O ENSINO DE FILOSOFIA NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL Juliana Franchi da Silva1 Daniel Arruda Coronel2 Resumo: Nos dias atuais, a filosofia vem ganhando uma crescente importância na educação, já que havia perdido sua relevância durante o período ditatorial do Brasil e extinta por muito tempo dos currículos escolares. Esse contexto de discussão ganha espaço nos debates entre educadores, educandos e em muitos outros setores da sociedade que se preocupam com os novos rumos da educação no país, defensores da necessidade de uma visão mais humanizadora, voltada para o desenvolvimento do senso crítico das novas gerações que irão coordenar o processo político e democrático do país. Não basta a obrigatoriedade do ensino da filosofia se não se desencadear em cada pessoa o maior dos desafios que é o de criar a cultura da sensibilidade e humanidade. Portanto, o ensino de filosofia no contexto das políticas públicas através dos investimentos em educação torna-se importante hoje numa tentativa de mostrar que a ação educativa possui preocupações em direcioná-lo para a dimensão dos valores da dignidade humana e do desenvolvimento da cidadania. Palavras-chave: Filosofia. Investimentos em Educação. Políticas Públicas. Introdução Apesar da introdução da filosofia nas escolas se dar de forma lenta, os educadores já reconhecem que a filosofia na formação educacional pode produzir grandes resultados. Ela estimula a discussão de conceitos através de debates, dando oportunidade de descobrir os ideais que possibilitarão o desenvolvimento intelectual necessários ao exercício da cidadania. 1 Graduada em Filosofia – Licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Bacharel em Ciências Econômicas (UFSM), graduanda em Ciências Sociais, Especialista em Pensamento Político Brasileiro (UFSM), aluna do Mestrado em Integração Latino-Americana-MILA-UFSM, Santa Maria – RS. Brasil. Bolsista da Coordenação de Pessoal de Nível Superior (CAPES). E-mail: [email protected] 2 Bacharel em Ciências Econômicas (UFSM), aluno do Mestrado em Agronegócios, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Acadêmico de Filosofia-Licenciatura Plena (UFSM) e Bolsista da Coordenação de Pessoal de Nível Superior (CAPES). E-mail: [email protected] 2 No entanto, a filosofia passa por um momento de análise. A própria filosofia abre espaços para as discussões a respeito dos conteúdos e metodologias que formam o corpo da disciplina, contemplando uma característica peculiar própria, uma vez que, epistemologicamente empreende um caráter crítico. A sociedade brasileira, por sua vez, absorvida pelo dilema da sociedade do conhecimento, prima por uma educação voltada para um horizonte de transformações. Analisando os investimentos em educação observa-se que desde a colonização, o empenho dos governantes para a consolidação do ensino da filosofia sempre deixou a desejar quer seja em apoio financeiro, através de materiais didáticos ou apoio institucional, através de leis. Sendo assim, é preciso dar um novo caminho para a educação, através da inclusão do ensino da filosofia em todos os níveis de ensino, em busca da capacidade que só o homem tem de superar a situação que lhe é imposta e não-escolhida. Com a filosofia, o homem surge como ser de projeto, capaz de ser livre e de construir o seu destino. Um breve comentário sobre o ensino de filosofia no Brasil O ensino, de Filosofia, surge no Brasil com a colonização. A Igreja Católica através dos jesuítas foi quem transmitiu os conhecimentos filosóficos, contudo observa-se que a mesma usou a filosofia como forma de propagar sua doutrina desvirtuando-se completamente do objetivo do filosófico. No Brasil, inicialmente, a filosofia fazia parte do chamado curso de arte oferecido pelos jesuítas aos estudantes que concluíam o primeiro nível de letras humanas. Esse curso estava voltado para a elite do Brasil-Colônia, pois a base do ensino de filosofia era a tradição escolástica. Esse ensino inspirava-se nos ideais da Contra-Reforma e favorecia o dogmatismo e a reafirmação da autoridade da igreja e dos clássicos. Com a ascensão política do Marques de Pombal, ao Ministério Português várias reformas administrativas foram feitas, principalmente na política educacional, incluindo o ensino de filosofia que sofreu alterações de ordem programáticas e metodológicas. Segundo Paim (1979, p. 22): A reforma pombalina trouxe como resultado a formação não apenas de numerosos naturalistas, que chegaram a ganhar notoriedade na Europa a exemplo de José Bonifácio de Andrade e Silva e Alexandre 3 Rodrigues Ferreiro, como também de uma elite dotada de nova mentalidade. Essa elite iria marcar profundamente nossa posterior evolução cultural, em vista de que se transferiu para o Rio de Janeiro, acompanhando a D. João VI, e implantou no Brasil feito Metrópole o conjunto de instituições que marca o apreço pela ciência aplicada. Com a expulsão dos jesuítas, por Pombal, no século XVIII, persistiu no Império e na República o ensino de filosofia aristotélico-tomista e a educação permaneceu elitista, desligada da realidade pelo qual passava o país. Na década de 20, do século XIX, a filosofia passou a ser disciplina obrigatória do ensino médio e pré-requisito para ingressar em curso superior. Em 1834, já no período regencial, são criados os cursos profissionalizantes e para ingressar nos mesmos, o secundário é pré-requisito, sendo a filosofia uma disciplina obrigatória. Com o advento da República e o contato com os intelectuais europeus e o surgimento de novos pensadores brasileiros o ensino de filosofia começava a voltar às salas de aula, porém não por muito tempo, pois o mesmo era obrigatório somente para o curso de Direito. No século XX, a Reforma de 1915 transformou a filosofia como uma disciplina facultativa. Em 1932 houve uma tentativa de reverter tal quadro. A Escola Nova colocava-se como tendência renovadora diante da situação econômica do Brasil (crise do modelo agroexportador e início da industrialização) que necessitava de uma melhor escolarização. Segundo Aranha (1996), com a Reforma Capanema, em 1942, o ensino secundário dividiu-se em ginásio (quatro anos) e colegial (três anos) que se subdividia em científico (ciência) e clássico (humanidades). A filosofia, nesse contexto, ressurgiu como uma disciplina obrigatória em um ano do científico e dois do clássico, atingindo uma carga-horária de quatro aulas semanais. No entanto, inúmeras portarias foram reduzindo de modo gradativo o número de horas-aula e de séries com filosofia, por fim, restrita ao último ano. Com a ditadura, a filosofia passa por seu momento mais critico, os governantes investiram maciçamente no ensino superior, não com o intuito de incentivar o debate acadêmico e a pesquisa científica, mas sim para demonstrar que havia um clima de milagre econômico que posteriormente comprovou-se falacioso. No ano de 1961 foi promulgada a primeira Lei de Diretrizes e Bases, a de nº4. 024, segundo a qual o ensino de filosofia perdia a obrigatoriedade, tornando-se uma disciplina complementar e incorporada mediante indicação de cada Conselho Estadual de Educação. 4 Mas foi com o Golpe Militar que se restringiu ainda mais o campo do ensino de filosofia, tornando-se disciplina optativa em 1968, para ser extinta pela lei 5.692/71. Esta lei introduziu o ensino profissionalizante segundo a tendência tecnicista, implantada mediante assessoramento de técnicos norte-americanos, isto é, os acordos MEC - Usaid. A extinção da filosofia no 2º Grau se deu em um contexto amplo, desprestigiada da universidade e com perseguições aos professores. De acordo com Chauí (1978, p.155): (...) Sistematicamente cortados de uma relação significativa com a linguagem e com todas as vias expressivas, os jovens estudantes não sabem ouvir, ler e escrever. (...) Impedidos de um acesso verdadeiro a linguagem, estão impedidos de um acesso verdadeiro ao pensamento e, conseqüentemente, da possibilidade de alcançarem o real, sempre confundido com os dados imediatos da experiência. No entanto, a lei 5.692 não atingiu o objetivo que anunciara como principal: a profissionalização. Mas, conseguiu deteriorar a qualidade da escola pública. Também, no período da vigência da lei poucas foram as escolas particulares que conseguiram manter a disciplina de filosofia. Houve então, uma reação através de movimentos, protestos e contatos com autoridades do governo a favor do retorno da filosofia no 2º Grau por parte da Sociedade de Estudos e Atividades Filosóficas (SEAF), Universidade de São Paulo (USP), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Rio de Janeiro(PUC-SP e PUC-RJ), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e outras entidades. Somente em 1982, a lei 7.044 permitiu a reinserção da filosofia no currículo a critério do estabelecimento de ensino, abrindo oportunidade para o gradual retorno da disciplina, ainda de forma precária na maioria das vezes. Nas palavras de Guido (2000, p.1): A obrigatoriedade do ensino de filosofia não é a solução para as deficiências crônicas da vida brasileira e da sua menoridade que se mostram bem concretas no trabalho escravo, no desemprego, na violência urbana, na corrupção e entre tantos males. Mas o ensino de filosofia pode contribuir para o fortalecimento da tímida democracia brasileira, este ensino nunca foi tentado seriamente (...).As experiências históricas apresentam apenas experiências em contextos isolados, como os seminários coloniais, aos poucos liceus imperiais, o secundário clássico das primeiras fases da República. Somente a partir da queda do ensino profissionalizante, em 1982, é que começou 5 efetivamente a discussão pela introdução do ensino de filosofia nas escolas secundárias (...). De acordo com a promulgação da LDB 9.394/96, um inciso refere-se explicitamente a Filosofia. A lei destaca a importância da formação para o exercício da cidadania, a difusão dos valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos e de respeito ao bem comum e a ordem democrática, bem como recomenda o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico. Segundo Lipman (1999, p.28): Numa era em que a maioria das humanidades foi colocada contra a parede, ela tem conseguido se manter a salvo – ainda que de forma moderada – principalmente por ter-se convertido numa indústria de conhecimento. O preço da sobrevivência foi alto, a filosofia teve de abdicar de toda reivindicação de exercer um papel socialmente significativo (...). A despeito de sua contínua impotência social, a filosofia permaneceu, em seu próprio domínio, uma disciplina de incrível riqueza e diversidade. Apenas nos últimos séculos é que surgiu um novo sinal sugerindo que a filosofia tem aplicações práticas jamais imaginadas pelos acadêmicos, e aqui e ali existem aqueles que ficam maravilhados diante do vasto panorama de sua aplicabilidade. Embora, sem a obrigatoriedade, muitas escolas de segundo grau estão incluindo a filosofia como disciplina em sua grade curricular e a própria Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), que é pioneira em formas alternativas de ingresso ao ensino superior com o Programa Experimental de Ingresso ao Ensino Superior (PEIES)3, vai incluir no vestibular e no PEIES questões de filosofia. Esta atitude é exemplar, pois motiva os alunos a estudar mais, os professores a buscarem qualificação e também contribui para diminuir o desemprego porque mais profissionais serão necessários nas escolas e cursos pré-vestibulares. Nesse sentido, a disciplina de filosofia merece cada vez mais ser discutida e levada a sério tanto sob o ponto de vista na formação do educando, onde ele possa obter domínios do conhecimento e exercer a cidadania; quanto aos seus conteúdos, metodologias e formas de avaliação. Para que isso seja possível, vai depender de iniciativas por parte de todos os setores 3 É uma forma alternativa ao vestibular, de ingresso ao ensino superior, onde são reservados 20% das vagas de cada curso aos alunos que optarem por esta forma alternativa, tendo como coordenador geral o Professor Dario Trevisan de Almeida. 6 interessados pelo desenvolvimento de um processo educativo coerente com os propósitos apontados pela educação. A filosofia e sua importância O século XXI abre-se ao tempo e à história, ainda marcado pelos estigmas do século passado, em que as guerras, a acumulação de rendas, os totalitarismos, o uso perverso das ciências, a intolerância religiosa, a solidão existencial, todas essas realidades vivenciadas pelas sociedades humanas ainda marcam o universo de agir e de significar a vida. Essas sociedades acumulam contradições e injustiças sociais, padece-se de fome em muitos países, doenças possíveis de erradicação continuam a matar e a fazer da miséria a causa dessas realidades. As cidades crescem sobre relações frias e normas impessoais, a violência atinge índices nunca antes pensados, o progresso moral não acompanhou o tecnológico. Esse cenário desafia a todos os cidadãos, para a necessidade de uma reflexão sobre o comportamento moral, sobre os costumes e sobre os parâmetros da ação e vivência em sociedade. No decorrer de sua constituição, a filosofia passou a ser uma disciplina geradora não apenas de conhecimentos teóricos, mas absorveu muitas implicações da natureza práticosocial. Ela não se constituiu numa área restrita a essa ou aquela formação devido ao seu caráter interdisciplinar. A filosofia amplia as relações entre a educação e a sociedade, unindo o saber e o fazer que são elementos essenciais na construção do social. Diante desse contexto, Freire (1999) aponta a educação como construtora e reconstrutora da sociedade através do conhecimento e, conseqüentemente, da prática dos valores éticos e morais. Para ele, a prática educativa deve ser voltada para o social. A inclusão da filosofia significa o início de uma mudança, através de uma proposta de reflexão, no campo histórico e institucional da filosofia, em pautar as grandes questões da ação humana, como a liberdade, a escolha, a autonomia moral, a religião, o bem e o mal, etc. Mas esta proposta, talvez leve algumas pessoas a considerarem que só os alunos de ciências humanas deveriam se ocupar com seu estudo, e não os futuros engenheiros, médicos, comerciantes, técnicos e profissionais da área de ciências exatas e biológicas. Ao contrário, a iniciação filosófica é muito importante para a formação integral de todos os alunos, onde os mesmos são convidados a pensar suas próprias vidas e a sociedade onde devem inserir-se como sujeitos éticos e políticos. 7 A filosofia viveu três grandes momentos, inicialmente retorna-se a Grécia4, onde o homem desejava apenas o saber. No século dezessete, com a modernidade, a filosofia passa a ser definida de outra maneira, vive-se um momento histórico marcado pelo capitalismo mercantil e com a idéia de conquista e apoderação da natureza na tentativa de dominá-la pelo conhecimento, onde através do conhecimento filosófico justifica-se a ciência. E no Século XX, os impasses da ciência e das artes, a precariedade das religiões, a idéia de uma revolução utópica e a política de libertação transtornam um mundo que parecia dominado, explicado e controlado. A filosofia se torna a busca da origem, causa e forma de todas essas crises, onde a sua peculiaridade é a de ajudar fazer falar as outras manifestações do conhecimento. Entretanto, no mundo contemporâneo, marcado pela tecnocracia e pelo discurso ideológico, não há espaço para o homem discutir de maneira ampla as questões que surgem a sua volta. Desse modo, a educação precisa cada vez mais priorizar uma educação desmistificadora que possa servir de base para o enfrentamento dos desafios existenciais de toda uma cultura. A educação sugere novas formas de recriação cultural que possa ultrapassar a relação entre os indivíduos, a exploração do homem pelo homem e da natureza, a fim de resgatar a verdadeira identidade do ser humano. Neste contexto, destaca-se o caráter importante da filosofia no desenvolvimento do educando hoje. O papel da filosofia seria o de preparar não só intelectualmente, mas politicamente para desempenhar uma prática social autônoma. No entanto, segundo Lipman (1999, p.33): Se examinarmos nosso sistema educacional (...) seremos obrigados a concluir não apenas que é imperfeito, mas que suas imperfeições são muito mais responsáveis do que gostaríamos de admitir pelas graves circunstâncias em que o mundo se encontra atualmente. Se lamentamos nossos líderes e nossos eleitores por serem egoístas e não esclarecidos, devemos lembrar que eles são produtos dos lares e famílias, devemos lembrar que os pais e avós dessas famílias são igualmente produtos do mesmíssimo processo de educação. Como educadores, temos uma enorme responsabilidade pela irracionalidade da população mundial. 4 A filosofia originou-se e desenvolveu-se num período da história dos gregos em que a pauta das discussões voltava-se para as questões de poder e da necessidade de dirigir a pólis tendo como horizonte o bem comum. No entanto, comparando essa afirmação com os acontecimentos empreendidos pela filosofia, percebe-se que a mesma assumiu um lugar bem distinto daquele que a impulsionou na Antigüidade, isto é, o alcance do cidadão. 8 A atividade crítico-reflexiva por muito tempo foi abandonada a um segundo plano e negligenciada acarretando graves lacunas na formação do educando. Essa é uma grande preocupação dos teóricos educacionais da atualidade. Esses teóricos consideram a necessidade da construção de formas alternativas no que tange a educação e sua dimensão sócio-política. No entanto, fora dos padrões da razão totalizadora, com um mundo totalmente fragmentado, rompeu-se o mito da unidade pela unidade, da instrumentalização. Diante desse novo horizonte, admite-se a fragmentação, sem prescindir da atualização e reflexão em relação aos paradigmas atuais como condição mínima de enfrentamento dos núcleos geradores da transformação no delinear do processo educativo. De acordo com Cunha (1992, p.63): O homem precisa buscar-se na sua essência. Marx anuncia que a essência do homem nada mais é do que a totalidade de sócios de desenvolvimento incluindo suas condições naturais de sua constituição biológica. Em lugar do conceito de natureza impetuosa que desabrocha miseravelmente, mas de uma condição que o contexto histórico propõe, cria e mantém. Somos civilizados porque somos formados em culturas civilizadas, seríamos selvagens se fossemos formados de culturas selvagens: a idéia de evolução linear aqui não faz o menor sentido. Podemos estar em condições civilizadas hoje e nas mais negras condições de barbárie amanhã. A essência do homem constitui-se nas condições concretas que fazem parte de seu momento histórico, porém, se o homem não aprender a refletir e conhecer a fundo a realidade em que vive não conseguirá encontrar sua identidade. O homem precisa conhecer sua realidade para atuar com autonomia. Segundo Arroyo (1991), na escola é que deve prevalecer o princípio da educação, uma vez que é na escola que as pessoas vão em busca do saber. Dentro dessa ótica, Gramsci (1989) aponta que a escola possui poder para formar ou deformar a sociedade, na medida em que ela é a promotora de uma interação ampliada com os homens. Uma questão que deve ser observada refere-se ao que ensinar. Nesse sentido, a preocupação não deve ser a de repassar ao educando apenas os conceitos da filosofia, mas desenvolver habilidades e competências necessárias para o seu crescimento autônomo, para que ele desenvolva a capacidade de atuação crítica frente aos desafios impostos pelo contexto sócio-cultural do qual faz parte. 9 Conhecer o humano é antes de mais nada, situá-lo no universo e, não separá-lo dele. Nesse sentido, o que ensinar, deve estar ligado ao contexto onde o mesmo deve ser desmistificado rompendo os entraves de seu fundamento e trazendo a experiência intelectual. Desse modo, a filosofia pode ser trabalhada a partir de seus próprios fundamentos, uma vez que, traz em sua gênese a necessidade de trabalhar o momento vivido pelos homens, porque a sua finalidade frente ao homem e ao mundo perpassa os séculos (Morin, 2001, p.47). É preciso ter cuidado para não cair no reduto da história em si, ou dos conceitos sob pena de diminuir ou desprezar o espaço da reflexão, do debate, da recriação e da contextualização, bem como do conhecimento. A exploração dos temas é que permeia o cenário atual, ou seja, a filosofia é epistemologicamente uma ciência crítica, mas, se desvinculada do contexto histórico do educando poderá ter sua abrangência reduzida apenas ao conhecimento sistemático dos fatos. Contudo, o estudo da filosofia é essencial porque não se pode pensar em nenhum homem que não seja solicitado a refletir e agir na busca da superação da consciência ingênua e no desenvolvimento da consciência crítica, pela qual a experiência vivida é transformada em experiência compreendida, isto é, em um saber a respeito dessa experiência. Em última análise, cabe à filosofia fazer a crítica da cultura. Só assim será possível desvelar as formas de dominação que se ocultam sob a alienação, o convencionalismo e a ideologia, por isso, qualquer que seja o projeto de vida ou a atividade profissional futura, enquanto pessoa e cidadão, o aluno precisa da reflexão filosófica para o alargamento da consciência crítica, para o exercício da capacidade humana de se interrogar e para a participação mais ativa na comunidade em que vive. A filosofia exige coragem. Filosofar não é um exercício puramente intelectual. Descobrir a verdade é ter a coragem de enfrentar as formas estagnadas do poder que tentam manter o status quo, é aceitar o desafio da mudança, saber para transformar. É à busca da verdade, não a sua posse, quem se dedica à filosofia põe-se à procura do homem, escuta o que ele diz, observa o que ele faz e se interessa por sua palavra e ação, desejoso de partilhar do destino comum da humanidade. Eis porque a filosofia deve permanecer nos currículos, não propriamente para preparar futuros filósofos, mas sim para dar subsídios para o aprimoramento da reflexão filosófica inerente a qualquer ser humano. 10 Considerações Finais Após um breve histórico da filosofia no contexto educacional, percebe-se que essa disciplina teve um papel restrito e esteve voltada a interesses políticos e econômicos em diferentes épocas da história do Brasil. Atualmente, ela passou a apresentar um novo caráter no contexto educacional. Ela não está mais voltada ao ensino técnico, pois surgem preocupações em direcioná-la para a dimensão dos valores da dignidade humana e do desenvolvimento da cidadania. A LDB foi importante para chamar a atenção da importância do ensino de filosofia, porém os problemas continuam; e só serão resolvidos quando os educadores e os legisladores se empenharem em efetivar a filosofia em todos os níveis dando condições estruturais para que os mestres tenham a árdua tarefa de ensinar os alunos a pensar filosoficamente. A filosofia é importante para o desenvolvimento de uma sociedade melhor onde predomine o diálogo, a discussão filosófica, numa reflexão sobre comportamentos morais e éticos com parâmetros em nossas ações e vivências sem autoritarismos e com liberdade e autonomia. O ensino de filosofia é fundamental para a consolidação da democracia, para a discussão de temas pertinentes e para o desenvolvimento do pensamento social e político da nossa sociedade. Sendo assim, a filosofia é de vital importância para a educação em todos os seus níveis de ensino. Ela obedece a um esforço no sentido de questionar, debater os problemas referentes à existência humana, isto é, desenvolver um espírito crítico, suscitando a liberdade para o exercício da democracia. Referências bibliográficas ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação. São Paulo: Moderna, 1996. ARROYO, Miguel (Org.). Trabalho, Educação e Prática: revendo os vínculos entre trabalho e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. CHAUI, Marilena. Revista Discurso, Departamento de Filosofia da USP, nº8, São Paulo, 1978. CUNHA, José Auri. Iniciação à Interrogação Filosófica, São Paulo: Atual, 1992. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários a prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1999. 11 GRAMISCI, Antônio. Os Intelectuais e a Organização da Cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1989. GUIDO, Humberto. 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