ESCRITÓRIO VIRTUAL DE ARQUITETURA Ana Cecília ROCHA Arq. e Urb., Mestranda pela EA-UFMG. Especialista em Tecnologia e Produtividade das Construções pela EE-UFMG. Home office: Rua Bernardo Guimarães, 300/202, Funcionários - BH/MG - 30140-080 Cyberoffice: www.anaceciliarocha.com.br [email protected] Cel (31) 995-995-20 RESUMO Este texto discute as TICs (Tecnologias de Informação e Comunicação) aplicadas ao uso do Teletrabalho na Arquitetura. Introduz um modelo simplificado de funcionamento de um Escritório Virtual, bem como cita exemplos de experiências bem sucedidas nas áreas de Arquitetura e Engenharia. Conclui com uma breve análise das vantagens e dos desafios proporcionados pela adoção do Teletrabalho. Palavras-chaves: TICs, Teletrabalho, Escritório Virtual, Home Office, Informática, Arquitetura. 1 – INTRODUÇÃO: O TELETRABALHO Teletrabalho consiste na execução de tarefas baseadas na informática e telefonia e que, portanto, não exigem um escritório central.1 Assim, o teletrabalhador seria um funcionário que exerce o seu trabalho independentemente do local onde se encontra, podendo ser sua residência, escritório particular, hotel ou qualquer outro lugar com infra-estrutura disponível. Maria Fátima PINEL2, em sua dissertação sobre o Teletrabalho, constata como o processo de reestruturação global da economia, proporcionado pelo desenvolvimento científico e tecnológico, prenunciam a “lenta morte da distância”, apontando cada vez mais para as relações virtuais ou midiáticas. Uma redefinição do conceito de tempo e espaço faz-se, portanto, necessária para compreendermos o que a autora chama de “Sociedade da Informação”, termo originalmente cunhado pelo sociólogo Daniel BELL3. O trabalho nesta sociedade caracterizar-se-ia pelo uso extensivo das TICs – Tecnologias da Informação e Comunicação. Quatro características do conhecimento e da informação tornam únicos estes recursos e conjecturam um novo retrato para a economia: o conhecimento é difundível e se auto-reproduz; o conhecimento é substituível; o conhecimento é transportável e o conhecimento é compartilhável. Com efeito, o conhecimento é um bem em si mesmo, que repassando-se não se perde, utilizando-se não se gasta, ao contrário, aperfeiçoa-se. Assim, o conhecimento e seu veículo principal - os recursos humanos - consistem no verdadeiro patrimônio das empresas contemporâneas. As aplicações do Teletrabalho proporcionam ainda enormes modificações em nossa estrutura de funcionamento. A primeira grande mudança está na flexibilização do espaço. Para cada tipo de atividade existe uma maneira correta de se implementar o Teletrabalho, podendo o serviço ser realizado via terminal ou através de Intranet (rede particular), ou mesmo Internet. Para trabalhos nos quais deve-se manter um contato mais estreito com os clientes e com os colaboradores, a modalidade hoteling (ou móvel) apresenta-se como a mais adequada. Além de minimizar o desperdício de espaço, outra grande vantagem do Teletrabalho reside na possibilidade de colaborar com a preservação do meio ambiente. O potencial poluidor de uma empresa não se resume apenas na emissão direta de poluentes, mas também na sua emissão indireta, causada pelo transporte de produtos e de funcionários. A redução dos veículos em circulação nas grandes cidades, especialmente em áreas de alta poluição do ar e congestionamento de tráfego, é um requisito essencial para a qualidade de vida e de trabalho. Considera-se ainda de extrema relevância a economia de energia, uma vez que infra-estruturas e grandes instalações empresariais tornam-se muitas vezes desnecessárias neste sistema. Inúmeras empresas já adotaram o Teletrabalho no Brasil e no mundo. De acordo com as estatísticas da ITAC - International Teleworkers Association Council4 - atualmente nos EUA cerca de 28% da população ativa utiliza alguma das formas de Teletrabalho1. Na AT&T, 33% dos gerentes trabalham em casa pelo menos uma vez por semana, incluindo 17% que teletrabalham em tempo integral em suas residências, através de Escritórios Virtuais.5 Segundo PINEL2, “no Banco do Brasil, seus auditores internos são teletrabalhadores parciais. Nas áreas de tecnologia e manutenção de equipamentos, alguns trabalhos são executados parcialmente à distância ou na residência dos funcionários. Na SAP do Brasil, aplicando o conceito de Hoteling, há mesas fixas para apenas 1/3 de seus 220 funcionários. Estes passam de 80% a 90% do tempo fora da empresa. Enquanto isto, na IBM, o representante de vendas, ao descer do elevador do prédio em São Paulo, digita o seu nome em um micro no hall, enquanto aguarda a resposta da localização da mesa que irá trabalhar no dia e, então, suas ligações serão transferidas para o local indicado pelo computador. Ao chegar, pluga o seu notebook à rede IBM, confere os e-mails, acessa o banco de dados e inicia seu trabalho. Há pouco mais de um ano no Brasil e contando com 500 integrantes, o Projeto Mundial da IBM (Mobility) já atingiu um aumento em média de 82% de produtividade de seus funcionários. Eles possuem total flexibilidade para administrar o seu horário de trabalho. A comunicação com a IBM e clientes acontece através de contatos virtuais, por e-mail e celular.” Seja no home-office, seja no estilo hoteling, o impacto da flexibilização de espaço pode ser sentido no mercado imobiliário, com a transferência da parte física das empresas para áreas menos valorizadas, reduzindo assim o custo operacional do empreendimento.2 Além disto, no mundo cibernético nem mesmo uma tempestade tropical impedirá a entrega do correio eletrônico. Mesmo sob condições climáticas adversas, as empresas que utilizam o Teletrabalho continuam a funcionar, só não estando à salvo dos “apagões”. Considerando, entretanto, que quase nenhuma forma de trabalho hoje em dia subsiste sem energia elétrica, pouquíssimos fatores externos colocam o Teletrabalho em condições competitivas desfavoráveis. O Teletrabalho concede ainda oportunidades iguais de mercado para os deficientes físicos, bem como minimiza, em alguns casos até mesmo elimina, interferências psicológicas e culturais associadas à raça, sexo, credo, aparência e nacionalidade. Possibilita uma perspectiva totalmente nova, uma vez que, como um cérebro comunicante, o trabalhador não estará mais limitado à noção de espaço como conhecemos hoje, nem à pré-julgamentos associados à características sociais ou físicas. Flexibilizando os locais de trabalho, as redes de comunicação permitem a criação de oficinas virtuais onde qualquer indivíduo possa exercer sua profissão. As atividades atingem quase todos os níveis e funções do escritório de arquitetura e engenharia: secretariado, desenho, marketing, programação, análise de sistemas, gerenciamento e elaboração de projetos. O Teletrabalho contribui ainda colocando a mão-de-obra altamente qualificada em contato com clientes distantes. Locais isolados geograficamente podem agora integrar-se ao mercado, prestando serviços para qualquer parte do mundo. Se por um lado isto reduz o êxodo para as grandes metrópoles, por outro, aumenta a competição em todos os âmbitos. Além disto, segundo Maria Fátima PINEL6, os teletrabalhadores são os primeiros a serem demitidos, devido à reduzida ligação emocional entre o funcionário e o empregador. Não obstante, o Teletrabalho cresce em todo o mundo, numa coerência direta com novas tendências econômicas, como o trabalho autônomo e a flexibilização de tempo e espaço. Domenico DE MASI dedica um capítulo inteiro de seu livro “O Ócio Criativo” ao assunto. Segundo o autor, a IBM Italiana transformou três mil e quinhentos de seus dependentes em teletrabalhadores. Como veremos a seguir, na área de arquitetura e engenharia o Teletrabalho é mais comum do que se possa imaginar, sendo que quase a totalidade dos escritórios, em diferentes patamares de adesão, já teletrabalha sem até mesmo dar-se conta disto. 2 – FUNCIONAMENTO DO ESCRITÓRIO VIRTUAL DE ARQUITETURA 2.1 – Relação Cliente – Profissional Cliente final, cliente leigo: O cliente final, ou o leigo, costuma ser aquele que mais se preocupa com a aparência do escritório, inferindo muitas vezes a partir dela a competência do arquiteto ou engenheiro. O Teletrabalho adapta-se melhor, portanto, nas empresas cujo enfoque principal concentra-se na capacitação do profissional e não no marketing imagético. No caso, trata-se não da imagem da arquitetura ali projetada, que deve sempre preocupar-se com as questões estéticas, mas referimo-nos ao profissional que, devido o seu público alvo, além de um produto de qualidade, precisa vender uma imagem pessoal através do escritório. Cliente intermediário, cliente do ramo: No caso do cliente final menos suscetível ao marketing imagético, do cliente intermediário (por exemplo, dono de construtora) ou ainda do cliente que pertence ao ramo (por exemplo, engenheiro), as relações tornam-se mais profissionais e menos dependentes do marketing/infra-estrutura do escritório, sendo as reuniões muitas vezes na empresa do próprio cliente ou no canteiro de obras. Este tipo de relação favorece especialmente o Teletrabalho. 2.2 – Relação entre os trabalhadores e a empresa Troca de informações e conhecimento: O contato entre os funcionários e troca de informações pode acontecer por telefone ou através de programas de Internet, tipo MSN ou ICQ, ou ainda, softwares dedicados de Intranet. Via e-mail, chat ou mesmo viva voz e imagem, os teletrabalhadores poderão tirar dúvidas e discutir idéias, minimizando assim a falta do contato presencial. Horário de trabalho: Com o Teletrabalho a gestão do tempo é realizada pelo próprio trabalhador, requerendo um perfil predisposto e disciplinado. No caso das remunerações por hora, podem ser adotados “pontos eletrônicos” ou planilhas. A relação de confiança, contudo, sempre é maior para com o teletrabalhador. Para que a troca de informações e tomada de decisões não sejam afetadas pela flexibilização, define-se “Horários Intercessão”, onde uma vez por dia, durante uma ou duas horas, toda a equipe estará on line. Em muitos casos, porém, telereuniões pré-agendadas ou o celular costumam dispensar este tipo de recurso. Reuniões: As reuniões podem acontecer virtualmente ou serem presenciais, nos chamados Escritórios Virtuais Profissionais, onde uma mensalidade garante a utilização da infra-estrutura de um escritório comum, como secretária, fax e sala de reuniões. No Brasil existem várias empresas que fornecem este serviço. Uma outra opção seria a realização de reuniões em horário de almoço ou jantar, seguidas de happy hour, contribuindo inclusive para a socialização entre os trabalhadores. Para empresas menores, nos Cybercafés elimina-se a necessidade de um notebook. Locais públicos de livre acesso, como universidades e museus apresentam-se como espaços ideais para reuniões de grupo, que podem ainda serem realizadas no Home Office ou escritório central. 2.3 – Infra Estrutura Ambiente de trabalho: O Home Office consiste na forma mais radical de Teletrabalho. Entretanto, Ênio Padilha7, engenheiro e especialista em marketing na Arquitetura e Engenharia, recomenda não confundir escritório da família com Home Office ou ainda, o ambiente residencial com o da empresa, garantindo assim a imagem profissional do espaço, bem como sua qualidade funcional e estética. Cuidados especiais precisam também ser observados quanto à tranquilidade e privacidade, evitando-se a interferência indesejada dos demais moradores durante o trabalho. Quando prefere-se, contudo, separar totalmente a empresa da residência, mantém-se a estrutura de um escritório convencional, eliminando-se somente os espaços anteriormente ocupados pelos antigos funcionários, atuais teletrabalhadores. Equipamentos: O Teletrabalho requer um alto nível de informatização do escritório e o uso de tecnologias de comunicação avançadas. A língua é o inglês, o latim de nossos tempos, a linguagem é a da informática. Alguns equipamentos são essenciais: computador, telefax, Internet rápida, scanner, celular, impressora. Equipamentos adicionais: microfone, microcâmera e Intranet. Com a já instaurada informatização dos escritórios de arquitetura e engenharia, o up grade não representa custos significativos. A economia com aluguel e infra-estrutura da sede compensam o investimento. Serviços auxiliares: Diversos serviços terceirizados podem auxiliar o Teletrabalho. Entregador ou, nos casos de escritórios de maior porte, office boy solucionam o problema com envio de projetos, material e documentos originais. Sedex com hora marcada assegura a comunicação com outras cidades. Uma Copiadora de confiança, com serviço delivery, garante que o projeto seja entregue diretamente na obra. 2.4 – Organização impecável, espírito empreendedor Para que este modelo de escritório funcione perfeitamente, os funcionários devem estar familiarizados com a tarefa que pretendem realizar, com as tecnologias e equipamentos envolvidos, com a padronização do escritório, possuindo manual de procedimentos e gabaritos necessários à execução do trabalho. Faz-se necessário ainda uma equipe extremamente disciplinada, dedicada e eficiente, onde o trabalhador tenha sempre a iniciativa de sugerir melhorias no sistema e de resolver problemas inesperados de forma a não depender com frequência de reuniões presenciais. Independente e empreendedor, o teletrabalhador deve possuir familiaridade com computador e novas tecnologias, além de grande capacidade de adaptação, síntese, comunicação e resolução de problemas. 2.5 – E-learning: educação à distância aplicada à capacitação profissional O Teletrabalho conta ainda com uma poderosa ferramenta de capacitação de recursos humanos: o ensino à distância. O que antes tratava-se de um formato educacional utilizado somente por pessoas em locomoção constante, como velejadores e viajantes, o ensino à distância hoje em dia está sendo implementado em universidades, escolas fundamentais, congressos, grupos de estudos e discussão. Ao redor do mundo, empresas públicas e privadas adotam a ferramenta com sucesso. Segundo o site E-Learning da University of Phoenix8, este recurso tem sido utilizado pela McDonalds, Cisco® Systems Inc. e US Postal Service. No Brasil, o e-learning já foi implementado em diversas empresas, como American Express e Usiminas/Fumec. Na CEMIG Companhia Energética de Minas Gerais, o projeto “Ensino Cemig” formou, em nove meses, 246 e-alunos em sua Intranet corporativa, economizando mais de 90 mil reais com despesas de curso e treinamento de funcionários. A média de requisições de inscrição chegou a 522 por dia. Foram oferecidos cursos de informática e específicos da área técnica.9 Na Internet, diversos sites oferecem cursos on line gratuitos de excelente qualidade. O premiado Webaula10, do Grupo Zargon, disponibiliza inúmeros cursos de informática para mais de 450.000 alunos, além de consultores via chat para esclarecimento de dúvidas. O portal do Sebrae também conta com uma área totalmente dedicada ao e-learning empresarial.11 O MIT (Massachusetts Institute of Technology), uma das universidades mais conceituadas do mundo, está oferecendo cursos on line gratuitos em praticamente todas as áreas do conhecimento, inclusive Arquitetura e Urbanismo.12 O Portal E-learning da UNESCO contém ainda outras informações sobre o ensino à distância e links para diversos sites do assunto.13 3 – EXEMPLOS BEM SUCEDIDOS Como teletrabalhadora, as experiências pessoais bem sucedidas têm sido estimulantes. A iniciação ao Teletrabalho aconteceu já no período acadêmico. Foram vários projetos ao redor do Brasil, alguns totalmente teletrabalhados, realizados muitas vezes sem sequer conhecermos pessoalmente os clientes ou empresas envolvidas. Esta experiência foi vivida na prática durante seis meses de estágio na CAD Arquitetura (escritório do arquiteto Carlos Alexandre Dumont – Carico). Também como estagiária da João Diniz Arquitetura14, teletrabalhamos em lojas e projetos diversos, tendo o arquiteto João Diniz teletrabalhado da Europa com sua equipe em Belo Horizonte. Num estágio de pesquisa via Internet, desenvolvemos durante seis meses trabalhos com o arquiteto Leonardo Barci Castriota15, que na ocasião encontrava-se no Getty Institute, em Los Angeles. Como profissional, o modelo de Escritório Virtual continua a ser aplicado em meu Home Office. Projetos arquitetônicos, de pesquisa, urbanísticos, patrimoniais: em inúmeras áreas da arquitetura o Teletrabalho se adapta perfeitamente. Um exemplo concreto foi a parceria com a Miguilim Assessorial Cultural, empresa sediada na cidade de Betim, objetivando realização de laudos técnicos, inventários, dossiês e diversos outros projetos patrimoniais. Contactei a Diretora da empresa – Patrícia Brito - por telefone, enviando o meu currículo por e-mail. Algumas semanas depois, recebo um telefonema com proposta de 5 trabalhos que foram, naquela mesma ocasião ao telefone, negociados e fechados. Os contratos vieram via Internet e o material necessário por entregador. Por e-mail e telefone, profissionais de diversas áreas (arquitetura, história, arqueologia, geologia, direito, educação, meio ambiente, etc.) teletrabalharam num contato praticamente diário. Os produtos finais impressos foram enviados à empresa por um entregador que, por sua vez, repassou tudo ao cliente final por correio. A prestação de contas chegou à empresa via e-mail e os vencimentos, depositados na conta bancária de cada profissional contratado. A experiência foi espetacular e o encontro ao vivo com a equipe só aconteceu um mês depois, no café do Palácio das Artes, numa reunião de confraternização e também de futuros negócios e projetos. Hoje, mais de seis meses após o primeiro telefonema, continuamos teletrabalhando sem ainda conhecer a maioria dos profissionais da empresa ou a sua sede em Betim. A parceria é um grande sucesso graças ao Teletrabalho. Por fim, uma experiência ousada atesta o crescente interesse brasileiro no Teletrabalho e nas TICs: o Reality Show de Negócios Virtuais em Casa16, na Brasiltec 200317 em São Paulo. A instalação Casa Inteligente contou com a participação de oito profissionais (dentre eles um arquiteto), que se mudaram para o espaço de 400 m2, projetado pelo arquiteto Carlos Bratke, por cinco dias e quatro noites. Estes oito candidatos foram selecionados entre 297 profissionais teletrabalhadores, inscritos em apenas cinco dias de divulgação. Prova de que o Teletrabalho está se tornando uma ferramenta cada vez mais utilizada aqui mesmo no Brasil. 4 – CONCLUSÃO Nos filmes e na literatura, os avanços da telecomunicação e da computação têm sido apresentados, muitas vezes, como os grandes vilões do futuro, onde o homem se tornaria quase um robô, preso em um único ambiente, sem contato real com os demais seres humanos, vivendo sensações produzidas artificialmente através da Realidade Virtual (VR). O pitoresco do passado e o retorno à máquina de escrever parecem alimentar a ilusão de que já não somos um planeta informatizado e teleinterligado. Praticamente todos, em maior ou menor grau, direta ou indiretamente, utilizam-se do computador e das TICs diariamente ao fazer, por exemplo, uma ligação telefônica. Entretanto, o ser humano é e sempre será um animal simbólico e gregário. Nenhuma atividade meramente computadorizada ou cerebral irá sublimar nossas necessidades emocionais e fisiológicas, muito menos substituir o prazer intrínseco que existe no convívio. As relações presenciais continuam nos happy hours , nos clubes, nas festas, nos parques, nos cafés, nas igrejas e nas inúmeras formas de socialização que o homem construir para si. Ao contrário do que pensam alguns, segundo o sociólogo italiano Domenico DE MASI, os horários flexíveis proporcionados pelo Teletrabalho “podem favorecer as minhas relações com os outros, talvez me permita falar mais vezes com o meu vizinho, ou conseguirei, finalmente, ir visitar um museu de manhã, ou quando bem me convier. Com efeito, as relações físicas diretas com os colegas de escritório diminuem. Mas aquelas eram relações impostas e não por escolha. Desse modo, sobra mais tempo a ser passado com os verdadeiros amigos, os eleitos por mim.”18 O mito do fim das relações sociais será derrotado pelo poder de escolha proporcionado por recursos como o Teletrabalho. Assim, nem tecnofobia, nem tecnolatria. O Teletrabalho não é a solução para todos os problemas profissionais: trata-se apenas de uma poderosa ferramenta que pode ser adotada com sucesso, parcial ou integralmente, no Escritório de Arquitetura e Engenharia. Aumento da produtividade, flexibilização de horários, economia de espaço e equipamentos, redução do desperdício de tempo, preservação do meio ambiente, diminuição do número de faltas, independência em relação às condições climáticas ou externas. A mãe em processo de amamentação pode teletrabalhar em casa nos primeiros meses, o trabalhador doente pode terminar o relatório imprescindível, o sábado pode ser dia comercial e a segunda, feriado. As vantagens são inúmeras e as desvantagens estão aí para serem superadas por milhões de atuais teletrabalhadores ao redor do mundo. Apesar de sua já substancial adesão, o Teletrabalho ainda se difunde lentamente, muito mais por razões sociais do que tecnológicas, como nos elucida DE MASI, num comentário extremamente perspicaz, que nos provoca a revermos nossos valores e nossas expectativas em relação ao trabalho e à sociedade em que vivemos. (O teletrabalho se difunde lentamente) devido a um abismo cultural. Antes de mais nada, a maioria da população sempre viveu num outro contexto psicológico, no qual a separação entre vida de trabalho e vida doméstica era considerada um fator de promoção social. Até que esta geração, que passou a vida inteira, desde o nascimento, dentro da organização industrial, seja superada, será difícil acolher sem traumas a reordenação dos lugares da vida e do trabalho. Um outro obstáculos são os chefes, acostumados a ter os subalternos na palma da mão. E, além disso, um fator que não é mencionado nunca, a dimensão erótica da empresa. A empresa é um lugar de paixões, amores, ligações, atrações. Há também a resistência dos sindicatos, do chefe de pessoal, da dor de muitos de abandonar o overtime. A repulsa dos homens, mas também de algumas mulheres emancipadas, pelo trabalho doméstico, considerado degradante. (...) Há a falta de hábito das empresas de calcular, além do desperdício de tempo, também o desperdício de espaço. E há o masoquismo coletivo: nem sempre as pessoas desejam viver melhor e ser mais felizes.19 Por fim, outro mito que precisa ser superado é o da total perda da individualidade devido à difusão de conhecimento e intercâmbio cultural. Possuir uma mente cosmopolita não elimina necessariamente nossa identidade. Nunca se preservou tanto o patrimônio dos lugares, não somente artístico e edificado, mas como também o Patrimônio Imaterial, ou intangível, que são as festas, o saber-fazer, a cultura de um povo. Como bem nos esclarece na passagem abaixo o arquiteto Carlos LEMOS, a diferença sempre existirá e pode até mesmo, num processo reativo à massificação, ser cada vez mais valorizada. Assim, desfrutaremos de tecnologias universalmente difundidas, relendo-as contudo do jeito nosso, cada cultura à sua maneira única, cada um acrescentando-lhes algo de seu. “Um olhar desatento realmente nos faz cogitar duma tendência à uniformização do pensamento, numa despersonalização cultural dos povos. Cremos que tudo isso seja de todo impossível devido justamente às articulações entre os elementos do meio ambiente e o conhecimento que, de um modo ou de outro, acabam interferindo no processo porque são irremovíveis em sua totalidade. Sempre haverá um pouco de Brasil em cada coisa, em cada artefato, em cada gesto. O rádio japonês sempre transmitirá sua musiquinha sertaneja. Sempre daremos um jeitinho nosso às coisas de fora.” 20 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AT&T. Global Survey Predicts Upsurge in Telework. Disponível em: <http://www.att.com/telework/> Acessado em: Set. 2003 BELL, Daniel. O Advento da Sociedade Pós-Industrial. São Paulo: Cultrix, 1977. DE MASI, Domenico. O Ócio Criativo. Rio de Janeiro: Sextante, 2000. FUSCO, Camila. As mudanças e o futuro do mercado de trabalho. Caderno I. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/home/cadernoi/artigo/0,2945,900119,00.html> Acessado em: Set. 2003 ITAC - International Teleworkers Association Council. Disponível em: <http://www.workingfromanywhere.org/telework/twa2001.htm> Acessado em: Set. 2003 LEMOS, Carlos A. C. O que é Patrimônio Histórico? São Paulo: Brasiliense, 1985, 4ª Ed. MARIA, Rosa. Casa incentiva o Teletrabalho. Estado de Minas, Belo Horizonte, 7 de Agosto de 2003. Caderno de Informática, p.16. Teletrabalho. PINEL, Maria Fátima de Lima. <http://www.teletrabalhador.com> Acessado em: Set. 2003 Brasil, Fev. 2002. Disponível em: ROCHA, Ana Cecília. “O Teletrabalho: a morte da distância, o ócio nada ocioso”. In: Slow Construction: Tecnologia e Sustentabilidade das Construções numa Cidade Inteligente. 2002. 145 (f.). Monografia Final de Curso - Especialização em Construção Civil - Escola de Engenharia da UFMG, Belo Horizonte. UNIVERSITY OF PHOENIX. E-learning. Disponível em: <www.elearning.com> Acessado em: Set. 2003 USP Brasiltec 2003. Disponível em: <http://www.usp.br/prp/brasiltec/desctrabs.htm> Acessado em: Set. 2003 WEBAULA – Portal de Ensino à distância. Cemig economiza mais de R$ 90 mil com o E-learning. Disponível em: <www.webaula.com.br> Acessado em: Set. 2003 Notas 1 Camila FUSCO. As mudanças e o futuro do mercado de trabalho. 2 PINEL, Maria de Fátima. Teletrabalho. 3 BELL, Daniel. O advento da Sociedade Pós-Industrial. 4 A ITAC consiste em uma organização sem fins lucrativos dedicada a estimular o crescimento e sucesso do Teletrabalho. Patrocina o Telework America, um projeto público-privado para o avanço do conhecimento acerca do Teletrabalho. “Trabalhando de qualquer lugar” é o endereço oficial do site ( www.workingfromanywhere.org ). São membros da ITAC diversas empresas que se utilizam desta ferramenta, como AT&T, Basf, HP, Nasco, Xerox, ScheringPlough, além de agências governamentais, como U.S. Department of Defense. 5 AT&T. www.att.com/telework 6 In Camila FUSCO. As mudanças e o futuro do mercado de trabalho. 7 Ênio Padilha, Engenheiro e especialista em Marketing na Arquitetura e Urbanismo, autor de diversos livros na área e do site www.eniopadilha.com.br 8 University of Phoenix. E-learning. www.elearning.com 9 WEBAULA. Cemig economiza mais de R$ 90 mil com o E-learning. 10 Webaula – Grupo Zargon. www.webaula.com.br O programa recebeu o Prêmio E-Learning Brasil 2002 / 2003 (ABRH) e “Referência Nacional em Inclusão Digital”. 11 Ambiente educacional Sebrae. http://educacao.sebrae.com.br/ 12 MIT E-learning. http://ocw.mit.edu/OcwWeb/index.htm 13 Portal E-learning - UNESCO. http://www.unesco.org/education/portal/e_learning/about.shtml 14 João Diniz – arquiteto e professor da FUMEC. www.joaodiniz.com.br 15 Projeto “Conservation Areas: The Management of Change”, elaborado e coordenado pelo Prof. Dr. Leonardo Castriota no Paul Getty Institute - LA/USA, em 2001. Leonardo Barci Castriota é atual Diretor da Escola de Arquitetura da UFMG e Presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil, Departamento Minas Gerais – IAB/MG. 16 MARIA, Rosa. Casa incentiva o Teletrabalho. 17 O Brasiltec 2003 consiste em uma mostra de tecnologia patrocinada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e pelo governo do Estado de São Paulo, com participação de universidades como a USP e de diversas empresas do setor. 18 DE MASI, Domenico. O ócio criativo. Pg. 198 19 DE MASI, Domenico. O ócio criativo. Pg. 209 20 LEMOS, Carlos. O que é Patrimônio? Pg. 28