UNIPINHAL
CENTRO REGIONAL UNIVERSITÁRIO
DE ESPÍRITO SANTO DO PINHAL
FUNDAÇÃO PINHALENSE DE ENSINO
AVALIAÇÃO DO IMPACTO DE UM MODELO DE RÁDIOCOLAR EM UM QUATI, Nasua nasua (Linnaeus, 1766)
(MAMMALIA: CARNIVORA) EM CATIVEIRO.
Wanella D’Avila Bitencourt
ESPÍRITO SANTO DO PINHAL - SP
2008
II
UNIPINHAL
CENTRO REGIONAL UNIVERSITÁRIO DE ESPÍRITO SANTO DO
PINHAL
FUNDAÇÃO PINHALENSE DE ENSINO
AVALIAÇÃO DO IMPACTO DE UM MODELO DE RÁDIOCOLAR EM UM QUATI, Nasua nasua (Linnaeus, 1766)
(MAMMALIA: CARNIVORA) EM CATIVEIRO.
Designação da área: Ecologia
Aluno: BITENCOURT, Wanella
Orientador: NAKANO – OLIVEIRA, Eduardo
Trabalho apresentado ao
Curso
de
Ciências
Biológicas, para obtenção
do Grau de Bacharel em
Ciências Biológicas.
ESPÍRITO SANTO DO PINHAL – SP
2008
III
Dedicatória
Dedico carinhosamente este trabalho a Profa.
Dra. Selma Candelária Genari.
IV
AGRADECIMENTOS
Ao Eduardo Nakano, meu orientador, pela oportunidade e confiança.
A todos os funcionários do Zoológico Municipal de Mogi Mirim, por autorizar a
realização do meu trabalho e colaborar com as “exigências” necessárias durante a
pesquisa.
Ao Biólogo Paulo Manaf, pelas importantes considerações que foram
determinantes para a interpretação dos resultados.
Ao Professor Ricardo Tiburcio, pela colaboração com a estatística do
trabalho.
Ao Júnior do Museu de História Natural de Itapira, pelas teses trazidas da
biblioteca da UNESP de Rio Claro, que foram indispensáveis para a conclusão deste
estudo.
A minha mãe Izabel, por todo amor, carinho e incentivo que me dedicou
durante o período da minha graduação.
Ao meu irmão Wallace, que apesar de sempre ter me causado aborrecimento
na hora de usar o computador, teve a proeza de conseguir entrar nesta lista graças
à ajuda financeira, que permitiu a compra da minha câmera fotográfica, equipamento
que foi fundamental para o desenvolvimento da pesquisa, sendo assim, obrigado!
As minhas queridas amigas, Bárbara, Mille e Marcela, pessoas iluminadas,
pela amizade, pelo companheirismo e amizade!!!
A turma da Biologia de 2003, pelos ótimos momentos, viagens e boas risadas!
A Malu (filhote de museu), pela sua amizade, sinceridade e ombro amigo,
sempre disponível em ajudar!
Aos meus eternos amigos da 1ª Turma da Bio em Pinhal!!! Luanda, Rafa,
Fabi, Zuza, Leandro, Véio (Adriano).
Aos meus inesquecíveis professores, Selma e Arnaldo, pela amizade,
conselhos e principalmente por vocês terem acreditado no meu potencial, quando eu
mesma já não acreditava que ele existia.
E por fim, eu agradeço ao tempo, que me deu estrutura e maturidade para
concluir este trabalho visando novos objetivos e ao destino, por ter driblado os anos,
possibilitando que eu conhecesse as pessoas certas nos momentos certos.
V
“Não tenha medo das Tempestades,
aprenda a manejar bem seu barco e não
mude o curso de sua viajem, só assim
chegará em seu destino.”
Michelle Miguelete
VI
Resumo
Avaliação do Impacto de um modelo de Rádio-Colar em um quati,
Nasua nasua (Linnaeus, 1766) (Mammalia: Carnivora) em cativeiro.
Aluna: BITENCOURT, Wanella
Orientador: NAKANO - OLIVEIRA, Eduardo
O quati (Nasua nasua) pertence a família Procyonidae (Carnivora: Mammalia)
e é uma espécie exclusiva da América do Sul. São principalmente diurnos e
possuem grande habilidade de escalar árvores. As fêmeas andam em grupos com
os machos mais jovens, enquanto os machos adultos são frequentemente solitários.
Possuem caráter oportunista, alimentando-se dos itens que se encontram em maior
disponibilidade, e sua dieta onívora pode indicar grande potencial dispersor. Devido
ao hábito críptico, a coleta de dados mais detalhado de carnívoros em seu ambiente
natural exige a utilização de técnicas mais sofisticadas como rádio-telemetria, que
permite ao observador manter contato com o mesmo indivíduo durante longos
períodos, possibilitando então, a coleta de informações importantes sobre o
comportamento desses animais. Porém, existem poucos estudos que avaliam se o
rádio-transmissor causa alguma interferência no comportamento natural dessas
espécies, havendo ainda duvidas sobre o grau de eficiência da técnica quanto ao
bem estar do animal no período do monitoramento. Sendo assim, o objetivo do
presente trabalho é avaliar se um modelo de rádio-colar causa alguma alteração no
comportamento habitual de um quati em ambiente de cativeiro. A pesquisa foi
realizada no Zoológico Municipal de Mogi Mirim “Luís Gonzaga de Amoedo
Campos”, localizado no município de Mogi Mirim, interior do estado de São Paulo,
no período de 12 de maio a 27 de agosto de 2007. Para efetuar a comparação dos
comportamentos, foi aplicado um etograma, antes durante e depois da implantação
do colar. A confecção do protótipo do rádio-colar seguiu o padrão estético dos
equipamentos reais, sendo respeitado o tamanho e o peso indicado para a espécie
em questão. A quantificação do etograma seguiu a metodologia de amostragem
“animal-focal”, onde um comportamento era registrado a cada 10 minutos em blocos
com duração de 1 hora, sendo que a coleta de dados foi realizada duas vezes por
semana em horários variados dentro dos períodos matutino e vespertino, totalizando
126 horas de observação. Após o termino das observações, pôde-se concluir que o
rádio-colar testado não causou alterações significativas no comportamento do quati,
sugerindo que a técnica de rádio-telemetria trata-se de um método eficiente para a
coleta de informações de animais silvestres in situ.
Palavras Chave: Procyonidae, Nasua, etograma, rádio-telemetria.
VII
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO..................................................................................................
1
2. OBJETIVO........................................................................................................
6
3. JUSTIFICATIVA................................................................................................
7
4. MATERIAL E MÉTODOS.................................................................................
8
4.1 Área de Estudo.....................................................................................
8
4.2 Local da Amostragem..........................................................................
8
4.3 Técnica de Observação.......................................................................
9
4.3.1 Categorias Comportamentais................................................. 10
4.3.2 Quantificação e Mapa Ambulatório......................................... 11
4.4 Rádio Colar.......................................................................................... 12
4.4.1 Instalação e Remoção do Colar............................................. 13
5. ANÁLISE DOS RESULTADOS......................................................................... 15
6. RESULTADOS.................................................................................................. 16
7. DISCUSSÃO..................................................................................................... 23
8. CONCLUSÃO................................................................................................... 27
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 28
10. ANEXOS......................................................................................................... 35
VIII
FIGURAS
Fig. 01: Mapa da distribuição geográfica do quati (Fonte: CAMPOS, 2006)
2
Fig. 02: Nasua nasua (Foto: Guto Bertagnolli)
3
Fig. 03: Localização do Município de Mogi Mirim – SP (Arte: Wanella Bitencourt)
8
Fig. 04:Visão frontal,posição do recinto e posição de observação (Foto: Wanella Bitencourt)
9
Fig. 05: Mapa ambulatório do recinto dos quatis (Arte: Wanella Bitencourt)
12
Fig. 06: Protótipo do rádio-colar e quati portando a réplica (Foto: Wanella Bitencourt)
13
Fig. 07: Comparação dos resultados obtidos durante a quantificação dos comportamentos.
19
Fig. 08: Freqüência da utilização das posições do recinto
19
Fig. 09: Freqüência da utilização dos quadrantes do recinto.
20
Fig. 10: Comparação entre a preferência na utilização das áreas suspensas ou do solo.
21
Fig. 11: Comparação entre as atividades realizadas no sábado e segunda-feira.
21
Anexo A: Imagem satélite do Zoológico Municipal de Mogi Mirim-SP (Fonte: Google Earth)
35
Anexo C: Fêmea investigando o QC após a colocação do colar. (Foto: Wanella Bitencourt)
36
Anexo D: Grupo dormindo junto na 2ª fase. (Foto: Wanella Bitencourt)
36
IX
TABELAS
Tabela 1: Qualificação dos comportamentos
11
Anexo B: Ficha do etograma.
35
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA UNIPINHAL
B624a
Bitencourt, Wanella D’Avila
Avaliação do impacto de um modelo de rádio-colar em um
quati, Nasua nasua (Linnaeus, 1766) (Mammalia: Carnivora) em
cativeiro. / Wanella D’Avila Bitencourt. Espírito Santo do Pinhal:
UNIPINHAL , 2008.
36 p.
1. Procyonidae
. 2. Nasua. 3. Etograma. 4. Rádio-telemetria. I.
Título.
CDU 57
1
1. Introdução
No Brasil são encontradas atualmente 29 espécies da ordem Carnivora,
sendo eles representantes das famílias Felidae, Canidae, Mustelidae, Otariidae,
Mephitidae e Procyonidae. Uma das características comuns desta ordem é a
adaptação a predação, pois seus crânios, músculos e dentes apresentam um
conjunto que permite facilmente, encontrar, capturar e matar animais
(EISENBERG & REDFORD, 1999).
Ao longo do processo evolutivo e da diversificação da ordem Carnívora,
várias espécies adquiriram dieta onívora com acentuado hábito frugívoro ou
insetívoro. São responsáveis pela ocupação de uma gama de nichos,
representando o papel de predadores de topo das teias alimentares graças às
diferenças na dieta, tamanho, forma e hábitos de vida variados. Desta forma,
desempenham a função de reguladores do tamanho das populações de suas
presas e contribuem para a manutenção do equilíbrio dos ecossistemas (EWER,
1973; EMMONS & FEER, 1997; EISENBERG & REDFORD, 1999; NOWAK,
1999; TERBORGH et al. 1999).
A família Procyonidae possui seis gêneros (Bassaricyon, Bassariscus, Nasua,
Nasuella, Potos e Procyon), sendo que apenas Bassariscus e Nasuella não
ocorrem no Brasil. A maioria dos procyonideos tem hábitos noturnos, são
geralmente solitários, mas algumas espécies podem viver em bando. São
essencialmente onívoros, alimentando-se de frutos, néctar e invertebrados. Uma
característica comum em todas as espécies desse grupo é a capacidade de
escalar árvores e criar seus filhotes em ninhos arbóreos (EISENBERG &
REDFORD, 1999).
O quati (Nasua nasua) é uma espécie exclusiva da América do Sul e é
encontrado nos biomas Amazônia, Cerrado, Caatinga, Pantanal, Mata Atlântica e
Campos Sulinos (EMMONS & FEER, 1997), (Figura 1). Pode chegar a ter
30,5cm de altura, com comprimento corpóreo variando entre 43-66cm mais 2269cm de cauda, podendo atingir até 11kg (FRANCIOLLI, 2005). São facilmente
identificados por possuírem uma cabeça alargada e terminada em um estreito e
prolongado focinho com um nariz muito saliente e pontiagudo (CABRERA &
YEPES,1960; CHEIDA et al., 2006 ), os dentes caninos são grandes e
2
especialmente baixos. Suas patas dianteiras são mais curtas e com longas
unhas, e as patas traseiras são mais longas com unhas fortes e mais curvadas
(EMMONS, 1990; NOWAK, 1991). São inconfundíveis também devido ao rabo
listrado, o qual é geralmente mantido em posição perpendicular ao corpo
(EISENBERG & REDFORD, 1999).
Figura 1: Mapa da distribuição geográfica do N. Nasua (Fonte: CAMPOS, 2006).
São predominantemente diurnos e podem viver em grupos de mais de 30
indivíduos, as fêmeas andam em grupos com os mais jovens, enquanto os
machos adultos são freqüentemente solitários (EMMONS & FEER, 1997;
NAKANO-OLIVEIRA, 2002). Entretanto, de acordo com Nakano-Oliveira (2002),
embora os quatis estivessem ativos na maior parte do dia, também foi observado
alguma atividade noturna. Segundo Gompper e Krinsley (1992) a vida organizada
em bandos possui suas vantagens e por isso, algumas vezes foram observadas
até associações entre machos, pois além de serem observadas cargas de
parasitas bem menores nos indivíduos que vivem em bando do que nos
solitários, esses benefícios incluem também uma cooperação contra possíveis
ataques de predadores.
Apresentam hábitos arborícolas, sua dieta pode variar sazonalmente e é
constituída principalmente de invertebrados, frutos, bromélias e pequenos
vertebrados (EISENBERG & REDFORD, 1999; BEISIEGEL, 2001; NAKANOOLIVEIRA, 2002; CHEIDA et al., 2006). (Figura 2)
3
Figura 2: Nasua nasua (Foto: Guto Bertagnolli).
Beisiegel (2001) observou que em 90,6% dos seus 32 encontros com
quatis na Mata Atlântica, os animais buscavam invertebrados ou pequenos
vertebrados no interior de bromélias epífitas, sugerindo como nos estudos de
Bisbal (1986) e Redford & Stearman (1993) apud Santos & Beiseigel, 2006, que
invertebrados são um componente importante na dieta dos quatis, embora
vertebrados e carniça também sejam consumidos quando encontrados
(GOMPPER & DECKER, 1998). O caráter oportunista dos quatis foi reforçado
nos estudos de Alves-Costa (1998) e Nakano-Oliveira (2002) que observaram
nas amostras fecais uma grande quantidade do item com maior disponibilidade
na época em que suas pesquisas foram realizadas.
Os quatis podem ser considerados dispersores efetivos por atuarem na
remoção da polpa das sementes, o que reduz o ataque de fungos e a competição
entre plântulas, já que as sementes são removidas para longe da planta-mãe
(SANTOS & BEISIEGEL, 2006), desta forma, os quatis realizam um importante
papel na dinâmica das florestas já que suas populações podem influenciar a
regeneração desses ambientes (ALVES-COSTA et al., 2004).
O período de gestação dos quatis é de dez a 11 semanas, nascendo de
dois a sete filhotes (CHEIDA et al., 2006). A área de vida mínima de um macho e
uma fêmea de quati em uma região de Floresta Estacional e Semidecidual
Secundária foram de 4,9 e 6,3km², respectivamente (NAKANO-OLIVEIRA, 2002)
4
e no Pantanal Central (sub-região da Nhecolândia, MS) foi de 1,2 e 1,4km²
(ROCHA, 2006).
Beisiegel (2001) relata que a vocalização baixa, forrageamento e
locomoção silenciosa dos quatis dificultam a localização do grupo por dias
consecutivos, apontando a necessidade da utilização da técnica de rádiotelemetria. Técnica, onde os animais são capturados e equipados com rádiotransmissores e então seguidos à distância (CRAWSHAW, 1979 e NAKANOOLIVEIRA, 2002).
O sistema eletrônico consiste basicamente de um transmissor acoplável
no animal estudado, que emite sinais de rádio captados por um receptor através
de uma antena (JACOB & RUDRAN, 2006), permitindo ao observador manter
contato dia após dia com um mesmo indivíduo durante longos períodos
(EMMONS, 1988 e NAKANO-OLIVEIRA, 2006), sendo capaz de reunir
informações como tamanho da área de uso desses animais; densidade
populacional; comportamento alimentar; seleção de habitat; distribuição de
recursos e interações espaciais entre os indivíduos (HARRIS et al., 1990 apud
VOGLIOTTI, 2003).
Um dos fatores que contribui para a crescente utilização da técnica é a
gama de dispositivos que ela abrange. Atualmente é possível utilizar os rádiotransmissores em quase todos os tipos de animais, como peixes, aves, répteis,
mamíferos e até mesmo em invertebrados (JACOB & RUDRAN, 2006).
A rádio-telemetria é uma tecnologia que vem se desenvolvendo muito na
sua capacidade de localização e monitoramento de espécies evasivas
(MILLSPAUGH & MARZLUFF, 2001 apud VOGLIOTTI, 2003).
Sendo de senso comum que a captura, o manejo e a acoplagem de
instrumentos para a realização de estudos com a técnica da rádio-telemetria,
representam uma interferência, mesmo que temporária nas atividades normais
de um animal (SAMUEL & FULLER, 1994), White e Garrot (1990) recomendam
que a coleta de dados seja iniciada com intervalo de aproximadamente uma
semana após a marcação, permitindo a habituação do animal ao equipamento e
o retorno ao seu comportamento normal. Porém ainda existem dúvidas sobre a
persistência dessas alterações (SAMUEL & FULLER, 1994) e qualidade das
informações coletadas de indivíduos marcados (FRIEND et al., 1994).
5
Apesar dos resultados obtidos por Crawshaw (1995), no Parque Nacional
do Iguaçu, Costa (2003), no Parque da Prosa em Campo Grande, MS, Trovati
(2004) em Lajeado, TO apud Rocha (2006) na Fazenda Nhumirim, Pantanal da
Nhecolândia e Nakano-Oliveira (2002), na Floresta Nacional de Ipanema, SP,
que monitoraram quatis de vida livre por rádio-telemetria terem sido compatíveis
à literatura descrita para a espécie, e desta forma, fortalecer a hipótese de que a
técnica não causa interferências significativas no comportamento do animal,
poucos estudos foram realizados para testar essa hipótese. Entre eles podemos
citar os trabalhos de Nogueira & Marques, (2003) com um cachorro-do-matovinagre (Speothos venaticus) no Zoológico da UFMT em Cuiabá, MT e Narozniak
(2007) que realizou o estudo no Zoológico Municipal de Curitiba com um
exemplar da espécie lobo-guará (Chrysocyon brachyurus).
Assim, esse trabalho teve o objetivo de descrever possíveis alterações
comportamentais de um quati em cativeiro portando uma réplica de rádio-colar.
6
2. Objetivo
A proposta deste trabalho foi avaliar se um modelo de rádio-colar (com as
mesmas medidas e peso de um real) causa alguma alteração no comportamento
habitual de um N. nasua em cativeiro e descrever possíveis variações de
comportamentos na espécie portando o colar. Sendo assim, além de contribuir
para o desenvolvimento da rádio-telemetria, os dados obtidos através desse
estudo poderão fornecer informações para assegurar o bem estar dos animais
monitorados na natureza.
7
3. Justificativa
Embora a melhor estratégia para proteção a longo prazo da diversidade
biológica seja a preservação de comunidades naturais e populações no ambiente
selvagem, pesquisas sobre grupos em cativeiro (ex situ) podem fornecer idéias
sobre a biologia básica de uma espécie e sugerir novas estratégias de
conservação para populações na natureza (in situ) (PRIMACK & RODRIGUES,
2001). Outro aspecto positivo da conservação ex situ é a possibilidade de realizar
testes impossíveis de serem realizados em experimentos de campo (VISSER &
LAMBRECHTS, 1999).
Assim, dados que incluam informações sobre a real eficiência da técnica
são de grande importância para o desenvolvimento da rádio-telemetria e para a
vida do indivíduo no período em que o monitoramento é realizado.
8
4. Materiais e Métodos
4.1 Área de Estudo
O estudo foi realizado no Zoológico Municipal “Luís Gonzaga de
Amoedo Campos”, situada no perímetro urbano do município de Mogi Mirim,
interior de São Paulo. (Figura 3)
O zoológico ocupa uma área de 65.249m² e está localizado entre as
coordenadas geográficas 22° 26' 44,61" S; 46° 57' 13,83" W, a uma altitude média
de 640m (Anexo A). A área é drenada pelo córrego do Aterrado, com regime
pluviométrico 1355mm (média anual). Apresenta solo arenoso (vermelhoamarelo) recoberto por cerrado (Martini S. B. comunicação pessoal).
Figura 3: Localização do município de Mogi Mirim-SP.
4.2 Local da Amostragem
O recinto encontra-se em uma área arborizada e é constituído por troncos que
proporcionam a ligação entre o solo e a base, bebedouro no chão e telhas de
amianto, que promovem a cobertura do “dormitório” dos animais, porém o
cativeiro não apresenta vegetação em seu interior, assim como, um abrigo que
deixe os animais fora do campo visual dos visitantes. O ambiente é
9
compartilhado por três machos e duas fêmeas, sendo que a densidade do recinto
é de um indivíduo por 270m³ (figura 4)
Figura 4: A) Visão frontal do recinto. B) Posição do recinto (ponto x) e Posição
de observação (ponto y).
4.3 Técnica de Observação
Os dados comportamentais foram coletados por observação de um macho
adulto que divide o mesmo recinto com outros quatro indivíduos, sendo que a
escolha desse animal ocorreu pelo fato do indivíduo diferenciar-se dos outros
animais do grupo sem nenhum tipo de marcação.
As coletas de dados foram realizadas entre os meses de Maio a Agosto de
2007, durante os sábados e as segundas-feiras. Todo o trabalho foi desenvolvido
no período diurno entre os horários de 7h30 às 16h30 para os sábados e das
8h30 às 15h30 para as segundas-feiras.
Para efetuar a comparação dos comportamentos, foi aplicado um
etograma, antes durante e depois da implantação do colar. A quantificação
seguiu a metodologia de amostragem de “animal-focal” (Deag, 1981), onde o
individuo
era
observado
durante
uma
hora
consecutiva,
tendo
um
comportamento registrado a cada dez minutos, com blocos divididos em
intervalos de 1hora cada, totalizando 126 horas de estudo.
A metodologia do etograma permite ao pesquisador descrever as
características básicas do padrão de comportamento de uma determinada
espécie (DEL-CLARO & PREZOTO, 2003), a partir da observação dos diversos
10
tipos de comportamentos realizados pelo animal, assim como as interações
sociais e a maneira em que os indivíduos se dirigem uns aos outros (DEAG,
1981).
4.3.1 Categorias Comportamentais
Um dos procedimentos do etograma é a qualificação dos comportamentos
observados,
onde
serão
descritos
pelo
pesquisador
e
quantificados
posteriormente, fornecendo os dados matemáticos da pesquisa (DEL-CLARO &
PREZOTO, 2003).
A caracterização do comportamento padrão dos quatis do Zoológico de
Mogi Mirim foi feita durante a realização do projeto piloto, que ocorreu no dia 22
de Fevereiro de 2007, com 6 horas de observações. Neste período foi
acompanhado o padrão de atividade dos animais presentes no recinto e os
eventos
comportamentais
apresentados
na
ocasião,
foram
descritos
e
classificados em seis categorias, porém todos os comportamentos que
apresentaram freqüência menor que 1% foram desconsiderados na análise
estatística.
Os comportamentos observados foram agrupadas em seis categorias
(tabela 1):
•
ALIMENTAÇÃO: relacionado à ingestão de alimento e o ato de beber
água;
•
ATENÇÃO: posturas em pé ou sentado, onde o animal permanece com
os olhos abertos, mas não necessariamente acompanhando movimentos,
eles podem ficar fixos em uma única direção;
•
DESLOCAMENTO: movimentação do animal com mudança de aspecto
físico, como: andar, correr, pular, explorar e forragear;
•
HIGIENE: seqüências comportamentais de auto-higiene, incluindo o ato de
lamber e coçar.
•
INTERAÇÃO SOCIAL: contato físico entre o individuo observado e os
demais quatis do cativeiro.
11
•
REPOUSO: postura deitado, onde o animal permanece em descanso,
podendo ou não estar com os olhos abertos, sendo que não há atividades
nem deslocamento.
Tabela 1 – Qualificação dos comportamentos.
Categorias Comportamentais
Comportamento
Alimentação
Atenção
Deslocamento
A – Andar
C – Comer
Interação
Social
Repouso
X
X
CAV - Cavar
CB – Comer bandeja
Higiene
X
X
CÇ – Coçar
X
CÇO – Coçar outro
X
CF – Comp. fuga
X
CZ – Cruzar
X
DE – Deitar
X
DJ – Dormir junto
X
DS – Dormir separado
X
F – Forragear
X
PA – Parado
X
SE – Sentado
X
TL – Trocar lugar
X
4.3.2 Quantificação e Mapa Ambulatório
Durante a quantificação do etograma foi registrado um comportamento para
cada dez minutos de observação, dentro de cada bloco de 1 hora. A ficha de
etograma foi formulada para obter as seguintes informações: hora, quadrante
onde o animal se encontra posição no recinto, comportamento, interação com a
coleira e observações em geral. Após a quantificação, cada ficha foi identificada
pela data e etapa apresentada na própria ficha (Anexo B).
A atividade locomotora apresentada pelo indivíduo no recinto durante o
estudo pôde ser acompanhada pelo mapa do cativeiro. Através dele foi possível
12
identificar o local exato onde cada comportamento quantificado foi realizado,
assim como, as suas respectivas áreas, através dos quadrantes delimitados
pelas linhas imaginarias como demonstra a figura 7.
Figura 5: Mapa ambulatório do recinto dos quatis - Zoológico de Mogi Mirim-SP
Foram considerados no total cinco pontos amostrados: BA - Base, SOL Solo, TRA - Tronco A, TRB - Tronco B, TRC - Tronco C. O espaço denominado
como solo abrange toda a área do recinto já que tanto a base quanto os troncos
encontram-se suspensos.
4.4 Rádio Colar
Para a realização deste experimento foi necessário confeccionar uma réplica
de rádio-colar com as mesmas características de um modelo usado no
monitoramento de quatis. A montagem do protótipo do colar seguiu o padrão
estético dos equipamentos reais, sendo respeitado o tamanho e o peso indicado
para
a
espécie
em
questão
segundo
orientações
obtidas
nos
sites:
www.telonics.com e www.atstrack.com. (Figura 5).
A preocupação com a similaridade entre a réplica confeccionada e um rádiocolar original transpassam as necessidades do aspecto físico, já que atualmente
ainda existem dúvidas sobre o peso ideal que deve ser atribuído para cada
13
espécie sem que ela tenha prejuízos enquanto realiza suas atividades habituais,
assim como o convívio social com outros indivíduos no período em que ocorre
seu monitoramento, sendo assim foi considerado a sugestão descrita na
literatura que indica 3% do peso do animal como peso máximo para o rádio-colar
(CRAWSHAW, 1992). O colar usado no experimento pesava 105gr, cerca de
1,61% do peso do animal que tinha 6,200kg.
Figura 6: A) Protótipo do rádio-colar. B) Quati portando a réplica do colar.
4.4.1 Instalação e Remoção do Colar
No dia 21 de junho, período de transição entre a 1ª e 2ª etapa do estudo, foi
realizado o procedimento para colocar a réplica do colar no quati. A ocasião
contou com a presença de um pesquisador com experiência em trabalhos
envolvendo captura, contenção e monitoramento por rádio-telemetria além do
corpo técnico do zoológico, composto por tratadores e veterinários.
A captura do quati dentro do recinto foi realizada através de puçás e com a
finalidade de minimizar o stress do animal durante o procedimento, foi aplicada
uma dose de 0,5ml de xilasina, porém a medicação não causou o resultado
esperado sendo necessário realizar a contenção do animal dentro do puçá, onde
o colar foi devidamente colocado. Após a instalação do equipamento o individuo
foi pesado indicando seu peso de 6,5kg, o que explica a ação insuficiente do
tranqüilizante no animal, já que a dosagem ideal para seu peso seria de 0,65ml
(Martini S. B. comunicação pessoal).
14
A remoção do colar foi realizada no dia 2 de agosto, período de transição
entre as fases 2 e 3. O procedimento foi efetuado pela equipe técnica do
zoológico que dispensou o uso de medicação. A contenção do quati foi de forma
mecânica através de puçás e o colar foi cortado com um estitele.
15
5. Análise dos Resultados
Durante o período do estudo foram obtidos três tipos de dados em cada fase. Os
dados comportamentais foram separados entre seis categorias e tiveram suas
porcentagens somadas de acordo com a classificação correspondente. As
informações coletadas sobre a posição do recinto e a freqüência da utilização dos
quadrantes tiveram seus resultados calculados individualmente. Entretanto, na
segunda fase do trabalho foram considerados somente os dados coletados a partir
da terceira semana desta etapa.
Os dados utilizados para detectar as possíveis diferenças entre as
amostragens obtidas no sábado e na segunda-feira, é o resultado da soma das três
fases do estudo em cada dia da semana, pois já que não houve alterações
significativas após a implantação e remoção do colar, consideramos as três etapas
como fases iguais.
Com a finalidade de detectar possíveis variações nos comportamentos
registrados entre as três fases do trabalho, assim como a utilização das posições e
quadrantes do recinto, foi aplicada uma analise estatística empregando-se o teste do
qui-quadrado.
16
6. Resultados
A primeira fase do estudo ocorreu no período entre os dias 12 de maio a 11
de junho, de 2007. Durante essa etapa foi possível traçar de forma preliminar o
comportamento padrão do indivíduo observado, assim como a sua relação com os
demais animais do grupo.
São vários os fatores que apontaram o quati (QC) observado como sendo o
indivíduo dominante do grupo. Comportamentos como escolher o lugar onde dormir
e ser o primeiro animal do grupo a se alimentar, fazem parte desse conjunto de
evidências.
Os quatis fazem duas refeições por dia, sendo que no período da manha é
oferecido vários tipos de frutas cortadas em cubos e divididas em cinco porções
dentro de bandejas plásticas. No período da tarde a alimentação é composta por
pedaços de carne distribuídos em bandejas ou por pintinhos que geralmente são
espalhados aleatoriamente no solo do recinto.
Com relação ao comportamento de alimentação, o QC era o primeiro animal a
descer para investigar a comida e nos casos das refeições servidas nas bandejas,
ele geralmente escolhia um recipiente e não permitia que outro animal se
alimentasse dela, porém a competição pelos alimentos era maior quando eram
ofertados pintinhos, neste caso o QC era o único indivíduo do grupo que tinha
sucesso ao invadir a área de forrageamento de outro quati.
Quanto ao comportamento social, o QC apresentou uma maior tolerância com
relação a presença das fêmeas, pois além de sempre dormirem próximos e
interagirem diariamente coçando uns aos outros antes e após a realização do
comportamento dormir, o QC permitia a passagem das fêmeas nos troncos, quando
os indivíduos se encontram caminhando em sentido contrário, fato que nunca
ocorreu quando o animal que segue no lado oposto tratava-se outro macho. Apesar
de o grupo dormir a maior parte do tempo juntos, o QC indicava uma preferência
maior em ficar do lado da tela do cativeiro e sempre mais próximo das duas fêmeas,
enquanto os outros machos permaneciam próximos das fêmeas, mas do lado
oposto.
17
O grupo demonstrou na 1ª fase que ambos desenvolvem as mesmas
atividades ao mesmo tempo, assim como, reagem automaticamente juntos a ações
externas, como a manutenção ao redor do recinto ou até mesmo a presença dos
visitantes, esses fatores estimularam o comportamento de defesa dos animais, seja
por meio de vocalização ou no ritmo acelerado de sua locomoção pelo recinto.
Apesar do QC acompanhar a rotina do grupo, ele era sempre o primeiro animal a
acordar e deixar o bando, no período da tarde, tinha o costume de se acomodar em
um dos troncos, cerca de trinta minutos em média antes do tratador chegar com a
comida.
As fêmeas eram responsáveis pela vocalização de alerta, que sempre é
emitido em um ponto elevado.
Considerando que o quati teria certo tempo para se adaptar com o
equipamento, foram adicionadas duas semanas extras na segunda etapa do
trabalho com o objetivo de garantir a padronização dos comportamentos
quantificados, sendo que as observações da fase presente ocorreu entre os dias 23
de junho e 30 de julho, dois dias após a implantação do colar.
Durante o procedimento de implantação do colar, o grupo permaneceu ativo e
vocalizando, esse comportamento continuou mesmo após a soltura do QC dentro do
recinto, já portando o colar. A princípio foi observada uma aproximação aleatória dos
demais indivíduos do bando com relação ao QC, aparentemente o objetivo desse
comportamento era de sentir o cheiro do QC, porém isso não ocorria apenas na
posição onde se encontrava a coleira e sim por todo corpo do animal (Anexo C).
Inicialmente o comportamento do QC ao ser solto no recinto foi de
forrageamento, foi possível notar que o animal ainda estava sobre efeito do
tranqüilizante, já que o mesmo apresentava sinais de desequilíbrio. Apesar de ter
passado pelo procedimento há poucos instantes, ao encontrar a bandeja com
alimentos no solo do recinto o QC parou para se alimentar, permitindo a
aproximação de uma das fêmeas que se retirou logo após cheirar o companheiro.
Após a alimentação o QC se dirigiu até a base junto com os outros quatis.
Neste momento foi possível observar o QC coçando o pescoço e sacudindo o corpo,
aparentemente com o objetivo de acomodar o objeto.
Na primeira amostragem da fase II pode-se observar o comportamento de
sacudir o corpo pelo QC, o mesmo que foi registrado no dia em que o colar foi
colocado,
porém
realizado
durante
a
finalização
de
uma
seqüência
de
18
comportamentos onde o animal coça várias partes do corpo. Desta forma, por estar
associado ao comportamento coçar, pertencente ao grupo da Higiene, a ação de
sacudir o corpo passou a ser considerado como desta mesma categoria.
No entanto, durante a primeira semana que o QC esteve com o colar,
observou-se uma maior aproximação dos machos sempre no momento em que o
grupo estava se preparando para dormir juntos e também quando o QC já estava
deitado.
O interesse dos quatis pelo colar durou duas semanas, nesse período foram
registrados 10 contatos, machos e fêmeas interagiram de diversas formas com o
objeto, como: morder, cheirar e até raspar com as unhas. O QC demonstrou irritação
na primeira semana com a procura dele pelos outros quatis, neste período foram
observados 9 contatos. Porém, este comportamento diminuiu drasticamente na 2ª
semana onde foi registrado apenas uma interação, sendo que nas semanas
seguintes não houve mais contato entre os animais e o colar até a remoção do
objeto. No entanto, o QC não demonstrou estar incomodado com o colar e apesar
da espécie apresentar grande mobilidade nos membros anteriores, além de possuir
unhas fortes, não houve nenhum registro de tentativa de remoção do colar (Anexo
D).
O último ciclo da pesquisa foi realizado entre os dias 31 de julho a 27 de
agosto, dois dias após a remoção do colar e assim como a fase controle, esta etapa
teve a duração de quatro semanas.
Ao compararmos os dados obtidos em cada fase da pesquisa, podemos
observar que as categorias comportamentais obtidas individualmente apresentam
uma porcentagem média semelhante em seus resultados, não havendo alterações
significativas (p > 0,05) no comportamento do quati analisado após a colocação do
equipamento, assim como, após a remoção do mesmo (Figura 7).
Apesar das fases demonstrarem equilibradas entre si, é evidente a diferença
entre a categoria REPOUSO com as demais, isso é o resultado da grande
porcentagem obtida com a realização do comportamento dormir.
19
Categorias Comportamentais
1ª Fase
100%
2ª Fase
3ª Fase
80%
60%
40%
20%
0%
en
Alim
tação
Aten
to
çã o
men
a
c
o
l
Des
o ci a l
Int . S
ne
Higie
Repo
u so
Figura 7: Comparação dos resultados e desvio-padrão obtidos durante a
quantificação dos comportamentos durante as três fases do estudo.
Os
resultados
observados
na
utilização
das
posições
do
recinto,
permaneceram semelhantes entre si nas três etapas do estudo (p > 0,05), sendo
que alta porcentagem obtida na posição BA (base), está diretamente associada ao
comportamento dormir (categoria Repouso), por tratar-se do dormitório do grupo
(Figura 8).
Posição no Cativeiro
1ª Fase
2ª Fase
3ª Fase
SOL
TRA
TRB
100%
80%
60%
40%
20%
0%
BA
TRC
Figura 8: Freqüência e desvio-padrão da utilização das posições do recinto.
20
Assim como foi observado nos gráficos I e II, a utilização dos quadrantes do
recinto se manteve equilibrada durante as etapas realizadas na pesquisa (p > 0,05).
O índice acima de 90% apresentado no quadrante 2A seguiu o padrão dos demais
gráficos, onde ocorreu uma preferência maior por um determinado local, assim
como, uma alta freqüência na realização de determinados comportamentos (Figura
9).
Tanto o QC quanto os demais animais do grupo, demonstraram uma
preferência maior em realizar suas atividades nas áreas elevadas existentes no
recinto, assim como os troncos e a base (Figura 10).
Quadrante
1ª Fase
2ª Fase
3ª Fase
100%
80%
60%
40%
20%
0%
1A
1B
1C
2A
2B
2C
Figura 9: Freqüência e desvio-padrão da utilização dos quadrantes do recinto.
Além do comportamento dormir, atividade mais realizada pelos quatis, os
animais também utilizavam as partes suspensas para comer, ato que tinha início no
solo onde o alimento era disposto e que logo era carregado a um ponto alto onde
era consumido. Sempre quando os animais acordavam para urinar ou defecar,
ambos utilizavam o lado oposto da base para fazê-los, porém quando os animais
estavam forrageando, estes mesmos comportamentos eram realizados no solo.
Todas as vezes que se observaram os quatis cruzando, os animais estavam na
base, no mesmo ponto usado como dormitório do grupo.
21
Preferência pela posição aérea ou terrestre
5%
8%
8%
95%
92%
Fase 1
92%
Fase 2
TR/BA
SOLO
Fase 3
Figura 10: Comparação entre a preferência na utilização das áreas suspensas ou
do solo do recinto. (TR/BA - tronco/base. SOLO - solo).
O nível de atividade entre os sábados e as segundas-feiras não apresentou
alterações significativas (p > 0,05). As interferências causadas no comportamento
dos QC devido ao grande fluxo de visitantes no final de semana, foram poucas,
porém os resultados demonstram que o animal permanece mais tempo próximo do
grupo e se desloca menos que nas segundas-feiras (Figura 11).
Sábado
Segunda
100%
80%
60%
40%
20%
0%
ção
enta
m
i
l
A
Aten
nto
çã o
ame
c
o
l
s
De
ne
H igie
o ci a l
Int . S
R epo
uso
Figura 11: Comparação e desvio-padrão entre as atividades realizadas no sábado e
segunda-feira.
22
No geral, os quatis realizam a maior parte de suas atividades nas partes
aéreas do recinto, participam frequentemente das mesmas atividades ao mesmo
tempo, fazendo com o grupo esteja explorando junto o solo ou então as regiões altas
do recinto e apesar do QC acompanhar o grupo, é ele quem sempre inicia a próxima
atividade a ser realizada.
23
7. Discussão
Todos os resultados obtidos nos três períodos do presente estudo foram
formulados a partir dos dados coletados através do etograma. A técnica permitiu
avaliar cada fase separadamente, possibilitando serem comparadas entre si. Além
de ter contribuído na avaliação do presente estudo o etograma está sendo utilizado
como uma ferramenta importante para trabalhos que envolvem a descrição de
comportamentos de animais que vivem em cativeiro como os estudos desenvolvidos
por Lagos et al.(2000), com onça-parda (Puma concolor) no Jardim Zoológico do Rio
de Janeiro, Da Silva et al. (2002) também com a espécie Puma concolor no
Zoológico de Brasília DF e Teures & Bellini (2003) com algumas espécies da família
Felidae no Zoológico do Parque do Ingá, na cidade de Maringá PR, assim como
para a aplicação e avaliação de enriquecimento ambiental como os trabalhos de
Barreto et al. (2002) com tigre-de-bengala (Panthera tigris tigris) e Barreto et al.
(2004) com Leão (Panthera leo), ambos no zoológico de Brasília DF e Santos et al.
(2007), com Guaxinim (Procyon Cancrivorus) no Zoológico de Uberaba MG.
Ao comparar as atividades realizadas por dois grupos de quatis em cativeiros
de zoológicos diferentes, Campos (2006), relatou uma considerável semelhança
entre o padrão de atividade de cada grupo. Assim como em Mogi Mirim, os grupos
observados por Campos (2006) em Campinas e Paulínia demonstraram uma
preferência maior em realizar os mesmos comportamentos, da mesma forma em que
apresentaram uma dominância maior em escolher determinadas áreas para
efetuarem suas atividades. No centro de Triagem de Animais Silvestre do IBAMA em
Maceió-Alagoas, Cavalcante-Pinto (2008), registrou em um recinto com apenas um
indivíduo que os comportamentos associados ao repouso ocupavam 37,17% das
atividades realizadas pelo quati.
Os animais cativos geralmente têm uma grande quantidade de tempo, mas
com poucas oportunidades comportamentais para ocupá-lo. A falta de possibilidades
comportamentais é especialmente evidenciada nas práticas de alimentação, pois a
comida é entregue aos animais em horários pré estabelecidos o que, por
conseqüência, faz com que não haja necessidade de realização de nenhum
comportamento para garantir o acesso a esse recurso. Uma conseqüência
indesejável desse fato é o desenvolvimento de comportamentos estereotipados, que
24
parecem roubar o lugar de comportamentos naturais vistos na maioria dos animais
de vida livre (SWAISGOOD, 2001).
Assim como nos recintos observados por Campos (2006), os quatis de Mogi
Mirim costumam realizar os comportamentos de “higiene” e “interação” antes e após
a atividade “dormir”. O QC e os demais indivíduos do grupo dormiam sempre no
ponto mais alto do recinto, entretanto, pode-se observar que os animais chegavam a
deitar para descansar nos troncos mais baixos, mas nunca no solo, comportamento
que corrobora com os dados obtidos em vida livre, já que a espécie tem o costume
de dormir nas copas das árvores (EMMONS, 1990; EISENBERG & REDFORD,
1999; BEISIEGEL, 2001; NAKANO-OLIVEIRA, 2002; CHEIDA et al., 2006;).
As atividades do quati observado, assim como dos demais indivíduos do
grupo foram na maioria das vezes desenvolvidas nos pontos altos do recinto,
comportamento que esta provavelmente associada ao comportamento arborícola
descrito na literatura da espécie. Beisiegel (2001), registrou em 69,5% de seus
encontros com os quatis, que os animais se encontravam nas árvores, contra 30,5%
de encontros com os quatis em terra.
Durante as observações realizadas ao longo estudo, foi possível detectar
alguns aspectos que indicam o QC como indivíduo dominante do grupo.
Comportamentos como ter prioridade ao acesso aos alimentos, abrigos e passagem,
são alguns desses indicativos observados com a relação do QC entre os outros
quatis de Mogi Mirim, além dessas evidências Chalmers (1979), relata que a
dominância também pode ser medida através de assimetrias de agressão,
assimetrias de catação prioridade a escolha de parceiros reprodutivos.
Apesar de o quati ser uma espécie que possui os membros anteriores com
unhas longas e fortes (EMMONS, 1990; NOWAK, 1991) e demonstrarem certa
habilidade em manipular alimentos com elas, o QC não apresentou nenhuma
tentativa de remover o colar com as patas dianteiras.
O fato dos quatis cativos terem se adaptado com facilidade à presença do
colar abre o questionamento sobre qual seria o resultado do mesmo experimento
aplicado em animais de vida livre, ou seja, até onde podemos garantir que o animal
que vive no ambiente in situ não sofrerá interferências em seu comportamento
durante a utilização do colar, já que as informações descritas neste trabalho foram
coletadas de animais de cativeiro.
25
O primeiro aspecto que aponta a possibilidade de aceitarmos que o colar não
trás prejuízos para os quatis de vida livre é a própria diferença existente entre os
ambientes in situ e ex situ. Segundo a descrição de Swaisgood (2001), na vida
selvagem o ambiente dos animais é dinâmico, eles têm presas a caçar e predadores
a evitar, alimento a buscar e território a defender, situações que tornam a vida
selvagem cheia de desafios, onde há algo novo a cada dia. Enquanto o ambiente
cativo em comparação com o selvagem é imutável, espacialmente limitado e pobre
de estímulos. Fator este que contribui diretamente ao alto índice apresentado pelos
comportamentos de repouso nos estudos com quatis em cativeiro, já citados neste
trabalho. Assim, diante desta gama de interferências e necessidades a serem
assimiladas pelo animal é possível aceitar que a adaptação de um quati ao colar em
vida livre, apresente um impacto ainda menor com relação aos resultados obtidos
em cativeiro.
Outro ponto importante é a própria conduta ou reação do animal a novas
situações, segundo Hashimoto (2008), o fato de se colocar um animal entre paredes
e telas não exclui os milhões de anos de evolução desta espécie na natureza e suas
conseqüências em termos de necessidade biológicas. Conceito que fortalece a
proposta da utilização de animais da mesma espécie, mesmo em regime de
cativeiro, como modelo para experimentos que não possam ser realizados com
animais de vida livre. Lorenz (1981) descreve que um determinado comportamento é
desenvolvido pela combinação entre fatores externos e internos, fazendo com que
os animais sejam motivados a desempenhar estes comportamentos não apenas
para atingir um objetivo funcional determinado por elementos presentes no ambiente
externo, mas também são movidos por motivação endrógenas (impulsos) “típicas da
espécie”, ditas “inatas” ou “instintivas” não no sentido de se desenvolverem no
individuo de forma inflexível e sem interferência do ambiente, mas no de terem esse
desenvolvimento
fortemente
“canalizado”
por
predisposições
geneticamente
transmitidas e consequentemente sujeitas a seleção natural.
Entretanto, do ponto de vista fisiológico o termo adaptação está ligado ao
processo no qual o receptor deixa de responder a um estimulo constante (Manaf P.,
comunicação pessoal), isso ocorre pela diminuição da capacidade de reação dos
receptores e também dos elementos centrais de transformação (KOLB, 1984). Desta
forma, o uso do colar pode ser chamado de grande adaptação, onde após breve
26
estimulação nos receptores de pressão localizados na pele, ocorre a diminuição da
sensibilidade local (KOLB, 1984).
O bem estar do quati não foi prejudicado durante o período em que o animal
usou o colar, da mesma forma em que não foi observado alterações em seu
comportamento que indicasse sinais de estresse na 2ª fase do experimento.
Segundo Broom & Molento (2004) o fato de um animal evitar ou esquivar-se
fortemente de um objeto ou evento fornece informações sobre seus sentimentos e
conseqüentemente sobre seu bem estar. Quanto mais forte a reação de esquiva,
mais pobre será o bem estar durante a presença do objeto ou fato. Enquanto o
estresse refere-se a situações nas quais existe falência de adaptação (BROOM &
MOLENTO, 2004).
Assim como os trabalhos realizados por Nogueira & Marques, (2003) e
Narozniak (2007), com duas espécies de canídeos, sendo respectivamente um
cachorro-do-mato-vinagre (Speothos venaticus) e um exemplar da espécie loboguará (Chrysocyon brachyurus), o presente estudo constatou que a utilização do
rádio-colar não causou prejuízos significantes para o animal durante o período em
que o objeto foi usado.
Segundo a conclusão de Alves-Costa (1998), os quatis podem ser
importantes componentes no processo de regeneração florestal, já que em sua
avaliação a espécie demonstrou a capacidade de dispersar efetivamente uma larga
variedade de espécies de sementes, características que fazem dos quatis espécies
potenciais para programas de reintrodução em fragmentos florestais. Considerando
a importância da espécie, associada à eficiência das amostragens que podem ser
obtidas através da rádio-telemetria o presente estudo pretende contribuir com novas
informações para trabalhos futuros com quatis em ambientes naturais.
27
8. Conclusão
Pôde-se concluir que o modelo de rádio-colar testado não causou alterações
significativas no comportamento do quati, sugerindo que a técnica de rádiotelemetria trata-se de um método eficiente para a coleta de informações de animais
silvestres in situ.
Apesar dos dados obtidos nesse estudo fazerem parte de um experimento
realizado em cativeiro, ambiente que altera a rotina e funções das espécies
confinadas, os quatis como um grupo social reagiram de forma positiva à presença
de um objeto “estranho” entre eles. Enquanto, a curiosidade demonstrada pelos
companheiros do quati analisado, foi compreendida de maneira saudável e natural,
devida a forma como foram apresentadas.
Além de indicar a necessidade da realização de um programa de
enriquecimento ambiental no recinto dos quatis, com o propósito de colaborar com a
diminuição do alto índice apresentado nos comportamentos de repouso, o presente
estudo sugere que sejam realizados novos trabalhos visando esse mesmo objetivo,
com a finalidade de obter um número de amostragens que assegurem os resultados
obtidos nesta pesquisa.
28
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35
10. Anexos
A - Imagem satélite do Zoológico Municipal de Mogi Mirim (ponto vermelho,
localização do recinto dos quatis). (Fonte: Google Earth)
B – Ficha do etograma.
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C - Fêmea investigando o QC após a colocação do colar.
D - Grupo dormindo junto na 2ª fase, assim como foi descrito na fase controle.
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AVALIAÇÃO DO IMPACTO DE UM MODELO DE RÁDIO