Centro Universitário UNA Faculdade de Comunicação e Artes Gestão da Comunicação Organizacional – Relações Públicas Daniela Novais Barbieri Alteridade: O desafio da percepção do outro nos processos internos de comunicação das organizações Belo Horizonte 2006 Centro Universitário UNA Faculdade de Comunicação e Artes Gestão da Comunicação Organizacional – Relações Públicas Daniela Novais Barbieri Alteridade: O desafio da percepção do outro nos processos internos de comunicação das organizações Trabalho apresentado à disciplina de Projeto Experimental II do Curso de Gestão da Comunicação Organizacional − Relações Públicas, da Faculdade de Comunicação e Artes, do Centro Universitário UNA. Orientador: Professor Rennan Lanna Martins Mafra Belo Horizonte 2006 Dedico este trabalho à minha família e amigos. Principalmente aos meus pais, que sempre me ajudaram e incentivaram a concretizar meus sonhos. Ao meu marido, pelo apoio e carinho. E ao meu orientador, pela paciência. Agradecimentos A Deus por estar sempre comigo, me orientando, cuidando de mim e me guiando ao caminho certo. Ao meu marido Lamark, que sempre esteve ao meu lado e me ajudou a conquistar esse sonho, com seu amor e paciência, com suas palavras de perseverança e por tudo que ele representa na minha vida. Ao meu pai a quem eu admiro e amo demais. Você me ensinou a sempre sorrir e ver a vida de uma maneira diferente. Te amo, pai. À minha mãe a quem eu amo tanto e que sempre sonhou com este momento. Consegui, mãe. Aos meus queridos irmãos: Bruno e Caio pelo carinho. Amo vocês. À minha Tia Calú que fez com que meu sonho se realizasse. Obrigada por tudo, tia. A todos os meus familiares que mesmo distantes sempre torceram por mim. Ao meu tio Alex e meu primo Evandro, que também contribuíram para que este sonho se realizasse, sou grata a vocês. Aos meus amigos, colegas, meus amigos de trabalho e minha de linda célula que sempre acreditaram em mim e me deram forças nos momentos difíceis, obrigada por toda compreensão, consideração e respeito. Angela, obrigada por fazer parte da minha vida. À Coordenadora Jussara Belo, pelo carinho, apoio e confiança. E a todos os professores que contribuíram para que eu chegasse até aqui. Ao Centro Universitário UNA, pela experiência adquirida tanto academica quanto profissionalmente e por toda confiança depositada em mim. E a você Rennan, que foi mais que um orientador, mais que um mestre, mas alguém que acreditou em mim e me fez perceber que é possível conquistar nossos sonhos. Você é um exemplo. Obrigada por tudo, de coração. Para tudo há um tempo determinado, sim, há um tempo para todo assunto debaixo dos céus: tempo para nascer e tempo para morrer; tempo para plantar e tempo para desarraigar o que se plantou; tempo para matar e tempo para curar; tempo para derrocar e tempo para construir; tempo para chorar e tempo para rir; tempo para lamentar e tempo para saltitar; tempo para lançar fora pedras e tempo para reunir pedras; tempo para abraçar e tempo para manter-se longe dos abraços; tempo para procurar e tempo para dar por perdido; tempo para guardar e tempo para lançar fora; tempo para rasgar e tempo para costurar; tempo para ficar quieto e tempo para falar; tempo para amar e tempo para odiar; tempo para a guerra e tempo para a paz. (Eclesiastes 3:1-8) Resumo Este estudo apresenta a proposta de desenvolver o conceito de alteridade organizacional a partir de um olhar comunicacional, no intuito de compreender a alteridade como um desafio de percepção do outro nos processos comunicativos internos de uma organização. De maneira mais específica, tal desenvolvimento é buscado a partir de uma interlocução teórica entre os conceitos de alteridade, identidade, cultura e comunicação, apropriando de tais formulações ao contexto das organizações. A idéia principal, aqui defendida, é que a alteridade organizacional pode representar um valor cultural, legitimado pela gestão, e estimulado por práticas comunicativas estratégicas internas. Para alargamento do horizonte teórico proposto, a relação entre o Centro Universitário UNA - uma instituição de ensino superior – e seu público interno foi utilizada como objeto empírico. Para isso, foi realizada uma pesquisa, baseada em metodologia qualitativa, a partir de um modelo de análise elaborado, no intuito de identificar, junto ao público interno de tal instituição, em que medida a alteridade organizacional se encontra presente em suas práticas como um valor, e como ou se a comunicação da instituição participa do estímulo a tal processo. Palavras-Chave: alteridade – identidade – cultura – organização - comunicação Lista de Figuras e Quadros Quadro 1.................................................................................................37 Quadro 2.................................................................................................41 Figura 3...................................................................................................52 Figura 4...................................................................................................63 Sumário Introdução ............................................................................................................................... Justificativa ............................................................................................................................. Objetivos ................................................................................................................................. Objetivo geral ......................................................................................................................... Objetivos específicos ........................................................................................................... 9 11 13 13 13 Capítulo 1: Alteridade Organizacional: em busca de definições 1.1 - Identidades ........................................................................................................ 1.1.1 - A cultura e a linguagem no processo de construção identitária ...................... 1.2 - A Alteridade em Questão ................................................................................ 1.2.1 - Dificuldades com relação à Alteridade ......................................................... 1.3 - O que é Organização? ................................................................................ 1.4 - Identidade Organizacional .......................................................................... 1.5 - A Cultura Organizacional ............................................................................. 1.6 - Identidade, subculturas e alteridade organizacional: em busca de uma 14 16 19 21 23 25 28 formulação .................................................................................................................. 1.7 - Comunicação interna e Relações Públicas: em busca da prática alteritária nas 30 organizações .............................................................................................................. 1.8 Modelo de análise: em busca de uma representação entre alteridade 33 organizacional e comunicação ................................................................................... 37 1.9 Procedimentos Metodológicos .............................................................................. 40 Capítulo II - Um Olhar Sobre a Realidade: A Alteridade Organizacional e o Centro Universitário UNA 2.1 - UNA – Histórico ............................................................................................... .................................... 2.2 - A UNA e sua estrutura administrativa e acadêmica ............................. 2.3 - UNA e Público interno: Em busca de pistas alteritárias 2.3.1 - A Carta de Valores ...................................................................................... 2.3.2 - Programa De Bem com a Vida ................................................................ 2.3.3 - Academia dos Professores ...................................................................... 2.4 - A Pesquisa Qualitativa: investigando a Alteridade com os sujeitos da Instituição .................................................................................................................... 42 45 46 47 48 49 51 ................. 2.5 - Análise das Entrevistas por Camadas ....................................................... 2.5.1 - Quebra-Gelo ............................................................................................... ........................................................... 2.5.2 - Consideração / Valorização – Gestão 2.5.3 – Diálogo .......................................................................................................... ........................................................... 2.5.4 - Percepção pelo outro: setor / pessoa ..................................................... 2.6 - Pesquisa com setor de marketing da UNA 2.6.1 - Quebra-gelo .................................................................................................. 2.6.2 - Práticas estratégicas interna estimulam a percepção do outro? ..................... .................................................................. 2.7 - Considerações Gerais da Pesquisa Considerações Finais ................................................................................................ Referencias Bibliográficas ................................................................................................. Introdução A busca pelo entendimento da alteridade, no contexto das organizações, representa o tema dessa monografia. Sendo assim, o presente trabalho tem como proposta convidar o leitor a pensar sobre a alteridade – que pode ser entendida, em linhas gerais, como uma capacidade de percepção do outro – no contexto das organizações, especialmente nos processos internos de comunicação. A discussão conceitual empreendida vincula o conceito de alteridade ao conceito de identidade, de maneira a entender a alteridade – as diferenças – em contraponto à identidade – as semelhanças. Frente a isso, o conceito de alteridade é também localizado junto à cultura, de modo que esta última oferece os elementos tanto para constituição da identidade, como também da alteridade. Nesse sentido, entenderemos, no trabalho, que uma capacidade alteritária representa uma constituição eminentemente cultural. Em seguida, no intuito de apropriar o conceito de alteridade para o ambiente das organizações, discutiremos que as organizações – enquanto agrupamentos humanos – apresentam também identidades e culturas próprias. 53 53 55 58 60 63 64 65 67 69 72 Nesse ínterim é que buscaremos localizar o conceito de alteridade organizacional, de modo a entender que o mesmo surge em meio às diferenças culturais e identitárias no interior mesmo das organizações – por mais que exista a ilusão de uma identidade única nos processos internos das organizações. Em meio a isso, vincularemos à identidade um conceito fundamental, que orientará todo o enfoque deste trabalho: o conceito de comunicação. Buscaremos entender como a alteridade é também um processo que só é possível “em relação”, ou seja, por meio de processos comunicativos. E, em linhas gerais, justamente por apresentar ligação intrínseca com o conceito de comunicação, a alteridade organizacional pode ser estimulada por práticas comunicativas estratégicas e de Relações Públicas, de modo que a mesma, com o apoio da gestão e em direção à cultura, possa representar um valor em meio às organizações. Para tanto, é importante, nas organizações, que o público interno esteja integrado, que tenha uma percepção e um olhar diferente para o outro ou mesmo para o outro setor. Isso porque a alteridade está totalmente inserida nas relações, entre as pessoas, e é preciso que ela seja estimulada ou já faça parte da cultura da organização para que tal percepção das diferenças do outro (esse outro discutido com mais profundidade ao longo do trabalho) sejam pontos chaves e estratégicos para a empresa, além de facilitar a interação entre o ambiente interno. Para a realização do trabalho escolhemos o Centro Universitário UNA – uma instituição de ensino superior, instalada em Belo Horizonte/MG, e que conta com 7 campi e uma série de setores e áreas diferentes, convivendo em meio aos processos internos. Com o objetivo de discutir tais diferenças, e as influências das mesmas junto à instituição – tendo como foco a comunicação – buscaremos alargar o horizonte teórico proposto e discutir, a partir de um objeto empírico, o conceito de alteridade organizacional, tendo como foco o desafio da percepção do outro nos processos internos. Nesse sentido, esta monografia se organiza por meio de dois capítulos: o primeiro procura desenvolver a noção de alteridade organizacional, tendo como conceitos norteadores a identidade, a cultura, a gestão e a comunicação. O segundo capítulo busca conhecer, com mais detalhes, as nuances do objeto empírico a ser estudado, que será problematizado a partir da realização de uma pesquisa, tendo como base metodologia qualitativa (detalhada adiante). Espera-se, com esse levantamento, reunir pistas e indícios importantes que nos apontem como podemos entender a alteridade no contexto das organizações. Justificativa Por que estudar a alteridade? Por que utilizar esse conceito? A idéia de trabalhar com o tema da alteridade no contexto das organizações foi bastante desafiadora e instigante. Isso porque um de nossos esforços foi a busca por apropriar do conceito de alteridade, a partir de uma série de autores referendados, no contexto das organizações. Tal apropriação, se feita, não se encontra disponível na literatura corrente, e, justamente por isso, acreditamos que tal construção, mesmo que realizada no espaço de uma monografia, e que ainda tenha que trilhar por um longo caminho de amadurecimento, apresenta um novo olhar para os processos internos organizacionais. Nesse sentido, o presente trabalho focaliza o público interno, os setores, analisando a relação entre eles, a percepção e o olhar pelo outro, no intuito de entender se a alteridade organizacional pode ser compreendida tanto como um valor cultural quanto uma prática comunicativa. O foco nos setores é justificado pela constatação de que a falta de integração, a cultura e a comunicação apenas se concretizam por meio das pessoas; mas são estímulos e práticas comunicativas que envolvam os setores a trabalharem integrados, preocupados um com o outro, trabalharem como equipe. A comunicação interna é um fator estratégico no sucesso dos negócios, pois gera resultados. É, portanto, um agente humanizador das relações de trabalho e ajuda a consolidar a imagem da organização junto ao seu público interno. As características da comunicação são determinadas pela cultura organizacional e pelas práticas estratégicas de comunicação. A partir da análise dos fatores acima, que demonstrou a forte inter-relação e interdependência existente entre a comunicação, a cultura e a vida das organizações, evidenciou-se a necessidade de que os profissionais de comunicação incorporem essas variáveis no planejamento e na execução de suas ações, visando a integração do público interno por parte de estímulos a alteridade. Com isso, é importante que os profissionais de comunicação incorporem esses desafios às práticas alteritárias em seus planejamentos e na execução de ações, visando trazer melhorias para o clima organizacional e a integração entre o público interno (setores), a compreensão e entendimento por parte de todos. Contudo, é válido sempre lembrar que a gestão da organização, de maneira mais ampla, tem papel decisivo na busca pela alteridade como um valor das organizações – e isso não apenas por mecanismos culturais, mas também por mecanismos de gestão eficientes, capazes de tornar os setores e departamentos aptos e cientes de suas próprias identidades e funções. A utilização do Centro Universitário UNA como objeto desta pesquisa reside no fato de o mesmo representar uma organização que apresenta uma série de diferenças internas, entre os setores, e que representou um espaço de fácil acesso para a busca de informações na realização de nossa pesquisa. Dessa maneira, acreditamos que a relevância desse estudo reside tanto no fato de buscar entender a alteridade, no campo da comunicação, como um valor cultural nas relações entre os setores internos do Centro Universitário UNA, quanto estimulado por práticas comunicativas estratégicas internas. Objetivo Geral: Discutir o conceito de alteridade organizacional, tendo como foco o desafio da percepção do outro nos processos internos de comunicação das organizações. Objetivos Específicos: - Realizar discussão conceitual sobre identidade, alteridade, cultura e comunicação, na tentativa de um modelo de análise sobre alteridade organizacional; - Tendo como base o modelo de análise, realizar verificação empírica de tal modelo na realidade interna comunicacional do Centro Universitário UNA. CAPÍTULO 1: ALTERIDADE ORGANIZACIONAL: EM BUSCA DE DEFINIÇÕES Para situar o conceito de “Alteridade", neste capítulo, optamos por abordar primeiramente o tema "Identidade" de modo amplo, tratando, inicialmente, de sua definição. Em seguida, explicaremos o conceito de Alteridade a partir do conceito de Identidade, utilizando, para isso uma abordagem antropológica e sociológica. Ao final, trataremos o conceito de Alteridade nas organizações e o desafio da comunicação junto aos processos internos organizacionais. 1.1 Identidades Quem sou? O que me faz ser assim? Por que me sinto parte de alguns grupos e distante de outros? Há séculos, o ser humano se coloca questões como essas. Em estudos de diversas áreas das ciências humanas, a temática da identidade vem sendo muito discutida, e seria a partir de tal temática que podemos situar, adiante, o conceito de alteridade (MENDONÇA, 2006). Stuart Hall (2000) demonstra a historicidade do conceito de identidade, apresentando algumas formas como foi concebido ao longo da modernidade, a partir das transformações sociais mais relevantes que, a partir do século XVI, especialmente, ocorreram no seio da sociedade ocidental. Na visão de Hall (2000), distinguem-se três concepções muito diferentes de identidade, a saber, as dos: a) Sujeito do Iluminismo, b) Sujeito sociológico e c) Sujeito pós-moderno. Hall (2004) aponta que o sujeito do Iluminismo baseava-se numa concepção da pessoa humana como um indivíduo totalmente centrado, unificado, dotado das capacidades de razão, de consciência e de ação, cujo “centro” consistia num núcleo interior, que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e com ele se desenvolvia, ainda que permanecendo essencialmente o mesmo – contínuo ou “idêntico” a ele – ao longo de sua existência. A noção do sujeito sociológico refletia a crescente complexidade do mundo moderno e a consciência de que este núcleo interior do sujeito não era autônomo e auto-suficiente, mas era formado na relação com “outras pessoas importantes para ele”, que mediavam para o sujeito, os valores, sentidos e símbolos - a cultura – dos mundos nos quais habitava. A identidade, nesta noção, é formada na “interação” entre o eu e a sociedade e preenche o espaço entre “interior” e o “exterior”, entre o mundo pessoal e o mundo público. Hall (2000) aponta que a perspectiva (tradição) sociológica, mesmo compreendendo a identidade como resultante da interação que o ‘eu’ (espaço interior, mundo pessoal) estabelece com a sociedade (espaço exterior, mundo público), ainda mantém viva a idéia do unificado, do único. Se por um lado, o núcleo interior do sujeito já não é tido como independente, portanto resultante das relações que estabelece com o social, a identidade como construção a partir das mediações, costuras e arremates entre o plano pessoal e o público (cultura), por outro, continua a contemplar a construção de uma identidade una, delimitável e condigna à condição sociocultural. Assim, além de exprimir a resultante das diversas interações do sujeito com o ambiente, a identidade sutura o sujeito ao sistema social, de modo que possa facilmente localizar-se e ser localizado. Já a noção de sujeito pós-moderno, para Hall (2004), conceptualiza-se como não tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um “eu” coerente. Sendo assim, dentro de nós, há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações são continuamente deslocadas, em relação aos sentidos que empregamos para dar significado do mundo. Ele defende, portanto, a partir de uma noção de sujeito pós-moderno, que a identidade só pode ser pensada como dinâmica elaborada nos incessantes processos narrativos do viver, em meio aos modos de vida, aos símbolos, à cultura. Sendo assim, a identidade torna-se uma “celebração móvel’: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam” (HALL, 2000, p. 13). Em conformidade com essa perspectiva, para Kathryn Woodward (2000 apud MENDONÇA 2006, p.18), as identidades que perpassam os sujeitos são esquemas culturais. Os discursos e os sistemas de representação constróem lugares a partir dos quais os indivíduos podem se posicionar e a partir dos quais podem falar. Nota-se que os sujeitos são elaborados no bojo da sociedade e da cultura. Ainda que a subjetividade seja um atributo individual, o homem a vive em um “contexto social, no qual a linguagem e a cultura dão significado à experiência que temos de nós mesmos e no qual nós adotamos uma identidade” (FRANÇA, 2002: web). Sendo assim, ligados à noção de identidade, dois elementos também importantes para o entendimento da noção de alteridade são a cultura e a linguagem. 1.1.1 A cultura e a linguagem no processo de construção identitária Para Edward Tylor (2006:web) desde a Antigüidade, tem-se tentado explicar as diferenças de comportamento entre os homens, a partir das diversidades genéticas ou geográficas. Contudo, características biológicas não são determinantes das diferenças culturais: por exemplo, se uma criança brasileira for criada na França, ela tenderá a crescer como uma francesa, aprendendo a língua, os hábitos, crenças e valores dos franceses. Podemos citar, ainda, o fato de que muitas atividades que são atribuídas às mulheres numa cultura são responsabilidades dos homens em outra. Um outro exemplo são as tribos de índios que habitam uma mesma área florestal e têm modos de vida bem diferentes: algumas são amigáveis, enquanto outras são ferozes; algumas se alimentam de vegetais e sementes, outras caçam; têm rituais diferentes, etc. A partir disso, podemos entender a cultura com base em Tylor (2006:web), como um conceito antropológico e sociológico que comporta múltiplas definições. A cultura é a forma pela qual uma comunidade satisfaz suas necessidades materiais e psicossociais e é também a forma pela qual uma comunidade define seu perfil em função da necessidade de adaptação ao meio ambiente. Para Da Mata (1980), p. 123), cultura é, em antropologia social e sociologia, Um mapa, um receituário, um código através do qual as pessoas de um dado grupo pensam, classificam, estudam e modificam o mundo e a si mesmas. É justamente porque compartilham de parcelas importantes deste código (a cultura) que um conjunto de indivíduos com interesses e capacidades distintas e até mesmo opostas transforma-se num grupo e podem viver juntos sentindo-se parte de uma mesma totalidade. Podem, assim, desenvolver relações entre si porque a cultura lhes forneceu normas que dizem respeito aos modos mais (ou menos) apropriados de comportamento diante de certas situações. Compartilhando também dessa perspectiva, o IEPHA define assim o conceito de cultura: O conjunto de atividades e modos de agir, costumes e instruções de um povo. É o meio pelo qual o homem se adapta às condições de existência transformando a realidade. Cultura é um processo em permanente evolução, diverso e rico. É o desenvolvimento de um grupo social, uma nação, uma comunidade; fruto de esforço coletivo pelo aprimoramento de valores espirituais e materiais. Tais conceitos de cultura procuram estabelecer suas bases e concentrar-se nas formas diversas de cognição e aprendizado que caracterizam diferentes comunidades. De forma semelhante aos indivíduos, estas optam por determinadas maneiras de pesquisar, perceber e compreender a realidade. E em meio a essa percepção da realidade, a linguagem possui um papel fundamental. Muito mais do que apenas um código lingüístico utilizado pelos homens, a linguagem, de acordo com Berger e Luckmann (1985), ordena a teia de relações do indivíduo, marcando as coordenadas de sua vida e dotando o seu mundo de significação. Nessa construção de significados acerca da realidade, o universo simbólico também oferece “ordem para a apreensão subjetiva da experiência biográfica” (LUCKMANN, 1985, p.134). De tal sorte, em meio a contextos e culturas, e, tendo a linguagem como mecanismo simbólico fundamental, as identidades se conformam em processos de articulação, de construção e de pontos de apego que ligam o sujeito a determinados discursos e papéis. Somos atravessados por várias identificações, sendo que há zonas de interseção e conflito entre elas. E é, em especial, no momento de conflito, que surgem as diferenças. (MENDONÇA, 2006, p.19). Ampliando, portanto, esse prisma, Hall (2000) aponta que a identidade é discursivamente construída, uma vez que no dotar o mundo (e a si próprio) de significância, o ser humano se constrói. É nesse sentido, buscando aquilo que lhe parece semelhante e negando aquilo que lhe parece diferente, ou estranho, Hall (2004) destaca que a identidade é elaborada e concretizada a partir da relação com o outro. O indivíduo está imerso no social e se forma nas suas relações. O “eu” só consegue se definir a partir do momento em que percebe suas diferenças para com os Outros. Assim, as identidades são “mais o produto de uma marcação do diferente e da exclusão do que o signo de uma unidade idêntica, naturalmente constituída, de uma identidade em seu significado tradicional” (HALL, 2004, p.109). Dessa maneira, pensar o outro é pensar os limites sempre feitos e refeitos de um nós. Não faria sentido o outro por si só. Ele só existe porque ele faz parte de um processo de marcação identitária no qual suas referências são tomadas como diferenças. É na relação com as diferenças desse outro, a partir da constituição de um nós, que a experiência de alteridade ganha seus contornos. Sendo assim, como conceituar, de maneira mais profunda, a noção de alteridade? 1.2 A Alteridade em Questão Como vimos, apenas existimos a partir do outro, da visão do outro, o que nos permite também compreender o mundo a partir de um olhar diferenciado, (partindo tanto do diferente quanto de nós mesmos), conformado por uma experiência do contato com aquilo que, para nós, seria semelhante ou distinto. É dessa maneira que Alteridade (ou "outridade") é a concepção que parte do pressuposto básico de que todo o homem social interage e interdepende de outros indivíduos. Assim, como muitos antropólogos e cientistas sociais afirmam, a existência do "eu-individual" só é permitida mediante um contato com o outro (que em uma visão expandida se torna o Outro - a própria sociedade diferente do indivíduo). (MONTAIGNE, 2000, p.307). Assim, a experiência da alteridade leva-nos a ver aquilo que nem teríamos conseguido imaginar, dada a nossa dificuldade em fixar nossa atenção no que nos é habitual, familiar, cotidiano, e que consideramos ‘evidente’. Aos poucos, notamos que o menor dos nossos comportamentos (gestos, mímicas, posturas, reações afetivas) não tem realmente nada de ‘natural’ (LAPLANTINE, 2000, p.21), mas representam, grande parte das vezes, sinais de processos sociais mais amplos em que estamos inseridos – mais do que sinais meramente biológicos. Quanto a isso, Velho (1996, p.10) aponta que: A noção de outro ressalta que a diferença constitui a vida social, à medida que esta efetiva-se através das dinâmicas das relações sociais. Assim sendo, a diferença é a base da vida social e fonte permanente de tensão e conflito. Laplantine (2000, p.21), em conformidade com isso, elucida que o conhecimento (antropológico) da nossa cultura passa inevitavelmente pelo conhecimento das outras culturas; e devemos especialmente reconhecer que somos uma cultura possível entre tantas outras, mas não a única. Para Lévinas (1973), a idéia de alteridade não se limita apenas a experiência de contato com o outro, mas, acima de tudo de colocar o outro no lugar do ser. Nesta visão, o outro não seria um objeto, mas um sujeito. Descamps (1991, p. 85) também compartilha disso, quando elucida que "a relação com o Outro é a base de uma co-presença ética". Cada um é constantemente confrontado com um próximo1. Dessa maneira, não há princípios de alteridade naqueles que não aceitam a dissidência de antigos companheiros, que não aceitam a oposição deliberada, a opinião, o ponto de vista diferente e adota-se uma postura de discriminação, trata o diferente com a indiferença e não adota a tolerância como princípio básico de mediação das relações interpessoais 2. Estas questões nos inspiram 1 É interessante notar que, nesse confronto (a partir das noções acima), podemos entender que não sou Eu frente ao Próximo (Outro), mas sim os Outros continuamente frente a Mim. Esta proposta rompe com a perspectiva autonomista e individual para remetê-la a uma visão de rede social. Deixa de ter sentido a máxima "A minha liberdade termina quando começa a dos outros", sendo substituída pela proposta de que a minha liberdade é garantida pela liberdade dos outros. (SOUZA, 2004, p.162) 2 Sob esse prisma, pela relação alteritária é possível estabelecer uma relação pacífica e construtiva com os diferentes, na medida em que se identifique, entenda e aprenda a aprender a discutir algumas dificuldades com relação à alteridade. É o que veremos a seguir. 1.2.1 Dificuldades com relação à Alteridade Segundo Bauman (1998), a produção da alteridade seria algo inerente a toda sociedade, já que a convivência gera a diferença. Os outros são aqueles que não se encaixam nos mapas cognitivos, morais e/ou estéticos do mundo. Para o autor, eles geram a incerteza, porque explicam a contingência do Nós, de seus valores e normas. Bauman (1998) cita duas estratégias que foram muito utilizadas, ao longo da história, para lidar com os Outros. A primeira delas, que ele denomina antropofágica, revelar-se-ia no sentido de um aniquilamento da alteridade, seguido de sua transformação no sentido de fazê-la semelhante. Já a estratégia antropoêmica consiste em “vomitar os estranhos, bani-los dos limites do mundo ordeiro e impedi-los de toda comunicação com os do lado de dentro” (BAUMAN, 1998, p.29). Com relação à perspectiva antropofágica definida por Bauman (1998), Young (1990 apud MENDONÇA, 2006) demarca cinco diferentes formas desrespeitosas de lidar com os Outros, sintetizando-as como formas de opressão. São elas: exploração, marginalização, falta de poder, imperialismo cultural e violência. Com especial atenção à quarta categoria definida pela autora, é válido ressaltar que o imperialismo cultural ocorre através da construção de quadros com o contrário. “Ou aprendemos a viver como irmãos, ou vamos morrer juntos como idiotas” (Martin Luther King). De uma forma leve e poética, Pereira (2006: web) aponta: Olhe para os dedos de sua mão. Eles são diferentes. Ainda bem. Exatamente por serem diferentes eles são harmoniosos quando vistos em conjunto. Já imaginou se eles fossem todos iguais?Certamente teríamos dificuldade de fazer o que fazemos de maneira tão natural. A humanidade, pode-se dizer, é semelhante a uma mão. Somos diferentes numa família. Somos diferentes numa região. Somos diferentes numa nação. A diferença é inerente, portanto, à natureza humana. Que bom que assim seja.”(CARLOS PEREIRA, 2006: WEB). culturais,que marcam certos grupos como Outros, estereotipando-os em formas de representações homogeneizantes e, geralmente, negativas. Para a autora: Aqueles que vivem sob o imperialismo cultural encontram-se definidos por fora, posicionados, situados, por uma rede de significados dominantes que eles experienciam como surgidas alhures, a partir daqueles com quem não se identificam e que não se identifacam com eles. (YOUNG, 1990, p.59 apud MENDONÇA, 2006). O fato de os Outros serem narrados, freqüentemente, de maneiras negativas, gera conseqüências bastante perigosas, tanto no que se refere à posição social dos sujeitos que compõem esse grupo, como no tocante à relação desses sujeitos consigos próprios. Isso porque “é por meio dos significados produzidos pelas representações que damos sentido à nossa experiência e àquilo que somos” (WOODWARD, 2000, p.17). Taylor (1994) explica os perigos de representações estigmatizantes ao declarar que “uma pessoa ou grupo pode sofrer dano real, distorção real, se as pessoas ou sociedade em volta deles representam-nos com uma imagem restrita, humilhante ou degradante”. Honneth (2003) também afirma que o desrespeito é um “comportamento lesivo pelo qual as pessoas são feridas numa compreensão positiva de si mesmas”. Visto que, nesse sentido, a alteridade surge como uma faculdade fundamental, especialmente no sentido de tentar eliminar as formas de desrespeito com relação ao outro, considerando-o como legítimo em suas escolhas, apesar das diferenças. O ver-se representando negativamente pode ferir a auto-estima, impedindo a realização do indivíduo em sua integridade. Nesse sentido, alteridade seria, portanto, a capacidade de conviver com o diferente, de se proporcionar um olhar interior a partir das diferenças do outro. Significa reconhecer o outro em si mesmo, também como sujeito aos mesmos direitos de todos, o que também gera deveres e responsabilidades. Desta constatação das diferenças é que gera a alteridade, alavanca da solidariedade e da responsabilidade (SILVA, 2006) Antes de encerrar as considerações sobre alteridade, é válido apontar que, para Martin Luther King (2006: web), a palavra alteridade possui o significado de se colocar no lugar do outro numa relação interpessoal, com consideração, valorização e diálogo. A prática da alteridade se conecta aos relacionamentos tanto entre indivíduos como entre grupos culturais, religiosos, científicos, étnicos, etc. e conduz da diferença à soma nas relações interpessoais entre os seres humanos, revestidos de cidadania. Luther King aponta, em conceituação, uma perspectiva de entendimento interessante: a de que a alteridade se torna possível “em relação”, ou seja, quando os sujeitos vivenciam a experiência de interação com o outro. Nesse sentido, é válido apontar que a experiência de alteridade, é, antes de tudo, uma experiência que só é possível a partir da comunicação. Neste trabalho, compartilharemos da visão de França (2001), na qual comunicação é um processo de produção e compartilhamento de sentidos entre sujeitos interlocutores, realizado através de uma materialidade simbólica (da produção de discursos) e inserido em determinado contexto sobre o qual atua e do qual recebe os reflexos. (FRANÇA, 2001). Dessa maneira, seria nesse compartilhamento de sentidos num determinado contexto, que a prática alteritária surge, e pode ser vivenciada. Portanto, estar com o outro, de maneira respeitosa, é também estar em comunicação com o outro. Foi dessa maneira que apresentamos a alteridade numa visão ampla, especialmente a partir da identidade. Interessa-nos, particularmente, entender: a alteridade, enquanto prática comunicativa, pode ser problematizada no contexto das organizações? 1.3 O que é Organização? Para buscarmos uma definição de alteridade no contexto das organizações, certamente uma de nossas preocupações foi a de buscar definições sobre organização. Foi nesse sentido que pudemos perceber que a palavra organização nos evoca uma série de sentidos e concepções. De início, é possível recuperar Maximiano (1995, p. 24) que aponta que: uma organização é a combinação de esforços individuais que tem por finalidade realizar propósitos coletivos. Por meio de uma organização torna-se possível perseguir e alcançar objetivos que seriam inatingíveis para uma pessoa. Uma grande empresa ou uma pequena oficina, um laboratório ou o corpo de bombeiros, um hospital ou uma escola são todos exemplos de organizações. Para Robbins (1998), organização significa uma unidade social coordenada conscientemente, composta de duas ou mais pessoas, que funciona numa base relativamente contínua para alcançar uma meta ou um conjunto de metas comum. Etzioni (1989) compartilha dessa perspectiva quando aponta que a base da organização é ser uma unidade social, na qual os objetivos organizacionais têm várias funções, entre elas: "fonte de legitimidade que justifica suas atividades; padrões para avaliar sua eficiência e rendimento; unidade de medida, para verificar sua produtividade (...). A razão de ser então da organização é servir a esses objetivos" (1989:07). O autor ainda destaca que existem muitas organizações que, simultaneamente e legitimamente, têm dois ou mais objetivos, isto é, possuem “finalidades múltiplas, deixando claro que a organização deve ser vista como uma unidade social que procura atingir objetivos específicos, sendo estruturada para tal” (ROBBINS, 1998, p. 7). Bartoli (1991) centraliza seu conceito de organização na ação de organizar (distribuição formal de responsabilidades – organograma), e para ele, existem alguns fatores que são inerentes a todas as organizações: 1 – finalidade existente e conhecida por todos os membros do grupo; 2 – distribuição de regras e tarefas a serem realizadas; 3 – divisão da autoridade e poder formal; 4 – duração indeterminada (missão permanente) ou claramente explicitada em função de um determinado objetivo; 5 – sistema de comunicação e coordenação; 6 – critérios de avaliação e controle dos resultados" (BARTOLI, 1991, p. 18). Portanto, para Bartoli (1991), a "ação de organizar" constitui um conjunto de elementos estruturais composto por regras, procedimentos e dispositivos de coordenação e distribuição de tarefas e responsabilidades, sendo a organização um "conjunto organizado" em si mesmo – o que corresponde a qualquer grupo de homens constituído conscientemente visando determinado objetivo, mas que precisam de uma estrutura que os mantenha, com um conjunto de elementos e de interações relativamente estáveis do sistema. Drucker (1997), por exemplo, embasa o conceito de organização no conhecimento. Em linhas gerais, para esse autor o conhecimento é a base que torna possível à organização ser especializada e suas funções definidas, de forma que tal conhecimento seja transformado em conhecimento produtivo. Nesse sentido a função das organizações é tornar produtivos os conhecimentos, e quanto mais especializados forem, mais eficazes serão. Dessa maneira, de forma a reunir a concepção de todos esses autores, é possível, de maneira geral, entender que uma organização é formada pela soma de recursos humanos, recursos materiais e recursos financeiros, todos estes orientados a um objetivo comum. Tal objetivo pode ser mercadológico (por exemplo, uma empresa de cosméticos), mobilizadores (por exemplo, uma organização não-governamental que defenda o meio-ambiente) ou políticos (por exemplo, uma prefeitura ou um estado de uma federação). Contudo, ao contrário de identificar as diferenças e especificidades de cada tipo de organização, essa monografia tem como foco específico compreender as organizações como um tipo de agrupamento humano específico, que compartilha objetivos, valores, símbolos e justamente por isso, é composto de elementos que constituem uma identidade e uma cultura própria, como veremos a seguir. 1.4 Identidade Organizacional Ao tratar os processos de identidades nas organizações, podemos utilizar como base as mesmas formulações conceituais que discutimos no início deste capítulo, quando tratamos da temática mais ampla da identidade. Como vimos, Hall (2000, pág.13) aponta que nos diferentes momentos, o sujeito assume diferentes identidades que podem ser até contraditórias, portanto deslocadas em diversas direções. Desse modo, ao contrário do que buscar definir uma identidade única e imutável de uma organização, o mais interessante seria entender os processos pelos quais o indivíduo assume identidades diferentes. Tais processos podem ser chamados de “identificações”. A identificação é, pois, um processo de articulação, uma saturação, uma sobredeterminação, e não uma subsunção. Há sempre ‘demasiado’ ou ‘muito pouco’ – uma sobredeterminação ou uma falta, mas nunca um ajuste completo, uma totalidade. (HALL, 2000, p.106). Nesse sentido, ao buscar entender a identidade no contexto organizacional, SILVA (2000) aponta que a identidade organizacional materializa complexos jogos relacionais que atualizam processos identificatórios específicos, fragmentados e até contraditórios. O autor ainda afirma que os processos de identificação não são fixos e apresentam fragmentações por se basear na idéia de Hall (2000) de que a identidade não seria um processo fixo e uno, e representa, tanto um jogo complexo de forças quanto um processo que acontece “em relação”. Dessa forma, a identidade organizacional também é produto dessas interações. Sendo assim, de maneira mais específica, é no interior das representações (cultura, símbolos, valores) que as identidades são construídas e transformadas. Esse processo de permanente construção/reconstrução se dá pela relação, isto é, pela estreita relação dialética que a identidade mantém com a alteridade, do sujeito com o outro. Quanto a isso, Hall (2000, p. 13) inclusive aponta que à medida que “os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente” (HALL, 2000, p.13). Desse modo, infere-se que somente seria possível acessar e/ou descrever uma identidade a partir de sua temporalidade material, em sua práxis. O que nada mais seria do que um fragmento, uma das possibilidades de identificação, a partir de uma dada tensão relacional. Se ainda é possível afirmar que a identidade é formada pela relação que a organização estabelece com o entorno (a sociedade), pontua-se, no entanto, que não mais se pensa em uma identidade única, pura, cristalizada, que facilmente possa lograr a simpatia dos públicos. Entretanto, Silva (2000) aponta que comumente utiliza-se o termo identidade organizacional para remeter a algo integral, original, coerente, estável, quase que imutável, ou seja, o sujeito seria definido de uma vez por todas e marcado de forma quase que indelével. Como vimos, essa compreensão de identidade está firmemente embasada nos princípios e na concepção de sujeito iluminista, já superada conceitual e pragmaticamente. Portanto, em busca de uma definição de identidade no contexto das organizações, para Hall (2000) uma determinada “identidade organizacional” seria resultante da ação e da identificação de sujeitos num determinado contexto, sendo que a organização situa-se em meio às várias possibilidades de contornos identitários. Para Whetten e Godfrey (1998, p. 33) a identidade de uma organização é constituída pelo conjunto de representações que seus integrantes formulam sobre o significado dessa organização, em um contexto social, isto é, “depende de como seus integrantes compreendem a si mesmos como uma organização” (WHETTEN, GODFREY, 1998, p. 33). Por fim, Hall (2000) elucida que nenhuma identidade organizacional está fechada a priori. Resulta complexa e dinamicamente das transações que a organização materializa com os seus públicos e o entorno e contempla performaticamente – em diferentes níveis, espaços e tempos – os principais traços da multiplicidade de identidades de seus públicos. Mesmo simbólicos e temporais, os contornos da identidade organizacional são desenhados pelos processos de negociação atualizados nas fronteiras culturais, ou seja, nos lugares em que a identidade cultural da organização relaciona-se com o que está fora dela. É assim que a cultura – ou as culturas – de uma organização assume papel fundamental no processo de construção da identidade organizacional, como veremos a seguir. 1.5 A Cultura Organizacional De início, é possível afirmar que, de acordo com Luz (2003) a cultura organizacional é o conjunto de valores, crenças, normas e princípios que são definidos por meio das interações que acontecem numa organização. A cultura pode ser vista através do comportamento dos funcionários, do ambiente interno da empresa, das decisões tomadas, do modo de administrar, do seu processo de comunicação interna e externa dos ‘mitos, tabus, tradições, sentimentos e comportamentos compartilhados pelos membros de uma organização’ (LUZ, 2003, p. 16) Uma das definições mais conhecidas de cultura organizacional é a desenvolvida por Schein (1998, p.24): Cultura organizacional é o conjunto de pressupostos básicos que um grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender como lidar com problemas de adaptação externa e integração interna e que funcionaram bem o suficiente para serem considerados válidos e ensinados a novos membros como forma correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas. Schein (1998) procurou elaborar um conceito de cultura organizacional concebendo-a como um modelo dinâmico que é aprendido, transmitido e mudado. Segundo o autor, existem diferentes níveis pelos quais a cultura de uma organização pode ser aprendida: 1) O layout da organização; 2) o comportamento das pessoas – fáceis de serem percebidos mas difíceis de serem interpretados; 3) os valores – sendo que aqui o autor aponta o problema da diferença existente entre os valores aparentes e os valores em uso e os pressupostos básicos, que normalmente são inconscientes, mas que na realidade, determinam como os membros do grupo percebem, pensam e sentem. Schein (1998) também aponta que a formação da cultura organizacional se dá desde o surgimento das organizações, quando os fundadores estabelecem quais são os objetivos e valores a que a organização se destina. A partir daí a cultura organizacional se sedimenta e é reforçada pelo grupo por meio da aprovação e reprovação de certos comportamentos e resultados. (SCHEIN, 1998 apud MARCHIORI, 1995) Analisando diversas definições de Barnard (1938), Follett (1964) e Selznick (1957), podemos destacar, historicamente, alguns pontos relativos à cultura organizacional, na visão de tais autores: • A cultura envolve o aprendizado e a transmissão dos valores adotados por um grupo para solucionar problemas; • A cultura funciona como elemento de comunicação e consenso; • Símbolos, rituais, e comportamentos manifestos são algumas das expressões da cultura organizacional; • A cultura influencia a maneira como os negócios são conduzidos; • A comunicação é um fator chave na transmissão da cultura entre os elementos do grupo. Por fim, no intuito de sistematizar as definições de cultura organizacional, Schein (1984) aponta que a cultura pode ser dividida em três componentes, cada um abrangendo uma série de fenômenos: . Preceitos – conjunto de normas, valores, regulamentos, política administrativa, tradições, estilos gerenciais que governam e controlam o funcionamento organizacional. É a função reguladora, de autoridade dentro da organização. Engloba não só leis formais, como os costumes, rituais, padrões e códigos informais. . Tecnologia – conjunto de instrumentos, processos, know-how, modo de fazer as coisas, distribuição de tarefas, divisão do trabalho e fluxo organizacional. É a função técnica, metodológica científica, racional e operativa da organização. . Caráter – conjunto de expressões ativas e afetivas dos indivíduos da organização, manifestações de idiossincrasias, características dos comportamentos grupais. Engloba as percepções, os sentimentos e as reações positivas ou negativas dos sujeitos organizacionais. Cabe ressaltar que esses três elementos da cultura não são necessariamente equivalentes: um ou outro pode predominar na vida organizacional, pode ter maior expressão, atuar com mais força. Há organizações eminentemente tecnológicas, outras mais normativas, outras ainda em que são mais intensas a expressão do caráter. Contudo, constituem-se elementos que, em alguma medida, possuem relevância para o entendimento da constituição da cultura organizacional. Após buscar tais definições sobre cultura organizacional, surgem alguns questionamentos relativos ao seu processo de constituição: as organizações são compostas de somente uma cultura organizacional, ou de várias culturas? Como pensar a relação entre cultura organizacional, identidade e alteridade – foco específico de nossa investigação? 1.6 Identidade, subculturas e alteridade organizacional: em busca de uma formulação Como vimos no início deste capítulo, a cultura dos sujeitos desempenha papel fundamental no processo de construção identitária, uma vez que a mesma fornece os elementos, valores e símbolos por meio dos quais as identidades são (re) constituídas, formadas e transformadas em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. E, nesse processo, também a linguagem assume participação fundamental, agindo como mecanismo simbólico capaz de ordenar e desordenar as relações dos sujeitos, de construir pontos de apego que ligam os mesmos a determinados discursos e papéis (MENDONÇA, 2006). No caso da cultura de uma organização, tais características também se encontram presentes; entretanto, a partir das especificidades das organizações é necessário que influenciado consideravelmente seja feita uma ponderação. Nas organizações, o processo de constituição da cultura é conduzido pelos gestores da organização. Isso significa, portanto, que a gestão apresenta forte presença na constituição da cultura de uma organização, e, por mais que os sujeitos possam intervir e participar da formação da cultura, os mecanismos de gestão possuem grande participação na marcação e sedimentação de elementos culturais organizacionais. Quanto a isso, pensando nas especificidades da constituição da cultura de uma organização, Eco (1991) aponta que a cultura organizacional é pensada sob a perspectiva de ser um dispositivo discursivo que ilusoriamente representa as diferenças internas como unidade identitária. Para representar as culturas organizacionais como unificadas, após idealizar a identidade organizacional e de posse das informações sobre as codificações dos públicos de interesse, mediante uma diversidade de estratégias, as organizações passam a selecionar e a por em circulação, na cadeia de comunicação, determinados sentidos, representativos dos padrões socioculturais dos públicos. (ECO, 1991). Portanto, segundo Eco (1991), as organizações e seus mecanismos de gestão apresentam uma construção fantasiosa que procura unificar a diversidade de públicos (identidades) em torno de uma única marca. Esses, pelo processo semiótico, tendem a interpretar os padrões organizacionais como sendo seus próprios padrões, até porque, como já se disse, vêem seus interesses, desejos e necessidades refletidos na identidade organizacional. Ela narra situações, um vivido, uma história, uma existência que tende a ser representativa da própria existência dos públicos. São os significados, aí reconhecidos pelos públicos, que permitem à organização institucionalizar-se como modelo, como padrão a ser seguido como cultura e como identidade. Contudo, pensando as organizações como formadas por grupos heterogêneos, comumente se desenvolvem grupos menores que têm características particulares. Assim podemos encontrar subculturas nas diferentes unidades e áreas da organização, bem como em sua linha vertical. Estas subculturas são facilmente identificáveis: Marchiori (1995) ao tentar exemplificar tal característica, pondera que basta observar o discurso de um operador da produção e um analista de marketing, por exemplo, numa organização. De tal sorte, quando aparece aqui a idéia de subculturas, é possível pensar também em “subidentidades”. Como, no interior das organizações, os diferentes setores acabam por desenvolver hábitos e fixar comportamentos que lhe são próprios, não podemos dizer somente que existe uma identidade organizacional, mas, “identidades organizacionais”. Neste ponto, parece termos chegado à questão fundamental que representa a investigação central deste trabalho. A partir das “subculturas” e das “especificidades” da gestão de cada setor numa organização, é possível, portanto, considerar que, em meio a esse processo de convivência entre identidades diversas (unificadas pela ilusão de uma identidade única como aponta Eco (1991) ) é que aparecem as diferenças entre os setores. Aqui parece estar a chave para entendimento do conceito de alteridade no âmbito das organizações que seria, portanto, a capacidade dos sujeitos de perceber que, por mais que exista algo que os una na organização, existe algo que os diferencia, e, nesse sentido, uma relação alteritária seria aquela capaz de entender e reconhecer as diferenças e identidades dos setores de uma organização como legítimas, e, para a existência da mesma. O “outro”, no caso de uma organização seria, portanto, esse “diferente” que possui marcas identitárias, culturais e funcionais peculiares, com o qual os sujeitos e setores precisam conviver e trabalhar, em conjunto. Certamente, muitos problemas de relacionamento entre os setores de uma organização surgem a partir da percepção e conformação de um olhar para esse outro. Se a atitude de percepção baseia-se numa atitude antropofágica (no sentido de aniquilar as diferenças em busca de uma semelhança) (como vimos), ou até antropoêmica (no sentido de banir totalmente a diferença e o diferente do convívio), as dificuldades de convivência tendem a aumentar, atrapalhando, inclusive, a produtividade e o rendimento. É válido notar, portanto, que a atitude diante do outro, nas organizações, é eminentemente cultural, e que, a atitude alteritária (um olhar legítimo para o outro) como prática parte do princípio do reconhecimento da diferença entre os setores como legítima para, inclusive, o bom funcionamento da organização. Nesse sentido, para que a organização possa atingir um bom grau de alteridade entre os setores, é necessário que ela conheça e valorize a sua cultura e reconheça as suas subculturas e subidentidades, como legítimos. Principalmente nas organizações orientadas por processos em que a sinergia entre as áreas é extremamente importante, reconhecer possíveis barreiras advindas de atitudes não alteritárias e minimizá-las por meio de uma comunicação efetiva com os públicos alvos pode representar um mecanismo fundamental para o bom funcionamento das organizações. É assim que, neste trabalho, buscaremos problematizar a alteridade organizacional a partir, também, da comunicação interna de uma organização; mesmo porque, como vimos, estar com o outro, de uma maneira respeitosa, é também estar em comunicação, em relação com esse mesmo outro. Entretanto, de maneira ainda mais específica, desejamos entender em que medida um trabalho de comunicação interna estratégica e de Relações Públicas pode, a partir da atuação junto à cultura organizacional e à gestão da organização, estimular a prática alteritária entre os sujeitos, nas organizações. 1.7 Comunicação interna e Relações Públicas: em busca da prática alteritária nas organizações De início, recuperando uma discussão iniciada anteriormente, é possível compreender a comunicação como um processo de produção e compartilhamento de sentidos entre sujeitos interlocutores, realizado através de uma materialidade simbólica (da produção de discursos) e inserido em determinado contexto sobre o qual atua e do qual recebe os reflexos. (FRANÇA, 2001). É assim que, no contexto de uma organização, é possível entender a comunicação interna como os processos relacionais que acontecem no interior das organizações (contexto), a partir da utilização de meios discursivos (materialidade simbólica), como jornais, intranet, comunicados, como também a partir do contato cotidiano interpessoal entre os sujeitos. Aprofundando tal noção, numa visão organizacional, a comunicação interna é aquela dirigida ao público interno da organização, sobretudo seus funcionários. Kunsch (1995) afirma que o objetivo principal da comunicação interna é de promover a máxima integração entre a organização e seus empregados sendo “um setor planejado com objetivos definidos para viabilizar toda a interação possível entre a organização e seus empregados”. (KUNSCH, 1995, p.93) A comunicação interna é um dos mais importantes componentes da comunicação integrada e, segundo Neves (1998), deve gerar relações internamente com os sujeitos em conjunto com as estratégias definidas pela área de recursos humanos. À comunicação cabe determinar as estratégias de como e quando gerar relação com o público interno (NEVES, 1998). Entretanto, tal processo, na prática, é permeado por alguns entraves, especialmente com relação à legitimação e à institucionalização de um trabalho de comunicação interna nas organizações. Quanto a isso, DAMANTE (1999, p. 22) aponta que: O mais difícil é fazer com que a comunicação seja algo institucionalizado dentro da empresa, que ela aconteça entre as pessoas. Ou seja, o chefe receber uma notícia e tomar a iniciativa de dividir o fato com os seus subordinados e achar importante reservar tempo para fazer isso. É o nosso grande desafio de comunicação interna: que as pessoas a enxerguem como parte de sua responsabilidade. (DAMANTE, 1999, p. 1822). É assim que, como em outros domínios de realidade dos sujeitos, nos processos internos de uma organização, o processo comunicativo é também algo vivo, dinâmico, instituidor de sentidos e de relações; lugar não apenas onde os sujeitos dizem, mas também assumem papéis e se constroem socialmente; espaço de realização e renovação da cultura, dos valores e sentidos de uma organização. (FRANÇA, 2001). Para França, é promovendo essa interseção que o viés comunicacional se coloca e se legitima como de fato um outro “ponto de vista” (ponto de onde se vê); um lugar frutífero para analisar e compreender a realidade em que vivemos. Com relação à comunicação interna, é possível, ainda, buscar outras interrelações. A primeira delas seria que a comunicação interna é um dos fatores centrais no estabelecimento, manutenção e modificação da cultura organizacional. A cultura e a comunicação mantêm uma relação de influência mútua. Para Marchiori (1999), o estudo da cultura organizacional reafirma a centralização do comportamento comunicativo na organização. A segunda delas seria com relação à comunicação interna e Relações Públicas, pois a comunicação interna, para Aidar (2005) é uma das principais ferramentas, dinâmica e contínua, (senão a mais importante), para promover mudanças e a integração de culturas no ambiente organizacional, especialmente após reestruturações estruturais de empresas. Os profissionais de Relações Públicas têm responsabilidade significativa na promoção da integração cultural a partir de um contínuo trabalho interdisciplinar, suportado pela comunicação formal e informal. O profissional de RP deve ter conhecimento efetivo do público interno com que lida e dos demais públicosalvo da organização. A terceira seria com relação à comunicação interna e gestão. As práticas de comunicação interna estão desvinculadas de um processo de gestão. Dito de outra maneira, não bastam somente ter mecanismos e instrumentos de comunicação interna, caso a gestão não os legitime, ou mesmo não utilize todas as suas potencialidades. Sendo assim, Aidar (2005) diz que a comunicação interna estratégica, somente com o apoio e legitimidade da gestão, e, interferindo na cultura organizacional, pode estimular a alteridade como uma prática comunicativa no interior das organizações. Dessa maneira, compreende-se que a comunicação interna pode estimular, na cultura, a alteridade como um valor, pois é por meio da comunicação que conhecemos os públicos, seus interesses, opiniões, sugestões, fazendo com estes possam se sentir mais motivados e valorizados. A comunicação estratégica pode, portanto, estimular a alteridade como uma prática comunicativa nas organizações, podendo desenvolver a percepção do outro tanto o sujeito quanto um setor diferente – nos processos internos organizacionais (sempre com apoio da gestão, e a partir de uma cultura – ou culturas – organizacional favorável). 1.8 Modelo de análise: em busca de uma representação entre alteridade organizacional e comunicação. Após buscar os aportes teóricos que procuraram fundamentar as noções desenvolvidas neste trabalho, este tópico tem por finalidade sintetizar as principais discussões conceituais empreendidas, de maneira a reuni-las num modelo de análise, capaz de compreender a noção de alteridade organizacional, especialmente como prática comunicativa. O modelo de análise, no quadro 1, denominado “diagrama da alteridade organizacional”, busca representar graficamente o raciocínio aqui proposto: DIAGRAMA DA ALTERIDADE ORGANIZACIONAL Cultura Organizacional - Percepção do outro (Deslocamento do olhar) - Consideração GESTÃO A ALTERIDADE ORGANIZACIONAL - Valorização Práticas comunicativas Estratégicas - Diálogo Quadro 1: Diagrama da alteridade organizacional Fonte: Construção da monografia Nesta figura, é possível compreender, a partir dos conceitos anteriores, que a alteridade organizacional é um processo vinculado a três grandes elementos de uma organização: A gestão, a cultura e a práticas comunicativas internas estratégicas. Isso nos leva a recuperar que a alteridade é determinante de uma gestão que a tenha como um valor e como uma prática – bem como uma cultura organizacional - esta que, por sua vez, também produto de uma gestão, deve ser sensível à alteridade como uma prática relacional e cotidiana. Contudo, tal processo (ou tal sensibilidade) não nasce de maneira espontânea; ele pode ser estimulado como um valor cultural tanto a partir de mecanismos de gestão – o que não se constitui como foco deste trabalho – quanto a partir de práticas comunicativas internas estratégicas (lembrando que estas, por sua vez, devem ter autonomia e legitimidade diante da gestão). Dessa maneira é possível trazer à baila as discussões empreendidas no início do capítulo, particularmente a noção de alteridade de Luther King, como uma possibilidade de definir alteridade no contexto das organizações. Para o autor, três seriam as capacidades fundamentais ligadas à noção de alteridade: a consideração do outro: “ele existe”; a valorização do outro: “ele é tão importante quanto eu”; e o diálogo com o outro: “por considerá-lo e valorizá-lo, eu me comunico e me relaciono com esse outro”. Junto a essas três capacidades definidas por Luther King, apresentamos com base em Lévimas (1973) mais uma capacidade, que é fundamental para que as outras possam ser alcançadas: a percepção do outro, de sua diferença, o que para isso tornase essencial um “deslocamento do olhar” em direção a esse outro. Por fim, no intuito de concluir o entendimento do modelo de análise – para compreender, com cuidado, a alteridade no contexto das organizações – reunimos abaixo, e em tópicos, os principais elementos que estão envolvidos em tal entendimento: • A alteridade de maneira geral pode ser compreendida como uma capacidade de conviver com o diferente, de se proporcionar um olhar interior pelas diferenças do outro. A alteridade nos propicia o entendimento e o respeito pelo outro, em suas diferenças. Na organização, esse “outro” pode ser entendido como um público diferente, ou um setor diferente em relação ao outro (por exemplo, o outro pode ser o cliente em relação ao funcionário; ou o setor de finanças em relação ao setor de serviços gerais). Como nosso interesse investigativo centra-se na comunicação interna, dirigiremos nosso foco para o entendimento da alteridade como um valor presente e estimulado junto aos setores internos de uma organização (no caso o Centro Universitário UNA; especificado no capítulo II). • A alteridade organizacional (a percepção, a consideração, a valorização e o diálogo com o outro) pode ser compreendida tanto como um valor cultural quanto uma prática comunicativa, relacional, uma vez que o contato com esse “outro” e seu reconhecimento enquanto legítimo é um processo possível por meio da troca, da interação, do diálogo. • A alteridade organizacional é tanto determinante de mecanismos de gestão, quanto por processos comunicativos internos estratégicos, sendo estes últimos capazes de estimular a alteridade como um valor. • A comunicação, como estímulo para a alteridade, pode alcançar grandes resultados nos processos comunicativos e de integração entre os públicos internos de uma organização, além de influenciar o clima organizacional, amenizando situações, promovendo a ética, motivação e boa convivência nas relações. A partir, portanto, desse modelo de análise e utilizando como objeto de estudo o Centro Universitário UNA, nosso objetivo é o de verificar em que medida a alteridade organizacional: 1) é presente como um valor cultural nas relações entre os setores internos do Centro Universitário UNA; 2) é estimulado por práticas comunicativas estratégicas internas pelo setor responsável pela comunicação de tal instituição. Tal pesquisa será detalhada adiante, no capítulo 2. 1.9 Procedimentos Metodológicos No intuito de utilizar o modelo de análise para a verificação de uma realidade empírica – neste caso, a do Centro Universitário UNA - foram elencados dois procedimentos metodológicos: Pesquisa Documental e Pesquisa Qualitativa. 1) Método: Pesquisa documental Objetivo: A Pesquisa Documental “trata-se da consulta aos documentos, aos registros pertencentes ao objeto de pesquisa estudado, para fins de coletar informações úteis para o entendimento e análise do problema”. (MICHEL, 2005, p.39). O objetivo desse método será fazer um levantamento de informações, para conhecimento geral da instituição, bem como o de buscar pistas em que a alteridade possa ser percebida como um valor no interior das organizações. Corpus: Para tanto, serão utilizados como fonte de informações o site do Centro Universitário UNA, os planejamentos e estratégias da UNA para o público interno, como: - Carta de Valores; - Programa De Bem com a Vida; - Academia dos Professores1. Procedimento: Análise de conteúdo 2) Método: Pesquisa Qualitativa Objetivo: as pesquisas qualitativas são exploratórias, ou seja, estimulam os entrevistados a pensarem livremente sobre algum tema, objeto ou conceito. Elas fazem emergir aspectos subjetivos e atingem motivações não explícitas, ou mesmo conscientes, de maneira espontânea. São usadas quando se buscam percepções e entendimento sobre a natureza geral de uma questão, abrindo espaço para a interpretação. (2006: web) 1 (Tais documentos serão especificados adiante, no capítulo II). Teoricamente neste estudo, pretende-se, com base na análise de Pesquisa de Percepção realizada na UNA, averiguar de que forma a prática de alteridade organizacional é estimulada pela comunicação ou faz parte da cultura organizacional. Corpus: Como fonte de informação, teremos o depoimento dos funcionários de alguns setores da UNA e de um profissional do setor de Comunicação - setores estes escolhidos que a partir da estrutura da UNA, o que será especificado adiante. Procedimento: Realização de entrevista mediante composição de roteiro semiestruturado (melhor especificado adiante). Em relação aos depoimentos, optamos por manter em sigilo os nomes das pessoas, para resguardar a ética da pesquisa. Assim, temos o seguinte quadro: Entrevistado 1 Representante do Departamento de Tecnologia de Informação Data 27/10/2006 1 Representante da Infra-Estrutura 1 Representante da Secretaria Geral 1 Representante da Coordenação 1 Representante do Gestão de Pessoas 1 Representante do Marketing 27/10/2006 27/10/2006 31/10/2006 16/11/2006 16/11/2006 Quadro 2: Pessoas que foram entrevistadas Fonte: Construção da monografia As entrevistas foram gravadas em fita cassete e posteriormente transcritas, tendo, cada uma, uma duração aproximada de 20 (vinte) minutos. Sendo que foram elaborados dois tipos de roteiros de entrevistas para dois públicos diferentes: uma para funcionários e outro para um funcionário do setor de Comunicação. CAPÍTULO II: UM OLHAR SOBRE A REALIDADE: A ALTERIDADE ORGANIZACIONAL E O CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA Neste capítulo, optamos por contextualizar o Centro Universitário UNA, tratando, inicialmente, de sua história, estrutura e projetos. Em seguida, explicaremos a pesquisa qualitativa, escolhida para este trabalho conceituando-a, e ao final, trabalharemos a pesquisa realizada na instituição para apresentarmos uma conclusão, após a investigação. 2.1 UNA – Histórico O Centro Universitário UNA é uma entidade particular de Educação, Ciência e Pesquisa, fundada em 20 de outubro de 1961 e reconhecida pelo Decreto Federal nº 74.455, de 26 de agosto de 1974. Inicialmente era denominada Instituto de Relações Públicas e em, 1966, quando foi credenciada, passou a se chamar Faculdade de Ciências Administrativas. À época funcionava na residência de Afonso Pena II que hoje integra o patrimônio histórico de Minas Gerais. (Centro Universitário UNA, 2006) Em 1976, o Centro muda seu nome para "Centro de Pesquisas Educacionais de Desenvolvimento de Recursos Humanos" - CEPEDERH. Três anos depois são autorizados os cursos de Contabilidade e Comércio Exterior, reconhecidos em 1983 pelo Conselho Federal de Educação. Em 1987 foi autorizado o curso de Tecnologia e Processamento de dados e, em 1992, o de Economia. Em 1998, o Conselho Nacional de Educação autorizou o funcionamento do curso de graduação em Gestão de Hotelaria, Turismo e Lazer. Em outubro de 2000, recebeu o título de Centro Universitário e em 2002 abriu seu terceiro campus no Buritis. No mesmo ano o curso de Direito foi autorizado pelo Ministério da Educação. Em 2003, passou por uma mudança em seu controle acionário que acabou por refletir em seu conceito e imagem como instituição de ensino superior. No ano seguinte, foram criados novos cursos nas áreas de Comunicação e Artes, Ciências Humanas e Ciências Biológicas e Saúde. Em fevereiro de 2004, foi criada UNATEC, com várias opções de cursos superiores de tecnologia. A missão da UNA é definida como: A Instituição tem como missão fundamental a formação de profissionais para o mercado de trabalho, pautados pelo desempenho superior, comportamento ético e postura cidadã. Busca da excelência acadêmica e administrativa no lançamento de cursos em Minas Gerais e na adoção de práticas modernas de ensino, sempre alinhadas ao mercado. A estrutura da UNA conta com sete campi em Belo Horizonte, descritos abaixo: • Campus Aimorés - Um edifício de 12 andares, no centro de Belo Horizonte (MG), lá funcionam os cursos de: Direito, Administração de Empresas, Comércio Exterior, Serviço Social, Pedagogia, Turismo, Pedagogia – Licenciatura, Ciências Contábeis e História – Licenciatura. No Campus Aimorés funcionam também os cursos de MBA, são eles: MBA Executivo Gestão Estratégica de Negócios, MBA Gestão Estratégica de Marketing, MBA Controladoria e Auditoria MBA Administração para Engenheiros e Arquitetos MBA Gestão Estratégica de Pessoas, MBA Gestão Estratégica Logística, MBA em Finanças Corporativas, MBA Gestão Contábil Avançada e Planejamento Tributário, MBA Gestão Estratégica de Projetos. E os cursos de PósGraduação: Pós Graduação em Gestão de Projetos Educacionais, Pós Graduação em Gestão Cultural e Pós-Graduação em Projetos Editoriais Impressos e Multimídia. Além do Mestrado em Turismo e Meio Ambiente. • Campus Buritis - Possui infra-estrutura mais horizontalizada, com um formato tradicional de campus. Abriga a Reitoria do Centro Universitário, tem ampla área verde e capacidade para 8 mil alunos. Lá funcionam, atualmente, os cursos da faculdade de Comunicação e Artes (Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações Públicas, Cinema e Vídeo e Moda) e da faculdade de Saúde (Farmácia, Nutrição, Enfermagem, Ciências Biológicas). • Campus UNATEC Afonso Pena - Fica no centro de Belo Horizonte, nos andares (9ª, 10ª, 11ª, 12ª e 15ª) de um prédio conhecido da capital mineira. Abriga os cursos de Graduação Tecnológica: Redes de Computadores, Análise de Desenvolvimento de Sistemas, Processos Gerenciais, Gestão de Recursos Humanos, Design de Interiores. • Campus UNATEC Liberdade - Tem posição privilegiada na cidade, junto ao circuito cultural da Praça da Liberdade. É uma construção composta por 21 salas, distribuídas em 3 andares; abriga os cursos de Graduação Tecnológica: Gestão Financeira, Marketing, Logística, Gestão Comercial. • Campus Barreiro - Localizado no Via Shopping Barreiro, junto à estação do metrô; conta com oito salas de aula. Abriga cursos de graduação tecnológica: Processos Gerenciais, Gestão da Produção Industrial, Logística, Gestão Comercial, Licenciatura em História e Pedagogia e Serviço Social. • Campus Bahia - Instalado no edifício do ICBEU - Instituto Cultural Brasil Estados Unidos - na Rua da Bahia em B.H., conta com 24 salas de aula e abriga cursos de graduação tecnológica: Gestão Ambiental, Comunicação Institucional, Gestão Hospitalar, Design Gráfico, Design de Interiores e Gestão do Turismo. • Campus Raja - Localizado no Casa Raja Shopping, o campus UNA Raja é o mais novo campus do centro universitário. Possui 54 salas e ocupa um espaço do 3º ao 6º andar. Lá funcionam os cursos de: Direito, Administração de Empresas, Arquitetura e Urbanismo, Engenharia de Produção, Sistema de Informação, Ciências Econômicas, Engenharia de Computação, Engenharia de Controle e Automação e Relações Internacionais. Funciona também o novo curso de Pós-Graduação em Tecnologia da Informação. 2.2 A UNA e sua estrutura administrativa e acadêmica O Centro Universitário UNA possui uma estrutura colegiada composta pelo Conselho Universitário e pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão. O Conselho Universitário é o órgão superior de direção acadêmica administrativa e disciplinar do Centro Universitário. São seus membros: - Reitor, como Presidente; - Vice-Reitor; - Pró-Reitores; - Diretores de Faculdades; - 1 representante dos professores de cada faculdade; - 1 representante do corpo discente de cada faculdade; - 2 representantes da comunidade; - 3 representantes da entidade mantenedora; - 2 representantes do corpo técnico-administrativo. Hoje a UNA possui diversos setores distribuídos em 5 grandes áreas. São elas: - Pró-Reitoria do aluno (CAA - Centro de Apoio Acadêmico, Secretaria Geral e Infra-Estrutura) essa área é responsável pelo atendimento ao aluno e todos os processos relacionados a ele. - Pró-Reitoria de Pós-Graduação (Pós-Graduação, MBA e Mestrado) compete a coordenação das atividades de pós-graduação. - Pró-Reitoria de Graduação (Bacharelado) tem por finalidade a coordenação das atividades de ensino de graduação. - Pró-Reitoria de Graduação Tecnológica específica para os cursos tecnológicos da UNATEC. - Pró-Reitoria de apoio Acadêmico (Cedesp, Biblioteca, DRI, Extensão) essa área é responsável pelos projetos acadêmicos para os alunos. Aos Pró-Reitores cabe a coordenação dos programas de avaliação institucional e do projeto de capacitação docente. Além das Pró-Reitorias, encontram-se os setores Institucionais: - Comunicação, Marketing e Relacionamento com o Mercado – estratégias, divulgações, assessoria, parcerias dentre outros. - Coordenação de cursos – são responsáveis por planejar, supervisionar, avaliar e reformular o projeto pedagógico de seus cursos, garantindo a qualidade da educação aos alunos do centro universitário. - De Bem com a Vida – programa de qualidade de vida para os funcionários da UNA. - A Reitoria que é o órgão superior executivo do centro universitário. É composta pelo Reitor, pelo Vice-Reitor, pelo chefe de Gabinete e pelos PróReitores. - Gestão de Pessoas – cuida dos recrutamentos internos e externos da UNA, além da adaptação dos funcionários. Facilita a vida das chefias quanto à capacitação do funcionário. - Departamento Pessoal – cuida dos processos administrativos de todos os funcionários. - DTI (Departamento de Tecnologia da Informação) – informática (redes, suporte e audiovisual). De tal sorte, com ampla estrutura, além de sete campi diferentes, (nos quais convivem públicos variados entre bacharelado, tecnólogo, pós-graduação e mestrado). De início, percebe-se a necessidade de um esforço alteritário por parte da instituição, no sentido de buscar a boa convivência entre os respectivos setores e suas diferenças. Como é este esforço por parte da UNA? Ele existe em que medida ele é assumido pelos sujeitos e setores? 2.3 UNA e Público interno: Em busca de pistas alteritárias De acordo com a estrutura da UNA, (bem como com internas), é possível notar de início, a partir da análise de documentos e estratégias, que a UNA possui programas para o público interno que marca iniciativas de práticas alteritárias, de acordo com o modelo de análise proposto. A partir da coleta e análise do material documental, bem como da orientação do modelo de análise desenvolvido, nossa tentativa foi a de identificar pistas de comportamento alteritário, estimulados ou vivenciados na organização pelos sujeitos. Os documentos pesquisados são referentes dos seguintes projetos e/ou ações destinados ao público interno da instituição: carta de valores, Programa de Bem com Vida; simpósio Administrativo e Academia dos Professores. 2.3.1 A Carta de Valores A carta de valores é um documento elaborado pelo Centro Universitário UNA, que reúne principais valores que devem orientar a instituição em todas as suas relações. O projeto foi idealizado e conduzido pelo Diretor de Pessoas e o processo de elaboração de carta foi descentralizado e participativo, dividido em algumas etapas. Foram escolhidos, de maneira aleatória, funcionários da instituição que, em momentos específicos foram divididos em uma série de grupos, sendo que cada grupo era responsável por escolher cinco valores capazes de orientar uma instituição de ensino superior. Os representantes desses grupos se reuniram, e, em consenso, definiram os cinco principais valores da instituição, descritos na carta, a saber: Cooperação: Cooperar é trabalhar junto em uma saudável relação de interdependência, em prol de objetivos comuns e benefícios mútuos. A Cooperação fortalece o espírito de equipe e de solidariedade e instiga nossa capacidade de compartilhar com desprendimento informações, conhecimentos e vivências. Transparência: é a prática responsável e de mão dupla da verdade e da integridade, que implica na coerência entre o que se pensa, e o que se faz, considerando os pontos de vista dos outros. Respeito: é ter consciência de nossos direitos e obrigações, assim como do outro, compreendendo e aceitando as diferenças individuais e fazendo valer as nossas considerações pelos valores humanos. Comprometimento: É enxergar além dos interesses pessoais, os interesses dos outros e da instituição, assumindo o compromisso com a construção de um mundo melhor. Inovação: É fazer diferente. É desenvolver a capacidade de imaginar o que não existe. É questionar a rotina e os hábitos. É aprender a conviver com o desconhecido, o diferente, o surpreendente e o novo. É transformar o sonho em realidade. Com relação à alteridade organizacional, é possível tecer as seguintes considerações: . A partir do modelo de análise, é possível perceber como tal iniciativa representa um indício de esforço alteritário por parte da instituição; . A busca por valores como cooperação, transparência, respeito, comprometimento e inovação parece indicar que, no campo dos valores, a consideração, a valorização, o diálogo e a percepção do outro são referendados e institucionalmente registrados; . A construção da carta, realizada de maneira descentralizada e participativa, aponta uma iniciativa da UNA também alteritária, de valorização de seus colaboradores, bem como de percepção, consideração e diálogo; . Para verificar a efetividade e o impacto de tal carta no cotidiano e na cultura da UNA, são precisos outros elementos para a realização dessa verificação (especialmente coletados por meio de uma pesquisa específica, junto do contexto de trabalho, com os funcionários). Contudo, tal iniciativa aponta para a alteridade organizacional como uma questão valorizada pela gestão da instituição. 2.3.2 - Programa De Bem com a Vida Criado, a partir de 2005, por uma equipe formada por representantes de diversos setores da UNA, o Programa De Bem com a Vida tem como objetivo a promoção da saúde e bem-estar dos funcionários acadêmicos e administrativos do Centro Universitário UNA. Ele está constituído em quatro frentes de atuação: 1) Esporte, 2) Lazer, 3) Estética, 4) Cultura. O programa funciona como facilitador para a prática de atividades nessas áreas, proporcionando bolsas entre 40% a 90% em academias e instituições de renome. A única condição exigida é o comparecimento assíduo na atividade escolhida. O Programa de Bem com a Vida é amplamente divulgado na Instituição, e parece apresentar uma boa aceitação por parte dos funcionários – dada sua duração, desde 2005, bem como sua ampliação no oferecimento de atividades com bolsa, a partir das quatro frentes de atuação do Programa. Com relação à Alteridade Organizacional, a existência do Programa no Centro Universitário UNA parece apontar também para um esforço alteritário da instituição, no sentido de proporcionar, ao funcionário, atividades que possam contribuir para sua qualidade de vida e no trabalho , de maneira geral, valorizando-o e considerando-o enquanto sujeito. Contudo, em relação à efetividade do Programa e seu impacto com relação à alteridade organizacional, não há elementos suficientes, na pesquisa documental empreendida, que apontem para esta questão. 2.3.3 Academia dos Professores A Academia de Professores representa uma iniciativa da UNA no sentido de promover encontros com os professores para a realização de ações de atualização e capacitação dos mesmos. Existindo desde 2004, entre os programas oferecidos pela Academia, destacamos: • Filosofia da Instituição (2004) • Postura Educadora (2004) • Didática (2004) • Condução de Grupos (2004) • Ensinar a pensar (2004) • Ética (2004) • Sala de aula: espaço cênico (2005) • Multimídia (2005) • O perfil do professor UNA/UNATEC (2005) • O perfil do jovem e do aluno UNA/UNATEC (2005) • Curso Propedêutico e atividades inovadoras desenvolvidas por nossos professores (2005) • Uma discussão fundamental: a relação professor- aluno. Amor e Agressividade. (2006) De acordo com registro do projeto da Academia, é necessidade primordial investir no aprimoramento didático-metodológico dos educadores, oferecendolhes conhecimentos adicionais e desenvolvimento de habilidades que possam melhor orientá-los no exercício da docência. O intuito é capacitar os professores em serviço para que possam fazer da sala de aula um ambiente agradável e academicamente produtivo que permite um aprendizado mais prazeroso e significativo, gerador de melhores resultados e de uma formação humana e acadêmica de excelência. Desta forma, foram criados os objetivos da Academia: 1- Alcançar a liderança competitiva, por meio da busca permanente da atualização e capacitação dos professores; 2- Refletir sobre os sentidos para uma ação pedagógica compreensiva que contemple os desafios da profissão docente no século XXI; 3- Capacitar o professor para utilizar os diversos recursos pedagógicos e estratégias metodológicas com finalidade educativa, dando ênfase principalmente às atividades práticas e experiências pessoais dos alunos; 4- Reconhecer as diversas estratégias de intervenção que auxiliam o professor no seu fazer pedagógico e na mediação do processo de ensino-aprendizagem em sala de aula; 5- Promover a vivência de ações pedagógicas diversificadas no que se refere ao uso de recursos e estratégias didáticometodológicas pelo professor; Com relação à alteridade organizacional, é possível identificar que a academia dos professores representa, também, um importante esforço alteritário, especialmente em 2 grandes âmbitos: . Professor para professor: é possível observar que a academia representa um espaço de percepção, consideração, valorização e diálogo de professor para professor, no sentido de oferecer-lhe elementos que possam qualificar sua prática pedagógica de considerá-lo enquanto sujeito importante para a instituição. . Professor para aluno: a academia dos professores busca também inserir elementos alteritários na relação professor-aluno, no intuito de possibilitar que tal relação, a partir da qualidade do ensino, da consideração, valorização, do diálogo e da percepção do “outro” (no caso, o aluno) possa frutificar o aprendizado em sala de aula. Contudo, em relação à efetividade da academia na relação alteritária do corpo acadêmico, de maneira geral, seriam precisos outros elementos, obtidos por meio de pesquisa, que possam subsidiar tal compreensão. 2.4 A Pesquisa Qualitativa: investigando a Alteridade com os sujeitos da Instituição Após apontarmos brevemente algumas pistas da alteridade organizacional nos registros dos documentos e estratégias produzidos para o público interno da UNA, nosso intuito agora é o de buscar depoimentos com pessoas de diferentes setores, bem como de buscar compreender, de maneira mais específica, a alteridade organizacional como um valor cultural utilizado nas relações entre os sujeitos, ou/e como prática comunicativa estratégica no Centro Universitário. Para a realização deste trabalho, como descrito no tópico procedimentos metodológicos, optamos pela Pesquisa Qualitativa, por ser um tipo de pesquisa que trabalha a percepção de valores, sensações, impressões – questões estas bastante pertinentes com relação à alteridade organizacional, aqui trabalhada. Sendo assim, a etapa dedicada à pesquisa de campo envolveu os funcionários de diferentes setores, que trabalham no Centro Universitário UNA. A amostra compreende dois públicos internos da instituição: funcionários da UNA e um profissional do marketing, cada um entrevistado mediante roteiro específico. A pesquisa foi aplicada entre os dias 27 de outubro a 8 de novembro de 2006. Os entrevistados foram abordados de maneira informal e foi utilizado um minigravador para gravar as entrevistas. Buscamos observar as reações espontâneas e as citações recorrentes dos entrevistados sempre que as perguntas a seguir eram feitas: Pesquisa com funcionários dos setores da UNA. Foram realizadas 6 perguntas, divididas em 4 camadas de investigação descritas no quadro a seguir: Objetivo: Saber se a alteridade é um valor cultural presente nas relações entre os setores. Camada de Pergunta (s) Objetivo (s) Investigação Quebra-gelo Busca-se saber nessa 2 - Qual a importância pergunta, qual é a do seu setor na UNA? percepção que se tem do próprio setor. Consideração Valorização Por ser uma pergunta de 1 - Quais são as quebra-gelo, o objetivo é atribuições aqui do seu aproximar o entrevistado setor? do entrevistador. gestão Diálogo Percepção do outro (setor/pessoa) Essa pergunta busca 3 As pessoas saber qual é o olhar do entendem a importância outro, em relação ao seu do seu setor? setor. 4 - Geralmente, o seu setor é compreendido pelos outros setores quando solicitado? O objetivo desta pergunta é perceber se os outros setores compreendem o setor quando solicitado e estabelecem diálogo. Possui o objetivo de 5 – Há falta de buscar identificar se há conhecimento dos um entendimento, processos do seu setor percepção do setor por parte dos outros? entrevistado perante outros setores. 6 - Você consegue ver a mesma importância de cada setor aqui na UNA, tanto quanto a importância do seu? Essa pergunta tem como objetivo perceber se há preocupação da importância dos outros setores da instituição, apesar das diferenças. Setores escolhidos: - DTI (Departamento de Tecnologia e Informação); - Infra-Estrutura; - Secretaria Geral; - Coordenação de curso; - Gestão de Pessoas; - Marketing. 2.5 Análise das Entrevistas por Camadas Os temas das entrevistas a seguir foram escolhidos de acordo com o conteúdo e análise das entrevistas, nas quais os funcionários revelaram dados que trouxeram outros elementos de análise com relação à alteridade organizacional na UNA. 2.5.1 Quebra-Gelo Perguntou-se para os entrevistados quais seriam suas atribuições no setor, a fim de criar uma proximidade com eles. Todos responderam com tranqüilidade e certeza quais são suas atribuições: Controle de gastos e de consumo (xerox, cantina, energia, água...). Cuidamos da limpeza, manutenção hidráulica, manutenção preventiva, dedetização, rede elétrica, pintura. Agendamentos de auditórios. (Representante da Infra-Estrutura, 27/10). São várias, desde diplomas, históricos dos alunos a outras demandas que nos são solicitadas. (Representante da Secretaria Geral, 27/10). Suporte aos alunos, a área administrativa. Tudo que se relaciona à informática e ao audiovisual. (Representante do DTI, 27/10). Facilitar a vida do líder, a gestão das pessoas aqui dentro é papel deles mesmos (...) nós temos obrigação de ajudar em um recrutamento interno, além de ajudar o funcionário quanto à adaptação ao trabalho e com as lideranças. Facilitar a vida das chefias quanto à capacitação do funcionário, acompanhar o crescimento de todos. Monitorar a remuneração e os benefícios de modo que ele seja justo e transparente, sem perder de vista o mercado externo. (Representante do Gestão de Pessoas, 16/11). Não se chega a uma lista completa (...) coordenamos os cursos, os conteúdos (...). Coordenamos os professores, atendemos os alunos, atendemos as demandas burocráticas. Há problemas de grade dos alunos, são inúmeras as demandas. Respostas simples, mas referentes ao papel, às atividades exercidas por todos eles. Alguns explicaram mais do que os outros, mas foi possível notar que, no geral todos aparentaram demonstrar conhecimento de suas atribuições na Instituição. 2.5.2 Consideração / Valorização – Gestão “Os entrevistados foram questionados acerca da percepção de seu setor, bem como da percepção do “outro” em relação a seu setor”. Há consideração e valorização entre os setores? Tais práticas fazem parte da cultura organizacional? Para o representante da Infra-Estrutura, com certeza, o seu setor é muito importante. Para ele, o próprio nome do setor já diz tudo: Ele é imprescindível. Mas trabalha atrás dos bastidores. Tudo que funciona na UNA passa pelo nosso setor (...). Acho que o próprio nome diz: Infra-Estrutura. Sem a gente não tem sala de aula limpa, campus limpo, rede elétrica (...) pintura, todo início de aula está tudo sempre arrumado. Um outro entrevistado reforça a opinião acima, com relação ao seu setor: O setor que trabalho é muito estratégico. (...) sem ele muitas áreas não funcionariam, pois eles precisam de um computador funcionando, outros de alguns sistemas e arquivos (...) além dos suportes nas máquinas diariamente (...). (Representante do DTI, 27/10). Outro entrevistado, também acredita que seu setor seja o mais importante: (...) é o mais importante, pois é onde se concentra todo o registro acadêmico do aluno, (...) históricos, diplomas (...). (Representante da Secretaria Geral, 27/10). Para um coordenador de curso, embora seja muito importante, ele aponta que seu setor não apresenta ainda, para os outros setores, tamanha importância, conforme declaração abaixo: Eu acho que tinha que ter a importância maior do que ele tem, mais de um ano e meio atrás, talvez, um ano atrás (...) eu ouvi o presidente da instituição falar que o coordenador tem uma importância vital nos processos ligados ao curso, porque na verdade, é ele quem personifica para o aluno essa relação. E entre o aluno e a empresa, quem representa mesmo o curso, quem o aluno corre atrás quando precisa de alguma coisa (...) que na verdade tem que tomar como seu o negócio do curso é o coordenador. Tenho impressão que aqui na UNA, um erro de visão da importância do negócio e a importância do que são as atividades que não são ligadas ao negócio, que é essencial. Acho que está começando a mudar, mas desde que eu entrei aqui, tenho a impressão de quem manda é a Secretaria, os prazos administrativos, etc. (...) e na área acadêmica. O entrevistado do setor de Gestão de Pessoas diz que: É o setor mais importante que tem na organização. Se não fizermos os processos de forma competente não teríamos alunos em sala de aula. No modelo nosso, os funcionários são mais participativos, eles precisam se expor, colocar suas idéias, críticas (...) o nosso processo seletivo é cuidadoso, tem que se alinhar com os projetos da UNA (...) professores que transformem a salas de aula é um desafio muito grande. Quando questionados se os outros setores entendem a importância do seu, as respostas apontaram caminhos diferentes. Para um entrevistado, os outros setores entendem, mas não como deveriam, Na verdade, entende de maneira equivocada, tudo é, procure o seu coordenador de curso. Se o aluno tem problema com o financeiro, está devendo a UNA, pode falar com seu coordenador, se ele tem problema com requisição ou solicitação, procure seu coordenador (...) e isso não é agradável para nós, o aluno também se chateia muito com tudo isso, pois ele vai para um lado e para o outro para que seu problema seja resolvido. (Representante da coordenação de curso, 31/10). Já para outro entrevistado, a visão na instituição tem mudado. Há algum tempo atrás não. Só depois de algumas reuniões, acho que conseguimos transparecer essa importância (...) se falta uma pessoa, desestrutura toda a nossa equipe. O que me deixa feliz é que a gestão já percebe essa importância. Muitos ainda só sabem criticar e nunca elogiar e quando aparecemos é porque algo fizemos de errado, mas as coisas que acontecem certinhas são muito difíceis de serem percebidas. Mas estamos felizes (...). (Representante da Infra-Estrutura, 27/10). Outros entrevistados têm pensamentos na mesma linha acima, conforme declarações abaixo: Sim, percebo isso a cada dia, o pessoal da UNA tem entendido o que fazemos e nos chama para resolvermos realmente os problemas destinados a nós (...) isso é muito bom (...). (Representante do DTI, 27/10) Eu acredito que entendem (...) eles gostariam que nossa atuação fosse mais paternalista e que fizéssemos mais, principalmente quanto aos benefícios e aos salários. Mas ainda estamos na fase de plantio. Já implantamos o plano de carreira para os funcionários e agora o plano de carreira docente. Temos feito ações importantes como a Academia dos Professores, mas tudo é fase de plantio. (Representante do Gestão de Pessoas, 16/11). Já um outro entrevistado não tem a mesma percepção com relação ao seu setor e afirma em poucas palavras que: Não entendem nosso setor (...) e é uma pena, porque a Secretaria Geral é o coração da UNA. Em todos os depoimentos dos entrevistados acerca da importância do seu setor e o entendimento do seu setor por parte dos outros, trabalhando a consideração e valorização como peças fundamentais para o crescimento organizacional, podemos perceber que para a grande maioria dos entrevistados a percepção é de que o seu setor é o mais importante da instituição. Tal percepção pode ser fruto de uma série de questões; mas o que percebemos é que ela pode apontar tanto para problemas e dificuldades administrativas (como definição de papéis e de prioridades) quanto para uma questão impregnada culturalmente da não percepção dos outros setores (o que investigaremos adiante). Mas por outro lado, alguns apontam que se sentem valorizados e o seu setor é entendido pelos outros. 2.5.3 Diálogo O diálogo é um elemento fundamental da alteridade organizacional: “por considerá-lo e valorizá-lo, eu me comunico e me relaciono com esse outro”. Nesse sentido, nossa principal preocupação foi verificar se quando solicitado o setor é compreendido pelos outros. Assim, para a representante da Secretaria Geral, falta mais compreensão por parte dos outros setores, conforme declaração abaixo: Às vezes é compreendido (...) às vezes não (...), mas precisa melhorar mais essa compreensão dos outros setores, entender mais as solicitações(...) De acordo com outros entrevistados, também há falta de compreensão. Sabese da importância de cooperar com o outro, principalmente em uma organização; mas o que parece é que nem sempre tal compreensão é possibilitada pelo diálogo: Todos estão vivendo em caráter de emergência. Por isso, quando nos solicitam algo, querem ser atendidos na hora e às vezes estamos atendendo outro setor e por isso não somos compreendidos. Falta compreensão, a demanda é enorme (...) (Representante da Infra-Estrutura, 27/10) (...) mas ser compreendido é só entender? O que acho, é que parece que as pessoas não entendem bem que a função do coordenador é intimamente ligada à área fim, ou seja, a educação. De cima, dos lados, de baixo, todos nos pedem para fazer tarefas operacionais. Aliás, qualquer problema com o aluno, mesmo que seja financeiro, é enviado para o coordenador. Além disso, com freqüência, tudo o que pedimos não volta. (...) é preciso pedir, cobrar, insistir, ou então fazer a gente mesmo. Isso pode variar de afixar um aviso em sala de aula a pedir um documento na secretaria. Quase sempre levantar e fazer dá mais certo que pedir a um auxiliar. (Coordenação de curso, 31/10). (...) no nosso setor somos divididos em Suporte e Redes e por isso gera muita falta de compreensão (...) principalmente quando é um problema no computador, se não atendermos na hora solicitada (...) e se quem foi solicitado for da área de redes, eles também não entendem (...). (Representante do DTI, 27/10). Já um entrevistado do setor de Gestão de Pessoas acha ser difícil existir essa compreensão, ele diz que: É difícil haver uma compreensão (...) quando entra em ações estratégicas (...) aí é mais difícil. Temos alguns projetos que serão implantados como: - Boas vindas (contratação); - Academia de lideranças (para que ele exerça o papel de líder de verdade); - PLR Participação dos Lucros e Resultados; - Valorização dos professores. Assim, precisaremos muito do apoio e da compreensão de todos para que tudo caminhe bem. Aqui é importante notar que, a nosso ver, as dificuldades de diálogo e compreensão entre os setores – o que dificulta a prática da alteridade organizacional – parece também apontar para uma dificuldade de gestão, de processos administrativos, de definições de papéis – questão que influi diretamente na cultura organizacional. Isso parece evidenciar o quanto o diálogo e a alteridade, no caso das organizações, por mais que estejam ligados a elementos culturais ou a estímulo de práticas comunicativas estratégicas, tem grande influência dos mecanismos de gestão adotados. Desse modo, entraremos em um ponto chave para que uma organização tenha a alteridade organizacional como um valor: o olhar pelo outro – questão que entenderemos a seguir. 2.5.4 Percepção pelo outro: setor / pessoa Conforme já vimos em tópicos anteriores, o olhar e a percepção pelo outro nos mostra que a capacidade de conviver com o diferente, de se proporcionar um olhar interior pelas diferenças do outro nos leva a refletir para as diferenças, entre os setores, no intuito de saber entendê-los. De acordo com alguns entrevistados, esta visão ainda está longe de fazer parte do trabalho deles, principalmente quando questionados se há falta de conhecimento dos processos de seu setor por parte de outro: Sim (...) tem entrado muito funcionário novato que não conhece muito os nossos processos, precisa pegar o ritmo da coisa (...). (Representante da Secretária Geral, 27/10). Acho que eles confundem muito ainda, pois nos pedem algo que às vezes não somos nós ou às vezes não entendem que nossa parte é até um certo momento, mas depois já não é mais com a gente. (Representante da Infra-estrutura, 27/10). Há sim, porque a visão das lideranças é focada em processos e na verdade deveria ser focada em liderança, em executar muito, ele não dá valor e o mais importante sempre é a gestão da equipe. (Representante do Gestão de Pessoas, 16/11). Para a Coordenação de curso, a visão com relação à falta de conhecimento dos processos do seu setor é um pouco diferente: Me parece que não. Na verdade, as pessoas não precisavam conhecer os processos do meu setor, mas apenas seu objetivo dentro da organização. Se todos entenderem as funções uns dos outros, os limites de responsabilidade, conhecer os mecanismos internos é desnecessário (...). Trabalhei numa empresa que tinha uma "matriz de responsabilidade": todos os que ocupavam cargos de chefia, principalmente, sabiam até onde poderiam ir. Também não deixavam para o outro o que era de cada um. Aqui na UNA as coisas são confusas, mas todo mundo tem pouca autonomia também (...). Para outro entrevistado, os setores entendem mas pouco, conforme declaração a seguir: Um pouco, pois as pessoas cobram muito, confundem a nossa área que é dividida em três: Desenvolvimento, Redes e Suporte. Seria interessante a explicação da área. (...) apesar de saber que no momento de desespero do problema, acaba esquecendo, isso é normal. Mais uma vez, nesses depoimentos acima, podemos perceber que a alteridade organizacional e a percepção dos setores se vinculam fortemente a mecanismos de gestão, que define papéis, atribuições e limites. Inclusive tal questão influencia no estímulo da alteridade organizacional por práticas comunicativas estratégicas: se as atribuições dos setores não são claramente acordadas, a comunicação não pode, sozinha, promover tal acordo ou tal compreensão. Diante de todos os depoimentos, ainda temos uma questão que é fundamental para a nossa pesquisa: saber se os setores entendem a mesma importância de cada setor, tanto quanto entendem a importância do seu, para o funcionamento da organização. Alguns entrevistados consideram os setores tão importantes quanto o seu para o bom funcionamento da instituição, conforme declarações abaixo: Sim (...) mas percebemos mais quando sentimos falta ou quando precisamos do outro. Precisamos trabalhar sempre em conjunto, pois todos nós precisamos uns dos outros. (Representante do DTI, 27/10). Com certeza. Cada setor tem sua função que é muito importante para o andamento da UNA. Precisamos caminhar como mesmo corpo, pois tudo tem que funcionar perfeitamente. (Representante da InfraEstrutura, 27/10). Claro que sim (...) trabalhamos como um todo e isso é fundamental para nós. (Representante da Secretaria Geral, 27/10). Outros entrevistados apontam para a necessidade de uma definição de propriedades, de hierarquização (o que aponta, mais uma vez, para a eficiência de mecanismos de gestão. Abaixo algumas declarações: Como eu disse antes, os setores não têm a mesma importância. Atividades fim e atividades meio são bem diferentes em seu papel na percepção do aluno, por exemplo. Isso aqui na UNA é meio invertido (...) a secretaria é mais importante que as coordenações. O pessoal de apoio não apóia, e sim dita as regras. Já ouvi uma assistente dizer que não tinha tempo para fazer algo operacional, que isso é o coordenador que tem que fazer (deve ter ouvido isso do chefe dela). (...) ou seja, também me parece que falta essa "hierarquia", por falta de palavra melhor, porque a importância de cada setor deve estar ligada, segundo as visões mais modernas de gestão, àquilo que o cliente percebe como importante. E importante na educação é ter bons professores, boa estrutura de laboratórios, biblioteca boa, bom atendimento em todos os sentidos. (Coordenação de curso, 31/10). Consigo só que não tanto quanto (...) cada um tem uma importância relativa. Uma área comercial, operacional, acadêmica, por exemplo, são sem dúvida as mais importantes, mas é muito relativo (...) (Representante do Gestão de Pessoas, 16/11). Percebemos que para a maioria dos setores entrevistados falta entendimento e compreensão por parte dos outros setores e também o olhar, a percepção pelo o outro. Ao mesmo tempo, percebemos que grande parte dos entrevistados entende que o outro setor é tão importante quanto o seu setor. Outros declaram que essa importância é relativa e é necessário separar as prioridades. Contudo, neste caso, a alteridade organizacional parece não ser vivenciada como prática, muito mais pela ausência de mecanismos de gestão do que pela cultura por si só. A relação entre alteridade e práticas comunicativas estratégicas, devido a sua importância como um dos focos centrais dessa monografia, será tratada no tópico seguinte. 2.6 Pesquisa com setor de marketing da UNA Objetivo: Buscar entender se a alteridade é estimulada por parte do setor de comunicação. Camada de Pergunta (s) Objetivo (s) Investigação Possui o objetivo de aproximar o entrevistado da comunicação numa do entrevistador e de saber a importância do organização? setor de comunicação numa organização. 1 – Qual a importância Quebra - gelo Essa pergunta tem por objetivo buscar conhece as atribuições identificar se o setor de comunicação conhece de todos os setores na as atividades dos outros UNA? setores. 2 – A comunicação – Existem 3 Tem por objetivo saber da se existem mecanismos por parte da comunicação que dão a comunicação para dar a conhecer a importância conhecer a importância de cada setor. de cada setor aqui mecanismos Práticas Estratégicas interna estimulam a percepção do outro? dentro? 4 – Você acha que um setor de comunicação participa do estímulo ao entendimento da mesma importância setor? de cada Buscou-se obter informações e entendimentos do setor de comunicação, a fim de saber se há reconhecimento de que a comunicação pode ser estimular o conhecimento interno da importância de cada setor. 2.6.1 Quebra-gelo Para o profissional de marketing, a importância de um setor de comunicação numa organização é essencial. Este acrescenta que a comunicação é a base para o sucesso de uma organização e que ele é papel predominante quando se fala de informação. Essencial. A comunicação é a base do sucesso de todas as ações propostas e do próprio dia-a-dia das organizações. Para sermos um prestador de serviços a comunicação ainda é mais importante, tudo que precisamos fazer é baseado em comunicação, as informações têm que fluir e precisam chegar nos responsáveis. (...) as decisões precisam ser tomadas com base em dados e informações que precisam ser disseminados dentro da organização. Os processos precisam ser claros. 2.6.2 Práticas estratégicas internas estimulam a percepção do outro? Como vimos, para o estímulo à alteridade organizacional, é fundamental que práticas comunicativas internas, direcionadas aos outros setores, sejam implementadas, especialmente no sentido de compartilhar atribuições e atividades setoriais internas. Mas para o profissional de marketing, isso ainda está caminhando na UNA. De acordo com a declaração abaixo, o próprio setor de marketing não conhece a estrutura da UNA em detalhes: Não, não sabemos. Sabemos a função, mas como ela é estruturada, como realmente funcionam, quais são as suas atividades, os detalhes, não sabemos. Talvez isso faça parte da cultura, todos já estão acostumados a lidar com isso e não percebem a importância de conhecer os setores. Um fator importante é que uma vez que a área passa por mudanças, deveríamos fazer uma reunião para apresentar a nova estrutura, quem cuida de que o que realmente esse setor faz... Em seu depoimento, o profissional acredita que essa falta de conhecimento ainda faça parte da cultura e que é preciso mudar, fazer mais reuniões e apresentar sempre a nova estrutura e suas atividades, quem executa cada função. Contudo, mais uma vez aqui aparece a falta de mecanismos de gestão eficientes que garantam a definição de papéis, as atribuições, os limites, bem como a divulgação interna disso. Ainda com relação às práticas estratégicas internas e o estímulo para percepção do outro, interessa-nos se existem mecanismos comunicativos internos que favorecem o conhecimento e valorização de cada setor para o funcionamento da instituição. A resposta foi a seguinte: Não, primeiro porque não temos uma intranet, que é um dos meios mais adequados. Também não faz parte da cultura. Ferramentas até temos, elas existem, mas não as utilizamos. Precisamos de alguém cuidando só disso, focado (...) já demos o primeiro passo, pois na nova estrutura existe uma pessoa para cuidar, planejar, criar e se preocupar com todos. Podemos, portanto, compreender, por meio do depoimento acima, que, há uma preocupação por parte deste setor de marketing em ter um profissional focado no público interno para trabalhar as questões situadas e principalmente estimular a compreensão pelos outros setores. Há entendimento com relação a dificuldades culturais internas; contudo, não há clareza com relação a mecanismos de gestão, de maneira geral, que necessitam também ser implementados. Assim, percebe-se que, o setor de marketing não participa do estímulo ao entendimento da importância de cada setor, como depoimento abaixo: Ainda não existe, mas é um processo. A questão é que temos o cliente externo e ainda o aluno, então acabamos por focar nos dois e esquecendo um pouco do outro público interno (funcionários). Mas sinto que faltam recursos e ferramentas para os nossos funcionários e principalmente os nossos professores. Hoje ainda não estimulamos. O certo seria chegar em cada setor e perguntar como funcionam. A gente tende a jogar algo para o outro setor e não há o alinhamento de fazermos as coisas juntos, apoiando e ajudando um setor com o outro. 2.7 Considerações Gerais da Pesquisa No intuito de levantar as principais considerações acerca da pesquisa realizada no Centro Universitário UNA, e tendo como referência o modelo de análise constituído, é possível levantar uma questão fundamental, que foi muito notada durante a entrevista: a alteridade é uma questão que sofre não somente grande influência da cultura ou da comunicação, mas – e principalmente – da gestão. De maneira geral, percebe-se que todos os entrevistados, em algumas ocasiões, tiveram a mesma percepção com relação às perguntas abordadas na pesquisa. Ficou claro que, ao falar do próprio setor, para o entrevistado o seu é sempre o mais importante, além de ser o principal da instituição. Quando abordamos perguntas sobre a importância do outro setor, podemos perceber que as pessoas entendem essa importância, mas não há compreensão entre os setores, além de não haver conhecimento dos setores por parte de todos e principalmente por parte do setor de marketing. Sendo assim, conseguimos notar que tal incompreensão não é fruto somente da cultura organizacional ou da ausência de práticas comunicativas estratégicas, mas, especialmente, pela ausência de mecanismos de gestão, que decidam e exponham, com clareza, as atribuições de cada setor, seus limites e possibilidades perante a instituição. Nesse sentido, a alteridade às vezes não se torna praticada por uma dificuldade administrativa (ex: coordenador de curso), ou seja, as atribuições precisam ser mais claras e há essa falta de entendimento dos próprios funcionários. Com relação ao setor de marketing, percebemos que ainda faltam processos e estímulos por parte deles perante os setores da UNA. Há uma distância grande entre as ações e o cotidiano, e seria primeiro conhecer toda a estrutura da instituição, para, assim, criar mecanismos que facilitem a percepção pelo outro, a consideração, o diálogo e a valorização. Mas aqui, recorremos novamente aos mecanismos de gestão: não adiantaria o setor de marketing tornar conhecidos os setores se não há consenso sobre a definição de suas obrigações, e nem de suas prioridades no quadro geral da organização. Diante disso, percebemos que a alteridade não está inserida, de maneira geral, nas práticas comunicativas internas do Centro Universitário UNA. As razões são inúmeras, mas especialmente destacamos que, como um elemento cultural, a alteridade pode ser alcançada, no interior das organizações, a partir de mecanismos de gestão eficientes, capazes de gerar identidades para os setores (para assim, aparecerem as diferenças e as capacidades alteritárias), de promover integração entre os setores, de compartilhar, internamente, as atribuições de cada setor, de comunicativos que sejam estratégicos. produzir conhecimento e processos Considerações Finais O objetivo central deste trabalho foi empreender uma discussão sobre alteridade no contexto das organizações. Para isso, uma série de adaptações tiveram que ser feitas, no intuito de buscar apropriações teóricas cuidadosas, de uma série de conceitos, originados das ciências sociais e humanas, para um terreno investigativo do campo das organizações. A Alteridade, como vimos, é a concepção que parte do pressuposto básico de que todo o homem social interage e interdepende de outros indivíduos. Assim, como muitos antropólogos e cientistas sociais afirmam, a existência do "euindividual" só é permitida mediante um contato com o outro (que em uma visão expandida se torna o Outro - a própria sociedade diferente do indivíduo). (MONTAIGNE, 2000, p.307). Já para Lévinas (1973), a idéia de alteridade não se limita apenas a experiência de contato com o outro, mas, acima de tudo de colocar o outro no lugar do ser. Nesta visão, o outro não seria um objeto, mas um sujeito. Em seguida, verificamos o quanto a alteridade vincula-se também à cultura – que disponibiliza as igualdades e diferenças – e à comunicação – uma vez que a alteridade é um prática que acontece “em relação”, a partir de um processo comunicativo. Nas organizações, entendemos a participação da cultura e da identidade organizacionais como constituidoras da alteridade e verificamos a participação da comunicação interna e de práticas comunicativas estratégicas como possibilitadoras do estímulo da alteridade organizacional como um valor e como uma prática nas organizações. Dessa forma, chegamos ao foco do trabalho que é a construção do modelo de análise, no qual foi constituído o Diagrama da Alteridade Organizacional. No modelo de análise tentamos demonstrar que a alteridade organizacional está vinculada à cultura organizacional, à gestão e a práticas comunicativas estratégicas, uma vez que a alteridade pode ser estimulada por práticas de comunicação ou pode ser um valor cultural que faz parte da instituição. No capítulo II, no intuito de promover uma verificação do modelo de análise junto a uma realidade organizacional, apresentamos nosso objeto de estudos, o Centro Universitário UNA, do qual apresentamos sua história, estrutura e seus projetos que visam o público interno. A partir disso, buscamos desenvolver uma pesquisa documental, na tentativa de identificar pistas alteritárias em tais projetos, e, em seguida, apresentamos uma pesquisa qualitativa, que buscou identificar em que medida a alteridade organizacional se encontra presente nas práticas internas comunicativas entre os setores da instituição. A pesquisa foi composta por depoimentos de funcionários de diversos setores e um profissional do setor de marketing para que fosse possível entendermos se a alteridade é praticada pelo público interno (os setores) da UNA. As principais conclusões da pesquisa apontaram que, se por um lado, existem projetos que estimulam a prática da alteridade na organização, o cotidiano organizacional é permeado por uma série de conflitos, frutos de questões tanto ligadas à cultura organizacional, quanto ao não estímulo da alteridade por meio de práticas comunicativas estratégicas. Entretanto, o que mais nos surpreendeu nos dados da pesquisa foi que a ausência de mecanismos de gestão, capazes de definir os objetivos organizacionais, os papéis entre os setores, as atribuições de cada área, contribuem enormemente para que a alteridade organizacional não represente uma prática comunicativa no interior da organização. Certamente essa monografia apresenta limitações. Outras pesquisas que buscassem aprofundar a relação entre os setores, e que apontassem mais para um enfoque administrativo poderiam oferecer um conjunto de dados que pudessem oferecer, à organização, resultados mais diretos capazes de fundamentar uma tomada de decisões mais efetiva. Contudo, os dados e o enfoque aqui coletados demonstraram o quanto um diagnóstico de comunicação acaba por revelar questões mais amplas da organização, ligadas à cultura e à gestão; e, por conseguinte, tal enfoque veio a possibilitar um entendimento pragmático do modelo de análise, ora proposto (Diagrama da Alteridade Organizacional), demonstrando o quanto a alteridade, no interior das organizações, apresenta-se como uma prática complexa, representada pela integração de mecanismos de gestão, cultura organizacional favorável, e práticas comunicativas estratégicas, que busquem estimular a percepção do outro, sua consideração e valorização, bem como a possibilidade de diálogo – no intuito de superar as diferenças em nome de um propósito mais amplo. REFERÊNCIAS BERALDO, Cristina Elisabeth Arnold, Comunicação Interna como fator estratégico nos processos de mudança. Monografia, Universidade de São Paulo. DA MATA, Roberto. Relativizando: Uma introdução à Antropologia Social, Editora Vozes, 1980. DAMANTE, Nara. “O estado da arte da comunicação organizacional no Brasil”. Comunicação Empresarial, ano 8, n.31, 2º trimestre, 1999, p. 22 – 26 DESCAMPS C. As idéias filosóficas contemporâneas na França. São Paulo: Jorge Zahar, 1991:85. Souza RT. As fontes do iluminismo latino. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004:162-174. ECO, Umberto. Tratado geral de semiótica. 2 ed. São Paulo: Perspectiva, 1991. FABIANA COLTURATO AIDAR, O papel da Comunicação Interna na Integração cultural em Fusões e Aquisições de Empresas. Monografia, São Paulo, 2005), disponível<http://gestcorp.incubadora.fapesp.br/portal/monografias/pdf/89.pdf> Acesso em 5 de setembro, 2006. FERNANDO C. Prestes Motta, Miguel P. Cultura Organizacional E Cultura Brasileira. Caldas Organizações. – São Paulo : Atlas, 1997. FLEURY, Maria Tereza Leme e Fischer, Rosa Maria (coord.). Cultura E Poder Nas Organizações. São Paulo: Atlas, 1989. FRANÇA, Vera Regina Veiga, Porto dos Milagres: diálogo com a realidade social e construção de símbolos de pertencimento, disponível em <http://www.intexto.ufrgs.br/n9/a-n9a2.html#_ednref4>. Acesso em: 20 de novembro, 2006. FREITAS, Sidinéia Gomes. Comunicação, Poder E Cultura Organizacional. Disponível em Artigos <http://www.aberje.com.br/livros/livro1/poder.htm>. Acesso em 15 abril, 2006. GOLDIM, José Roberto, Alteridade. Disponívem em: <http://www.ufrgs.br/bioetica/alterid.htm>. Acesso em: 10 de setembro, 2006. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 4. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. IEPHA, Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico De Minas Gerais. Disponível em: <http://www.iepha.mg.gov.br/sobre_cultura.htm>, acesso em: 2 de novembro de 2006. KUNSCH, Margarida M. K. A comunicação integrada nas organizações modernas: avanços e perspectivas no Brasil in CORREA, Tupã (org.) Comunicação para o mercado. São Paulo: Edicom, 1995, p. 93 LARAIA, Roque de Barros. Cultura: Um Conceito Antropológico. 11ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. MARCHIORI, Marlene Regina. Comunicação É Cultura. Cultura É Comunicação. Comunicação Empresarial, São Paulo, n. 31, segundo trimestre 1999. MENDONÇA, Ricardo Fabrino. Identidade e representação: as marcas do fotojornalismo na tessitura da alteridade. In: VAZ, Paulo Bernardo. Narrativas fotográficas. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. pp17-58. NEVES, Roberto Castro. Imagem empresarial: como as organizações (e as pessoas) podem proteger e tirar partido do seu melhor patrimônio. Rio de Janeiro: Mauad, 1998. Pesquisas Qualitativa. Disponível em: <http://www.ibope.com.br/calandraWeb/BDarquivos/sobre_pesquisas/tipos_pes quisa.html> A acesso em: 21 de novembro, 2006. SCHEIN, 1998 SILVA, Maurício. Alteridade e Cidadadania <http://www.evirt.com.br/colunistas/mauricio08.htm>, acesso em: 17 de setembro, 2006. SILVA, Tomaz Tadeu. Quem precisa de identidade? Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 103-33. STEPHEN P. Robbins. Comportamento organizacional / Tradução técnica Reynaldo Marcondes. – 9. ed. – São Pauloa; Prentice Hall, 2002. TYLOR, Edward. Estudos Antropológicos, Filosóficos E Sócio-Culturais Do Homem 1 / <http://professores.unisanta.br/adelto/downloads/EstudosAntro4.doc>, acesso em: 20 de agosto, 2006.