PLÁGIO (I)
…«Estava-se perante a consagração dos valores», por que se havia batido a sociedade
– herdeira da radicalização de posições – e conseguido a «pacificação geral, a
segurança colectiva, a prosperidade, o respeito das fronteiras, a soberania das nações,
a liberdade do indivíduo».
Sociedade «cristã, devotada à disponibilidade de espírito, cultora da lei e da boa
administração, praticante de governo representativo, de nacionalismo temperado e de
liberalismo patriota, contra o devaneio gratuito e especulativo».
Mas trinta e quatro anos depois do culto da moral e da justiça, aquela sociedade
«naufraga, e as dúvidas voltam aos espíritos». Da grande anarquia daqueles trinta e
quatro anos, «resultam a paralisia» da actividade económica, «a ruína da agricultura, a
estagnação industrial, o desemprego. Da crise económica e social», a actual sociedade
«é conduzida à crise política. Esta põe em causa as instituições ditas democráticas e
parlamentares. Surge a agitação, alastra a miséria, espalha-se o caos. Há um colapso
de confiança. Há uma crise de consciência. Desintegra-se a classe média, desnorteia-se
a alta burguesia: o decadentismo corrói todos os valores. Desvanece-se o espírito
daquela outra sociedade», e a actual «vê enfraquecer o seu prestígio».
A sociedade de outrora «pessoa de bem, humanitária, altruísta e paternal, é batida em
brecha», pelo «ímpeto dos partidos comunistas. Organizam-se as quintas colunas,
lançam-se movimentos sindicalistas de combate e» destruidores. «Por toda a parte o
comunismo de inspiração russa apresenta-se aos homens como arauto exclusivo da
justiça social, único paladino dos oprimidos, promotor singular do desenvolvimento
rápido. É um novo messianismo, em nome da unidade invocada para ligar as “vítimas”
da burguesia e do capitalismo.
E por toda a parte é estimulada a criação de partidos ou movimentos» revolucionários.
«Todos têm em comum um ponto central: destruir aquela sociedade moderada, desfazer
o espírito» nacional, «derrubar aquela sociedade do apaziguamento e da conciliação».
Desponta uma sociedade «radical, amarga, aguda, intolerante». Esta resulta dos novos
ventos que «despontam, mas é também consequência do idealismo ingénuo de quantos
acreditaram poder confiar», a estranhos e traidores, «a regulamentação» da sua própria
vida.
Mas ao fim de trinta e quatro anos, a actual sociedade, decidiu «inspirar-se nos valores
tradicionais», tentando «restaurar a autoridade», mas mantendo teimosa e
deliberadamente o «Estado parlamentarista», patente na «sua orgânica, na sua
actuação política, nas suas manifestações exteriores», criando tiques de totalitarismo
inadequados, antiquados, importando estrangeirismos.
E esta sociedade «vê-se forçada a publicar legislação» com conteúdos «extremistas de
sinais opostos» à sua própria confissão. Surgem políticos «de aventura». A grande
oposição, “oculta”, actua na clandestinidade, enquanto que, «outros grupos, de restrita
base popular, contribuem para o caos e para o terror. E esta atmosfera de
afrontamento retrata-se» na população. «As comunidades nacionais aparecem
dilaceradas por forças políticas que alvejam sem tréguas a sociedade, pessoa de bem,
originalmente «pacífica e liberal, povoada pelos espíritos de boa vontade».
«Em face de encruzilhada ideológica, os homens de inteligência e de sensibilidade
reflectem a angústia» consentida, «e as suas» urgentes «criações são procuradas com
avidez por corresponderem a um ânimo que se generaliza nas massas. Forma-se uma
cultura de crise. Ressuscita-se o quadro da» primeira república, «desenha-se a
desintegração das classes média e baixa, é a queda de uma civilização corroída»;
surgem «os dramas individuais e colectivos, e» desmascaram-se «os desenganos
ideológicos». Percebe-se «que as civilizações nascem e morrem». Assiste-se «à
violência nas ruas, à desordem na sociedade. À decadência das instituições, à
perplexidade dos espíritos. Todos de súbito se recordam de que» passaram quarenta
anos sobre os bons costumes, «e reparavam que a poesia, com a sua capacidade
divinatória» conduzia todo um povo à perda dos valores morais e materiais.
«Desprestigiadas as instituições» pretensiosamente «democráticas», em toda a Nação,
envelhecida e desaparecida «a geração» dos bons costumes, «que haviam implantado a
paz indivisível e a segurança colectiva, permitiu a sociedade ser sacudida por espíritos,
por crises económicas e sociais». Tornaram-se «os governos incapacitados para
resolverem as tensões no seio da comunidade e entre esta, o debate solta-se das
coordenadas, para se fixar na» ilusão e na anarquia.
«Desaparece a unidade» doutrinária de outrora «quanto à estrutura e conteúdo do
Estado», favorecendo «o padrão comum de valores ruinosos».
A sociedade «dilacere-se entre os fogos dos totalitarismos!»
«São-lhe sugeridos vários futuros e todos se excluem!»
A memória de um povo é a sua História:
«Sob o ponto de vista nacional, não são só as despesas públicas que se torna
necessário reduzir, mas as despesas privadas, e pouco importaria mesmo retirar
despesas ao Estado para as pôr em quantitativo igual a cargo dos particulares: a
economia nacional pagá-las-ia igualmente…»
João Gomes
2008-12-28
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