DETERMINAÇÃO DE EPICENTROS E HIPOCENTROS
TREINAMENTO TÉCNICO: DA TEORIA A PRÁTICA
Apostila de Treinamento
(IAG-SISMO-042010)
Elaborado por:
Afonso Emidio de Vasconcelos Lopes
Marcelo Assumpção
SÃO PAULO
Agosto de 2010
1. Introdução
O conhecimento da distribuição espacial e temporal dos terremotos é o item mais básico e
fundamental para qualquer tipo de estudo sismológico. Vale lembrar que a partir desse tipo de
informação podemos conhecer os limites horizontais das placas tectônicas, e obter informações
sobre as propriedades das rochas de uma determinada área, como por exemplo, a profundidade de
transição entre o comportamento rúptil (frágil) e dúctil das rochas na crosta terrestre. Apenas com a
distribuição espacial dos sismos também podemos mapear falhas geológicas em regiões intraplaca,
como no Brasil.
A determinação hipocentral é um processo onde são determinadas a coordenada espacial (latitude,
longitude e profundidade) e a hora de origem de um determinado evento sísmico, que pode ser uma
explosão, um pequeno sismo ou um grande terremoto. Esse tipo de rotina utiliza os tempos de
chegada das ondas sísmicas a um grupo de estações sismográficas, que é comparado com o tempo
teórico calculado a partir de um modelo de velocidade das ondas sísmicas.
O hipocentro é obtido com a minimização das diferenças entre os tempos de chegada observados e
teóricos das ondas sísmicas, e pode ser estimado com diversos programas, sendo os principais deles
o HYPO71, HYPOCENTER e o HYPODD. Esses três programas serão discutidos em detalhes em aula
prática.
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2. Parâmetros Básicos
2.1 Distância Hipocentral (e Epicentral)
Considerando que o sismo tem uma profundidade focal pequena (que possa ser desprezada) e que
as primeiras ondas P e S que chegam a estação são ondas diretas, ou seja, aquelas que saem do
evento e vão direto para a estação sismográfica, podemos estimar a distância epicentral (neste caso
igual a distância hipocentral) utilizando a diferença de tempo entre as chegadas das ondas P e S.
Como a velocidade da onda P (VP) é maior que a da onda S (VS), quanto maior a distância epicentral,
maior a distância entre essas duas ondas (veja Figura 1), de forma que existe uma relação direta
entre a distância hipocentral (neste caso igual a distância epicentral) e o valor S-P = tP-tS.
Figura 1 – Seção sísmica ilustrando que o valor de S-P aumenta com a distância epicentral. No nosso
caso iremos estudar apenas a parte linear das curvas, para distâncias hipocentrais
menores que 500 km.
Como as ondas P e S percorrem a mesma distância hipocentral (∆), podemos escrever que:
∆௉ = ∆ௌ
(1.1)
No caso de ondas P e S diretas, geradas por um sismo raso, temos:
ܸ௉ = ௧
∆ು
ು ି௧బ
ܸௌ = ௧
∆ೄ
ೄ ି௧బ
∆௉ = ܸ௉ ሺ‫ݐ‬௉ − ‫ݐ‬଴ ሻ
→
∆ௌ = ܸௌ ሺ‫ݐ‬ௌ − ‫ݐ‬଴ ሻ
→
(1.2)
(1.3)
Substituindo as Equações (1.2) e (1.3) na equação (1.1), temos:
ܸ௉ ሺ‫ݐ‬௉ − ‫ݐ‬଴ ሻ = ܸௌ ሺ‫ݐ‬ௌ − ‫ݐ‬଴ ሻ
(1.4)
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Com isso, o primeiro item que devemos descobrir é qual é a hora de origem do sismo (t0).
Rearranjando a Equação (1.4), temos:
‫ݐ‬଴ =
௏ೄ ௧ೄ ି௏ು ௧ು
௏ೄ ି௏ು
(1.5)
Substituindo a Equação (1.5) na Equação (1.2), temos:
∆ = ∆௉ = ܸ௉ ሺ‫ݐ‬௉ − ‫ݐ‬଴ ሻ = ܸ௉ ቀ‫ݐ‬௉ −
௏ೄ ௧ು ି௏ೄ ௧ೄ
ቁ
௏ೄ ି௏ು
∆ = ܸ௉ ቀ
௏ೄ ௧ೄ ି௏ು ௧ು
ቁ
௏ೄ ି௏ು
= ቀ௏ ುି௏ೄ ቁ ሺ‫ݐ‬௉ − ‫ݐ‬ௌ ሻ
௏ ௏
ೄ
௏ೄ ௧ು ି௏ು ௧ು ି௏ೄ ௧ೄ ା௏ು ௧ು
ቁ
௏ೄ ି௏ು
= ܸ௉ ቀ
(1.6)
(1.7)
ು
Como um dos parâmetros que conhecemos bem nas rochas é a razão VP/VS (em geral perto do valor
1,73), vamos dividir a equação (1.7) por VS para podemos reescrevê-la da seguinte forma:
∆= ൭
௏ು
ೇ ൱ ሺ‫ݐ‬௉
ଵି ು
ೇೄ
− ‫ݐ‬ௌ ሻ = ൭ೇು ು ൱ ሺ‫ݐ‬ௌ − ‫ݐ‬௉ ሻ = ‫ܥ‬ா ∗ ሺܵ − ܲሻ
௏
ೇೄ
ିଵ
(1.8)
Note que enquanto as ondas P e S forem diretas, CE será um valor constante que depende da
velocidade da onda P (VP) e da razão VP/VS.
Exercícios:
1) Determine o valor da constante CE para sismos próximos e rasos que ocorreram nos seguintes
ambientes geológicos: (a) uma bacia sedimentar com velocidade da onda P igual a 3,8 km/s e
VP/VS igual a 1,80; (b) em uma região com embasamento aflorante, VP igual a 5,8 km/s e VP/VS
igual a 1,73.
2) Considerando
os dois casos acima (bacia sedimentar e embasamento), determine as distância
hipocentrais de um sismo raso (profundidade focal igual a zero) para cada estação sismográfica
citada na tabela abaixo.
Estação
WIEB
QABB
SEGB
DIEB
CALB
S-P (seg.)
10
12
5
22
8
Distância na Bacia Sedimentar (km)
Distância em Embasamento (km)
3) A estação WIEB, que está localizada em uma bacia sedimentar, registrou um sismo com S-P=10
segundos e profundidade focal conhecida de 5 km. Neste caso, qual é a distância epicentral (em
km) para a estação WIEB?
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2.2 Distância Epicentral, Azimute e Back-Azimute para o Modelo de Terra Plana
Um hipocentro é definido por sua latitude (φH), longitude (λH) e profundidade focal (ZH), e da mesma
forma, uma estação sismográfica é definida espacialmente por sua latitude (φST), longitude (λST) e sua
altitude (ZST). A profundidade focal, em geral, é dada em quilômetros, e é medida com referência ao
nível do mar, sendo positiva para baixo. A altitude da estação também deve ser dada em
quilômetros, porém muitos programas utilizam a unidade metro, sendo medida com referência ao
nível do mar e com valores positivos para cima. Desta forma, as distâncias em quilômetros entre as
coordenadas X (longitudes) e Y (latitudes) do hipocentro e da estação, são dadas por:
௞௠
∆‫ = ݕ‬111,195 ቀ௚௥௔௨ቁ ൫φௌ் − φு ൯
(1.9)
φೄ೅ ାφಹ
∆‫ = ݔ‬111,195 ቀ௚௥௔௨ቁ ሺλௌ் − λு ሻ cos ቀ
௞௠
ଶ
ቁ
(1.10)
Onde as coordenadas são ângulos dados em graus. O número 111,195 é calculado considerando o
raio médio da Terra de 6.371 km.
A distância epicentral de um sismo, ∆ (em km), é dada por:
∆= ඥ∆‫ ݔ‬ଶ + ∆‫ ݕ‬ଶ
(1.11)
Já o BackAzimute (BAz)e o Azimute (Az) serão dados por:
‫ = ݖܣ‬tan ିଵ ሺ∆‫ݕ‬/∆‫ݔ‬ሻ
‫ = ݖܣܤ‬tan ିଵ ሺ∆‫ݕ‬/∆‫ݔ‬ሻ + 180 = ‫ ݖܣ‬+ 180
Exercícios:
1) Determine a distância epicentral, azimute entre o epicentro e a estação, e o back azimute entre a
estação e o epicentro para os casos abaixo:
φH (o)
λH (o)
Latitudes Pequenas
0
0
0
0
0
-30
Latitudes Médias
40
0
40
0
40
0
Latitudes Grandes
60
0
60
0
60
0
φST (o)
λST (o)
1
5
60
1
5
60
41
45
50
1
5
10
61
65
70
1
5
10
Dist. (km)
Az. (o)
BAz (o)
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3. O Método de Geiger para Localização de Hipocentros
Durante a aula é discutido em sala como executar determinações epicentrais preliminares com uma
estação sismográfica tri-axial utilizando o movimento de partícula da onda P, para determinar o
Back-Azimute (BAz) do evento, e o valor da diferença S-P para determinar a distância hipocentral em
km (∆). Por outro lado, a determinação hipocentral mais praticada na sismologia é a que utiliza o
método de Geiger, apresentado a seguir.
Geiger (1920, 1912) introduziu uma técnica interativa de mínimos quadrados para a localização de
sismos, sendo a técnica mais usada na determinação de hipocentros. Trata-se de uma técnica muito
simples de ser entendida e programada, porém a grande fragilidade do método é que o valor da
resposta depende da distribuição espacial das observações, sendo necessário analisar os resultados
numéricos antes de aceitar a solução final.
O problema de determinação hipocentral é altamente não-linear, já que não há uma relação linear
simples entre os tempos de chegada e as coordenadas espaciais e temporal da fonte do evento. Essa
não linearidade surge na determinação do hipocentro porque a determinação dos azimutes e
distâncias entre cada estação e o evento depende da predição dos tempos de percurso, para o
modelo, que depende da distância e da profundidade focal. Para exemplificar, basta entender que a
primeira chegada da onda P pode ser dada pela onda direta ou outras refrações, dependendo da
distância ou da profundidade focal.
Uma das abordagens mais adequadas nesse caso é linearizar o problema e estudar as pequenas
variações nas coordenadas da fonte. Para simplificar essa apresentação, vamos considerar o
problema de um sismo local, para o qual se pode usar um sistema de coordenadas cartesiano. Essa
abordagem pode ser bem aplicada para estudo de atividade sísmica local induzida por reservatórios
ou minas.
Vamos supor que as coordenadas do sismo são (X, Y, Z, T), onde X, Y e Z são as coordenadas espaciais
e T é a hora de origem (lembre-se que as três coordenadas espaciais definem o hipocentro, e as duas
primeiras definem o epicentro). Agora, vamos supor que as coordenadas da j-ésima estação é (xj, yj,
0), onde estamos assumindo que a estação se encontre na superfície da Terra (na altura do geóide).
Para a estação j-ésima, o tempo de primeira chegada da onda sísmica é tj.
Nesse sistema de coordenadas, a diferença entre os tempos das primeiras chegadas observado e
previsto para o tempo da estação j é:
‫ݏ݁ݎ‬௝ = ‫ݐ‬ை஻ௌ,௝ − ‫்ݐ‬ாைோூ஼ை,௝
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Onde:
‫்ݐ‬ாைோூ஼ை,௝ = ܶ − ܶܶ൫‫ݔ‬௝ , ‫ݕ‬௝ , 0, ܺ, ܻ, ܼ൯
Onde TT é o tempo de percurso de uma determinada fase sísmica e das coordenadas da estação e do
hipocentro. Um valor de resíduo diferente de zero pode acontecer devido a ruídos nos tempos de
chegada das ondas sísmicas, a erros no modelo de velocidade utilizado na previsão dos tempos de
percursos das ondas sísmicas ou devido a erros na localização geográfica e temporal do foco do
sismo.
A linearização do problema parte do pressuposto de que o resíduo nos tempos de chegada ocorre
devido a erro na posição do hipocentro (X0, Y0, Z0, T0), onde o indicie “0” indica um valor inicial. Se
quisermos prever o tempo de viagem para uma nova localização (X0+∆X, Y0+∆Y, Z0+∆Z, T0+∆T), a
estimativa do tempo de percurso predito será dada por:
ܶ଴ + ∆ܶ + ܶܶ൫‫ݔ‬௝ , ‫ݕ‬௝ , 0, ܺ, ܻ, ܼ൯ +
߲ܶܶ௝
߲ܶܶ௝
߲ܶܶ௝
∆ܺ +
∆ܻ +
∆ܼ
߲ܺ
߲ܻ
߲ܼ
Onde as derivadas parciais são estimadas com base nas coordenadas (X0, Y0, Z0). Desta forma, a
mudança nas coordenadas influência o resíduo da seguinte forma:
‫ݏ݁ݎ‬௝ = ∆ܶ +
߲ܶܶ௝
߲ܶܶ௝
߲ܶܶ௝
∆ܺ +
∆ܻ +
∆ܼ
߲ܺ
߲ܻ
߲ܼ
Desta forma, as mudanças nas coordenadas iniciais aparecem como termos lineares, permitindo que
o problema possa ser abordado de forma linear, exigindo que as mudanças nas coordenadas ajudem
a minimizar a seguinte expressão através de mínimos quadrados:
ܴ = ෍ ‫ݏ݁ݎ‬௝ଶ
As condições para forçar um valor mínimo de resíduo são:
߲ܴ
= 0;
߲∆ܶ
߲ܴ
= 0;
߲∆ܺ
߲ܴ
= 0;
߲∆ܻ
Isso pode ser colocado na forma matricial mostrada abaixo:
݁
߲ܴ
=0
߲∆ܼ
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‫ۍ‬෍ ܶܶ௑ ܶܶ௑
‫ ێ‬௝
‫ێ‬
෍ ܶܶ௑ ܶܶ௒
‫ێ‬
‫ ێ‬௝
‫ێ‬෍ ܶܶ௑ ܶܶ௓
‫ ێ‬௝
‫ێ‬
‫ ێ‬෍ ܶܶ௑
‫ ۏ‬௝
෍ ܶܶ௒ ܶܶ௑
௝
෍ ܶܶ௒ ܶܶ௒
௝
෍ ܶܶ௒ ܶܶ௓
௝
෍ ܶܶ௒
௝
෍ ܶܶ௓ ܶܶ௑
௝
෍ ܶܶ௓ ܶܶ௒
௝
෍ ܶܶ௓ ܶܶ௓
௝
෍ ܶܶ௓
௝
‫ې‬
‫ۍ‬෍ ‫ݏ݁ݎ‬௝ ܶܶ௑ ‫ې‬
෍ ܶܶ௑ ‫ۑ‬
‫ ێ‬௝
‫ۑ‬
௝
‫ۑ‬
‫ێ‬
‫ۑ‬
෍ ‫ݏ݁ݎ‬௝ ܶܶ௒
∆ܺ
‫ۑ‬
‫ێ‬
‫ۑ‬
෍ ܶܶ௒ ∆ܻ
‫ۑ‬቎ ቏ = ‫ ێ‬௝
‫ۑ‬
௝
‫ܼ∆ ۑ‬
‫ێ‬෍ ‫ݏ݁ݎ‬௝ ܶܶ௓ ‫ۑ‬
‫ ێ‬௝
‫ۑ‬
෍ ܶܶ௓ ‫ܶ∆ ۑ‬
‫ۑ‬
‫ێ‬
‫ۑ‬
௝
෍
‫ݏ݁ݎ‬
‫ۑ‬
‫ێ‬
‫ۑ‬
௝
ܰ
‫ے‬
‫ ۏ‬௝
‫ے‬
Onde se utilizou a notação abreviada TTX=૒TTj/૒X, e utilizou-se o fato de que ૒TTj/૒T=1.
A solução para esse sistema de equação lineares fornece os valores das mudanças a serem realizadas
na posição da fonte, de forma que as coordenadas do próximo passo da iteração é:
ܺଵ = ܺ଴ + ∆ܺ
ܻଵ = ܻ଴ + ∆ܻ
ܼଵ = ܼ଴ + ∆ܼ
ܶଵ = ܶ଴ + ∆ܶ
Esse processo é repetido novamente para calcular X2=X1+∆X, Y2=Y1+∆Y, Z2=Z1+∆Z e T2=T1+∆T, e assim
por diante, até que esse processo iterativo alcance valores de ∆X, ∆Y, ∆Z e ∆T suficientemente
pequenos e que definem o fim do processo de convergência.
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