epitelial com o FIT por via retal. Na DII, curiosamente, têm sido descritos redução da expressão intestinal de FIT na RCUI e aumento na DC.28, 37, 44, 50 O maior conhecimento das funções de agentes citoprotetores e com atividade reparadora sobre a mucosa intestinal, como é o caso do ITF e também do fator de crescimento TGF – β (Transforming Growth Factor), tem servido para ampliarmos nossa compreensão sobre a etiopatogenia da DII. 6 Ademais, há implicações terapêuticas: camundongos knockout para TGF-β desenvolveram colite espontaneamente e foram mais susceptíveis à colite induzida por DSS O organismo protege-se de antígenos luminais através de integrado sistema de defesa denominado, em conjunto, de barreira intestinal. 25, 29 Dois componentes constituem a barreira intestinal: a) componente não imunológico, representado pela acidez gástrica, secreções digestivas (ex., bile), motilidade gastrointestinal, microbiota intestinal, produção de defensinas pelas células de Paneth, barreira de células epiteliais, camada aquosa e camada de mucina/fator trefoil; b) componente imunológico, representado pela produção de IgA secretora, imunidade inata (exs., neutrófilos, células apresentadoras de antígenos – macrófagos, células dendríticas, células epiteliais etc.), imunidade adquirida ou adaptativa (exs., linfócitos T e B). Nesse terceiro item, veremos o componente não imunológico. Redução da mucina tipo IV foi descrita na RCUI.15, 18, 41 De fato, um dos melhores modelos experimentais de RCUI, o macaco Saguinus oedipus ou cotton-top tamarin, tem deficiência dessa mucina e desenvolve colite espontaneamente.18, 41 Neste contexto, a produção da substância secretagoga MMS – 68 (macrophage – derived intestinal secretagogue) por macrófagos da lâmina própria intestinal está diminuída na RCUI, reduzindo a secreção de mucina pelas células caliciformes.15, 18, 41 Essas 39 FBG pre congresso 155x225.pmd 39 10/5/2007, 17:35 Gastroenterologia: da Patogenia à Prática Clínica e a indução de TGF-β foi capaz de protegê-los contra a colite induzida pelo TNBS (ácido 2,4,6–trinitrobenzeno sulfônico).15, 18 Outro aspecto que salienta a importância da barreira intestinal na gênese da DII é a investigação envolvendo proteínas do citoesqueleto (ex., queratina) e de estruturas que interligam as células epiteliais (ex., caderina). Assim, camundongos não produtores de queratina ou de caderina desenvolvem colite e até mesmo neoplasias (exs., adenomas, carcinomas). 18 Finalmente, a diminuição da fonte energética do colonócito (ex., butirato) e o aumento da permeabilidade intestinal, ambos mencionados anteriormente, completam o quadro de disfunção e deficiência no sistema de proteção da barreira intestinal na DII.18, 41 No caso da imunidade inata, Marks et al.,30 em elegante trabalho, demonstraram que pacientes com doença de Crohn têm redução significativa da atuação do sistema imune inato. Assim, como veremos a seguir, o sistema imune adaptativo ou adquirido é hiperestimulado, o que contribui para a amplificação do processo inflamatório.3, 6, 9, 25, 42 Fatores relacionados à imunorregulação de mucosa: imunidade adaptativa ou adquirida As células apresentadoras de antígenos direcionam os elementos antigênicos para os linfócitos, ativando-os e gerando a imunidade adquirida ou adaptativa.6, 25 Na DII, há defeito na imunidade inata e intensificação da imunidade adquirida. 30,42 Essa exacerbação da imunidade adquirida ocorre por excesso de estimulação antigênica (deficiência da imunidade inata, aumento da permeabilidade intestinal), redução da apoptose de linfócitos e imunorregulação deficiente.6, 25, 42 Em condições normais, a apresentação antigênica pelas células apresentadoras de antígenos é encaminhada, preferencialmente, para a atividade imunossupressora/ imunorreguladora da lâmina própria. 41 No entanto, Mayer e Eisenhardt32 demonstraram, in vitro, que a apresentação de antígenos por células epiteliais isoladas de pacientes com DII ocorria na direção dos linfócitos T auxiliadores (helper, CD4 positivos); por outro lado, havia ativação de linfócitos T reguladores (CD8 positivos) pelas células epiteliais dos indivíduos do grupo controle. A conseqüência da hiperestimulação de linfócitos CD4 positivos é a amplificação e cronificação do processo inflamatório com a participação de citocinas (exs., interleucina-1, TNF etc.) e radicais livres de oxigênio.18, 41 A transformação da célula epitelial em célula apresentadora de antígeno (induzida pelo IFN-γ), somada à sua capacidade de secretar citocinas antiinflamatórias (exs., interleucina10, TGF-β, antagonista do receptor para IL-1) e pró-inflamatórias (exs., interleucina-6, interleucina-8, TNF), de expressar moléculas de adesão (ex., molécula de adesão intercelular – ICAM-1), de liberar eisosanóides e 40 FBG pre congresso 155x225.pmd 40 10/5/2007, 17:35 Adérson Omar Mourão Cintra Damião/Aytan Miranda Sipahi produzir óxido nítrico, constitui a base do conceito atual de que a célula epitelial intestinal exerce funções imunorreguladoras.4, 15, 41, 43 A imunorregulação anormal da DII também pode ser constatada através da resposta das células mononucleares da lâmina própria à IL-4, uma citocina imunossupressora. Normalmente, fagócitos monocucleares, sob ação da IL-4, reduzem a produção de interleucina-1β e TNF-α e aumentam a de antagonista do receptor para IL1 (IL-1ra). Tais respostas, no entanto, não são vistas em células mononucleares da lâmina própria e em monócitos periféricos de pacientes com DII, 18, 41 o que coopera para a perpetuação da cascata de reações inflamatórias na mucosa intestinal. Além disso, como já comentado, os neutrófilos e monócitos de pacientes com DII apresentam elevado número de receptores para componentes bacterianos (exs., FMLP, LPS), com conseqüente intensificação da resposta imune.41 Outrossim, observou-se que a DC tem uma resposta predominantemente do tipo Th1, com maior produção de interleucina-2 (IL-2), IFN-γ e TNF. Ao contrário, na RCUI, há resposta do tipo Th2, com elevação de IL-4, IL-5, IL-6, IL-9, IL-10 e IL-13. 3, 6, 18, 25 É interessante salientar que a resposta Th1, habitualmente, relaciona-se com imunidade mediada por célula, ativação de macrófagos, formação de granuloma e produção de IgG2, aspectos esses evidenciados na DC. Por sua vez, a resposta Th2 envolve a imunidade humoral, autoimunidade, ativação de linfócitos B e mastócitos, além da produção de IgG1, características essas compatíveis com a RCUI.41 Em 1995, Casini-Raggi et al. 8 sugeriram que a DII teria primariamente um desequilíbrio entre o antagonista do receptor para IL-1 (IL1ra) e a IL-1, com deficiência relativa de IL-1ra e conseqüente diminuição da relação IL-1ra/IL-1 na mucosa intestinal. Estudos subseqüentes, no entanto, revelaram que esse fenômeno ocorre secundariamente ao processo inflamatório, período em que grande quantidade de IL-1 é produzida, sobrepujando a de IL-1ra. Este fato repete-se em outras situações inflamatórias, que não a DII, tais como colites actínica e infecciosa. 20 Implicações terapêuticas O sucesso da pesquisa de bancada ensejou novas opções terapêuticas na DII. Hoje, os estudos clínicos têm por objetivo avaliar a eficácia do bloqueio seletivo de mediadores inflamatórios, bem como do incremento da imunidade inata.10, 25, 30, 33 Essa nova abordagem é, genericamente, denominada terapia biológica, uma vez que age em mediadores e fenômenos naturais e fisiológicos.25 Fatores de crescimento (exs., fator epidérmico de crescimento, fator trefoil, TGF-β, hormônio de crescimento, fator de crescimento do queratinócito etc.) têm sido testados no sentido de melhorar a defesa do trato digestivo (efeito barreira). Alguns deles (ex., TGF-β) têm também ação 41 FBG pre congresso 155x225.pmd 41 10/5/2007, 17:35 Gastroenterologia: da Patogenia à Prática Clínica antiinflamatória. Os prebióticos, probióticos e simbióticos modificam a microbiota intestinal e normalizam o conteúdo de Bifidobacteria e Lactobacilli, alterações essas que acabam por reduzir o contingente antigênico imposto às células imunológicas da lâmina própria intestinal.15 Além disso, estimulam a secreção de mucina e de TGF-β, incrementando a capacidade de defesa do trato gastrointestinal. Também ações imunomoduladoras, como redução de citocinas próinflamatórias (exs., IL-1, IL-8, TNF etc.) e aumento de citocinas antiinflamatórias (ex., IL-10), têm sido demonstradas para os probióticos.15 O fator estimulador de colônias de granulócitos e macrófagos (GM-CSF, sargramostim) consiste em outra forma de melhorar a imunidade inata do organismo.25 No caso da imunidade adquirida, é possível bloquear a IL-12 (anti-IL-12 ou ABT-874), a IL-2 (anti-IL-2, daclizumabe e basiliximabe), o interferon-γ (anti-IFN-γ, fontolizumabe ou HuZAF), clones de células T CD4 positivas (anti-CD3,visilizumabe ou HuM291), a IL-6 (atlizumabe), moléculas de adesão como a integrina a4 (natalizumabe), a integrina a4b7 (MLN-02, LDP-02), a molécula de adesão intercelular 1 (ICAM 1, alicaforsen ou ISIS 2302) e, finalmente, o fator de necrose tumoral (TNF-α) através do infliximabe (75% humano), certolizumabe (CDP-870, 95% humano), adalimumabe (100% humano) e certolizumabe (CDP-870). 25, 33 Por outro lado, é possível oferecer citocinas antiinflamatórias como a IL-10. Recentemente, a capacidade de secretar IL-10 e fator trefoil foi incorporada ao probiótico Lactococcus lactis, por engenharia genética, fazendo com que, além dos benefícios inerentes ao probiótico, se obtenha ação direta antiinflamatória, imunomoduladora e reparadora sobre a mucosa inflamada.15 Muitas dessas terapias ainda estão em fase experimental ou carecem de maior confirmação clínica. Entretanto, os resultados preliminares são encorajadores. A droga mais testada, e já comercializada no Brasil, é o infliximabe (anti-TNF), com resultados favoráveis tanto na doença de Crohn quanto na RCUI. 21, 38-40 Algo fundamental que tem sido descrito para a terapia biológica é a sua capacidade de promover melhora endoscópica e histológica, o que parece se traduzir em impacto sobre a história natural da doença, fato este não observado com o uso da abordagem usual com os corticóides tradicionais (ex., prednisona). 21 Na verdade, conquanto o corticóide melhore os índices clínicos de atividade da doença em cerca de 80% a 90% dos casos, a melhora endoscópica é da ordem de apenas 30%.21, 40 No caso da terapia biológica, esse valor sobe para 70%. Índices semelhantes de melhora endoscópica/histológica (70% a 75%) também têm sido relatados para a terapia nutricional, com impacto no longo prazo.5, 7 A pesquisa com terapia biológica certamente continuará de forma célere, na busca de medicamentos mais eficazes, de fácil administração, com menos efeitos colaterais e com impacto sobre a história natural da doença. Também teremos de reconsiderar os métodos atuais de avaliação da resposta 42 FBG pre congresso 155x225.pmd 42 10/5/2007, 17:35 Adérson Omar Mourão Cintra Damião/Aytan Miranda Sipahi terapêutica na doença de Crohn, como os índices de atividade (exs., índice de Best ou CDAI, Crohn’s disease activity index, índice de Harvey & Bradshaw etc.), que não levam em conta as condições macro nem microscópica da mucosa intestinal.45 Provavelmente, esses métodos clínicos/laboratoriais darão lugar a exames endoscópicos, ultra-sonográficos, de cápsula endoscópica, colonoscopia virtual etc., que, com o tempo, deverão ter seus custos mais reduzidos, possibilitando abordagem mais rotineira. Finalmente, associações de terapia biológica (ex., sargramostim + anti-TNF-α) talvez sejam utilizadas a fim de se obter melhor efeito terapêutico. Tudo indica que os corticóides tradicionais estão com seus dias contados. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. Referências bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 15. 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