Nota Prévia
Este documento foi elaborado pela ex-Alta Autoridade para a Comunicação Social
(AACS) e apresentado no dia 27 de Novembro de 2003
em cerimónia pública, tendo sido subscrito por diversos órgãos de comunicação
social (imprensa, rádio e televisão)
DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS
E ACORDO DE ÓRGÃOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
RELATIVO À COBERTURA DE PROCESSOS JUDICIAIS
27 de Novembro de 2003
Considerando o direito dos órgãos de comunicação social de informar;
Considerando o direito de todos e de cada um dos cidadãos de se informar e de ser
informados;
Considerando o direito de acesso às fontes de informação por parte dos jornalistas:
Considerando a importância da protecção das fontes de informação dos jornalistas;
Considerando a liberdade de imprensa e meios de comunicação social;
Considerando as funções dos media no esclarecimento da opinião pública, entendido
como condição fulcral para a existência de uma sociedade democrática e aberta;
Sublinhando que, para além da especificidade das funções das autoridades judiciais e
da especificidade da função dos media, a Justiça e a Comunicação Social convergem
no apuramento de factos;
Sublinhando que, durante a fase instrutória e/ou durante a fase de julgamento de
alguns processos, tal objectivo é prejudicado, e em alguns casos gravemente
comprometido, por eventuais excessos de opacidade que objectivamente abrem
caminho a indesejáveis imprecisões e especulações, bem como a redutoras versões
mais ou menos tacticamente interessadas;
E entrando em linha de conta com a legislação aplicável e designadamente com a
"Recomendação do Comité de Ministros aos Estados-Membros quanto à informação
veiculada através dos órgãos de comunicação social relativamente a processos
penais", adoptada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa em 10.07.03;
Os directores, directores editoriais e directores de informação dos órgãos de
comunicação social signatários da presente Definição de Princípios e Acordo;
naturalmente,
Reconhecendo que os direitos de informar, de se informar e de ser informado têm
limites constitucionais e legais que salvaguardam outros direitos, liberdades e
garantias fundamentais;
Reconhecendo a indispensabilidade da compatibilização responsável entre as
liberdades de expressão e de informação e outros direitos humanos;
Reconhecendo a dignidade e a independência dos Tribunais, estruturantes de
sociedades abertas e democráticas;
Reconhecendo o valor das regras processuais de facto indispensáveis ao apuramento
da verdade;
Reconhecendo que o sistema judicial, por célere que seja, está obrigado - em função
de regras processuais, algumas acauteladoras de liberdades essenciais e direitos
humanos - a um tempo próprio, a uma sucessão de tempos próprios, que
naturalmente não coincidem com o tempo dos media.
Reconhecendo os limites legais de intervenção pública dos juízes e dos magistrados
do Ministério Público relativamente aos processos de que se ocupam;
Consideram oportuno e fundamental declarar:
1. Que, naturalmente, actuam e actuarão segundo o seu compromisso legal,
profissional e ético do mais estrito rigor informativo;
2. Que investigam, divulgam e comentam, mas não acusam, não julgam, não
condenam, designadamente não põem em causa o direito à presunção de inocência;
3. Que respeitam os direitos individuais dos arguidos nos processos, e de quantos
deles são referidos, nomeadamente testemunhas, e especialmente as mais
vulneráveis, nas diversas fases dos processos;
4. Que lhes devem, de facto, ser reconhecidas como funções essenciais a procura da
informação e o acto informar, na investigação, no relato rigoroso dos factos, no
comentário responsável e livre, sobretudo estando em causa informação de interesse
público;
5. Que lhes deve de facto ser reconhecido o desempenho do escrutínio ao
funcionamento do sistema de justiça penal, vantajoso no plano sócio-cultural e no
plano da transparência do poder judicial;
6. Que esperam que o segredo de justiça projecte apenas um critério estritamente
indispensável ao desempenho da Justiça e à defesa de direitos humanos, e não se
traduza, em alguns casos, em desnecessárias opacidades, objectivamente
comprometendo os direitos de informar, de se informar, de ser informado e
contribuindo para a imprecisão, a suposição, a especulação, a falta de rigor;
7. Que devem ter acesso às informações possíveis por parte das autoridades judiciais
e dos serviços policiais, entrando em linha de conta
- com a legítima diferença, capacidade de iniciativa, o critério de investigação
jornalística de cada um dos órgãos de comunicação social;
- mas também com a indispensabilidade de uma relação objectivamente não
selectiva e não discriminatória;
- conjugando o fornecimento dos dados possíveis a solicitação de órgãos de
comunicação social com uma relação mais indiferenciada, nomeadamente através de
comunicados, conferências de imprensa e outros meios;
8. Que consideram essencial a criação de condições para a acessibilidade às
audiências públicas dos julgamentos, em especial os de manifesto interesse público,
assegurando os signatários todo o seu contributo para evitar designadamente riscos
de influência indevida sobre partes envolvidas;
9. Que reputam da maior importância e premência o desenvolvimento da relação
entre o sistema judicial e a Comunicação Social, no sentido de aperfeiçoar os
conhecimentos dos jornalistas sobre o quadro legal-regulamentar e os procedimentos
da Justiça, bem como no sentido de esclarecer os agentes da Justiça sobre as
práticas e os desenvolvimentos dos media;
10. Que entendem a presente iniciativa como contributo para o referido
desenvolvimento dessa relação, naturalmente no quadro da independência e respeito
mútuos.
As consequências deste Acordo/Declaração de Princípios - documento alcançado com
a contribuição da Alta Autoridade para a Comunicação Social - serão posteriormente
ponderadas por este órgão.
Este documento poderá ser subscrito por todos directores, directores editoriais e
directores de informação que se reconheçam nos princípios nele enunciados.
Lisboa, 27 de Novembro de 2003
O Presidente da AACS
Armando Torres Paulo
Juiz Conselheiro
_________________________________________
COMUNICADO
A ALTA AUTORIDADE PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL
E O ACORDO RELATIVO À COBERTURA
DE PROCESSOS JUDICIAIS
14 de Janeiro de 2004
A Alta Autoridade para a Comunicação Social está a proceder à ponderação das
consequências da Declaração de Princípios e Acordo de Órgãos de Comunicação Social
Relativo à Cobertura de Processos Judiciais, conforme as responsabilidades que lhe
foram confiadas por directores de jornais diários e semanários, directores de
informação das emissoras de rádio de âmbito nacional e directores de informação de
todos os canais de televisão.
A Alta Autoridade para a Comunicação Social verifica que desde a assinatura da
Declaração, em 27 de Novembro de 2003, os órgãos de informação estão a actuar
com mais rigor informativo, mais respeito pela direito à presunção de inocência e
mais respeito pelos direitos individuais dos arguidos e das testemunhas.
Nomeadamente na cobertura dos processos por pedofilia. É certo que ainda
continuam a ocorrer violações de normas legais e de preceitos deontológicos, é certo
que nem sempre houve a reserva e a ponderação que as circunstâncias impunham.
Mas boa parte dos órgãos de comunicação social empenhou-se no cumprimento dos
compromissos assumidos.
Não obstante, a Alta Autoridade para a Comunicação Social não pode deixar de
assinalar que a cobertura jornalística dos processos por pedofilia está
frequentemente confinada à divulgação de fugas de informação com origem nos
operadores judiciários, raramente por indiscrição, quase sempre por cálculo. Visa-se
normalmente, reduzir os órgãos de comunicação social e os jornalistas a caixas de
ressonância dos interesses da acusação e da defesa, meras correias de transmissão
para manipulação da opinião pública.
Ao longo dos últimos dias, surgiram inquietantes apelos ao agravamento das
restrições ao direito de informar, pronunciamentos contra o sigilo profissional dos
jornalistas, contra as críticas ao funcionamento do sistema judiciário e contra a
divulgação de violações do segredo de justiça. Na esteira de Recomendações e
Declarações do Conselho da Europa e de sentenças do Tribunal Europeu dos Direitos
do Homem, a Alta Autoridade para a Comunicação Social afirma que “a protecção das
fontes jornalísticas é uma das pedras angulares da liberdade de imprensa”.
Considera que incumbe à imprensa, à rádio e à televisão “comunicar informações e
ideias sobre todas as questões de interesse geral, incluindo aquelas que dizem
respeito ao funcionamento do poder judicial”. Assinala que o Tribunal Europeu
considera que “viola um princípio essencial da liberdade de expressão” a condenação
de jornalistas, como cúmplices, receptadores ou detentores de documentos obtidos
ilegalmente, por terem publicado informações em segredo de justiça ou em segredo
fiscal, “uma vez que os referidos documentos constituem a condição e a fonte da
informação divulgada”.
Inquieta, igualmente, que se preconizem alterações ao Código Penal e ao Código do
Processo Penal com vista a punir mais expeditamente e com maior vigor os
jornalistas e as empresas jornalísticas e que não se promova a fixação na lei de
propostas que visam assegurar uma informação mais isenta e mais qualificada ou
prevenir violações da lei.
A Alta Autoridade para a Comunicação Social alerta para os riscos de intervenções
conjunturais. Considera que o quadro legislativo vigente basta para sancionar,
designadamente em sede judiciária, violações de normas constitucionais e legais por
órgãos de comunicação social. Mas não rejeita, obviamente, aperfeiçoamentos dos
textos jurídicos existentes. Desde que seja “garantido a todos o direito a uma
informação objectiva”, direito proclamado pelo Papa João XXIII na encíclica Pacem in
Terris, e desde que seja mantido o lugar fulcral da liberdade de imprensa no regime
democrático.
Esta deliberação foi aprovada por maioria com votos a favor de Carlos Veiga Pereira
(Relator), Armando Torres Paulo, Artur Portela, Sebastião Lima Rego, José
Garibaldi, João Amaral, Manuela Matos e José Manuel Mendes e abstenção de Maria
de Lurdes Monteiro.
Alta Autoridade para a Comunicação Social,
14 de Janeiro de 2004
O Vice-Presidente
José Garibaldi
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COMUNICADO
de
15 de Janeiro de 2004
A Alta Autoridade para a Comunicação Social, reunida em plenário em 14 de Janeiro
de 2004, aprovou a seguinte deliberação:
DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS E ACORDO DE ÓRGÃOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
RELATIVO À COBERTURA DE PROCESSOS JUDICIAIS
Na sequência da apresentação pública da Declaração de Princípios e Acordo de
Órgãos de Comunicação Social Relativo à Cobertura de Processos Judiciais realizada a
27 de Novembro de 2003, na Assembleia da República – e dado que vários órgãos da
comunicação social não presentes na ocasião aderiram, posteriormente, aos
princípios nela consagrados – a Alta Autoridade para a Comunicação Social considera
oportuno publicar a relação completa dos órgãos de comunicação social que, até à
data, já subscreveram a referida Declaração:
A Capital, Correio da Manhã, Diário de Coimbra, Expresso, Jornal de Notícias,
NTV, O Independente, O Primeiro de Janeiro, Público, Rádio Comercial, Rádio
Renascença, RDP, RTP, Semanário, SIC, SIC Notícias, Tal & Qual, TSF, TVI, 24
Horas e Visão.
Alta Autoridade para a Comunicação Social,
15 de Janeiro de 2004
O Presidente
Armando Torres Paulo
Juiz Conselheiro
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Nota Prévia Este documento foi elaborado pela ex-Alta