Radioatividade Por Marco César Prado Soares – Engenharia Química – Universidade Estadual de Campinas UNICAMP – 2013 Dados históricos: Descoberta por Henri Becquerel. Em 1903, Rutherford e Frederick Soddy propuseram que a radiação é resultado da transformação natural do isótopo de um elemento em um isótopo de outro elemento. Estes processos são denominados reações nucleares. Em uma reação nuclear, há variação no número atômico de um átomo, e frequentemente, variação do número de massa. Decaimentos radioativos Radiação α é composta por núcleos de hélio (He2+) e a radiação β é composta por elétrons (e-). Os danos causados pela radiação estão relacionados à energia absorvida. Um fóton de luz visível é emitido quando um átomo sofre uma transição de um estado eletrônico excitado para um de menor energia. A radiação gama origina-se de maneira bastante parecida, exceto pela ocorrência de transições entre níveis de energia nuclear. As reações nucleares frequentemente resultam na formação de um núcleo – produto em um estado nuclear excitado. A alta energia da radiação γ é uma medida da grande diferença de energia entre os níveis de energia nuclear. Em uma série de decaimento radioativo, o núcleo reagente é frequentemente chamado de pai, e, o produto, de filho. Outras formas de desintegração são a emissão de pósitron ( ) e a captura de elétron. Na emissão β, o elétron forma-se a partir de um nêutron: o que explica o aumento do número atômico. Na emissão de pósitron, o pósitron forma-se a partir de um próton: Pósitrons e elétrons têm a mesma massa e cargas opostas. O pósitron é o análogo de antimatéria do elétron. Quando se encontram, ocorre aniquilação mútua e liberação de radiação gama: Na captura de elétrons, um elétron extranuclear é capturado pelo núcleo. O número de massa não é alterado, e o número atômico diminui em uma unidade (na nomenclatura antiga, a camada eletrônica mais interna era chamada de camada K, e a captura de elétrons era chamada de captura K). Estes processos (emissão de partículas α e β, de pósitrons e captura de elétrons) são os chamados decaimentos radioativos, e são frequentemente acompanhados por radiação gama. 1 Estabilidade Isótopos estáveis encontram-se em um intervalo muito estreito, chamado de faixa de estabilidade. É admirável o pequeno número de isótopos estáveis. Somente 2 isótopos estáveis ( e ) têm mais prótons do que nêutrons. Até o Ca (Z = 20) os isótopos estáveis frequentemente apresentam quantidades iguais de prótons e de nêutrons ou somente um ou dois nêutrons a mais do que prótons. Acima do Ca, a razão nêutron-próton é sempre maior do que 1. Á medida que a massa aumenta, a faixa de isótopos estáveis desvia-se cada vez mais da reta N = Z, onde N é o número de nêutrons. Acima do Bi (83 prótons e 126 nêutrons) todos os isótopos são instáveis e radioativos. As meias-vidas de isótopos instáveis são mais curtas nos núcleos mais pesados. Os isótopos mais afastados da faixa de estabilidade têm meias-vidas mais curtas do que os isótopos instáveis mais próximos da faixa de estabilidade. Elementos com número atômico par têm, em geral, mais isótopos estáveis que os com número atômico ímpar. Há mais isótopos estáveis com número par de nêutrons do que com número ímpar. Somente 5 isótopos estáveis ( , , , e ) apresentam número ímpar tanto de prótons quanto de nêutrons. Núcleos instáveis decaem de modo a trazê-los a uma razão nêutron – próton estável: Todos os elementos acima do Bi (Z = 83) são instáveis. Para alcançar a faixa de estabilidade, é necessário um processo que diminua o número atômico. A emissão α é uma maneira eficaz de diminuir Z. A emissão β ocorre em isótopos com razão nêutron - próton alta, isto é, isótopos acima da faixa de estabilidade. Após o decaimento β, o número atômico aumenta em 1 unidade e o número de massa permanece constante, resultando em uma razão N/Z mais baixa. Isótopos com razão nêutron – próton baixa, abaixo da faixa de estabilidade, decaem por emissão de pósitron ou captura de elétron. Ambos os processos levam a núcleos com número atômico mais baixo e com o mesmo número de massa. Para que o núcleo seja estável, as forças de ligação nucleares (atrativas) devem ser mais intensas que as forças de repulsão eletrostática entre os prótons arranjados de forma compacta no núcleo. A energia de ligação nuclear, Eb, é definida como a energia necessária para separar o núcleo de um átomo em prótons e nêutrons. A observação experimental é que a massa de um núcleo é sempre menor que a soma das massas de seus prótons e nêutrons constituintes. A teoria é que a “massa que falta”, chamada de defeito de massa, é equivalente à energia que mantém as partículas nucleares unidas. A equação de Einstein exprime matematicamente esta relação: onde é o defeito de massa e c a velocidade da luz no vácuo. 2 Aspectos cinéticos A taxa de decaimento radioativo é determinada a partir das medidas de atividade (A) de uma amostra. A atividade refere-se ao número de desintegrações observadas por unidade de tempo, e é proporcional ao número de átomos (N) do elemento radioativo presentes. É medida em Bq (becquerel), dps (desintegração por segundo) e Ci (curie), principalmente. 1Bq = 1dps 1Ci = 3,7 x 1010 Bq sendo k a constante de desintegração radioativa (análogo a uma reação cuja cinética é de 1ª ordem). Por outro lado, a atividade é a taxa com que o número de átomos radioativos decresce com o tempo, ou seja: O tempo de meia-vida, , é definido como o tempo para que metade da amostra tenha se desintegrado. Neste caso, 3 e . Como , onde m é a massa da amostra, M é a massa atômica e éo número de Avogadro, Outra possibilidade é calcular o tempo t(f) para que uma fração f da amostra de material radioativo se desintegre. sendo N o total de átomos a sofrer desintegração e 4 a quantidade inicial. mas logo Em um instante qualquer, , o que significa que kN átomos se desintegram por segundo. Se esta taxa fosse mantida constante, o tempo τ que uma amostra levaria para desintegrar os átomos iniciais seria: este intervalo de tempo é definido como a vida-média: Outras reações nucleares Enrico Fermi e seus colaboradores demonstraram que as reações nucleares que envolvem bombardeamento por nêutrons são mais favoráveis se os nêutrons apresentam baixas energias. Um nêutron de baixa energia é simplesmente capturado pelo núcleo, formando um produto no qual o número de massa aumenta em apenas uma unidade. Por causa da baixa energia da partícula bombardeadora, o núcleo não apresenta energia suficiente para se fragmentar nestas reações. O novo núcleo é produzido em um estado excitado, e, quando retorna ao estado fundamental, raio γ é emitido. Reações em que um nêutron é capturado e raio γ é emitido são chamadas de reações (n, γ). Um aspecto importante das reações de fissão é que elas produzem mais nêutrons do que o necessário para iniciar o processo. Sob as circunstâncias corretas, esses nêutrons servem, então, para continuar a reação. Se um ou mais desses nêutrons 5 for capturado por outro átomo de isótopo fissionável, então outra reação pode ocorrer, liberando ainda mais nêutrons, e a sequência repete-se sucessivamente. Um mecanismo como este, em que cada etapa gera um reagente para continuar a reação, é chamado de reação em cadeia. Uma reação em cadeia de fissão nuclear possui 3 etapas gerais: Iniciação: a reação de um único átomo é necessária para iniciar a reação. A fissão de é iniciada pela absorção de um nêutron, formando , instável. Propagação: esta parte do processo repete-se indefinidamente, e cada etapa produz mais produtos. A fissão de libera nêutrons que iniciam a fissão de outros átomos de urânio. Terminação: no final, a reação em cadeia termina. Isto pode ocorrer se o reagente ( ) foi totalmente consumido, ou se os nêutrons responsáveis pela continuação da reação escaparem da amostra sem ser capturados pelo . A velocidade depende do número de nêutrons, de modo que a reação nuclear ocorra cada vez mais rápido à medida que mais e mais nêutrons são formados, levando a uma enorme liberação de energia em um curto intervalo de tempo. Em uma reação de fusão nuclear, vários núcleos pequenos reagem para formar um núcleo maior. Quantidades imensas de energia podem ser geradas por essas reações. Nas temperaturas extremamente altas necessárias para uma reação de fusão, a matéria não existe na forma de átomos e moléculas; em vez disso, a matéria encontra-se na forma de um plasma constituído de núcleos e elétrons não ligados. A maioria dos radioisótopos produzidos por fusão têm meias-vidas curtas. Diluição isotópica Neste processo, uma pequena quantidade de isótopo radioativo é injetada em um líquido de volume desconhecido, como a corrente sanguínea de uma pessoa. Aguarda-se um intervalo de tempo para permitir que o isótopo seja distribuído pelo corpo e retira-se uma amostra do líquido, cuja radioatividade é determinada. Exemplo 1: injeta-se um volume V0 de uma solução contendo um radioisótopo de meia-vida , e cuja atividade é A. Após um tempo t, retira-se uma amostra de sangue, de volume V2, e a atividade desta amostra é A2. Qual o volume de sangue? a concentração de átomos radioativos será 6 Se não houvesse havido diluição, após o tempo t, a atividade seria igual a , e a concentração seria . Como há diluição: onde V é o volume total de sangue como , é a concentração na amostra colhida, igual á concentração no volume total de sangue, e considerando muito menor que : é o volume total de sangue no corpo. A técnica é geral, pode-se medir, por exemplo, o volume de um lago; adicionando-se um aminoácido com atividade radioativa, pode-se determinar a quantidade original daquele aminoácido na proteína: É feita a hidrólise de uma massa de proteína e adicionada uma massa de aminoácido marcado com 14C, de atividade conhecida. Depois de misturar, é separada uma amostra do mesmo aminoácido; determina-se a atividade da amostra e encontra-se a quantidade inicial do aminoácido. Exemplo 2 (IME -2004): Suponha que se deseje estimar o volume de água de um pequeno lago. Para isso, dilui-se nesse lago VS litros de uma solução de um sal, sendo que a atividade radioativa dessa solução é As becquerel (Bq). Após decorridos D dias, tempo necessário para uma diluição homogênea da solução radioativa em todo o lago, é recolhida uma amostra de volume VA litros, com atividade AA Bq acima da atividade original da água do lago. Considerando essas informações e sabendo que a meia-vida do sal radioativo é , determine uma expressão para o cálculo do volume do lago nas seguintes situações: ae D são da mesma ordem de grandeza. b- é muito maior que D. No item “a”, a solução é idêntica ao exemplo feito para o sangue, se considerarse VS muito menor que V, de modo que: 7 No item “b”, , de modo que . Logo: Referências bibliográficas FELTRE, Ricardo. Química 2 – Físico-Química. 6ª edição. São Paulo: Moderna, 2004. KOTZ, John C.; TREICHEL, Paul M. Jr. Química Geral 2 e Reações Químicas. Tradução da 5ª edição americana. São Paulo: Cengage Learning, 2009. RAMALHO, Francisco; FERRARO, Nicolau Gilberto; SOARES, Paulo Antônio de Toledo. Os Fundamentos da Física 3. 9ª edição. São Paulo: Moderna, 2007. 8