RELATÓRIO DE EVENTO Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. BRASIL DANIEL EDLER GUSTAVO BEZERRA Setembro 2012 www.kas.de/brasil IX Conferência de Segurança Internacional do Forte de Copacabana SEGURANÇA E RESPONSABILIDADE EM UM MUNDO MULTIPOLAR No dia 19 de setembro de 2012, a nona atuação do bloco que, anteriormente, traba- edição da Conferência de Segurança lhava apenas na sua vizinhança mais imedi- Internacional do Forte de Copacabana ata, mas que se adaptou à nova realidade e reuniu políticos, acadêmicos, militares, passou a defender os princípios de demo- diplomatas, intelectuais e representantes cracia e respeito aos Direitos Humanos glo- da sociedade civil da Europa, América balmente. Latina e EUA no Rio de Janeiro para debater temas relevantes sobre Segurança A embaixadora europeia afirmou que as Internacional. vantagens que o bloco possui na busca pela concretização de seus projetos advêm das Boas-vindas múltiplas ferramentas que empregam (militares, civis, financeiras, comerciais) e que A mesa de abertura foi composta pela chefe podem influenciar a realidade de uma ma- da Delegação da União Europeia no Brasil, a neira que a OTAN e outros atores (dadas as embaixadora Ana Paula Zacarias, pelo pre- suas limitações de instrumentos) não po- sidente do Centro Brasileiro de Relações In- dem. Ela lembrou ainda que essa estrutura ternacionais (CEBRI), o embaixador Luiz diplomática do bloco demorou a ser criada, Augusto de Castro Neves e pelo Represen- mas atualmente está operacional e é capaz tante da Fundação Konrad Adenauer no de coordenar atividades com outros atores Brasil, Sr. Felix Dane. (mesmo Estados membros da UE), principalmente de modo a evitar crises, como Primeira a falar, a embaixadora Ana Paula tem sido as atuações recentes para países Zacarias afirmou que a delegação da União como Irã e Síria. Europeia no Brasil tem sido uma parceira no projeto da Conferência de Segurança Inter- A senhora Zacarias afirmou que a União Eu- nacional do Forte de Copacabana nos últi- ropeia tem um longo caminho no seu pro- mos anos, pois este é uma das mais impor- cesso de consolidação, principalmente com tantes reuniões da América do Sul que dia- o fortalecimento dos aspectos fiscal, eco- loga com a Europa os temas de segurança. nômico e político, que também são formas Segurança e responsabilidade, lembrou a de construir a segurança. Ela ressaltou a embaixadora, são temas importantes que importância dos parceiros para a atuação estão em foco a alguns anos e que se fazem externa da UE, e que um desses parceiros é mais presentes quando levamos em consi- o Brasil, com quem ela percebe que a Euro- deração o mundo interdependente em que pa compartilha diversos objetivos, interes- as ameaças são globais e em que prover o ses e valores, questões essenciais para que acesso a vida digna é um desafio para todos se leve adiante diálogos sobre segurança e os países. A União Europeia (UE) tem inves- política externa. A cooperação entre esses tido esforços para a construção desse mun- dois atores reforça a confiança mútua e do melhor, principalmente após perceber a possibilita que ela se estenda para outras necessidade de mudança na estratégia de áreas. Afinal, como destacou a embaixado- 2 Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. ra, ainda existem muitas possibilidades de Gestão de Crises (CMPD) da União Europei- cooperação. a, Walter Stevens; pelo Subsecretário Geral do Departamento de Operações de Paz das BRASIL DANIEL EDLER O embaixador Luiz Augusto de Castro Neves Nações Unidas, Edmond Mulet; pelo contra- GUSTAVO BEZERRA lembrou que se busca uma cooperação fru- almirante e vice-ministro da Defesa da Re- tífera para as duas regiões do planeta. Ele pública do Peru, Mario César Sánchez De- percebe que desde o fim da Guerra Fria o bernardi e pelo tenente-coronel Jürgen mundo está mais complexo nos seus temas Menner, que representou o ministério da e política, mas as burocracias diplomáticas Defesa da Alemanha. A moderação coube ainda funcionariam com os parâmetros do ao embaixador José Botafogo Gonçalves, período da Guerra Fria. Compreende-se que vice-presidente emérito do CEBRI. Setembro 2012 www.kas.de/brasil foram muitos anos com esta dinâmica, mas é surpreendente que um mundo de coope- O diretor Walter Stevens ressaltou que o ração e paz ainda não tenha emergido, diálogo com os outros palestrantes traria mesmo com mudanças significativas do ce- importantes contribuições para as políticas nário político internacional, como represen- da União Europeia e vem em ótimo momen- tado pela emergência da China. Os novos to, no qual o bloco busca responder a ame- desafios que surgem são imensos e têm de aças globais e garantir os Direitos Huma- ser resolvidos de forma multilateral com nos. Segundo ele, é importante “multilate- respostas globais, com o objetivo principal ralizar” a multipolaridade: compartilhar a de reduzir as assimetrias de poder e direi- segurança global significar enfrentar a vio- tos, que levem o mundo para uma realidade lência globalmente, e por isso o bloco traba- mais justa. O embaixador terminou sua fala lha em parceria estreita com a ONU, com afirmando que os palestrantes poderão con- organizações regionais – especialmente com tribuir com o diálogo para melhorar a coo- a União Africana – e também com países peração ao menos nas questões de segu- como Turquia, Rússia e Brasil, parceiros rança. fundamentais no tema. Sobre a cooperação com o Brasil, o Sr. Stevens lembrou da coo- O representante de Fundação Konrad Ade- peração entre as duas regiões na República nauer no Brasil, Sr. Felix Dane, afirmou ser Democrática do Congo e afirmou que a co- uma honra abrir a IX Conferência de Segu- munidade internacional aprendeu que con- rança Internacional do Forte de Copacabana flitos são complexos e multifacetados, o que duas semanas após sua chegada ao Brasil, significa dizer que nenhum ator sozinho vindo de Ramallah. Segundo ele, a seguran- consegue efetivamente por fim a um pro- ça no Oriente Médio afeta a segurança de blema desse nível, e que, para efetivamente todo o mundo, e questões que antes eram resolvê-lo é necessário combinar ferramen- vistas como regionais atualmente têm con- tas diplomáticas com ambientais e sociais: seqüências globais. Necessitamos saber essa seria a natureza de abordagens abran- como podemos lidar com desafios de segu- gentes para a solução de conflitos. rança globais que afetam um mundo multipolar que deve ser, cada vez mais, multila- Sobre a atuação da UE em conflitos, Walter teral. O senhor Dane ressaltou a importân- Stevens afirmou que é possível fazê-la a- cia da parceria com o CEBRI e com a Dele- primorar sua capacidade de lidar com esses gação da UE no Brasil e expressou seu de- desafios. A crise dos Bálcãs na década de sejo de que dure muitos anos como institui- 1990 mostrou a necessidade de se avançar ções incentivadoras do debate em temas de e esse esforço foi feito de forma bastante segurança do Brasil e da Europa. Em segui- efetiva. Em 2012, ainda que pouco tempo da, deu como aberta a conferência. depois, já é possível notar a diferença de atuação, principalmente pela entrada em Painel de Abertura: Segurança e respon- atividade do CMPD. Atualmente a UE conta sabilidade em um mundo multipolar com quinze missões civis e militares em operação, que fortalecem o Estado de direito, O painel de abertura foi composto pelo dire- treinam forças policiais, monitoram planos tor do Departamento de Planejamento e de paz, treinam Forças Armadas e comba- 3 tem a pirataria, ajudando a melhorar a se- Carta constitutiva da ONU. No entanto, sem gurança mundial. Nenhuma das missões foi esse tipo de cooperação não é possível res- BRASIL imposta, afirmou o diretor, mas senão im- ponder aos desafios que se estabelecem. O DANIEL EDLER plementadas a partir de convite realizado caso do Timor Leste foi um sucesso no qual, GUSTAVO BEZERRA pelas Nações Unidas. A criação do Serviço após dez anos, as atividades da ONU come- de Ação Externo da União Europeia (EEAS) çam a encerrar-se. Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. Setembro 2012 www.kas.de/brasil ajudou a consolidar o caráter de atuação abrangente do bloco, principalmente porque O Sr. Mulet afirmou que há programação a prevenção funciona melhor do que o con- futura no DPKO, com planejamento em dife- trole de crises, e a EEAS favorece a aborda- rentes estágios para o Sudão e o Sudão do gem preventiva. Sul, chamados por ele de 3S: Somália, Sahel e Síria, regiões nas quais se tem lições O Sr. Stevens citou a percepção ampla so- penosas do passado para tirar. O subsecre- bre crise na atuação sobre pirataria no Nor- tário lembrou que as ferramentas disponibi- te da África. A situação era emblemática de lizadas são dos anos de 1960 e de 1970, ampla crise, tendo vista que decorreria da mas que os desafios são muito maiores. falta de estruturas políticas sólidas na regi- Como melhorar a aplicabilidade e a eficiên- ão, em especial na Somália. A operação cia desses instrumentos? Existe, efetiva- Atalanta, levada a cabo em 2008 em estrei- mente, uma paz a ser mantida? A Comuni- ta parceria com a ONU e com os EUA, obte- dade Internacional estaria comprometida ve grande sucesso na redução da pirataria para resolver as crises? Estas foram algu- na região. Neste sentido, a UE transformou- mas das questões que o senhor Mulet fez se em um importante provedor de seguran- durante sua apresentação. Para ele, o Con- ça internacional capaz de articular alianças selho de Segurança da ONU (CS) muitas com parceiros globais, regionais e locais pa- vezes confere um mandato, mas os próprios ra buscar soluções para crises atuais, e es- países que o aprovam têm um projeto dife- pera a oportunidade atuar em parceria com rente daquele aprovado. Cria-se assim um o Brasil. dilema de enorme dificuldade para ser resolvido, realidade parecida com a do Congo. Em seguida, o Subsecretário Geral do Departamento de Operações de Paz da ONU, O Sr. Mulet lembrou que não existe qual- Sr. Edmond Mulet, afirmou que a colabora- quer tipo de regulação sobre o comércio de ção de diferentes países e agências é es- armamentos. Diferentemente do que ocorre sencial, pois a ideia de parceria é central com o comércio de café e bananas, os paí- para a consecução de operações de manu- ses que fabricam armas são os mesmo que tenção de paz (OMP) que contam, atual- pedem à ONU para reparar as violentas mente, com 120.000 pessoas em campo, conseqüências do seu comércio. Ele pediu 22.000 civis e um orçamento de US$ 7,5 que haja controle sobre esse comércio, e bilhões para todas as operações. Segundo que seja feito de maneira responsável. A Mulet, as operações desse tipo também ONU sozinha não tem capacidade de evitar evoluíram e passaram a adequar-se às cri- conflitos. Ele destacou que situações de vio- ses contemporâneas, que tendem a ser in- lência causam migração e refugiados, que ternas e não mais entre Estados. Portanto, buscam abrigo em todas as partes do mun- assumiu-se agora também a função de mo- do. Essa seria apenas uma dimensão das nitorar transições políticas e a reconstrução, conseqüências globais de conflitos locais. a estruturação de Estado de Direito, as elei- Seria preciso desenvolver de forma mais ções e a governabilidade. Através dessa a- consistente abordagens regionais para con- tuação é possível manter a sustentabilidade flitos, realidade para a qual UNASUL e o da paz para fazer com que esta seja dura- Brasil provêm bons exemplos de capacidade doura. As OMP são apenas uma parte do de articulação. processo, que envolve diversas organizações e arranjos internacionais, situação que O vice-ministro do Peru, Mario César Sán- estabelece um duplo desafio, tendo em vis- chez Debernardi, afirmou que o Peru está ta que essa realidade não está prevista na comprometido com a paz e a segurança in- 4 ternacionais e que trabalha cooperativa- internacional, no qual ainda há diversos de- mente com a ONU na região para mantê- safios, como o acesso a fontes energéticas, BRASIL las, a exemplo de sua atuação na missão de mudanças climáticas e explosão populacio- DANIEL EDLER paz do Haiti (MINUSTAH). Ainda assim, ele nal. Dessa forma, caberia às instituições in- GUSTAVO BEZERRA vê que existem regiões que continuam a ternacionais articular a integração em te- mostrar instabilidade, como a crise social mas de defesa e segurança. A consolidação que afeta o Oriente Médio e o impacto da da UNASUL é ponto central desse processo, falta de democracia em algumas regiões do pois fortalece o diálogo regional e com ou- mundo. O Sr. Sánchez Debernardi afirmou tras regiões que estejam interessadas nas que o modelo econômico em vigor atual- ameaças globais percebidas atualmente. Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. Setembro 2012 www.kas.de/brasil mente também prejudica, na medida em que ajuda a espalhar a crise econômica. Pa- Representante do Ministério da Defesa da ra ele, o mundo inteiro estaria vivendo a Alemanha, o tenente-coronel Jürgen Manner realidade que os latino-americanos viveram foi o último participante da mesa a falar. Ele algumas décadas atrás. analisou a reorientação das forças armadas alemãs como forma de lidar com as mudan- O vice-ministro considera que é preciso ças nos desafios de segurança, questões compreender as ameaças não tradicionais à que devem ser discutidas de forma conjun- paz. Na América do Sul elas estão relacio- ta. Para ele, a política de segurança e reori- nadas principalmente a violência decorrente entação das forças armadas são dois lados do tráfico de drogas, visto que na região de uma mesma moeda. Até 1990 predomi- quase inexistem conflitos inter-estatais. E navam questões ligadas à Guerra Fria (GF) por ser esta uma ameaça comum aos países - OTAN versus Pacto de Varsóvia. Nessa po- da região, busca-se articular por meio da laridade, uma guerra provavelmente ocorre- UNASUL uma solução conjunta, especial- ria na Alemanha, o que gerava medo entre mente porque a associação entre os cartéis os alemães. Com o fim deste período, o de drogas e os grupos terroristas ameaçam mundo mudou. Os alemães não se prepa- as bases das sociedades. O recente ciclo de ram mais para uma guerra interplanetária, crescimento econômico da região vem a- mas para garantir a estabilidade no globo, companhado da preservação da democracia, realidade que seria impensável aos cidadãos que favoreceu o desenvolvimento social. alemães de vinte anos atrás. Hoje a Alema- Todavia, a expansão econômica não signifi- nha vive tempos de paz, rodeada por par- ca, necessariamente, estabilidade social e o ceiros. As forças armadas alemães devem crescimento inclusivo. O Sr. Sánchez De- estar preparadas para a própria defesa – bernardi analisou a importância de parcerias das fronteiras do país e da OTAN – mas isso com grandes atores mundiais, como a Chi- não pode ser definido apenas geografica- na, a União Europeia e os EUA para ajudar a mente. Acontecimentos em qualquer ponto consolidar um bloco comum na América do do planeta podem ter impacto rápido na Eu- Sul que favoreça a governança. Contudo, as ropa. Questões relativas ao Irã, ao Paquis- diversidades da região impõem dificuldades. tão e Afeganistão são exemplos de possíveis No caso peruano, o país tem conseguido ameaças futuras. Por isso, existe uma de- avançar economicamente com inclusão so- manda de reorganização da estrutura das cial, o que comprovaria que a estratégia do Forças Armadas, que precisam estar prepa- presidente Ollanta Humala foi eficaz. Da radas para diferentes cenários. Segundo o mesma forma, busca-se essa eficácia para Sr. Menner, é importante assumir respon- evitar que a ameaça de terrorismo, que por sabilidades globais e pensar nas capacida- tanto tempo rondou o Peru, não se concre- des de que se deve dispor, pois novos desa- tize novamente. Outro ponto positivo é que fios demandam novas respostas. Busca-se a região está livre de armas nucleares e mi- apenas a especialização em missões inter- nas, decisão que depende da anuência dos nacionais ou algo mais? Este é um ponto diversos países. estratégico que deveria ser pensado em todos os países europeus. Por exemplo, a Ho- Os avanços regionais não podem servir de landa acabou de renunciar aos tanques de empecilho para que se perceba o contexto combate. 5 A Alemanha precisa de forças armadas ca- de estudos de defesa e política externa do pazes de responder às exigências da UE e American Enterprise Institute, Danielle Plet- BRASIL da OTAN. Portanto, que tenham ampla ga- ka; pelo tenente-coronel Jügern Menner, DANIEL EDLER ma de ação: assistência em situações de representante do Ministério da Defesa da GUSTAVO BEZERRA catástrofes, apoio a civis, intervenção hu- Alemanha; e pelo coordenador da Escola de manitária, luta contra terrorismo, operações Ciências Sociais e História da Fundação Ge- de estabilização, apoio a forças parceiras e túlio Vargas de São Paulo, Oliver Stuenkel. a defesa das próprias fronteiras. Isso signi- A moderação ficou a cargo do Representan- fica que devem contar com unidades profis- te da Fundação Konrad Adenauer no Brasil, sionais equipadas com tecnologia moderna, Felix Dane. Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. Setembro 2012 www.kas.de/brasil capazes de serem adaptadas a diferentes circunstâncias e de operarem em conjunto O Embaixador Patriota afirmou que o papel com os aliados. Para ele, isso exigiria mu- do Brasil no plano internacional é atuar de dança significativa na mentalidade dos mili- forma coerente com a sua política interna tares. Essa transformação na realidade das de combate à pobreza e redução das desi- forças armadas alemães teria atraído a a- gualdades. Para ele, a manutenção da regi- tenção dos parceiros daquele país, que es- ão sul-americana como área livre de armas tariam introduzindo medidas semelhantes, nucleares e de destruição em massa é outro visto que uma simples adaptação da antiga aspecto central ao projeto de política exter- infra-estrutura não seria suficiente. É preci- na almejado pelo Brasil. Ele ressaltou tam- so reorientar as políticas e o papel desem- bém a importância da ONU, embora a insti- penhado pelas forças armadas. Não se bus- tuição represente um formato que reflete a caria mais o crescimento rápido, situação realidade de poder de um mundo velho e que tornaria o recrutamento obrigatório um ultrapassado. Enquanto desafios, Guilherme atraso. A busca seria por forças armadas Patriota percebe que é necessário construir altamente profissionais, situação em que as um mundo com um modelo capitalista mais forças de segurança em breve terão de inclusivo, que consiga, eficientemente, a- competir pelos jovens com a indústria. branger dois bilhões de pessoas na economia mundial como consumidores. Sobre a relação com parceiros, o tenentecoronel Menner falou da necessidade de a- A Sra. Danielle Pletka defendeu a atuação primorar a eficiência e a cooperação. Ele externa dos EUA no mundo contemporâneo, afirmou que com a reorientação das forças e afirmou que o mundo é melhor hoje do armadas será possível responder a desafios que foi no passado, tendo em vista que e- diferentes daqueles que os palestrantes an- xistem mais democracias. Para ela, os EUA teriores apresentaram. O impacto sobre os ocupam espaço de liderança no cenário polí- militares será grande, mas não haveria al- tico internacional do mundo contemporâ- ternativa à transformação das estruturas e neo, isso a despeito de serem incompeten- do papel das forças armadas. tes no uso de softpower. Sobre a capacidade de hardpower do país, a pesquisadora O evento contou, após o almoço, com ativi- afirmou que o país é fraco (os modelos dos dades simultâneas: a Conferência 1 com o equipamentos bélicos seriam antigos e não tema Estratégias e Ferramentas para Alcan- mais capazes de atender a demanda con- çar a Segurança Responsável, e o Workshop temporânea). Os cortes previstos para o 3 sobre Potenciais Riscos Futuros para a orçamento militar americano tendem a pio- Segurança do Atlântico rar o cenário e deixar o país mais fraco. Sobre a situação da OTAN, Pletka lembrou que Conferência 1: Estratégias e ferramentas há um compromisso entre os membros da para alcançar a segurança responsável aliança no sentido de contribuir com 2% do orçamento do país para a Defesa, e segun- A Conferência foi composta pelo embaixador do ela, apenas os EUA e a Grécia cumprem e assessor especial de política externa da esse acordo. E no caso grego, o valor em Presidência da República do Brasil, Guilher- termos reais não é significativo, dado o im- me de Aguiar Patriota; pela vice-presidente pacto da crise do Euro sobre o orçamento 6 do país. Esta falta de compromisso seria um Oliver Stuenkel, por sua vez, afirmou que a motivo de fraqueza da instituição, que não postura do Brasil sobre a situação da Líbia, BRASIL contaria com uma estrutura militar sólida apesar de parecer confirmar a postura da DANIEL EDLER nos países membros. Rússia e da China, difere delas a partir do Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. momento em que é feita a partir de outras GUSTAVO BEZERRA Setembro 2012 www.kas.de/brasil O tenente-coronel Jügern Menner reforçou a bases. Por exemplo, a articulação em rela- necessidade dos países europeus aumenta- ção à Responsabilidade de Proteger de- rem a responsabilidade sobre as fronteiras monstra a postura brasileira de tentar arti- continentais, reduzindo a dependência que cular novas bases para a atuação interna- existe em relação aos EUA como maior po- cional. Isso é essencial na política interna- tência militar da ONU. A capilaridade das cional, pois a recusa pela recusa poderia fronteiras facilita o tráfico de armas entre os fazer com que a realidade regredisse àquela países. Esta situação é muito preocupante, de meados da década de 1990, quando não e é inconcebível que haja regimes de con- havia a articulação da Responsabilidade de trole sobre a exportação de bens como ba- Proteger. Foi o imobilismo da sociedade in- nana e café, mas que inexista qualquer tipo ternacional que possibilitou situações como de controle sobre o comércio de armas. as de Ruanda e Kosovo. O professor Oliver Stuenkel falou da Res- A Sra. Pletka contestou a postura adotada ponsabilidade de Proteger e os desafios que pelo Professor Stuenkel. Para ela, a área tal conceito traz no que tange à relação en- cinzenta na qual o Brasil está é difícil de ser tre os Estados soberanos. Para ele, a Ale- definida, mesmo porque, no resultado das manha é um caso à parte nos posiciona- votações, pouco importaria a justificativa, mentos dos países membros da União Euro- dado que o resultado seria o mesmo. Ainda peia sobre intervenções, pois é mais reti- assim, mesmo que se considerasse essa di- cente que os outros membros quando o as- ferença na justificativa, como estabelecer sunto é intervenção humanitária alhures. A maneiras de fazer com que a posição brasi- votação no Conselho de Segurança sobre a leira não seja influenciada por aquela da situação da Líbia, nesse sentido, seria em- Rússia e da China? O mais importante para blemática. a analista é a premissa de que não haveria benevolência em posicionamentos de políti- Durante o debate, o Embaixador Patriota ca internacional, portanto o Brasil teria inte- afirmou que o Brasil tem contribuições para resses em se posicionar contrário à inter- um Conselho de Segurança da ONU refor- venção na Líbia, embora não se saiba quais mado, mas que essas respeitam as diferen- são. Ela não se arrisca a identificá-los por- ças existentes entre as capacidades milita- que não conhece o suficiente da realidade res dos Estados membros. Para ele, não se- do país para fazer essa análise. Para ela, é ria coerente cobrar que a contribuição brasi- inconcebível ficar à espera de que a situa- leira ocorra nos mesmos termos da contri- ção da Síria, bem como aconteceu com a buição dos Estados que tenham maior capa- Líbia no ano passado, resolva-se sozinha. cidade militar. O embaixador ressaltou que Citando um analista da instituição à qual o tempo político pode ser mais demorado do está filiada, Pletka afirmou que não é possí- que aquilo que eventualmente se deseja, vel bater em alguma coisa se não se dispõe mas reforçou que decisões açodadas não de nada. Nesse sentido, a intervenção nos favorecem a estabilidade da política interna- dois países mediterrâneos seria um impera- cional nem contribuem para a estruturação tivo, um que foi conseguido (da Líbia) e ou- de um cenário mais pacífico. Segundo o tro que encontra muitas barreiras (da Síria). Embaixador Patriota, o uso da força é um instigador por definição da corrida arma- O tenente-coronel Menner, citando o analis- mentista e, portanto, de um cenário de ta militar Karl Von Clausewitz, relembrou maior instabilidade, ao invés de contribuir que os meios militares são os últimos passí- para a consolidação de um panorama de veis de serem empregados em crises políti- entendimento. cas, e por isso a necessidade de debate acerca da sua utilização. Na sua análise, a 7 intervenção na Líbia foi um sucesso, o que kozy. Os posicionamentos do atual presi- mostrou ser um problema para o posicio- dente francês, Françoise Hollande, continu- BRASIL namento adotado pelo governo da Alema- am a apresentar divergências entre o go- DANIEL EDLER nha, que ficou com o ônus político de ter verno francês e os projetos dos EUA. A ab- GUSTAVO BEZERRA ficado de fora de um processo de transfor- dicação dos EUA da aliança militar deixaria mação bem sucedido como este. aos franceses a responsabilidade de se tor- Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. narem a consciência do mundo. De forma Setembro 2012 www.kas.de/brasil Para o professor Stuenkel não estaria tão sarcástica, ela comentou: “os franceses?! claro se a intervenção na Líbia fora um su- Sério?...” cesso ou um fracasso, mas esta seria uma definição importante de ser feita com vistas Perguntado sobre as dificuldades que uma a não ficar preso em um choque de narrati- possível reforma no Conselho de Segurança vas sobre o que ocorreu no país mediterrâ- da ONU poderia gerar a partir do congela- neo. Para ele, a possibilidade da sociedade mento do órgão, a exemplo do que ocorrera internacional ver-se presa em tal debate com a Liga das Nações, o embaixador Patri- seria mais clara se a realidade política do ota respondeu que o mundo é outro, que mundo retornar aos moldes do imobilismo não é possível comparar com a realidade observado na primeira metade do século contemporânea nem com o mundo do final XIX. da Segunda Guerra Mundial, muito menos com aquele da Liga das Nações. Uma re- Para o embaixador Patriota, um olhar em forma do Conselho faz-se necessária, assim retrospectiva indica que a atuação do Brasil como a moderação no discurso político, no Conselho de Segurança da ONU foi cor- principalmente com a moderação de “fal- reta, tendo em vista que a guerra civil da cões”, seja no mundo ocidental, seja no Líbia é alimentada por atores externos ao mundo islâmico. Essa moderação política país, e não propriamente um processo en- passa pela necessidade de respeitar o Con- dógeno, com motivações exclusivas de polí- selho de Segurança como locus decisório, tica interna. Ele acredita que a restauração de não o ignorar como um espaço legítimo democrática levada adiante na América La- de tomada de decisão na área de segurança tina entre as décadas de 1980 e 1990 pode internacional. A possibilidade do Conselho oferecer bom exemplo para a situação dos não ser respeitado nas suas decisões políti- países do Oriente Médio atualmente. Co- cas abre precedentes graves que poderão mentando sobre a responsabilidade interna- ser utilizados futuramente por outros países cional, o embaixador afirmou que o nosso com interesses próprios que não tenham processo de inserção internacional é um seus interesses ratificados por decisões do projeto de integração, e que isso já de- Conselho. monstra a importância da responsabilidade internacional para o Brasil. A Sra. Pletka falou sobre como as guerras do Afeganistão e do Iraque criaram a ne- Danielle Pletka lembrou que os EUA benefi- cessidade de repor os equipamentos e re- ciam-se da ordem liberal tal como ela existe novar os estoques. Para ela, a campanha nos dias atuais e, por isso, interessa aos eleitoral para presidência dos EUA estava estadunidenses arcar com os custos daí ori- passando ao largo de debates sobre política ginados. Independentemente do resultado externa, situação que mudou a partir dos das eleições presidenciais dos EUA, o país recentes ataques às representações diplo- continuará a fazer parte da OTAN e dos pro- máticas dos EUA. Segundo a analista, have- jetos ali levados a cabo. Para a analista, is- ria grande expectativa sobre o debate entre so é essencial para a posição estadunidense os candidatos, que abordarão questões de no mundo contemporâneo, pois abdicar de política externa e internacional. participar da OTAN seria abdicar de uma parcela importante de poder. Os EUA absti- Em uma análise sobre o futuro da seguran- veram-se de participar da intervenção Líbia ça internacional, o tenente-coronel Menner pela forma como esta foi levada à frente afirmou que em um futuro próximo o Irã pelo então presidente francês, Nicolas Sar- terá armas nucleares e que não resta muito 8 Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. a fazer quanto a isso. Para ele, a possibili- para que as tropas consigam cumprir suas dade de intervenções de Israel por meio de missões. BRASIL ataques preventivos não afetaria, estrategi- DANIEL EDLER camente, este processo. Isso geraria o atra- Workshop 3: Potenciais riscos futuros pa- GUSTAVO BEZERRA so em alguns anos do desenvolvimento final ra a segurança no Atlântico do artefato, ao invés do impedimento do Setembro 2012 www.kas.de/brasil acesso dos iranianos à bomba. Dessa for- A mesa foi composta pela diretora da Divi- ma, um ataque de Israel seria apenas pre- são de Gestão de Conflito e Construção de judicial para alcançar a paz na região. Neste Paz do Instituto para Estudos de Segurança sentido, ele acredita que a relação entre os (ISS) da África do Sul, coronel Annette Lei- EUA e Israel vai mudar, pois é insustentável jenaar; pelo professor da Universidade Sci- a manutenção do virtual seqüestro que e- ences Po de Paris, Alfredo Valladão; pelo xiste atualmente da agenda de política ex- Contra-almirante e diretor da Escola de terna dos EUA para o Oriente Médio, pelos Guerra Naval da Marinha do Brasil, Cláudio interesses de Israel. Portugal de Viveiros; e pelo diretor de Estudos e Pesquisa do Instituto de Altos Estudos Em sua análise sobre a situação contempo- de Defesa Nacional da França, Michel Fou- rânea da política internacional, o embaixa- cher. A moderação coube ao professor do dor Patriota afirmou que um dos problemas Instituto de Relações Internacionais da PUC mais sérios seria a seletividade na atuação do Rio de Janeiro, Kai Kenkel. em situações semelhantes. Questionado sobre a possibilidade dos incentivos atuais do Annette Leijenaar destacou que o olhar para governo brasileiro repetirem uma situação o Atlântico Sul reflete duas partes: a África de corrida armamentista com a Argentina e a América do Sul. Precisa-se, portanto, nos moldes daquela que se viu na década abordar os dois lados para entender a ques- de 1970, ele afirmou que essa não é uma tão estratégica desta região. Segundo a possibilidade, dado que o projeto que se pesquisadora, mais de 90% do comércio na tem de restabelecimento de política indus- África é feito pelo mar, e a pesca ilegal teria trial militar é com vistas a estabelecer uma um custo econômico enorme para o conti- cooperação entre os países vizinhos, princi- nente, pelo seu caráter de ameaça de gran- palmente por meio da construção de uma de porte. As organizações regionais tem es- cadeia produtiva que incorpore diversos paí- tratégias para combater esse desafio, em ses. Essa estratégia é feita com vistas à especial a Comunidade Econômica dos Es- compra de aviões, dado que um só país da tados da África Ocidental (ECOWAS), mas região não teria demanda capaz de gerar não é clara a atuação individual dos Estados escala que cubra os gastos de desenvolvi- contra essas práticas. mento dessa tecnologia. O exemplo disso é o avião cargueiro que está sendo desenvol- Segundo Leijenaar, a União Africana adotou vido em uma parceria entre Brasil e Argen- uma estratégia marítima conjunta que a- tina. barca uma lista de ameaças, inclusive ilícitas como tráfico, violações de meio- Danielle Pletka, questionada sobre sua a- ambiente e lavagem de dinheiro. A solução presentação, na qual afirmou serem os EUA que ela propõe é o compartilhamento da mais fracos do que já foram, não levou em zona marinha, cooperação para ferramentas consideração a importância da recente in- de monitoramento, políticas comuns para a corporação de instrumentos novos, como os pesca, tecnologia integrada para recursos drones. Ela afirmou que estes não são ca- humanos entre outros. A África precisaria pazes de atender todas as missões existen- de Marinhas mais fortes para fazer guarda tes em uma guerra, pois são excelentes pa- da costa do que Marinhas capacitadas para ra assassinatos seletivos, mas não se pode guerras. simplesmente matar a todos os inimigos. Ela considera ser necessário deter um bom Sobre a atuação do Brasil em projetos na contingente de pessoal e de instrumentos África, a pesquisadora afirmou que existe a cooperação para exercícios de segurança 9 multilateral de 1993, Atlasur. Além disso, a Sexta: questão Antártica. O debate sobre a segurança marítima é importante para os exploração aumentaria e mudanças climáti- BRASIL debates entre os BRICS. Sobre a situação cas seriam tema central a ser considerado, DANIEL EDLER específica da África do Sul, os constrangi- principalmente a dúvida se os países da re- GUSTAVO BEZERRA mentos para o orçamento de defesa e au- gião poderão administrar este espaço. A sência de interesse político doméstico não própria questão das Malvinas demonstra Setembro 2012 permitem aumentar o orçamento. que o espaço não é livre de conflitos arma- www.kas.de/brasil Em seguida, o Sr. Alfredo Valladão falou so- Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. dos; bre o aumento da densidade das relações Sétima: alargamento do canal do Panamá. no Atlântico Sul, o que demandaria mais Tema que deve retomar centralidade, que mecanismos de governança capazes de evi- resultará em desafios para a governabilida- tar conflitos e aumentar a cooperação. Ele de do Caribe. Alguns países da região têm enumerou as questões mais importantes neste canal uma rota central para comércio. para o Oceano. UNASUL e Brasil devem ter políticas bem elaboradas sobre isso, especialmente consi- Primeira: energia. O Atlântico Sul está em derando que apenas os EUA tem capacidade vias de se transformar em uma das princi- de controlar militarmente a região, embora pais áreas de produção de hidrocarbonetos ainda a veja como marginal. do mundo, despertando o interesse mesmo dos EUA. O professor também citou a possi- Europa teria interesses pontuais no Atlânti- bilidade de haver enorme quantidade de co Sul, sobretudo aqueles que são países minérios no leito marinho; costeiros, pois o tráfico de drogas é um tema importante para eles, bem como a rota Segunda: produção agrícola. Serão, de a- comercial que deve aumentar com a expan- cordo com ele, a África e a América do Sul são do Canal do Panamá. O professor inclu- que alimentarão o mundo nos próximos a- iu a questão das Malvinas no mesmo escopo nos; de análise que a questão dos Estados falidos, como dois temas problemáticos para a Terceira: rotas comerciais. A África é, pro- Europa. No entanto, este continente teria vavelmente, a próxima fronteira de cresci- pouca capacidade de atuar na região, assim mento econômico. Haveria apostas no mer- como o Brasil tem enorme interesse mas cado africano, o que tornaria as rotas atlân- pouca capacidade de atuação até as praias ticas pelo cabo uma das mais importantes africanas. Para Valladão, os próprios africa- do mundo, dado que os maiores navios de nos deveriam ter interesse de olhar para o transporte não passariam pelo canal de Su- oceano com seriedade, mas suas capacida- ez e a pirataria no Chifre da África também des dependeriam de acordos. Seria preciso serve para diminuir o fluxo nesta rota; aumentar a cooperação para que juntos os países do sul do Atlântico fossem capazes Quarta: a criminalidade transnacional. O de governá-lo. Alianças entre Estados e en- tráfico de drogas da América do Sul até o tre projetos regionais de integração seriam Golfo de Guiné teria enorme impacto políti- muito importantes nesse processo. Assim, co na África. Criar-se-iam narcoestados com interessaria ao Brasil fortalecer capacidades conseqüências políticas graves. Por esse militares da África. Essencial seria estender motivo governos de países africanos de- também os exercícios navais que são feitos mandam que o Brasil tome posição mais com os EUA. Os africanos e os europeus de- firme no combate contra esta rota; veriam ser incluídos para facilitar mais acordos entre os países do sul. O Brasil deve- Quinta: fluxo de refugiados. O professor ria incentivar exercícios no Caribe, atuando Valladão perguntou-se qual seria a posição em parceria com EUA e com a Europa. brasileira se esse fluxo aumentasse substantivamente; O oceano Índico e a China, segundo Valladão, também poderiam ter repercussão sobre o Atlântico. Brasil e África do Sul vis- 10 lumbrariam a parceria sob foco em segu- com uma jurisdição internacional própria rança na região, mas Índia teria a vanta- para defini-la e combatê-la (Tratado da Ja- BRASIL gem de aumentar sua competição com a da maica). A tendência é de que a pirataria a- DANIEL EDLER China. Para os dois grandes países do Atlân- vance rumo à costa oeste da África e, pos- GUSTAVO BEZERRA tico Sul seria um problema porque se traria sivelmente, à costa brasileira. A Marinha um ator não–atlântico para participar da deve estar atenta para evitar esse tipo de dinâmica do oceano. Influenciaríamos a ação; Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. Setembro 2012 competição entre potências externas em www.kas.de/brasil uma área de interesse estratégico do país. 3) Novas ameaças. Eventos que vão ocorrer Devemos refletir mais sobre os impactos no Brasil aumentam ameaça do terrorismo disso. em nosso território. No mar, a preocupação seria com plataformas de petróleo. Há tam- O contra-almirante Claudio Portugal de Vi- bém os conflitos transnacionais, que deveri- veiros iniciou sua fala afirmando que a Polí- am manter o Brasil em estado de atenção tica de Defesa Nacional (PDN) estabelece a para monitorar a entrada e saída de materi- projeção do Atlântico Sul como central para al ilícito por nossa costa. o país e interessa ao Brasil fazer essa projeção de forma pacífica. Segundo o militar Em seguida, ele falou sobre o SISGARAZ – brasileiro, o Atlântico Sul por anos esteve sistema de monitoramento da Amazônia distante de disputas, mas o mundo come- Azul – que é operado por civis e militares, çou a lançar olhares sobre a região. A exis- atuando como segurança, salvamento, con- tência de depósitos polimetálicos e do pré- trole de pesquisa científica e meteorologia. sal reordenaram o tabuleiro da produção de Abordando a questão da energia nuclear, o energia e minério no mundo. Por exemplo, diretor da Escola Naval afirmou que o Brasil 82% da produção de petróleo do Brasil vêm vê isso como central, e busca desenvolver o do mar. submarino nuclear. Afinal, a capacitação da indústria de defesa tem conseqüências posi- O Atlântico deve ser um elemento de agre- tivas para outros segmentos da economia gação entre países da América do Sul e des- nacional. tes com a África. Neste caso, a pesca é uma atividade fundamental para o Brasil e está Michel Foucher iniciou sua apresentação diretamente ligada ao Atlântico Sul. A de- comentando sobre o perímetro do Atlântico. manda de pescado deve aumentar e a ofer- Para a Europa, Atlântico significaria o norte ta não conseguirá seguir. Oceanos não são e o tratado da OTAN, segurança coletiva celeiros inesgotáveis. Estoques já estão bai- com EUA e Canadá. Mas não haveria uma xos e a proteção da vida marinha ainda não questão central entre os países da região. A foi incorporada como questão central para o cooperação teria sido muito efetiva, por isso país. O Brasil deveria assumir o protago- teria que se olhar para o Sul. O analista nismo no debate sobre o balanço da produ- francês identificou uma crescente importân- ção e limites sustentáveis da pesca no A- cia das questões relativas aos mares e do tlântico. Atlântico Sul. Duas semanas antes da conferência, referendando a importância que as No que tange às ameaças que poderiam questões marítimas assumem para o conti- pairar sobre nosso patrimônio, o contra- nente europeu, a Comissão Europeia lançou almirante falou que não seriam ameaças de o livro verde sobre questões do mar. Ao fa- países inimigos, apenas ameaças difusas, lar sobre as rotas comerciais, o analista sendo os principais temas: francês elogiou a integração do Brasil às principais rotas. O país teria rotas para o 1) Conflito armado: estaria a Estratégia Na- Panamá, Europa, Ásia e África. Por isso, cional de Defesa (END) passível de ser em- considera que o Brasil necessitaria pensar pregada como previsto? de forma mais ampla e não ficar restrito apenas à parte sul do Atlântico. 2) Pirataria: essa questão tem crescido e não passaria desapercebida, mas contaria 11 Ao analisar o impacto na Europa, o Sr. Fou- 50 anos a Marinha brasileira trocaria expe- cher afirmou que naquele continente a notí- riências com a Marinha estadunidense. Os BRASIL cia sobre cooperação no Atlântico Sul é bem EUA teriam transferido a operação Panamá DANIEL EDLER recebida, pois é vista como uma boa forma e os exercícios no Caribe a um almirante GUSTAVO BEZERRA de combater ameaças à segurança. Esta brasileiro. Todas as atividades da Marinha situação deixa evidente que existem inte- brasileira teriam observadores dos EUA e da resses europeus compartilhados com Brasil Europa. Haveria um grande intercâmbio de e a África, que não estão restritos à explo- informações e desenvolvimento de sistemas ração dos recursos, mas com a construção de dados e monitoramento compartilhado de confiança mútua. A Europa buscaria coo- da região. Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. Setembro 2012 www.kas.de/brasil peração política e operacional com os dois lados do Atlântico Sul. Michel Foucher afirmou haver uma política externa estadunidense mais assertiva para Uma pessoa da platéia perguntou: “O Minis- a África. A IV frota segue essa lógica, au- tério da Defesa do Brasil, nesta mesma con- mentando a presença estadunidense na re- ferência, se colocou bastante resistente a gião. Mas a realidade global seria diferente. qualquer diálogo com a Europa e a OTAN EUA teriam redistribuído sua frota para au- para cooperação na região. Em temas de mentar a presença no Pacífico, compondo segurança, há espaço para diálogo Brasil- 60% no Atlântico e 40% no pacífico. Europa?” O professor Valladão afirmou que o Brasil quer atuar no Atlântico Sul e neces- Annette Leijenaar afirmou que o Brasil é sidade de capacidade para operar. Por en- percebido de forma positiva na costa da Á- quanto não tem espaço para esta coopera- frica, principalmente na África do Sul, de ção, mas bloquear a região é insustentável maneira que não é visto como um ator que e não interessa ao país. Se não podemos trará uma resposta ocidental - no sentido assumir capacidade de governança, outros pejorativo do termo. Parceiros africanos ve- o farão. riam uma parceria com o Brasil de forma muito mais positiva, de resultados menos O Contra-almirante Viveiros afirmou que o vultosos para o desenvolvimento. Brasil não quer proibir os demais de atuarem, mas garantir que a atuação seja multi- Um funcionário da Petrobrás fez a pergunta: lateral através da cooperação com Brasil, “A pirataria no golfo da Guiné tem aumen- América do Sul e África. Sozinhos, Europeus tado e prejudica a expansão da presença e EUA não serão capazes de ocupar o espa- brasileira na região, principalmente na ex- ço e não poderão combater as ameaças que ploração de petróleo. Os piratas da Nigéria eles identificam para si próprios. Por outro e de Benin também são prejudiciais por fo- lado, o Brasil já teria identificado a necessi- carem principalmente em embarcações de dade de capacitar-se e tem operado nesse combustível. O que a Marinha faz quanto a sentido, principalmente através do aprimo- isso?” O Contra-almirante Viveiros afirmou ramento da Marinha. Temos programas ou- que a Marinha estaria atenta a isso, visto sados, como o submarino. Com nossa capa- que há constante troca de informações com cidade melhorada, nenhum país poderá a- os Estados africanos e o aumento de nossa tuar ignorando os interesses brasileiros. capacitação para preservar os interesses brasileiros. Estudos e doutrinas para au- O professor Kai Kenkel fez a pergunta: mentar a participação do Brasil no combate “Como a reativação da IV frota muda o jogo à pirataria estariam sendo desenvolvidos estratégico na região?” O Contra-almirante para ajudar a combater esse problema. afirmou que não se trataria de uma questão de intimidação ou ameaça. Não foi uma no- Michel Foucher afirmou que também a Fran- va invenção, ela já existiu no passado e te- ça teria enormes interesses na região, mo- ria conduzido ações que estariam direciona- tivo pelo qual haveria uma operação per- das à costa ocidental da África. É uma res- manente de frotas europeias na baia de posta às ameaças de atores não-estatais, e Guiné e próximo à Nigéria para lidar com provê assistência humanitária. Há mais de esse desafio. 12 Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. BRASIL Conferência 2: Desafios e oportunidades munidade Econômica dos Estados da África para cooperação estratégica entre o Sul e Ocidental (ECOWAS). A relação com a OTAN o Norte funciona do mesmo jeito, aumentando a capacidade de ação da ONU. Da mesma DANIEL EDLER GUSTAVO BEZERRA Setembro 2012 A mesa foi composta pelo Subsecretário Ge- forma, seria fundamental ter a colaboração ral do Departamento de Operações da Paz dos governos locais, que poderão ajudar em da ONU, Sr. Edmond Mulet; pelo diretor do seus países. Departamento de Pesquisa da NATO Defenwww.kas.de/brasil ce College, Karl Heinz Kamp; e pelo Profes- Os países do Norte já teriam percebido a sor de Relações Internacionais da Universi- importância de participar nestas ações, mas dade do Estado do Rio de Janeiro, Williams os países do Sul precisariam ser mais moti- da Silva Gonçalves. A moderação coube ao vados. O Sul não quer ser só instrumento professor de Relações Internacionais da U- das ações, mas participar dos debates de niversidade de Brasília, Antonio Jorge Ra- elaboração do conceito de intervenção e das malho da Rocha. decisões políticas em conceitos específicos. Antonio Jorge começou as atividades fazen- Para o diretor Kamp, a globalização também do perguntas aos palestrantes: “Qual a vali- ocorre nas políticas de segurança e uma das dade da divisão entre Norte e Sul em um principais atividades da OTAN hoje seria o mundo atual, marcado por desigualdades estabelecimento de parcerias no Golfo, na tanto no Norte quanto no Sul? Não seria Ásia e no Leste Europeu. Seriam parceria melhor pensar em termos de países mais principalmente operacionais, com tratados desenvolvidos e menos desenvolvidos? especificando-, mas que não focariam ape- Mesmo nestes últimos há vantagens compa- nas em temas militares, mas em ciberata- rativas de grande valor estratégico.” ques, segurança energética, proliferação de armas nucleares e terrorismo. O Sr. Kamp “A Conferência Rio +20 tomou nota das me- assinalou que nem todos os parceiros seri- tas do milênio e reforçou a lógica do desen- am democráticos, e que a OTAN preferiria volvimento sustentável. Deixou-nos um não fazer parceria com eles, mas existem possível arcabouço institucional que nos países cruciais com os quais a parceria seria permite promover crescimento econômico inescapável. Ele afirma que a OTAN não tra- com inclusão social e respeito ao meio am- taria seus parceiros de forma igual, pois os biente. Este é o desafio do século. Como diferencia entre parceiros por necessidade cuidar dos bilhões de seres humanos e tam- (Uzbequistão, China) e parceiros por esco- bém do meio ambiente? Realização desta lha (aqueles que partilham de valores). agenda é ameaçada pela crise econômica, mas a Rio+20 aponta para o futuro que não O diretor Kamp chamou atenção para o fato pode ignorar a confluência destes temas.” de que não haveria muitas ligações entre a OTAN e a América do Sul. As relações mais O Subsecretário Edmond Mulet afirmou que claras seriam apenas com a Argentina, haveria consenso de que ninguém é capaz mesmo havendo potencial para mais parce- de lidar individualmente com as questões de rias. Kamp não as estaria defendendo, ape- segurança global. Seria fundamental que a nas apontando. Seria necessário que hou- ONU trabalhasse com organizações regio- vesse diálogo para que os atores de ambos nais, que possuem mais conhecimento da os lados descobrissem as perspectivas para realidade local e permitiriam mais participa- uma parceria. As se descobrir espaços de ção e legitimidade às ações. Esta estratégia diálogo, o Brasil certamente terá um papel teria sido utilizada, por exemplo, em Darfur, fundamental na resposta que será dada. com a atuação da ONU em conjunto com a União Africana. Mesmo no Haiti haveria uma O Sr. Kamp defende que não haja percep- cooperação ampla com países da região, ções erradas sobre a OTAN, pois haveria dado que setenta por cento das tropas vem uma visão de que OTAN seria o braço ar- de países latino-americanos. Na Libéria e na mado dos EUA, que afetaria a soberania da Costa do Marfim há cooperação com a Co- América do Sul. Mas não é assim. A OTAN 13 Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. seria uma aliança política e militar de defesa cional. Trata-se de uma posição bastante composta por Estados comprometidos a a- distinta da do Brasil. BRASIL judar-se mutuamente em caso de ataque DANIEL EDLER externo. A aliança tem atuado em outras A atuação do Brasil entre os BRICS, com a GUSTAVO BEZERRA situações, como na Líbia, mas essa não se- busca de mudança da ordem internacional, ria sua razão de ser. Sendo uma aliança de dificulta a relação com a OTAN. O Brasil de- defesa, defende o território, as pessoas fende o princípio da autodeterminação dos dentro deste território (os terroristas, lem- povos, visto como fundamental para a pro- bra Kamp, atacam as pessoas e não os ter- moção da democracia entre os Estados - ritórios) e defende os interesses vitais dos democracia não é importante apenas dentro Estados membros (aspecto mais controver- dos Estados. O poder armado, afirma o pro- so). fessor Gonçalves, deveria ser usado para Setembro 2012 www.kas.de/brasil dissuadir a utilização das forças armadas, As missões de defesa da OTAN não excluiri- não para ampliar os conflitos. A intervenção am parceria com Rússia, mas esta não po- na Líbia, levada a cabo pela OTAN, foi jus- deria ir contra os interesses de defesa de tamente o contrário. Em nome da defesa algum Estado membro da OTAN. A institui- dos Direitos Humanos um chefe de Estado ção atua em escala global (África, Europa e foi morto a pauladas no meio da rua. En- Ásia), mas precisa trabalhar com consenso. quanto se defendem os Direitos Humanos Há enorme debate interno sobre muitos dos de uns, os mesmos atores recusam-se a temas de segurança. A OTAN não está nas abrir as patentes para remédios de AIDS mãos de nenhum Estado específico, pois é que matam milhares na África. A posição do regional com um horizonte global. Seria um Brasil, por isso, dificilmente vai se aproxi- grupo de Estados independentes e sobera- mar daquela defendida pelos europeus. nos, liderados pelos EUA, mas não dominados. O professor Jorge Ramalho insistiu na pergunta: “como os senhores veêm a possibili- Williams Gonçalves destacou as dificuldades dade de cooperação? Há alguma?” para cooperar com o Norte em temas de segurança. Há uma sensação real de mu- O diretor Kamp afirmou que haveria um ne- dança na política internacional. A rápida as- xo entre segurança e desenvolvimento, mas censão da China é motor de grande parte para a OTAN seria difícil lidar com estas di- destas mudanças, pois implica na perda de mensões conjuntamente. OTAN seria uma posição hegemônica dos EUA (muito preju- organização de defesa, por isso seria neces- dicados pela crise econômica, mas também sário que se trabalhasse com parceiros e em crise política e intensificação do senti- reconhecesse a abordagem mais abrangen- mento antiamericano ao redor do mundo). te da ONU. No entanto, a OTAN seria capaz Para ele, a crise econômica europeia dividi- de promover segurança militar em situações ria a Europa em dois grupos: alguns como a nas quais o desenvolvimento, por causa da Alemanha, que se fortaleceriam com a pró- violência, não poderia ocorrer. No Afeganis- pria crise, e outros que enfrentariam os e- tão e na Síria o argumento seria o mesmo. feitos sociais mais severos dela. A formação dos BRICS também é um sintoma destas O professor Williams, no entanto, insistiu mudanças. Tratar-se-ia de um grupo que que há efetivamente um vínculo entre segu- teria por objetivo remodelar a ordem inter- rança e desenvolvimento. Isso seria reco- nacional com vistas a deixá-la mais justa e nhecido pela ONU desde a década de 1960. equilibrada. Dessa forma, o Brasil estaria Em 1967, quando o Grupo dos 77 obteve a em uma posição muito diferente da OTAN. criação da Unctad, a proposta era justa- Com o fim da Guerra Fria, ao invés de aca- mente nesse sentido: evitar que países bar, a OTAN deixou de cuidar da segurança mais pobres, indefesos ante a força bruta de seus Estados-membros e teria passado a do mercado, entrassem em colapso. interferir em várias regiões do mundo, agindo como uma espécie de polícia interna- Workshop 4: Livro Branco da Defesa e a legislação internacional 14 Esta mesa contou com a presença do chefe da política externa do país. Segundo ele, o da Assessoria de Planejamento Institucional Livro Branco não serve para nortear as rela- BRASIL do Ministério da Defesa do Brasil, General ções do Brasil com outros Estados porque, DANIEL EDLER de Divisão Julio de Amo Júnior; pelo Diretor de acordo com a Convenção de Viena de GUSTAVO BEZERRA do Centro de Direito Internacional (CEDIN), 1969 sobre Direito dos Tratados, recente- Leonardo Nemer Caldeira Brant; pelo diretor mente ratificada pelo Brasil, o país não pode do Instituto de Estudos Europeus e membro abster-se de obrigações internacionais a do Departamento de Direito da Universidade partir de legislação interna, pelo contrário, de Saarland, na Alemanha, Torsten Stein; e devem ser consoantes. Após essa explana- pela professora do Departamento de Estu- ção, o professor apresentou as diferenças dos Globais e do Departamento de Econo- entre as concepções monista e dualista so- mia do Colby College (EUA), Patrice Franko. bre Direito. A primeira apresenta dificulda- A moderação coube ao coordenador da Es- des porquanto percebe que tanto o Direito cola Sérgio Vieira de Mello e do Grupo de Interno quanto o Direito Internacional têm a Análise de Prevenção de Conflitos GAPCon, mesma origem comum e a partir dessa ma- da Universidade Cândido Mendes, Clóvis triz homogênea surgem esses dois ramos Brigagão. do Direito. As dificuldades aí presentes di- Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. Setembro 2012 www.kas.de/brasil zem respeito à forma de explicar um possíO professor Clóvis Brigagão saudou os pre- vel conflito entre os dois direitos. O Dualis- sentes dando-lhes boas-vindas, e questio- mo, por sua vez, ao identificar o Direito In- nou o motivo de não ter sido chamado para ternacional e o Direito Interno como oriun- auxiliar na escrita do Livro Branco, tendo dos de fontes diferentes, possibilita que se em vista que afirmou ser o fundador da á- trabalhe com a noção de incorporação de rea de Segurança Internacional no Brasil. princípios e normas de uma fonte do direito Em seguida passou a palavra ao General para outra. Julio Amo. O professor Stein afirmou que o conceito de O general apresentou o conceito de Livro Responsibility to Protect não é e nem pode Branco, que, para ele, pode ser muito útil ser visto como uma carta branca para a a- para a manutenção da paz, uma vez que tuação e intervenção de atores na realidade informa as capacidades de que dispõe o Es- política de Estados, o que serviria para tado e que esta capacidade não tem por ob- romper por completo a noção de soberania jetivo atacar outros países. Segundo o ge- estatal. Para ele, a importância do Livro neral, o termo White Paper é utilizado desde Branco está em definir as normas de enga- os séculos XV/XVI, mas o seu formato e in- jamento do Estado que o publica, uma situ- formações foram gradualmente sendo alte- ação que, em teoria, suprimiria a importân- rados ao longo do tempo. Em 1996, o Brasil cia do Conselho de Segurança definir as di- publicou o documento Estratégia de Defesa retrizes para as operações de manutenção Brasileira. Na década de 2000 essa estraté- de paz, visto que cada Estado já teria publi- gia foi revista e agora, em 2012, vai ser pu- cadas as suas normas. Ao mesmo tempo, blicado o primeiro Livro Branco da Defesa torna mais fácil a responsabilização quando do Brasil. De acordo com o General, embora um Estado descumprir. o Brasil seja um dos últimos países a publicar um Livro Branco, tendo em vista nosso A professora Franko, por sua vez, ressaltou histórico, somos pioneiros em legislação a- as diferenças entre os temas de Segurança presentando nossa concepção de Defesa. Internacional que existem atualmente. Se- Ele destacou também que a iniciativa do gundo ela, é preciso analisar a realidade por Livro Branco teve origem no Poder Legisla- meio da interação entre três pontos: sobe- tivo, e não no Ministério da Defesa. rania, globalização e produção econômica internacionalizada. Essa é o que ela definiu O professor Leonardo Nemer afirmou que o como a trindade impossível da economia de Livro Branco é uma contribuição que se in- defesa, em um paralelo com a trindade im- sere no artigo 4º da Constituição brasileira, possível da macroeconomia. A definição de aquele que define os princípios norteadores qual aspecto entre os três será preterido é 15 Konrad-Adenauer-Stiftung e.V. central para a definição da estratégia de se- nidade para oficiais cujos subordinados a- gurança do Estado e para a postura que es- jam de forma ilegal. BRASIL te assumirá internacionalmente. Essa reali- DANIEL EDLER dade implica que sempre haverá trade-off GUSTAVO BEZERRA entre esses três aspectos da economia de Defesa. O painel de encerramento foi composto pela chefe da Delegação da União Europeia no Setembro 2012 www.kas.de/brasil Encerramento Para Patrice Franko, o Brasil já tem poder e Brasil, Embaixadora Ana Paula Zacarias; participa dos fóruns internacionais mais im- pela Diretora Executiva do Centro Brasileiro portantes. Nosso setor de Defesa faz parte de Relações Internacionais (CEBRI), Fátima de uma cadeia produtiva e, portanto, é mui- Berardinelli; e pelo Representante da Fun- to difícil manter a autonomia, principalmen- dação Konrad Adenauer no Brasil, Felix Da- te porque o Brasil não tem demanda sufici- ne. ente para criar escala na produção de equipamentos militares. A embaixadora Zacarias afirmou que haveria enorme interesse em continuar com a Após as apresentações, Antônio Carlos Pe- parceria estratégica entre União Europeia e reira, editor-chefe do Estado de São Paulo, Brasil em todas as suas dimensões. Não ha- questionou sobre a necessidade de aumen- veria apenas uma resposta para os desafi- tar o orçamento do Ministério da Defesa, os, devido à complexidade do mundo sem- atualmente o segundo da Federação, como pre em transformação. O desafio da confe- forma de atender os projetos das forças rência foi este: estabelecer um espaço de armadas do país. O Sr. Pereira sugeriu que diálogo. Apesar dos problemas, o mundo se deva repensar o plano de carreira dos estaria melhor porque há mais cooperação. militares, incluindo aí o custei de oficiais a- Nesse contexto, o Brasil seria um parceiro tivos, reservistas e pensionistas, de forma a cada vez mais interessante para a União liberar mais verba para os projetos de mo- Europeia, pois apresenta uma contínua ca- dernização. pacidade de evolução. O general Júlio respondeu-lhe com as espe- Fátima Berardinelli afirmou que o CEBRI es- cificidades do orçamento militar, que tem taria muito satisfeito com os resultados da uma periodicidade diferente do orçamento conferência que se encerrava. Os palestran- dos demais ministérios, e afirmou que a si- tes teriam sido capazes de trazer questões tuação própria de contar com o pagamento muito interessantes para o tema da segu- de inativos no próprio orçamento do minis- rança internacional. Promover debates é tério é situação sui generis entre os outros justamente a missão do CEBRI, e por isso o ministérios, de forma que o orçamento da objetivo de manter a parceria com a Funda- Defesa tende a ser um dos maiores da Uni- ção Konrad Adenauer para a execução da ão. Conferência do Forte de Copacabana. O outro debate que precedeu o fim da mesa Felix Dane afirmou que aquele foi um longo foi levantado por uma aluna de direito da e intenso dia, com discussões paralelas que Universidade Rural do Rio de Janeiro que, trouxeram as várias dimensões dos desafios contrapondo a legislação penal militar brasi- globais de segurança. Isso seria fundamen- leira com as previsões existentes no Tratado tal para aproximar as posições. Agradeceu a de Roma que fundou o Tribunal Penal Inter- todos os participantes, equipes e palestran- nacional, questionava sobre a atualização tes e deu por encerrado o evento, afirman- daquele de forma a adequar-se a este, em do esperar que esta experiência se repita especial no que diz respeito à possibilidade nos próximos anos. de responsabilização penal de oficiais comandantes sobre as ações dos seus subordinados. Neste caso, o General Júlio afirmou é um tema da alçada do Ministério da Justiça, mas combateu a noção de que há impu-