FORMAÇÃO DO PROFESSOR ESPECIALISTA PARA ATUAR NAS
REDES DE APOIO: UM DESAFIO PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Annie Gomes Redig
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. E-mail: [email protected]
RESUMO:
Este trabalho pretende refletir e discutir sobre a formação do professor da área Educação Especial para
o atendimento educacional especializado nas redes de apoio – sala de recursos e itinerância. Para tal,
utilizou-se como metodologia de pesquisa qualitativa, entrevistas semiestruturadas com docentes das
redes de apoio do município do Rio de Janeiro, de uma determinada região. Nessa direção, observouse que as especialistas sentem dificuldade de interação com os profissionais das classes comuns, em
especial a partir do Ensino Fundamental II em diante, bem como a importância da formação
continuada / em serviço, para o atendimento educacional especializado dos alunos com deficiência.
Palavras-chaves: Formação de professores, Educação Especial, Educação Inclusiva, Rede de Apoio.
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo discutir a formação do docente da área de Educação
Especial para atuar no atendimento educacional especializado, ou seja, profissionais que
lecionam como suportes – nas redes de apoio -, dos professores das classes comuns. Utilizouse como metodologia de pesquisa qualitativa, entrevistas semiestruturadas com professoras
especialistas da sala de recursos e itinerantes do município do Rio de Janeiro, no ano letivo de
2009.
É fundamental para o sucesso da Educação Inclusiva que as escolas regulares tenham
um serviço de suporte da Educação Especial, como as salas de recursos e / ou professores
itinerantes1. A sala de recursos é um espaço destinado aos alunos que apresentam alguma
deficiência e que estão incluídos nas classes comuns, com o objetivo de aprofundar os
conteúdos e desenvolver mecanismos para que, esses alunos aprendam, com o auxílio de
recursos específicos que atendam as suas necessidades (PLETSCH, REDIG, BÜRKLE,
2008). O professor itinerante, segundo Pletsch (2005), Pletsch et al (2008), Bürkle & Redig
1
Estes são os serviços de suporte ou apoio oferecidos na Rede Pública de Educação do Município do Rio de
Janeiro, outras redes apresentam outras modalidades e / ou denominações para os suportes.
(2009) é um serviço desenvolvido por um especialista aos professores das classes comuns que
possuem alunos com necessidades educacionais especiais e aos próprios educandos.
Então, com o atual cenário da Educação Inclusiva, a Educação Especial vem tendo que
reestruturar o seu papel, antes voltado prioritariamente para a educação de pessoas com
necessidades educacionais especiais, agora, reconfigurado para dar suporte e / ou apoio ao
ensino regular (GLAT, FONTES & PLETSCH, 2006). Pletsch (2009) ressalta que a Educação
Especial não deve ser apenas um reforço escolar / pedagógico, mas sim um trabalho realizado
juntamente com o ensino comum, desenvolvendo métodos para um aprendizado significativo
e com êxito.
METODOLOGIA
Para compreendermos a atuação e formação das professoras especialistas no contexto
da Educação Inclusiva, foi desenvolvida uma pesquisa qualitativa com entrevistas semiestruturadas em escolas da rede municipal do Rio de Janeiro em que há professoras itinerante
e salas de recursos, durante o primeiro semestre de 2009. Todas as entrevistas foram gravadas
em áudio e transcritas. Então, das 17 professoras participantes da pesquisa, apenas três são de
sala de recursos e cinco itinerantes, foco desse trabalho. Essas profissionais foram
selecionadas por atuarem com alunos com deficiência intelectual, na Coordenadoria Regional
de Educação (CRE) escolhida.
Para Manzini (2008) a entrevista pode ser utilizada como forma única para a coleta de
dados, ou de maneira secundária, para complementar informações. Para ele (MANZINI, 2008,
p.8, grifo do autor) “é certo que o pesquisador que irá coletar informações por meio de
entrevista terá um dado de natureza muito particular: a versão sobre um evento ou fato”, isso
significa, que esse fato ou evento foi vivenciado pelo entrevistado, fazendo parte de sua
realidade. Então, os dados obtidos pelas entrevistas expressam opiniões, concepções e
descrições informadas pelos participantes. A entrevista é um momento de interação social,
visto que é desenvolvida por meio de um diálogo entre os envolvidos.
Discutindo a formação do docente especialista na perspectiva da Educação Inclusiva
A partir da década de 1990, o sistema educacional brasileiro vem sofrendo
modificações crescentes na direção de oferecer uma Educação Inclusiva para todos os alunos
— independentemente de sua condição social, econômica, cultural ou orgânica (deficiências,
transtorno psiquiátricos e/ou de comportamento, altas habilidades e outros) — visando seu
desenvolvimento social e acadêmico, em classes comuns do ensino regular.
A proposta da Educação Inclusiva tem como princípio uma escola que deve se
preparar para lidar com a diversidade do alunado, recebendo os que apresentam necessidades
educacionais especiais em uma pedagogia centrada no estudante, com suportes adequados
para que ele se desenvolva, em consonância com os preceitos da Declaração de Salamanca
(UNESCO, 1994). A política da Educação Inclusiva preconiza que esse alunado deve estudar
em uma classe regular, que tenha uma estrutura adequada para que o seu processo de ensinoaprendizagem ocorra com êxito.
Considerando por esse prisma, os profissionais da Educação precisam ter uma
formação continuada, a fim de receberem todos os educandos, pois não podem mais, como no
passado, “escolher” lecionar ou não para alunos com deficiência. Aliás, não só os professores
precisam estar preparados, mas todos os funcionários da escola, mesmo os que já possuem
uma qualificação: desde o diretor até o porteiro, pois este aluno é da escola e não do
professor.
A formação dos professores é uma das questões mais complexas para o sucesso da
proposta da Educação Inclusiva, visto que, é um dos fatores fundamentais para a efetivação de
uma educação de qualidade para todos os alunos. Para Senna (2007, p.165) “a perplexidade
do professorado diante dos sujeitos da educação inclusiva reflete exatamente sua incapacidade
de os enquadrar no perfil conceitual de aluno”.
É necessário que na formação dos professores haja uma articulação entre Educação
Especial e Ensino Regular, de forma, que os especialistas participem da capacitação dos
professores das classes comuns, construindo novas possibilidades de práticas pedagógicas
inclusivas (OLIVEIRA & LEITE, 2007). Essa proposta de parceria entre Educação Especial e
Ensino Regular também é defendida por outros autores como Fernandes (2006), Mendes
(2006, 2008), Fontes (2007), Glat & Blanco (2007), Pletsch, Redig & Bürkle (2008), Glat
(2008), Redig (2009, 2010) entre outros.
A propagação da Educação Inclusiva trouxe em seu bojo um questionamento sobre a
continuidade da Educação Especial, pelo menos na forma tradicional como esta área vem
atuando. Certamente, há necessidade de reformulação do papel da Educação Especial sobre
este novo palco educacional que vem se definindo. Entretanto, a importância da mesma não
pode ser subestimada. Nessa direção, para viabilizar este processo é essencial que os
professores especialistas sirvam de suporte para os da classe comum, visto que estes não estão
capacitados para receber esse alunado e se sentem despreparados para esta nova realidade.
O despreparo dos docentes do ensino comum é apontado por diversos autores, entre
eles: Glat & Nogueira (2002), Glat (2004, 2008), Machado (2005), Souza (2005), Lima
(2006), Antunes (2007), Oliveira (2007), Fontes (2007) entre outros. De acordo com Bueno
(1999) os professores do ensino regular não possuem preparo para o recebimento de alunos
com necessidades educacionais especiais. Mas, por outro lado, este autor também aponta que
os professores da Educação Especial, de modo geral, não têm muito a contribuir com o
trabalho pedagógico das classes comuns, uma vez que sua prática tem sido pautada na
compensação da deficiência do aluno em situação específica de classes especiais, com sua
dinâmica própria.
A formação do professor para a Educação Especial é uma discussão que deve ser feita
a partir dos objetivos que se quer atingir. Müller e Glat (1999) acreditam que o professor é o
elemento fundamental para o desenvolvimento de uma prática pedagógica inclusiva, por isso,
é importante repensar essa formação, levando em consideração as dificuldades em relação à
inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais nas classes comuns.
Rodrigues (2006) defende que o professor precisa ter uma formação profissional e não
apenas uma formação acadêmica. Nesse sentido, Barreto (2007) acredita que os professores
especializados são produtores de conhecimento e que encontram na escola, um espaço para a
vivência com a diversidade, do debate, da reflexão e da aplicação de saberes, a fim de
construírem uma escola de qualidade para todos os alunos.
Todavia, tem sido verificado que a atual formação do professor especialista em
Educação Especial não atende às necessidades atuais da prática pedagógica desse profissional,
visto que esses educadores se sentem despreparados para atuar com os alunos com
necessidades educacionais especiais, devido à precariedade de sua formação inicial. Pesquisas
revelam que a formação inicial dos professores para a Educação Especial não é suficiente para
a atuação profissional, o que leva os docentes a sentimentos variando desde insegurança até
culpa por não conseguir adequadamente ensinar a esses alunos (NUNES, GLAT, FERREIRA
& MENDES, 1998, MÜLLER & GLAT, 1999, OLIVEIRA & COSTA, 2007, MENDES,
2008).
Com a política da Educação Inclusiva, há uma tendência em formar o especialista,
com habilitação ampla, para atender as diferentes deficiências, inclusive para o trabalho no
contexto das salas de recursos multifuncionais2. De acordo com uma pesquisa realizada com
professores de classes especiais, Müller e Glat (1999) perceberam a formação ampla não
“contempla as particularidades e complexidades do processo ensino-aprendizagem de alunos
com necessidades especiais, principalmente os mais prejudicados” (p.39).
Não só a Educação Especial e a Educação Regular devem exercer um trabalho
colaborativo, mas como a formação em nível de graduação e pós-graduação precisa estar
articulada, objetivando um entendimento da política da Educação Inclusiva, aliado à pesquisa
e a produção de saberes pedagógicos inclusivos. É importante o incentivo a formação
continuada desses profissionais, a fim de eliminarmos as práticas excludentes existentes, por
isso, é fundamental o estímulo aos cursos de pós-graduação em Educação, que seguem essa
concepção. Como lembra Bueno (1999) uma qualificação crescente do professor implica em
ações políticas, com financiamento, valorização do trabalho docente em todos os âmbitos, seja
no salário, carreira entre outros.
A formação do docente da Educação Especial para o atendimento educacional
especializado: narrativas de professoras especialistas
Para que os docentes da Educação Especial atuem como suporte dos professores das
classes comuns, é necessário que haja uma formação em serviço, com o objetivo de capacitar
os especialistas para lecionarem para diversos alunos com diferentes deficiências. Pensar na
complexidade da formação desses profissionais é um desafio, pois no passado havia uma
especialização para cada deficiência e esse professor lidava com os sujeitos de sua
capacitação. Porém, atualmente, não acontece mais isso, visto que, os que atuam nas salas de
recursos e itinerância, encontram em suas turmas uma crescente diversidade de deficiências.
Nesse sentido, é importante reforçar para a necessidade da formação continuada e/ou em
serviço tentar dar conta da grande demanda que esses profissionais atendem.
De acordo com os relatos das entrevistadas, observamos que a Secretaria Municipal de
Educação do Rio de Janeiro (SME) desenvolve diversos cursos de capacitação e / ou
atualização para seus professores. Este tipo de ação é fortalecida pela LDBEN 9394/96
2
Segundo Alves, Gotti, Griboski & Dutra (2006) salas de recursos multifuncionais são espaços da escola
equipados com computadores com programas que facilitem o aprendizado dos alunos com necessidades
educacionais especiais, bem como impressoras em Braille, livros com fontes ampliadas e outros equipamentos
que possibilitem o aprendizado
(BRASIL, 1996) que preconiza a preparação dos profissionais da Educação para lidar com os
alunos com necessidades educacionais especiais.
As professoras confirmaram que os cursos oferecidos auxiliam em sua prática
pedagógica. Essa concepção vem de encontro com pesquisas que afirmam que a formação em
serviço é um dos caminhos para capacitar os profissionais para a Educação Inclusiva
(PRIETO, 2007, MENDES, 2008). Porém, elas enfatizam mais a prática em detrimento da
teoria, pois acreditam que o cotidiano da sala de aula, já acrescenta na sua formação,
relatando que a verdadeira aprendizagem acontece no espaço escolar. Todavia, se essa prática
pedagógica não for avaliada, refletida e planejada juntamente com a teoria da Educação, fica
superficial.
Outra estratégia para a formação em serviço, pode ser realizada por meio de encontros,
com trocas de experiências que esses profissionais fazem, de forma que possam conversar e
discutir as situações cotidianas com os demais docentes. Sendo assim, as professoras refletem
sobre suas práticas pedagógicas, a fim de desenvolverem uma pedagogia realmente inclusiva.
Outras professoras se queixaram que sentem necessidade de mais reuniões e oficinas para
discutir o cotidiano das escolas, e sobretudo trocar experiências. Para Giroto & Sade (2008) as
oficinas pedagógicas são como espaços de interação e trocas entre os professores, com o
objetivo de melhorar suas práticas pedagógicas, por meio da reflexão e do diálogo.
É importante também, o estreitamento da relação entre os professores das classes
comuns com os especialistas, visto que, ambos são responsáveis pela educação dos sujeitos
com deficiência. E para tal, os especialistas narram dificuldades de elaboração de
metodologias inclusivas que contemplem as diferentes áreas do conhecimento, principalmente
a partir do Ensino Fundamental II. Esse fato é um complicador no processo de inclusão e de
ensino-aprendizagem desses educandos. Acreditamos que para a real inclusão desses
indivíduos é necessário que os docentes das classes comuns também participem do programa
de formação continuada.
ALGUMAS REFLEXÕES FINAIS
A formação dos professores, tanto especialistas quanto das classes comuns é um
desafio para a Educação. Os profissionais da Educação Especial estão acostumados com um
cotidiano diferente da proposta pela Educação Inclusiva, na qual terão que atuar como rede de
apoio da Escola Regular, contemplando alunos de diferentes níveis de ensino e deficiências.
Por isso, é necessário pensarmos em formas para capacitar esses profissionais.
Vale ressaltar, a importância da formação em serviço desenvolvido pelo IHA, porque,
as especialistas se sentem mais seguras para atuarem no processo de inclusão dos alunos com
necessidades educacionais especiais nas classes comuns. Essa necessidade de formação
continuada e a procura por cursos, também foram apresentados na pesquisa de Müller & Glat
(1999) com docentes de classes especiais, bem como a riqueza das reuniões com as outras
professoras especialistas, possibilitando a troca de experiências.
Nessa direção, o despreparo dos professores mostrado em inúmeros depoimentos se
contrapõe com a LDBEN 9394/96 (BRASIL, 1996), a Declaração de Salamanca (UNESCO,
1994), Decreto nº 2 (BRASIL, 2001) entre outros documentos que preconizam a valorização
do docente, com melhores condições salariais, de trabalho, qualificação e etc. Esses elementos
são fundamentais para que o profissional de Educação exerça sua função de forma satisfatória
e de qualidade para todos os envolvidos nesse processo. É importante frisar que este
despreparo atinge tanto os professores das turmas comuns quanto os especialistas, que na
atual política precisam ser capacitados para atender alunos com uma grande diversidade de
deficiências, porque atuarão com diferentes alunos nas salas de recursos e na itinerância. O
pequeno quantitativo de profissionais especializados para atender à enorme demanda (tanto de
apoio direto ao educando como suporte ao professor regente) também se configura como um
obstáculo para a inclusão educacional.
Em termos amplos, precisamos conscientizar a sociedade da diversidade existente, da
importância da Educação Inclusiva e não apenas responsabilizar e culpabilizar a escola pelos
conhecimentos dos indivíduos. Todavia, para Padilha (2009) é função da escola a escolha da
melhor maneira para que o aprendizado aconteça de forma significativa, então acreditamos
que para isso, os professores precisam ser capacitados, de forma que os possibilitem atender à
nova demanda de ser um profissional multi-habilitado, com o objetivo de garantir uma
educação de qualidade para todos.
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