«O Banco do Sul pode ser uma alternativa, mas o dos BRICS não»
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«O Banco do Sul pode ser uma alternativa, mas o
dos BRICS não»
Date de mise en ligne : quinta-feira 21 de Agosto de 2014
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«O Banco do Sul pode ser uma alternativa, mas o dos BRICS não»
Os meandros financeiros do desenvolvimento não têm segredos para Eric Toussaint.
Fundador em 1990 do Comité para a Anulação da Dívida do Terceiro Mundo (CADTM), este
politólogo belga foi associado pelo Governo equatoriano ao lançamento do Banco do Sul.
Apesar da paralisia actual deste organismo, Eric Toussaint continua a acreditar nesse
projecto lançado em 2007 por sete Estados sul-americanos como alternativa ao Banco
Mundial. Em contrapartida, mostra-se céptico quanto ao projecto de banco de investimento
Banco de investimento Sociedade financeira cuja actividade consiste em efectuar três tipos de
operações: aconselhamento (nomeadamente em fusão-aquisição), gestão por conta de emrpesas
(aumentos de capital, introdução na Bolsa, emissão de empréstimos obrigacionistas) e
investimentos nos mercados. Os bancos de investimento não angariam capitais junto do público,
financiam-se emprestando aos bancos ou recorrendo aos mercados financeiros. anunciado pelos
cinco principais países emergentes.
Os BRICS [Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul] anunciaram a intenção de criarem uma alternativa ao
Banco Mundial (BM). Isto é uma boa notícia para o desenvolvimento?
E. Toussaint: A criação de uma alternativa ao BM poderia de facto ser uma excelente notícia, mas não acredito que
seja este o caso. Os cinco países que constituem os BRICS são países capitalistas emergentes que procuram
proteger os seus interesses, na mesma medida em que o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o BM são
instrumentos controlados pelas grandes potências tradicionais. O Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) é
diferente, uma vez que promete não impor condições - do tipo planos de ajuste estrutural - para a concessão de
empréstimos e promete aplicar (mas fá-lo-á?) o princípio: um país, um voto. Isto não basta para construir uma
alternativa. Seria apenas um mal menor.
Se bem entendi: trocar-se-ia um BM submisso a Washington, por um NBD ao serviço do imperialismo
chinês?
Melhor dizendo, segundo o economista brasileiro Rui Mauro Marini, subimperialismo, no sentido de que esses
países, com a China e o Brasil à cabeça, investem massivamente nos países em desenvolvimento para defender os
seus próprios interesses políticos e económicos, e não para desenvolver quem recebe os fundos. O que os
diferencia do verdadeiro imperialismo, como o dos EUA, é o facto de não utilizarem - ou ainda não utilizarem? meios militares. A excepção é a Rússia.
Na sua opinião, como seria uma verdadeira alternativa ao BM?
O anúncio em 2007 da criação do Banco do Sul (BdS) representa essa esperança. A pedido do presidente Rafael
Correa, participei na redacção da posição equatoriana aquando da criação do Banco do Sul, e depois num conselho
de ministros dos sete países fundadores. O Equador e a Venezuela tinham uma visão clara de uma instituição que
deveria servir o emprego e a integração continental. E tinham projectos concretos, como uma indústria farmacêutica
de produtos genéricos ou a ligação ferroviária entre os países da América do Sul, com produção local de material de
transporte, o que significaria menos poluição e avanços industriais e tecnológicos. O BdS seria ainda uma moeda
comum e alternativa, o sucre. Ou a ideia de transferir meios dos países mais dotados de reservas cambiais para os
outros países. Era um projecto de integração, que levava em conta os interesses dos povos e poderia estender-se
sem dificuldade à América Central e às Caraíbas, nomeadamente por pretender ser transparente - contabilidade
pública, auditorias externas - e democrático. Para ser alternativa ao BM, era preciso ser um exemplo, e portanto
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ambicioso. Por exemplo, estava excluída a hipótese de os funcionários do BdS beneficiarem de imunidade judiciária,
contrariamente aos do BM...
Infelizmente o Banco do Sul ainda não entrou em actividade. Sete anos após a sua fundação, o banco não
concedeu nenhum empréstimo! As autoridades venezuelanas anunciaram o seu arranque para antes do final de
2014. A ver vamos.
O banco dos BRICS terá melhor sorte?
Conseguirão eles pôr-se de acordo sobre projectos comuns? É caso para perguntar se esses cinco países não se
associaram sobretudo para mostrar às potências tradicionais que são capazes de o fazer. A realidade, na minha
opinião, é que esses países têm muito poucos interesses comuns.
Terão eles capacidade financeira para dar vida a um banco desses?
Sem qualquer dúvida! A China, só por si, possui 3 biliões de dólares em reservas de cambiais e não sabe que lhes
há-de fazer. É uma reserva enorme, quase duas vezes o total das dívidas públicas externas dos países em
desenvolvimento. Uma grande parte desse dinheiro foi aplicado em títulos do Tesouro norte-americano. A China é o
maior credor dos EUA. O Brasil e a Rússia também possuem avultadas reservas de divisas. Só a África do Sul terá
dificuldade em entrar com os 10 mil milhões de dólares para o capital de lançamento da instituição (que vão
acrescer aos 5 mil milhões a depositar no fundo de reserva).
O investimento do Brasil no NBD não é uma certidão de óbito para o BdS?
O BdS já está com os pés para a cova... Mas com ou sem Brasil, a América do Sul ainda tem meios financeiros para
levar o projecto por diante. Na minha opinião, o Brasil é o principal responsável pelo bloqueio actual. Esse país tem
o seu próprio banco de desenvolvimento, o BNDES, que investe muitíssimo no estrangeiro. O seu peso, na América
do Sul, equivale ao do Banco Interamericano de Desenvolvimento e aos empréstimos do BM na região! O Brasil
privilegia o BNDES. Só participou no BdS para travar um potencial concorrente.
Esse fracasso e as dificuldades actuais da Argentina e da Venezuela não serão sinal de que o sonho de
independência latino-americano está fora de alcance?
No momento em que Hugo Chávez propôs o BdS, o projecto era inteiramente razoável! O erro provavelmente
consistiu em achar que o Brasil tinha de entrar, custasse o que custasse.
Apesar de tudo, a maioria dos países do continente provou que podia afastar-se do consenso neoliberal. Novas
estruturas começaram a funcionar, como a ALBA. Temos também a decisão do Equador, da Bolívia e da Venezuela
de se retirarem do tribunal do BM em matéria de investimento. E o aumento dos impostos pagos pelas grandes
empresas estrangeiras que exploram os recursos naturais desses países. É insuficiente olhar para as
potencialidades reais desses países e os desafios importantes, mas ainda é tempo: seria necessária uma reacção
forte nos próximos dois anos. Alguns responsáveis governamentais pressionam nesse sentido.
Senão, receio que a América do Sul venha a enfrentar graves dificuldades financeiras. Um cenário semelhante ao
da crise da dívida de 1982 ameaça voltar.
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Há indícios nesse sentido?
Sim, os EUA preparam-se para aumentar as taxas de juro, que baixaram massivamente com a crise de 2007-2008.
Isso irá encarecer o financiamento da dívida no preciso momento em que os Estados sul-americanos estão sob a
ameaça duma diminuição da procura mundial de matérias-primas. Receio que esses países se apercebam daqui a
dois a três anos que perderam uma magnífica ocasião, durante o decénio anterior, de se dotarem de instrumentos
financeiros alternativos destinados a blindá-los contra as decisões tomadas pelos países do Norte.
Tradução: Rui VianaPereira
Post-scriptum :
Fonte: http://www.lecourrier.ch/123072
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