Rubens Robles Ortega Junior
Uma nota sobre bissetrizes e planos
bissetores
Rubens Robles Ortega Junior (Doutor)
Curso de Matemática – Universidade Tuiuti do Paraná
Departamento de Matemática – Universidade Federal do Paraná
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 29, FACET 04, pp. 183-190, Curitiba, abr. 2002
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Uma nota sobre bissetrizes e planos bissetores
Resumo
Duas retas no espaço bidimensional determinam dois ângulos de interseção, um ângulo agudo e seu suplemento.
Este trabalho discute o problema de encontrar a equação analítica da bissetriz do ângulo agudo formado pelas
retas. Será apresentado um critério simples para a resolução desta questão específica da Geometria Analítica Plana.
A versão tridimensional deste problema envolvendo o plano bissetor de um ângulo agudo também é discutida.
Palavras-chave: geometria analítica, bissetrizes, planos bissetores.
Abstract
Two intersecting lines in 2-space determine two angles of intersection, an acute angle and its supplement. This
work concerns the problem of finding the analytic equation of the line that bisects the acute one. It will be
presented a simple criterion to solve this specific question of plane analytic geometry. The three-dimensional
version of this problem concerning the plane that bisects an acute angle is also discussed.
Key words: analytic geometry, angle bisector line, angle bisector plane.
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 29, FACET 04, pp. 183-190, Curitiba, abr. 2002
Rubens Robles Ortega Junior
Introdução
Na Geometria Analítica Plana, estudada na terceira série do Ensino Médio, e na Geometria Analítica Espacial, estudada na primeira série de vários
cursos superiores, particularmente os inseridos nas
áreas de Ciências Exatas e de Tecnologia, os professores abordam, respectivamente, a questão da
obtenção das equações das bissetrizes dos ângulos
formados por duas retas concorrentes e das equações dos planos bissetores dos diedros formados
por dois planos concorrentes. Quando se quer saber qual é a equação da bissetriz (ou do plano
bissetor) do ângulo agudo formado pelas retas (ou
pelos planos), o procedimento padrão que é mostrado aos alunos consiste em calcular duas distâncias e compará-las. A menor distância estará associada
à bissetriz (ou ao plano bissetor) do ângulo agudo.
O objetivo deste trabalho é apresentar um critério
simples e de aplicação rápida para a resolução deste
problema.
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 29, FACET 04, pp. 183-190, Curitiba, abr. 2002
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Uma nota sobre bissetrizes e planos bissetores
Bissetrizes
Consideremos
duas
retas
concorrentes
r : a1 x + b1 y + c1 = 0 e s : a 2 x + b2 y + c 2 = 0 . É
bem conhecido que as equações das bissetrizes dos
ângulos formados por elas são dadas por (Iezzi, 1997,
p. 108-109)
a1 x + b1 y + c1
l1 :
a12 + b12
=+
a 2 x + b2 y + c 2
a 22 + b22
a1 x + b1 y + c1
a12 + b12
=-
a 2 x + b2 y + c 2
æ
a1
a2
l1 : ç
ç 2
2
2
a 2 + b22
è a1 + b1
æ
ö
b1
b2
÷x+ç
ç 2
÷
2
2
a 2 + b22
è a1 + b1
ø
ö
÷y=0
÷
ø
ö
æ
b1
b2
÷x+ç
+
÷
ç 2
2
2
a 2 + b22
ø
è a1 + b1
ö
÷y=0
÷
ø
e
e
l2 :
Com objetivo de simplificar os cálculos podemos
supor, sem perda de generalidade, que as retas r e s se
intersectam na origem do sistema de coordenadas
cartesianas, o que significa considerar c1 = c 2 = 0 .
Agora, seja P = (b1 ,- a1 ) um ponto pertencente à
reta r : a1 x + b1 y = 0 e calculemos sua distância às retas
.
a 22 + b22
O problema de saber qual das duas é a bissetriz do
ângulo agudo, no caso em que as retas r e s não são
perpendiculares, é tradicional e já apareceu em muitos
exames vestibulares de todo o Brasil. Os livros do
Ensino Médio, como por exemplo (Iezzi, 1997, p. 111114), costumam indicar a solução fazendo uma comparação entre as distâncias de um ponto arbitrário P ,
tomado sobre a reta r (ou s), às bissetrizes l1 e l2. Se
a menor distância é a de P a l1 (respectivamente l2),
então l1 (respectivamente l2) é a bissetriz do ângulo
agudo. Mostraremos que este procedimento, considerado de forma genérica, conduz a um critério simples
para se determinar qual é a bissetriz do ângulo agudo.
æ
,l 2 : ç
a1
a2
+
ç 2
2
2
a 2 + b22
è a1 + b1
respectivamente:
d ( P, l1 ) =
æ
a1
a2
ç
ç 2
2
2
2
a
+
b
a
1
2 + b2
è 1
ö
÷a
÷ 1
ø
æ
ö
b1
b2
÷b - ç
÷ 1 ç 2
2
2
2
+
a
b
a
1
2 + b2
è 1
ø
æ
a1
a2
ç
ç 2
2
2
a 2 + b22
è a1 + b1
2
ö æ
b1
b2
÷ +ç
÷ ç 2
2
2
a 2 + b22
ø è a1 + b1
ö
÷
÷
ø
2
e
d ( P, l 2 ) =
æ
a1
a2
ç
+
ç 2
2
2
2
a
+
b
a
1
2 + b2
è 1
æ
ö
b1
b2
÷b - ç
+
÷ 1 ç 2
2
2
2
+
a
b
a
1
2 + b2
è 1
ø
æ
a1
a2
ç
+
ç 2
2
2
a 2 + b22
è a1 + b1
2
ö æ
b1
b2
÷ +ç
+
÷ ç 2
2
2
a 2 + b22
ø è a1 + b1
ö
÷a
÷ 1
ø
ö
÷
÷
ø
2
.
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Rubens Robles Ortega Junior
( a1b2 ¹ a 2 b1 )
e
( a1a 2 + b1b2 ¹ 0).
Portanto,
- a 2 b1 + a1b2
a 22 + b22
d ( P, l1 ) =
2-
não
perpendiculares
(a) Se a1a 2 + b1b2 < 0 então a bissetriz do ângulo agudo formado pelas retas r e s é a reta
2(a1a 2 + b1b2 )
a12 + b12 a 22 + b22
l1 :
e
a 2 b1 - a1b2
a 22 + b22
d ( P, l 2 ) =
2+
a12 + b12 a 22 + b22
2(a1a 2 + b1b2 )
a12
+ b12
a 22
+ b22
> 2+
a12 + b12
=+
a 2 x + b2 y + c2
a 22 + b22
.
(b) Se a1a 2 + b1b2 > 0 então a bissetriz do ângulo agudo formado pelas retas r e s é a reta
2(a1a 2 + b1b2 )
Posto que os dois denominadores são iguais, temos
que
d ( P, l1 ) < d ( P, l 2 ) Û 2 -
a1 x + b1 y + c1
2(a1a 2 + b1b2 )
a12 + b12 a 22 + b22
Logo,
d ( P, l1 ) < d ( P, l 2 ) Û a1a 2 + b1b2 < 0,
o que significa, neste caso, que l1 é a bissetriz do ângulo agudo. Analogamente, obtemos que
d ( P, l1 ) < d ( P, l 2 ) Û a1a 2 + b1b2 < 0
Portanto, acabamos de demonstrar o seguinte Teorema.
e
Sejam
r : a1 x + b1 y + c1 = 0
duas
retas
concorrentes
s : a 2 x + b2 y + c 2 = 0
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 29, FACET 04, pp. 183-190, Curitiba, abr. 2002
l2 :
.
a1 x + b1 y + c1
a12 + b12
=-
a 2 x + b2 y + c 2
a 22 + b22
.
Planos Bissetores
A versão tridimensional do problema discutido
anteriormente considera dois planos concorrentes
a : a1 x + b1 y + c1 z + d1 = 0 e b : a 2 x + b2 y + c 2 z + d 2 = 0.
As equações dos planos bissetores dos diedros formados por
e
182-183)são dadas por (Venturi,
2001, p. 182-183)
p1 :
e
a1 x + b1 y + c1 z + d1
a12
+ b12
+
c12
=+
a 2 x + b2 y + c 2 z + d 2
a 22 + b22 + c 22
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Uma nota sobre bissetrizes e planos bissetores
p2 :
a1 x + b1 y + c1 z + d1
a12
+ b12
+
c12
=-
a 2 x + b2 y + c 2 z + d 2
a 22
+ b22
+
c 22
No caso em que os planos e não são perpendiculares, queremos saber qual desses dois planos é o
plano bissetor do ângulo diedro agudo determinado
por e . Em (Venturi, 2001, p. 185), sugere-se tomar um ponto arbitrário P no plano (ou ) e calcular suas distâncias aos planos
e . Se a menor
distância é a de P a (respectivamente ), então
(respectivamente
) é o plano bissetor do ângulo
diedro agudo.
Sem perda de generalidade, podemos supor que
e passam pela origem do sistema de
os planos
coordenadas cartesianas, o que significa considerar
d1 = d 2 = 0 .
Agora, seja P = (b1 ,- a1 ,0) um ponto pertencente ao plano a : a1 x + b1 y + c1 z = 0 e calculemos sua
distância aos planos
æa a
p1 : ç 1 - 2
èA B
ö
æb b
÷x+ç 1 - 2
ø
èA B
ö
æc c
÷y+ç 1 - 2
ø
èA B
ö
÷z = 0
ø
respectivamente (aqui, A =
B = a 22 + b22 + c 22 ):
d ( P, p 1 ) =
æ a1 a 2 ö
æb b ö
ç - ÷ b1 - ç 1 - 2 ÷ a1
èA Bø
èA Bø
2
2
æ a1 a 2 ö æ b1 b2 ö æ c1 c 2 ö
ç - ÷ +ç - ÷ +ç - ÷
èA Bø èA Bø èA Bø
2
e
d ( P, p 2 ) =
æ a1 a 2 ö
æb b ö
ç + ÷ b1 - ç 1 + 2 ÷ a1
A
B
è
ø
èA Bø
2
2
æ a1 a 2 ö æ b1 b2 ö æ c1 c 2 ö
ç + ÷ +ç + ÷ +ç + ÷
èA Bø èA Bø èA Bø
2
.
Portanto,
- a 2 b1 + a1b2
d ( P, p 1 ) =
B
2(a1a 2 + b1b2 + c1c 2 )
2AB
e
e
a ö
æa
æb b ö
æc c ö
p2 :ç 1 + 2 ÷x +ç 1 + 2 ÷ y +ç 1 + 2 ÷z = 0
èA Bø
èA Bø
èA Bø
a12 + b12 + c12 e
a 2 b1 - a1b2
d ( P, p 2 ) =
B
2(a1a 2 + b1b2 + c1c 2 ) .
2+
AB
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Posto que os dois denominadores são iguais, temos
que
d ( P, p 1 ) < d ( P, p 2 ) Û 2 -
2(a1a 2 + b1b2 + c1c 2 )
2(a1a 2 + b1b2 + c1c 2 )
> 2+
.
AB
AB
Logo,
d ( P, p 1 ) < d ( P, p 2 ) Û a1a 2 + b1b2 + c1c 2 < 0,
é o plano bissetor
o que significa, neste caso, que
do ângulo diedro agudo. Analogamente, obtemos que
d ( P, p 1 ) < d ( P, p 2 ) Û a1a 2 + b1b2 + c1c 2 < 0.
Portanto, acabamos de demonstrar o seguinte Teorema.
Sejam
e
a : a1 x + b1 y + c1 z + d1 = 0
b : a 2 x + b2 y + c 2 z + d 2 = 0 dois planos concorrentes e não perpendiculares ( a1a 2 + b1b2 + c1c 2 ¹ 0).
(a) Se a1a 2 + b1b2 + c1c 2 < 0 então a equação do
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 29, FACET 04, pp. 183-190, Curitiba, abr. 2002
plano bissetor do ângulo diedro agudo formado pelos planos e é o plano
.
p1 :
a1 x + b1 y + c1
a12
+ b12
+
c12
=+
a 2 x + b2 y + c 2
a 22 + b22 + c 22
(b) Se a1a 2 + b1b2 + c1c 2 > 0 então a equação
do plano bissetor do ângulo diedro agudo formado
pelos planos e é o plano
p2 :
a1 x + b1 y + c1
a12 + b12 + c12
=-
a 2 x + b2 y + c 2
a 22 + b22 + c 22
Conclusão
Os teoremas apresentados anteriormente
constituem um critério de fácil aplicação na resolução de um problema específico da Geometria
Analítica.
.
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Referências bibliográficas
IEZZI, G. (1997). Fundamentos de Matemática Elementar, volume 7 (Geometria Analítica). São Paulo: Atual
Editora Ltda.
VENTURI, J. J. (2001). Álgebra Vetorial e Geometria Analítica. Curitiba: Artes Gráficas e Editora Unificado.
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