A Falha do Ponsul – Um Exemplo da Integração de Dados sobre Estruturas Geológicas Activas num SIG de Sismotectónica Ponsul fault - An example of introduction of data on Active Geologic Structures on a GIS Seismotectonics database Costa, A. M. (a,1), Caranova, R. (b,2), Cabral, J.(b,3), Silva, S. (a,4), Laiginhas, C.(c,5) & Taborda R.(b,6) a – Bolseira do Projecto SISMOTECTO, LATTEX-IDL, Univ. de Lisboa; b – LATTEX-IDL, Univ. de Lisboa 1 - [email protected]; 2 - [email protected]; 3 – [email protected]; 4 – [email protected]; 5 - [email protected]; 6 - [email protected] SUMÁRIO A construção de uma base de dados actualizada sobre as estruturas tectónicas activas em Portugal Continental, e a sua integração num Sistema de Informação Geográfica (SIG), permite um acesso facilitado a toda a informação disponível sobre cada estrutura sismotectónica. A falha do Ponsul foi escolhida como exemplo devido ao volume de informação disponível para a base de dados. A sua segmentação e as estações descritas no campo permitem caracterizá-la mais detalhadamente. Palavras-chave: Neotectónica; Base de dados; SIG; Falha do Ponsul. SUMMARY The study and knowledge of the seismotectonic structures in the Portuguese Mainland, the construction of a database with the pertaining information and the full integration in a Geographic Information System (GIS) allows the access to all the data on the active structures. The Ponsul fault was chosen as an example due to the quantity and quality of the information available to introduce in the database. The fault segmentation and field data from selected sites allow a detailed characterization of the fault. Key-words: Neotectonics; Database; GIS; Ponsul fault. regional importante, marcada por alguns sismos históricos fortes e também por alguns eventos instrumentais importantes [5]; [6]; [7]. A presença de estruturas geológicas activas sismogénicas impõe uma perigosidade sísmica significativa, particularmente em algumas áreas com aglomerações populacionais e infraestruturas importantes, como as regiões do Algarve e de Lisboa, onde o risco pode ser, consequentemente, mais elevado. Assim, o conhecimento, tanto quanto possível exaustivo, das estruturas neotectónicas sismogénicas numa região caracterizada por taxas de actividade relativamente baixas, mas onde o potencial de ocorrência de sismos de magnitude elevada é evidenciado pela dimensão das deformações neotectónicas e pela própria sismicidade histórica, é, pois, essencial para a correcta avaliação da perigosidade sísmica regional. Introdução O território continental português encontra-se localizado na placa euroasiática, próximo da fronteira com a placa africana, e disposto ao longo da margem continental oeste-ibérica, provavelmente na transição de margem passiva para margem activa convergente [1]; [2]; [3]; [4]. Este enquadramento geodinâmico, é responsável por uma actividade tectónica regional importante ao longo do período Quaternário. A actividade tectónica quaternária (ocorrida aproximadamente nos últimos 2 milhões de anos Neotectónica) manifesta-se por deformações diversas, de que se destacam os movimentos em falhas activas [1]. Uma das principais consequências de movimentações actuais em falhas activas localizadas no território continental português e na área atlântica vizinha consiste na ocorrência de uma sismicidade 1097 Considerou-se importante definir em cada tabela parâmetros que possam ser utilizados para cálculos de perigosidade sísmica regional, como o potencial sismogénico, a taxa de actividade e o período de recorrência médio do sismo máximo expectável Para fazer face a esta realidade, foi proposto rever e actualizar a Carta de Neotectónica de Portugal Continental, publicada em 1988 [8], de modo a construir uma base de dados actualizada sobre as fontes sismogénicas (falhas activas) localizadas no Fig.1: Esquema de relações entre tabelas relativas às estruturas activas regionais. associado a cada segmento de uma falha. Define-se como potencial sismogénico de uma falha, o potencial sismogénico mais elevado de um segmento dessa falha. Assume-se o período de recorrência e a taxa de actividade da falha, como o período de recorrência e taxa de actividade do segmento da falha com potencial sismogénico mais elevado. A idealização das tabelas constituintes da base de dados e a sua interligação constituem uma etapa importante no desenvolvimento do Sistema de Informação Geográfica (SIG). território português e área atlântica adjacente. A informação sobre as estruturas tectónicas activas será adicionada a outra informação, nomeadamente sobre a actividade sísmica regional (arqueosismologia, sismicidade histórica e instrumental), o estado de tensão na litosfera, entre outra, de modo a construir uma base de dados de Sismotectónica. A construção e desenvolvimento da base de dados é efectuada em formato de Sistema de Informação Geográfica (SIG), permitindo o acesso a informação diversificada, e classificada, sobre as fontes sismogénicas e o rápido relacionamento entre dados, essencial para uma correcta avaliação da perigosidade sísmica regional. A estrutura tectónica escolhida para exemplificar o tratamento e inserção de dados sobre estruturas activas neste SIG, foi a falha do Ponsul por esta se encontrar bem constrangida no que respeita à sua caracterização neotectónica, existindo informação abundante e diversificada disponível na bibliografia. SIG Um SIG é uma ferramenta que permite correlacionar dados alfa-numéricos com dados geográficos criando mapas temáticos definidos de acordo com o tipo de informação, através de pesquisas realizadas na base de dados. Da análise espacial entre vários mapas resultam novos dados, com os quais é possível construir novos mapas temáticos. Num SIG de Sismotectónica é importante ter em conta, não só a caracterização das fontes sismogénicas e da actividade sísmica regional, como também a caracterização populacional desse local, de forma a ser possível avaliar o impacto em termos do risco sísmico. A base de dados do projecto SISMOTECTO está a ser desenvolvida em ArcGIS® (Software ESRI). Estão presentemente a ser desenvolvidos dois mapas temáticos: • Caracterização Administrativa; • Neotectónica/Falhas Activas. recorrendo ao Sistema de Coordenadas HayfordGauss, Datum 73. Para a caracterização administrativa de Portugal Continental utilizou-se a CAOP de 2003 (Carta Administrativa Oficial de Portugal) do Instituto Geográfico Português (IGeo), com os limites Base de Dados Uma base de dados é constituída por um conjunto de tabelas interrelacionadas, que permitem integrar todos os dados disponíveis e correlacioná-los entre si, para que seja minimizada a sua redundância. A base de dados, construída em Access, é constituída por tabelas referentes às próprias estruturas activas, cada uma das quais ligada a uma parte gráfica (SIG). Na construção da base de dados, concebe-se um conjunto de tabelas correlacionadas entre si, que no seu todo permitem o acesso a uma informação generalizada sobre vários parâmetros de cada estrutura activa. Existem três tabelas principais: falhas, segmentos e estações, relacionadas entre si, e relacionadas com uma tabela de referências bibliográficas (figura 1). 1098 administrativos dos Distritos, dos Concelhos e das Freguesias, às quais foram acrescentados dados populacionais retirados dos CENSOS 2001 Instituto Nacional de Estatística (INE). O tratamento destes dados permite construir um mapa temático de densidade populacional. O Mapa de Falhas Activas está a ser desenvolvido com base na informação da Carta Neotectónica de Portugal Continental na escala 1/1.000.000 [8], e da Carta Geológica de Portugal na escala 1/500.000 [9] INETI, utilizando-se o Modelo Digital de Terreno para o Continente (MDT-200m, IGeo), como base topográfica. Aquela informação é actualizada exaustivamente com base em informação bibliográfica posterior sobre cada estrutura geológica activa, e em informação inédita dos autores, adquirida em estudos de campo. A definição dos metadados para cada tipo de dados é um passo essencial, que permite ao utilizador garantir e verificar a qualidade dos dados. A falha do Ponsul é um importante acidente tectónico, localizado perto de Castelo Branco (figura 2). Tem um comprimento total de 120 Km em Portugal e Espanha (85 Km em Portugal) e uma orientação geral N60ºE [10]. A falha do Ponsul corresponde a um desligamento esquerdo tardivarisco, reactivado na Orogenia Alpina, limitando a norte a bacia cenozóica Moraleja-Rodão, onde ficaram preservados sedimentos continentais [10]. A reactivação póspaleozóica da falha é evidenciada por dados geomorfológicos, estratigráficos e estruturais. A movimentação no acidente é testemunhada em contactos por falha, com o soco, a norte, a cavalgar os depósitos cenozóicos, a sul [10]. Em alguns locais foram encontradas evidências de uma reactivação provável no Quaternário, predominantemente de falha inversa, com um deslocamento vertical acumulado de cerca de 100 m [10]. Com base num modelo de segmentação fundamentado na geometria da zona de falha e na velocidade média de deslizamento calculada, estimou-se o sismo máximo mais provável que ela pode gerar, de magnitude compreendida entre 6,75 e 7,25, com um intervalo de recorrência médio de 9000 a 30000 anos, consoante a taxa de movimentação considerada (0,1 mm/ano ou 0,03 mm/ano, respectivamente) [10]. A caracterização da falha do Ponsul foi feita de forma sucinta na base de dados, tendo em conta os dados necessários para a sua caracterização sismogénica (tabela 1). Falha do Ponsul A falha do Ponsul é apresentada como exemplo da actualização e introdução de dados no SIG de Sismotectónica. A escolha desta estrutura tectónica deve-se à quantidade e diversidade de informação disponível sobre a falha, o que facilitou a construção da base de dados e do SIG, permitindo testar a utilização de diferentes parâmetros. Tab.1: Caracterização da falha do Ponsul Nome da falha Falha do Ponsul Cod_Falha 2010000 Comprimento total (km) 120 Direcção geral N60ºE Falha certa com Cinemática componente principal de movimentação de tipo inverso (marcas no bloco superior) Dados geomorfológicos 9 Dados estratigráficos 9 Dados estruturais 9 Taxa de actividade 0,1 a 0,03 mm/ano Potencial sismogénico 7,25 (M. max.) Período de recorrência 30.000 anos médio (valor máximo) Descrição Hiperligação para breve descrição da falha Cartografia Hiperligação para cartografia simplificada A tabela com a informação da falha do Ponsul, disponível no nível Falhas Activas, é acedida quando no programa de SIG se solicita a informação Fig. 2: Localização da falha do Ponsul. 1099 da estrutura. Da mesma forma se podem aceder às descrições mais detalhadas através das hiperligações existentes. Referências Bibliográficas [1] Cabral, J. (1995) – Neotectónica em Portugal Continental, Memórias do Instituto Geológico Mineiro, 31, 237 p.; [2] Ribeiro, A., 2002, Soft Plate and Impact Tectonics, Springer Verlag, 324 p.; [3] Ribeiro, A. & Cabral, J. (1987) – The neotectonic regime of West-Iberia continental margin: a trasition from passive to active? Abstracts, EUG IV, Strasbourg, April, 13-16, Terra Cognita, 7 (2-3), 120 p.; [4] Ribeiro, A., Cabral, J., Baptista, R. & Matias, L. (1996) – Stress pattern in Portugal mainland and the adjacent Atlantic region, West Iberia. Tectonics, v. 15, nº 2, 641659 pp.; [5] Martins, I. & Mendes Victor, L.A. (1993) – Actividade Sísmica na Região Oeste da Península Ibérica. Energética e Períodos de Retorno. Universidade de Lisboa. Instituto Geofísico do Infante D. Luís, Pub. n.º 20, Lisboa, 15 pp.; [6] Mezcua, J. & Martínez Solares, J.M. (1983) – Sismicidad del area ibero-mogrebi. Publicación 203, Instituto Geografico Nacional, Madrid, 299 pp.; [7] Oliveira, C.S. (1986) – A sismicidade Histórica e a Revisão do catálogo Sísmico. Proc. 36/11/7368, I e D, Estruturas, Relatório 99/86 – NDA, LNEC, Lisboa, 192 pp.; [8] Cabral, J. & Ribeiro, A. (1988) – Carta Neotectónica de Portugal Continental, na escala 1/1.000.000, Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa.; [9] Carvalho, D., Oliveira, J.T., Pereira, E., Ramalho, M., Antunes, M.T., Monteiro, J.H., Almeida, J.P., Carvalhosa, A., Ferreira, J.N., Gonçalves, F., Olivieira, V., Ribeiro, A., Ribeiro, M.L., Silva, A.F., Noronha, F., Young, T., Barbosa, B., Manuppella, G., Pais, J., Reis, R.P., Rocha, R., Soares, A.F., Zbyszewski, G., Gaspar, L., Moreira, A.P., Almeida, F.M., Dâmaso, B. & Dâmaso, L. (1992) – Carta Geológica de Portugal na escala 1:500.000, Folha Sul e Folha Norte. Serv. Geol. de Portugal.; [10] Dias, R.P. & Cabral, J. (1989) – Neogene and Quaternary Reactivation of the Ponsul Fault in Portugal, Comun. Serv. Geol. Portugal, t. 75, 3-28 pp.; Fig. 3: Tabela de caracterização da falha do Ponsul. A falha do Ponsul foi dividida, no território português, em 4 segmentos: Arneiro-Vila Velha de Rodão, Coxerro-Monte do Inventos, Monte dos Inventos-Idanha-a-Nova e Idanha-a-NovaMonfortinho. A tabela referente aos segmentos aqui descritos tem os mesmos campos que a tabela das falhas, diferenciando-se apenas no campo Cod_Segmento, que se acrescenta. Ao longo do traçado da falha estão descritas 24 estações. A tabela da base de dados que descreve as estações está representada abaixo (tabela 2). A informação destas tabelas é acedida através do SIG, seleccionando o segmento ou a estação que se pretende consultar através do botão de informação ou, se for o caso, do botão de hiperligação. Tab.2:Tabela descritiva das estações. Nome da estação Idade da última formação afectada pela falha Descrição Projecção estereográfica de dados estruturais Considerações finais O trabalho em curso visa completar a recolha de informação e introdução dos dados sobre outras estruturas geológicas activas em Portugal Continental no SIG de Sismotectónica, decorrendo paralelamente com o tratamento e integração da outra informação pertinente para a caracterização sismotectónica de Portugal, tendo como objectivo final a sua disponibilização na Internet. Os trabalhos decorrem na perspectiva de que, para o bom funcionamento do SIG, é necessário a constante e recorrente actualização e a introdução de novos dados. Agradecimentos As bolsas das autoras Sandra Silva e Ana Costa foram suportadas pelo projecto GEODYN “Geodynamics – Present to Past”, POCTI – ISFL-532, financiado pela FCT e co-financiado pelo FEDER. O trabalho realizado insere-se no projecto “Base de Dados SIG sobre a Sismotectónica em Portugal Continental”, POCI/CTE-GIN/58250/2004, financiado pela FCT e co-financiado pelo FEDER. 1100