INFECÇÃO URINÁRIA NO ADULTO
1-Introdução
2-Fisiopatologia e patogenia
3-Exame de urina, cultura, microbiologia
4-Agentes etiológicos
5- Classificação e definições
6-ITU baixa não-complicada em mulheres não-grávidas
7-ITU alta (pielonefrite) aguda não-complicada em mulheres não-grávidas
8-ITU recorrente não complicada em mulheres
9-Bacteriúria assintomática
10- ITU associada ao cateter vesical
11-ITU na gravidez
12-ITU em homens
13-Infecção urinária complicada
1.
Introdução
O trato geniturinário (TGU) é estéril, exceção à parte distal da uretra. Define-se
infecção do trato urinário (ITU) como a resposta inflamatória do urotélio à
invasão bacteriana no setor estéril do TGU, associada à bacteriúria e piúria.
Bacteriúria significa presença de bactérias enquanto piúria traduz o encontro de
leucócitos na urina. Fungos, leveduras e vírus ocasionalmente podem causar
infecção urinária.
A ITU é possivelmente a infecção bacteriana mais comum no ser
humano. Entre as mulheres mais de 50% apresentará um episódio de cistite
durante a vida, 12% desenvolve ITU a cada ano; 25% terá recorrência. Em
mulheres jovens sexualmente ativas a incidência de cistite é estimada em torno
de 0,5 a 0,7 por pessoa/ano, enquanto na pós-menopausa é de 0,07
mulheres/ano. A pielonefrite aguda não complicada é bem menos freqüente, 1
caso para cada 28 de cistite.1
Em razão da elevada freqüência e da relativa facilidade no diagnóstico e
tratamento,
a
banalização
de
sua
abordagem
resulta
em
custos
desnecessariamente elevados, inquietação que se soma a uma crescente
1
resistência aos agentes antimicrobianos(AAM) num preocupante cenário de
reduzida expectativa de desenvolvimento de AAM nos próximos 5-10 anos.2
2.
Fisiopatologia e patogenia
Dentre as vias que disseminam infecção urinária a linfática é rara. O rim é
sede relativamente freqüente de abscesso em pacientes com bacteremia ou
endocardite por Staphylococcus aureus e mais raramente por Cândida. Em
humanos, a infecção hematogênica do rim por gram-negativos é incomum.
A via ascendente retrógrada é
mais frequente , bactérias de origem
entérica (E.coli e outras Enterobacteriaceae) são os microorganismos
caracteristicamente encontrados.
A uretra feminina é curta (4 cm) e o intróito
vaginal encontra-se próximo ao ânus, o que explica a maior freqüência de ITU
em mulheres quando comparada aos homens; nesses a uretra é maior, com
menos umidade ao seu redor, além da proteção conferida pelas secreções
prostáticas.
O intróito vaginal e uretra distal são naturalmente colonizados por
difteróides, estreptococos e lactobacilos produtores de H2O2. A colonização
desses locais por enterobactérias pode ocorrer em conseqüência de
fenômenos mecânicos (defecação, sudorese, higiene pessoal inadequada),
deficiência de estrógeno, uso de espermicidas, infecções genitais.
O ato sexual favorece a migração das bactérias do intróito vaginal para
uretra e bexiga, sendo um dos fatores de risco mais importantes para
desenvolvimento de ITU em mulheres jovens. A freqüência do ato sexual tem
correlação proporcional ao risco de ITU (2,6 vezes quando em torno de três
vezes na semana e 9 vezes quando diariamente). O mecanismo é
provavelmente mecânico.
A partir da contaminação da bexiga, a interação de fatores como
patogenicidade da bactéria, tamanho do inóculo, mecanismos de defesa local e
sistêmica, determinarão os desfechos possíveis, que são: erradicação da
bactéria, ITU baixa ou pielonefrite aguda. Na maioria das vezes, as bactérias
que chegam à bexiga são rapidamente eliminadas por mecanismos protetores
encontrados na urina e bexiga: fluxo contínuo de urina, osmolaridade elevada,
2
concentração de uréia aumentada, afluxo de neutrófilos para urina e bexiga,
secreções prostáticas com propriedades bactericidas.
No trato urinário normal as ITU são frequentemente relacionadas a
bactérias com propriedades específicas de virulência, conhecidas como
uropatogênicas. A E.coli uropatogênica apresenta maior capacidade de vencer
os mecanismos naturais de defesa. Pertencem ao sorogrupo O (1,4,6,7,16,
18,75)
e adquiriram elementos genéticos capazes de colonizar, invadir e
sobreviver no trato urinário. Etapa crítica na invasão tissular, o aumento da
aderência às células do epitélio é facilitada pela presença de fímbrias na
parede das bactérias, como E.coli e Proteus.
São estruturas protéicas,
parecidas com fios de cabelos, ligam-se a receptores específicos na superfície
da célula epitelial. As bactérias uropatogênicas também produzem hemolisina,
aerobactina e adesinas, além de possuírem flagelos, aumentando a
mobilidade.3
As propriedades uropatogênicas não condicionam resistência específica
aos AAM. O conceito de virulência ou patogenicidade bacteriana no trato
urinário estabelece que nem todas as espécies bacterianas são igualmente
capazes de induzir infecção, Quanto maior o comprometimento dos
mecanismos de defesa natural (obstrução, por exemplo) menor a virulência
requerida pela cepa bacteriana para infectar. Bactérias cultivadas de pacientes
com anormalidades do trato urinário não costumam apresentar propriedades
uropatogênicas.
3.
Exame de urina, cultura, microbiologia4,5
Piúria no exame de sedimento urinário é definida como um número de
leucócitos acima de 10.000/ml ou 5 piócitos/campo. Quase sempre presente
em ITU, sua ausência sugere um diagnóstico alternativo, detecção de piúria
sem ITU bacteriana é conceituada como piúria estéril, condição associada a
diversas situações clínicas como mostra o quadro 1.
3
QUADRO 1
Causas da piuria estéril
Uso de antimicrobianos
Contamitação da urina por solução esterilizante
Contaminação da urina por leucócitos da vagina
Nefrite Intersticial crônica
Nefrolitíase
Tumor uroepitelial
Cistite Intersticial
Tuberculose
Brucelose
As fitas (dipsticks) são dispositivos que detectam a presença da
leucócito-esterase (enzima liberada por leucócitos e que traduz piúria) e do
nitrito (bacteriúria).
Esse último é altamente específico, porém com
sensibilidade insatisfatória uma vez que apenas bactérias gram-negativas
reduzem nitrato para nitrito. Nos quadros clínicos típicos a positividade de fita
para leucócito-esterase ou nitrito correlaciona-se com bacteriúria significativa,
negativos não excluem o diagnóstico.
Nos casos indicados, a detecção de bacteriúria é fundamental para o
diagnóstico e urocultura é o método de escolha. Por ser mais concentrada, o
ideal seria colher a urina pela manhã, entretanto sintomas irritativos da bexiga
dificilmente permitem esse procedimento, quando possível, um intervalo de 2
horas pode ser o suficiente. Utiliza-se um recipiente estéril, faz-se antissepsia
dos genitais externos com sabonete liquido e água, ou então solução salina.
Afastam-se os lábios vulvares e despreza-se o jato inicial de urina; a amostra
pode ser armazenada por até 24 horas a 4oC, caso não possa ser enviada
imediatamente ao laboratório. Em casos selecionados a amostra pode ser
colhida por cateterização uretral ou punção supra-púbica ( indivíduos incapazes
de urinar espontaneamente).
4
O número de bactérias é considerado relevante para o diagnóstico da
ITU, como demonstrado por Kass em 1960, quando desenvolveu o conceito de
bacteriúria significativa (>105 UFC/ml). O número de colônias não é
necessariamente igual no diagnóstico de cada uma das síndromes de ITU.
4.
Agentes etiológicos6,7,8
As bactérias melhor adaptadas para infectar o trato urinário são oriundas
da flora intestinal endógena, em sua maioria aeróbios Gram-negativos ( E.coli,
Proteus mirabilis, Klebsiella sp, Enterobacter, Pseudomonas aeruginosa,
Serratia sp, Morganella morganii, Providencia stuartii). Em menor freqüência
cocos Gram-positivos (Stphylococcus sp,Streptococcus grupos B e D);
bactérias
anaeróbias
(Bacteróides
fragilis,
Peptostreptococcus)
e
microorganismos que necessitam de técnicas especiais de identificação
(Chlamydia trachomatis, Ureaplasma urealyticum, Gardnerella vaginalis).
Infecções adquiridas em hospital estão relacionadas a bactérias com
espectro de resistência alargado, como Pseudomonas e Serratia marcescens.
O relato de E.coli produtora de ESBL(betalactamase de espectro estendido)
em ambiente hospitalar e na comunidade,
betalactâmicos
(incluindo
com perfil de resistência
amoxicilina-clavulanato),
ciprofloxacino,
a
e
sulfametoxazol-trimetoprim sinaliza a preocupante dimensão do problema.
Nitrofurantoína e fosfomicina ainda podem ser utilizados no tratamento dessas
cepas. Estudo internacional (ARESC) que incluiu o Brasil mapeou as espécies
relacionadas à ITU baixa em mulheres de 18 a 65 anos,como mostra a tabela
1 abaixo.
5
TABELA 1-Bactérias isoladas em ITU baixa – Brasil – estudo ARESC6,7
Bactérias
Padrão de resistência
Eschechiria coli
73,9%
Klebsiella pneumoniae
6,1%
Staphylococcus saprophyticus
4,9%
Proteus mirabilis
3,8%
Enterobacter, Serratia, Klebsiella,
6,3%
Pseudomonas, Enterococcus
Streptococcus, outros estafilococcus
4,9%
coagulase-negativos
O padrão de resistência bacteriana na ITU baixa no Brasil também foi
divulgado no estudo ARESC6,7 Quase sempre o antimicrobiano (AAM) é
empregado de forma empírica, e o conhecimento desses dados é útil. De forma
geral, recomenda-se optar por AAM com índices de resistência inferiores a
20% na ITU baixa e 10% na ITU alta. Em pacientes internados deve-se
contemplar os padrões de susceptibilidade de cada instituição.
TABELA 2- Padrões de resistência bacteriana na cistite no Brasil, ARESC6,7
Antibiótico
Fosfomicina trometamol
Sensibilidade (%)
94,9
Mecilinam (não disponível no Brasil
94,6
Ciprofloxacino
89,0
Nitrofurantoína
84,1
Amoxicilina/clavulanato
78,7
Cefuroxima
75,7
Acido nalidíxico
74,7
Sulfametoxazol-trimetoprim
58,4
Ampicilina
33,8
6
5.
Classificação e definições
As ITU podem ser classificadas em complicadas, não-complicadas e
sepse urinária. A Sociedade Européia de Urologia propõe uma classificação
que se baseia
no sítio anatômico, gravidade, fatores de risco e dados
microbiológicos.
Sítio anatômico: uretrite, cistite, pielonefrite, corrente sanguínea (sepse).
Gravidade: escala contínua de 1 a 6: 1-assintomático, 2- sintomas locais, 3sintomas gerais, 4-resposta inflamatória sistêmica (SIRS), 5-SIRS com
disfunção orgânica e 6- falência de órgãos.
Fatores de risco do paciente (vide quadro 2)
QUADRO 2 -Fatores de risco para ITU
Tipo
O
R
E
N
U
C
Categoria de fator de risco
Exemplos
Sem fator de risco
Mulher saudável na pré-menopausa
ITU Recorrente com baixo risco de desfecho Atividade sexual e contraceptivos
desfavorável
Deficiência hormonal pós-menopausa
Grupo sanguíneo
Diabetes mellitus controlado
Fator de risco Extra-urogenital com risco ou Gravidez
desfecho de maior gravidade
Sexo masculino
Diabetes mellitus mal controlado
Imunossupressão significativa*
Doenças do colágeno*
Doença Nefrológica com risco ou desfecho de Insuficiência renal relevante*
maior gravidade
Nefropatia policística
Fator de risco Urológico com risco ou desfecho de Obstrução ureteral (estenose, cálculo)
maior gravidade, pode ser resolvido durante Uso transitório de cateter vesical
tratamento
Bacteriúria assintomática**
Disfunção controlada de bexiga
neurogênica
Cirurgia Urológica
Cateter vesical permanente e fator de risco Sonda vesical prolongada
urológico sem perspectiva de solução, com risco Obstrução urinária sem solução
de desfecho desfavorável
Bexiga neurogênica mal controlada
* mal definido
** em combinação com fator de risco (gravidez, cirurgia urológica)
Patógenos: a urocultura identifica o agente causador e seu padrão de
sensibilidade, sensível (S) ou resistente(R).
7
As figuras 1 e 2 resumem a integração desses quatro parâmetros.
Figura 1
Classificação de ITU pela European Section of
Infection in Urology (ESIU)
Gravidade
4
Gradiente de gravidade
Sintomas
Sem
sintomas
Sintomas locais
Disuria, alguria
polaciuria
Diagnóstico
Bacteriuria
assintomática
Cistite
Dipstick
Cult+ sens
Exames
+
Sintomas gerais
Febre, dor lombar
Nausea, vômito
ITU alta
ITU alta
febril
SIRS
Febre, calafrios
Hipotensão arterial
Sepse
Urinária +
Dipstick, Cult+ sens ,US AGU, TC
AGU
SIRS
Disfunção organica
Falência de orgãos
Sepse
Urinária ++
Sepse
Urinaria +++
Dipstick, Cult+ sens ,US AGU, TC
abdominal, hemoculturas
ORENUC vide tabela 4
Fatores de risco
ITU não complicada
Tratamento
clinico
e cirúrgico
Nenhum
Empírico
3-5 dias
Empírico + direcionado
7-14 dias
ITU complicada
Empírico + direcionado
7-14 dias
2 AAM(?)
Empírico + direcionado
10-14 dias
2 AAM
Fonte: Grabe M, et al. Guidelines on Urological Infections. European Association of Urology. 2010. (adptado).
Figura 2
Parâmetros aditivos para classificação e avaliação de gravidade de ITU
Apresentação
Clínica
Uretrite
Cistite
Pielonefrite
Sepse urinária
Glândulas
Genitais
masculinas
Gravidade
Fatores de risco (FR)
ITU baixa
ORENUC
ITU alta moderada
ITU alta grave
Patógenos
ITU SIRS
Sem FR
ITU Disf órgãos
ITU recorrente
ITU Falência órgãos FR extraurogenital
Espécie isolada
FR Nefrológico
FR Urológico
Sensibilidade
Cateter vesical
•Sensível
•Pouco sensível
•Multiresistente
Copiado e adaptado de 4
8
Fonte: Grabe M, et al. Guidelines on Urological Infections. European Association of Urology. 2010. (adptado).
6.
ITU baixa não-complicada em mulheres não-grávidas1,4,9,10
ITU aguda não complicada delimita episódios de cistite aguda em
mulheres saudáveis, sem anormalidades estruturais ou funcionais do trato
urinário, ou comorbidades que contribuam negativamente no seu desfecho. E.
coli é a bactéria mais frequentemente isolada (70-95%), Staphylococcus
saprophyticus em 5-10% (vide tabela 1).
Diagnóstico
Algúria, disúria e polaciúria na ausência de corrimento, prurido vaginal e
fatores de risco para ITU complicada, sugerem o diagnóstico de alta
probabilidade de ITU baixa. O uso de fita (dipstick) ou o exame do sedimento
urinário são as alternativas para o diagnóstico laboratorial. Culturas não são
rotineiramente solicitadas. Se realizadas, na presença de sintomas típicos e
uma contagem > que 102 UFC/ml corroboram o diagnóstico, exceto na suspeita
de pielonefrite, sintomas sem resolução, recorrência entre 2-4 semanas após
completar tratamento ou a presença de sintomas atípicos.
Diagnóstico diferencial
Vaginite (corrimento vaginal, prurido); uretrite (piúria sem bacteriúria:
infecções
por
Chlamydia,
Herpes
simplex,
Neisseria
gonorrhoeae,
Trichomonas vaginalis, e na candidíase; anormalidades estruturais da uretra
(estenose, divertículo); cistite intersticial (diagnóstico de exclusão em mulheres
com sintomas de ITU e sem evidências de infecção identificável); doença
inflamatória pélvica (dor abdominal e febre eventualmente acompanhados de
disúria).
Tratamento
A escolha dos AAM é baseada na eficácia, perfil de efeitos colaterais, taxa
de resistência bacteriana, capacidade de indução de resistência microbiana,
custo e disponibilidade. Pode variar de um local para outro. Em nosso meio
fosfomicina e nitrofurantoína são drogas que atualmente aproximam-se desse
9
perfil. Sulfametoxazol-trimetoprim será considerado quando a resistência for
inferior a 20%. O uso empírico de quinolonas fica reservado para casos mais
graves, pelo risco aumentado de indução a resistência. O tratamento de
mulheres na pós-menopausa é semelhante ao da pré-menopausa.
TABELA 4- Tratamento com antimicrobianos da ITU baixa não complicada
Fármaco
Fosfomicina trometamo
Posologia
Tempo tratamento
3 gramas VO dose única
1 dia
Nitrofurantoína macrocristais 100 mg VO 12/12 h
Nitrofurantoína
5-7 dias
50 mg VO de 6/6 h
7 dias
Ciprofloxacino
250 mg VO 12/12 h
3 dias
Levofloxacino
250 mg VO a cada 24h
3 dias
Norfloxacino
400 mg VO 12/12 h
3 dias
Ofloxacino
200 mg VO 12/12 h
3 dias
Cepdoxime proxetil
100 mg VO 12/12 h
3 dias
Sulfametoxazol-trimetoprim
800/160 mg VO 12/12 h
3 dias
Alternativas
Acompanhamento
Urocultura não é solicitada de rotina no seguimento, exceto na ausência de
melhora ao final do tratamento ou recorrência de sintomas em 2 semanas.
Infere-se que o microorganismo encontrado não é susceptível ao AAM
anteriormente empregado e o retratamento com outro AAM deve durar 7 dias.
7.
ITU alta (pielonefrite) aguda não-complicada em mulheres nãográvidas1,4,9,10
A ITU alta ou pielonefrite aguda (PNA) traduz o comprometimento renal
quando a bactéria ascende aos rins pelos ureteres. O espectro microbiano é
semelhante ao da ITU baixa não complicada. A PNA manifesta-se desde
quadro leves com pouco comprometimento sistêmico culminando com quadros
graves com disfunção ou falência de órgãos. Entre esses dois extremos é
possível divisar um continuum de repercussões clínicas e laboratoriais.
10
Quadro clinico e diagnóstico
Pode ou não ocorrer quadro irritativo vesical, acompanhado por dor lombar,
dor à palpação costovertebral, náuseas, vômitos, febre (>38oC), calafrios.
Menos frequentemente observa-se quadro séptico com disfunção de múltiplos
órgãos e choque.
No exame com fita (dipsticks) ou do sedimento urinário, a presença de
piúria continua sendo de fundamental importância. A bacterioscopia de urina
não centrifugada (o achado de 1 germe por campo de grande aumento
equivale a 105 UFC/ml na urocultura) é muito útil, sendo positiva em 90% dos
casos. Diferentemente da urocultura, o resultado fica pronto em pouco tempo
(<1 hora) e ajuda guiar a cobertura antimicrobiana para Gram negativos ou
positivos. Se negativa, não exclui o diagnóstico. O encontro de cilindros
leucocitários é de alta especificidade. A urocultura é mandatória (contagem
≥104UFC/ml indica bacteriúria relevante), além de exames complementares
nas pacientes com comprometimento sistêmico significativo (taquicardia,
taquipneia, hipotensão arterial, por ex): hemograma, PCR quantitativa, função
renal, glicemia, lactato, teste de gravidez, gasometria arterial, hemoculturas.
Ultrassonografia (US) de rins e vias urinárias é recomendada para afastar
obstrução ou cálculos do trato urinário naquelas que necessitaram de
internação. Tomografia do abdome/pelve é realizada quando a febre persiste
por mais de 72 horas, após o início do tratamento ou o US é inconclusivo.
Diagnóstico Diferencial
É extenso: apendicite aguda, doença de Crohn, pneumonia de base,
doença diverticular do intestino grosso (alças intestinais na proximidade da
bexiga podem provocar sintomas irritativos), endometriose, doença inflamatória
pélvica, colecistite aguda, nefrolitíase, entre outros.
Tratamento
Excetuando menor incidência de Staphylococcus saprophyticus comparada às
ITU baixas, os microorganismos isolados são semelhantes. Casos leves as
moderados, criteriosamente avaliados, podem ser inicialmente tratados com
AAM por via oral. Fluorquinolonas são os únicos AAM via oral recomendados
de forma empírica se os índices de resistência à E. coli forem inferiores a 10%.
11
O tratamento varia entre 7-10 dias, ou de 5 dias quando se empregam doses
diárias mais elevadas. Número crescente de resistência de E. coli
às
quinolonas tem sido observado na comunidade, dificultando seu uso empírico.
A prescrição dos demais AAM por via oral se faz exclusivamente guiada por
cultura. Na suspeita de PNA não se administra nitrofurantoína nem
fosfomicina.
Na impossibilidade do uso de fluorquinolonas empregam-se
AAM por via EV (ou ocasionalmente IM) migrando para via oral guiada por
antibiograma de acordo com a condição clínica. Quando o comprometimento é
sistêmico o tratamento será inicialmente em regime hospitalar com AAM
parenteral, modificando-se o AAM de acordo com a cultura. Mulheres na pré e
pós-menopausa são abordadas de forma semelhante.
TABELA 5 - Tratamento de ITU alta – casos leves a moderados
Antibióticos
Dose diária
Duração tratamento
Ciprofloxacino
500-750 mg BID 7-10 dias
Levofloxacino
250-500 mg MID
7-10 dias
Levofloxacino
750 mg MID
5 dias
Sulfametoxazol-trimetoprim* 800/160 BID
14 dias
Amoxicilina-clavulanato*
14 dias
0,5/0,125 g TID
* não utilizar de forma empírica, apenas guiados por cultura.
12
Tabela 6 - Terapeutica parental inicial em casos graves de PNA *
Antibiotico
Dose diária
Ciprofloxacino
400 mg BID
Levofloxacino
250-500 MID
Levofloxacino
750 mg MID
Alternativas
Cefotaxima
2 gramas TID
Ceftriaxona
1-2 gramas TID
Ceftazidima
1-2 gramas TID
Cefepime
1-2 gramas TID
Amoxicilina-clavulanato
1,5 gramas TID
Piperacilina-tazobactam
2,5-4,5 gramas TID
Gentamicina
5mh/Kg/MID
Amicacina
15mg/Kg MID
Ertapenem
1 grama MID
Imipenem-cilastatina
0,5/0,5 gramas TID
Meropenem
1 grama TID
Doripenem
0,5 gramas TID
* Após a melhora, trocar para AAM VO de perfil de sensibilidade adequado,
completando 7-14 dias de tratamento.
Acompanhamento
Urina rotina e cultura não são habitualmente solicitados nas pacientes
com boa evolução. Ausência de melhora com 3 dias ou recorrência de
sintomas
nas
primeiras
2
semanas
serão
investigadas
com
urocultura/antibiograma e exames de imagem. Na ausência de anormalidades
urológicas infere-se que o microorganismo não é susceptível ao AAM
inicialmente empregado, o tratamento será baseado na cultura inicialmente
colhida.
8.
ITU recorrente não complicada em mulheres1,4,9,11,12
Diagnostica-se ITU recorrente quando infecção sintomática ocorre após
a resolução clínica de um episódio anterior, é relevante quando acontece três
13
ou mais vezes por ano. Recidiva é a recorrência da ITU com o mesmo germe
da infecção anterior no período de até 2 semanas após o tratamento. Equivale
a falha em erradicar a infecção, relacionada à curta duração do tratamento ou
um foco persistente. Reinfecção é muito mais frequente que recidiva. É
entendida como nova infecção com patógeno de cepa diferente após
erradicação de bacteriúria com tratamento adequado. Distinguir entre recidiva e
reinfecção nem sempre é fácil quando o germe isolado é o mesmo. Quando a
recorrência ocorre em prazo inferior a 2 semanas após o tratamento considerase recidiva,
acima de 2 semanas classifica-se como reinfecção. Identificar
recidiva implica considerar investigação urológica com eventual tratamento
cirúrgico e por vezes o prolongamento do uso de AAM. Essa distinção é de
pouca importância em pacientes jovens e saudáveis, uma vez que não há
evidência que ITU recorrente na ausência de anormalidades anatômicas e
funcionais determine hipertensão arterial ou insuficiência renal.
Entre as
mulheres jovens os fatores de risco mais comuns são atividade sexual recente,
uso de espermicidas com ou sem diafragma, mãe com história de ITU, início
precoce de ITU (antes dos 15 anos). Na pós-menopausa o hipoestrogenismo
determina modificações na flora vaginal facilitando ITU. Outros fatores incluem
incontinência urinária, cistocele, volume residual pós-miccional aumentado,
passado de ITU antes da menopausa.
Prevenção não-farmacológica
Questão central na infecção recorrente é a colonização vaginal com
uropatógenos, com maior propensão de adesão às células uroepiteliais.
Diversas recomendações não-medicamentosas, nem todas com evidência de
eficácia são recomendadas: evitar diafragma ou espermicida; aumentar
ingestão de líquidos; urinar a cada 2-3 horas; urinar antes de dormir e após o
coito; uso de cranberry (fruto originário da América do Norte). Esse último
contém substâncias que inibem aderência da E.coli e outros uropatógenos às
células uroepiteliais, como frutose (fímbrias tipo 1) e proantocianidinas
(fímbrias tipo P). Ainda que referendado por plausibilidade biológica a utilização
do cranberry não é consenso. Recente metanálise concluiu ausência de
redução significativa em ITU sintomática. Para as mulheres que desejarem
utilizá-lo a quantidade prescrita é de 200-750 ml de suco por dia, a dose de
14
comprimidos e cápsulas ainda não se encontra bem determinada.Estima-se
que a dose mínima diária do composto ativo proantocianidina seria de 36 mg.
Prevenção farmacológica
A profilaxia com AAM é bastante eficiente na redução de recorrência de
ITU. Está indicada em mulheres com duas ou mais ITU sintomáticas em 6
meses, ou 3 ou mais episódios em 1 ano. Profilaxia contínua, pós-coito e autotratamento são as modalidades sugeridas, a última ainda que utilizada em
alguns paises conflita com o código de ética médica brasileiro. A escolha vai
depender do contexto clínico e da preferência da paciente. A escolha do AAM
deve basear-se no padrão de susceptibilidade das cepas causadoras da ITU e
no histórico de alergia e intolerância medicamentosa. Antes de iniciar a
prevenção, deve-se garantir a erradicação da ITU prévia confirmada por
urocultura negativa 1-2 semanas após o tratamento. A profilaxia contínua se
faz pelo período mínimo de 6 meses, em alguns casos dois ou mais anos são
utilizados, entretanto a emergência de cepas resistentes aos AAM utilizados é
um problema real.
Estrógeno tópico normaliza a flora vaginal e reduz o risco de ITU em
mulheres na pós-menopausa , sendo alternativa bastante atrativa nesse grupo.
15
QUADRO 3- Profilaxia contínua com AAM em mulheres com ITU recorrente
Regimes*
Sulfametoxazol-trimetoprim 200/40 mg MID
Sulfametoxazol-trimetoprim 200/40 mg 3 vezes na semana
Nitrofurantoína 50 ou 100 mg MID
Cefaclor 250 mg MID
Cefalexina 125 0u 250 mg MID
Norfloxacino 200 mg MID
Ciprofloxacino 125 mg MID
*Todos deverão ser tomados a noite antes de dormir
QUADRO 4- Profilaxia pós-coito com AA para ITU recorrente em mulheres
Regimes
Sulfametoxazol-trimetoprim 200/40 ou 400/80
Nitrofurantoína 50 ou 100 mg
Cefalexina 250 mg
Ciprofloxacino 125 mg
Norfloxacino 200 mg
Ofloxacino 100 mg
Outras estratégias
Probióticos podem proteger a vagina da colonização por uropatógenos
mantendo pH baixo e produzindo H2O2 (microbicida para E. coli). Lactobacillus
vaginallis é promissor, mas seu uso rotineiro ainda requer estudos adequados.
A imunoterapia com lisado bacteriano de E.coli (OM-89, Uro-vaxom) pode ser
recomendada em mulheres com ITU não complicada recorrente.
Investigação urológica
A investigação rotineira de ITU baixa recorrente geralmente resulta em
custos desnecessários e potencial morbidade. A suspeita de anormalidades
estruturais ou funcionais, o isolamento de Proteus (associação com cálculo
urinário) e ITU recidivante podem justificar a investigação. Na mulher jovem
16
com ITU alta recomenda-se o estudo do trato urinário nos casos de resposta
demorada ao tratamento ou após dois episódios recorrentes de pielonefrite.
Ultrassonografia e tomografia helicoidal são os exames preferidos. Cistoscopia
e urografia excretora deverão passar pelo crivo do urologista.
9.
Bacteriúria assintomática4,13
É definida como o isolamento de bactéria em urina colhida de forma
apropriada em indivíduos assintomáticos. O limiar quantitativo é de: ≥ 105
UFC/ml em jato médio, ≥ 102 UFC/ml por sondagem. Deve ser confirmado em
24 horas, cultivando-se o mesmo microorganismo.
A prevalência aumenta com a idade (20% nas mulheres acima de 80
anos), mulheres diabéticas (8-14%), homens com idade superior a 75 anos (615%). Dilema freqüente no paciente internado é a interpretação de bacteriúria
em quadro febril sem sintomas urinários. Piúria não deve ser interpretada como
“sintoma”, tampouco indicação de terapêutica antimicrobiana. Rastreamento e
eventual tratamento somente estão indicados na gravidez e antes de
procedimentos geniturinários invasivos.
Rastreamento e tratamento não estão indicados: nas mulheres não-grávidas,
mulheres com diabetes, homens saudáveis, uso de sonda vesical de demora,
nefrostomia, lesão medular, candidúria, pacientes que serão submetidos a
prótese ortopédica, transplante renal nos primeiros 6 meses. Os casos de
neutropenia serão avaliados individualmente.
10. ITU associada ao cateter vesical4
ITU é causa mais freqüente de infecção nosocomial, sobretudo quando
associada à sonda vesical. Considerando que a introdução foi realizada de
forma correta, o sistema é fechado, e a manipulação obedeceu aos princípios
básicos de higiene, o tempo de cateter é o fator de risco mais importante para
desenvolvimento de infecção.
chance
de
infecção.
Quanto menor o tempo de cateter menor a
Antibioticoterapia
profilática
não
está
indicada
rotineiramente, tampouco irrigação com antimicrobianos. Outros sistemas de
drenagem poderão ser considerados em circunstâncias específicas: cateter
17
supra-púbico, preservativos e cateterismo intermitente. O emprego de AAM só
se justifica nos casos sintomáticos, sempre precedido e posteriormente guiado
por cultura. Não cabe o uso de AAM supressivo.
Nos casos de candidúria assintomática não se utiliza terapêutica
antifúngica, a retirada do cateter é melhor alternativa. Se associada a sintomas
ou suspeita de infecção sistêmica, a terapêutica com antifúngicos deve ser
considerada, precedida por hemoculturas e posterior avaliação do sistema
urinário por exames de imagem.
11. ITU na gravidez3,4,9,14
A gravidez predispõe à ITU por dilatação do sistema coletor renal e
aumento do crescimento bacteriano por alterações na composição da urina.
Bacteriúria ocorre em 2-7% das gestações, os agentes e mecanismos
são semelhantes àqueles das mulheres não grávidas, mas existe maior
propensão de progressão para pielonefrite (20-40%). Há risco aumentado de
prematuridade, baixo peso e de mortalidade perinatal.
Recomenda-se o rastreamento de bacteriúria no primeiro trimestre da
gravidez.
Bacteriúria assintomática é diagnosticada em duas amostras de
urina separadas por 24 horas com crescimento ≥ 10 5 UFC/ml. Em grávidas
sintomáticas o ponto de corte sugerido é de ≥ 10 3 UFC/ml e o tratamento deve
ser precedido por urocultura. Os AAM sugeridos no tratamento da bacteriúria
assintomática, ITU baixa e alta estão sumarizados nas tabelas 7 e 8.
18
TABELA 7 - Tratamento de bacteriúria e ITU baixa na gravidez
Antibióticos
Duração do tratamento
Comentário
Nitrofurantoina
12/12h 3-5 dias
Evitar próximo ao parto
(macrocristais) 100mg
(deficiência G6PD)
Amoxicilina 500mg
8/8h 3-5 dias
Amoxicilina-Clavulanato
12/12h 3-5 dias
Resistência aumentada
500mg
Cefalexina 500mg
8/8h 3-5 dias
Fosfomicina 3g
Dose única
Resistência aumentada
TABELA 8- Tratamento da pielonefrite aguda na gravidez
Antibiotico
Dose
Ceftriaxone
1-2 g EV ou IM a cada 24 h
Aztreonan
1 g EV acada 8-12h
Piperacilina-Tazobactam
3,375-5,4 g a cada 6 h
Imipenen-Cilastatina*
500 mg EV de 6/6 h
Ampicilina +
2 g EV 6/6 h
Gentamicina#
3-5 mg/Kg/dia em 3 doses divididas
*Categoria C, estudos em alguns animais com efeitos adversos.
Preferir meropenem, ertapenem, doripenem
# Classe D ototoxicidade com exposição prolongada do feto
Na bacteriúria assintomática e ITU baixa impõe-se controle de cura
bacteriológica (7 dias após término do tratamento) e seguimento mensal com
urocultura. Se no acompanhamento a cultura estiver positiva (≥ 105 UFC/ml)
novo tratamento será realizado, baseado no antibiograma. Terapêutica
supressiva
pode
ser
empregada
quando
dois
ou
mais
cursos
de
antimicrobianos são utilizados, recomenda-se nitrofurantoína 50-100 mg à noite
durante toda a gravidez. Nessa situação não se preconiza seguimento mensal
com uroculturas, exceto no início do terceiro semestre ou nos casos
sintomáticos.
Culturas positivas devem ser tratadas de acordo com
19
antibiograma por cerca de 7 dias acompanhada de reintrodução do tratamento
supressivo até o final da gravidez. Profilaxia pode ser considerada durante toda
a gestação no grupo de mulheres com risco aumentado, como diabetes e traço
falciforme (nitrofurantoína 50 mg/noite ou pós-coito). Mulheres que já se
utilizavam desse esquema antes da gravidez devem mantê-lo.
Na pielonefrite aguda a recorrência é estimada em torno de 6-8%, justificando a
profilaxia com baixas doses de AAM após o término do primeiro tratamento de
PNA (nitrofurantoína 50-100 mg/noite. ou cefalexina 250/500 mg/noite) até o
final da gravidez. Também nesses casos não se indica seguimento mensal com
uroculturas , exceto no início do terceiro trimestre ou na presença de sintomas.
12. ITU em homens4,9,15
ITU em homens são - ao menos em tese- complicadas, e a investigação
urológica necessária. São mais freqüentes após os 40 anos, muitas vezes
associadas à obstrução prostática. A infecção não complicada é rara e
ocasionalmente observada em homossexuais e HIV-positivos, urocultura é
rotineiramente utilizada na abordagem diagnóstica. Homens com sintomas
urinários
e
febre
apresentam
provavelmente
infecção
da
próstata,
acompanhada por elevação transitória do PSA, exame que – nesse contexto deve ser solicitado juntamente com urina (rotina e cultura). A contaminação da
amostra urinária é infrequente, uma contagem ≥ 103 UFC/ml é compatível com
diagnóstico de bacteriúria significativa.
Os agentes mais frequentemente encontrados são E.coli e outras
Enterobacteriaceae, nos idosos aumenta a proporção de Proteus, Klebsiella,
Serratia, Pseudomonas e Enterococcus.
O tratamento das ITU não complicadas é realizado preferencialmente
com quinolonas ou sulfametoxazol-trimetoprim pelo período médio de 7 dias;
nitrofurantoína e betalactâmicos
devem ser evitados, pois não
alcançam
concentrações adequadas na eventual concomitância de prostatite oculta.
Nos casos complicados o tempo mínimo de tratamento será de 14 dias,
os AAM utilizados seguem a mesma lógica do tratamento da cistite. Os casos
mais graves deverão ser hospitalizados e empregados AAM via parenteral de
forma semelhantes às mulheres.
20
13- Infecção urinária complicada3,4,9,16
Ocorre em indivíduos com anormalidade funcional ou estrutural do trato
urinário ou portadores de condição (diabetes, imunossupressão,insuficiência
renal) que altere desfavoravelmente a evolução da infecção. Entre as mais
freqüentes temos: obstrução extra-renal (tumores, hipertrofia prostática,
cálculos); intra-renal (nefrocalcinose, nefropatia do ácido úrico, rim policístico,
traço falciforme);
instrumentação (cateteres vesicais, ureterais, cistoscopia,
nefrostomia, derivações urinárias, cirurgias urológicas); alterações funcionais
(bexiga neurogênica, refluxo vesicoureteral).
As manifestações clínicas são as mesmas de ITU baixa ou alta, o
comportamento evolutivo é que costuma ser diferente. Com freqüência, o
diagnóstico é suspeitado na vigência de ITU (alta ou baixa) que evolui com
ausência de melhora após 72 horas de tratamento ou recorrência precoce. A
pielonefrite complicada é entendida como a progressão da infecção do trato
urinário alto para abscesso renal, abscesso peri-nefrético, pielonefrite
enfisematosa ou
necrose papilar, condições que são diagnosticadas por
métodos de imagem e que – não raro – o exame de urina (bacteriológico) não
revela . Necessitam de acompanhamento e intervenção urológica (drenagem
percutânea a nefrectomia). Diagnóstico diferencial com tumor renal a
pielonefrite xantogranulomatosa é uma evolução incomum e peculiar de
infecção do parênquima renal. O tecido destruído é substituído por tecido
granulomatoso com macrófagos englobando material lipídico. Diabetes,
cálculo renal, isquemia renal, e obstrução são fatores predisponentes.
Os microorganismos identificados apresentam grande diversidade e alta
prevalência de resistência aos antimicrobianos, entretanto, a presença de
resistência antimicrobiana, per se, não significa necessariamente uma infecção
complicada.
Na ITU associada a cálculos E. coli e Enterococcus são relativamente
menos importantes, mas Proteus e Pseudomonas adquirem papel relevante.
Entre os produtores de urease, Proteus, Providencia, Morganella sp e
Corynebacterium urealyticum são predominantes.
21
A abordagem terapêutica requer acompanhamento urológico e a
remoção do fator obstrutivo costuma ser decisiva. Na ITU baixa, quando o
tratamento empírico for necessário, quinolonas
por via oral ou EV
(ciprofloxacino, levofloxacino) com excreção renal são recomendadas, pois
atingem altas concentrações na urina e tecidos (exceto moxifloxacino).
Nitrofurantoína,
sulfametoxazol-trimetoprim, fosfomicina, betalactâmicos por
via oral não devem ser utilizados empiricamente, apenas apoiados em cultura.
Amoxicilina e ampicilina continuam sendo prescritas para tratamento de
Enterococcus sensível. Via parenteral de AAM fica reservada para aqueles que
não toleram via oral ou quando se suspeita de infecção por microorganismo
resistente às drogas orais: As doses encontram-se nas respectivas tabelas. O
uso IM por vezes pode ser útil: ceftriaxone 1 g IM, ertapenem 1 g IM (não
apresenta
ação
sobre
Pseudomonas,
ao
contrario
dos
demais
carbapenemas)aminoglicosídeos (gentamicina 5 mg/Kg dose única diária). O
tempo de tratamento deve variar entre 7 a 14 dias, de acordo com gravidade e
comportamento clinico de cada caso.
Pacientes com ITU alta complicada necessitam de tratamento inicial em
regime hospitalar com medicação endovenosa. Aqueles com comprometimento
moderado podem ser tratados com fluorquinolonas ou cefalosporinas de
terceira ou quarta geração. Nos mais graves, incluindo drenagem urinária
incompleta, preconiza-se piperacilina-tazobactam ou carbapenemas.
Aminoglicosídeos são cogitados no tratamento de microorganismos altamente
resistentes aos esquemas acima, em pacientes com função renal preservada.
O tratamento deve durar entre 10 a 14 dias, dependendo das circunstâncias
pode ser prolongado, e a migração para AAM por via oral será considerada na
seqüência, sempre guiada pelo antibiograma. Controle de cura pode ser feito
ao final do tratamento ou em casos de evolução desfavorável.
22
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