SEXUALIDADE INFANTIL: TEORIA, GESTÃO E DOCÊNCIA
Viviane Cristina Ferreira Gloor (Pedagogia), UNESPAR/FECILCAM,
[email protected]
Fabiane Freire França, (Pedagogia), UNESPAR/FECILCAM,
[email protected]
INTRODUÇÃO
Quando a gestão escolar entra em pauta há uma grande dificuldade de percebê-la como
elemento constituinte de democracia dentro do ambiente escolar. No entanto, a gestão é o elemento
integrador na escola, é ela que fornece subsídios para que todos os sujeitos que se encontram ali
naquele ambiente se integrem e efetivem de fato e objetivamente relações que não se baseiem no
autoritarismo, mas sim, em relações de alteridade, que se dêem num plano horizontal (PARO, 2003).
Relações horizontais são entendidas aqui como as relações humanas que se estabelecem entre
os sujeitos que se encontram envolvidos no âmbito escolar, sejam eles o diretor/a, orientador/a,
alunos/as, docentes, funcionários ou família, relações estas que devem ser de cooperação e
solidariedade, numa atitude de alteridade, isto é, respeito e tolerância para com as dificuldades e
diferenças dos outros.
As atividades do estágio supervisionado da Universidade Estadual do Paraná – campus Campo
Mourão tem como modalidade a Gestão Educacional. Sabendo que o trabalho de gestão se dá numa
constante relação entre as várias instâncias e atores da escola, em contato estabelecido com a escola, as
gestoras de uma escola de Educação Infantil e séries iniciais de Campo Mourão, foram considerados
alguns temas-problemas para serem trabalhados em discussões, dentre eles se encontrava a
sexualidade infantil que, apesar de estar presente nas relações sociais e institucionais, nem sempre é
contemplada nos currículos e nos cursos de formação de docentes (SOUZA, 2013).
Além da formação precária dos agentes escolares que lidam diariamente com as crianças,
outra dificuldade apresentada é o controle por parte da família, da escola e das diversas instituições
sociais, tendo como consequência o trabalho inadequado com a sexualidade da criança, tal como a
moldagem de comportamentos que são considerados socialmente apropriados a meninos e meninas.
Partindo desta realidade, procuramos responder ao seguinte questionamento:
como o tema da sexualidade infantil pode ser apreendido por agentes escolares e
implementado em ações cotidianas no interior da escola?
Ao responder esta questão, buscamos contribuir de alguma maneira com a formação dos
profissionais da educação participantes do projeto, esclarecendo dúvidas e propondo meios para a
problematização de paradigmas e estereótipos educacionais. Compreendendo que a gestão
democrática exige a participação de todos (PARO, 2003), temos claro que o envolvimento dos pais é
de extrema importância ao se tratar da sexualidade infantil, pois esta envolve sua vivência cotidiana
com a família e a escola, duas instituições de alta relevância na formação de sua identidade.
JUSTIFICATIVA
O curso de Pedagogia ofertado pela Universidade Estadual do Paraná campus Campo Mourão
(Unespar/Fecilcam) possui o estágio em Gestão Educacional como um dos pontos necessários à
experiência no exercício profissional a fim de ampliar e fortalecer atitudes éticas, conhecimentos e
competências, de acordo com o Regulamento do Estágio Supervisionado (Resolução nº 029/08).
Por assumir relevância social, consideramos importante a discussão sobre sexualidade infantil
no âmbito escolar, pois, de acordo com alguns professores, as crianças têm revelado a sua sexualidade
cada vez mais cedo, trazendo à tona uma adolescência extremamente precoce. Na gestão, o debate
sobre este assunto pode resultar em orientações para as ações cotidianas de professores e agentes
escolares.
Altmann e Carvalho (2012, p. 11) afirmam que “Ausência de formação, medo, pudor,
percepção da sexualidade como algo inadequado à infância, entre outros, constroem um recorrente
silenciamento infantil no ambiente escolar.”. Além disso, as autoras concordam que “O trabalho
conjunto entre educadoras(es), família e demais profissionais pode construir uma visão de infância e
sexualidade que dê conta das manifestações no ambiente escolar e em casa.” (ALTMANN e
CARVALHO, 2012, p. 12).
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
No trabalho com a educação infantil, vários são os desafios para os educadores, o trabalho
com o desenvolvimento físico e mental, o trabalho com as coordenações, dentre outros. E é na
educação infantil que a criança busca sua identidade, e a construção de sua identidade sexual
demonstra ser um desafio aos educadores. A criança no decorrer da idade e no processo de interação
social vai percebendo que pertence a um grupo, ou seja, a um gênero, feminino ou masculino, e este
processo, de descoberta como sujeito sócio-histórico, é visto muitas vezes na educação infantil como
um problema ou como um tema a ser adiado para a adolescência. No entanto, deve ser visto por todos
da instituição escolar como algo necessário de ser trabalhado, pois a criança necessita deste
entendimento, de sua construção do corpo, do gênero e de sua sexualidade como “menino” e ou como
“menina”, como bases para a formação de sua identidade.
Ao definir o conceito de sexualidade, Maia e Spaziani (2010, p. 68) explicam que este se
configura como um fenômeno abrangente por referir-se tanto “[...] às múltiplas manifestações
erógenas e corporais ao longo do desenvolvimento humano, como também às representações sociais e
históricas que dele fazem parte: valores, atitudes, concepções, etc.”. Portanto, como dizem as autoras,
o conceito envolve as relações sociais e políticas que interferem a maneira como as pessoas vivenciam
seus, prazeres e desejos.
Citando Foucault (1997), Altmann e Carvalho (2012) aponta que a sexualidade é “[...] como
um dispositivo histórico e não como uma realidade subterrânea que se apreende com dificuldade.” (p.
2) Sendo assim, a sexualidade é algo que ao longo da vida vai se “construindo” a partir de vários
processos que o sujeito vivencia, a partir da formação do conhecimento, da intensificação dos
prazeres, dos estímulos ao corpo, entre outros. Considerando que a sexualidade se constitui ao longo
da vida, torna-se “[...] marcada pela história, cultura, ciência, assim como pelos afetos e sentimentos,
expressando-se então com singularidade em cada sujeito.” (BRASIL, 1998).
De acordo com estudos realizados sobre sexualidade, as manifestações sexuais iniciam-se
antes mesmo do nascimento, tais como ereções penianas e lubrificações vaginais, ainda que estas
aconteçam de forma espontânea ou como uma resposta à estimulação tátil (NEDEFF, 2001). O autor
ressalta que, no entanto, tais manifestações não são reações aprendidas, mas uma herança biológica: as
atividades sexuais infantis se dão por um impulso biológico, diferenciando-se das atividades sexuais
adultas, que possuem outras motivações.
As manifestações sexuais mais comuns, tanto na instituição escolar como na familiar, são as
curiosidades e questionamentos, a masturbação infantil e os jogos sexuais (MAIA e SPAZIANI,
2010). Estas são marcadas pela exploração do corpo (respondendo a um estímulo imediato,
fisiológico) e por brincadeiras em grupo que envolvem toques e visualização do corpo. As autoras
defendem que estes momentos podem ser trabalhados pelo/a professor/a, no caso da escola,
explicando aos/às alunos/as as diferenças e semelhanças corporais entre os sexos de modo a
proporcionar a construção da identidade de gênero, permeando nesta discussão os padrões e
estereótipos sociais de comportamento. Como destaca Furlani (2008, apud ALTMANN e
CARVALHO, 2012)
[...] trabalhar educação sexual com as crianças desde pequena, incluindo aí o tema
da masturbação, que deve ser percebida e abordada de maneira positiva. [...] as
crianças precisam entender os conceitos de nudez e privacidade e, para que não
pareça ser um modo de fazer “concessões” quanto aos prazeres das crianças, devem
aprender que certas atitudes dever ser feitas privativamente. (ALTMANN e
CARVALHO, 2012, p. 7)
Jimena Furlani observa que, ao discutirmos a adoção de ações pedagógicas que
tomem como tema a sexualidade, cabe perguntar que Educação Sexual queremos,
que princípios e fundamentos ela apresenta, quais são os efeitos sociais desses
saberes, a que sujeitos eles dão visibilidade e quem eles ocultam. (JUNQUEIRA,
2009, p. 40)
Outra instituição que deveria discutir a sexualidade infantil seria a família, mas muitos pais,
assim como muitos educadores, têm uma visão errônea sobre este aspecto do desenvolvimento do
filho, por variados motivos: talvez pelos poucos conhecimentos sobre o assunto, ou por questões
religiosas; enfim encontram certas dificuldades em compreender este processo (BRASIL, 1998).
Segundo Masters e Johnson (1988), alguns pais já encaram o desenvolvimento da
sexualidade de seus filhos de maneira mais objetiva e com maior aprovação. Por
vários motivos, alguns outros pais sentem desconforto diante de qualquer forma de
interesse ou comportamento sexual por parte dos filhos. Preocupam-se que haja
anormalidade, ou não sabem como lidar com o fato, ou tem conflitos sexuais
internos próprios. (NEDEFF, 2001, p.86).
O fato de a família ter valores conservadores, liberais ou progressistas, professar
alguma crença religiosa ou não e a forma como o faz determina em grande parte a
educação das crianças. Pode-se afirmar que é no espaço privado, portanto, que a
criança recebe com maior intensidade as noções a partir das quais construirá sua
sexualidade na infância. (BRASIL, 1998, p. 77)
Tomando consciência de que tais manifestações irão ocorrer dentro do ambiente escolar, o/a
professor/a (e também os demais funcionários da escola que interagem constantemente com as
crianças) deve estar preparado/a
[...] para responder de modo claro, verdadeiro e objetivo às questões relacionadas ao
corpo e à sexualidade [...]. Para isso, os educadores devem respeitar a necessidade
de autoconhecimento de seus alunos, bem como promover discussões abertas,
tratando do tema sem punições [...] buscando valorizar a dimensão sexualidade na
educação infantil, enriquecendo as mediações educativas que buscam suprir todas as
necessidades das crianças [...].” (MAIA e SPAZIANI, 2010, p. 71)
Outro importante aspecto a ser ressaltado no desenvolvimento das crianças é a formação de
uma identidade sexual e de gênero. Segundo Afonso (1995), a partir da consciência do seu corpo
sexuado - que pode ser percebido com as diferenciações trabalhadas pelo professor entre os corpos -,
da identificação com os papeis sociais – apreendidos por meio de brincadeiras e observações do
mundo a sua volta – e das escolhas sobre suas relações afetivo-sexuais, o sujeito (no caso a criança)
“[...] constrói para si uma identidade ‘de ser homem’ ou ‘de ser mulher’” (AFONSO, 1995, p. 4), isto
é, uma identidade de gênero. A criança percebe a si mesma não como um corpo sexuado simplesmente
(macho/fêmea), mas como pertencente a um gênero – masculino ou feminino – em relação a outro
gênero em meio às relações socioculturais. Portanto, como afirma a autora, um sujeito social e
historicamente ativo exposto a contradições, rupturas, transgressão e inovação.
Para trabalhar com as questões referentes à sexualidade, os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN’s, 1998) ressaltam a importância de o professor possuir uma formação específica, que possibilite
a construção de uma postura profissional e consciente no trato com o tema. Deve procurar, portanto,
entrar em contato com questões teóricas, leituras e discussões sobre as temáticas específicas de
sexualidade e suas diferentes abordagens tendo como finalidade a abertura de um espaço de reflexão
sobre valores e estereótipos tanto dos/as educadores/as, quanto dos/as alunos/as.
METODOLOGIA
Tendo como referencial teórico os pressupostos político-filosóficos dos Estudos Culturais,
foram realizadas reuniões com os/as docentes, gestoras e funcionárias/os da escola, dado que o
Regulamento de Estágio Obrigatório (Resolução 029/08) oferece como alternativa metodológica o
desenvolvimento de “Seminários, debates, reuniões, curso de pequena duração”, buscando articular
estes às necessidades/demandas da instituição com o intuito de subsidiar tanto acadêmicos do curso
quanto os educadores/as da instituição.
Os Estudos Culturais, diz Giroux (1995), podem oferecer possibilidades que garantam aos/às
educadores/as a reflexão sobre a teoria e prática educacionais e sobre o significado de educar os/as
futuros/as profissionais da escola, de forma a atender as novas demandas sociais que, cada vez mais,
afetam o cotidiano escolar. Entra em jogo “[...] a tentativa para produzir novas metodologias e novos
modelos teóricos para analisar a produção, a estrutura e a troca de conhecimentos.” (GIROUX, 1995,
p. 90-91, grifos meus).
Teve-se como tema de discussão a sexualidade infantil, compreendendo neste tema gerador a
sua significação, sua representação por parte dos/as agentes escolares e a proposta de atividades e
abordagens que podem ser significativas no trato com a sexualidade na infância.
Como material foram apresentados aos/às educadores/as alguns vídeos e livros com o objetivo
de gerar maior discussão da sexualidade, sobretudo das crianças, que necessitam de uma orientação
conforme as necessidades etárias. Dentre os vídeos encontram-se “Medo de quê?” e “Minha Vida de
João”, duas produções da ECOS, uma organização não-governamental que atua na defesa dos direitos
humanos, com ênfase nos direitos sexuais e direitos reprodutivos, sobretudo de adolescentes e jovens.
O trabalhado realizado por esta organização tem como finalidade a erradicação das discriminações
relativas a gênero, orientação sexual, raça/etnia, deficiências e classe social. Neste sentido, os vídeos
aqui selecionados tratarão do tema sexualidade e orientação sexual, que dão suporte para a discussão
do professor em sala de aula.
Dentre os livros encontravam-se alguns indicados para trabalhar com as crianças, como “Ceci
tem Pipi” (LENAIN, 2004) e “Faca Sem Ponta, Galinha Sem Pé” (ROCHA, 2009), que podem dar
suporte para iniciar uma discussão em classe, e outros em que os/as educadores/as podem se basear
para explicar sobre o assunto, como “Gênero e Diversidade Sexual na Escola: reconhecer diferenças e
superar preconceitos”; “Gênero e Diversidade na Escola: formação de professoras/es em gênero,
sexualidade, orientação sexual e relações étnico raciais”
e “Diversidade Sexual na Educação:
problematizações sobre a homofobia nas escolas”, que são produções do governo brasileiro para
atender a demanda sobre a orientação sexual na escola, dentre outras questões. Foram indicados ainda
os livros “Gênero, Sexualidade e Educação: uma perspectiva pós-estruturalista” e “O Corpo Educado:
pedagogias da sexualidade”, ambos da autora Guacira Lopes Louro (1997, 2000), que possibilitam
uma boa explicação sobre a sexualidade. Além destes, o/a educador/a pode buscar orientação nos
Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), que possui, na parte de Temas Transversais, um eixo
somente sobre a Orientação Sexual, com informações sobre o histórico das discussões, metodologias e
orientações.
Também foi aplicado um questionário com as gestoras com o objetivo de verificar como se dá
a gestão dentro da escola. Os encontros com as educadoras e gestoras foram realizados na escola
municipal durante as terças-feiras, com duração de uma hora após o expediente de trabalho dos/das
participantes do projeto.
RESULTADOS
O estágio de gestão constituiu-se em sete encontros com as funcionárias da escola municipal,
dado que o Regulamento de Estágio Obrigatório (Resolução 029/08) oferece como alternativa
metodológica o desenvolvimento de “Seminários, debates, reuniões, curso de pequena duração”,
buscando articular estes às necessidades/demandas da instituição com o intuito de subsidiar tanto
acadêmicos do curso quanto os educadores/as da instituição. As discussões pautaram-se em temas de
grande valor e influência no cotidiano escolar, como violência, gênero, sexualidade, ética e avaliação,
além de um questionário com a orientadora da escola para esclarecer dúvidas sobre como se dá a
gestão no ambiente escolar.
Esses encontros também favorecem a efetivação da gestão democrática pois, como explica
Dalmás (1994), o grupo de educadores se integra em atividades de formação que podem levar a um
trabalho diferenciado em sala de aula, num processo de diálogo consciente.
Nossa apresentação teve como tema a sexualidade infantil dentro do ambiente escolar,
envolvendo sua identificação nos sujeitos infantis, as práticas mais frequentes e como trabalhá-las em
sala de aula, de forma a desenvolver a sexualidade, tanto no que diz respeito aos aspectos biológicos
dessa formação quanto aos aspectos sociais.
Promovemos então com as educadoras presentes uma diferenciação entre sexualidade,
orientação sexual e identidade sexual. Segundo o caderno da CEPESC (2009)
Identidade sexual: Refere-se a duas questões diferenciadas: por um lado, é o modo
como a pessoa se percebe em termos de orientação sexual; por outro lado, é o modo
como ela torna pública (ou não) essa percepção de si em determinados ambientes ou
situações. A identidade sexual corresponde ao posicionamento (nem sempre
permanente) da pessoa como homossexual, heterossexual ou bissexual, e aos
contextos em que essa orientação pode ser assumida pela pessoa e/ou reconhecida
em seu entorno.
Sexualidade: Refere-se às elaborações culturais sobre os prazeres e os intercâmbios
sociais e corporais que compreendem desde o erotismo, o desejo e o afeto até noções
relativas à saúde, à reprodução, ao uso de tecnologias e ao exercício do poder na
sociedade. As definições atuais da sexualidade abarcam, nas ciências sociais,
significados, ideais, desejos, sensações, emoções, experiências, condutas,
proibições, modelos e fantasias que são configurados de modos diversos em
diferentes contextos sociais e períodos históricos. Trata-se, portanto, de um conceito
dinâmico que vai evolucionando e que está sujeito a diversos usos, múltiplas e
contraditórias interpretações, e que se encontra sujeito a debates e a disputas
políticas. (CEPESC, 2009, p. 112)
Orientação sexual refere-se ao sexo das pessoas que elegemos como objetos de
desejo e afeto. Hoje, são reconhecidos três tipos de orientação sexual: a
heterossexualidade (atração afetiva, sexual e erótica por pessoas de outro gênero); a
homossexualidade (afetiva, sexual e erótica por pessoas do mesmo gênero); e a
bissexualidade (atração afetiva, sexual e erótica tanto por pessoas do mesmo gênero
quanto pelo gênero oposto). O termo “orientação sexual” contrapõe-se a uma
determinada noção de “opção sexual”, entendida como escolha deliberada e
supostamente realizada de maneira autônoma pelo indivíduo, independente do
contexto social em que se dá. Nossas maneiras de ser, agir, pensar e sentir refletem
de modo sutil, complexo e profundo os contextos de nossa experiência social.
Assim, a definição dos nossos objetos de desejo não pode resultar em uma simples
opção efetuada de maneira mecânica, linear e voluntariosa. (CEPESC, 2009, p. 124)
Portanto, por mais que os sujeitos respondam à imposição de critérios estéticos, higiênicos e
morais com os quais convivem diariamente (e isso dentro do próprio espaço escolar também), não são
receptores passivos, mas constituem suas biografias de forma coerente e de acordo com suas
identidades próprias. Assim o é também a criança, sobretudo, por ter essa identidade ainda em
formação, dinâmica e flexível.
Desta forma, torna-se responsabilidade ética da comunidade educativa (professores/as,
gestores/as, funcionários/as, família, comunidade) respeitar e promover o direito de cada sujeito de
viver, procurar a felicidade e manifestar-se de acordo com seu desejo. Este trabalho, segundo a
CEPESC (2009), implica reflexão e aprendizado individual e coletivo a partir de situações e novos
conhecimentos.
Foram apresentadas algumas propostas de trabalho para as professoras:
•
Diálogo aberto com os/as educandos/as sobre as diversas dimensões da sexualidade: prazer,
envolvimento afetivo, expectativas, novas sensações físicas e emocionais, descobertas,
dúvidas, etc.
•
Procurar saber se há motivação e interesse pelo conteúdo e compreensão em relação aos temas
debatidos;
•
Avaliar a repercussão das aulas junto aos pais e às lideranças juvenis, comunitárias e
religiosas, que podem se tornar aliados ou não do processo educativo;
•
Estabelecer vínculos de confiança com os alunos no decorrer da ação educativa;
•
Acesso por parte dos alunos a atividades de sensibilização, como oficinas e cursos com
pessoas especializadas, em colaboração com a escola;
•
Troca de experiência entre profissionais da educação.
Após a exposição destas propostas uma das professoras levantou questionamento: Como trazer
isso pra sala de aula? Dito isto, foi explicado que o trabalho com a sexualidade deve ocorrer de acordo
com as necessidades sentidas dentro do ambiente da sala de aula, tomando por base situações que
ocorreram pontualmente ou que estão sendo muito frequentes, abrindo um espaço no próprio cotidiano
da aula e, se necessário, solicitar uma palestra de profissional especializado das áreas da educação e da
saúde.
No que diz respeito à entrevista realizada, o questionário pautou-se em perguntas sobre a
gestão e o papel do/a pedagogo/a dentro da instituição escolar. De acordo com as respostas dadas pela
orientadora percebe-se a defesa do ideal de gestão democrática, pautado em princípios legais e na
participação coletiva no processo educacional. O papel do/a pedagogo /a também está relacionado com
este processo educacional, isto é, o processo de ensino-aprendizagem, conectando os “pontos-chave”
deste processo: aluno/a, professor/a, família.
A discussão sobre Gestão Democrática se faz necessária devido a não observância de
participação do entorno escolar em decisões de relevância social e cultural e por levar em consideração
o estabelecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96): “Art. 3º. O ensino
será ministrado com base nos seguintes princípios: [...] VIII – gestão democrática do ensino público,
na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino.” e ainda “Art. 12. Os estabelecimentos de
ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: [...] VI –
articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a
escola.”.
Discutindo sobre a gestão democrática e o trabalho do/a pedagogo/a na resolução de
dificuldades de aprendizagem, a avaliação entrou em questão, que segundo a orientadora, faz com que
se repensem as metodologias utilizadas no processo ensino-aprendizagem a fim de superar as
dificuldades a longo prazo. Assim também o defende Dalmás (1994): a avaliação é justamente um
processo, pois não ocorre de forma pontual a fim de discorrer-se sobre os conteúdos formais, mas se
dá no início, no decorrer e no final de um primeiro processo igualmente importante: o ensino-
aprendizagem. Desta forma vive-se o que o autor chama de ação-reflexão-ação: planejamento da ação
educativa, aplicação de objetivos, análise dos resultados em relação aos objetivos propostos; esse
movimento faz com que a educador/a esteja sempre atento ao processo de ensino-aprendizagem do
aluno, numa avaliação contínua sobre metodologias e conteúdos.
Por fim, a orientadora também afirmou que o trabalho com a gestão democrática não se dá
num vazio, mas deve seguir a política definida pela escola, deve basear-se nos pressupostos filosóficos
definidos nos documentos da escola - Projeto Político Pedagógico e Regimento Interno -, que por sua
vez, são fundamentados nas leis e resoluções do governo, ditando direitos e deveres de todos aqueles
que estão implicados no âmbito escolar: “Tudo o que se faz na escola, todas as suas funções devem
estar baseadas nos documentos internos. São eles que irão ditar os caminhos a serem percorridos para
se chegar aos objetivos propostos.” (Fala da orientadora da escola investigada).
Vimos então ser possível a concretização do ideal democrático no âmbito da gestão escolar,
sobretudo se o/a educador/a considerar as defasagens que se encontram no âmbito escolar, tanto em
relação de formação de educadores/as quanto nos relacionamentos que se dão entre os sujeitos que se
encontram dentro da escola, sejam eles funcionários (professores/as, orientador/a, diretor/a, auxiliares)
ou não (família, comunidade)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar das falhas, dificuldades e atrasos em implantar adequadamente uma gestão escolar
democrática, observamos no exemplo desta escola municipal de Campo Mourão o interesse por parte
de seus/suas funcionários/as em fazer da escola um espaço para debate dos paradigmas pós-modernos
que têm como pretensão a inclusão das vozes que foram silenciadas ao longo da história da educação,
mais especificamente do currículo da escola brasileira, ou seja, as histórias e as lutas das etnias
diminuídas, do gênero, das raças, das sexualidades periféricas.
A inclusão destas questões no contexto escolar passa necessariamente pela implantação
concreta e objetiva da gestão escolar democrática, por esta dizer respeito à participação de todo o
conjunto de atores e atrizes escolares em relações horizontais, ou seja, relações de alteridade, de
respeito, de tolerância, de equidade, de compreensão e, sobretudo, de auxílio mútuo.
Baseados nestes princípios, o trabalho administrativo e pedagógico poderá se tornar mais fácil
de ser realizado, pois levará em conta as condições humanas e sociais que se dão no âmbito escolar.
Além disso, considera as condições identitárias e políticas dos sujeitos que ali estão implicados.
Desta forma, o trabalho escolar não se resumirá a mera transmissão de conhecimentos por
parte do professor, mas poderá promover a transformação social e cotidiana do/a aluno/a por meio do
trabalho participativo de toda a comunidade escolar, interna e externa, no cumprimento das funções de
cada um e dos fins objetivados coletivamente.
REFERÊNCIAS
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Pesquisa, São Paulo, n. 93, p. 12-21, mai/1995.
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entre o silenciamento e a vigilância. In: Artifícios, Pará, v. 2, n. 4, p. 1-13, dez/2012.
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Ministério da Educação, 1996.
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Transversais: Orientação Sexual. Brasília: MEC/SEF, 1998.
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DALMÁS, Angelo. Planejamento Participativo na Escola: elaboração, acompanhamento e
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JUNQUEIRA, Rogério Diniz (org.). Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a
homofobia nas escolas. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade, UNESCO, 2009.
MAIA, Ana Cláudia Bortolozzi; SPAZIANI, Raquel Baptista. Manifestações da sexualidade infantil:
percepção de pais e professoras de crianças de 0 a 6 anos. In: Revista Linhas, Florianópolis, v. 11, n.
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NEDEFF, Cristiano Carvalho. Contribuições da sexologia sobre a sexualidade infantil nos dois
primeiros anos de vida: uma revisão bibliográfica. In: Revista Psicologia: Teoria e Prática, São
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PARO, Vitor Henrique. Gestão Democrática da Escola Pública. 3ª ed. São Paulo: Ática, 2003.
Regulamento de Estágio Supervisionado do Curso de Pedagogia da Fecilcam. Resolução n° 029/2008.
SILVA, Tomaz Tadeu da (org.). Alienígenas na Sala de Aula: uma introdução aos estudos
culturais em educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995. (Coleção estudos culturais em educação).
SOUZA, Jane Felipe de. Gênero e Sexualidade nas Pedagogias Culturais: implicações para a
educação infantil. Disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:http://www.ced.ufsc.br/~nee0a6/SOUZA.pd
f>. Acesso em: 12 de mai de 2013.
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