Resultados preliminares
do Campo Experimental
de Mirtilos
da Estação Agrária de Viseu
RESULTADOS PRELIMINARES DO CAMPO EXPERIMENTAL
DE MIRTILOS
DA ESTAÇÃO AGRÁRIA DE VISEU
Sérgio Martins, Arminda Lopes e Margarida Lopes
[email protected],
[email protected]
[email protected]
Viseu, 2015
2
Figura 1- Campo experimental de mirtilos na Estação Agrária de Viseu.
A forte adesão à cultura do mirtilo, na região centro do país, e a necessidade de dar
resposta aos potenciais investidores, motivaram a instalação de um campo
experimental (figura 1) na Estação Agrária de Viseu (EAV), organismo da Direção
Regional de Agricultura e Pescas do Centro (DRAPCentro).
Pretende-se, com este campo, fazer uma caracterização da adaptabilidade das
diferentes cultivares às condições edafoclimáticas locais, através do estudo de
diferentes aspectos agronómicos como a fenologia, o rendimento, a qualidade do fruto
(ºbrix, acidez total, dureza, compostos fenólicos, calibre e textura), o escalamento da
produção e as necessidades hídricas da cultura. Adicionalmente, a existência desta
infraestrutura, tem permitido a realização de um conjunto de ações de
divulgação/formação junto dos agricultores, como a demonstração da instalação da
cultura, da poda e ainda a monitorização de pragas e outras visitas à exploração que se
destinam a dar a conhecer a cultura e a esclarecer e formar produtores.
O campo foi instalado em 23 de novembro de 2012, num solo franco arenoso, com
teores de matéria orgânica de 2,0%, sistematizado em camalhões, cobertos por uma
tela, com um compasso de plantação de 2,7*1,0m, a uma altitude de 450m.
3
Um dos parâmetros mais importantes para a cultura do mirtilo é a necessidade de horas
de frio. Como se pode ver na Tabela 1, que contem os registos dos últimos 4 anos, na
região de Viseu, este fator não é limitante.
Tabela I- Número de horas de frio, calculado com base no modelo de Crossa-Raynaud
Ano
Nº Horas de frio
2011/2012
2012/2013
2013/2014
2014/2015
1100
965
1004
1074
Foram plantadas 18 plantas de cada cultivar divididas em 3 grupos: Northern Highbush
- NHB (Duke, Bluecrop, Bluegold, Huron, Chandler, Draper, Legacy, Liberty, Elliot e
Aurora), Southern Highbush - SHB (Sharpblue, O’Neal, Star, Biloxi, Misty, Suziblue, Rebel
e Camellia) e Rabbiteye – Rb (Ochlockonee, Powderblue. Imediatamente após a
plantação optou se pela eliminação dos órgãos frutíferos de todas as plantas (Figura 2).
Figura 2 - Intervenção em verde, feita dois meses após a instalação do campo.
No ciclo produtivo de 2013/2014 foram avaliados os parâmetros agronómicos de
fenologia, rendimento, qualidade do fruto e água no solo. Apresentamos, de seguida, os
principais resultados e conclusões preliminares.
4
Esta operação implicou que em 2013 não existissem dados de produção. Em 2014
repetiu-se esta intervenção na totalidade das plantas da cultivar Aurora e parcialmente
nas cultivares Bluecrop, Huron, Legacy, em que foram deixados os órgãos frutíferos em
apenas três plantas, garantindo desta forma a caracterização da fenologia, mas não a
caracterização do ciclo produtivo. Esta estratégia, foi tomada com base na experiência de
colegas da Austurian berrys, que preconizam que as plantas apenas devem produzir ao
terceiro ciclo, garantindo, desta forma, um maior desenvolvimento do sistema radicular.
Caracterização da fenologia
Os dados da fenologia estão resumidos na tabela II onde são apresentadas as datas em
que cada cultivar atingiu os estádios de ponta verde (C), floração (F2) e maturação (K).
Tabela II – Fenologia das diferentes cultivares no ciclo produtivo 2014.
Ponta verde (C)
Floração (F2)
Maturação (K)
Powderblue
18 abril
28 julho
Ochlockonee
25 abril
4 agosto
Sharpblue
8 abril
24 junho
8 abril
24 junho
Star
3 abril
17 junho
Biloxi
3 abril
24 junho
Misty
28 março
17 junho
O’Neal
4 março
Suziblue
12 fevereiro
3 abril
17 junho
Rebel
12 fevereiro
26 março
17 junho
Camllia
12 fevereiro
8 abril
7 junho
Duke
18 março
18 abril
15 junho
Bluecrop
7 março
18 abril
27 junho
Bluegold
7 março
15 abril
19 junho
Huron
28 fevereiro
11 abril
17 junho
Chandler
25 fevereiro
15 abril
1 julho
Draper
7 março
15 abril
19 junho
Legacy
25 fevereiro
11 abril
27 junho
Liberty
20 março
25 abril
22 julho
Elliot
18 março
25 abril
28 julho
-
-
-
Aurora
5
Apesar das variedades do sul, de um modo geral, atingirem a floração, uma semana mais
cedo que as cultivares de norte, este facto, não se traduziu em grandes diferenças na
data de maturação. Uma possível justificação poderá estar nas baixas temperaturas
médias, próximas dos 15ºC, que se fizeram sentir, na segunda quinzena de maio e junho
(Figura 3).
Figura 3 – Valores médios das temperaturas máximas, mínimas e média durante o ciclo vegetativo.
Salienta-se ainda o facto de a cultivar Elliot ter entrado em maturação em 28 de julho,
o que julgamos ser precoce, de acordo com o que está descrito para esta cultivar. Este
comportamento/tendência, caso se venha a manter em ciclos futuros, vem confirmar a
necessidade de estudar o comportamento das cultivares, nos diferentes microclimas. A
instalação desta cultivar, bem como da Aurora, visava o prolongamento do ciclo
produtivo até finais de agosto-princípios de setembro, período este em que se verifica
um aumento substancial do preço pago por quilograma.
Paralelamente, durante o ano de 2014 foi feito o acompanhamento da fenologia da
cultivar Duke, em simultâneo com outras regiões do país numa parceria com a
Universidade do Porto e o INIAV. Neste projeto os dados colhidos em cada campo são
inseridos numa plataforma digital global a que todos os operadores têm acesso. O
sucesso desta iniciativa para a caracterização da fenologia desta cultivar, no ano de
2014, impulsionou o seu alargamento às cultivares Ochlockonee e Centrablue.
6
Uma vez que a cultura do mirtilo é cada vez mais popular, a nível nacional, parece-nos
que este trabalho tem extrema importância na geração de conhecimento de suporte a
decisões aquando da instalação de novos campos, constituindo assim uma ferramenta
de apoio aos investidores nesta área.
Caracterização do ciclo produtivo
O acompanhamento dos vários estados fenológicos permite, de forma mais global,
caracterizar o ciclo produtivo. Esta caracterização constitui uma ferramenta de elevada
utilidade, aquando da decisão das cultivares a instalar em novos campos, tendo em
conta a época de produção pretendida.
Os resultados integrados da caracterização do ciclo produtivo são apresentados na
figura 4. As cultivares NHB garantiram uma produção que não foi além da terceira
semana de agosto (Liberty e Elliot). Nas Rabbiteye foi possível colher frutos por um
período mais alargado (até finais de agosto). Estes resultados têm de ser analisados de
forma integrada com os dados de procura deste fruto no mercado, de forma a que os
produtores possam adequar a escolha das cultivares a instalar, com a máxima
valorização do fruto.
a) frutos comidos pelos pássaros b) remoção total de órgãos frutíferos, na poda
Figura 4 - Caraterização do ciclo produtivo.
7
Relativamente às cultivares SHB (Camellia, Sharpblue, O’Neal, Biloxi e Rebel), não foi
possível fazer esta caraterização pois, no fim de semana de 7-8 de junho, o campo foi
sujeito a uma elevado ataque de melros e estorninhos, que consumiram grande
quantidade da fruta que se encontrava muito próximo da data de colheita.
Imediatamente após este incidente, recorremos à aplicação de uma estrutura
rudimentar móvel (Figura 5), que nos permitiu fazer a caracterização da produção das
restantes cultivares. Atualmente o campo, já tem uma rede antipássaro fixa.
Figura 5 – Estrutura antipássaro móvel.
Produtividade
Apresentamos, na figura 6, os resultados da produtividade do campo da EAV. As
cultivares mais produtivas foram a Duke e a Occhlockonee, que atingiram valores
próximos dos 2,7ton/ha. É de salientar que estes valores refletem apenas um ciclo de
produção completo, num ano em que a plantação ainda não atingiu o seu potencial
produtivo máximo.
8
3000
2500
kg/ha
2000
1500
1000
500
Aurora
Elliot
Liberty
Legacy
Draper
Chandler
Huron
Bluegold
Bluecrop
Duke
Camélia
Rebel
Suziblue
Misty
Biloxi
Star
Oneal
Sharpblue
Ochlockonee
Powder Blue
0
Figura 6 – Produção por hectare no 2º ano após a plantação
No que se refere ao peso médio do fruto, . verifica-se que o peso do fruto variou entre
1,7 e 3,3g, nas cultivares Huron e Chandler respetivamente (Figura 7). Estes valores
parecem-nos bastante interessantes pois, segundo a bibliografia consultada, o peso
médio do fruto, considerando um conjunto de cultivares, é inferior 1,77g (Sousa, 2007).
4
3,5
3
2
1,5
1
0,5
Figura 7 - Peso médio do fruto por cultivar.
9
Aurora
Elliot
Liberty
Legacy
Draper
Chandler
Huron
Bluegold
Bluecrop
Duke
Camélia
Rebel
Suziblue
Misty
Biloxi
Star
Oneal
Sharpblue
Ochlockonee
0
Powder Blue
peso (g)
2,5
Parâmetros de qualidade do fruto
Textura do fruto
Para a determinação deste parâmetro, que reflete a dureza/firmeza do fruto, recorreuse a um texturómetro (TA.XT plus, Texture Analizer Stable Micro-Systems Lda., Surrey,
UK) que quantifica a força, expressa em Newtons, necessária para para perfurar a baga.
A textura dos frutos depende da cultivar, assim, a Suziblue, uma SHB, foi a que
apresentou os valores de dureza mais elevados, atingindo 2,47N (Figura 8). A cultivar
NHB, Chandler, foi a que apresentou valores inferiores (1,4N). Estes valores estão aquém
do que é apontado por trabalhos similares que referem valores de 3,3N (Giongo et al,
2013).
3
2
1,5
1
0,5
Figura 8 – Firmeza dos frutos (N) em cada cultivar estudada.
10
A urora
E lliot
L ibe rty
L e g a cy
D ra pe r
C ha ndle r
H uron
B lue g old
B lue c rop
D uke
C a mé lia
R e be l
S uz iblue
Mis ty
B iloxi
S ta r
O ne a l
S ha rpblue
O c hloc kone e
0
P owde r B lue
F irmez a (N)
2,5
Além da firmeza a qualidade do fruto é também determinada pelo teor de açúcares, e
pela acidez titulável cujos resultados são apresentados nas figuras 9 e 10
respetivamente. De todas as cultivares estudadas, foi a Rabbiteye, Powderblue, que
apresentou valores de grau brix superiores (16oBrix), sendo a cultivar NHB Bluegold a
que se revelou menos doce (12 oBrix). Estes resultados estão de acordo com o trabalho
realizado por Sousa (2007), que refere um intervalo de variação entre 11 e 16oBrix.
18
º B rix
16
14
12
10
8
6
A urora
E lliot
L ibe rty
L e g a cy
D ra pe r
C ha ndle r
H uron
B lue g old
B lue c rop
D uke
C a mé lia
R e be l
S uz iblue
Mis ty
B iloxi
S ta r
O ne a l
S ha rpblue
O chlockone e
P owde r B lue
4
2
0
Figura 9 – Compostos solúveis (oBrix) por cultivar.
Quanto aos resultados de acidez titulável, a cultivar Rabbiteye Ochlockonee, foi a que
apresentou valores superiores (0,9%). Estes resultados estão de acordo, com a avaliação
sensorial, pois apesar de apresentar valores de açúcares elevados, trata-se de uma
cultivar desequilibrada na boca, marcadamente ácida. O valor médio obtido, para as
cultivares NHB foi de 0,52%, o que está aquém do mencionado por Skrede et al (2011),
que apontam média de acidez titulável 0,73% (ácido málico).
11
1,2
Á c . málic o (g/l)
1
0,8
0,6
0,4
0,2
A urora
E lliot
L ibe rty
L e g a cy
D ra pe r
C ha ndle r
H uron
B lue g old
B lue crop
D uke
C a mé lia
R e be l
S uz iblue
Mis ty
B iloxi
S ta r
O ne a l
S ha rpblue
O c hloc kone e
P owde r B lue
0
Figura 10 - Acidez titulável (% ácido málico) por cultivar.
Monitorização do teor de água no solo
Um dos fatores mais limitantes na cultura do mirtilo é a disponibilidade de água,
sobretudo no pico do verão. No sentido de conhecer o comportamento da água no solo
instalaram-se, em março de 2014, três tubos de PVC, com 160cm de profundidade
(Figura 11), em três cultivares (Duke, Aurora e Camellia). Com este dispositivo foi
possível avaliar a evolução do teor de humidade recorrendo a uma sonda capacitiva
portátil, modelo Diviner 2000, que fornece medições de 10 em 10 cm. Apesar de termos
colocado os tubos a uma profundidade de 160cm, apresentamos apenas o
comportamento do teor de humidade nos primeiros 50cm, pois segundo Bryla (2011), a
maioria do sistema radicular do mirtilo encontra-se situado a este nível.
12
Figura 11 – Dispositivo experimental usado para medir o comportamento da água no solo.
Os resultados desta análise são apresentados na figura 12 onde podemos verificar um
aumento do teor de água no solo, quer após o fornecimento de água pela rega, quer
pela ocorrência de precipitação. Apesar do padrão de evolução ser comum, a
capacidade de armazenamento do solo é diferente, verifica-se que o solo onde está a
Camellia, apresenta valores de humidade inferiores às outras, transmitindo a ideia de
que, esta cultivar, terá maiores necessidades hídricas. Estes resultados são de extrema
importância para definir as dotações de rega por cultivar. No futuro, esta avaliação,
associada à determinação de potenciais hídricos mínimos e de base nas plantas, poderá
ajudar a compreender as necessidades hídricas da cultura, permitindo desta forma uma
gestão racional da água.
Figura 12 - Comparação da evolução do armazenamento de água no solo nas 3 cultivares na profundidade 0-50cm
13
Considerações finais
Apesar dos resultados apresentados serem preliminares são indicadores de algumas
tendências confirmadas por outros autores noutras regiões mas também reveladores
de possíveis alterações no desempenho das cultivares que podem ser devidas a efeitos
locais. Só com o acumular de dados e a continuação da caracterização das cultivares
instaladas no campo da EAV será possível confirmar se estes resultados mantêm o
mesmo padrão ao longo dos anos. Em 2015 será possível recolher informação das
restantes cultivares que não foram caracterizadas total ou parcialmente.
Estas conclusões, ainda que preliminares, são de fundamental importância no
estabelecimento da base de conhecimento que permitirá, a breve prazo, fazer o
aconselhamento aos produtores e investidores baseados em resultados adaptados à
região.
Agradecimentos: Doutor Pedro Brás de Oliveira, do INIAV; Professor Pedro Rodrigues e
Professora Daniela Vasconcelos Teixeira da Escola Superior Agrária de Viseu
Bibliografia
Bryla (2011). Crop Evapotranspiration and Irrigation Scheduling in Blueberry. http://www.
Intechopen.com/books/evapotranspiration from measurements to agricultural and
environmental aplications, consultado em 20/4/2015.
GIONGO L., PONCETTA P., LORETTI, P. COSTA, F. (2013). Texture profiling of blueberries
(Vaccinium spp.) during fruit development, ripening and storage. Postharvest Biology
Technology. 76; 34-39.
SKREDE G., MARTINSEN BK., WOLD A., BIRKLAND S., AABY K., (2011). Variation in quality
parameters between and within 14 Nordic tree fruit and berry species. Acta Agriculturae
Scandinavica Section B – Soil and Plant Science: 1-16
SOUSA, M.B. (2007). Mirtilo – Qualidade Pós-Colheita. Portugal, Folhas de Divulgação AGRO 556
Nº 8, Instituto Nacional de Recursos Biológicos.
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Resultados preliminares do Campo Experimental de Mirtilos da