UNIVERSIDADE SEVERINO SOMBRA Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado Profissional em Educação Matemática SÔNIA CRISTINA DA CRUZ MENDES PRÁTICAS PEDAGÓGICAS PARA O ENSINO DOS NÚMEROS IRRACIONAIS VASSOURAS 2012 SÔNIA CRISTINA DA CRUZ MENDES PRÁTICAS PEDAGÓGICAS PARA O ENSINO DOS NÚMEROS IRRACIONAIS Dissertação apresentada para qualificação ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu do Mestrado Profissional em Educação Matemática da Universidade Severino Sombra, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação Matemática. Orientadoras: Profª. Drª. Chang Kuo Rodrigues e Profª.Drª. Estela Kaufman Fainguelernt VASSOURAS 2012 MENDES, Sônia Cristina da Cruz. Práticas pedagógicas para o ensino dos números irracionais/ Sônia Cristina da Cruz Mendes.Vassouras, 2012. 112 f. Orientadoras: Profª Drª Chang Kuo Rodrigues e Profª Drª Estela Kaufman Fainguelernt Dissertação (Mestrado Profissional em Educação Matemática) – Universidade Severino Sombra, Programa de PósGraduação Stricto Sensu. Bibliografia. SÔNIA CRISTINA DA CRUZ MENDES PRÁTICAS PEDAGÓGICAS PARA O ENSINO DOS NÚMEROS IRRACIONAIS Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Matemática da Universidade Severino Sombra, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação Matemática. _________________________________________________________________ Profª Drª Chang Kuo Rodrigues (Orientadora) Universidade Severino Sombra ________________________________________________________________ Profª Drª Estela Kaufman Fainguelernt (Orientadora) Universidade Severino Sombra ________________________________________________________________ Profª Drª Patrícia Nunes da Silva Universidade do Estado do Rio de Janeiro ________________________________________________________________ Profª Drª Lúcia Aversa Villela Universidade Severino Sombra Vassouras-RJ, 30 de março de 2012 Dedico este trabalho a Sebastião da Silva Mendes, meu pai, que em muito contribuiu para a conquista desta etapa da minha vida. Homem íntegro e correto, não poupou esforços financeiros e participou diretamente do processo de investigação desta pesquisa. Dedico, também, à minha mãe, Jorgelina da Cruz Mendes, mulher de fibra, que me educou, abdicou da própria vida para auxiliar seus filhos e contribui muito para a educação dos meus filhos. Dedico, ainda, aos meus filhos Gabriel Mendes Rangel, pela sua contribuição direta nas investigações dos assuntos abordados nesta pesquisa, e Davi Mendes Rangel, pela participação na parte tecnológica deste trabalho, e por compreenderem os momentos de minha ausência. AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, pelo privilégio de ter educação de qualidade. Aos meus pais, pelos sacrifícios e renúncias, para que eu pudesse estudar. Aos meus filhos, pela compreensão e entendimento da minha ausência, mesmo quando estou presente. À minha orientadora, Profª Drª Chang Kuo Rodrigues, que com sua sabedoria tornou possível a realização deste trabalho. À minha coorientadora, Profª Drª Estela Kaufman Fainguelernt, por, desde o início, ter acreditado em mim e me feito sentir capaz. À Profª Drª Lucia Maria Aversa Villela, uma “mãe orientadora”, que teve participação direta na construção deste trabalho. Uma pessoa maravilhosa, nascida para ser educadora, pequena só no tamanho, porque, no coração, é um gigante. Obrigada pela paciência. À Profª Drª Patrícia Nunes da Silva, pelas contribuições na escrita deste trabalho e participação na Banca. À direção, funcionários e alunos da instituição onde a pesquisa foi realizada, por tornar esse trabalho possível. A todo o corpo docente do Mestrado Profissional em Educação Matemática da USS, por acreditar na capacidade de seus discentes. Aos meus amigos do Mestrado Profissional em Educação Matemática, em especial, Heloisa, Marcelo e Marlucia. “Amigo é coisa para se guardar / do lado esquerdo do peito, / mesmo que tempo e a distância digam não” (Milton Nascimento) vocês estarão comigo. ―Todo professor secundário e universitário deveria conhecer a história da Matemática. Há muitas razões para isto, mas ser um Excelente guia pedagógico é talvez a mais importante.‖ Morris Kline RESUMO MENDES, Sônia Cristina da Cruz. Práticas Pedagógicas para o Ensino dos Números Irracionais, 2012. 112 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Educação Matemática) – Universidade Severino Sombra, Vassouras, 2012. Esta dissertação apresenta uma pesquisa de natureza qualitativa, desenvolvida em uma escola de formação de professores para a Educação Básica, da rede pública estadual do Rio de Janeiro. Constitui-se em uma investigação de práticas pedagógicas para o ensino dos números irracionais, com o objetivo de fornecer material para auxiliar os professores em suas práticas e estimular a reflexão sobre a importância de uma boa formação desse conceito. Será agregada ao trabalho uma construção epistemológica no estudo da razão áurea, quando se trata de relacionar a existência dos números irracionais de forma articulada à realidade e nas construções geométricas. Utilizaremos a história dos números irracionais como embasamento para encontrar outros recursos didáticos, que viabilizem o processo de ensino e de aprendizagem, além de apontar a importância para a formação do conjunto dos números reais; refletiremos acerca de diferentes práticas pedagógicas passíveis de serem aplicadas em sala de aula em parceria com a abordagem geométrica da razão áurea. Com isso, pretendemos apresentar algumas propostas pedagógicas, no sentido de incrementar as aulas de Matemática, tanto para o aluno quanto para o professor da Educação Básica, utilizando sequências de atividades didáticas e o software GeoGebra, que permitirá a visualização de construções geométricas. Palavras-chave: Números Irracionais. Práticas Pedagógicas. Razão Áurea. GeoGebra. ABSTRACT This work presents a qualitative research, developed a training school for teachers for basic education, the public schools of Rio de Janeiro. It constitutes an investigation of pedagogical practices for the teaching of irrational numbers, in order to provide material to assist teachers in their practices and and stimulate reflection on the importance of a good formation this concept. It will be aggregated to an epistemological construction work in the study of golden ratio when it comes to relate the existence of irrational numbers s in a coordinated way to the reality and the geometric constructions. We will use the history of irrational numbers as basement to find other teaching resources, which enable the teaching and learning, while pointing out the importance for the formation of the set of real numbers, we will reflect on different teaching practices that can be applied in the classroom class in partnership with the geometric approach the golden ratio. We intend to present some educational proposals in order to improve math classes for both the student and the teacher of basic education, using sequences of learning activities and software GeoGebra which allow the visualization of geometric constructions. Keywords: Irrational Numbers. Pedagogical Practices. Golden Ratio. GeoGebra. LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 Diagonal do quadrado ........................................................................... 44 FIGURA 2 Segmentos de retas................................................................................. 45 FIGURA 3 50 FIGURA 4 Método geométrico de construção das raízes quadradas de números naturais .................................................................................................. Distribuição das raízes quadradas de números naturais na reta real .... FIGURA 5 Proporção áurea...................................................................................... 56 FIGURA 6 Divisão áurea do segmento de reta......................................................... 56 FIGURA 7 Maçã partida........................................................................................... 58 FIGURA 8 Reprodução das abelhas......................................................................... 59 FIGURA 9 Tela do software GeoGebra................................................................... 66 FIGURA 10 Tela do software GeoGebra, com desenhos livres ................................ 68 FIGURA 11 Tela do software GeoGebra, com as diagonais do pentágono ............. 71 FIGURA 12 Tela do software GeoGebra, com as diagonais dos polígonos ............ 72 FIGURA 13 Tela do software GeoGebra, com segmento áureo ............................... 75 FIGURA 14 Anotação dos valores das medições por um estudante ......................... 76 FIGURA 15 Pentágono .............................................................................................. 78 FIGURA 16 Dobradura do ponto áureo ..................................................................... 79 FIGURA 17 Questão da OBMEP – 2011 .................................................................. 80 FIGURA 18 Tela do software GeoGebra, com construção de números irracionais . 83 FIGURA 19 Tela do software GeoGebra, com localização de números irracionais . 84 FIGURA 20 Arredondamento e aproximações das raízes irracionais (Estudante A) 85 FIGURA 21 Arredondamento e aproximações das raízes irracionais (Estudante B) 86 FIGURA 22 Resultado da 7 em diferentes mecanismos ....................................... 87 FIGURA 23 Tela do software GeoGebra, com infinitos quadrados ......................... 88 51 FIGURA 24 FIGURA 25 Tela do software GeoGebra, com segmento de reta parcialmente coberto por pontos.................................................................................. 89 90 FIGURA 26 Tela do software GeoGebra, após rolamento distanciando os pontos executados sobre segmento.................................................................... Tela do software GeoGebra, com gráfico das funções ......................... FIGURA 27 Definição dos números irracionais por uma estudante .......................... 93 FIGURA 28 Percurso de Hércules, em metros .......................................................... 94 FIGURA 29 Representação geométrica de um número racional ............................... 95 FIGURA 30 Representação geométrica de um número irracional ............................ 96 FIGURA 31 Trabalho de representação geométrica realizado por um estudante ...... 97 FIGURA 32 Representação geométrica de um número racional com incógnitas ..... 97 FIGURA 33 FIGURA 34 Representação geométrica de um número irracional para demonstração de semelhança ................................................................ Resposta de um estudante, sobre os números irracionais ...................... 99 101 FIGURA 35 Outra resposta para os números irracionais ........................................... 102 91 LISTA DE ESQUEMAS ESQUEMA 1 1 Esquema da teoria de Chevallard (2001) .................................... 27 ESQUEMA 2 Indicadores para aprendizagem dos números irracionais............. 28 LISTA DE QUADROS QUADRO 1 Família dos números metálicos ............................................................. 62 QUADRO 2 Diagonais dos polígonos ....................................................................... 73 LISTA DE SIGLAS SEEDUC Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro PCN Parâmetros Curriculares Nacionais IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica OBMEP Olimpíadas Brasileiras de Matemática das Escolas Públicas PTE-IESK Posto Tecnológico Educacional do Instituto de Educação Sarah Kubitschek PDE Plano de desenvolvimento da Educação SEED Secretaria de Educação à Distância PROINFO Programa Nacional de Informática na Educação MEC Ministério da Educação TAD Teoria Antropológica do Didático SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 15 2 REVISÃO DA LITERATURA ......................................................................... 19 3 QUADRO TEÓRICO E METODOLÓGICO ................................................. 23 3.1 REFLEXÕES SOBRE A TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO......... 24 3.2 OBSERVAÇÕES PEDAGÓGICAS E INDICAÇÕES DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS ........................................................................ 4 29 OBJETO MATEMÁTICO DA INVESTIGAÇÃO: OS NÚMEROS IRRACIONAIS .................................................................................................. 39 4.1 UM POUCO DA HISTÓRIA .............................................................................. 39 4.2 PARA QUE SERVEM OS NÚMEROS IRRACIONAIS? .................................. 47 4.3 OBSERVAÇÃO DE ALGUNS NÚMEROS IRRACIONAIS NA RETA REAL.................................................................................................................... 48 4.4 RAZÃO ÁUREA ................................................................................................. 55 5 A INVESTIGAÇÃO .......................................................................................... 63 5.1 ATIVIDADES ENVOLVENDO RAZÃO ÁUREA ............................................ 64 5.1.1 Atividades com Software GeoGebra .................................................................... 64 5.1.2 Atividades com Outros Recursos ......................................................................... 76 5.2 ATIVIDADES COM OUTROS IRRACIONAIS ............................................... 81 5.2.1 Atividades com Software GeoGebra .................................................................... 81 5.2.2 Atividades com Outros Recursos ......................................................................... 92 6 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ........................................... 100 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 103 REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 106 ANEXOS .......................................................................................................................... 109 15 1 INTRODUÇÃO O presente trabalho insere-se na linha de pesquisa Organização Curricular em Matemática e Formação de Professores, do Programa de Mestrado Profissional em Educação Matemática, da Universidade Severino Sombra, no campus da cidade de Vassouras, no Estado do Rio de Janeiro. O campo de investigação é o da prática pedagógica e visa a motivar o aprendiz a atribuir significado aos conceitos matemáticos. Nesta pesquisa, trabalharemos com o conjunto dos números irracionais, dando especial destaque às construções geométricas e aplicações do número de ouro, usualmente representado pela letra grega (phi). As questões que nortearam a investigação foram: 1- Como é realizada a construção do conceito dos números irracionais por parte dos estudantes do curso de formação de professores dos anos iniciais (antiga escola normal)? 2 - Como trabalhar o tema dessa investigação articulado à realidade? 3 – É possível utilizar diferentes recursos didáticos que possam estimular a construção do significado dos números irracionais? A motivação para o presente trabalho surgiu de reflexões, ao lecionar a disciplina de Fundamentos e Metodologia de Matemática para turmas do Curso de Pedagogia de uma instituição de ensino superior, localizada na Zona Oeste da Cidade do Rio de Janeiro. Durante o mestrado, ao cursar a disciplina de Ideias Fundamentais da Matemática, foi realizado um seminário de números racionais e irracionais, destacando o número phi, o que contribuiu para a escolha do tema. A formação acadêmica da pesquisadora sofreu influência a partir da busca de atividades que articulassem os conteúdos à aplicação na realidade dos educandos. Foi essa formação que a possibilitou fazer uma relação direta dos conteúdos matemáticos com as atividades do cotidiano, identificando como a Matemática está conectada a diferentes áreas do conhecimento. O estudo emergiu de um conhecimento empírico gerado pelas experiências observadas em sala de aula. Para uma investigação de práticas motivadoras, tentaremos levar o aprendiz a desenvolver intuição, visualização, percepção, descoberta, criatividade e reflexão acerca dos conceitos matemáticos a serem construídos. Algumas observações a priori levaram-nos à hipótese de viabilizar a concepção do que é um número irracional e ao questionamento em relação à sua utilização na vida prática. 16 Acreditamos que, utilizando a história da Matemática como recurso didático, antes do desenvolvimento das atividades, essas tornar-se-ão mais interessantes e significativas. Além disso, comungamos com os teóricos Fonseca (1997), Moreira (2006) e Miguel (2009), quando afirmam que a articulação do ensino de números irracionais à realidade configura-se como um meio que viabiliza a aprendizagem. De acordo com as pesquisas bibliográficas, percebemos que o número possui inúmeras aplicações em diferentes áreas de conhecimento, como arquitetura, arte e música, entre outros. Devido à sua abrangência, acreditamos que utilizá-lo como objeto de estudo pode estimular a curiosidade e investigação dos alunos, a partir de construções geométricas, e proporcionar melhoria nos processos de ensino e de aprendizagem. Conjecturamos que o número phi pode ser utilizado como meio de conexão do ensino de números irracionais com a realidade, configurando-se como um dos recursos que propicia a aprendizagem de modo eficaz. Essa dinâmica foi realizada durante o desenvolvimento da investigação para o ensino dos números irracionais, abordando a utilização da razão áurea. A pesquisa teve como objetivo experimentar e validar as práticas pedagógicas que articulam o estudo dos números irracionais à realidade dos educandos, para tentar responder às questões anteriormente propostas. Essa busca por propostas que propiciem a construção do conceito dos números irracionais permite-nos levar em consideração o recurso didático da história da Matemática e aplicações no cotidiano. Foram valorizadas as propostas que, a partir de construções geométricas, explorem a percepção, a visualização, a interpretação, a noção de infinito, favorecendo a formação do conceito de completude do conjunto dos números reais, com a inserção dos números irracionais na reta real. Vale, ainda, destacar que foi explorada a relação entre as construções geométricas e algébricas do número e outros conhecimentos matemáticos. Além disso, realizamos um breve estudo sobre a razão áurea, para situá-la no contexto do mundo atual, quando se trata de relacionar a existência dos números irracionais no cotidiano e em construções geométricas, e uma investigação sobre a importância dos números irracionais para a construção do conjunto dos números reais, no campo da geometria. A pesquisa foi realizada em uma instituição pública de formação de professores que atuarão nos anos iniciais do ensino fundamental, localizada no Município do Rio de Janeiro, onde a pesquisadora atua profissionalmente e, seguindo as exigências do Comitê de Ética em 17 Pesquisa, os dirigentes e participantes concordaram em fazer parte dessa investigação, conforme o documento que se encontra no anexo A. Seguimos uma abordagem conforme indicado no Currículo Mínimo de Matemática, produzido pela Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro (SEEDUC), cuja meta é orientar com clareza e objetividade o docente, indicando itens essenciais para o processo de ensino e de aprendizagem, considerando a disciplina, o ano de escolaridade do estudante e o bimestre do ano letivo. Com esta pesquisa visamos promover uma melhoria no exercício futuro do magistério dos anos iniciais, visto que se tratam de “normalistas”, e tal melhoria poderá favorecer a aprendizagem de seus futuros estudantes, buscando a compreensão da importância da formação de tais conceitos, que podem ser introduzidos intuitivamente, desde os anos iniciais do Ensino Fundamental. Uma das estratégias utilizadas para a realização da investigação foi a de pesquisa bibliográfica. Para revisão da literatura, optamos por investigar algumas publicações disponibilizadas na internet, as dissertações de Penteado (2004) e Nakamura (2008), e a tese de Miguel (1993), no sentido de conhecer os diferentes enfoques dados aos números irracionais e, em especial, à razão áurea. Este trabalho foi dividido em sete capítulos, a saber: o primeiro é introdutório e objetiva apresentar um breve cenário sucinto sobre o tema; no segundo capítulo, optamos por expor a revisão da literatura, tal como descrevemos no parágrafo anterior; no terceiro, abordaremos o quadro teórico e metodológico, dividindo-o sob dois aspectos: o teórico, quando a pesquisa será fundamendada sob o ponto de vista do ensino, à luz da Teoria Antropológica do didático de Chevallard (1999), e, quanto ao metodológico, baseamo-nos na pesquisa-ação de Thiollent (2000), que se caracteriza pelo seu foco qualitativo com participação e orientação dos pesquisadores; no quarto capítulo, trataremos do objeto matemático da investigação, os números irracionais, visando abordá-los historicamente segundo os autores Boyer (1996), Carton (1995), Eves (2004), Livio (2007), Garbi (2010), Mattei (2000), Singh (2008) e matematicamente, enfatizando as características de um número racional e como provar que um número é irracional. Destacaremos as influências históricas dos pitagóricos e um questionamento sobre para que servem os irracionais, procurando um sentido para tal estudo no Ensino Fundamental e anos posteriores. O quinto capítulo, a investigação, trilha por uma pesquisa de atividades, reflexões e propostas didáticas sobre os números irracionais; enfatizamos, mais especificamente, a razão áurea. Visamos assim, a valorizar as atividades pedagógicas, investigando construções 18 geométricas, para, acreditamos, melhorar a compreensão dos problemas de Matemática. Serão apresentadas atividades com suas representações algébricas e geométricas construídas no software Geogebra e em outros recursos didáticos; no sexto capítulo, de análise e discussão dos resultados, apresentaremos o perfil social e acadêmico do grupo participante da pesquisa, apontando as fragilidades e potencialidades encontradas no decorrer do trabalho. E, para finalizar, apresentaremos no sétimo capítulo as considerações finais, onde teremos um panorama geral de todo o trabalho e alguns aspectos do ensino de Matemática. Por fim, destacamos que as práticas citadas e sugeridas neste trabalho resultaram no Produto desta investigação, uma exigência do Mestrado Profissional, e podem ser aplicadas nos diversos níveis de ensino: fundamental, médio ou superior, e, se necessário, podem ser feitas adaptações, de acordo com a ênfase que se deseja dar a determinados objetivos educacionais. Dessa forma, pleiteamos contribuir com a prática do professor de Matemática e a aprendizagem, principalmente, dos educandos. 19 2 REVISÃO DA LITERATURA Nesta seção, apresentaremos alguns trabalhos consultados, os quais possibilitaram uma análise sobre como vêm sendo abordados os números irracionais em diferentes níveis de ensino por alguns autores, na intenção de dar um panorama mais amplo sobre o assunto. O primeiro deles é o trabalho de Penteado (2004), que abordou as dificuldades no ensino e na aprendizagem dos números irracionais e as consequências negativas que podem refletir em estudos futuros, para a aquisição de outros conceitos matemáticos mais avançados. A autora realiza um estudo com um grupo de professores, utilizando a teoria de Raymond Duval1 e verificando as dificuldades apresentadas para a introdução dos conceitos de números irracionais. Cita, ainda, a importância de se formar a ideia de infinito e aborda a questão histórica desses conteúdos. Segundo Penteado (2004, p.01), “pesquisas nacionais e internacionais evidenciam que muitas dificuldades dos alunos na aprendizagem de limites e continuidade de funções são decorrentes da falta de compreensão do conjunto dos números reais”, daí a nossa preocupação em desenvolver um estudo que possa verificar o que ocorre ao prefaciar os conhecimentos dos números irracionais, formadores da completude dos números reais, nos anos finais de ensino básico, conforme indicados pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), e, consequentemente, a nossa preocupação com práticas e recursos que melhorem as atividades de sala de aula, para a formação do conceito dos números irracionais. Penteado (2004) ainda afirma que alguns problemas estão relacionados à escrita do número irracional, quando são apresentados ou efetuados os cálculos, pois são utilizadas aproximações de números decimais, causando certo desconforto entre as definições dos conceitos de racionais e irracionais. Outro problema é a apresentação dos irracionais sempre em raízes, além do desconhecimento da cardinalidade dos conjuntos, a completude dos reais e a existência de infinitos números. Nesse âmbito, alguns professores preocupam-se apenas com o operacional, os cálculos de radicais e o uso de números transcedentais, mais especificamente o (pi), nos cálculos de geometria. Não há uma construção do significado de infinito formando a ideia inicial do que seja um número irracional, sua importância e sua 1 A teoria do autor não será discutida, pois foge ao foco de nosso trabalho, mas o leitor poderá obter mais informações, que poderão ser de grande valia. Raymond Duval apresenta a Teoria dos Registros de Representação Semiótica, na qual afirma que, para possibilitar maior apropriação do conhecimento, é preciso conhecer pelo menos dois registros de representação diferentes e realizar uma articulação entre eles. Penteado (2004) corrobora esse argumento como base de sua pesquisa, visto que investiga as reações dos professores diante das representações e dos procedimentos para obter os números racionais e irracionais entre dois números reais distintos. 20 apresentação histórica. Cabe ressaltar que as diferentes representações dos números racionais e irracionais são dificuldades decorrentes de não saber interpretar e de não se ter construído o significado dos mesmos. Os estudantes tornam-se repetidores de mecanismos e nem sempre sabem o motivo da existência dos números irracionais, afirmando, algumas vezes, quando questionados, que “são aqueles que não servem pra nada”. No trabalho de Penteado (2004), há ainda outro ponto a considerar: uma problematização sobre a questão da discussão dos professores com relação à densidade dos conjuntos, suas representações, concepções e suas reações diante dessas questões. Caberia, então, analisar a construção desses conceitos na formação de professores, tal como afirma a mesma autora: Buscamos elaborar questões que criassem condições mais favoráveis para a apreensão destes conceitos, privilegiando as conversões entre os diferentes registros de representação, bem como tentando propiciar tratamentos das representações em cada registro, tanto no procedimento da média aritmética quanto naquele inspirado na diagonalização de Cantor. (PENTEADO, 2004, p.38) A autora utiliza uma metodologia de análise comparativa, a priori e a posteriori, realizada com os professores da Educação Básica do Ensino Médio da rede pública do Estado de São Paulo. Nesse contexto, observam-se algumas dificuldades que os professores apresentam, com relação aos conceitos básicos dos números irracionais, como, por exemplo, sua identificação. Sendo assim, detectar certo tipo de problema acaba por ser um importante meio de contribuir para a melhoria do ensino. Encontramos, no trabalho de Nakamura (2008), essa contribuição, quando faz uma abordagem histórica e epistemológica sobre o estudo dos números irracionais e a forma como são apresentados nos livros didáticos. O mesmo autor formaliza sua problemática em questões simples, mas de extrema relevância, inseridas no cotidiano de sala de aula, tais como: por que e para que ensinar e aprender irracionais? Para que servem e quando serão usados? O autor inicia fazendo um percurso histórico-epistemológico, com foco na história da Matemática do antigo Egito, citando algumas proporções da razão áurea. Segue com a Matemática da Babilônia e da Grécia antiga, seguindo orientações que são confirmadas por D‟Ambrosio (1999 apud NAKAMURA, 2008, p.20), quando afirma que “a introdução da 21 História da Matemática para o ensino pode ser considerada elemento motivador e, mesmo, caminho para esclarecer ideias matemáticas, incluindo-as em um Movimento Humanista.” Na investigação de Nakamura (2008) há, ainda, apontamentos acerca das influências e contribuições deixadas pelos grandes filósofos e matemáticos ao longo do tempo, de Pitágoras (586?a.C.-500?a.C.) a Richard Dedekind (1831-1916). Uma longa apresentação do desenvolvimento da Matemática de aproximadamente dois mil anos de história. Além disso, apresenta as reformas curriculares e as transformações sofridas pelos livros didáticos, no que diz respeito aos números reais. O mesmo autor analisa que a associação entre os números irracionais e as representações decimais infinitas e não periódicas “[...] pode criar obstáculos à compreensão da noção de irracionalidade e da própria natureza do contínuo numérico” (NAKAMURA, 2008, p.77). Apresenta algumas sugestões de situações que poderiam ser abordadas sobre os números irracionais, conforme exemplo abaixo: A tarefa consiste em descrever quando eles são chamados de segmentos comensuráveis e quando de segmentos incomensuráveis. Trataremos de duas técnicas a primeira pela razão de segmentos; e a segunda, utilizando o método de subtrações sucessivas, conhecido como máximo divisor comum entre dois segmentos dados (NAKAMURA, 2008, p.108. Grifo do autor) Nesse sentido, a revisão dessa obra corroborou ainda mais a escolha da teoria que fundamentou a análise das atividades propostas em nossa investigação, a Teoria Antropológica de Chevallard (1999), conforme detalharemos mais adiante. Outro trabalho consultado foi a tese de doutorado de Miguel (1993), intitulada “Três Estudos sobre História e Educação Matemática”, a qual apresenta três estudos: o primeiro tem foco no antigo problema entre a história da Matemática e a Educação Matemática, e fundamenta a história como uma metodologia de ensino para introduzir geometria, conforme o teórico Clairaut (1713-1765). O segundo estudo percorre a história da Educação Matemática, ou seja, como ocorreram historicamente os pensamentos que delimitaram o funcionamento de nossa prática pedagógica. O terceiro e último enfoque apresentado pelo autor, intitulado “Números Irracionais: Um estudo Histórico-Pedagógico-Temático, contribuiu para conceitos que iremos desenvolver em nossa investigação, pois apresenta uma discussão sobre a reconstituição da História, ao traçar temas que se relacionam e podem ser utilizados pedagogicamente acerca dos números irracionais, ampliando assim, a nossa visão para nos orientar na problemática da didática do ensino desses números. 22 Neste sentido, um estudo-historico-temático deve ser, antes de mais nada, uma reconstituição histórica do tema tendo em vista o seu ensinoaprendizagem em um contexto definido. Deve ser também uma reconstituição histórica de temas historicamente afins, isto é, que mostrem estar em íntima conexão com o desenvolvimento do tema central. No caso do tema central “números irracionais”, alguns temas historicamente afins são, por exemplo, o teorema de Pitágoras, o problema da incomensurabilidade, o método indireto de prova, etc. (MIGUEL, 1993, p.30) Para o autor, o processo de ensino-aprendizagem será construtivo se existir um elemento motivador. A fim de atender sua proposta, ele utiliza o pentagrama, ou pentáculo das bruxas, no qual apresenta segmentos incomensuráveis, possibilitando uma investigação sobre os números irracionais. Nessa proposta, ressalta a importância da relação entre o homem e o objeto de estudo, o que favorece a formação do significado do conceito. Em uma de suas atividades faz um questionamento interessante: “é possível construir um único quadrado cuja área seja igual à soma das áreas de dois quadrados quaisquer?” (MIGUEL, 1993, p.10). Para responder essa questão, utilizou papel quadriculado, no intuito de favorecer a visualização dos quadrados. O quadrado por si só pode não permitir nenhuma aprendizagem efetiva, contudo, quando atrelado à argumentação histórica, no caso, a de Hipaso, ampliou o acesso a diversas explorações didáticas, que podem ser confrontadas com outras abordagens. Consequentemente, a situação didática pode propiciar uma discussão oportuna sobre os personagens históricos que influenciaram as primeiras ideias acerca dos números irracionais. A análise dos trabalhos revisados proporcionou uma fonte de referência literária bastante rica sob o ponto de vista da investigação propriamente dita e, concomitantemente, concedeu-nos momentos de reflexão e ação na prática pedagógica, visando a contribuir para o cotidiano das aulas de Matemática, na formação de professores para Educação Básica, em particular, dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Apesar de existirem várias pesquisas voltadas para o processo de ensino e de aprendizagem sobre o tema números irracionais, percebemos que ainda carecem problemáticas com esse enfoque na prática de sala de aula. 23 3 QUADRO TEÓRICO E METODOLÓGICO Ao realizar uma revisão da literatura, reforçou-se a nossa percepção de que existem algumas lacunas sobre o ensino e a aprendizagem dos números irracionais com relação ao modo como é abordada em diversos níveis de escolaridade. Podemos apontar como um dos motivos para essas lacunas a aplicação meramente mecanicista, sem ênfase no contexto histórico e/ou associação com ênfase na geometria. Iniciamos essa investigação a partir do próprio testemunho de professores, preocupados, diante das resistências dos estudantes à Matemática. Já definidos e esclarecidos os objetivos a serem atingidos, entrelaçamos o presente tema aos pressupostos teóricos apresentados na obra de Chevallard, Bosch e Gáscon (2001), além de um embasamento no estudo da geometria, na vertente dos teóricos da Didática da Matemática. Para a escolha das atividades desenvolvidas na pesquisa, buscamos um foco geométrico, a fim de favorecer o lado intuitivo e simultaneamente concreto, tendo em vista que permite uma visualização do tema que está sendo investigado. Nesse sentido, nas palavras de Fainguelernt (1999), a geometria: [...] oferece um vasto campo de ideias e métodos de muito valor, quando se trata do desenvolvimento intelectual do aluno, do seu raciocínio lógico e da passagem da intuição de dados concretos e experimentais para os processos de abstração e generalização (FAINGUELERNT, 1999, p.22) Tanto a abstração quanto a generalização são fatores fundamentais para que o aluno possa construir de forma correta o conceito dos números irracionais. As construções geométricas tornam-se oportunas para o caráter investigativo e exploratório. Ao utilizar as figuras geométricas, encontramos, em várias relações, medidas com valores irracionais, possibilitando viabilizar o significado desses valores no contexto mais real, isto é, de forma concreta, a partir da visualização do aluno. A aprendizagem matemática, de modo geral, ocorre de forma tátil e visual, em direção à abstração. Assim, acreditamos que a relação entre os conhecimentos geométricos e a descoberta dos números irracionais pode contribuir para o processo de apropriação de seu conceito. A própria história nos mostra o quanto a geometria contribuiu para a descoberta de vários conhecimentos em outros campos da Matemática, como é o caso dos primeiros números irracionais, que se relacionam diretamente com medidas de figuras geométricas. É 24 um campo fértil para investigações, e pode ser vista como uma ciência e um meio de análise de estruturas lógicas, favorecendo, assim, o aprendizado de como “fazer” e como “pensar”. 3.1 REFLEXÕES SOBRE A TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO Os procedimentos que norteiam a nossa investigação têm suporte na Teoria Antropológica do Didático de Chevallard (1999). Apresentaremos algumas reflexões sobre a teoria, tecendo uma relação mais estreita com o nosso trabalho de pesquisa. Um aspecto aqui ressaltado é sobre o que vem a ser a matemática escolar e, segundo Chevallard, Bosch e Gáscon (2001), é uma consequência das necessidades matemáticas da convivência dos indivíduos em sociedade. Talvez seja por isso que é preocupante haver uma inversão nos valores relacionados à única razão de ser ensinada na escola, reduzindo-se ao valor social da aprendizagem matemática para um mero aprendizado escolar, tal como Chevallard, Bosch e Gáscon (2001) ressalta: Esse tipo de reducionismo pode fazer com que não se “leve a sério” a matemática escolar, considerando-a como mero “artefato escolar”. Aparece então um problema didático que pode ser formulado da seguinte maneira: “o que fazer para que os alunos se coloquem como matemáticos diante de questões matemáticas que lhe são propostas na escola e para que assumam, eles mesmos, a responsabilidade por suas respostas?” (CHEVALLARD; BOSCH; GÁSCON, 2001, p.46) Dessa forma, buscamos apresentar aos alunos questões sobre números irracionais que iniciem a partir de um contexto social, mesmo que seja meramente histórico, tornando a aprendizagem matemática um meio de atender as necessidades da sociedade, isto é, identificar as conexões que existem entre a Matemática e as diferentes áreas do conhecimento. O fazer matemático requer que se tenha um objeto matemático, em nosso caso, os números irracionais, quando construiremos modelos matemáticos que surgirão como exploração para esses números. Saber utilizar as ferramentas matemáticas já conhecidas para resolver problemas vivenciados no cotidiano implica que “[...] o estudo de um sistema matemático ou extramatemático gera questões que podem ser abordadas mediante instrumentos matemáticos já existentes, mas que são desconhecidos para aquele que desenvolve a atividade” (CHEVALLARD; BOSCH; GÁSCON, 2001, p.55), viabilizando, aprendizagem para responder as questões que foram propostas. portanto, uma 25 A Matemática torna-se um constante trabalho de criação como, por exemplo, ao utilizar ferramentas conhecidas, recursos já utilizados para criar novos modelos, em resumo, aquele que aprende a matemática clássica a transforma e cria uma matemática própria. O ensino é um meio para a realização de um estudo e cabe ao professor administrá-lo, selecionando atividades desafiadoras e investigativas condizentes com cada nível de escolaridade. Para Chevallard, Bosch e Gáscon (2001), as tarefas que irão organizar o estudo são vistas como técnicas. “Nesse paradigma, a aprendizagem é considerada como um processo psico-cognitivo, fortemente influenciado por fatores de motivação e de atitude do aluno-aprendiz” (CHEVALLARD; BOSCH; GÁSCON, 2001, p.73), daí o enfoque de uma busca motivacional para os números irracionais, com a inserção da razão áurea. Nesse contexto, verificamos ser fundamental para a aprendizagem a elaboração de um material e de atividades que possam motivar o aprendiz, gerando a “necessidade de criar novos dispositivos didáticos capazes de articular o trânsito entre os diferentes momentos desse processo” (CHEVALLARD; BOSCH; GÁSCON, 2001, p.285). Uma das dificuldades encontradas no desenvolvimento do processo é que nem sempre há intenção e/ou vontade do aprendiz, para que haja uma aprendizagem. Essa questão é chamada por Chevallard, Bosch e Gáscon (2001) de “irresponsabilidade matemática dos alunos”. Em resumo, a Teoria Antropológica do Didático, ou simplesmente TAD, apresenta a relação do homem fazendo matemática, constatando que todo fenômeno matemático compõe uma didática da obra matemática, que, ao longo do tempo, sofre transformações para se adequar ao contexto atual de ensino, o que caracteriza a transposição. E, por isso, a TAD é aquela que organiza a atividade matemática inserida no conjunto de atividades humanas e das instituições sociais. No âmbito da TAD, identificamos os tipos de tarefas, que são as atividades e técnicas (maneiras de fazer) que fornecerão modos diferentes para sua realização, pois, quando bem delineadas, podem ser analisadas sob pontos de vista diferentes. Para que o aprendiz cumpra toda a tarefa, é preciso que conheça todo o desenvolvimento de uma técnica. Como exemplo, a técnica da prova por absurdo2, na qual verificamos se um número é irracional, para demonstrar o desenvolvimento de uma determinada tarefa. 2 Sobre esse ponto, nos deteremos na seção 4.1. 26 A Matemática possui técnicas que são institucionalizadas, já reconhecidas pela comunidade dos matemáticos, mas para sua existência deve ser compreendida, entendida e justificada, ou seja, uma condição de existência está estritamente relacionada a um discurso descritivo e justificativo, o que Chevallard, Bosch e Gáscon (2001) chamam de tecnologia3. Essa tecnologia, quando justificada, gera a teoria. A organização para desenvolver um determinado tipo de tarefa é chamada de organização praxeológica, que nada mais é do que um conjunto de técnicas, tecnologias e teorias. A natureza dos objetos matemáticos de estudo pode ser considerada ostensiva, a que possui uma materialidade, e não-ostensiva, quando exige maior grau de abstração, como ideias e conceitos. Então, em nosso estudo, poderíamos considerar a representação dos irracionais como ostensivos, por exemplo, 2 , e a noção de número irracional não-ostensiva, cujo conceito, propriamente dito, de irracional, é nossa maior preocupação. Por tecnologia, entendemos recursos, os procedimentos das construções geométricas para justificar as técnicas utilizadas no desenvolvimento das tarefas. Para apresentar a Teoria de Chevallard (1999) de modo prático, construímos o Esquema 1 abaixo: 3 Para não causar uma confusão no leitor, apresentaremos o termo tecnologia em itálico, quando estivermos nos referindo à Teoria Antropológica do Didático, de Chevallard, Bosch e Gáscon (2001), visto que utilizaremos o software GeoGebra, que é um recurso da tecnologia da informação. 27 Esquema 1 - Esquema da teoria de Chevallard (2001) Objeto ostensivo Objeto não-ostensivo Tarefa Técnica Teoria de Chevallard Tecnologia Organização Praxeológica Teoria Transposição Didática (devido ao envelhecimento da praxeologia) Fonte: Dados da pesquisa Segundo Chevallard (2001), para o aprendizado, deverá ocorrer interação entre velhos e novos conhecimentos, além de bons materiais didáticos. Assim, para modelar nossas atividades, refletimos acerca de algumas questões, como, por exemplo, quais seriam os conhecimentos preexistentes que iriam interagir com o material escolhido? Quais os conhecimentos prévios estariam relacionados a novos conhecimentos, para uma aprendizagem com significado, favorecendo a construção do conceito dos números irracionais? Para responder esses questionamentos, construímos um esquema (Esquema 2), com alguns indicadores que consideramos relevantes de serem abordados para a aprendizagem dos números irracionais. 28 Esquema 2. Indicadores para aprendizagem do números irracionais Mensuráveis Segmentos Incomensuráveis Medições Geometria Racionais Infinitos Irracionais Números Reais Fonte: Dados da pesquisa Quadro metodológico Para realização e desenvolvimento da pesquisa, foi elaborado um questionário no qual o fator determinante foi o foco qualitativo que, segundo Thiollent (2000), é considerado uma pesquisa-ação, devido à realização de uma pesquisa de cunho social, que consiste na observação do grupo e experimentação das atividades. Utilizamos, ainda, como referência e direcionamento as indicações de enfoque interdisciplinar dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Associamos nosso trabalho à teoria anteriormente citada, visto que “o papel da teoria consiste em gerar ideias, hipóteses ou diretrizes para orientar a pesquisa e as interpretações” (THIOLLENT, 2000, p.55). Assim sendo, a teoria escolhida favorece a nossa investigação pelo fato de aplicar as tarefas e observar cada técnica utilizada pelos estudantes, além de suas tecnologias, permitindo-nos repensar sobre as atividades que podem levar a uma construção apropriada do conceito dos números irracionais. Os pesquisadores, durante a investigação, exerceram um papel ativo no desenvolvimento das questões propostas, inclusive nas avaliações. Caracterizando-se, assim, como uma pesquisa-ação, que “[...] é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo [...]” (THIOLLENT, 2000, p.14), ou seja, os pesquisadores atuam de forma cooperativa ou participativa. 29 A pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em pesquisa (Anexo A), intitulada “Números Irracionais: Práticas Pedagógicas Envolvendo Razão Áurea”, conforme Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996, e baseia-se nos pressupostos metodológicos da pesquisa-ação e, concomitantemente, busca-se por atividades pedagógicas que motivem os educandos, contribuindo para o processo de aprendizagem matemática. 3.2 OBSERVAÇÕES PEDAGÓGICAS E INDICAÇÕES DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS A indicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) é de um ensino associado ao cotidiano dos alunos, o que nos leva a refletir sobre qual realidade poderia ser atrelada ao conceito de números irracionais. Para fazer essa relação, encontramos na geometria construções que nos permitiram articular o referido conhecimento ao cotidiano dos alunos. Surgiram, então, alguns questionamentos: qual o uso real dos números irracionais para os alunos? Por que ensinar e aprender os números irracionais? Durante o desenvolvimento dessa pesquisa, percebemos que muitas são as dificuldades encontradas pelos alunos para a formação dos conceitos dos números irracionais, como, por exemplo, não conseguem distinguir a diferença entre um número racional e um irracional; números com infinitas casas decimais periódicas são confundidos com irracionais; não há uma ideia formada sobre o infinito; não há uma justificativa para adquirir conhecimentos sobre os números irracionais. Para explicar a existência e a necessidade dos números reais, primeiramente, recorremos à história, reportando-nos a Pitágoras; segundo a versão divulgada pela maioria das publicações, foi quando tudo começou. Nessa etapa da investigação, centralizamos o estudo na razão áurea, situando o leitor, com uma abordagem histórica. Posteriormente, vinculamos o estudo às construções geométricas que nos permitissem explorar uma diferença entre as medições comensuráveis e incomensuráveis e a exploração da ideia de infinito. É preciso que os alunos saibam identificar os conjuntos numéricos e seus respectivos elementos, e um bom meio para isso é a observação de regularidades, conforme indica Vigotsky (2000), a qual poderá proporcionar uma boa formação de significado para os números racionais, favorecendo a compreensão do conceito de irracionais, ou seja, os que não são racionais no conjunto dos números reais. Os procedimentos abordados nos parágrafos anteriores fazem-se necessários para que 30 o aluno chegue a uma definição e formação do conceito que, segundo Mathias (2010), é a etapa final. Todo esse contexto traçado para construir um conceito fez-nos refletir sobre as dificuldades dos alunos na aprendizagem de Matemática, de um modo geral, como mostram os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica 4 (IDEB). E, segundo D‟Ambrosio (l996), [...] os maiores entraves a uma melhoria da educação tem sido o alto índice de reprovação e a enorme evasão. Ambos estão relacionados. Medidas dirigidas ao professor, tais como fornecer-lhe novas metodologias e melhorar, qualitativa e quantitativamente, seu domínio de conteúdo especifico, são sem dúvida importantes, mas têm praticamente nenhum resultado apreciável. (D‟AMBROSIO, 1996, p.61) Juntamente com esses resultados, aparecem os desestímulos, a baixa autoestima. Então, motivar, estimular é o nosso ponto de partida. Acreditamos que, ao relacionar os conhecimentos ao cotidiano, proporcionamos um sentido ao estudo. Para que haja um bom desenvolvimento pedagógico, precisamos verificar como ocorre a aprendizagem da criança, como a Matemática é desenvolvida e como acontecem as situações didáticas e adidáticas (BROUSSEAU, 2008). O homem é um ser criador, que busca meios de suprir suas necessidades, enfrenta a natureza para se proteger ou apenas como mero desafio. Curiosidade, necessidade e erros levam o homem à aprendizagem. Nosso aluno precisa se deparar com desafios e situaçõesproblema que façam parte de seu contexto atual. As experiências obtidas pelas descobertas foram movidas pela curiosidade ou necessidades, e vão fazendo com que o homem aprimore seus conhecimentos, que serão repassados direta ou indiretamente. A ação do processo educativo envolve o aluno, o mestre e o meio, todos em constante evolução. Assim, para Vigotsky (2004): O que menos se deve é imaginar o processo educativo como unilateralmente ativo e atribuir todo o caráter ativo ao meio, reduzindo a nada o caráter do próprio aluno, do mestre e de tudo o que está em contato com a educação. Na educação, ao contrário, não existe nada de passivo, de inativo. Até as 4 O IDEB é um dos eixos do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), cujo objetivo é melhorar a educação oferecida aos diversos estudantes, nos vários níveis escolares. Esse índice permite apresentar para a sociedade como está a educação no Brasil, é uma forma de prestar contas com relação à educação básica. Seus indicadores são o fluxo escolar e o desempenho dos estudantes. Em resumo, é um instrumento “Para identificar quais são as redes de ensino municipais e as escolas que apresentam maiores fragilidades no desempenho escolar e que, por isso mesmo, necessitam de maior atenção e apoio financeiro” [...] (BRASIL, 2008, p.4). 31 coisas mortas, quando se incorporam ao círculo da educação, quando se lhes atribui papel educativo, adquirem caráter ativo e se tornam participantes ativos desse processo. (VIGOTSKY, 2004, p.70) O mundo atual é dinâmico, cheio de transformações tecnológicas cada vez mais avançadas. Nesse sentido, D‟Ambrosio (1996, p.68) corrobora com essa concepção quando afirma: “conceituo educação como uma estratégia da sociedade para facilitar que cada indivíduo atinja o seu potencial e para estimular cada indivíduo a colaborar com outros em ações comuns na busca do bem comum.” Nesse âmbito, precisamos modernizar o ensino, utilizando tecnologias, estimulando e motivando os educandos com práticas pedagógicas inovadoras que despertem seu interesse. Nessa direção, Vigotsky (2004) confirma que a criança é movida pelo interesse, ainda que esse seja negativo. Imaginemos um professor, ao ensinar que (pi) é um número irracional. O que isso tem de atrativo para o aluno? Daí a importância de se pensar em práticas pedagógicas para o ensino dos números irracionais, já que “o desenvolvimento e o reforço do interesse constituem a lei básica da educação e exigem que o pedagogo impregne gradualmente o processo de atividade com esse interesse.” (VIGOTSKY, 2004, p.114) Verificamos que é fundamental o professor ser criativo e inovador, pois “a regra psicológica básica de elaboração do interesse é a seguinte: para que o objeto nos interesse, ele deve estar vinculado a alguma coisa do nosso interesse, algo já conhecido, e ao mesmo tempo deve conter algumas formas novas de atividade [...]” (VIGOTSKY, 2004, p.115). Por que em Matemática não contamos historinhas? Por que em Matemática não utilizamos o excêntrico e colorido da Arte? Inovar, mudar, quebrar paradigmas são palavras muito ditas na atualidade, mas “inovação é difícil de julgar” (D‟AMBROSIO, 1996, p.66). De acordo com Freire (1996), a formação do aprendiz é muito mais que apenas treinar. Esse é um importante aspecto, pois a Matemática apresenta inúmeras técnicas que precisam ser integradas ao ensino. E não deve ser uma mera repetição das atividades. É preciso elaborar atividades potencialmente significativas, que permitam ao aprendiz formar os conceitos e aplicar diferentes técnicas. Quando o professor ensina apenas conteúdos, sem a preocupação com o significado e a consciência crítica, mantém o ciclo da educação das injustiças e dos excluídos, assim como Freire (1996) enfatiza: Daí o tom de raiva, legítima raiva, que envolve o meu discurso quando me refiro às injustiças a que são submetidos os esfarrapados do mundo. Daí o 32 meu nenhum interesse de, não importa que ordem, assumir um ar de observador imparcial, objetivo, seguro, dos fatos e dos acontecimentos. Em tempo algum pude ser um observador “acizentadamente” imparcial, o que, porém, jamais me afastou de uma posição rigorosamente ética (FREIRE, 1996, p.14) A Matemática ainda é uma das disciplinas que mais exclui, limita-se a erros e acertos. Mas entre esses dois extremos existe um longo percurso que o aprendiz desenvolveu, isto é, houve alguma transformação. É também com análise e reflexão do erro que se chega ao acerto. O processo de aprendizagem é um processo investigativo da busca de seus próprios interesses. O ser humano aprende movido pelo que deseja e pelo que é necessário. Não é um depósito de dados e informações, de acordo com as palavras de Freire (1996), ao denominar como ensino “bancário”. Percebe-se, assim, a importância do papel do educador, o mérito da paz com que viva a certeza de que faz parte de sua tarefa docente não apenas ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo. Daí a impossibilidade de vir a tornar-se um professor crítico se, mecanicamente memorizador, é muito mais repetidor cadenciado de frases e de ideias inertes do que um desafiador. (FREIRE, 1996, p.26-27) A Matemática, atualmente, evidencia o aspecto formal apresentando um produto pronto e acabado, conforme corrobora Fonseca (1997). O aluno é treinado pelo professor para obter respostas certas, o que não contribui para o processo de aprendizagem, pois “do ponto de vista psicológico, dificilmente poderia haver dúvida quanto à total inconsistência da concepção segundo a qual os conceitos são apreendidos pela criança em forma pronta [...]” (VIGOTSKY, 2000, p.246). A construção dos conceitos está relacionada a um processo de desenvolvimento de várias funções, como atenção, lógica, abstração, comparação, discriminação e a generalização. Toda prática pedagógica é acompanhada de uma abordagem teórica e não há como isentá-la. O conhecimento ganha vida quando apresentado como interligação do passado com o presente, proporcionando uma ação futura. O conhecimento da história pode ser um bom argumento para sustentação e entendimento de uma teoria. Segundo os PCN (BRASIL, 1998), a Matemática deve estar ao alcance de todos, para a educação inclusiva. Essa deve ser a prioridade do docente, para buscar a democratização. 33 Outro aspecto importante é que a Matemática não seja abordada como um conhecimento pronto e acabado, assim, é preciso construir e apropriar-se dos conceitos, para que ocorra a transformação e compreensão da realidade. Na Matemática, encontramos a característica de se observar o mundo real e poder relacioná-la a ele, a partir das representações, dos princípios e dos conceitos matemáticos. Nesse processo, os estudantes deverão: falar, escrever, produzir gráficos, desenhos, construções e organizar dados e resultados. O ensino da Matemática deve traçar um caminho de busca da compreensão. Vamos citar um exemplo sobre compreensão humana. Quando apresentamos uma pessoa: “Este é Paulo”, ele apenas é Paulo, apenas um nome, sem valores e sentido. Continuamos sem saber quem é Paulo. O que faz diferença é a história de Paulo. Onde queremos chegar? À importância da existência de um contexto, mesmo que seja meramente histórico. A localização, a época, como e por que foi descoberto, quais os estudos que levaram à descoberta, proporcionam o entendimento de um tipo de “ancoradouro” epistemológico. Quando o professor apenas apresenta conteúdos, nada faz sentido. O conteúdo apenas será memorizado ou decorado. É preciso contextualizar e vincular a utilidade ou uso atual, somente assim será encontrado o sentido, o motivo da existência do conteúdo a ser estudado e, nessa direção, os PCN (BRASIL, 1997) reiteram que: O conhecimento matemático deve ser apresentado aos alunos como historicamente construído em permanente evolução. O contexto histórico possibilita ver a Matemática em sua prática filosófica, científica e social e contribui para a compreensão do lugar que ela tem no mundo (BRASIL, 1997, p.20) Fonseca (1997) defende que o ensino da Matemática de forma holística 5 facilita a compreensão do todo. Comungamos desse argumento e partimos do pressuposto de que a razão áurea, devido a forma surpreendente que surge além de sua diversidade de aplicação nas diferentes áreas, fornece-nos elementos para um estudo histórico, interdisciplinar e geométrico, a fim de produzir um espaço de caráter motivador e investigador, objetivando a construção dos conceitos relacionados aos números irracionais. Os PCN (BRASIL, 1998) indicam quais devem ser os recursos didáticos utilizados para o “fazer matemática” na sala de aula, a saber: resolução de problemas, história da Matemática, tecnologias da informação e jogos. 5 O movimento holístico ultrapassa toda fragmentação disciplinar e integra nele o novo paradigma transdisciplinar. 34 Em nossa pesquisa, teremos o enfoque do recurso didático da tecnologia da informação, utilizando o software GeoGebra em algumas de nossas atividades, as quais proporcionam situações com problemas investigativos; e abordaremos a história da Matemática de forma oral e informativa, com o intuito de situar o grupo participante em um contexto propício sobre o tema. Mesmo assim, apresentaremos uma breve análise dos recursos didáticos indicados acima. O recurso de resolução de problemas tem sido utilizado apenas como aplicação de atividades para conteúdos previamente ensinados, não tendo exercido seu verdadeiro papel no ensino. Os problemas devem ser apresentados para investigação de diversas formas de obtenção de um resultado e para possíveis soluções de situações reais, ou não. Essa possibilidade e liberdade de criação contribuem para a autonomia e o desencadeamento de um caminho de resolução de novos problemas. Ao recorrer à resolução de problemas antigos, a história da Matemática contribui para a investigação de como é realizada ao longo do tempo, quando ocorreu a produção dos conhecimentos matemáticos, podendo o professor apresentar uma diversidade de resoluções para um mesmo problema, segundo diversos matemáticos, em épocas variadas. A História da Matemática mostra que ela foi construída com resposta e perguntas provenientes de diferentes origens e contextos, motivadas por problemas de ordem prática (divisão de terras, cálculo de créditos), por problemas vinculados a outras ciências (Física, Astronomia), bem como por problemas relacionados a investigações internas à própria Matemática. (BRASIL, 1997, p.42) Com relação ao recurso à história da Matemática, como o próprio nome diz, está relacionado à utilização do contexto histórico como meio pedagógico para esclarecer e responder as dúvidas dos alunos. A história da Matemática é um veículo de informação social e antropológico, que resgata a identidade cultural, contribuindo para a formação de um olhar crítico sobre os objetos de estudo, para a compreensão do conhecimento. Segundo Miguel (2009), desde o século XVII são discutidas as influências pedagógicas da história no ensino de Matemática, posteriormente inseridas nos congressos, no início do século XIX. Nesse sentido, essa inserção justifica-se devido ao fato de que a história aumenta a motivação, além de humanizar a Matemática e direcionar a cronologia histórica em que os conceitos foram desenvolvidos. 35 A história da Matemática oferece oportunidade de contextualização importante do conhecimento matemático, em que a articulação com a história pode ser feita nessa perspectiva, tais como a crise dos irracionais no desenvolvimento da ciência grega, que tem conexão com obstáculos até hoje presentes na aprendizagem desse conceito. (BRASIL, 2006, p.95) Desse modo, contribui para melhor percepção dos alunos com relação à Matemática e oportuniza a realização de investigações matemáticas. Apesar dos nítidos benefícios que o trabalho com a utilização da história no ensino da Matemática pode trazer, ainda temos algumas dificuldades, como “a quase inexistência de material bibliográfico com sugestões de atividades que possam ser utilizadas pelos professores em sala de aula” (MIGUEL, 2009, p.10). Outras dificuldades estão relacionadas à formação dos professores, pois, de um modo geral, não ocorre orientação de como utilizar práticas pedagógicas, e elas nem costumam ser usadas em suas próprias aprendizagens, por seus professores. Existe, ainda, a falta de tempo do educador, que assume diversas horas/aula, para poder viver com um orçamento razoável, e compromete a preparação das aulas; diante disso, prende-se demais aos livros didáticos, os quais, em geral, trazem apenas uma breve apresentação de dados históricos meramente ilustrativos. As atividades pedagógicas que recorrem à história no ensino da Matemática, na prática de sala de aula, têm como finalidades recriar problemas históricos, promover discussão sobre os distintos procedimentos, analisar fundamentos e métodos dos conceitos e debater aspectos da Matemática que estão inseridos na construção histórica. Para que todos os tópicos acima sejam atingidos, é necessário que a produção dos textos históricos matemáticos tenha o ponto de vista da escrita de um educador matemático comprometido com essa proposta. É um tipo de prática reconhecida como pedagogicamente útil na construção de conceitos que são considerados entraves na aprendizagem matemática, como é o caso de questões de geometria, trigonometria e números irracionais. Outro recurso importante é o das tecnologias de informação, que daremos ênfase mais adiante nesse trabalho, o qual, mais uma vez, torna-se obrigatório no mundo e que pode fornecer aos professores uma ferramenta importante, contribuindo na construção dos conceitos de Matemática. Muitos advogam o uso do computador devido à motivação que ele traria à sala de aula. Devido às cores, ao dinamismo e à importância dada aos 36 computadores do ponto de vista social, o seu uso na educação poderia ser a solução para a falta de motivação dos alunos (BORBA; PENTEADO, 2005, p.15) Nesse contexto, a escola precisa estar sempre atenta, aberta e direcionada às mudanças para, então, envolver os alunos na conquista do conhecimento. Uma das maneiras de conscientizar os professores sobre as práticas pedagógicas com o uso das novas mídias é levá-los à observação e utilização dessas práticas. Tendo em vista a complexidade em se introduzir novas práticas, é visível a resistência de muitos professores em apropriarem-se desses recursos pedagógicos em suas ações didático-pedagógicas. Muitos professores desistem quando percebem a dimensão da zona de risco. Evitam qualquer tentativa nesse sentido. Muitas vezes assumem e justificam essa postura baseados ou no fato de que acham que computadores não são para escola, ou que não estão preparados e não encontram condições de trabalho na escola (BORBA; PENTEADO, 2005, p.15) Devido à problemática da formação do professor, acreditamos ser importante o desenvolvimento de trabalhos que envolvam atividades para o ensino de números irracionais com a utilização de softwares, a fim de fornecer material que permita a inserção das tecnologias no contexto atual. Buscando quais fatores forneceriam uma aprendizagem com significado para os alunos, encontramos orientações para nossas investigações no teórico Moreira (1999), que aborda a construção de mapas conceituais e a Teoria da Aprendizagem Significativa. O autor (MOREIRA, 1999) considera aprendizagem significativa como um processo pelo qual um novo conhecimento interage com os conhecimentos preexistentes, “ancoradouro”, da estrutura cognitiva do aprendiz, que são os subsunçores. A nova aprendizagem pode ser a significação de um novo conceito, ou modificações que tenham ocorrido, devido à influência de um novo material. Ele explica que: Há, pois, um processo de interação no qual conceitos mais relevantes e inclusivos interagem com o novo material, servindo de ancoradouro, incorporando-o e assimilando-o; porém, ao mesmo tempo, modificando-se em função dessa ancoragem. (MOREIRA, 1999, p.12. Grifo do autor) Constatamos, assim, que uma das condições fundamentais para que ocorra a aprendizagem significativa é que o material seja significativo. Para que isso aconteça é 37 preciso que ocorram dois fatores: o material deve possuir significado lógico, ser não-arbitrário e não-aleatório; e a estrutura cognitiva do aprendiz deve ter conhecimentos subsunçores, que permitam a interação com o material. Segundo Moreira (2006), é fundamental dar importância a um material e atividades que possam motivar o aprendiz, como apresentado abaixo: A condição de que o material seja potencialmente significativo envolve dois fatores principais, ou duas condições subjacentes, quais sejam a natureza do material, em si, e a natureza da estrutura cognitiva do aprendiz. Quanto à natureza do material, ele deve ser “logicamente significativo” ou ter “significado lógico”, isto é, ser suficientemente não arbitrário e não aleatório, de modo que possa ser relacionado, de forma substantiva e não arbitrária, a ideias, correspondentemente relevantes, que situem no domínio da capacidade humana de aprender. No que se refere à natureza da estrutura cognitiva do aprendiz, nela devem estar disponíveis os conceitos subsunçores6 específicos, com os quais o novo material é relacionável. (MOREIRA, 2006, p.19, Grifo do autor) Outra condição para que haja aprendizagem significativa “é que o aprendiz apresente uma predisposição para aprender” (MOREIRA, 1999, p.40). Afinal, uma das dificuldades encontradas para que haja uma aprendizagem significativa é que “se a intenção do aprendiz for, simplesmente, a de memorizá-lo arbitrária e literalmente, tanto o processo de aprendizagem como seu produto serão mecânicos (ou automáticos)” (MOREIRA, 1999, p.23). Segundo Moreira (1999), a aprendizagem significativa e a aprendizagem mecânica, apesar de se contraporem, apresentam-se em um continuum, e mesmo a aprendizagem mecânica não ocorre em um “vácuo”, podendo ser utilizada em alguma fase inicial da aquisição do conhecimento. Em outro continuum estaria a aprendizagem por recepção e por descoberta, não devendo essa segunda ser confundida com aprendizagem significativa, afinal, ambas podem ocorrer de forma significativa ou mecânica. Nem tudo que é descoberto torna-se significativo, grande parte da aprendizagem de novos conhecimentos que ocorrem “em sala de aula está orientada para aprendizagem receptiva” (MOREIRA, 1999, p. 16). Vale ressaltar que a aprendizagem receptiva pode ser significativa, desde que haja uma maturidade cognitiva do aprendiz e que os métodos expositivos não sejam mal empregados. 6 O autor menciona que essa palavra não existe em Português, mas, com relação ao seu significado, caracterizase por expressar conhecimentos pré-existentes, ou seja, ideias, proposições e conceitos que já foram formados na mente do educando. 38 Tais orientações em muito contribuíram para reflexão, ao escolher as atividades que seriam propostas nesse trabalho. 39 4 OBJETO MATEMÁTICO DA INVESTIGAÇÃO: OS NÚMEROS IRRACIONAIS Este capítulo é dividido em quatro tópicos, a saber: um pouco da história; para que servem os números irracionais?; observação de alguns números irracionais na reta real; e razão áurea. Será feita uma abordagem histórica, apresentando a trajetória da descoberta dos irracionais, o que nos permite verificar os aspectos positivos das construções geométricas para o estudo dos irracionais. Apresentamos, ainda, a importância de se observar regularidades e generalizações, visto que a Matemática é uma ciência estruturada no raciocínio lógico, em observações de padrões e provas. Em contrapartida, percebemos a dificuldade de apresentarmos irregularidades, que também constitui a aprendizagem dos números irracionais, visto que são dízimas não-periódicas. Propomos um estudo de alguns números transcedentais7, buscando ilustrar suas curiosidades e possibilidades de relações interdisciplinares, além de sua utilização atual. 4.1 UM POUCO DA HISTÓRIA Iniciamos nossos estudos tomando por base pesquisas como as de Boyer (1996), Eves (2004) e Garbi (2010), abordando fatos históricos sobre o filósofo e matemático Pitágoras, com o objetivo de estabelecer um ponto de partida para o estudo e a descoberta sobre os números, e apresentando sua importância e influência para o estudo da matemática atual, além de situar o leitor no contexto da descoberta dos irracionais Observações pedagógicas fundamentam a estrutura da presente pesquisa, que propõe um breve questionamento sobre a necessidade dos números irracionais, com a pretensão desse olhar ser um ponto de orientação para educadores. 7 Os números podem ser algébricos ou transcendentes. Essa classificação surgiu com a descoberta da teoria dos conjuntos de Cantor que, segundo Eves (2004), em um artigo, apresentou as seguintes definições e teoremas: I Um número complexo é algébrico quando podem ser escritos na forma: a 0xn + a1xn-1 +... +an-1x + an = 0, em que ai (i = 0,1,2...., n) são inteiros II O conjunto dos números algébricos é enumerável; III O conjunto dos números reais não é enumerável IV Existem números transcendentes. Os números racionais são números algébricos. Os números que apresentam a forma de raízes, como, por exemplo, + 2 , - 2 , 3 5 , 3 5 são números irracionais algébricos. “Um número real que não seja algébrico é denominado irracional transcendente‖. (CARVALHO 1984, p. 161). Como exemplo de trancedentais podemos apresentar em especial o número PI, representado pela letra grega π, número de ouro representado por e o importante número de Euler, e. 40 Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), o volume (BRASIL, 1998) referente à Matemática da antiga quinta a oitava série, evidencia a importância de um ensino que envolva, dentre outros aspectos, a história e suas aplicações, de forma a estimular a curiosidade dos alunos. Aprendemos e ensinamos, algumas vezes, a utilização desses números sem embasamento teórico adequado, sem ter um conhecimento de sua origem e de sua aplicação, o que influencia o desempenho do aluno, como também sua visão do que é a Matemática e qual deve ser sua aplicação. Para melhor compreensão dos números irracionais, é preciso perceber características fundamentais dos números racionais e fazer uma viagem no tempo, recordando descobertas e questionamentos relevantes sobre esses números. Sabe-se que a ideia de número é muito antiga, milenar, pois existem vários registros encontrados a respeito disso. Acredita-se até que a ideia de número precede a escrita. Eves (2004) cita que foi encontrado na Tchecoslováquia um osso de lobo, correspondente a 30 mil anos atrás, com incisões representando o número 55, decomposto em 25 e 30, em grupos de 5, provavelmente uma escrita no sistema quinário, espelhado nos dedos das mãos. Observa-se, então, que o homem já sabia contar a partir de agrupamentos dos algarismos. Assim, o número surge da necessidade que o homem tem de contar. Desde a criação da ideia, o número foi relacionado e associado ao divino, o que despertou no homem a curiosidade, levando-o para um longo caminho de estudo e descobertas. Pitágoras Segundo Boyer (1996), o registro histórico da matemática grega inicia de modo formal com Tales e tem continuidade com Pitágoras. Estaremos abordando o surgimento dos números irracionais e da razão áurea, a partir dos estudos dos pitagóricos. Vamos, então, contar melhor essa história desde o início. Singh (2008) afirma que o estudo dos pitagóricos começou no século VI a.C., com algumas histórias envoltas em lendas, tornando difícil separar os fatos “reais” da ficção, já que não existem comprovações para tais. A única certeza é que Pitágoras desenvolveu um extraordinário trabalho de lógica numérica. Pitágoras viveu por volta de 569 – 475 a.C. Seu nome significa “o anunciador”, que em grego era Pítico (ou Pythios). Filho de Menesarco e Partêmis, revelou-se, desde criança, 41 como prodígio. Teve grandes mestres, como Hermodamas, Ferécides e Tales, que era um comerciante rico da colônia grega de Jônia de Mileto, e foi quem percebeu a ocorrência de um eclipse, permitindo situar sua obra em torno de 600 a.C.. Ele “[...] introduziu um conceito revolucionario: as verdades matemáticas precisam ser demonstradas” (GARBI, 2010, p.15). Pitágoras de Samos, como era chamado, compreendeu que os números existiam independentemente dos objetos concretos, percebendo que os números não eram apenas instrumentos de contagem. Sua fascinação e seus estudos pelos números possibilitaram a descoberta de inúmeras propriedades, além das relações com a natureza e os padrões que se formavam. Acredita-se que Pitágoras viajou durante vinte anos, indo, segundo alguns historiadores, à India e à Inglaterra. Aprendeu mecanismos matemáticos utilizados pelos babilônios e egípcios, povos que tinham a Matemática como um instrumento para resolver problemas de ordem prática, como era o caso da utilização das leis da geometria para demarcar os campos, devido às enchentes do Rio Nilo. Daí o significado “medida da terra” para o estudo da geometria. Naquela época, produzia-se Matemática como uma receita a ser seguida. Funcional, mas não havia um questionamento que levasse a uma lógica, um porquê. Influenciado pelas concepções de Tales sobre a Matemática, e depois de observar vários povos, Pitágoras obteve um aprendizado sobre as diversas maneiras de fazer Matemática. Ao retornar à ilha de Samos, para desenvolver pesquisas e questionamentos sobre esses conhecimentos, surgiu a intenção de fundar uma escola voltada para a filosofia, a fim de entender o que se fazia e não apenas fazer. Mas a ilha estava liderada por Polícrates, um conservador, que tentou silenciar Pitágoras. Pitágoras buscou o isolamento, para desenvolver seus estudos sem perseguição, mas precisava de companhia. Para tanto, pagou para lecionar a um menino. Em um determinado momento, para testá-lo, simulou não ter dinheiro. Mas seu aluno já havia se apaixonado pelos estudos, e ofereceu pagar-lhe. Ainda segundo Singh (2008, p. 30), “infelizmente este foi o único adepto que Pitágoras conquistou em Samos”. Posteriormente, em Crotona, criou a irmandade pitagórica, com vários discípulos. Fazendo uma digressão, o contexto histórico culminou nas seguintes questões, para reflexão: Por que nossos alunos não estão interessados nos conhecimentos que tentamos apresentar? O que está faltando à escola? Como colocar o brilho nos olhos desses jovens que nos procuram? 42 Na Grécia, Pitágoras fez importantes descobertas para a Matemática, a Astronomia e a Música. A “teoria dos números” foi a base da escola pitagórica; acreditava-se que os números eram a essência do universo. Nesse contexto, os números tinham essência divina, devido às relações existentes entre os números e os fenômenos naturais. O encantamento desse filósofo o fez assumir como lema “Tudo é número”, que perpassou por toda escola pitagórica. De acordo com Carton (1995), os ensinamentos de um membro da escola pitagórica constituíam-se em três partes: preparação, purifição e perfeição, como se refere Tarento, um dos seus discípulos, na obra versos de ouro de Lísis. A etapa da preparação era o culto a alguma Divindade. A purificação era o culto à humanidade, à família e ao amor universal. Finalmente a perfeição, que estava relacionada à meditação, à fé, para que, com o auxílio da oração, desvendassem os problemas do universo. Uma das mais preciosas descobertas de Pitágoras foi a relação entre a harmonia da música e a harmonia dos números, tal como Singh (2008) confirma: Além de estudar as relações entre números, Pitágoras também era fascinado pela ligação dos números com a natureza. Ele percebeu que os fenômenos naturais são governados por leis, e que essas leis podem ser descritas por equações matemáticas. Uma das primeiras ligações que ele percebeu foi a relação fundamental entre a harmonia da música e a harmonia dos números. (SINGH, 2008, p.35) Nenhum músico teve tanta importância no período clássico quanto Pitágoras. Conforme conta a lenda, Pitágoras foi guiado pelos deuses na descoberta das razões matemáticas por trás dos sons, depois de observar o comprimento dos martelos dos ferreiros. Assim, “Pitágoras teria, em seguida, concebido a unidade de medida musical, o tom, como o excesso e intervalo entre a quarta e a quinta, ou seja, 3/2 : 4/3 = 9/8, tom maior da gama moderna [...]” (MATTEI, 2000, p.103). Os seguidores de Pitágoras aplicaram essas razões ao comprimento de fios de corda em um instrumento chamado cânon, ou monocorda, e foram capazes de determinar matematicamente a entonação de todo um sistema musical. Os pitagóricos viam essas razões como governando todo o Cosmos, assim como o som. Platão descreve em sua obra, Timeu, a alma do mundo como estando estruturada de acordo com as mesmas razões. Para os pitagóricos, assim como para Platão (428 – 348 a.C.), a música tornou-se uma natural extensão da Matemática, bem como uma arte. A Matemática e as descobertas musicais de Pitágoras exerceram, dessa forma, uma crucial influência no desenvolvimento da música através dos tempos e, particularmente, foi acentuada no final da Idade Média. 43 Para os gregos, na Matemática, só existiam os números racionais positivos e Pitágoras considerava-os suficiente para descrever todo o universo, pois estavam associados às medições. Nos estudos de Pitágoras encontramos muitas generalizações e regularidades. É o caso dos números triangulares, números quadrados, números pentagonais entre outros que possuem uma ligação entre a aritmética e a geometria. Talvez essa seja a razão para a escolha do pentagrama como símbolo do grupo: misticismo e geometria. Nas palavras de Livio (2007): Muitos pesquisadores (entre eles Kurt Von Fritz, em seu artigo intitulado “A descoberta da incomensurabilidade por Hipaso de Metaponto”, publicado em 1945) sugerem que os pitagóricos foram os primeiros a descobrir a Razão Áurea e a incomensurabilidade. Esses historiadores de matemática afirmavam que a preocupação pitagórica com o pentagrama e o pentágono, combina com o conhecimento geométrico que havia no meio do século V a.C., tornou plausível que os pitagóricos, e em particular, talvez Hipaso de Metaponto, tenham descorbeto a Razão Áurea e, através dela, a incomensurabilidade. (LIVIO, 2007, p.49) Com base em Livio (2007), o grupo de Pitágoras atribuía propriedades especiais a alguns números, como apresentaremos a seguir: O número 1 (um) era o número gerador de todos os outros. O número 2 (dois), que é encontrado nas relações com o corpo humano e o mundo – dois olhos, o sol e a lua – era o número da opinião e divisão. O número feminino, pois, associava-se aos dois seios. O número 3 (três) era o número masculino, devido à associação aos órgãos masculinos, número da harmonia (unidade mais divisão – 1+2). O primeiro número real expresso geometricamente pelo triângulo. O número 4 (quatro) era o número da justiça e ordem. O número 5 (cinco) leva a origem da razão áurea. Representa a união 2 + 3 = 5. O número do amor e do casamento. O número 6 (seis) é o primeiro número perfeito. Número perfeito é aquele cuja soma dos seus divisores, não o incluindo, é igual ao próprio número. O número 10 (dez) representava o “tudo” (1 + 2 + 3 + 4) e, coincidentemente, é a base do nosso sistema de numeração (sistema decimal). Dentre os estudos e observações de Pitágoras, uma de suas importantes demonstrações é da relação entre os três lados de um triângulo retângulo qualquer, que hoje conhecemos 44 como “Teorema de Pitágoras”; é uma generalização e surgiu da observação de uma regularidade utilizada intuitivamente na prática pelos babilônios e pelos chineses, mil anos antes de Pitágoras. Atribui-se a esse teorema o surgimento dos números incomensuráveis. Uma das histórias mais divulgadas em livros didáticos sobre o não avanço aos números reais pelos pitagóricos é a de Hipaso, um dos alunos da Irmandade Pitagórica; ao observar a diagonal do quadrado de lado igual à unidade, Figura 1, verificou não ser um número racional (inteiro ou fracionário), e um grande conflito foi gerado, desencadeando a queda da doutrina “tudo é número”. Figura 1 - Diagonal do quadrado d 1 1 Fonte: Dados da pesquisa Assim, d= d² = 1² + 1² (1) d² = 2 (2) (3) 2 (um número não racional) A fim de percebermos o problema gerado, é preciso compreendermos que, naquela época, os números estavam ligados a resultados de medições e era isso que caracterizava um número como racional. Com relação a esses números, Caraça (1951, p 35) afirma que “sejam os dois segmentos de recta AB e CD, em cada um dos quais se contém um número inteiro de vezes o segmento u – AB contém m vezes e c contêm n vezes o segmento u. Diz-se, por definição, que a medida do segmento AB, tomando CD como unidade, é o número [...]”. Segue abaixo, para melhor compreensão, um esquema representativo de um número racional. Observe os segmentos a e c, seguindo a Figura 2: 45 Figura 2. Segmentos de retas c a Fonte: Dados da pesquisa c cabe uma quantidade exata (m) de vezes em a c cabe uma quantidade exata (n) de vezes no segmento unitário Então: a = m.c assim c= a m (4) 1 = n.c assim c= 1 n (5) Como: c=c (6) a 1 m n (7) m n (8) a Sendo m diferente de zero e m, n primos entre si, a fração é irredutível. Euclides (330-290 a.C) provou por contradição que que atualmente demonstramos imaginando que 2 não é um número racional, o 2 seja um número racional, assim, seguindo a definição apresentada, poderia ser escrito na forma m , onde m e n são primos entre si. n Teríamos que: m 2 n 2 m n (9) 2 m2 2.n2 2 (10) (11) 46 Logo, m 2 é par. Então m é par e pode ser escrito na forma m 2k . Então, Se m e n são números pares, 2k 2 2.n2 (12) 4k 2 2.n2 (13) 2k 2 n2 (14) m é uma fração redutível, ou seja, não são primos entre n si, o que contradiz o fato de ser irredutível. Portanto, 2 não é um número racional. Observe que apresentamos uma generalização para os números racionais. Devido à falta de explicação pela razão humana, naquela época, sobre essa nova descoberta, surgiu o termo “irracional” que, de acordo com Mattei (2000), significa “indizível”, do grego arrêton ou álogon, “privado de razão”. Durante séculos, estudiosos matemáticos tentaram entender e explicar a nova descoberta e, “por algum tempo, 2 foi o único número irracional conhecido” (EVES, 2004, p.107). Para Eves (2004), a existência dos números irracionais contribui para a ideia matemática do contínuo, como é possível verificar em estudos feitos por Dedekind (Postulado da continuidade) e Cauchy (sucessões de Cauchy); eles retomaram os estudos e trabalharam com os conceitos de corte e de partição e corte dos números racionais, definindo, assim, o conjunto dos números reais e o espaço para os números imaginários e complexos. Dedekind publicou em 1872 um trabalho intitulado Continuidade e números irracionais, que abrange essa questão pela reta, devido à sua continuidade. Da união do conjunto dos números racionais com o conjunto dos números irracionais, surge o conjunto dos números reais. Lima (2002) é um dos autores que cita a existência de mais números irracionais que números racionais. Um número Real chama-se irracional quando não é racional. Como o conjunto dos números racionais é enumerável, [...] que existem números irracionais e, mais ainda, sendo R = Q U (R – Q), os irracionais constituem um conjunto não-enumerável (portanto formam a maioria dos Reais) porque a reunião de dois conjuntos enumeráveis seria enumerável. (LIMA, 2002, p.18) 47 Chega-se à conclusão de que realmente o ensino dos números irracionais é fundamental, pois, sem esse conhecimento, como chegar aos números reais? E como explicar a continuidade as inúmeras casas decimais sem regularidade? 4.2 PARA QUE SERVEM OS NÚMEROS IRRACIONAIS? No nosso dia a dia não nos deparamos com medições que sejam números com infinitas casas decimais. Obviamente, para um estudo geométrico, esses números aparecerão, mas na prática, empregamos aproximações, pois, por mais preciso que seja o instrumental passível de ser utilizado, não é comum apresentar infinitas casas decimais, quer sejam periódicas (número racional representado por dízimas periódicas) ou não (números irracionais). Então, para que eles servem? E por que estudá-los? A maior parte dos conteúdos de Matemática do ensino médio está vinculada a modelos matemáticos de natureza contínua: os números reais e os espaços geométricos (reta, plano e espaço tridimensional). O estudo da geometria e das funções de variável real insere-se nesse contexto, refletindo o papel fundamental do Cálculo (esse assunto é objeto de estudo na universidade) no desenvolvimento das aplicações da Matemática nas Ciências. (BRASIL, 2006, p.94) Não há descoberta inútil para a ciência, pois haverá sempre um próximo passo. Algumas vezes, na ciência, algo que é descoberto fica guardado por muitos anos, até séculos. Posteriormente algum outro cientista faz uma nova descoberta relacionada ao assunto e faz a continuidade do trabalho, descobrindo sua aplicação. No caso específico dos números irracionais, podemos atribuir quase mil anos de estudo para obter a compreensão e necessidade dos mesmos para as ciências. Quando os números são dispostos em uma linha reta numerada, que é o modelo quantitativo da continuidade, são os números irracionais os responsáveis em tornar a reta contínua. Essa é uma visão matemática que pode auxiliar os cientistas na questão que perdura até a atualidade sobre como o tempo flui. De modo contínuo (sem interrupções) ou descontínuo (como nos relógios digitais)? No nosso cotidiano, percebemos somente a existência dos números racionais, muitas vezes apenas os inteiros positivos, quantificando os diversos fenômenos naturais. Se nos limitarmos a isso, concordaríamos com Pitágoras em ocultar a descoberta dos números irracionais. 48 Mas, do ponto de vista dos cientistas, “[...] podemos concluir que ao descobrir os números irracionais, os matemáticos criaram uma possibilidade que não pode ser comprovada por qualquer medição que se possa imaginar” (MIGUEL, 2009, p. 187) e que precisamos dos números irracionais para descrever todos os fenômenos, como, por exemplo, a velocidade da luz, que é mensurada até a nona casa decimal sem periodicidade, já que apenas paramos de escrevê-la, pois, para descrever essa medida, o ato seria infinito; os mesmos números servem para detectar falhas no funcionamento dos computadores. Encontramos, ainda, grande utilidade desses números na geometria, como é o caso do número transcendental π (pi) e do número de ouro, (phi), que possui inúmeras aplicações, as quais abordaremos mais adiante. 4.3 OBSERVAÇÃO DE ALGUNS NÚMEROS IRRACIONAIS NA RETA REAL Como vimos anteriormente, Pitágoras foi o precursor da Matemática em realizar provas, demonstrações, e, inspirado pela influência de Tales, movido pela curiosidade e envolto em uma diversidade de conhecimentos adquiridos da observação de vários povos, criou um grupo de seguidores, que chamamos de pitagóricos, com quem organizou toda uma filosofia de vida. O fim de Pitágoras era, pois, gravar a noção de ciência da generalidade, de maneira que fizesse penetrar a verdade em todas as análises de minúcia. Toda a ciência, com efeito, que limita as investigações a um dos planos da criação, ou que encara os seres ou os objetos sem ter em conta a sua origem, os seus elementos de constituição, as suas conexões atuais, o seu fim, é forçosamente fragmentária e voltada ao erro. Investigações empreendidas sem estas ideias gerais só chegam à acumulação de fatos sem significação nem ligação e as deduções práticas falsas e perigosas. Foi o que Platão, discípulo de Pitágoras, resumiu numa frase: “Não há senão a ciência da generalidade”. (CARTON, 1995, p.153) Associando todo esse lado histórico à nossa atualidade, percebemos que buscamos cada vez mais realizar ou criar atividades que desenvolvam nos educandos o hábito de pensar e raciocinar sobre os conceitos de Matemática. É preciso que o aluno observe regularidades e generalizações, daí a importância de compreender que a prova e as demonstrações matemáticas são necessárias. Uma das funções da prova é a de buscar uma explicação e, por meio de demonstrações, apresentar por que o resultado é verdadeiro. Outra função seria a de validação 49 do resultado, o que para a Matemática é fundamental, mas, em geral, para os alunos não apresenta motivação, só dificuldade. Por isso, neste trabalho, buscamos apresentar atividades que permitam a observação de regularidades e que sejam motivadoras. Reportando-nos, ainda, à história, em busca de respostas, traçamos uma comparação entre o sentido de número para o homem primitivo – que encontrava encantamento, misticismo e uma relação direta às coisas que lhe permitiam contar – e o homem atual, para quem os números são apenas algo aritmético, aparentemente desligados das coisas reais, pois já estão inseridos em seu pensamento, como afirma Caraça (1951): Verifiquemos, no entanto, como um dado real que não pode ser posto de lado, que o homem tem tendência a generalizar e estender todas as aquisições do seu pensamento, seja qual for o caminho pelo qual essas aquisições se obtêm, e a procurar o maior rendimento possível dessas generalizações, pela exploração metódica de todas as suas consequências. (CARAÇA, 1951, p.10) O homem tende a seguir em suas criações determinada lógica. O próprio pensamento intuitivo gradativamente leva-nos ao desencadeamento de um raciocínio lógico, uma observação de determinadas tendências, normas, princípios, enfim, regularidades. Como exemplo, podemos citar a sequência de números naturais que vai aumentando com acréscimo de uma unidade. Assim, naturalmente, se dermos início à sequência 0, 1, 2, 3, automaticamente saberemos responder qual será o próximo número, que é o quatro. Isso ocorre porque percebemos uma regularidade, ou melhor, “o meu pensamento não vê barreira para aplicação da operação elementar; por outras palavras, aceita não pode deixar de aceitar, a possibilidade de repetição ilimitada do acto mental – juntar uma unidade” (CARAÇA, 1951, p.11), o que nos leva ao princípio da extensão, à possibilidade do infinito. O homem busca o caminho mais simples para solucionar suas problemáticas, o caminho mais curto que nos leva ao princípio da economia, poupando energia mental para solucionar possíveis cálculos. Deparamo-nos com operações mentais que nos levam a criar generalizações. Quando o professor ensina Matemática, apresenta inúmeras fórmulas que parecem ter surgido do “nada” e tornam o conhecimento “decorado” e sem sentido. Para uma aprendizagem significativa (MOREIRA, 1999), é preciso conduzir o aluno para a percepção de regularidades, pois “a tendência em Matemática é adquirir, completar, estender, generalizar” (CARAÇA, 1951, p.51). 50 A existência de regularidades é extremamente importante porque permite a repetição e previsão, desde que se criem as condições iniciais convenientes; ora, repetir e prever é fundamental para o homem na sua tarefa essencial de dominar a Natureza. Toda técnica se baseia nisso, e o leitor que pense um momento na possibilidade e utilidade dessa técnica na vida corrente – de um extremo ao outro da aparelhagem técnica, da enxada ao ciclotrão – verificará sem trabalho que tal possibilidade e utilidade se baseiam nestas duas coisas essenciais: repetir os fenômenos tantas vezes quantas sejam precisas, prever os seus resultados. (CARAÇA, 1951, p.119–120). Nas palavras de Lorenzato (2008, p.12), “é preciso auxiliar a criança a transformar em interiorizações (ou abstrações) suas ações sobre o concreto, o manipulável ou o visual, isto é, passar da ação à representação (abstração reflexiva)”. As representações e generalizações são importantes não só para a Matemática, como para a própria linguagem. A construção do pensamento ocorre segundo a formação de generalizações e de um processo de transições de uma generalização a outra, conforme afirma Vigotsky (2000). A passagem do concreto (o que se pode visualizar) para o abstrato, a formação das deduções da lógica é realizada pela observação de regularidades e generalizações, tendo em vista que “o conceito é, em termos psicológicos, um ato de generalização” (VIGOTSKY, 2000, p.246). Durante o desenvolvimento desta pesquisa, ao observar algumas construções geométricas, percebemos uma regularidade pertinente aos números irracionais que nos chamou atenção. Observando a representação formada pelas hipotenusas dos triângulos retângulos, conforme Figura 3, e percebendo sua disposição quando tais números irracionais são escritos na reta real, é notável a regularidade existente, a qual nos levou à verificação de sua veracidade. Figura 3 - Método geométrico de construção das raízes quadradas de números naturais Fonte: Dados da pesquisa 51 O objeto de estudo dessa observação foram certos números algébricos, mais especificamente as raízes quadradas de números inteiros positivos. Ficamos particularmente interessados na distribuição desses números ao longo da reta real. Observe, na Figura 4, a distribuição das raízes quadradas positivas na reta real: Figura 4 - Distribuição das raízes quadradas de números naturais na reta real. Fonte: Dados da pesquisa Percebemos que, entre o número inteiro 1 e o inteiro 2, existem duas raízes quadradas que são números irracionais; entre o inteiro 2 e 3 existem quatro; entre o inteiro 3 e 4, seis; e, assim, sucessivamente, ou seja, a observação sugere, para cada segmento da reta delimitado por dois inteiros positivos consecutivos, mais duas raízes quadradas. Mas somente essa percepção, sem a generalização, não é o suficiente para que a afirmação seja verdadeira. Afinal, os números inteiros positivos dessa reta são infinitos, e pela visualização dos cálculos com apenas alguns números não podemos comprovar a veracidade de nossa conjectura para o próximo intervalo. Antes de iniciarmos a generalização, verificamos a regularidade que ocorre entre esses intervalos, delimitados por dois inteiros positivos consecutivos, realizando alguns cálculos. Entre o intervalo limitado pelos inteiros 1 e 2, teremos raízes quadradas de números inteiros positivos que são números irracionais, então: 1≤ ≤ 2 com a = {1, 2, 3, 4} (15) Calculamos os quadrados e teremos: 1² ≤ a ≤ 2² (16) 1≤a≤4 (17) Subtraindo os quadrados, para excluir uma das extremidades, tem-se que: 52 4–1=3 (18) Agora, subtraímos 1 do resultado obtido acima, para excluir a outra extremidade e verificamos quantas raízes teremos nesse intervalo: 3 – 1 = 2, que é o número de raízes quadradas de números inteiros positivos. Repetiremos o mesmo processo para o intervalo limitado pelos inteiros 2 e 3. Também teremos raízes quadradas de números inteiros positivos, que são números irracionais. Então: 2≤ ≤ 3 com a = {4, 5, 6, 7, 8, 9} (19) E, calculando os quadrados, teremos: 2² ≤ a ≤ 3² (20) 4≤a≤9 (21) Vamos subtrair os quadrados, para excluir uma das extremidades: 9–4=5 (22) Agora, subtraímos 1 do resultado obtido acima, para excluir a outra extremidade, e verificamos quantas raízes temos nesse intervalo: 5 – 1 = 4, que é o número de raízes quadradas de números inteiros positivos. Novamente repetimos o mesmo processo para o intervalo limitado pelos inteiros 2 e 3, a fim de percebermos a regularidade. Também teremos raízes quadradas de números inteiros positivos, que são números irracionais, então: 3≤ ≤ 4 com a = {9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16} (23) A partir do cálculo dos quadrados: 3² ≤ a ≤ 4² (24) 9 ≤ a ≤ 16 (25) Vamos subtrair os quadrados, para excluir uma das extremidades: 53 16 – 9 = 7 (26) Agora, subtraímos 1 do resultado obtido acima, para excluir a outra extremidade, e verificamos quantas raízes temos nesse intervalo: 7 – 1 = 6, o número de raízes quadradas de números inteiros positivos. Percebemos que, quando subtraímos os quadrados dos números inteiros, já que estamos trabalhando com raízes quadradas, retiramos sempre 1, para fazer a exclusão da extremidade. Podemos seguir o mesmo princípio, para generalizar o argumento. Seja n um número inteiro positivo qualquer. Então, teremos entre n e n + 1: n≤ ≤n+1 (27) n² ≤ a ≤ (n + 1)² (28) n² ≤ a ≤ n² + 2n + 1 (29) Calculamos os quadrados e, daí, Vamos subtrair os quadrados, para excluir uma das extremidades: n² + 2n + 1 – n² = 2n + 1 (30) Agora subtraímos 1 do resultado obtido acima, para excluir a outra extremidade e verificamos quantas raízes temos nesse intervalo: 2n + 1 – 1 = 2n, que é o número de raízes quadradas de números inteiros positivos. Deduzimos, anteriormente, que a quantidade de raízes quadradas na forma k, k pertencente ao conjunto dos números naturais, IN, encontra-se entre n e n+ 1, e é igual a (n+1)² – n² -1. Sendo x a quantidade de raízes quadradas na forma k , k pertencente IN, vamos mostrar (demonstrar) que o valor de x cresce conforme uma progressão aritmética, P.A. ( de razão 2. Escolhemos dois termos consecutivos quaisquer da sequência descrita acima. Por exemplo, an e o termo seguinte an+1, e obtemos que an é uma quantidade x de raízes compreendidas no intervalo n e n+ 1. 54 Então: = (n + 1)2 – n² - 1 (31) = n² + 2n + 1 – n² -1 (32) = 2n (33) Desenvolvendo: O termo seguinte será an+1, que é uma quantidade x de raízes compreendidas no intervalo n + 1 e n+ 2: = (n+2)² - (n+1)² - 1 (34) = (n² + 4n + 4) - (n²+2n+1) – 1 (35) = n² + 4n + 4 – n² -2n – 1 – 1 (36) 2n + 2 (37) - (38) Assim, subtraindo os termos: 2n + 2 – 2n = 2 (39) Chegamos à verificação de que é uma progressão aritmética de razão dois. Constatamos, nesse estudo, o quão importante é ter domínio das demonstrações generalizadas e perceber as regularidades para o desencadeamento de uma construção do raciocínio lógico e abstração dos conhecimentos. Além disso, é preciso atentar para o questionamento dos porquês, as dúvidas e os próprios erros que nos levam às descobertas e comprovações. As fórmulas que serão apresentadas aos estudantes não devem se tornar apenas letras decoradas; é necessário que o professor demonstre aos educandos por um exemplo numérico, já que pode não ficar bem definido o que se deseja verificar. Por isso, iniciamos a partir de exemplos concretos as regularidades, para chegarmos a deduções e abstrações. 55 A disciplina de Matemática em cursos de formação de professores para a Educação Básica contribui para a percepção de regularidades e generalizações, estimulando, assim, as provas de novas descobertas. O ser humano busca o conhecimento, para ser capaz de entender, explicar e transformar o mundo. O professor não deve limitar seus aprendizes a fórmulas prontas e sem sentido. Deve-se, ao menos, apresentar a evolução histórica da Matemática, para que eles entendam que o conhecimento não surge com um passe de mágica, muito pelo contrário, é um processo em constante transformação. Cabe, portanto, ao professor de Matemática aprofundar seus próprios conhecimentos, ser um pesquisador inquieto, para incentivar seus alunos a exercer a prática investigativa. 4.4 RAZÃO ÁUREA Buscamos, neste trabalho, utilizar a razão áurea como meio de apresentar, demonstrar e motivar o processo de aprendizagem dos números irracionais, devido à sua “beleza”, ao seu “misticismo” e sua curiosidade, além de permitir inúmeras construções geométricas, possibilitando o caráter investigativo que tanto almejamos. Surge, então, uma problemática: a questão do juízo estético, ou juízo de gosto. Cada indivíduo sente-se atraído ou motivado por coisas diferentes: o que eu gosto nem sempre é o que o outro gosta. Nesse sentido, Chauí (2006) indica que foi Kant quem realizou o mais importante tratamento sobre juízo de gosto, discutindo as questões citadas acima, ou seja, a subjetividade do gosto. É possível perceber que: [...] uma discussão é um processo de afinamento das opiniões cuja finalidade é chegar a um acordo entre as partes. Assim, não se disputa o belo, mas pode se discutí-lo. Essa discussão é uma reflexão com a finalidade de se chegar a um juízo estético compartilhado por todos (CHAUÍ, 2006, p.282) Notamos, em nossa sociedade, alguns padrões de beleza criados pelo homem, de acordo com a sua cultura e os diferentes grupos sociais. A razão áurea é encontrada nas proporções de várias obras de arte, na natureza, e é considerada a proporção da beleza. A arte, muitas vezes, imita a natureza, que, por sua vez, apresenta inúmeras regularidades; o homem, como observador, formaliza-as e possibilita transformá-las em demonstrações matemáticas. O fato de recorrermos a práticas pedagógicas para os números irracionais que se aproximem à realidade dos indivíduos levou-nos a busca da arte e da natureza presente no dia 56 a dia, encontrando, assim, a razão áurea como meio motivador e concreto para o ensino e a aprendizagem de tais números. O símbolo usado para a razão áurea era a letra grega (tau), significando “o corte”. Somente no século XX, Mark Barr deu-lhe o nome de (Phi), para homenagear Fídias, escultor e arquiteto grego que, como supõem alguns historiadores, fazia uso da razão áurea em suas obras, como “Partenon”, em Atenas, e o “Zeus”, no templo Olímpia. O número de ouro, (Phi), cujo valor é 1,618033988749... (um número irracional), é reconhecido como um número com características misteriosas e enigmáticas. A razão áurea inspira estudiosos de todas as disciplinas. O homem também apropriouse de (Phi) para realizar inúmeras obras e monumentos. Segundo Livio (2007), Euclides foi o primeiro a definir com clareza a razão áurea (300 a.C.), chamando-a de “Razão extrema e média”, quando como uma linha toda está para o maior segmento, o maior segmento está para o menor, ou seja, procuremos dividir o segmento todo em duas partes tais que o segmento total dividido pela maior dê o mesmo resultado que a maior dividida pela menor. Daí, teremos a proporção, Figura 5: Figura 5. Proporção áurea = Fonte: Dados da pesquisa É evidente que temos uma infinidade de formas diferentes de dividir um segmento AB qualquer, em duas partes desiguais. Porém, somente uma delas parecerá ser a mais agradável ao espírito, como traduzindo uma operação harmoniosa para os nossos sentidos. A fim de chegarmos algebricamente ao valor de (Phi), partimos do segmento da mesma maneira, como foi efetuada na proporção acima citada. E teremos, conforme Figura 6, a divisão áurea de um segmento de reta: Figura 6. Divisão áurea do segmento de reta Fonte: Dados da pesquisa 57 Pelo estudo das proporções podemos estabelecer que: uv u = u v (40) u v u + = u u v (41) u = x v (42) u v u + = u u v (43) 1 = x x (44) x + 1 = x2 (45) x2 - x - 1 = 0 (46) Que pode ser escrito como: Substituindo: Temos: 1+ Essa equação apresenta duas raízes reais, a saber: 1 5 0,618 2 (47) 1 5 1,618 = 2 (48) x1 = e, x2 = 58 Desde as mais antigas até os dias atuais, temos construído com a ajuda de (Phi), por ser ele o número que expressa, segundo nossos conceitos de beleza, a mais perfeita relação de harmonia já conseguida pelas mãos humanas. O motivo da escolha desse número é que “a atratividade do „Número Áureo‟ originase, antes de mais nada, do fato de que ele tem um jeito quase sobrenatural de surgir onde menos se espera” (LIVIO, 2007, p.18). Cientes de que existem várias concepções desse número, não pretendemos provar a veracidade ou não sobre possíveis utilizações casuísticas do número de ouro. Utilizaremos o encanto e a magia criada ao longo do tempo e, principalmente, as construções geométricas relacionadas ao número áureo, para tentar motivar a atenção e o prazer das descobertas nas investigações, favorecendo outros conhecimentos e conceitos matemáticos. A razão áurea aparece em nosso cotidiano por meio da arte, da natureza, do corpo humano, da música, sendo esse o motivo pelo qual é conhecida como “divina proporção”. Até os dias atuais, vários são os objetos/setores em que encontramos essa razão, como é o caso do cartão de crédito, da identidade e dos serviços de odontologia relacionados à estética. Na natureza, a razão áurea surge, por exemplo, ao partirmos uma maçã pela sua circunferência máxima, Figura 7, pois encontraremos as sementes arrumadas em forma de uma estrela de cinco pontas, um pentagrama. Figura 7. Maçã partida Fonte: Dados da pesquisa O crescimento das conchas do nautilus (molusco) “também obedece a um padrão que é orientado pela razão áurea” (LIVIO, 2007, p.19), assim como a árvore cronológica do zangão, que segue esse mesmo padrão, Figura 8. 59 Figura 8 - Reprodução das abelhas Fonte: Contador (2011, p. 218) Na folotaxia, termo que se refere à forma com que as folhas das plantas estão dispostas ao longo de seus ramos, é possível encontrarmos uma regularidade entre seus intervalos, distribuindo-se em forma de um espiral com ciclo de cinco, o que nos leva a um pentágono. “A quantidade importante que caracteriza a localização das folhas é o ângulo entre as linhas que ligam o centro do caule às folhas sucessivas” (LIVIO, 2007, p.132), chamado de ângulo áureo, que tem o valor aproximado de 137,5 graus. Os abacaxis, bem como as pinhas, em sua superfície apresentam camadas hexagonais, e cada uma dessas camadas é parte de três espirais diferentes; o arranjo dos flóculos nos girassóis forma espirais no sentido horário e anti-horário que se cruzam. Essa formação ocorre “por pontos sucessivos separados por 137,5 graus” (LIVIO, 2007, p.132). O mesmo ocorre com as pétalas de algumas flores, como é o caso das margaridas. Em todos esses casos aparece a sequência de Fibonacci. A Matemática observa as regularidades na natureza e as associa a números, como faziam os pitagóricos em seus estudos, mesmo que misticamente. Percebemos a razão áurea como um caminho para observações da presença de pradrões existentes na natureza, que seguem uma numeração que tende para o número 1,618... Grande parte dessas curiosidades é explicada buscando como recurso o estudo da sequência de Fibonacci, a qual citaremos abaixo. Leonardo de Pisa (1170 – 1240), um matemático da Idade Média, após muitos estudos, chegou ao número de ouro. No ano de 1202, Leonardo, que ficou conhecido como Fibonacci (Filho de Bonacci), publicou o livro Liber abaci (Livro do ábaco), apresentando explicações sobre a numeração indo-arábica, nos sete primeiros capítulos. Em 1223, Fibonacci publicou Practica Geometriae (Prática de Geometria), um pequeno livro que contribuiu diretamente para o desenvolvimento da literatura sobre a razão áurea. 60 No livro Liber abaci, Fibonacci apresentou o problema dos coelhos, no qual um casal, após um mês, dá origem a outro par de coelhos (o período de gestação desse animal é de trinta dias) e, consequentemente, no mês seguinte, o par de coelhos inicial, que já é maduro, dará origem a mais um par de coelhos, e o outro par estará em fase de amadurecimento. Assim, no terceiro mês, serão dois pares de coelhos maduros e um em amadurecimento, formando a seguinte sequência: um par de coelhos no primeiro mês, dois pares no segundo mês, três pares no terceiro mês, no quarto mês, cinco pares e, assim, sucessivamente. Esse problema deu origem à sequência 1,1,2,3,5,8..., a qual ficou conhecida como a sequência de Fibonacci. Observe que o número subsequente dessa sequência é igual à soma dos dois anteriores, ou seja, . Ao realizarmos a divisão do termo posterior com o anterior, verificamos que a sequência tende para o número . Observe: 1:1=1 (49) 2:1=2 (50) 3 : 2 = 1,5 (51) 5 : 3 1,6666666666666666666666666666667 (52) 8 : 5 = 1,6 (53) 13 : 8 = 1,625 (54) 21 : 13 1,6153846153846153846153846153846 (55) 34 : 21 1,6190476190476190476190476190476 (56) 55 : 34 1,6176470588235294117647058823529 (57) 89 : 55 1,6181818181818181818181818181818 (58) 144 : 89 1,6179775280898876404494382022472 (59) O homem, em suas construções e obras de arte, às vezes, tenta retratar a natureza e, consequentemente, remete-nos a encontrar muitas obras de arte que apresentam a razão áurea. Um dos grandes pintores, artista do Renascimento, em cujas obras encontramos a razão áurea, foi Leonardo da Vinci8. Ele usou (Phi) para pintar a Monalisa, uma de suas mais notáveis obras; em vários pontos dessa obra, tais como nas relações entre seu tronco e cabeça, ou entre os elementos do rosto, aparece a razão áurea. Outra obra desse autor foi o “O Homem Vitruviano”, onde se constata a divina proporção. 8 Nasceu cerca de três séculos depois de Leonardo de Pisa, portanto, não devem ser confundidos. 61 Uma das aplicações mais recentes da razão áurea é no ramo da odontologia estética. A busca pela beleza levou esse ramo a questionar quais os padrões e as proporções poderiam ser considerados belos, visto que é um conceito um tanto abstrato. Pagani e Bottino (2003) alegam que é importante refletir sobre estética na odontologia, um ramo atual para o qual caminham os valores de beleza da sociedade. A estética engloba o estudo da beleza para obtenção de resposta no emocional. Mas quando abordamos o assunto beleza, precisamos de padrões, e como é complexo definir padrões e proporções de beleza, devido à sua subjetividade, o ser humano observa regularidades e proporções como medidas comparativas, chegando, assim, à razão áurea. A estética dental tem demonstrado grande influência na relação com o comportamento humano, em geral, com a autoestima. A beleza de um sorriso melhora a autoconfiança e, consequentemente, apresenta vantagens para a vida social, cultural e educacional. Para Contador (2011), pesquisas relacionadas à presença da proporção áurea e a medidas crânio-facial podem “devolver aos pacientes ortodônticos, cirúrgicos ou protéticos as medidas que lhes são mais harmônicas, e não aquelas que ocorrem na média da população” (CONTADOR, 2011, p. 225). Tais estudos podem contribuir para decisões médicas. Vinculamos, assim, a importância de estudos matemáticos relacionados à razão áurea com outras áreas de conhecimentos essenciais, não devendo tal estudo ser descartado e, sim, cada vez mais aprimorado. A família dos números metálicos No decorrer de nossas investigações, encontramos um elemento que acreditamos poder contribuir muito para um aprofundamento em pesquisas futuras, pois sua diversidade proporciona possibilidades de atividades em distintas áreas: a família dos números metálicos. Apresentaremos, de forma sucinta, a família dos números metálicos, cujos membros “são todos os números irracionais quadráticos positivos” (SPINADEL, 2003), ou seja, são as soluções positivas das equações quadráticas, do tipo: (60) e (61) 62 sendo n um número natural. São chamados de números metálicos, pois apresentam uma generalização do número de ouro, quando n = 1. As raízes dessas equações são números irracionais, e assim como acontece com o número de ouro, podem ser expressas como frações contínuas e sequências secundárias de Fibonacci. Observe o Quadro 1, que trata das características de alguns membros da família dos números metálicos. Quadro 1. Família dos números metálicos Sequência númerica Número de ouro Número de Prata Número de Bronze Número de cobre9 Número de Níquel Lei de formação Equação quadrática Raízes das equações quadráticas 1, 1, 2, 3, 5 8, 13, 21... 1, 1, 3,7,17, 41, 99,239... 1, 1, 4, 13, 43,142,469... 1,1,3,5,11, 21,43,85... O número inteiro 2 1, 1, 4, 7, 19, 40,97... Fonte: Dados da pesquisa O Quadro 1 permite-nos verificar a vasta dimensão das possibilidades de conhecimentos matemáticos que podem ser abordados com a família dos números metálicos. Assim, podemos associá-los às sequências numéricas, às funções quadráticas, aos números irracionais, às frações contínuas e às construções geométricas. 9 Apesar da resolução da equação do número de cobre gerar um número inteiro ele é considerado pertencente à família dos números metálicos, a que cabe um aprofundamento sobre o assunto em outro momento, já que estamos neste capítulo apenas apresentando os estudos encontrados. Esses números possuem inúmeras propriedades. 63 5 A INVESTIGAÇÃO Neste capítulo faremos uma abordagem mais específica das práticas pedagógicas, com apresentação das atividades que foram aplicadas em nossa pesquisa e que podem ser utilizadas em sala de aula e no laboratório de informática pelo professor, a fim de construir conceitos, diferenciar números racionais e irracionais e, principalmente, permitir a percepção do infinito. Tivemos preocupação com o tema números irracionais devido ao difícil entendimento apresentado pelos alunos e pela pouca abordagem do tópico nos livros didáticos, além da dificuldade que os professores encontram em relacioná-los com o cotididano. Dessa forma, buscamos encontrar atividades investigativas e motivadoras, devido ao ensino desse conhecimento ainda se apresentar como “[...] um amontoado de regras de operar com radicais, as quais acabam sendo vistas pelos estudantes como um conhecimento pouco significativo, pouco desafiador e desligado dos demais temas [...]”. (MIGUEL, 2009, p.270) Conforme citado anteriormente, o desenvolvimento desta pesquisa ocorreu em uma escola de formação de professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental, do estado do Rio de Janeiro. Não se trabalhou com uma determinada série. O grupo escolar onde a pesquisa aconteceu englobou 12 estudantes do primeiro ao quarto ano do Ensino Médio 10. Para a realização das atividades foram gastos dois meses, com encontros semanais de quatro horas. O número de estudantes, durante a realização das atividades, teve uma variação, devido às faltas nos respectivos encontros. As atividades que serão apresentadas fazem parte dessa pesquisa, tendo sido criadas ou adaptadas pela autora/pesquisadora do trabalho. São atividades de foco investigativo e exploratório. [...] a psicologia e a didática garantem que no processo ensino-aprendizagem um conceito não pode simplesmente ser reduzido à definição, e é através da contextualização por meio de diferentes atividades e situações-problemas que ele adquire um significado para o aprendiz. (FAINGUELERNT, 1999, P. 22) Tivemos a preocupação, antes da aplicação das atividades, de apresentar a história da Matemática, com suas respectivas crises, informações sobre a descoberta dos números irracionais e o conhecimento prévio sobre o número de ouro. Foi apresentado um power point 10 O referido curso do Ensino Médio equivale ao curso “Normal” de formação de professores do anos iniciais do Ensino Fundamental. 64 com figuras relacionadas aos referidos assuntos, para que os estudantes pudessem visualizar as obras de arte e todo o contexto que foi abordado. Após as apresentações históricas, foi realizada uma discussão na qual realizamos questionamentos, como: será que todas essas histórias são realmente verdadeiras? Imagine uma nova descoberta nos dias atuais, contradizendo algo que acreditamos como verdade; qual seria nossa atitude diante do fato? Podemos dizer qua a Matemática é estática e está pronta e acabada? Diante desse contexto, as questões apresentadas permitiram que os estudantes desenvolvessem um olhar mais crítico sobre determinadas narrativas, a fim de apontar a existência de fatos históricos e fatos lendários. Sugerimos, também, aos estudantes que investigássemos, nas construções geométricas e em nosso próprio corpo, as relações de proporção que forneceriam a razão áurea, não no intuito de provar a veracidade da mesma, mas para verificarmos segmentos incomensuráveis. Ao final da pesquisa, faremos uma análise do ensino e da aprendizagem, levando em consideração as características do grupo participante e o seu nível de escolaridade. Para melhor organização do nosso trabalho, dividimos as atividades para o “número de ouro” e para os outros números irracionais de uma forma geral, subdividindo cada um desses assuntos em atividades com o software GeoGebra e com outros recursos, como verificaremos a seguir. 5.1 ATIVIDADES ENVOLVENDO RAZÃO ÁUREA Nesta seção, trataremos de apresentar as atividades realizadas com os estudantes sob dois aspectos, a saber: com o uso do software GeoGebra, e sem o uso desse software, analisando pontualmente os resultados obtidos. 5.1.1 Atividades com software GeoGebra Sabemos que a tecnologia, no mundo atual, não é mais uma opção e, sim, algo que se faz presente no dia a dia. Inscrições, boletins escolares, resultados de exames, transações bancárias, várias situações do cotidiano são resolvidas pela internet. Assim, o computador está presente nas resoluções de problemas diários, mesmo para o público que não tem acesso facilitado a essa ferramenta. 65 Os fatos citados acima obrigam a inserção da tecnologia na vida de diferentes grupos sociais. Torna-se cada vez maior a necessidade de aprender a utilizar o computador, isso não é mais uma opção e, sim, uma obrigação, visto que alguns serviços são apenas on line. As Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006) reiteram que: No uso de tecnologia para o aprendizado da Matemática, a escolha de um programa torna-se um fator que determina a qualidade do aprendizado. É com a utilização de programas que oferecem recursos para a exploração de conceitos e idéias matemáticas que está se fazendo um interessante uso de tecnologia para o ensino da Matemática. Nessa situação, o professor deve estar preparado para interessantes surpresas: é a variedade de soluções que podem ser dadas para um mesmo problema, indicando que as formas de pensar dos alunos podem ser bem distintas; a detecção da capacidade criativa de seus alunos, ao ser o professor surpreendido com soluções que nem imaginava, quando pensou no problema proposto; o entusiástico engajamento dos alunos nos trabalhos, produzindo discussões e trocas de idéias que revelam uma intensa atividade intelectual (BRASIL, 2006, p.90) Analisando esse contexto, reafirmamos que a educação não pode ficar inerte a tal inserção. É preciso que a escola inicie o hábito da prática de utilização da tecnologia, tanto para a realização de trabalhos como para contribuição e construção de uma aprendizagem significativa que tem como característica “uma interação (não uma simples associação), entre aspectos específicos e relevantes da estrutura cognitiva e as novas informações, pelas quais estas adquirem significado” (MOREIRA, 2006, p.16). O software GeoGebra11 permite-nos executar e realizar atividades matemáticas relacionadas à geometria, álgebra e cálculo, além de contribuir com o professor na montagem de seus trabalhos12 e avaliações que serão aplicadas em suas turmas, facilitanto a construção de desenhos e de figuras geométricas. Esse software foi desenvolvido na Áustria por Markus Horerwanter, da Universidade de Salzburg, e possibilita abordar vários conteúdos da Educação Básica, proporcionando aulas dinâmicas e produtivas, tornando-se um importante recurso metodológico para melhor visualização, percepção e investigação de propriedades, o que validam as conclusões dos alunos, por meio de suas próprias descobertas. 11 É um software de acesso livre e gratuito e pode ser utilizado por qualquer pessoa, ao acessar o endereço eletrônico: http:www.geogebra.org/cms. Além disso, apresenta versões para o sistema operacional do Windows e Linux. 12 O professor poderá fazer a figura desejada com o software e, para copiar no trabalho que está montando (teste, prova e outros), utilizar a tecla print screen do teclado do computador e ctrl v no documento do Word, ou no próprio software ao “abrir” a caixa arquivo, exportar, copiar para área de transferência e ctrl v no documento do Word. 66 É importante conhecer as divisões das funções de cada parte do software para melhor manuseio. Na Figura 9, apresentamos a divisão da tela do software em: Janela da álgebra – visualização dos nomes dos objetos, representados por letras, e as coordenadas dos pontos e/ou as equações algébricas. Em nosso trabalho, pouco será utilizada essa função e, em geral, essa janela estará fechada na apresentação de nossas atividades. Janela da geometria – ferramentas para realização de desenhos e figuras geométricas; pode ser utilizada com eixo cartesiano e/ou malha quadriculada ou não, além de permitir alteração das propriedades dos mesmos, tais como cor, espessura e outros. Barra de ferramentas – possui as ferramentas necessárias para realização dos desenhos de fácil compreensão, pois aparecem as figuras e seus respectivos nomes. Utilizaremos em todas as atividades. Campo de entrada – situado na parte inferior da tela, é utilizado para as mesmas funções da barra de ferramentas e para plotar gráficos de funções. Figura 9 - Tela do software GeoGebra BARRA DE FERRAMENTAS JANELA DA ÁLGEBRA JANELA DA GEOMETRIA CAMPO DE ENTRADA Fonte: Dados da pesquisa Apresentaremos algumas atividades e construções de (phi) realizadas no software GeoGebra, que podem contribuir com o professor para o estudo da geometria. As atividades apresentadas a seguir são investigativas e servem para serem utilizadas no laboratório de 67 informática, propiciando o desenvolvimento de elementos que favoreçam a formação dos conceitos matemáticos de infinito, continuidade, função e, consequentemente, os números irracionais, tendo em vista que realizaremos as construções geométricas de (phi). Visamos, assim, propor atividades utilizando o software GeoGebra, com o intuito de reforçar e formular conceitos matemáticos, preexistentes no contexto de vida do estudante, como é o caso da percepção do infinito e de continuidade, que tem relação direta com os números irracionais. Atividade 1 – Desenhos Livres Objetivos Ensinar o manuseio do software, para que os estudantes estejam familiarizados com a utilização do mesmo; Retomar conhecimentos básicos de geometria, tal como a diferença entre segmento e reta. Enunciado da 1a atividade: DESENHOS LIVRES 1) Selecione arquivo13. Abrirá uma caixa onde vamos escolher novo; 2) Selecione exibir. Abrirá uma caixa onde vamos escolher malha; 3) Escolha o ícone novo ponto e marque na malha os pontos de acordo com o desenho desejado (exemplo: uma casa); 4) Escolha o ícone segmento definido por dois pontos e delimite os pontos marcados. DIVISÃO DE SEGMENTO EM PARTES IGUAIS 1) Selecione arquivo. Abrirá uma caixa onde vamos escolher novo; 2) Selecione exibir. Abrirá uma caixa onde vamos retirar o plano cartesiano; 3) Escolha o ícone segmento definido por dois pontos e marque um segmento qualquer; 4) Escolha o ícone ponto médio ou centro. Clique nos pontos do segmento feito no item anterior; 5) Escolha o ícone distância, comprimento ou perímetro. Clique no ponto central e da extremidade; repita com a outra lateral. Alguns estudantes ligaram os pontos utilizando a ferramenta “reta definida por dois pontos”, proporcionando nitidamente a diferenciação entre segmento e reta, já que, muitas 13 Os nomes das ferramentas do software serão escritos em negrito nos comentários de nossas atividades. 68 vezes, apenas pela fala do professor tais diferenças parecem passar imperceptíveis. Vejamos um exemplo realizado por um estudante, conforme Figura 10. Figura 10 - Tela do software GeoGebra, com desenhos livres Fonte: Dados da pesquisa Nessa atividade realizada, o estudante esboça duas maneiras de resolvê-la. A primeira opção, à direita, mostra que ele (ou ela) não distinguiu a diferença entre o conceito de reta e o conceito de segmento; e, ainda pela Figura 8, à esquerda, percebemos o esboço da atividade devidamente realizada. Nesse sentido, de acordo a análise praxeológica de Chevallard (1999), a tarefa consistiu-se em realizar desenhos livres e dividir um segmento em partes iguais, utilizando software GeoGebra, seguindo os comandos indicados. No entanto, os próprios comandos já sinalizavam várias sub-tarefas como, por exemplo, fazer escolhas, isto é, os estudantes tinham de escolher os ícones apropriados para a realização dessa atividade. Em se tratando da técnica, ou modos de fazer, alguns estudantes, durante o manuseio, escolheram o ícone relacionado à reta definida por dois pontos, demonstrando que não houve reconhecimento entre os conceitos de reta e de segmento, não havendo, portanto, tecnologia, conforme já abordado anteriormente. Assim, ao investigar algumas atividades de livros didáticos, Rodrigues (2009) reforça que em uma análise praxeológica: A técnica não se restringe apenas a um modo de ser realizado. Alguns conceitos devem fazer parte dos conhecimentos disponíveis do estudante para que se possa aplicar a técnica. A tecnologia existe para justificar e explicar as técnicas, e a teoria é a justificativa da justificativa, isto é, a tecnologia da tecnologia. (RODRIGUES, 2009, p.46. Grifo da autora) 69 Por outro lado, a mesma autora (RODRIGUES, 2009) enfatiza que nem sempre há constatação de tecnologia em uma análise praxeológica, ou melhor, os modos de “fazer”, ou técnicas, não indicam que o estudante efetivamente compreendeu o saber disponível na atividade. Por isso, para verificar se houve aprendizagem potencialmente significativa, deve ser constatada a tecnologia. A seguir, vejamos a Atividade 2 proposta para os estudantes. Atividade 2 – Diagonais do Pentágono Objetivos Transmitir noção de infinito; Permitir um ambiente exploratório e investigativo, por meio de construções geométricas; Proporcionar relação entre a construção geométrica e o número irracional ϕ; Possibilitar a observação de irregularidades, pelas diferentes casas decimais da razão áurea; Reconhecer e diferenciar números decimais finitos ou infinitos; Reconhecer e diferenciar números decimais periódicos e não-periódicos. Enunciado da 2a atividade DIAGONAIS DO PENTÁGONO 1) Selecione o ícone Polígono regular, marcando dois pontos na tela. Abrirá uma caixa onde colocaremos o número cinco e clique ok. O pentágono aparecerá; 2) Selecione segmento definido por dois pontos, ligando os vértices do pentágono pelas diagonais. Que figura formou? Quantas diagonais foram traçadas? Qual a figura formada no centro do pentágono? Experimente continuar, repetindo as tarefas um e dois. O que você observa? 3) Ainda utilizando esse desenho, clique em distância, comprimento ou perímetro e meça uma diagonal e uma lateral. Depois utilize inserir caixa de texto, clicando na tela, uma caixa se abrirá. Então digite: “\frac { } { }=” + (distância-- / distância--) Depois clique em latex e ok. Verifique o que acontece. 70 Propusemos a construção do pentágono e suas diagonais, a fim de verificarmos o surgimento do número de ouro, demonstrando, assim, a presença da razão áurea na figura. Em seguida, lançamos algumas perguntas para direcionar a investigação. A tarefa dessa atividade consistiu em traçar as diagonais do pentágono, utilizando o software GeoGebra, seguindo os comandos acima descritos, e responder as questões propostas. Para a realização dessa tarefa, os alunos utilizaram a técnica de traçar as diagonais ligando os pontos não consecutivos, apenas um aluno utilizou a técnica de ligar pontos consecutivos e não consecutivos. O pentágono foi escolhido pelo fato de ser um objeto matemático que propiciou, durante a história, elementos de investigação geométrica e de incomensurabilidade e, segundo Chevallard, Bosch, Gascón (2001, p.147), “[...] devemos escolher as obras matemáticas que respondam mais adequadamente a essas questões, reconstruir essas obras para adaptá-las às instituições docentes e a todas as outras”. Nessa atividade, buscamos, ainda, encontrar “a razão áurea”, dividindo a medida da diagonal do pentágono pelo seu lado, e perceber outras construções geométricas. O software Geogebra fornece-nos até quinze casas decimais, com isso, foi possível realizar a observação do resultado aproximado, com a intenção de que os alunos percebessem as irregularidades das casas decimais apresentadas e comparadas com o disposto pelas diferentes calculadoras, conforme defendem os PCN. Foi explicado aos estudantes que poderíamos continuar “infinitamente” e não saberíamos dizer qual o valor da próxima casa decimal. Acreditamos que essa percepção de infinito é fundamental para a formação do conceito de números irracionais. Nessa atividade, com relação à primeira pergunta sugerida, foi unânime a resposta: “uma estrela”. Alguns ainda acrescentaram: “tem um pentágono no meio dela, de cabeça para baixo”, conforme podemos verificar na Figura 11. 71 Figura 11 - Tela do software GeoGebra, com as diagonais do Pentágono Fonte: Dados da pesquisa A possibilidade de movimentação da tela do software facilita a percepção de que a construção será infinita, pois a figura desenhada vai ampliando, permitindo a construção de novas figuras no interior da mesma. Após a realização dessa tarefa, surgiu, por parte de alguns estudantes, o anseio de verificar o número de diagonais das diversas figuras geométricas, o que nos fez notar que o software permitiria ramificar o estudo para o ensino de outros conceitos, simultaneamente. Realizamos, então, a atividade sugerida pelos próprios estudantes. Vejamos a atividade 3. Atividade 3 – Diagonais dos Polígonos Objetivos Permitir um ambiente exploratório e investigativo pelas construções geométricas; Possibilitar a observação de regularidades; Investigar números de diagonais de diferentes polígonos regulares. A tarefa dessa atividade consiste em traçar as diagonais de diferentes polígonos, utilizando o software GeoGebra. A técnica, assim como na atividade 2, consistiu em ligar os segmentos não consecutivos dos diferentes polígonos regulares, conforme Figura 12. 72 Figura 12. Tela do software GeoGebra, com as diagonais dos polígonos Fonte: Dados da pesquisa Diante da realização dessa atividade, constatamos mais uma vez que os conhecimentos, particularmente os matemáticos, devem partir do interesse dos estudantes, tais como os autores Chevallard, Bosch, Gascón (2001) reiteram que: “[...] „a arte‟ de formular hipóteses e conjecturas que nos parecem acertadas, examinar sua validade e constatá-las, reformulá-las para obter novas hipóteses suscetíveis de serem colocadas à prova, etc. Dito de outra maneira, estamos nos referindo, aqui, àquele momento do trabalho matemático no qual uma pessoa deve saber se afastar do que se costuma considerar como a “certeza matemática”, para começar a raciocinar com o “provável ou verossímil” (Chevallard, Bosch, Gascón, 2001, p.131) Desse modo, acreditamos que essa atividade propiciou aos alunos formular e validar o estudo da fórmula do número de diagonais dos polígonos. A agilidade e a facilidade com que o desenho pôde ser realizado fizeram com que os estudantes sentissem estímulo para aumentar suas figuras e promovessem questionamentos. Descrevemos algumas falas dos alunos: — Quatro lados, duas diagonais, cinco lados, cinco diagonais..., não entendi. — Não é assim. Veja, no primeiro de cada vértice sai apenas uma diagonal: na segunda figura de cada vértice saem duas diagonais, na outra de cada vértice saem três, e vai aumentando assim. — Como liga ao outro vértice, se temos a metade das diagonais? 73 — Como assim? — Quatro lados, duas diagonais, que é a metade da quantidade de lados; cinco lados seriam dez, pois, de cada vértice saem duas, mas será a metade, então, cinco; seis lados como saem três, seriam dezoito, mas metade são nove diagonais. Sugerimos aos estudantes que organizassem um quadro para descrever as diagonais dos polígonos, Quadro 2. Quadro 2.- Diagonais dos polígonos vértices 4 5 6 7 8 9 10 N° de diagonais de cada vértice N° de diagonais do polígono 1 2 3 4 5 6 7 2 5 9 14 20 27 35 Fonte: Dados da pesquisa Propusemos a tarefa de verificar o número de diagonais de um polígono qualquer, ou seja, para o caso de n vértices, sendo n qualquer número natural. E lançamos a pergunta: “qual seria o número de diagonais de cada vértice?” Uma das técnicas desenvolvidas por um dos estudantes foi a seguinte: 4 – 1 = 3, 5 – 2 = 3, 6 – 3 = 3 então será n – 3. A discussão foi duradoura e os alunos chegaram à generalização da fórmula das diagonais dos polígonos, conforme apresentada abaixo: (62) Com essa atividade, os estudantes iniciaram a formação do conceito de função intuitivamente, pela observação de regularidades, que é fundamental para o desencadeamento do raciocínio lógico matemático. Durante a realização dessa atividade, alguns estudantes, ao traçar as diagonais, demonstraram não saber que elas deveriam ser perpendiculares, e que poderiam estar exatamente na horizontal e vertical, como é o caso do losango (na sua forma usual apresentada aos alunos). Essa foi uma descoberta. Acreditavam que, para ser diagonal, deveria haver alguma “inclinação”, um ângulo menor que noventa graus, como segmentos concorrentes. A seguir, apresentaremos a atividade 4 proposta. 74 Atividade 4 – Segmento Áureo Objetivos Permitir um ambiente exploratório e investigativo por meio de construções geométricas; Proporcionar a percepção da relação existente entre a construção geométrica e o número irracional ϕ; Criar uma nova ferramenta no software GeoGebra; Verificar a relação entre raio e diâmetro. Enunciado da 4a atividade SEGMENTO ÁUREO 1) Construa um segmento, utilizando a opção segmento definido por dois pontos (criando ponto A e B); 2) Marque o ponto médio, utilizando a opção ponto médio ou centro e, com botão direito, nomeie como ponto C; 3) Selecione a ferramenta reta perpendicular, clicando no segmento e no ponto B; 4) Selecione um círculo definido pelo centro e um de seus pontos, clicando no ponto B e no ponto C; 5) Selecione a ferramenta interseção de dois objetos e clique sobre a reta perpendicular e a circunferência, nomeando o ponto que aparecerá como ponto D; 6) Construa o segmento AD utilizando a ferramenta segmento definido por dois pontos; 7) Selecione círculo definido pelo centro e um de seus pontos, clicando no ponto D e ponto B; 8) Selecione a ferramenta interseção de dois objetos e clique sobre o segmento AD e a circunferência. Nomeie o ponto que aparecerá como ponto E; 9) Selecione um círculo definido pelo centro e um de seus pontos, clicando no ponto A e no ponto E; 10) Selecione a ferramenta interseção de dois objetos e clique sobre o segmento AB e a circunferência. Nomeie o ponto que aparecerá como ponto F; Está pronto o segmento áureo e, para comprovar, vamos medir os segmentos AB, AF, FB; 11) Clique em distância, comprimento ou perímetro e meça AB, AF e FB e, depois, utilize inserir caixa de texto com um clique na tela, quando abrirá para, então, digitar: “\frac {AB} {AF}=” + (distânciaAB / distânciaAF) “\frac {AF} {FB}=” + (distânciaAF / distânciaFB) O que você percebe? O que é o segmento BD em relação as circunferências? As três circunferências são iguais? Qual a relação entre o raio e o diâmetro? Quais figuras geométricas foram utilizadas para essa construção? A tarefa consistiu em construir o segmento áureo, utilizando o software GeoGebra, e criar uma nova ferramenta no software. A técnica utilizada para responder os 75 questionamentos foi a da observação da figura 13, visualização e intuição; alguns estudantes apresentaram dificuldades em perceber a relação entre raio e circunferência. Nessa atividade, construímos o segmento áureo para criar, posteriormente, no software, uma nova ferramenta, a qual chamaremos “segmento áureo”. Assim, em outras utilizações, em que seja necessário construir um segmento áureo, não haverá necessidade de efetuarmos todo o trabalho apresentado. Essa atividade visa a facilitar para os professores o manuseio do software; além de ter um foco utilitário, é, também, investigativo, visto que, para tal, utilizamos várias figuras geométricas, conforme Figura 13, podendo ser exploradas a relação entre raio e diâmetro, a posição das circunferências, os tipos de triângulos, as posições de retas, entre outros. Os questionamentos propostos no enunciado da atividade permitiram verificar os conhecimentos dos estudantes, no que tange aos conceitos de geometria. Figura 13 - Tela do software GeoGebra, com segmento áureo Fonte : Dados da pesquisa Para a criação de uma nova ferramenta, os estudantes não devem apagar a construção e, sim, seguir o passo a passo: clique em ferramenta e em criar uma nova ferramenta, com um clique na janela em ponto F: ponto de interseção de f, a; depois clique em próximo e novamente em próximo; aparecerá o campo nome da ferramenta, que nomearemos de ponto áureo; então clique em concluído; para que essa nova ferramenta não desapareça, selecione opções e gravar configurações. A sugestão, agora, é que se faça um segmento áureo, utilizando a nova ferramenta. 76 A figura 13, apresentada anteriormente, mostra o segmento AB, que é o segmento áureo, ficando perceptível, após a escrita das razões, o surgimento do número de ouro. 5.1.2 Atividades com Outros Recursos Atividade 5 – Número de Ouro no Corpo Humano Objetivos Permitir um ambiente apropriado para a apresentação de números irracionais; Proporcionar a possibilidade de estabelecer relação entre o corpo humano e o número irracional ϕ; Discutir medições com grandezas comensuráveis e incomensuráveis; Calcular média aritmética; Oportunizar um estudo de aproximações. Enunciado da 5ª atividade: Utilizando a fita métrica, retirem as medidas do osso maior (falange proximal) de qualquer um de seus dedos e do osso médio (falange média) do mesmo dedo, e façam anotações dos valores encontrados. Essa atividade caracterizou-se pela ludicidade, pois o estudante pôde interagir com as medidas de seus próprios dedos, conforme podemos constatar na Figura 14, abaixo. Figura 14 - Anotação dos valores das medições por um estudante Fonte: dados da pesquisa 77 Além disso, envolveu a prática de efetuar cálculos com números encontrados nas medidas do corpo humano, apontando sua convergência para o número ϕ (Phi), apesar da falta de precisão nas medições. Os materiais utilizados nessa atividade foram a fita métrica e a calculadora. Posteriormente, pedimos aos estudantes que fizessem a divisão dos valores encontrados, para uma observação de elementos comuns. Foram somados todos os resultados obtidos na divisão e o resultado dessa soma foi dividido pela quantidade de estudantes participantes, obtendo, assim, a média, cujo valor é aproximado de ϕ (Phi). Após a execução da tarefa, que consistiu em medir partes do corpo, foram lançados alguns questionamentos para a realização de uma nova tarefa: discutir acerca dos valores encontrados para segmentos com suas respectivas razões, com o intuito de que percebam a existência de grandezas comensuráveis e incomensuráveis. Em seguida, o professor foi encaminhado a dirigir a tarefa de lançar algumas questões que encaminhassem uma discussão entre os estudantes, a saber: Discuta com seus colegas as seguintes questões: 1. O que são segmentos comensuráveis e incomensuráveis? 2. Estes segmentos são expressos por números racionais ou irracionais? 3. As aproximações utilizadas nessa atividade representam números racionais ou irracionais? 4. Existe uma forma de representar os números irracionais quando efetuamos cálculos? Foi possível debater sobre a percepção da harmonia e da beleza, chegando à discussão sobre números irracionais e suas aproximações racionais. A técnica utilizada pelos estudantes foram os cálculos de média, a utilização de calculadora, as medições, o preenchimento de tabelas e as aproximações. Atividade 6 – Diagonais do Pentágono Objetivos Comparar a realização da tarefa com e sem o software Geogebra, para traçar uma análise sobre vantagens e desvantagens dos métodos utilizados; Indicar a noção de infinito; 78 Permitir um ambiente exploratório e investigativo, por meio das construções geométricas. Enunciado de 6ª atividade Figura 15. Pentágono Fonte: Dados da pesquisa 01) 02) 03) 04) 05) Trace as diagonais Qual a figura formada?_____________________________________________ Qual a figura formada no centro?____________________________________ Continue traçando as diagonais na figura central. O que você percebe?________________________________________________ A tarefa dessa atividade consistiu em traçar as diagonais do pentágono, veja a Figura 15, utilizando lápis e régua. A técnica utilizada pelo grupo foi de ligar os pontos não consecutivos, para formar os segmentos que representam as diagonais. Justificamos a realização dessa atividade devido à falta da inserção da tecnologia em muitas escolas e objetivando verificar um comparativo dos efeitos da aprendizagem e da motivação dos estudantes. Resolvemos aplicar a execução da atividade 2 sem a utilização do software. Constatamos que, assim como na atividade realizada com software, os conceitos relacionados à percepção foram alcançados, mas a visualização do software disponibiliza um elemento facilitador, proporcionando maiores questionamentos, como dúvidas entre retas e segmentos, além de permitir desenhar diversas vezes no interior do pentágono as diagonais, o que, no entanto, não acontece manualmente. 79 Atividade 7 – Dobradura Objetivos Observar a formação de figuras planas; Analisar propriedades geométricas; Permitir um ambiente exploratório e investigativo, por meio das construções geométricas; Perceber segmentos comensuráveis e incomensuráveis. Essa atividade não apresentou um enunciado, pois é interativa e prática, com o professor executando a dobradura e os alunos acompanhando-o manualmente. A justificativa que encontramos para utilizar a atividade com dobraduras foi que, além de ser um recurso interessante para a exploração das propriedades geométricas das figuras planas e espaciais, pode ser explorada a discussão sobre comensurabilidade e incomensurabilidade. A tarefa consistiu em dobrar uma folha de papel, no formato de um quadrado, seguindo as orientações do professor, realizando a divisão do segmento com a razão áurea. A técnica utilizada foi de dobraduras, que utilizaram noções de diagonais, metade e figuras geométricas. Vejamos um modelo pela Figura 16: Figura 16 - Dobradura do ponto áureo Fonte: Dados da pesquisa Para essa atividade, utilizamos papel no formato de um quadrado, branco ou colorido e marcamos o ponto que delimita a maior e a menor parte do segmento áureo das dobraduras. Apresentamos o passo a passo da atividade, em quatro modelos, conforme Figura 16. Primeiramente, divida o quadrado ao meio, de modo a obter dois retângulos iguais, e marque a diagonal (AC) do retângulo inferior (Modelo I); depois dobre o menor lado do triângulo retângulo (lado BC) sobre a diagonal marcada (Modelo 2). Sem desdobrar o anterior, dobre o 80 lado AD sobre a diagonal (Modelo III) e transponha o ponto B, marcando o Ponto I; desdobre, e teremos o segmento áureo AB (Modelo IV). Atividade 8 – Investigação da Questão da OBMEP (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas) - 2011 Objetivos Reconhecer figuras planas; Analisar propriedades geométricas; Permitir um ambiente exploratório e investigativo, por meio das construções geométricas; Permitir observação de semelhança; Perceber segmentos comensuráveis e incomensuráveis; Utilizar o Teorema de Tales; Relacionar a construção geométrica a números irracionais. Vejamos, a seguir, o enunciado da 8ª atividade, expresso pela Figura 17: Enunciado da 8ª atividade Figura 17 - Questão da OBMEP 2011 Disponível em: <http://www.obmep.org.br/provas.htm>. Acesso em: 27 ago. 2011 Essa atividade permitiu a tarefa de investigar uma questão da prova das Olimpíadas Brasileiras de Matemática para as Escolas Públicas, OBMEP, que foi realizada nas escolas no dia 17 de agosto de 2011. Essa questão envolveu, na sala de aula, várias figuras desenhadas, como a apresentada na questão acima; dividimos os grupos e trabalhamos a resolução da questão, usando recortes dos triângulos DAE e BEF. A técnica utilizada foi a de sobrepor os 81 recortes dos triângulos semelhantes no retângulo dado e montar proporções. Vale ressaltar que nem sempre a visualização da semelhança entre os triângulos fica “clara” para os alunos Os estudantes observaram que as medidas dos lados AD e EF são iguais a 1cm, isto é, AD = EF = 1 e BE era desconhecido, o qual foi atribuído ao valor x. Consequentemente, AE = 1 + x. Com o manuseio das figuras, ficou fácil a visualização da semelhança dos triângulos e a aplicação do Teorema de Tales, para chegar à solução da incógnita, usando a equação quadrática. Segundo a organização Praxeológica de Chevallard (1999), podemos afirmar que os estudantes, quando apresentaram a tecnologia, usaram as proporções e, posteriormente, chegaram à resolução de equação, pela fórmula de Bhaskara. Com essa atividade, associamos a forma geométrica e algébrica da razão áurea. 5.2 ATIVIDADES COM OUTROS IRRACIONAIS A seguir, apresentaremos algumas atividades envolvendo outros irracionais. 5.2.1 Atividades com software GeoGebra Atividade 9 – Construção de Números Irracionais Objetivos Reconhecer figuras planas; Analisar propriedades geométricas; Propiciar um ambiente exploratório e investigativo, por meio das construções geométricas; Permitir observação de semelhança; Perceber segmentos comensuráveis e incomensuráveis; Utilizar o Teorema de Tales; Relacionar a Construção geométrica a números irracionais; Realizar aproximações. A seguir, vejamos o enunciado da nona atividade. 82 Enunciado da 9ª atividade CONSTRUINDO RAÍZES IRRACIONAIS COM O GEOGEBRA 1) Utilize o eixo e faça um semicírculo definido por dois pontos distintos, marcando suas extremidades nos pontos 0 e 7; 2) O próximo passo é traçar uma reta perpendicular em relação ao eixo das abscissas, na coordenada do ponto D(1,0). Para isso, é preciso fazer um segmento sobre o eixo, ligando A e B: marque o ponto médio C desse segmento. Faça uma reta sobre o eixo das abscissas: selecione reta perpendicular, clique no ponto D e na reta que está sobre a abscissa. 3) Faça o ponto E da interseção entre a reta perpendicular à abscissa e ao semicírculo. 4) Trace um segmento ligando o ponto A até E e teremos o valor da 7 , quando efetuarmos a medida do segmento AE, cuja aproximação de duas casas decimais será 2,65. O Geogebra permite aproximação em até 15 casas decimais A tarefa dessa atividade consiste em construir geometricamente as raízes irracionais, conforme Figura 18 abaixo, utilizando o software GeoGebra, e fazer o uso simultâneo de diferentes calculadoras, para traçar um comparativo das aproximações obtidas, conforme indicado pelos PCN: “Ao trabalhar com essas aproximações, é interessante usar diferentes calculadoras e informar aos alunos a respeito dos cálculos que são feitos em computadores de grande porte”. (BRASIL, 1998, p.107) A técnica utilizada para realizar a tarefa foi a semelhança de triângulos e proporção, apresentando, por parte dos estudantes, o discurso da tecnologia do Teorema de Tales e, por outros, o Teorema de Pitágoras. 83 Figura 18 - Tela do software GeoGebra, com construção de números irracionais Fonte: Dados da pesquisa Simultaneamente, com a realização da construção das raízes, por meio do GeoGebra, os estudantes utilizaram as calculadoras. Para verificar a veracidade das respostas, foi despertada a curiosidade de construir outras raízes irracionais, e assim surgiu dentre o grupo a curiosidade de saber “por que” sempre dava certo. Reportamo-nos à descoberta da raiz de dois, que foi encontrada geometricamente pelo Teorema de Pitágoras. Já o estávamos fazendo antes, mas com a contribuição do uso do software. Os estudantes verificaram atentamente a construção feita no GeoGebra (Figura 18) e perceberam que, no triângulo ADE, poderiam trabalhar o Teorema de Pitágoras: (AE)² = (AD)² + (DE)² (63) Visualizaram a medida AD no eixo das abscissas, que é 1, e a medida DE no eixo das ordenadas, que se aproxima de 2,5. Também foi possível concluir que DE tem a medida de 6. Os estudantes experimentaram, também, utilizar o Teorema de Tales, observando a semelhança entre os triângulos AEB e ADE, retângulos em E e D respectivamente, efetuando, assim, a seguinte operação: x 7 AE AB , pois, 1 x AD AE (64) 84 Atividade 10 – Localização de Números Irracionais na Reta Real Objetivos Permitir um ambiente exploratório e investigativo, por meio das construções geométricas; Perceber segmentos comensuráveis e incomensuráveis; Perceber o número irracional como um ponto para preenchimento da reta; Localizar um número irracional entre dois números racionais; Relacionar a Construção geométrica a números irracionais. A tarefa consiste em marcar na reta real as raízes irracionais e localizar os números irracionais, utilizando o software GeoGebra. Propusemos aos estudantes que transferissem as raízes irracionais, em estado de investigação na atividade 9, para a reta real (eixo das abscissas), a fim de localizarmos entre quais números racionais estariam-nas. Construímos, no software, os seguintes números, representando as raízes: 4, 5, 6 e 7 , conforme Figura 19 abaixo e, para marcá-las na reta, utilizamos a ferramenta compasso. O símbolo do radical da raiz 4 , apesar de não ser um número irracional, foi aprensentada assim intencionalmente, com o intuito de que os estudantes percebessem a exatidão de seu valor, traçando um comparativo. Figura 19 - Tela do software GeoGebra, com localização de números irracionais Fonte: Dados da pesquisa 85 A técnica utilizada agora foi ensaio e erro, tentando encontrar valores racionais mais próximos possíveis das raízes em estudo, conforme as Figuras 20 e 21 abaixo, realizada pelos estudantes A e B, respectivamente, ao “[...] efetuar cálculos com os irracionais por meio de aproximações racionais. Nesses casos apresenta-se uma situação apropriada para tratar o conceito de arredondamento e utilizar as calculadoras”. (BRASIL, 1998, p.107) Figura 20 - Arredondamento e aproximações das raízes irracionais (Estudante A) Fonte: Dados da pesquisa 86 Figura 21. Arredondamento e aproximações das raízes irracionais (Estudante B) Fonte: dados da pesquisa A fim de desestabilizar a exatidão matemática criada pelos estudantes, lançamos alguns questionamentos, como: Existe um número racional que serve como resposta para uma raiz irracional? Podemos escrever um número irracional que não seja na forma da representação de raiz? Alguns alunos responderam que sim, outros não e entre eles surgiu um questionamento: - Como vamos escrever um número infinito? Sempre vamos parar de escrever. Para contribuir com a análise dos estudantes, sugerimos que eles calculassem a 7 em diferentes mecanismos, calculadoras, celulares e computador; os estudantes fizeram as anotações, conforme um exemplo ilustrado pela Figura 22. 87 Figura 22 - Resultados da 7 em diferentes mecanismos Fonte: dados da pesquisa Esse estudante, Figura 22, apresenta cinco resultados distintos para, então, chegar a um valor mais aproximado de 7. Atividade 11 – Percepção do Infinito Objetivos Permitir um ambiente exploratório e investigativo, por meio das construções geométricas; Permitir a percepção de infinito; Verificar características e propriedades de polígonos regulares; Relacionar a construção geométrica de números irracionais. Enunciado da 11ª atividade PERCEPÇÃO DO INFINITO 1) Escolha o ícone polígono regular e clique na tela, marcando dois pontos. Logo em seguida, abrirá uma caixa, para colocar o número de lados do polígono desejado (ex: 4), e clique ok. Assim feito, aparecerá uma figura; 2) Escolha o ícone ponto médio ou centro. Clique nos dois vértices dos lados do quadrado, marcando quatro pontos médios; 3) Escolha o ícone polígono regular e clique nos dois pontos médios, o primeiro e o último feitos anteriormente; 4) Continue, repetindo os passos anteriores. O que você percebe? 5) Experimente fazer o mesmo com outros polígonos regulares. Por exemplo, faça um pentágono. 88 A tarefa dessa atividade consiste em desenhar sucessivos polígonos regulares inscritos uns no interior dos outros (Figura 23), utilizando o software GeoGebra. A técnica utilizada está relacionada a polígonos regulares, ponto médio e formas geométricas. Essa atividade tem a intenção de fornecermos uma melhor percepção do infinito, tema polêmico, o qual contribui diretamente com a ideia da representação decimal dos números irracionais, uma vez que possui uma quantidade infinita de casas decimais não periódicas. Figura 23 - Tela do software GeoGebra, com infinitos quadrados Fonte: Dados da pesquisa Nessa atividade, os estudantes fizeram alguns comentários bastante significativos, como: — Professora, eu nunca vou acabar de desenhar. Vai ser infinito. — Formamos um quadrado e um losango, sempre assim, então o quadrado é um losango. — Mas losango pode ser feito em um retângulo, nem todo losango é um quadrado, mas o quadrado é um losango? Alguns estudantes questionaram por que deveriam utilizar o ícone polígono regular e não polígono apenas. Então, foi lhes sugerido que desenhassem com essa ferramenta, para investigarem o que aconteceria. — Por que não consigo desenhar? 89 Discutimos as características do quadrado, pois os estudantes apenas levaram em consideração os quatro lados iguais, sem a preocupação com os ângulos internos, que deveriam ser de noventa graus cada um. Atividade 12 – Densidade através de um Segmento Objetivos Discutir a infinidade de elementos de um conjunto numérico; Observar geometricamente a infinidade de elementos de um conjunto numérico; Diferenciar infinidade de continuidade. Enunciado da 12ª atividade Agora que você já sabe manusear o software GeoGebra, exiba o eixo cartesiano, trace um segmento de qualquer tamanho sobre o eixo das abscissas e cubra esse segmento com pontos (Figura 24). Figura 24. Tela do software GeoGebra, com segmento de reta parcialmente coberto por pontos Fonte : Dados da pesquisa Após os estudantes terem preenchido todo o segmento com pontos, pedimos que fizessem a movimentação da tela do software (Figuras 24 e 25). Então questionamos: o que aconteceu? Vamos conseguir cobrir esse segmento com pontos? Por quê? 90 A tarefa dessa atividade consistiu em cobrir um segmento de reta qualquer por pontos. Figura 25. Tela do software GeoGebra, após rolamento distanciando os pontos executados sobre o segmento Fonte : Dados da pesquisa Segundo Caraça (1951, p.56, Grifo do autor), “a suposição de que o ponto geométrico não tem dimensões, leva imediatamente a admitir que, entre dois pontos quaisquer A e B da recta, existe sempre uma infinidade de pontos, e isto por mais próximos que A e B estejam um do outro”. Podemos, assim, nessa atividade, verificar que entre dois pontos distintos de uma reta há uma infinidade de pontos, o que de fato, facilitou-se pela visualização e pela prática da correspondência de cada ponto a um único elemento de um conjunto numérico. Quanto à questão da continuidade, “a recta ultrapassa, em riqueza interior de estrutura, esse simples variar gradualmente, sem saltos, sem, como habitualmente se diz, soluções de continuidade”. (CARAÇA 1951, p.57) A atividade possibilitou a discussão de que o contínuo pode ser infinito ou não e que o infinito não é necessariamente contínuo. Essa atividade não teria o mesmo efeito caso fosse realizada com lápis e papel, daí a importância da utilização do software. Atividade 13 – Raízes das Funções da Família dos Números Metálicos Objetivos Analisar os gráficos de funções; Perceber que não há um ponto exato que expresse as raízes irracionais das funções; 91 Observar a qual intervalo pertence um número irracional. Enunciado da 13ª atividade Plote as funções do número de ouro, de prata e bronze e responda: a) Qual o coeficiente que está sendo alterado? b) O que acontece com os gráficos? c) Em qual ponto todos os gráficos cortam o eixo y? d) Esse ponto tem alguma relação com algum dos coeficientes? e) Quais são as raízes dessas funções? f) Utilizando o GeoGebra, conseguimos encontrar um número que expresse essas raízes? Por quê? Nessa atividade, a tarefa proposta consistiu em plotar funções com o software, cujas raízes são números irracionais, pertencentes ao grupo da família dos números metálicos. A técnica relacionou-se apenas ao manuseio do mouse, para execução do rolamento do eixo cartesiano, além da realização do cálculo das raízes das funções, usando a fórmula de “Bhaskara”. Para tal, os estudantes escreveram as funções no campo Entrada, que se encontra na parte inferior da tela do software GeoGebra, conforme Figura 26, e apertaram enter no teclado do computador; automaticamente os gráficos aparecem. Pedimos aos estudantes que, para responder a letra f da atividade, realizassem o rolamento da tela, com o uso do mouse, alterando a numeração do eixo das abscissas, a fim de procurar um ponto na reta da abscissa que apresentasse uma representação decimal exata das raízes irracionais. Figura 26 - Tela do software GeoGebra, com gráfico das funções Fonte: Dados da pesquisa 92 A movimentação do software permitiu que os estudantes percebessem o intervalo pelo qual o ponto se encontra vai reduzindo infinitamente, até que concluíssem por conta própria que não haveria uma representação decimal exata. 5.2.2 Atividades com Outros Recursos Atividade 14 – Trabalhando Número em Figuras Circulares Objetivos Perceber o número π como razão do comprimento da circunferência e seu diâmetro; Discutir a diferença entre fração e razão; Discutir a diferença entre círculo e circunferência. Essa é uma atividade prática, por isso não apresenta um enunciado propriamente dito, sendo realizada de forma oral e interativa. Buscamos, nessa atividade, a tarefa de medir e observar a relação ou razão entre o comprimento da circunferência e o diâmetro de cada figura circular. Nesse experimento prático do número π, teve-se o cuidado especial para que não fosse confundido com um número racional, visto que, para a realização dessas medições, os valores encontrados são números decimais aproximados. Material utilizado: a- tesoura b- régua c- barbante d- objetos de forma cilíndrica (lata de refrigerante, lata de salsicha e outros) e- calculadora Os estudantes realizaram a tarefa de medir em duplas. Consistiu em contornar os objetos com o barbante, obtendo, assim, o comprimento da circunferência. Posteriormente, era retirada a medida da base do objeto, com barbante, ou seja, o diâmetro. A técnica utilizada pelas duplas foi a divisão das medidas da circunferência pela medida do diâmetro, encontrando valores aproximados ao número irracional π. Na sequência, abrimos uma discussão para apresentar como são realizados esses cálculos no cotidiano do profissional de engenharia, como são utilizadas as aproximações, a 93 fim de minimizar as margens de erro, e lançamos o seguinte questionamento: é possível o engenheiro utilizar o número π sem aproximações? Após o debate, os estudantes demonstraram percepção de que o número irracional pode ser muito mais a ideia do que a representação em si. Pedimos que escrevessem suas definições, como, por exemplo, dada por uma estudante conforme a Figura 27, e percebemos que eles, agora, iniciaram um processo de tecnologias para as atividades sobre números irracionais. Figura 27. Definição dos números irracionais por uma estudante Fonte: Dados da pesquisa O comentário ilustrado por um dos estudantes, Figura 27, aponta a importância de iniciar os estudos dos números irracionais a partir de suas ideias para que, posteriormente, possa ser apresentado o conceito propriamente dito. Atividade 15 – Contando História Para refletir sobre o tópico dos números racionais e buscar a compreensão de que os números são infinitos, podemos utilizar uma adaptação da história de “Hércules e a Tartaruga14": 14 BAHIANO, Carlos E. N. Números Racionais e Irracionais. Instituto de Matemática. Universidade Federal da Bahia. Disponível em: <http://miltonborba.org/OBMEP/APOST_3-Racin_Irrac.pdf>. Acesso em: 24 out. 2011. 94 Hércules e a tartaruga Hércules era um grande atleta da Grécia antiga. Um dia encontrou uma tartaruga, que descansava embaixo de uma árvore a 100 metros de onde ele se encontrava. Hércules gritou: “Boa tarde, tartaruga, como vai?”. Mas a tartaruga não respondeu. Hércules, então, pensou que a tartaruga era surda e aproximou-se cuidadosamente, percorrendo cinquenta metros, ou seja, a metade do caminho. E gritou novamente: “Boa tarde, tartaruga?” Mas ela nada respondeu. Hércules continuou caminhando, e andou vinte cinco metros, a metade do caminho restante. Mesmo assim a tartaruga nada respondeu. Hércules continuou caminhando em direção à tartaruga, sempre andando a metade do caminho. Pergunta-se: Depois de quantas etapas Hercules alcançará a tartaruga? Observe os valores de quantos metros Hércules caminhou até então, Figura 28: Figura 28 – Percurso de Hércules, em metros 50 25 12,5 6,25 3,125 1,5625 0,78125 0,390625 0,1953125 0,09765625 0,048828125 0,0244140625 0,01220703125 0,006103515625 0,0030517578125 Fonte: Dados da pesquisa 95 Somando-se todos esses valores, para saber quanto Hércules andou, encontramos: 99,896948247813, mas poderíamos continuar, já que haverá um número menor. Percebemos a infinidade de valores e que eles serão os números racionais. Atividade 16 – Apresentação dos Números Racionais e Irracionais Geometricamente Acreditamos que essa atividade foi a que melhor apresentou um diferencial entre os números racionais e irracionais de forma significativa. A atividade consiste em fazer um retângulo de lado correspondente às medidas do numerador e denominador da fração que se quer identificar como um número racional ou não. Caso seja inteiro ou um número irracional, para a realização dessa atividade, utilizaremos um como denominador, a fim de obter duas medidas. Exemplo: o número inteiro 2 2 2 4 ......... a fração ..... o número irracional 7 1 2 . 1 A figura abaixo, Figura 29, representa a fração de numerador 4 e denominador 7, sendo 7 a base (maior medida) do retângulo, e 4, a altura (menor medida). Começamos fazendo um quadrado com a menor medida, e continuamos fazendo sucessivos quadrados, sempre com a menor medida, verificando quantas vezes o quatro cabe no sete e, assim, sucessivamente, com as medidas que sobram. Figura 29 - Representação geométrica de um número racional Fonte: Dados da pesquisa 96 Nesta segunda figura representada a seguir, Figura 30, seguimos o mesmo procedimento, manualmente e obrigatoriamente com a utilização do compasso. Figura 30 - Representação geométrica de um número irracional Fonte: Dados da pesquisa A tarefa consiste em transformar os números dados em medidas dos lados de um retângulo e medir quantas vezes o menor lado do retângulo caberá no maior, formando quadrados de modo sucessivo, até que o procedimento termine, ou não. A técnica utilizada é a das divisões sucessivas com algoritmos e representações geométricas. Conclusão: quando o número for racional, conseguiremos preencher “totalmente” o retângulo com quadrados, e quando o número for irracional, ocorrerá uma “sobra” com a figura de um retângulo no interior do retângulo maior. Para o desenvolvimento dessa atividade, entregamos folha de papel A4 para a confecção de retângulos, cujas medidas são valores numéricos na ordem de números inteiros racionais ou medidas de valores irracionais obtidos pela diagonal do quadrado. Veja um exemplo de como fora realizada por um estudante na Figura 31. 97 Figura 31 - Trabalho de representação geométrica realizado por um estudante Fonte: dados da pesquisa Esta atividade pode ser desenvolvida, também, com o software Geogebra, apesar de apresentar certo grau de dificuldade para desenhar, o que pode fazer com que a ideia principal da finitude, ou não, do processo se perca. Justificando a atividade15 Figura 32. Representação geométrica de um número racional com incógnitas Fonte: dados da pesquisa 15 Encontramos justificativa para essa atividade baseada nos estudos do Algoritmo de Euclides e algoritmo da divisão (SANTOS, 1998), conforme demonstrações do anexo C. 98 y r x x n r y = nx + r x= (63) r+ (64) r r= + (65) Caso as grandezas sejam comensuráveis em um determinado momento, teremos resto zero e, assim, o processo será finito, pois: = 0 +0 (66) Então; (67) Caso as grandezas sejam incomensuráveis, continuaremos as divisões sucessivas infinitamente, pois teremos sempre uma medida r, que caberá n vezes em outra medida qualquer, restando sempre um segmento qualquer. Mas, como saber se o processo é realmente infinito? Para responder esta pergunta, buscamos provar a semelhança das figuras, tal como apresentada na Figura 33. 99 Demonstração de semelhança dos retângulos Figura 33. Representação geométrica de um número irracional para demonstração de semelhança Fonte: dados da pesquisa Para finalizar esta tarefa utilizamos a técnica do Teorema de Tales. Assim, temos que: (68) (69) = (70) ( = (71) Como os resultados são iguais, significa que os retângulos são semelhantes, assim, o processo será infinito, caracterizando um número irracional. 100 6 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Para a realização de nossa pesquisa, após sua autorização pela direção da instituição escolhida, preocupamo-nos em como seria escolhido o grupo de trabalho. A fim de não haver nenhum tipo de discriminação ou escolhas por afinidade, resolvemos colocar cartazes nos murais da escola, convocando voluntários para a pesquisa. No aviso que foi anexado ao mural, informamos antecipadamente o dia (segunda-feira) e o horário (pela manhã) dos encontros, com o respectivo número de vezes em que seriam realizados. e data para o início. Como nessa escola funciona um posto de tecnologia educacional 16, que oferece cursos para professores e estudantes, foram-nos disponibilizados dois ambientes: uma sala de aula e uma sala de informática. No primeiro encontro, que ocorreu em primeiro de agosto de 2011, passamos um questionário (Anexo B), para traçar o perfil social e acadêmico dos participantes, o que, atrelado ao desenvolvimento das atividades, propiciou-nos tirar algumas conclusões. Dos doze voluntários da pesquisa, nove eram do sexo feminino. Esse alto percentual, 75% do total, já era esperado, tendo em vista que há maior número de meninas nessa escola. A faixa etária variou de 14 a 18 anos, entre os estudantes. Dentre os participantes, contamos com uma professora17, já experiente, que atua como orientadora tecnológica em uma escola também da rede estadual. Desse universo, apenas a professora tem filhos e, em geral, os estudantes residem com seus familiares. No âmbito acadêmico, com exceção da professora citada, o grupo era formado por estudantes que se encontravam matriculados no curso de formação de professores dos anos iniciais e pertenciam ao Ensino Médio18, sendo a maioria do primeiro ano. Mais de 80% dos participantes diziam gostar de Matemática e nunca estiveram retidos em nenhum ano escolar. Isso nos chamou a atenção, com relação ao interesse dos estudantes, conforme se referem Chevallard, Bosch e Gáscon (2001), já citados anteriormente. Quanto a terem dificuldades relacionadas à aprendizagem da Matemática, o grupo dividiu-se pela metade. Todos os 16 PTE – IESK (Posto Tecnológico Educacional do Instituto de Educação Sarah Kubitschek), o posto faz parte do Programa Nacional de Informática na Educação (PROINFO), que foi desenvolvido pela Secretaria de Educação à Distância (SEED) do Ministério da Educação (MEC), em parceria com o governo do Estado do Rio de Janeiro, e tem como objetivo introduzir novas tecnologias de informação e comunicação nas Escolas Públicas, como apoio ao processo de ensino e de aprendizagem. 17 Esta voluntária obteve a informação sobre a pesquisa através de uma das professoras do posto de tecnologia educacional. Justificou seu interesse por conta de sua função naquela escola, visto que seria uma chance de aprimorar seus conhecimentos. 18 Apesar de ser Ensino Médio, o curso tem duração de quatro anos, conforme já comentado no início deste trabalho. 101 estudantes responderam que acham a matéria importante para sua formação profissional, com exceção da professora participante. Quanto à escolha pela profissão, aproximadamente 67% responderam que a procuraram por vocação. Os demais apresentaram a questão da indecisão, obrigações com o provimento da família e falta de opção. Quando questionados sobre o conhecimento prévio do assunto de que trataríamos, apenas um estudante afirmou não ter estudado os números irracionais. Traçamos, assim, um perfil geral do grupo: pessoas que possuem apoio e influência familiar positiva para o estudo e almejam crescimento acadêmico e financeiro. Veem nos estudos uma forma de alcançar melhoria de vida. São estudantes estudiosos e aplicados, que já tinham vivenciado uma relação com o conteúdo da pesquisa; mesmo assim, quando foram reconhecer os números irracionais, marcando os que eles conheciam, nenhum teve um total de acerto, o que nos leva à questão inicial de que o estudante não sabe identificar quais são os números irracionais. Mais interessante ainda foi quando questionou-se ao grupo sobre o que eram os irracionais e onde eram utilizados. Surgiram as mais diversas respostas, como, por exemplo, a resposta abaixo, Figura 34. Figura 34 – Resposta de um estudante sobre os números irracionais Fonte: Dados da pesquisa Observando a resposta do estudante, Figura 34, que afirmou serem os irracionais números inteiros e fracionários, e relacionou-os a medidas, acreditamos que tais considerações possam ser resquícios de apresentações dos professores em séries anteriores, visto que, em geral, essa ideia é associada à incomensurabilidade, como na relação da medida do lado e da diagonal do quadrado, o que pode corroborar com nossa crença de que conhecimentos de geometria contribuem para a aprendizagem dos números irracionais, mas o professor deve em suas abordagens ter cuidado para não passar uma visão equivocada. Outro aspecto importante, segundo Chevallard, Bosch e Gáscon (2001), que defendem o êxito na aprendizagem quando há interação entre velhos e novos conhecimentos. 102 Vejamos outro exemplo de resposta para o mesmo contexto, Figura 35: Figura 35 – Outra reposta para os números irracionais Fonte: Dados da pesquisa. A Figura 35 apresenta uma resposta contraditória de outro estudante, quando afirma não se lembrar do que são números irracionais, mas, ao mesmo tempo, dizer que os utiliza sempre. Observamos que apenas um estudante não reconheceu (pi) como número irracional, o que nos leva a conjecturar que, mesmo sem ocorrer a apropriação do significado da ideia do conceito dos irracionais, alguns estudantes, devido à utilização e ao treino, provavelmente das atividades relacionadas a cálculos de geometria, assimilaram a representação simbólica e associaram-no aos irracionais. Tal análise de resultados com relação ao número irracional (pi) não nos surpreendeu, já que ele é um dos números irracionais mais utilizados desde o 5º ano do Ensino Fundamental das séries iniciais, quando o professor inicia área de figuras circulares. Os estudantes, de tanto visualizarem o símbolo, reconheceram-no como irracional. O oposto ocorre com o número irracional (phi), pois apenas um estudante reconheceu-o como número irracional. Nesse contexto, (pi) significa alguma coisa, um número irracional, em outras palavras, (pi) é a mesma coisa que um número irracional; a princípio, é meramente representacional, uma relação entre o símbolo e o conjunto, mas na medida em que esse conceito de número irracional for formado, a aprendizagem terá significado e poderá se estender a outros. Apesar do reconhecimento de (pi), conjecturamos que nossos estudantes não têm uma aprendizagem do verdadeiro conceito dos números irracionais, caso contrário, haveriam generalizado e se estendido aos demais números irracionais. Eles reconhecem a representação como um número decorado, mas sem o seu significado ou, o que pode ser pior, com um significado errôneo. 103 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS Uma das dificuldades na compreensão do conceito dos números irracionais pode estar relacionada ao caráter meramente utilitário com que é transmitida a Matemática. Nota-se que há uma não aceitação do estudo desse conceito, por parte dos estudantes, visto que é preciso um esforço na habilidade de abstrai-lo. Para os estudantes, o conceito de números irracionais parece fugir à realidade e à necessidade, ao aplicá-lo em suas vidas. E por que aprender algo que não será utilizado e que parece ser tão desnecessário? Observamos que, para os estudantes, é relevante a Matemática focada na questão do uso concreto de seus rudimentos, o que a torna sem sentido, quando o ensino os ultrapassa. Isso deixa o aprendizado sem fundamento, contribuindo para as dificuldades criadas pela não aceitação, pois, como aprender o que não vejo como necessário? Percebemos, ainda, que muitos estudantes teceram considerações acerca dos anos iniciais do Ensino Fundamental, quando eram considerados “bons” em Matemática e, a partir do sexto ou sétimo ano, iniciaram os problemas e as dificuldades nessa área do conhecimento. Fundamental, para eles, parecem ser apenas as quatro operações. Ouvimos, enquanto professores, frequentemente, argumentos como: “para que eu vou aprender isso?”. Outros apresentam suas respostas focadas em uma busca de formação acadêmica, como possível melhoria de vida “financeira” que o estudo poderia lhes proporcionar. Nessa direção, dizemos que buscar a educação para resolver problemas econômicos é uma questão cultural do povo brasileiro. E tudo isso parece ser muito conveniente quando tratamos de um país capitalista, onde reproduzimos um modelo educacional que privilegia apenas um pequeno grupo, a elite. Será que não podemos transformar esse cenário? Qual o papel do professor de Matemática em tal processo, enquanto sujeito capaz de melhorar o mundo? Apesar dessas questões não serem inéditas, parecem ser inesgotáveis, já que percebemos que é conveniente essa divisão da sociedade que preza demasiadamente o “conteúdo”; quando o importante é o conhecimento e o saber, enquanto evolução histórica. Por isso, acreditamos que ensinar Matemática deve ultrapassar a lógica que favorece apenas uma minoria, sendo aquela que estimula a lógica do prazer, do desafio, da observação, do desejo pela descoberta e do sentido para a vida. Consideramos serem esses os primeiros desafios para o ensino e a aprendizagem desses aparentes “desnecessários” números. Outro aspecto que consideramos problemático é a questão da busca de uma representação para os números irracionais. Como representá-los sem confundir os estudantes? 104 Em geral, o aluno quer ver o número escrito, mas essa prática reporta-nos a aproximações, ou seja, aos números racionais. É notória a apresentação em forma de radical, já que é mais aceita e incorporada ao contexto deles. Mas não podemos limitar o ensino dos números irracionais a isso. Acreditamos ser positivo produzir atividades que propiciem a percepção do infinito. Quando o professor fala em (pi) ser um número infinito, escreve uma igualdade que se limita a 3,14, apesar de utilizar a palavra aproximadamente; como consequência, cria-se uma grande confusão mental nos estudantes. Assim, faz-se necessária maior preocupação com a formação de conceitos, por isso indicamos apresentar os números irracionais relacionados à questão da incomensurabilidade, pois, dessa forma, o estudante percebe que cada casa decimal acrescida a esse número será um algarismo diferente e imprevisível, produzindo a percepção do conceito dos irracionais. Após o desenvolvimento de todo esse trabalho e respectiva aplicação das atividades, gerou-se um produto final, no sentido de proporcionar meios para que os estudantes sejam motivados a buscar a construção dos conceitos dos números irracionais. Ficamos convencidos de que grande parte da dificuldade em compreender o significado dos números irracionais está na má apropriação do significado desse conceito. Sem conhecer bem os números racionais, como conceber a ideia tão abstrata e intuitiva dos irracionais? O pouco tempo destinado ao ensino dos números irracionais também contribui para reforçar ainda mais as limitações no processo de aprendizagem. Por isso, corroboramos com os teóricos, já citados anteriormente, que consideram a atuação do professor essencial, bem como a natureza das atividades, pois são elementos fundamentais para formação e aprendizagem. Nesse contexto, as atividades propostas pelo professor podem instigar o estudante à investigação e à exploração de novas descobertas, dando sentido para maior aceitação e formação de conceitos que se deseja ensinar. Em especial, para os números irracionais, a história do surgimento, a crise e toda problemática, em torno desses “estranhos” números poderá permitir a percepção da necessidade desses números para o desenvolvimento da sociedade, não só na Matemática, como na Física e ciências em geral. Portanto, defendemos que a inserção da razão áurea no ensino dos números irracionais pode ser uma forte aliada na busca necessária pelo prazer das descobertas; um elemento importante, que pode propiciar a abstração e a percepção da existência de números infinitos e não periódicos. 105 Talvez, pensando em uma Matemática utilitária, tivéssemos o seguinte questionamento: para que serve essa “Razão Áurea”? E responderíamos: para nada, visto que há grande polêmica em sua forma de aparecer naturalmente ou uma busca em encontrá-la em tudo, fomentando uma discussão que possivelmente proporcionará um ambiente investigativo e de estudos. Acreditamos ser interessante vê-la surgir na natureza, no corpo humano, indicando-nos uma Matemática que é o produto da imaginação e inteligência humana. Dessa forma, humaniza-se a produção de conhecimentos matemáticos ao longo da história da espécie humana: acontecimentos passados e sonhos futuros interagindo, para a formação do presente. Com o desenvolvimento dessa pesquisa, verificamos que é preciso, para a formação do conceito dos números irracionais, traçar um foco histórico, a fim de alicerçar o ponto de partida e compreensão de que a existência desses números não surgiu do “nada”. Foi possível, ainda, perceber a problemática existente no estudo das figuras geométricas, a falta de conhecimento das suas características e propriedades. Atribuímos essa razão à falta da prática do desenho geométrico inserido nas aulas de Matemática ou de Geometria. Percebemos que o próprio Currículo Mínimo indica o ensino de conceitos e teorias, não enfatizando a prática. Fica claro que um objeto matemático, como os números irracionais, permite grande variedade de abordagens e relações com outros conhecimentos, o que vai repercutir na prática pedagógica de sala de aula, para a ocorrência de uma aprendizagem significativa. 106 REFERÊNCIAS BORBA, M. de C.; PENTEADO, M. G. Informática e Educação Matemática. 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( ) 1º ano ( ) 2º ano ( ) 3º ano 06) Você já ficou retido em algum ano escolar? ( ) Sim ( ) Não Qual? _________ 07) Você já ficou em dependência em alguma disciplina? ( ) Sim ( ) Não 08) Qual? Em que ano escolar?___________________________________________ 09) Por que você escolheu o curso de formação de professores? ( ) vocação ( ) Não havia outra opção ( ) Foi obrigado pelos familiares. Quem?______________________________ ( ) É a escola mais próxima de sua casa ( ) Outros_______________________________________________________ 10) Você gosta de matemática? ( ) Sim ( ) Não 11) Você tem dificuldade em matemática? ( ) Sim ( ) Não 12) Você acha matemática importante? ( ) Sim ( ) Não 13) Você já estudou o conjunto dos números irracionais? ( ) Sim ( ) Não 14) Para você o que são números irracionais?______________________________ 15) Para que servem os números irracionais?______________________________ 16) Marque os números irracionais que você conhece? ( ) 5 ( ) 2,56472 ( ) 1,967342..... ( ) 2,343434.... ( )¼ ( ) ( ) 112 ANEXO C Fonte: Santos (1998, p. 4 e 8)