dezembro • 2007 CIRCUNFERÊNCIA ABDOMINAL: ENFOQUES DO ENCONTRO SOBRE PESQUISA EPIDEMIOLÓGICA Paulo Aligieri • Secretário executivo da Sociedade Brasileira de Medicina Farmacêutica - SBMF No Encontro Multidisciplinar Bimestral realizado pela SBMF em 11/12/2007, no auditório do Sindusfarma, com patrocínio da EUROTRIALS, foram comentados estudos epidemiológicos e sua importância em diversos tipos de investigação como, por exemplo, para definir as etapas do curso de uma doença ou esmiuçar os fatores que intervêm no prognóstico ou qualidade de vida do paciente e opções terapêuticas (incluindo avaliação de sua efetividade, segurança, praticidade e custos). Abaixo seguem algumas anotações sobre os conceitos apresentados no evento mas, antes, leia um resumo de um dos mais importantes estudos epidemiológicos recentes e que revelou aspectos importantes sobre o risco cardiovascular. Um estudo com 168.000 pacientes, distribuídos em 63 países Adiposidade abdominal tem sido reconhecida como tema importante não só do ponto de vista clínico como para a saúde pública. Todavia, não se sabe se existe, na população mundial, uma associação da medida da circunferência abdominal (CA), como ocorre com a determinação do índice de massa corporal (IMC) em relação às doenças cardiovasculares (DCV) e diabetes mellitus e se aquela medida tem real utilidade na prática clínica diária. A pesquisa denominada International Day for the Evaluation of Abdominal Obesity (IDEA): a study of waist circumference, cardiovascular disease, and diabetes mellitus in 168,000 primary care patients in 63 countries foi realizada, ao mesmo tempo, em 63 países, nos quais foram recrutados pacientes consecutivos com idades entre 18 e 80 anos, em dois dias preestabelecidos. Em tais atendimentos, foram registrados a CA e o IMC como a presença de DCV e diabetes mellitus. Entre os pacientes que consultavam seus clínicos, 97% concordaram em participar do estudo. Quanto aos resultados globais, 24% dos 69.409 homens e 27% das 98.750 mulheres tinham obesidade (IMC > 30 kg/m2). Outros 40% e 30% de homens e mulheres, respectivamente, tinham sobrepeso (IMC de 25 to 30 kg/m2). Aumento da CA (mais do que 102 para os homens e mais do que 88 cm para as mulheres) se registrou em 29% e 48%, respectivamente. CVD ocorreu em 16% e 13%, e o diabetes mellitus em 13% e 11% dos homens e mulheres, respectivamente. Houve um aumento gradativo significante entre a freqüência de DCV e diabetes mellitus com o IMC e a CA, sendo a relação mais forte com a CA do que o IMC, em ambos os gêneros. A relação com CA, DCV e, particularmente, diabetes foi documentada até em pacientes relativamente magros, isto é, com IMC inferior a 25 kg/m2 1 Rua Pamplona, 788 • 3º and. • Sala 32 • CEP: 01405-001 • São Paulo • SP • Fone/Fax: 11 3253-2848 • www.sbmf.org.br dezembro • 2007 Os autores concluem que, entre os pacientes (tanto homens como mulheres) que consultaram seus médicos clínicos, o IMC e, particularmente, a CA tiveram relação com DCV e, diabetes mellitus, especialmente este último. É necessário usar estratégias que resolvam este problema global para prevenir uma causa importante de morbidade e mortalidade. Principais achados da pesquisa IDEA Item Homens Mulheres • Indivíduos incluídos 69.409 98.780 • IMC maior do que 30 kg/m2 24% 27% • IMC de 25 a 30 kg/m2 40% 30% • CA anormal (H >102 cm; M > 88 cm) 29% 48% • Doença cardiovascular 16% 13% • Diabetes mellitus 13% 11% IMC = índice de massa corporal = peso /h (em m) ao quadrado CA = Circunferência abdominal; H = homens; M = mulheres Fonte: Balkau B, Deanfield JE, Després JP, Bassand JP, Fox KA, Smith SC Jr, Barter P, Tan CE, Van Gaal L, Wittchen HU, Massien C, Haffner SM. International Day for the Evaluation of Abdominal Obesity (IDEA): a study of waist circumference, cardiovascular disease, and diabetes mellitus in 168,000 primary care patients in 63 countries. Circulation. 2007;116(17):1942-51. “ Registros de pacientes são estudos observacionais, portanto não intervencionistas com coleta sistemática de dados. ” Algumas noções sobre estudos de registro Estudos epidemiológicos compreendem uma gama variada de investigações mas os que mais interessam à indústria farmacêutica compreendem os registros de pacientes. São estudos observacionais, portanto não intervencionistas, cujo protocolo define uma coleta sistemática de dados mas as diretivas não albergam recomendações para um tratamento em cada sujeito incluído. Os registros sistemáticos de pacientes e os estudos clínicos controlados randomizados têm papéis importantes e complementares na avaliação das doenças e dos tratamentos disponíveis. Enquanto estudos randomizados envolvem amostras restritas da população como também se esmeram quanto aos critérios de inclusão e exclusão, os estudos de registro se apóiam em amostras amplas da população com poucos critérios de exclusão, sem perder a preocupação com um planejamento cuidadoso. Como não "engessam" a decisão terapêutica, estes estudos tem boa chance de refletir aquilo que realmente ocorre na prática. No entanto, cada estudo de registro precisa passar pelas mesmas etapas válidas para estudos randomizados tais como: • Desenho (delineamento) adequado do registro, • Escolha das fontes de recrutamento de investigadores e pacientes, • Preocupações éticas, • Análise dos dados e controle da sua qualidade, Rua Pamplona, 788 • 3º and. • Sala 32 • CEP: 01405-001 • São Paulo • SP • Fone/Fax: 11 3253-2848 • www.sbmf.org.br 2 dezembro • 2007 • Detecção e reporte de eventos adversos, • Interpretação dos dados obtidos e divulgação. Além de despertar grande interesse da indústria, estudos de registro também são de alto interesse para a administração pública, companhias seguradoras, planos de saúde, associações de pacientes, sociedades de especialidades e a esfera acadêmica, em geral. Na verdade, o poder público tem investido muito pouco em estudos de registro. Tendo em vista que o registro de novos medicamentos cada vez mais se apóia em dados farmacoeconômicos, é de se prever uma necessidade crescente de estudos de registro que incluam dados econômicos sobre as doenças, sua prevenção ou cura. Outro artigo marcante sobre circunferência abdominal Obesidade no abdome, medida pela circunferência abdominal (CA) é um identificador mais acurado do risco cardiometabólico do que a obesidade mensurada através do índice de massa corpórea (IMC). O estudo 'Shape of the Nations' foi planejado com o objetivo de avaliar o conhecimento e a compreensão deste risco. “ Constatou-se que, em média geral internacional, há obesidade ou sobrepeso em 39% dos indivíduos que visitam um clínico ” Aproximadamente 100 clínicos gerais, 400 membros da população e 100 pacientes sob risco de doença cardiovascular foram entrevistas em 27 países através de um questionário padronizado. As questões tinham o objetivo de esclarecer a compreensão dos fatores de risco, da avaliação do peso de distribuição do peso assim como da CA para aquilatar o grau de risco cardiometabólico. Constatou-se que, em média geral internacional, há obesidade ou sobrepeso em 39% dos indivíduos que visitam um clínico. Nos Estados Unidos, esta taxa atinge os 49%. A obesidade abdominal como fator de risco importante para cardiopatia por 58% dos clínicos. Em termos mundiais, 45% de todos os médicos nunca mediam a CA de seus clientes e 52% tinham uma percepção falsamente otimista na estipulação de um número que definisse o tamanho da CA que poderia colocar em risco seus pacientes. Na população geral, 42% estavam cientes da associação ente obesidade abdominal e risco mas uma proporção ainda maior (60%) consideravam o IMC como indicativo de risco cardiovascular. Na população geral, raramente as pessoas mediam sua circunferência abdominal e sabiam que o aumento deste identificador se associa com risco cardíaco. Cerca de 59% dos pacientes caracterizados por este tipo de risco não tinham recebido de seus médicos a informação sobre a ligação entre CA e risco de cardiopatia. Os autores do relato destacam a importância da medição da CA como também a facilidade e baixo custo deste procedimento. Desta forma, os achados da pesquisa apontam claramente a necessidade de grandes esforços para ampliar o conhecimento tanto dos profissionais como da população assistida sobre a importância da CA na determinação de risco e na definição de condutas tanto em nível individual como na saúde pública. Fonte: Smith SC Jr, Haslam D. Abdominal obesity, waist circumference and cardio-metabolic risk: awareness among primary care physicians, the general population and patients at risk--the Shape of the Nations survey. Curr Med Res Opin. 2007;23(1):29-47. NB: As opiniões e conceitos expressos pelos autores podem não coincidir com aqueles da SBMF ou seus diretores. 3 Rua Pamplona, 788 • 3º and. • Sala 32 • CEP: 01405-001 • São Paulo • SP • Fone/Fax: 11 3253-2848 • www.sbmf.org.br