Reabilitação psicossocial nos CAPS Mário Dinis Mateus Dep. de Psiquiatria – UNIFESP CAPS Prof. Luiz da R. Cerqueira 1. Reabilitação 2. Potencialidades nos CAPS 3. Obstáculos nos CAPS Reabilitação psiquiátrica ou psicossocial ? Modelos para a reabilitação do portador de transtorno mental grave 1. Baseado na saúde (medicina) ocidental contemporânea 2. Baseado na crítica ao “modelo biomédico” e na contracultura em geral 3. Baseado nos grupos de auto-ajuda (recovery model) Reabilitação (ou Atenção, ou Clínica) Psicossocial Recuperação de uma vida significativa Maior autonomia possível Estímulo da subjetividade Adaptação e aprendizagem de habilidades Atenção ao sofrimento e as diferentes necessidades do indivíduo Conscientização dos direitos e empowerment Wulf Rossler “Psychiatric rehabilitation today: an overview” Duas estratégias fundamentais: Centrada no indivíduo Intervenções no ambiente Word Psychiatry. (2006) 5:151-155. Wulf Rossler “Psychiatric rehabilitation today: an overview” Quatros aspirações fundamentais: Ter sua própria moradia Uma formação adequada e carreira no trabalho Relações pessoais e sociais satisfatórias Participação na comunidade com plenos direitos Word Psychiatry. (2006) 5:151-155. Teorizações do modelo: Abílio da CostaRosa (2001): “modo psicossocial” Quatro parâmetros: 1. (...)“superação do modo de relação sujeitoobjeto característico do modelo médico e das disciplinas especializadas que ainda se pautam pelas ciências positivas” (...) 2. No que diz respeito às formas de organização das relações intrainstitucionais preconiza-se a sua horizontalização (...) Teorizações do modelo: Abílio da CostaRosa (2001): “modo psicossocial” 3. (...) o Modo Psicossocial preconiza antes de tudo a integralidade das ações no território. (...) A natureza da instituição como organização fica modificada e o local de execução de suas práticas desloca-se do antigo interior da instituição para tomar o próprio território como referência. Teorizações do modelo: Abílio da CostaRosa (2001): “modo psicossocial” 4. (...) preconiza a superação da ética da adaptação, que tem seu suporte nas ações de tratamento como reversibilidade dos problemas e na adequação do indivíduo ao meio e do ego à realidade. (...) deixa firmada a meta da produção de subjetividade singularizada, tanto nas relações imediatas com o usuário propriamente dito, quanto nas relações com toda a população do território. Os centros de atenção psicossocial 1987: CAPS Luiz R. Cerqueira (“Itapeva”) 2002: Portaria 336/GM normatiza os caps 19 89 19 90 19 91 19 92 19 93 19 94 19 95 19 96 19 97 19 98 19 99 20 00 20 01 20 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 07 20 08 TOTAL DE CAPS NO BRASIL 1400 1200 1000 800 600 400 200 0 FONTE: Ministério da Saúde. Potencialidades do modelo CAPS 1. Referência continuada 2. Ambiente terapêutico 3. Projeto terapêutico 4. Sinergismo da equipe interdisciplinar 5. Ações na comunidade 6. Flexibilidade do modelo: projetos especiais 1- Referência continuada Contra o anonimato do sistema: para promover a adesão e a continuidade do cuidado Proteção do projeto terapêutico contratado, que muitas vezes gera resistências e sabotagens do paciente ou da instituição Equipes de referência (Gastão Wagner Campos): Gestão compartilhada do cuidado Clínica ampliada “Superando modelos de organização hierarquizados, fragmentados e autoritários” Equipes de referência e apoio especializado matricial. Um ensaio sobre a reorganização do trabalho em saúde. Ciência e Saúde Coletiva. 1999;4(2):393-403. Seguimento de caso EUA, 1977: Community Support Program insere no sistema de saúde mental o case management, que passa por várias propostas: Modelo do “intermediário” (Broker model) Modelo do seguimento de caso clínico Tratamento comunitário assertivo Mueser, et al (1998). Models of Community care for Severe Mental Illness: A Review of Research on Case Management. Schizophrenia Bulletin. 24 (1): 37-74. 2- Projeto terapêutico 1. Levantamento das necessidades 2. Levantamento das potencialidades e projetos pessoais 3. Levantamento dos recursos necessários e possíveis 4. Contratação do projeto 5. Reavaliação periódica Camberwell assessment of need Acomodação Alimentação Cuidados com a casa Atividades diárias Cuidados pessoais Saúde física Sintomas psicóticos Informação sobre sua condição e tratamento Sofrimento psíquico Segurança em relação a si próprio e aos outros Problemas com Álcool e drogas Companhia Relacionamento íntimo Expressão sexual Cuidados com crianças Educação básica Telefone Transporte Dinheiro Benefícios sociais Intensidade no acompanhamento Perfis de uso, de acordo com as necessidades do paciente: (A) Não intensivo: consultas e/ou sessões psicoterápicas (B) Semi-intensivo: (A) + oficinas e outras atividades dirigidas (pode necessitar das refeições nos dias com mais de uma atividade) (C) Intensivo: (A) + (B) + ambiente terapêutico (grande benefício na convivência diária com técnicos e outros pacientes, ou com ambiente protegido) 3- Ambiente terapêutico Atividades e Ambiência Acolhimento “Regras da casa” e assembléia geral Estímulo X Continência 4- Interdisciplinaridade: Ações em comum + Especificidades de cada área Madel T. Luz. Complexidade do Campo da Saúde Coletiva: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, e transdisciplinaridade de saberes e práticas – análise sócio-histórica de uma trajetória aradigmática. Saúde Soc. São Paulo, v.18, n.2, p.304-311, 2009 Gastão Wagner de Sousa Campos (2007): “Efeito torre de babel” Totalidade, integralidade, holismo, interdisciplinaridade ou transdisciplinaridade, todas são noções que pretendem representar o todo, indicam formas para absorver cada pedaço no todo. Em decorrência, e com grande freqüência, esquemas teóricos que as empregam tendem a desqualificar qualquer abordagem ou qualquer recorte que ouse falar de apenas um pedaço das coisas. Ciência & Saúde Coletiva, 12(3):566-585, 2007 5- Ações na comunidade Parcerias com recursos de outros setores: Desenvolvimento social Educação Esporte Cultura 6- Flexibilidade do modelo: projetos especiais no CAPS ITAPEVA Exemplo: Programa para a Esquizofrenia Refratária (PROESQ) Identificação dos casos Consultas psiquiátricas Supervisão das coletas de sangue pela enfermagem Suporte continuado pela equipe Psicoeducação com a família Obstáculos a reabilitação no CAPS 1- Premissas básicas como a existência da doença mental, benefício da medicação ou necessidade de medidas de proteção durante as crises são questionadas, ou pior, refutadas sem discussão pela equipe. Obstáculos a reabilitação no CAPS 2- Alguns usuários do CAPS ficam anos “convivendo dentro do CAPS”, se cronificando na instituição. Obstáculos a reabilitação no CAPS 3- Dentro da crítica à instituição hospitalar, o CAPS não pode oferecer um ambiente protegido e sim trabalhar no “território”: os usuários são dirigidos a atividades culturais, esportivas, de trabalho, etc fora do CAPS. Se esta pessoa não se adapta, a culpa é da família e comunidade que não lhe apoiam... Obstáculos a reabilitação no CAPS 4- Em nome de não “ir contra a equipe” e “impor um saber sobre os demais”, cada profissional diminui ao máximo as especificidades de sua especialidade, criando um “mínimo denominador comum” de cuidados com o paciente. Obstáculos a reabilitação no CAPS 5- Na ausência de diretrizes, a “equipe” se torna a instância de decisão das condutas, podendo gerar disputas e discussões intermináveis. Obstáculos a reabilitação no CAPS 6- Por vezes o psiquiatra se torna uma figura marginal e faz do CAPS um ambulatório: atende consultas marcadas, prescreve terapêuticas e pouco se relaciona com a equipe O psiquiatra na equipe (...) Existiam duas noções presentes no discurso de toda a equipe técnica e que estava relacionada a esta freqüente troca de médicos: 1) A possibilidade dos psiquiatras em serem substituídos - durante os períodos em que o CAPS ficava sem psiquiatras, eram feitos acordos junto à Secretaria Municipal para que outros médicos fornecessem receitas para os usuários do CAPS. Era freqüente também que as técnicas preenchessem receitas e enviassem para que o médico as assinasse e carimbasse. 2) O serviço prescindia do médico para ser gerido; ainda que fosse obrigatória a presença de psiquiatra para que um CAPS fosse credenciado. Conforme descrevia a coordenadora no período de estudo de campo: “ficamos um longo período sem psiquiatra e sentimos dificuldades em algumas coisas. Mas afinal foi bom porque sabemos agora que não precisamos deles”. (...) Marcelo Kimati Dias, 2007 Medicina, jornal do CFM, outubro de 2010: “Saúde mental: diretor do CFM critica a política pública” (...)O tema foi abordado durante sessão plenária do CFM, em outubro. Fortes, também coordenador da câmara técnica de psiquiatria, enfatiza que a atividade na saúde mental deve ser coordenada por um profissional médico tanto nas instancias centrais como nas regionais e locais. (...) “é preciso reagir. A medicina detém a autoridade para as prescrições e demais demandas e o médico precisa assumir seu papel legítimo dentro desta estrutura”, (...) conclusão As posições no debate sobre a reabilitação vão se clareando e polarizando em dois extremos. Cabe a cada um tomar sua posição, que favorecerá ou não o diálogo com outros profissionais, mas principalmente com o portador e com a sociedade.