Curso de Pós-Graduação em Dependência Química Módulo 02 | Neurobiologia 1 Neurobiologia da Dependência química Profa. Ana Regina Noto Neurobiologia Cronograma do Módulo Sexta 1. Introdução 2. Neuroanatomia e neurofisiologia 3. Filme: “O poder do cérebro” Sábado manhã 4. Psicofarmacologia I (sistemas de NT) 5. Reforço, Tolerância, S. Abstinência Sábado tarde 6. Psicofarmacologia II (cinética e dinâmica das DR) 7. Filme: “Quem somos nós?” Domingo 8. Bases genéticas da dependência 9. Debate final e Avaliação do módulo INTRODUÇÃO DROGAS PSICOATIVAS Atuam no Sistema Nervoso Central (SNC) e provocam alterações de comportamento PSICOTRÓPICAS Categoria de drogas psicoativas que podem provocar DEPENDÊNCIA Dependência Estado resultante da interação entre um organismo vivo e uma substância, caracterizado por: Modificações de comportamento e outras reações que incluem: Impulso a utilizar a substância de modo contínuo ou periódico com a finalidade de experimentar seus efeitos psíquicos ou de evitar o desconforto da privação Organização Mundial de Saúde Dependência: Evolução do conceito MODELO MORAL MODELO MÉDICO DOENÇA “Falta de caráter” Escolha pessoal antropologia psicologia sociologia SÍNDROME Lei do “tudo ou nada” Contínuo-dinâmico Meta: abstinência Moderação Falta de controle Comportamento aprendido Sintoma Escolha Movimento de Temperança Lei seca 1900 1920 - 1933 Alcoólicos Anônimos 1940 Jellinek 1960 G.Edwards 1976 Sobell & Sobell 1980 Neurociências 2000 Dependência: Modelo Biopsicossocial DOENÇA - SÍNDROME MÉDICO COMPORTAMENTO APRENDIDO PSICOLÓGICO SOCIAL SINTOMA MACROSSOCIAL ESCOLHA SINTOMA RELACIONAL Perspectiva biológica do avanço da dependência (sinais e sintomas) Perspectiva biológica dos sinais e sintomas Abstinência Uso exporádico Abuso Dependência Leve Dependência Moderada Reforço Dependência Grave Fissura Tolerância Síndrome de Abstinência Dependência: Principais características 1. Desejo ou compulsão 2. Dificuldade em controlar o consumo 3. Abandono de prazeres e interesses alternativos 4. Persistência no uso a despeito da evidência de conseqüências nocivas 5. Síndrome de Abstinência 6. Tolerância Organização Mundial de Saúde NEUROANATOMIA E DEPENDÊNCIA DEPENDÊNCIA Dependência envolve transtornos da função cerebral pelo uso de substâncias. Os processos mais alterados são: senso-percepção motivação coordenação motora julgamento entre outros Sistema Nervoso Central CÓRTEX GÂNGLIOS DA BASE AMIGDALA HIPOTÁLAMO HIPOCAMPO NIDA, 2005 NIDA, 2005 Recompensas Naturais Comida Água Sexo NEUROFISIOLOGIA NEURÔNIO axônio Corpo celular dendritos 1-1 Stahl S M, Essential Psychopharmacology (2000) Potencial de ação Comunicação química entre neurônios SINAPSE NEURÔNIO PRÉ-SINAPTICO Vesículas sinapticas Neurotransmissores (NT) Receptores NEURÔNIO PÓS-SINAPTICO STAHL, 2000 “Caminhos” dos neurotransmissores SINAPSE NEURÔNIO PRÉ-SINAPTICO Liberação Recaptação (NT volta para o neurônio pré-sinaptico) Metabolismo NEURÔNIO PÓS-SINAPTICO (inativação do NT com auxílio de uma enzima) STAHL, 2000 PSICOFARMACOLOGIA 1 SISTEMAS DE NEUROTRANSMISSÃO Dopaminérgico Noradrenérgico Serotonérgico Colinérgico Gabaérgico Neurotransmissores Substâncias químicas (moléculas) que transmitem “mensagens” entre neurônios Ex: DOPAMINA OHOH- CH2 – CH2 NH2 NEUROTRANSMISSORES DOPAMINA (DA) - Sistema Dopaminérgico NORADRENALINA(NA) – Sistema Noradrenérgico SEROTONINA (5HT) – Sistema Serotonérgico ACETILCOLINA (Ach)– Sistema Colinérgico GABA – Sistema Gabaérgico GLUTAMATO – Sistema Glutamatérgico Receptores Complexos moleculares, localizados na membrana do neurônio, responsáveis por receber “mensagens” Ex: TIPOS DE RECEPTORES IONOTRÓPICOS (rápidos) Controlam canais IÔNICOS (entrada e saída de íons) METABOTRÓPICOS (lentos) Controlam “segundo mensageiro” ex: Proteína G (transmitem a mensagem química, para desencadear outros eventos metabolismo) RECEPTORES E SISTEMAS DE NEUROTRANSMISSÃO Cada neurotransmissor tem seus receptores específicos DOPAMINA (DA) – D1, D2 NORADRENALINA – alfa, beta SEROTONINA (5HT) – 5HT1 (a, b, c e d), ACETILCOLINA – Nicotínico GABA – GABAa GLUTAMATO 5HT2 e Muscarínico e GABAb – NMDA, AMPA e cainato Metabolismo Ex: inativação da dopamina Dopamina MAO COMT HVA (ácido homovanílico) ENZIMAS ENZIMAS: substâncias que catalizam (aceleram) reações Sem elas, as reações são mais lentas ou nem mesmo acontecem MAO – Monoamonoxidade (uma das principais enzimas, responsével pela inativação da dopamina, noradrenalina e serotonina) Comunicação Dopaminérgica D2 Dopamina MAO (ou COMT) HVA (ácido homovanílico) D1 STAHL, 2000 VIAS DOPAMINÉRGICAS -Mesolímbica (relacionada agressividade, reforço) - Nigro- estriatal (relacionada ao sistema motor - Parkinson) - Meso-cortical (relacionada doenças afetivas - Esquizofrenia) - Túbero infundibular (relacionada a hormônios - GH) - Retinal FUNÇÕES RELACIONADAS AO SISTEMA DOPAMINÉRGICO - Reforço - Agressividade - Sistema motor - Afetividade Drogas de abuso – sistema dopaminérgico Diminui a recaptação (ex: COCAÍNA) Dopamina Aumenta a liberação (ex: ANFETAMINAS) STAHL, 2000 Comunicação Noradrenérgica Noradrenalina MAO (ou COMT) Receptores: alfa ou beta HVMA (ác. homovanílmandélico) STAHL, 2000 VIAS NORADRENÉRGICAS Feixe noradrenérgico ventral Feixe noradrenérgico dorsal FUNÇÕES RELACIONADAS AO SISTEMA NORADRENÉRGICO - Vigília (acordar) - Humor - Recompensa - Controle da PA (Pressão Arterial) DROGAS QUE ATUAM NO SISTEMA NORADRENÉRGICO Diminui a recaptação (ex: COCAÍNA) Noradrenalina Aumenta a liberação (ex: ANFETAMINAS) STAHL, 2000 Comunicação Serotonérgica Serotonina (5HT) Receptores: 5HT1, 5HT2 MAO 5HIAA (ác. 5 hidroxi indol acético) STAHL, 2000 FUNÇÕES RELACIONADAS AO SISTEMA SEROTONÉRGICO - Alterações sensoriais (pode propicia alucinações) - Humor (melhora) - Temperatura (desregula) - Apetite (diminui) - Dor (diminui) DROGAS QUE ATUAM NO SISTEMA SEROTONÉRGICO Diminui a recaptação (ex: fluoxetina, êxtase) Serotonina Aumenta a liberação (ex: êxtase) Agonista (ex: LSD, êxtase, DMT, mescalina) STAHL, 2000 TIPOS DE RELAÇÃO ENTRE DROGA-RECEPTOR AGONISTAS: drogas que se acoplam ao receptor produzindo efeitos, como “falso-neurotransmissores” (ex: LSD é agonista dos receptores 5HT2a) ANTAGONISTAS: drogas que se acoplam ao receptor e NÃO produzem efeitos, inclusive, impedem a ação dos neurotransmissores (por “ocupar o espaço”) Comunicação Colinérgico Acetilcolina (Ach) AchE Acetato + colina Receptores: M1, M2 STAHL, 2000 FUNÇÕES RELACIONADAS AO SISTEMA COLINÉRGICO - Aprendizado e Memória (Dç Alzheimer) - Motricidade (Dç Parkinson) - Vigília DROGAS QUE ATUAM NO SISTEMA COLINÉRGICO - Anticolinérgicos (Ex: Lírio Bc, Artane, etc) Comunicação Gabaérgica GABA GABA t Succinil semi aldeído Receptores: GABA a STAHL, 2000 Cl- O CLORO HIPERPOLARIZA A MEMBRANA, DIFICULTANDO A OCORRÊNCIA DE POTENCIAL DE AÇÃO DROGAS QUE ATUAM NO SISTEMA GABAÉRGICO Benzodiazepínicos: facilitam a ação do GABA por modificar a configuração do receptor GABAa (agonista alostérico) DROGAS PSICOTRÓPICASChaloult, 1971 ESTIMULANTES DEPRESSORAS Álcool Cocaína Solventes Heroína Anfetamina Benzodiazepínicos LSD Cogumelos Ecstasy (Psiloscibe sp) Maconha DMT PERTURBADORAS - ALUCINÓGENAS (psicodislépticas) Chaloult, 1971; Abraham et al., 1996; Kovar, 1998 Fatores que influenciam os efeitos das drogas • • • • • Droga e sua ação no SNC Dose administrada e farmacocinética Tempo de uso Contexto de uso Estado psicológico ESTIMULANTES COCAÍNA, ANFETAMINAS, CAFEÍNA, NICOTINA Estimulantes = Psicoanalépticos • Aumento da atividade do SNC - Alteração “quantitativa” • Aumento da energia, vigor físico, disposição, vigília e diminuição do cansaço e da fome • Além do uso “recreativo”, são empregadas nos remédios moderadores de apetite COCAÍNA Mecanismo de ação principal: Cocaína diminui a recaptação de dopamina e noradrenalina COCAÍNA Diminui a recaptação, aumentando a concentração de dopamina na fenda sinaptica x Dopamina Principais efeitos da cocaína • • • • • • Aumento da energia Aumento da disposição Vigor físico Sensação de poder Diminuição do cansaço Redução do apetite/fome DEPRESSORES Álcool, solventes, benzodiazepínicos, barbitúricos BENZODIAZEPÍNICOS Depressoras = Psicolépticos • Diminuição da atividade do SNC Alteração “quantitativa” • Lentidão, sonolência, apatia, redução da coordenação motora, dificuldade de concentração e redução da memória. • Além do uso “recreativo”, são empregadas nos remédios ansiolíticos e hipnóticos Mecanismo de ação principal: Facilitam a ação do Gaba GABA GABA a STAHL, 2000 Cl- O CLORO HIPERPOLARIZA A MEMBRANA, DIFICULTANDO A OCORRÊNCIA DE POTENCIAL DE AÇÃO e portanto ocorre “depressão” de várias áreas do SNC ÁLCOOL ÁLCOOL • Variações individuais (ex: gênero), alimentação, padrão de uso. • Efeito bifásico: – 1º estimulante (ação em DA e NA) – 2º depressor (ação em GABA e Glutamato). • Gravidez (Síndrome fetal) e amamentação ALUCINÓGENOS Classificação dos alucinógenos De acordo com a similaridade estrutural e funcional 1. INDÓLICOS (indolalquilaminas) Ex: LSD, Pscilocibina, Ibogaína, DMT 2. FEAs (feniletilaminas) Ex: Mescalina, MDMA (ecstasy) 3. ANTICOLINÉRGICOS Ex: atropina, escopolamina, triexafenidil (Artane®) 4. PCP e ketamina (anestésicos dissociativos) 5. CANABINÓIDES Ex: maconha Abraham et al., 1996 Kovar, 1998 Perturbadoras, alucinógenas = Psicodislépticos • Modificação da atividade do SNC Alteração “qualitativa” • Confusão mental (delírios e alucinações), despersonalização, distorção de tempo e espaço. • Não tem indicação clínica (exceto alguns alucinógenos secundários, como anticolinérgicos e anestésicos dissociativos) INDÓLICOS Pscilocibina Ibogaína DMT LSD serotonina MDMA LSD Psilocibina Mescalina 5HT2A 13-10 5HT2A Stahl S M, Essential Psychopharmacology (2000) Interação 5HT-DA Substância negra Núcleos da rafe 11-17 Stahl S M, Essential Psychopharmacology (2000) LSD - Efeitos Efeitos agudos - intensos Sinestesia Cinestesia Entre outros... ÊXTASE Farmacocinética da MDMA (ecstasy) 20-90 min Aumento: 5-20 min Platô 2-3 horas EFEITOS Início: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 HORAS Curran & Travil, 1997 Mecanismo de ação da MDMA SEROTONÉRGICO AGONISTA 5HT2 SINAPSE LIBERAÇÃO RECAPTAÇÃO DOPAMINÉRGICO LIBERAÇÃO RECAPTAÇÃO NORADRENÉRGICO LIBERAÇÃO RECAPTAÇÃO STAHL, 2000 Downing, 1986; Vollenweider,et al, 1998 ÊXTASE Efeitos Imediatos com Dose Usual POSITIVOS Felicidade / Bom humor Proximidade c/ outros Empatia sentidos autoconfiança Euforia Loquacidade Agitação “Aumento de energia” NEGATIVOS OU NEUTROS Diminuição do apetite Bruxismo / Trismo Náuseas e vômitos Taquicardia Hipertensão Insônia Sudorese Tremores Hepatotoxicidade MACONHA Receptores CB Regiões do SNC desenho esquemático de binding de THC – CB1 Cortex - Cognição e sentidos Hipocampo – Memória Cerebelo – Equilíbrio, coordenação motora Via do reforço Acumbens (Gânglios da base) Reforço – Compulsão Tolerância Síndrome de Abstinência Dependência: Principais características 1. Desejo ou compulsão 2. Dificuldade em controlar o consumo 3. Abandono de prazeres e interesses alternativos 4. Persistência no uso a despeito da evidência de conseqüências nocivas 5. Síndrome de Abstinência 6. Tolerância Organização Mundial de Saúde REFORÇO – COMPULSÃO Compulsão Estado em que um organismo apresenta um comportamento impulsivo e repetitivo: - Comportamento é reforçado (recompensa ou prazer) - Perda do controle em limitar o consumo TOLERÂNCIA Necessidade de quantidades crescentes da substância para obter o mesmo efeito (ou quantidade habitual produz cada vez menos efeito) OMS, 2004 TOLERÂNCIA O organismo vai ficando menos sensível aos efeitos da substância: DOWNREGULATION DOS RECEPTORES NIDA TOLERÂNCIA CRUZADA quando o cérebro do usuário, uma vez já tolerante à droga, invoca o mesmo mecanismo adaptativo quando exposto à outras drogas que produzem efeitos psicoativos similares. Ex.: cocaína e anfetaminas álcool e anestésico Morfina e Heróina DESAFIO: Pq não ocorre tolerância cruzada entre, por exemplo, cocaína e benzodiazepínicos ??????? SINDROME DE ABSTINÊNCIA Conjunto de sinais e sintomas que ocorrem quando o consumo da substância é reduzido ou interrompido OMS, 2004 Comunicação química entre neurônios SINAPSE Retirada da droga Neurotransmissores Receptores Down regulation STAHL, 2000 Quantidade de receptores insuficiente para manter o sistema funcionando normalmente SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA (OMS) Bases Genéticas na vulnerabilidade às dependências Bases Genéticas “As heranças genéticas podem ser responsáveis por diferenças de ação das drogas entre os indivíduos e, em parte, explicar a variação do consumo e da dependência” Bases Genéticas Dependência é um “Transtorno Complexo” ou seja, provavelmente causado pela interação de vários genes com vários fatores ambientais. Bases Genéticas substâncias psicoativas podem ter um efeito maior em pessoas com vulnerabilidade genética a dependência. CUIDADO! Para não confundir com determinismo biológico (ex:cor dos olhos) Bases Genéticas Tipos de estudos: - Estudos de padrões transgeracionais (famílias) em gêmeos monozigóticos x dizigóticos e indivíduos adotados. - Estudo de “traços” relacionados - Busca de genes possivelmente relacionados (como genes de receptores, genes de enzimas, etc) Genética e a dependência do álcool - Diferenças nas características dos receptores gabaérgicos, serotonérgicos e dopaminérgicos - Diferenças no metabolismo: ex. deficiência da enzima aldeído desidrogenase (ADH) Dependência do álcool deficiência enzimática ADH, especialmente em orientais Álcool desidrogenase ETANOL (Álcool Etílico) Aldeído desidrogenase X ACETALDEÍDO Reações: “vermelhão” no rosto, náuseas, mal estar, etc. ACETATO Dependência do Tabaco Vários genes implicados: -Ex: Metabolismo da nicotina (acúmulo de nicotina no cérebro), receptores, etc -Diferenças de hereditariedade entre populações, gênero. Perspectivas da genética - Os resultados até então encontrados, embora incompletos, indicam perspectivas promissoras. -Uma vez identificados os genes, o desafio será compreender a interação com o ambiente: para novos diagnósticos e tratamentos. COMORBIDADE COMORBIDADE Transtornos associados Ocorrência conjunta de dois ou mais transtornos mentais ou condições médicas gerais. Tratamento Farmacológico ÁLCOOL Dissulfiram (Anti-álcool) Álcool desidrogenase ETANOL (Álcool Etílico) Aldeído desidrogenase X ACETALDEÍDO Reações: “vermelhão” no rosto, náuseas, mal estar, etc. REAÇÃO AVERSIVA ACETATO Tratamento Farmacológico ÁLCOOL Acamprosato Substância sintética semelhante a um aminoácido natural. Restabelece atividade de neurônios que ficaram super excitados devido à exposição crônica ao álcool Tratamento Farmacológico ÁLCOOL Naltrexona Substância que bloqueia os receptores opióides Tratamento Farmacológico TABACO Adesivos transdérmicos Substituição da nicotina com retirada gradativa Tratamento Farmacológico TABACO Bupropiona Inibidor fraco da recaptura de noradrenalina e dopamina Tratamento Farmacológico HEROíNA Metadona Substituição da heroína por metadona com posterior retirada gradativa