ANÁLISE COMPORTAMENTAL DE INDIVÍDUOS DE ONÇA PARDA (Puma concolor)
DA FUNDAÇÃO ZOOLÓGICO DO RIO DE JANEIRO-RJ
Carvalheira, Rodrigo Guerra (Orientador)1
Valente, Olinda Olegário da Silva2
Palavras-chave: Etologia. Felinos Neotropicais. Onça Parda.
Introdução
O objetivo deste artigo é uma pesquisa observacional etológica, identificando os padrões
comportamentais, quantificando e qualificando-os para montar um etograma através da descrição
dos comportamentos individuais de um casal de suçuaranas, conhecidos também como: puma,
leão da montanha ou onça parda, mantidos no plantel da Fundação Zoológico da Cidade do Rio
de Janeiro (RIOZOO).
Como a maioria dos animais cativos, como os que vivem em zoológicos, é comum seus
comportamentos apresentarem alguma variação em função de não estarem em seus ambientes
naturais. Através do etograma, temos um maior conhecimento sobre a rotina desses animais
dentro do recinto, favorecendo assim a análise dos possíveis fatores geradores de
comportamentos atípicos, sendo eles: a forma do manejo alimentar ou sanitário, temperatura,
odores, público, ruídos etc. e suas respectivas interferências no comportamento destes animais;
visando à importância de uma manutenção adequada e uma possibilidade real da eliminação
destes fatores agregando qualidade de vida e proporcionando o bem-estar ao animal e induzindoos a terem comportamentos naturais.
1
Curso de Ciências biológicas da Universidade Castelo Branco, Rio de Janeiro-RJ.
[email protected]
2
Graduanda do Curso de Ciências Biológicas da Universidade Castelo Branco. Aluna bolsista Programa de Pesquisa
Institucional de Iniciação Científica & Tecnológica 2013/2014.
E-mail: [email protected]
Procedimentos Metodológicos
O presente estudo foi realizado na Fundação Zoológico do Rio de Janeiro (RIOZOO),
localizado dentro do parque da Quinta da Boa Vista, Bairro Imperial de São Cristóvão, na cidade
do Rio de Janeiro, Brasil. Como requisito parcial do trabalho, foi feito o levantamento dos
comportamentos de um casal de Puma concolor, mantidos no plantel do zoológico ocupando o
mesmo recinto. Os métodos de amostragem utilizados para o levantamento dos comportamentos
foram o ad libitum (ALTMANN, 1974) e o scan sampling (SOUTO, 2003).
O trabalho foi realizado entre outubro de 2013 e abril de 2014, com uma carga horária de
144 horas totais, sendo divido em três etapas. A primeira etapa, tendo início em outubro,
consistiu na entrevista com o profissional do zoológico responsável pelo setor dos felinos no
qual o animal em questão se enquadra para pesquisar todas as informações referentes ao animal
de estudo, o que inclui levantamento dos dados de manejo, informações sobre o recinto e o
animal durante um dia, entre 9 horas até às 17 horas. Essa etapa auxiliou na divisão do recinto
em quadrantes facilitando a visualização e a marcação dos indivíduos, determinando o local em
que os mesmos ocupavam.
Na segunda etapa, que perdurou por cinco dias não sucessivos durante os meses de
outubro e novembro de 2013, sendo escolhidos de acordo com a disponibilidade respeitando o
prazo do andamento do trabalho. Foi aplicado o método ad libitum para elaboração do catálogo
completo dos comportamentos observados denominado etograma; neste método, os registros dos
animais são feitos através de observações levando em consideração quaisquer comportamentos
realizados pelo animal. As observações foram devidamente registradas em caderno de campo,
sempre com duração de duas horas no período da manhã e cinco horas no período da tarde,
totalizando setenta e duas horas de observações, tendo intervalo entre os horários de 11h-12h.
A terceira etapa incluiu o levantamento da frequência de cada comportamento observado,
utilizando o método scan sampling (SOUTO, 2003), que se caracteriza em fazer rápidas
observações do momento, realizada durante um minuto a cada cinco minutos, registradas
também em caderno de campo e no etograma. Essa etapa do trabalho durou dezoito dias, as
observações tiveram duração de duas horas pela manhã e duas horas pela tarde, sendo três dias
de cada mês, visto que na etapa anterior durante a confecção do etograma pelo método ad libitum
foram eliminadas duas horas de observações, que seriam no período de 12h-15h, pois foi
irrelevante para o estudo à medida que foi constatado que os animais possuíam uma baixa
atividade em função da própria biologia dos felinos referente aos horários de sol a pino. Essa
etapa teve início em novembro de 2013 e findou em abril de 2014. As observações realizadas
aqui ocorreram durante três dias em cada mês, entre aqueles com alta visitação (domingos), sem
visitação (segundas-feiras) e dia de baixa visitação (terças-feiras).
Análise de Dados
A transformação dos recintos em quadrantes foi um fator determinante na hora de
localizar onde o animal se encontra realizando determinada atividade, facilitando sua
demarcação no ambiente. Esses dados coletados na primeira etapa do trabalho foram de suma
importância para analisar o grau de utilização territorial do espaço do recinto através do método
scan sampling, que também visou a calcular a frequência de ocorrência dos comportamentos
realizados pelos indivíduos.
Foram analisadas as diferentes categorias comportamentais e suas frequências,
evidenciando que o casal de suçuaranas observado passa a maior parte do tempo em descanso no
quadrante 1A, a fêmea na cama e o macho no chão da plataforma embaixo da cama da fêmea.
Discussão dos Resultados
O catálogo comportamental do casal de P. concolor em cativeiro segue:
1. Manutenção (MA)
Comportamentos resultantes de atividades reflexas ou de manutenção da homeostase do
indivíduo, como: lamber, beber água, comer, urinar, coçar, afiar as garras, espreguiçar, bocejar.
2. Exploração (EX)
Atividades de investigação do ambiente onde o animal pode ser encontrado cheirando o chão,
cheirando a área da grade de cambeamento, cheirando o tronco que há dentro do recinto,
cheirando as plantinhas (mato), cheirando a parede do recinto ou farejando o ar.
3. Observação (OB)
Atividade de investigação do ambiente: face virada para o macho, face virada para a fêmea, face
voltada para o lado de fora, face voltada para os visitantes, face voltada para a área de
cambeamento, escutando barulho de carros, escutando barulho no cambeamento e analisar.
4. Locomoção (LO)
Comportamentos ligados ao deslocamento horizontal e vertical do animal; caminhar, correr e
saltar.
5. Estereotipia (EX)
Comportamentos repetitivos, sem sentido, obsessivo, possivelmente devido ao baixo
enriquecimento ambiental e ao estresse causado pelo público: Pacing e Andar em círculos.
6. Descanso (DE)
Comportamentos ligados ao estado estacionário que envolveu atenção ou desatenção em relação
ao ambiente.
Descansar: Postura deitada, com a cabeça erguida com os olhos abertos ou fechados, na qual o
animal reage aos estímulos do ambiente em menor grau de variação.
Deitado: Animal com o corpo estendido, deitado na cama ou no chão do recinto, com os olhos
abertos ao ambiente e reativo aos estímulos externos.
Em pé, sentado e dormindo.
7. Comportamento Social Agonístico (CSA)
Interação direta entre os indivíduos, ou com o público, que envolva algum tipo de luta ou
conflito.
Ronronar, deslocar o outro e ser deslocado.
Em outras ocasiões, os animais ficavam fora do alcance da visão porque estavam dentro
do cambeamento ou porque deitavam nas partes altas do recinto em que não havia possibilidades
de enxergá-los, só havendo a percepção de que estavam no local quando os mesmos levantavam
a cabeça e devido à ausência de deslocamento.
Os períodos de maior atividade como exploração do ambiente e alimentação
concentravam-se entre 16h e 17h para ambos, ocorrendo com mais frequência e sendo mais
perceptível para a fêmea após a morte do macho que aconteceu em janeiro de 2014, indicando
que possivelmente ela evitava o contato com o mesmo, dados de leituras de diversos autores que
afirmam que estes animais, quando em vida livre, têm hábitos de vida solitários, com exceção de
algumas ocasiões, como disputas entre machos pelo domínio de fêmeas ou território, durante
breve períodos de acasalamento, fêmeas com filhotes pequenos etc. A fêmea passou a maior
parte do tempo em descanso e observação, dormindo e analisando, respectivamente.
Comportamentos anormais, como estereotipias (33%) e exploração (56%), foram registrados
poucas vezes.
O macho passou praticamente todo o tempo de observação descansando embaixo da
cama da fêmea, fato este que pode estar relacionado com a sua morte, apresentou pouquíssimos
movimentos exploratórios ao qual para os resultados foram insignificantes.
Entre o período de 09h e 11h, os comportamentos basicamente se limitavam a descanso e
manutenção, como se lamber, coçar, descansar e dormir para a fêmea. O macho passou a maior
parte do tempo observado dormindo, quando não, estava no cambeamento. Apresentando poucas
variações nos seus comportamentos durante todo o trabalho de campo, fato este que pode estar
relacionado com a sua morte, em que talvez estivesse dando indícios de algum sintoma. Poucos
eventos como exploração foram observados nesses horários.
Os comportamentos mais frequentes nas horas de maiores atividades da fêmea eram de se
deslocar na parte frontal do recinto e beber água.
Os locais mais utilizados pela fêmea para descansar e analisar era a cama 1-1A na plataforma
mais alta, com 3750% correspondendo a 675 vezes em que ela ocupou a área, com 267% o
quadrante 4F no canto direito encostada na parede da plataforma e com 6% do quadrante 3F na
plataforma mais alta em baixo da cama2.
O macho se instalou mais vezes na plataforma 1A embaixo da cama da fêmea com poucos
movimentos, às vezes dormindo e na maior parte do tempo fora do alcance da visão.
Considerações Finais
A frequente fragmentação e degradação dos habitats, além da caça predatória e comércio
ilegal, vem fazendo com que, a cada dia, mais espécies animais entrem nas listas de ameaçados
de extinção, sendo muitas delas, representadas apenas em cativeiro. Dessa forma, os zoológicos
têm um papel fundamental na conservação, seja incentivando a reprodução dessas espécies como
formando um banco genético para futuras pesquisas e manutenção da sua diversidade genética.
Portanto, o estudo do comportamento de animais cativos é essencial para um melhor
conhecimento dos variados comportamentos apresentado por eles, detectar possíveis sinais de
estresse para melhorar os padrões de vida desses animais.
A baixa atividade dos animais em questão mostrados neste trabalho pode estar
relacionada com o padrão de atividades destes animais em seu ambiente natural. Segundo
Almeida (2007), na natureza, os felídeos são predadores de topo de cadeia que necessitam
apenas de uma parte do dia para caçar sua presa; o restante do tempo é gasto em atividades
sociais, em descanso ou em patrulha de território. Isso poderia explicar os grandes períodos de
inatividade e até mesmo um fator de estereotipia apresentado pela fêmea.
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Acessado em: outubro de 2014.
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