Avaliação da Aprendizagem: como os pais dos alunos da Educação Infantil vêem esse processo? Priscila Ximenes de Souza1 Elizabeth Varjal2 Resumo Este estudo teve como objetivo apreender a compreensão dos pais sobre o processo de avaliação da aprendizagem dos alunos da Educação Infantil da Unidade Executiva do SESC Casa Amarela/PE. Ancorado na técnica de estudo de caso, foram feitas observações da rotina escolar e formulados questionários com questões fechadas e abertas entregues à professora, às duas gestoras e a um dos pais de cada um dos 20 alunos matriculados na turma de alfabetização. As respostas foram analisadas e categorizadas de acordo com os teóricos referenciados ao longo do trabalho de pesquisa. Os resultados apontaram que uma parcela considerável dos pais compreende a avaliação numa perspectiva emancipatória, visto que não a tem como um acontecimento pontual, métrico, estático e único, mas como um processo que visa construir e reconstruir o saber de todos os envolvidos sejam eles alunos, professores ou familiares. Palavras-chaves: Educação Infantil, Avaliação da Aprendizagem, Compreensão dos Pais. Introdução O presente estudo apresenta reflexões sobre o processo de avaliação da aprendizagem na Educação Infantil, detendo-se na ótica dos pais dos alunos desse nível escolar. Originalmente o trabalho compreendeu tanto a pesquisa bibliográfica quanto a de campo. Esta última realizada ao longo de seis meses na turma de alfabetização da Unidade Executiva do SESC – Casa Amarela, onde, através da técnica de estudo de caso, foram realizadas observações formais e não-formais da rotina escolar. Do mesmo modo, foi realizada a aplicação de um questionário, com questões fechadas e abertas, à professora, às duas gestoras e a um dos pais de cada uma das vinte crianças matriculadas nesta turma no ano de 2006. A pesquisa objetivou apreender a compreensão dos pais sobre o processo de avaliação da aprendizagem, tendo especificamente o interesse em identificar o significado da avaliação para os pais, no contexto próprio da Educação Infantil, bem como os fatores que têm influenciado tal compreensão. Concluinte de Pedagogia – Centro de Educação - UFPE – [email protected] Profª Drª Adjunta do Departamento de Psicologia e Orientação Educacionais – Centro de Educação – UFPE – [email protected] 1 2 2 Além disso, buscou identificar o grau de participação desses pais no processo avaliativo adotado pela escola, no sentido de entender como suas compreensões têm interferido no processo de ensino-aprendizagem. A respeito disso, partimos da concepção de que a avaliação é relação social entre vários atores e, por isso, demanda a participação de todos os envolvidos: os sujeitos do processo e os parceiros do mesmo (professores, alunos e família). Assim, é vital considerar a avaliação como um processo interativo, através do qual, educadores e educandos aprendem sobre si mesmos. Como afirma Melchior (1994), “A avaliação deve ser um processo holístico, não fragmentado, contextualizado nos processos de ensino e de aprendizagem, de forma democrática, onde todos os elementos envolvidos avaliam e são avaliados, conforme os valores e os pressupostos do projeto pedagógico.” (p.39) Conceber a avaliação como processo de interação permite superar a visão ainda existente em nossa cultura escolar onde o poder de avaliar é apenas do professor, que no papel de juiz, determina se o aluno é bom ou ruim, se está aprovado ou reprovado. Ao aluno, resta ouvir sua sentença, sem direito a questionamentos. E, por fim, os pais são apenas comunicados dos resultados, através de uma reunião ou, então, ao receber o boletim do filho. Entretanto, entendendo a educação como um direito e repensando o sentido da avaliação em um projeto educativo que conceba a escola em sua dimensão plural, ver-se-á que o ato avaliativo será mais democrático quando se compartilha o poder. Em vista desta democratização, teóricos recomendam utilizar a hetero, a co e a auto-avaliação3 (Casanova, 2002), onde devem atuar, respectivamente, o professor, os pais e o aluno. Através dessa prática os professores além de refletirem sobre sua própria ação pedagógica, agem como investigadores da história e das conquistas de cada criança. Os pais e a família assumem a função de co-avaliadores, compreendendo os processos e os princípios da 3 Termos utilizados para classificar a avaliação conforme os agentes/sujeitos envolvidos. Na heteroavaliação apenas o professor avalia os alunos, na auto-avaliação cada aluno avalia seu aprendizado e na co-avaliação tanto o professor, quanto os alunos e, no caso da Educação Infantil, também os pais participam da avaliação. 3 avaliação. E, os alunos passam a ter mais condições de participar do seu processo de aprendizagem. Essa perspectiva no contexto da Educação Infantil tem demonstrado a importância, ou melhor, a necessidade de que a família interaja com a escola nesse processo contínuo e não circunstancial, haja vista o grau de maturidade dos alunos nesse nível escolar. Diante disto, supúnhamos inicialmente que os pais pesquisados tinham um entendimento superficial e desconexo tanto em relação à prática avaliativa observada na escola, quanto às concepções de como se deve avaliar. No entanto, foi possível observar, através da análise dos dados coletados, que uma parcela significativa desses pais tem uma compreensão clara da avaliação entendida como um processo contínuo que visa dar subsídios para o enriquecimento do processo de ensino-aprendizagem e que esta envolve a participação de vários sujeitos. Assim, iniciamos este estudo com um passeio pelo campo teórico da avaliação da aprendizagem e da participação familiar, onde destacamos as referências feitas à área de Educação Infantil. Posteriormente, trazemos os dados encontrados na realidade pesquisada, analisando e discutindo-os a fim de desvelar os múltiplos aspectos que envolvem a problemática em questão. Avaliação da Aprendizagem Como território de passagem das mais diversas abordagens, o campo da avaliação vem, com o passar do tempo, suscitando discussões e reflexões acerca de seus métodos, processos e concepções, tendo em vista a ação docente e a finalidade mesma desta prática. O entendimento de que o processo avaliativo não se dá num vazio conceitual, mas, ao contrário, dimensionado por um modelo teórico de mundo e, portanto, de educação com possibilidade de ser traduzido em prática pedagógica nos leva a analisar o fenômeno – avaliação, dicotomizando-o em dois grupos, um referente a visões de mundo positivistas e outro a visões de mundo dialéticas (Romão, 1999; Luckesi, 1998). Perseguidor de “verdades absolutas” e “padronizadas”, a epistemologia positivista tende para um sistema educacional onde a avaliação está baseada no julgamento de erros e acertos que levam a prêmios e castigos. Esta postura 4 seletiva, cujo uso é desaconselhável em sala de aula, pode ser observada em Bradfield & Moredock (1963) ao definir a avaliação como “processo de atribuição de símbolos a fenômenos com o objetivo de caracterizar o valor do fenômeno, geralmente com referência a algum padrão de natureza social, cultural ou científica.” (p.16) A teoria dialética do conhecimento, por outro lado, tende a um sistema educacional preocupado com a criação e a transformação, onde a avaliação está baseada na observação de desempenhos, em situações específicas, cujos sucessos ou insucessos são igualmente importantes para a escolha das alternativas seguintes. Tal visão formativa pode ser encontrada em Souza (1997) quando afirma que “[...] desponta como finalidade principal da avaliação o fornecer sobre o processo pedagógico informações que permitam aos agentes escolares decidir sobre intervenções e redirecionamentos que se fizerem necessários em face do projeto educativo definido coletivamente e comprometido com a garantia da aprendizagem do aluno.” (p.46) Esta idéia de avaliação também é compartilhada por Sant’Anna (1995) quando considera que “A avaliação consistirá em estabelecer uma comparação do que foi alcançado com o que se pretende atingir. Estaremos avaliando quando estivermos examinando o que queremos, o que estamos construindo e o que conseguimos, analisando sua validade e eficiência (=máxima produção com um mínimo de esforço).” (p.23) Ante estas duas perspectivas verificamos que a última tem sido a linha norteadora do discurso legal instituído em nosso país. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) estabelece, na Seção I, referente às disposições gerais da Educação Básica, artigo 24, que um dos critérios a ser observado na verificação do rendimento escolar é: “avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos 5 qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais”. De forma mais específica ao que este estudo pretende, encontramos na Seção II, referente à Educação Infantil, artigo 31, que: “a avaliação far-se-á mediante o acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental”. O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, assim como os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental, visando atender e complementar as determinações desta lei enfatizam a idéia de que o propósito da avaliação não é o de aprovar ou reprovar, mas o de acompanhar os alunos em seu processo de desenvolvimento, na manifestação de condutas que expressem capacidades de ordem cognitiva, física, afetiva, de relação interpessoal, ética e estética. Esta abordagem legal, do ponto de vista teórico, está dimensionada num campo conceitual bastante amplo, onde é possível perceber que as variações conceituais são resultantes da diversidade de estudiosos do tema. Dentre esses estudos, temos o pensamento de Luckesi (1998) que concebe a avaliação numa perspectiva diagnóstica, pois tem como finalidade fazer com que o professor conheça o ponto de partida de seus alunos, nas sucessivas etapas, durante o processo, para identificar seus limites e possibilidades, a fim de oportunizar condições para melhorar a sua aprendizagem e o processo educativo. Essa concepção identifica-se com a definição de avaliação mediadora apresentada por Hoffmann (1991), uma vez que, para a autora, o processo avaliativo deve ser desenvolvido para beneficiar o educando e necessita dar-se fundamentalmente pela proximidade de quem educa e de quem é educado. Tendo, a partir desta ação interativa, a intenção de investigar, problematizar e, principalmente, ampliar o processo de construção do conhecimento. Entretanto, abrindo um horizonte maior, Marta Darsie (1996) propõe uma avaliação que seja uma atividade de metacognição, assim como Perrenoud (1999) ressalta uma avaliação que esteja voltada à lógica de regulação da aprendizagem, ao invés, da lógica de fabricação da excelência, onde o aluno toma consciência de onde partiu, o que construiu e como construiu. 6 ”É a avaliação que irá impulsionar o processo de construção dos conhecimentos no qual o aluno acompanha seu próprio processo de construção, e de reconstrução, bem como seus ganhos e perdas, sucessos e fracassos, reorientando-se permanentemente.” (Darsie, 1996, p.50) Dessa maneira, além de constituir-se em instrumento de aprendizagem, porquanto dá a oportunidade do educando acompanhar seu próprio desenvolvimento, esta avaliação coloca-se como instrumento de investigação didática, pois revela os erros e acertos de quem organiza e de como organiza o ensino. Nesse conjunto de conceituações, Casanova (2002) adverte-nos para uma avaliação que, além de detectar os conhecimentos prévios dos alunos, aproximar educandos e educadores, oportunizar o acompanhamento reflexivo e a regulação da aprendizagem e do ensino, deve respeitar, imprescindivelmente, a diversidade do alunado, de maneira que o professor venha a adaptar sua forma de ensinar à forma de aprender de cada aluno. No entanto, este modelo de avaliação que considera as diferenças da população estudantil merece uma atenção ainda maior quando tratado no contexto da Educação Infantil, uma vez que os discentes possuem pouca maturidade e experiência escolar, o que exige do professor uma postura bem esclarecida quanto às características do processo avaliativo. Pois, “Ainda que na aplicação da avaliação se unifiquem diferentes tipologias avaliativas, convém distingui-las para efeitos metodológicos no sentido de identificar qual é a mais indicada em cada caso e, sempre, para saber o que se pretende e o que se pode conseguir com ela quando seu resultado é incorporado a um processo educativo.” (Casanova, 2002, p.15) Assim, vemos que quanto à funcionalidade, a avaliação pode ser formativa e somativa. Na primeira, avalia-se o processo, uma vez que incide sobre ele desde seu começo e ocorre de forma continuada. Visa à melhoria do mesmo, possibilitando o aperfeiçoamento da ação empreendida no momento em que esta acontece. Na segunda, avalia-se o produto final de um trabalho, a fim de determinar a utilidade ou não do que foi conseguido. 7 Quanto ao normotipo, a avaliação pode ser nomotética e ideográfica. A primeira investiga a situação do educando segundo um campo de conduta definido e externo a ele, podendo ser normativa (quando o referente contrastante é o nível do grupo em que este se encontra) ou criterial (quando o referente é o critério de aprendizagem). A segunda, a ideográfica, tem como referente às reais possibilidades de aprendizagem de cada aluno, sendo estes definidos em função de suas características pessoais. No que diz respeito à temporalidade, a avaliação pode ser inicial, processual e final. Como o próprio nome sugere a inicial se dá no começo de um trabalho, buscando conhecer o ponto de partida dos alunos; a processual ocorre de forma contínua, visando perceber o grau de avanço dos mesmos, reorientando e melhorando a intervenção pedagógica; e, a final acontece no término de um processo, com a intenção de identificar os resultados obtidos. Por fim, no que se refere aos agentes, temos a auto-avaliação, a heteroavaliação e a co-avaliação. Na primeira, os alunos analisam a própria construção de seus conhecimentos. Na segunda, o professor ou outro sujeito legitimado avalia os alunos. E, na terceira, tanto o professor quanto os alunos avaliam-se mutuamente. Todavia, no âmbito da Educação Infantil a coavaliação necessita ampliar sua ação aos pais dos alunos, já que estes, por terem pouca idade, precisam do acompanhamento de seus familiares para garantir seu sucesso escolar. Deste modo, compreendemos que na Educação Infantil a avaliação necessita de um tratamento especial, uma vez que “acompanhar a criança em seu desenvolvimento exige um olhar teórico-reflexivo sobre seu manifestações decorrentes do contexto caráter sociocultural evolutivo do e seu pensamento.” (Hoffmann, 1996, p.7). No entanto, observamos que o professor, em sua maioria, tem, por um lado, expressado uma concepção de avaliação emancipatória e, por outro, utilizado do processo avaliativo prendendo-se ao aspecto de avaliação classificatória, muitas vezes percebendo o aluno apenas no seu aspecto intelectual ou afetivo. Desconsiderando, assim que “as crianças apresentam 8 maneiras peculiares e diferenciadas de vivenciar as situações, de interagir com os objetos do mundo físico.” (Hoffmann, 1991, p.83) Por isso, podemos identificar nas fichas de avaliação, tão comuns na préescola, um caráter pouco significativo para os alunos e para os próprios professores, visto que, em geral, não visam provocar mudanças, já que não se constituem em reflexão da ação educativa. Como afirma Marta Darsie (1996), “Por ser reflexão da ação, aqui da ação educativa, podemos inferir que a avaliação torna-se a possibilidade de superação da própria ação e que, se permanente, provocará mudanças na ação educativa, rumo à efetivação de sua intencionalidade.” (p.48) Ao compreender a criança como foco principal de reflexão sobre a ação, o professor redimensiona o seu fazer a partir do mundo infantil descoberto e ressignificado, o que transcorrerá na qualidade de sua interação com a criança e no seu olhar examinador sobre ela. A prática avaliativa, desta forma, realizar-se-á enquanto acompanhamento, incidindo no cotidiano da ação educativa e na absorção da dinâmica da construção do conhecimento, que, portanto, não pode ser entendida como um momento ao final do processo, em que se verifica aonde a criança chegou, definindo sobre ela uma lista de comportamentos ou capacidades, é necessário que a avaliação seja contínua e realizada em todos os momentos do processo de ensino-aprendizagem, tendo funções e propósitos diferenciados em cada um deles. Para tanto, o professor precisa utilizar uma série de instrumentos e técnicas que possam fornecer dados para a análise qualitativa do desempenho dos discentes, a reflexão sobre a própria prática docente, a auto-análise dos estudantes e a realimentação do projeto pedagógico da escola com o devido espaço para a apreciação e participação da família neste percurso. Participação Familiar na Educação Infantil Nos últimos anos, a participação da família tem se inscrito no centro do debate sobre a democratização da escola. A relação entre essas duas instituições vem sendo entendida, acima de tudo, como uma parceria, visto 9 que, juntas “podem favorecer o desenvolvimento da criança em suas dimensões cognitiva, social, afetiva, cultural, expressiva, lúdica, criativa e biológica.” (Porto, 2006, p.99) Contudo, para bem compreender essa perspectiva de cooperação é preciso ter claro que, apesar de muitas vezes se fundirem, a escola e a família são duas realidades que possuem suas características peculiares, complementares entre si, mas que não podem ser confundidas na tarefa de educar. Segundo Szymanski (1997), a escola tem “a obrigação de ensinar (bem) os conteúdos construídos de áreas de saber considerados como fundamentais para a instrução de novas gerações” e às famílias cabe “dar acolhimento a seus filhos um ambiente estável, provedor, amoroso.” (p.219) A importância da articulação entre a escola e as famílias ainda é apontada por Zabalza (1998) como uma das condições para se realizar uma educação de qualidade, pois a primeira possui capacidade de ação limitada, especificamente no que concerne às questões curriculares como, por exemplo, a continuação em casa de atividades iniciadas em sala de aula. Para ele, a participação familiar “[...] enriquece o trabalho educativo que é desenvolvido na escola (a presença de outras pessoas adultas permite organizar atividades mais ricas e desenvolver uma atenção mais personalizada com as crianças), enriquece os próprios pais e mães (vão sendo conhecidos aspectos do desenvolvimento infantil, descobrindo características formativas em materiais e experiências, inclusive o jogo, conhecendo melhor os filhos, aprendendo questões relacionadas com a forma de educar) e enriquece a própria ação educativa que as famílias desenvolvem depois em suas casas. Também os professores (as) aprendem muito com a presença dos pais e mães, ao ver como eles enfrentam os dilemas básicos da relação com crianças pequenas.” (p.54/55) Nesse contexto, compreende-se também que a participação da família não se restringe apenas às atividades de caráter pedagógico, mas que esta se amplia ao âmbito da gestão escolar. Para que os pais de fato se envolvam é necessário que eles venham a aderir ao projeto da escola tanto em sua 10 dimensão pedagógica, quanto política, visto que contribuirá na democratização das relações sociais no seu interior e, por conseqüência, na melhoria da qualidade de ensino. De acordo com Paro (2000), isto demanda “[...] um acordo tanto com os educandos, fazendo-os sujeitos, quanto com os pais, trazendo-os para o convívio da escola, mostrando-lhes quão importante é sua participação e fazendo uma escola pública de acordo com os interesses de cidadão.” (p.17) O posicionamento do cenário legal brasileiro sobre o tema da participação familiar aponta alguns avanços a partir dos anos 90. O Estatuto da Criança e do Adolescente, instituído pela Lei nº 8.069/90, determina no parágrafo único do artigo 53 que “É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.” Tal legislação consegue ser mais avançada do que a lei exclusiva para a esfera educacional. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) determina apenas em seu artigo 12, que trata das incumbências dos estabelecimentos de ensino, que estes devem “articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola” e, no artigo 13, que trata das incumbências dos docentes, que estes devem “colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade”. De maneira mais específica, temos o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil que, em seu caderno introdutório (volume 1), trata a participação familiar sob o título de “parceria com as famílias”. Este item justifica a necessidade dessa parceria em função das características da faixa etária das crianças atendidas, argumenta sobre a diversidade de arranjos familiares que devem ser compreendidos pela escola e sobre o estabelecimento de canais de comunicação entre as duas instituições. Embora concordemos com os apontamentos feitos, há de se considerar que a idéia de participação subjacente aos documentos acima citados é um tanto passiva, pois não é dado o direito as famílias de participar nas discussões, elaboração, acompanhamento e avaliação do projeto da escola, 11 mas simplesmente de fazer com que elas se incluam ao mesmo, legitimando todas e quaisquer idéias, opções e práticas da escola. Entendemos, por outro lado, que a participação familiar deve ter um caráter critico, visto que é essencial “conseguir que a participação da família seja significativa e seja percebida pelos pais como um fato importante. Não pode, certamente, ser vivida como um ‘dever’ ou como um instrumento para ratificar opções já realizadas por outros, e sim como o envolvimento direto na construção do projeto educativo dos próprios filhos.” (Borgui Apud. Corrêa, 2002, p.5) Assim, a partir do momento em que a família tiver a oportunidade de compartilhar sugestões e decisões do projeto político pedagógico da escola ela se sentirá partícipe e co-responsável na execução e avaliação do mesmo. Participação da Família no Processo de Avaliação da Aprendizagem na Educação Infantil Do mesmo modo que a participação social só se efetiva num “processo de colaboração que envolve o mútuo engajamento dos participantes, num esforço coordenado para resolver, propor, negociar e tomar decisões conjuntamente” (Porto, 2006, p.107), a avaliação será cada vez mais justa à medida que se compartilha o poder. Nesse sentido, tal perspectiva configura-se na discussão de Mediano (1977), que, a partir da definição de Fermin, faz algumas inferências sobre as características do processo avaliativo, considerando a avaliação como funcional, já que se realiza em função de objetivos claramente definidos; como processo sistemático, pois está inserida num processo mais global, o de ensino-aprendizagem, sendo parte integrante do mesmo e não algo isolado; como contínua, visto que ocorre ao longo de todo o processo oportunizando a recuperação imediata quando houver déficits no processo de ensinoaprendizagem; e como integral, pois tem o aluno como um todo (cognitivo, afetivo, psicomotor, etc.). A autora ainda salienta que, decorrente desta característica de processo integral, a avaliação passa a ampliar seu objeto e agora abarca também um 12 caráter orientador, uma vez que não visa mais eliminar os alunos; um caráter cooperativo, pois sem desejar eliminar perdeu o estilo competitivo; e um caráter extensivo, porquanto desfocalizou o professor como único sujeito ativo do processo e deu margem também para a atuação dos próprios alunos e dos seus pais. Nesse conjunto, a concepção de avaliação extensiva aliada à moderna diretriz democrática, demonstra a necessidade em desmistificar a idéia de que a avaliação é relação apenas de professor e aluno, especialmente quando tratada no contexto da Educação Infantil, uma vez as crianças terem tão pouca idade e necessitarem do acompanhamento dos adultos que convivem com elas, a fim de alcançarem o pleno desenvolvimento de suas capacidades. Por isso, “[...] os registros, as anotações sobre o seu desenvolvimento precisam ser complementadas e compartilhadas por todas as pessoas que se responsabilizam pela criança. Há necessidade, portanto, de criar espaço para que essas pessoas conversem sobre aspectos do seu desenvolvimento. Professores, administradores, atendentes, funcionários, técnicos, pais e familiares devem estar disponíveis para refletir sobre os interesses, as necessidades, as conquistas das crianças, no sentido de auxiliá-las em suas tentativas.” (Hoffmann, 1991, p.107) Entretanto, isto não quer dizer que para se realizar uma avaliação de cunho participativo entre escola-família, ocorra apenas uma prática de reuniões periódicas com os pais para a entrega de pareceres finais, mas que se criem oportunidades freqüentes de troca de idéias entre adultos que trabalham com a criança e destes com seus familiares. Hoffmann (1996) cita o relatório de acompanhamento da criança como um instrumento avaliativo que pode responder a essa demanda, visto que “[...] ao mesmo tempo em que refaz e registra a história do seu processo dinâmico de construção de conhecimento, sugere, encaminha, aponta possibilidades da ação educativa para pais, educadores e para a própria criança.” (p.46) 13 Com esse aporte teórico, buscamos no campo de pesquisa dados que evidenciassem a compreensão do corpo docente (professora e gestoras) sobre o processo de avaliação da aprendizagem. Focalizamos nosso olhar nos pais e/ou responsáveis dos alunos (principais sujeitos da pesquisa). Os dados foram coletados através da aplicação de questionários e em observações formais e não formais registradas num anedotário e em listas de verificação. Além disso, foram utilizadas como fonte de dados as fichas de comentários escritos pelos pais acerca do relatório de avaliação entregue no final do 1º semestre. Também foi analisada a Proposta Pedagógica da Educação Infantil no SESC a fim de se identificar o posicionamento institucional ante o tema pesquisado. Todas as informações colhidas foram reunidas e analisadas a partir de uma matriz analítica onde elencou-se como categorias de análise os agentes/sujeitos avaliativos, a funcionalidade, o normotipo, a temporalidade, a participação dos pais e a articulação escola-família, tendo, cada uma destas categorias, unidades de análise específicas. Concepções, projeto pedagógico e práticas avaliativas em uma turma de Educação Infantil A escola em que foi realizada a pesquisa de onde surgiu o presente estudo possui uma característica peculiar dentre as demais escolas que vemos regularmente, pois se trata de uma escola que está alocada em um setor de uma grande instituição que realiza outras atividades, além da escolar, em áreas diversas como: esportes, cultura, saúde, etc. tendo, em todas essas atividades, o foco educacional. Esse fato teve uma relevância significativa na análise das informações coletadas, uma vez que diretrizes gerais perpassam os diferentes setores e nos levam a olhar a instituição como um todo, mesmo que se queira ver apenas parte dela. Por isso, os diversos acontecimentos observados foram analisados tendo-se o cuidado em não perder de vista o foco central da pesquisa, percebendo aquilo que era de caráter estritamente escolar e aquilo que era influenciado pelo contexto institucional. Deste modo, alguns temas foram levantados a fim de se realizar uma abordagem mais pontual. 14 • Características do processo avaliativo Com base em Casanova (2002), identificamos que em relação aos agentes/sujeitos avaliativos, um pouco mais da metade dos pais acham que os sujeitos que devem avaliar são os professores, os alunos e os pais demonstrando com isso que questionam a exclusividade da hetero-avaliação, no sentido de que institui um poder assimétrico. Defendem a auto-avaliação e a co-avaliação como maneira de se compartilhar o poder e possibilitar a autonomia do educando. “É muito bom quando os meninos, junto com a professora, vêem o que tão aprendendo. E é bom também quando a gente chega pra dizer o que é que a gente ta achando.” (mãe 4) Esta concepção também é compartilhada pela professora e pelas gestoras, contudo, observando o cotidiano escolar não vemos uma prática freqüente de auto-avaliação dos alunos sendo realizada. No que concerne especificamente à participação dos pais no processo de avaliação a professora da turma coloca que “É importante e necessário que os pais participem deste processo, pois a avaliação é um instrumento de suma importância para que o professor possa obter dados sobre o processo de aprendizagem de cada criança. Assim, a contribuição que os pais dão enriquecem e validam esse processo.” (professora da turma) Ainda a respeito dos agentes/sujeitos avaliativos a Proposta Pedagógica cita que ao elaborar o relatório descritivo de avaliação o professor deve está “[...] considerando as produções dos alunos, o diálogo estabelecido com os pais, educadores e funcionários [...]” (p.52) estando, assim, em conformidade ao que diz Hoffmann (1991) quando defende a idéia de que os registros e anotações sobre desenvolvimento da criança precisam ser complementados e compartilhados por todas as pessoas que se responsabilizam pela mesma. Pensando na funcionalidade da avaliação percebemos que os pais entendem que esta deve se dar ao longo do processo de ensinoaprendizagem, a fim de se observar as dificuldades e os sucessos dos alunos, 15 o que atenta para a perspectiva formativa. No entanto, alguns pais também consideram a avaliação somativa, uma vez que expressam a necessidade de receberem um resultado final acerca do desenvolvimento de seus filhos. “Crianças de 3 a 6 anos devem ser observadas no período ensino-aprendizagem anual e a partir desta etapa fazer uma elaboração de relatório descriminando todo o seu desenvolvimento no ano letivo. É o processo mais abrangente para avaliação.” (pai 10) Ampliando esta visão, a professora e as gestoras concebem a perspectiva formativa, somativa e diagnóstica como funções da avaliação, tendo em vista a necessidade de se identificar o nível de desenvolvimento dos alunos em cada etapa do processo de ensino-aprendizagem para um melhor atendimento às necessidades dos educandos. “No relatório de avaliação é preciso que se coloque como o aluno se encontrava no início do processo de ensinoaprendizagem, como ele foi se desenvolvendo ao longo do tempo e como ele está até aquela data em que se está avaliando” (gestora 2) Condizente com esta idéia, a Proposta Pedagógica também cita: “Entendida enquanto processo contínuo, a avaliação compreende as funções diagnóstica, prognóstica e investigativa, cujas informações viabilizam o redimensionamento da ação pedagógico-educativa, na medida em que tudo aquilo que avaliamos não é visível a olho nu.” (p.51) Este ponto nos remete a questão da temporalidade, visto a ligação direta entre a função que a avaliação possui e o momento em que ela precisa ocorrer para cumprir com esta função. Assim, demonstrando coerência entre estes dois temas, uma parcela considerável dos pais, além da professora e das gestoras, afirmam que a avaliação deve ocorrer no começo, no meio e no final do processo de ensino-aprendizagem. A Proposta Pedagógica não cita claramente em que momento a avaliação deve acontecer, mas ao relatar que a mesma 16 processa-se de forma contínua inferimos que também compreenda esses três períodos. No que se refere ao normotipo da avaliação, encontramos resultados diversos que se enquadram tanto na avaliação nomotética quanto ideográfica. No primeiro caso, vemos que os pais defendem formas de avaliação que têm como referentes de análise critérios e normas externos ao educando. No segundo, percebemos a defesa de que também é necessário ver o aluno em seus aspectos pessoais. Um exemplo disto é a justificativa que um dos pais pesquisados expressa ao responder que a aplicação de provas e testes e a elaboração de relatórios é a maneira mais correta de se avaliar a aprendizagem de crianças de 3 a 6 anos de idade: “As duas opções uma complementaria a outra, porque só prova, testes ficam distante do aluno, e havendo uma observação do aluno seria um tratamento mais próximo e humano.” (mãe 11) Sobre essa questão, notamos que a prática exercida pelo corpo docente (professora e gestoras) se aproxima mais a uma avaliação nomotética do tipo criterial, uma vez que seus referentes de análise são, na maioria das vezes, critérios de aprendizagem. Porém, na elaboração dos relatórios avaliativos também é tomado como referente às reais possibilidades de aprendizagem de cada aluno baseada nas características pessoais dos mesmos, o que configura uma perspectiva ideográfica: “A criança precisa ser avaliada no contexto geral, e não a partir de conceitos isolados.” (gestora 2). Esta perspectiva, também é expressa, mesmo que de maneira subjetiva, na Proposta Pedagógica: “[...] avaliação individual das crianças [...] devem ser feitas com o cuidado de não compará-las entre si, respeitando o ritmo de cada uma delas [...]” (p.52) Os resultados encontrados no conjunto das informações colhidas e anteriormente analisadas refletem um pouco das idéias levantadas por Mediano (1977), que, a partir da definição de Fermin, faz inferências acerca das características do processo avaliativo. Assim, vemos que a avaliação está sendo concebida, pela maioria dos sujeitos observados, como atividade funcional, sistemática, contínua, integral, orientadora, cooperativa e extensiva. 17 A atividade funcional é percebida em relatos que demonstram que a avaliação se realiza em função de objetivos. “O relatório constitui-se numa forma completa de avaliação, pois atende vários objetivos proposto pelo educador.” (gestora 1) A atividade sistemática é entendida como um processo global, onde a avaliação é parte integrante do processo de ensino-aprendizagem e não algo separado do mesmo. “A elaboração de relatórios descritivos a partir da observação do processo de construção das aprendizagens de conceitos, fatos, habilidades e atitudes é um tipo de avaliação que dá mais suporte ao professor, pois abrange todo o processo de ensinoaprendizagem.” (professora da turma) O dado acima citado, junta-se a outros comentários e indicia que a avaliação é vista como atividade contínua, ou seja, que acontece ao longo de todo o processo. “É bom quando o professor faz relatório de tempos em tempos pra gente acompanhar passo a passo como o menino está e poder ajudar também.” (pai 10) Outros relatos nos permitem identificar o aspecto integral da atividade avaliativa que compreende o aluno como um todo. “[...] educação infantil é bem mais, do que aprender as letras e os números[...]” (mãe 4) “[...] nos preocupamos desde cedo com o comprometimento o dever e a missão de desenvolver o lado educacional do nosso filho, tanto no lado corporal, cognitivo e social.” (mãe 18) Responsável pela ampliação do objeto da avaliação, esta atividade integral possibilitou que a mesma obtivesse também um caráter orientador. A atividade orientadora da avaliação pode ser observada num pequeno comentário onde vemos que ao invés de eliminar alunos a avaliação passa a orientar os mesmos em seu processo de aprendizagem a fim de que consigam atingir os objetivos previstos. 18 “Sei que minha filha ainda não aprendeu tudo que tem que aprender na alfabetização, mas ela vai ir melhorando com o tempo e com o que a professora vai fazendo na escola e a gente vai fazendo em casa.” (mãe 17) Este aspecto orientador eliminou o caráter competitivo da avaliação e tornou-a uma atividade cooperativa que não realiza comparações entre alunos, mas, pelo contrário, utiliza critérios preestabelecidos e/ou o desempenho anterior do próprio aluno como referentes avaliativos. “Pra vista do que ele sabia quando chegou aqui ele tá bem melhor. Agora, é claro que pra vista de outros meninos que já tavam aqui antes ele tá mais atrasado, mas não é assim que a gente deve vê os meninos, né? Cada um tem seu ritmo.” (mãe 4) Finalmente, a atividade extensiva é percebida em comentários que desfocalizam o professor como único sujeito ativo e ressaltam a necessidade da participação dos alunos e dos pais destes no processo de avaliação. “Apesar de ainda serem pequenininhos é bom quando eles percebem o que eles tão aprendendo. Parece que ficam mais animados!” (mãe 7) “É importante que os pais participem, no sentido de sugerir, questionar, colaborar com o processo de educação da criança. A escola não pode trabalhar isolada os pais precisam estar presentes.” (gestora 2) • Participação familiar Apesar deste comentário feito por uma das gestoras, o caráter extensivo apresenta dois fatores significativos que comprometem a qualidade da avaliação. O primeiro refere-se ao fato de que tanto os pais, quanto a instituição compreendem a participação familiar no processo avaliativo apenas como aspecto pedagógico e não político, visto que os pais se colocam numa posição de passividade quanto às idéias, opções e práticas já estabelecidas pela escola, e expressam apenas sua satisfação (ou insatisfação) com as 19 atividades realizadas, como exemplifica um comentário escrito na ficha de apreciação que os pais recebem junto com os relatórios de avaliação: “A escola vem atendendo as minhas necessidades e do meu filho de maneira excepcional. Gostaria de agradecer pelo bom trabalho e pelo comprometimento ético dos professores e funcionários. Tendo em vista que tudo está ocorrendo da melhor maneira possível só tenho a agradecer, espero que tudo permaneça do mesmo modo.” (mãe 16) De acordo com Borgui (apud Corrêa, 2002), esta prática não possibilita uma participação ativa dos pais, uma vez que estes não participam nas discussões, elaboração, acompanhamento e avaliação do projeto da escola, e, por isso, não se sentem co-responsáveis pela execução e avaliação do mesmo. Por outro lado, temos no aspecto pedagógico uma posição bem definida pela instituição, pois encontramos na Proposta Pedagógica, várias orientações sobre a participação familiar e, dentre elas, o seguinte trecho que trata da dinâmica da avaliação formativa: “Análise do Dossiê pela família, constituída pelo relatório ‘Contribuições da Família’ construído coletivamente pelos pais e professores somados a visão do contexto da turma na qual o aluno se insere.” (p. 52) Nesse contexto, apesar de observarmos que a participação dos pais compreende somente o aspecto pedagógico, esta ainda apresenta um déficit e constitui o segundo fator que compromete a qualidade da avaliação. Durante o momento da pesquisa, detectamos que quase a metade dos pais não tem estado presente nas reuniões e nos plantões pedagógicos, e não tem respondido as fichas de apreciação que recebem junto com os relatórios de avaliação. Então, analisando especificamente essa questão das reuniões e plantões pedagógicos encontramos um fato comum entre os filhos da maioria dos pais ausentes nesses momentos. Pois, trata-se de crianças que estudam na instituição desde anos anteriores. O que nos permite deduzir que esses pais, 20 por já conhecerem a forma de trabalho da escola, não se preocupam em participar dessas ocasiões. Contudo, também suspeitamos que possa haver algum fato relacionado à forma como as reuniões e os plantões são organizados. Fato este que esteja desestimulando a presença dos pais como, por exemplo, a repetição de assuntos na pauta de discussão entre uma reunião e outra. Infelizmente, dado o limite de tempo da pesquisa, não pudemos investigar melhor esse caso e identificar a veracidade do mesmo. A questão é que, ainda que a instituição promova momentos de participação, os pais não têm se inserido nesse processo e, segundo Hoffmann (1991), isso é necessário para que professores, gestores, funcionários e familiares possam refletir sobre o desenvolvimento das crianças, compreendendo melhor seus interesses, necessidades e conquistas, a fim de auxiliá-las em suas tentativas. Além disso, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil ressalta a necessidade de que sejam estabelecidos canais de comunicação entre a escola e as famílias, compreendendo a diversidade de arranjos familiares e as características da faixa etária das crianças atendidas. Assim, considerando tais circunstâncias de participação familiar, vemos que algumas estratégias de articulação família-escola são traçadas tanto por parte da família, quanto da escola. Alguns pais, por vezes, aproveitam para conversar com a professora sobre o desenvolvimento das crianças no momento em que as deixam na escola. Outros enviam recados através da agenda da criança ou telefonam para a escola. Por parte da escola vemos uma preocupação constante em está informando os pais sobre as atividades realizadas e os eventos promovidos, tendo um cuidado especial em solicitar uma conversa com os pais sobre o desenvolvimento de alunos que apresentam maiores dificuldades de aprendizagem. Ainda que não seja suficiente, é significativa esta articulação que a escola e a família tem tido, pois Zabalza (1998) aponta a importância deste contato como uma das condições para se realizar uma educação de qualidade, visto a possibilidade de se enriquecer o trabalho educativo desenvolvido na escola com a presença de outras pessoas adultas, dando uma atenção mais 21 personalizada as crianças e a possibilidade de se enriquecer os próprios pais e mães que têm a oportunidade de conhecer melhor alguns aspectos do desenvolvimento infantil. Considerações Finais Diante do quadro geral em que a pesquisa foi realizada e tendo em vista os objetivos traçados originalmente, podemos concluir que uma parcela considerável dos pais analisados compreende a avaliação numa perspectiva emancipatória, visto que não a tem como um acontecimento pontual, métrico, estático e único, mas como um processo que visa construir e reconstruir o saber de todos os envolvidos sejam eles alunos, professores ou familiares. Esta compreensão foi mais perceptível nos pais que mantêm um contato mais próximo com a escola, no sentido de que estão mais presentes na vida escolar dos filhos, acompanhando as atividades que são enviadas para casa, participando das reuniões, plantões e projetos pedagógicos, entre outros. Porém, apesar de não ser tão contundente, fatores como nível de escolaridade e condições financeiras também demonstraram influenciar esta compreensão, uma vez que a maioria dos pais que esboçaram um entendimento emancipador acerca da avaliação tinha nível médio ou superior completos e possuíam renda familiar de até cinco salários mínimos. Sobre a participação dos pais no processo avaliativo concluímos que esta ainda tem sido insuficiente, tendo em vista que não há um estímulo ou exigência de que esses pais estejam presentes nesse momento trazendo seus argumentos, questões e opiniões que podem fazer com que eles tenham uma melhor compreensão do processo de ensino-aprendizagem que acontece na Educação Infantil e auxiliem no desenvolvimento de seus filhos. Nesse caso, ficou evidenciado que as reuniões pedagógicas são uma das articulações família-escola mais significativas, pois nelas a escola procura apresentar a sua proposta educacional e a linha de trabalho seguida. Como uma parte dos pais que trabalham não tem condições de estar presente nesses momentos, apesar de vermos que a escola procura realizá-los em horários mais acessíveis, ousamos sugerir que esta busque estratégias de ação que atinjam esses pais de forma mais individual, como por exemplo, o aumento no envio de fichas de comentários sobre o desenvolvimento das 22 crianças, e, por conseguinte, a exigência de que os pais devolvam essas fichas devidamente respondidas. A nosso ver, esta atitude poderá suscitar nesses pais, um interesse maior em acompanhar e compreender como está ocorrendo o processo de aprendizagem de seus filhos. Da mesma forma que também poderá dar margem para uma participação mais ativa dos pais no que se refere ao projeto educativo da escola, pois terão a oportunidade de sugerir, opinar, acompanhar e avaliar o mesmo. Apesar de vários fatos terem sido esclarecidos, acreditamos que este estudo merece um maior aprofundamento devido ao tempo de pesquisa não nos ter permitido desvelar aspectos ainda obscuros. O primeiro deles é o interesse em descobrir e entender as razões dos pais muitas vezes expressarem uma determinada compreensão acerca do processo de avaliação que não se efetiva na prática. Outro ponto é a questão do nível de interferência dessa compreensão no processo de ensino-aprendizagem. E, por fim, acreditamos que seria interessante saber como esse processo de avaliação extensiva desenvolve-se em escolas públicas que possuem a mesma característica democrática que a escola aqui pesquisada. Esperamos que esse estudo possa contribuir com o debate acadêmico sobre a questão da avaliação e a participação familiar na Educação Infantil, suscitando novos temas de pesquisa. Referências Bibliográficas BRADFIELD, J. M. & MOREDOCK, H. S. Medidas e Testes em Educação. 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