ANÁLISE DA QUALIDADE DAS INFORMAÇÕES SOBRE A MORBIDADE E MORTALIDADE POR CAUSAS EXTERNAS NO BRASIL – UMA REVISÃO DE LITERATURA Viviane Maria Sutile1 Rute Michelin Galesi Campelo2 Sérgio Lopes de Moraes3 Fernando Faria Junior4 Vera Lídia Alves de Oliveira5 RESUMO: Ao longo das últimas décadas, houve um grande aumento nas ocorrências e nas mortes por acidentes e violências em todo o mundo, constituindo-se num grave problema de saúde pública. Para o acompanhamento epidemiológico desses agravos no Brasil, utilizam-se principalmente dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH-SUS). Entretanto, problemas e dificuldades na obtenção de informações através destes sistemas têm levantado dúvidas quanto à confiabilidade das mesmas. O objetivo dessa revisão de literatura foi encontrar estudos que constataram ou comprovaram os principais problemas existentes e indicaram formas de intervenção. Pretende-se, com o subsídio dessa pesquisa, contribuir para a melhoria da qualidade dessas informações na Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba através da atividade de auditoria. Palavras-chave: Causas Externas. Violência. Acidentes. Mortalidade. Morbidade. Qualidade da informação. 1 Cirurgiã Dentista- PUC/PR, Especialização em Odontologia em Saúde Coletiva, Odontologia em Saúde Coletiva com ênfase em Gerenciamento em Unidade de Saúde e Odontologia em Saúde Coletiva com ênfase em Saúde da Família, Auditora da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba cursando Especialização em Auditoria nas Faculdades Pequeno Príncipe. 2 Médica- UFPR, Especialização em Pediatria e Saúde Pública, Auditora da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba cursando Especialização em Auditoria nas Faculdades Pequeno Príncipe. 3 Médico- UFPR, Especialização em Oftalmologia e Auditor da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba cursando Especialização em Auditoria nas Faculdades Pequeno Príncipe. 4 Médico – PUC/PR, Especialização em Pediatria e Terapia Intensiva Pediátrica, Auditor da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba cursando Especialização em Auditoria nas Faculdades Pequeno Príncipe. 5 Cirurgiã Dentista- UFRJ, Mestrado em Saúde Pública, Especialização em Saúde Pública e Odontologia Preventiva e Social, Coordenadora de Diagnóstico em Saúde do Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba e Orientadora do Curso de Especialização em Auditoria das Faculdades Pequeno Príncipe. 2 INTRODUÇÃO Na área da saúde, entende-se por Causas Externas (CE) o conjunto de agravos à saúde que incluem as causas ditas acidentais como as ocorridas no trânsito, trabalho, quedas, envenenamentos, afogamentos e outros tipos de acidentes e as causas intencionais como as agressões, homicídios, suicídios, lesões autoprovocadas, entre outras ( Ministério da Saúde,2001). Incluem, portanto, o que socialmente se reconhece como acidentes e violências. O Ministério da Saúde (MS) define violência como “o evento representado por ações realizadas por indivíduos, grupos, classes, nações que ocasionam danos físicos, emocionais, morais e/ou espirituais a si próprio ou a outros” e acidentes como “o evento não intencional e evitável, causador de lesões físicas e ou emocionais no âmbito doméstico ou nos outros ambientes sociais, como do trabalho, do trânsito, da escola, de esportes e o lazer” (MS,2001). A redução da mortalidade por doenças infectoparasitárias, complicações materno-fetais e doenças nutricionais e, em contrapartida, o aumento real das mortes por doenças crônicas e por violências e acidentes fizeram com que o perfil de mortalidade do país se modificasse desde a década de 1980. No período de 1980 a 2009 houve um aumento de 97,5% na frequência de óbitos por CE. Os acidentes e violências ocupavam o 4º lugar de causa morte nos anos 2000 a 2003 e a partir de 2004 passaram para o terceiro lugar, permanecendo nesta posição até o ano 2009 (DATASUS-MS) e figurando abaixo somente das Doenças Cardiovasculares e das Neoplasias. Estatísticas oficiais de mortalidade em Curitiba demonstram que as violências e os acidentes ocupam historicamente o terceiro lugar como causa dos óbitos. Além disso, houve um aumento da proporção das mortes por CE em relação ao total dos óbitos, passando de 12,9% em 2000 para 15,3% em 2009. Desde o ano de 2000, as CE representam o principal grupo de morte na faixa etária de 1 ano a 44 anos. No ano de 2009, do total de óbitos na faixa etária de 15 a 29 anos, 80% foram por C. E. e na faixa etária de 30 a 39 anos corresponderam a 51%. Nas últimas duas décadas, a mortalidade por homicídios em Curitiba quintuplicou, passando de 7,9 óbitos/100.000 habitantes em 1980 para 41,5 em 2009, sendo a primeira causa por morte violenta. Em 2009, 52,8% do total de óbitos por CE ocorreram por homicídio, 23,3% por acidente de transporte, 10,5% por quedas e 5,1% por 3 suicídios. Outra característica importante nestes óbitos é a predominância do sexo masculino. Em 2009, 81% dos óbitos por CE ocorreu no sexo masculino e 19% no sexo feminino. Para os homens há maior ocorrência de óbitos por homicídios (59%) e de acidentes de transporte (22,8%) e para as mulheres há predomínio dos óbitos por quedas (30,4%), homicídios (26%) e acidentes de transporte (25,6%). As Causas Externas exercem grande impacto sobre a sociedade, não somente com relação às perdas prematuras de vidas, mas também com relação às repercussões sobre a qualidade de vida e das condições de saúde das pessoas envolvidas. É o setor de saúde que custeia as consequências destes eventos, pois tem a responsabilidade de proporcionar à comunidade serviços de urgência, leitos hospitalares, UTI, atenção especializada, reabilitação física, assistência social diante de uma demanda cada vez maior. psicológica e Segundo dados do DATASUS, no Brasil, a proporção de internações por CE aumentou de 5,2% em 1998 para 6,9% em 2005 e a proporção de gastos passou de 6,4% para 8,5% neste mesmo período. Da mesma forma que, por meio de políticas públicas se conquistou a redução da morbimortalidade de muitas doenças, almeja-se também a redução da violência e acidentes. Para isto, é fundamental o acompanhamento epidemiológico destes agravos através da coleta sistemática de dados que contribuam para identificar sua magnitude, suas características e consequências. Os casos fatais de acidentes e violências somados aos que chegam à hospitalização representam a menor parcela dos eventos. De acordo com o Manual de Vigilância de Lesões (OMS, 2004), estima-se que, em países desenvolvidos, para cada óbito por lesões, 30 vítimas sejam hospitalizadas e 300 sejam tratadas em serviços de urgência e liberadas. Sabe-se também que uma grande parcela das vítimas não busca nenhum tipo de assistência. Apesar disto, os dados de mortalidade provenientes do Sistema de Informações Sobre Mortalidade (SIM) e de morbidade hospitalar originados do Sistema de Internação Hospitalar (SIH-SUS) são os mais utilizados para a vigilância das CE e permitem conhecer a sua magnitude e suas características. Entretanto, a qualidade destas informações tem sido questionada por vários estudiosos do tema. Através de suas pesquisas, tem-se observado a má qualidade e as limitações das informações geradas por estes sistemas. Por sua vez, o 4 Ministério da Saúde tem se mostrado sensível a estas constatações criando estratégias e diretrizes para a melhoria das informações. Sabe-se que informações fidedignas são imprescindíveis para subsidiar as análises epidemiológicas e gerenciais e para a implementação de políticas públicas apropriadas para a prevenção destes agravos. Conhecer os pontos falhos em cada nível de geração dos dados desses sistemas e posteriormente, contribuir para a identificação e correção destas distorções por meio da atividade de auditoria é o foco deste estudo. METODOLOGIA No presente trabalho foi realizada uma revisão de literatura enfocando o tema qualidade de informações sobre CE, sendo pesquisadas publicações através da Biblioteca Virtual em Saúde a qual tem acesso a várias fontes importantes como a Biblioteca Cochrane, Lilacs, Medline, Ibecs e Scielo. Para a busca foram utilizados os seguintes descritores: causas externas, acidentes, violência, mortalidade, morbidade, qualidade da informação. Não houve ressalvas quanto ao ano de publicação do artigo e nem quanto ao local onde foram realizadas as pesquisas. Algumas publicações foram utilizadas para o embasamento teórico sobre o tema a fim de ampliar os conhecimentos e enriquecer as análises. Para esta revisão sobre a qualidade dos dados, foram obtidos treze artigos referentes à mortalidade e seis referentes à morbidade hospitalar por CE. RESULTADOS MORTALIDADE POR CAUSAS EXTERNAS Os dados de mortalidade são obtidos através do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), implantado em 1976 pelo Ministério da Saúde, cujo banco de dados é alimentado com informações das Declarações de Óbito (DO – Anexo A) que são codificadas de acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID) pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde. 5 Os óbitos ocorridos por CE devem obrigatoriamente passar por exame de necropsia nos Institutos Médicos Legais (IML), independente do tempo decorrido entre a ocorrência e o óbito, uma vez mantida a relação de causalidade. As Declarações de Óbito por CE são preenchidas por médicos legistas. Em localidades onde não há IML, a DO deverá ser preenchida por qualquer médico indicado por uma autoridade judicial ou policial, na função de perito legista eventual (ad hoc). O oitavo bloco de informações da DO é de preenchimento obrigatório por ocasião de óbito por Causas Externas ou mortes suspeitas. Neste bloco, deve ser informada a “provável circunstância de morte não natural”: o tipo de ocorrência (acidente, homicídio, suicídio, outros, ignorado), a caracterização ou não de acidente de trabalho, a fonte da informação (boletim de ocorrência, hospital, família, outros, ignorado), descrição sumária do evento e do local de ocorrência. Foram vários os estudos que avaliaram a confiabilidade das informações das DO por Causas Externas. A pesquisa de SIMÕES e RECHENHEIN (2001), analisou as informações das DO por acidentes e violência em menores de 18 anos residentes em Duque de Caxias-RJ no período de 1995 e 1996. Foram observadas discordâncias entre as informações do IML (DO preenchidas pelos legistas), informações da Secretaria Municipal de Duque de Caxias (DO complementadas com informações do livro de registro das necropsias do IML) e da Pesquisa (informações dos Relatórios de Ocorrências Policiais - ROP e laudos de necropsia do IML). As principais discordâncias foram nos homicídios e acidentes de trânsito. A percentagem de concordância entre as três fontes foi considerada baixa (45,0% em 1995 e 37,6% em 1996), quando considerada a CID até terceiro dígito e um pouco melhor (59,5% em 1995 e 52,9% em 1996) quando considerada a classificação por agrupamento. Os pesquisadores concluíram que o IML, apesar de ter em seus registros informações suficientes para o esclarecimento da causa básica da morte, não as repassa, através de um preenchimento adequado das DO pelos médicos legistas, para os órgãos responsáveis pelas estatísticas oficiais. Constataram uma melhora na qualidade da informação quando as DO são complementadas com informações que ficaram restritas aos bancos de dados do IML. Entendem que a qualidade das informações das DO preenchidas pelo médico legista é influenciada pelo grau de conscientização do profissional sobre a importância epidemiológica das DO e pelo receio de envolvimentos futuros com autoridades policiais e judiciais. Os autores concluem que a busca complementar de informações na imprensa, ROP e 6 IML na tentativa de qualificar adequadamente a causa do óbito, implica em custos extras às Secretarias de Saúde e em transferência de responsabilidades. Pesquisa realizada por MELLO JORGE et al. ( 2002), buscou identificar as DO por CE que poderiam ter as causas básicas melhor definidas e dimensionar as mudanças na distribuição destas mortes com o resgate e recuperação de dados. Foram selecionados os óbitos por CE ocorridos no último trimestre de 2000 em quinze municípios brasileiros sendo três em Sergipe, cinco em São Paulo e sete em Mato Grosso. Dos 320 óbitos por CE selecionados, 156 constituíam óbitos do tipo ignorado ou foram classificados como diagnóstico incompleto de CE. A investigação complementar destas mortes se baseou em visitas ao IML (com consultas aos laudos de necropsia), às Delegacias de Polícia (com consultas aos Boletins de Ocorrência) e aos domicílios dos falecidos. Este resgate de informações determinou uma grande mudança na distribuição do tipo de CE destes óbitos. Houve um expressivo aumento nos homicídios, de 5 para 28 óbitos (82% a mais); um aumento de 50% no número de suicídios, de 2 para 4 casos; 90% a mais de óbitos por acidente de transporte (de 35 para 67) e a diminuição de 83 para 15 no número de óbitos por causas externas ignoradas, portanto, uma redução de 82% nos óbitos por causas externas mal definidas. Os autores concluíram que o IML, na grande maioria das vezes, dispõe de informações capazes de esclarecer adequadamente a causa da morte, mas não as repassa para as DO. Outro estudo, semelhante ao anterior, foi realizado por MELLO JORGE (1990), onde foram analisados 499 óbitos de crianças menores de 15 anos por CE ocorridos no município de São Paulo em 1985. O objetivo foi comparar as informações da causa da morte das DO emitidas pelos médicos legistas do IML com as informações existentes nos registros do IML e a conclusão diagnóstica do “investigador da pesquisa” que codificou a casa da morte com auxílio de informações adicionais. A concordância entre as três fontes de informação, em nível de terceiro dígito, foi de apenas 23,45% e de 66,13% em nível de agrupamento. A concordância entre as informações do IML e do investigador foi mais próxima, 71,54% quando se considerou terceiro dígito e 84,77% quando se considerou agrupamento. As DO preenchidas pelos médicos legistas demonstraram possuir os dados de pior qualidade. A pesquisa concluiu que o IML não repassa, por meio do preenchimento da DO, dados completos de cada caso, embora disponha destas informações em seus arquivos e que, a instituição responsável oficialmente pelas 7 estatísticas dessas informações, não faz a busca ativa de dados para o esclarecimento adequado da causa da morte. MELLO JORGE e LATORRE (1994) desenvolveram um estudo nacional referente às mortes no trânsito no período de 1978 a 1992 com informações das capitais brasileiras por apresentarem cobertura mais adequada, menor número de subregistro de óbitos, menor número de óbitos por causas mal definidas, além de aceitável percentual de CE de tipo ignorado. Conforme já apontado em outros estudos, as pesquisadoras avaliaram a qualidade do preenchimento das DO, pois como afirmaram “os legistas limitam-se, muitas vezes, a colocar a natureza das lesões encontradas na necropsia, não informando de que tipo de acidente/violência tais lesões foram decorrentes”. A melhor qualidade de informação foi obtida em 1989 no grupo dos atropelamentos. As autoras concluem concordando com todos os pesquisadores que se dedicam ao tema acidente de trânsito quando afirmam a necessidade de um adequado sistema de informação, que deve ser harmonioso desde a fase de coleta até a fase publicação e análise dos resultados, pois estes dados subsidiarão programas que visam minimizar as consequências destes acidentes e cabe ao setor saúde contribuir com a prevenção dos acidentes e finalmente avaliar os custos da atenção e reabilitação, possibilitando minimizar a epidemia do trauma. O estudo de BARROS et al. (2001), analisando os óbitos em crianças e adolescentes por CE em Recife de 1979 a 1995, demonstrou o baixo registro dos dados referentes à pessoa (ocupação, grau de instrução, assistência médica, confirmação do diagnóstico por necropsia e local de acidente) e ao lugar (município da ocorrência do óbito e local do acidente). Os autores consideram como uma possível explicação para este fato, o entendimento que os profissionais do IML têm da sua responsabilidade na produção destas informações. Assim, algumas variáveis seriam entendidas como de sua responsabilidade direta por serem determinadas à luz da necropsia e preenchidas de modo sistemático. Outras seriam preenchidas de forma irregular, por serem entendidas como de sua responsabilidade indireta por tratar-se de informações que precisam ser retiradas de documentos que acompanham o cadáver (guia de encaminhamento do hospital ou da delegacia de polícia). Em função da importância dessas variáveis para a caracterização da população atingida por acidentes e violências, os autores recomendaram a discussão entre os técnicos da SMS e IML visando a melhoria da qualidade dos 8 dados das DO e a realização de crítica de outras variáveis que não a causa básica por parte da SMS, com correção das distorções existentes. A pesquisa de DRUMOND JR. et al. (1999) avaliou a qualidade do preenchimento e codificação das DO por acidentes não especificados (CID 10: Y10Y34) e eventos com intenção indeterminada (CID 10: X59) na cidade de São Paulo em 1996. A avaliação foi feita por meio de consultas ao Boletim de Ocorrência que acompanha o corpo enviado ao IML, às conclusões dos laudos de necropsia e às fichas de encaminhamento enviadas junto ao corpo pelos hospitais e Serviço de Verificação de Óbito. Dos 550 casos avaliados, 297 (54%) tinham sido codificados como “acidentes sem especificação” e 253 (46%) como “eventos com intenção indeterminada”. Após avaliação, as causas básicas foram recodificadas e redefinidas em 53,2% dos casos chegando-se a constatação que entre as mortes acidentais a maioria foi devida a acidentes de trânsito, dos quais, os atropelamentos foram os mais incidentes (22%). Verificou-se também que 1/3 das “intenções indeterminadas” foram redefinidas e recodificadas e entre os casos esclarecidos a maioria foi devido a quedas (10,6%). Conclui o artigo, que o IML não utiliza dados que tem disponíveis para preencher adequadamente as DO. No município de Maringá, foi desenvolvido um estudo por MATHIAS e MELLO JORGE ( 2001) para conhecer a qualidade das informações dos óbitos ocorridos no período de 1979 a 1995. O estudo mostrou que houve uma melhora na qualidade das informações ao longo dos anos, sobretudo naquelas causas de morte que indicam a qualidade dos dados de mortalidade, ou seja, as causas mal definidas e sem assistência médica e as CE do tipo ignorado. Em 1979, as mortes classificadas como mal definidas correspondiam a 7,5% do total de óbitos e passou para 3,5% em 1995. Das mortes com causas mal definidas, 59,4% foram sem assistência médica em 1979 passando para 12,4% em 1995. As CE do tipo ignorado correspondiam a 15,2% do total de Causas Externas em 1979, passando para 2,1% em 1995. Os autores atribuem a melhora da qualidade das informações ao processo de municipalização, ocorrida em 1991, quando houve a descentralização do Serviço de Vigilância Epidemiológica, ao trabalho de busca ativa dos dados pela Secretaria Municipal de Saúde para corrigir e complementar as informações das DO e à melhora da cobertura médica no município. Outro estudo realizado por LOZADA et al. (2009) semelhante ao anterior, analisou a qualidade dos dados do SIM para óbitos por CE em todo o Estado do 9 Paraná no período de 1979 a 2005. Estes autores, como os citados anteriormente, observaram que a proporção de óbitos por CE de intenção indeterminada diminuiu progressivamente, passando de 22,3% em 1980 para 6,7% em 1985 e, chegando a 2,1% em 2005. Chegaram a conclusões semelhantes, atribuindo esta melhora na qualidade das informações no Paraná à municipalização e descentralização do SIM o que facilitou a relação com os IML, médicos, imprensa e contribuiu para a correção e classificação correta da causa básica dos óbitos. Estudo realizado por ANDRADE e MELLO JORGE (2001) analisou a cobertura policial e a validade dos dados registrados em Declarações de Óbito (DO), Boletins de Ocorrência (BO), fichas de atendimento em prontos socorros do SUS e Autorização de Internação Hospitalar (AIH) de todos os hospitais gerais (seis) e ortopédico (um) da cidade de Londrina - PR. Foram estudadas 3.643 vítimas de acidentes de transporte ocorridos no primeiro semestre de 1996. No período estudado, 80,1% das vítimas foram atendidas em pronto socorro, 10,2% foram internados, 1,8% morreram e para 7,9% dos BO não foram localizados os atendimentos em pronto socorro, internações ou declarações de óbito. Observou-se neste estudo, que a cobertura dos registros policiais para acidentes de transporte foi bastante baixa, sendo que em dois terços dos acidentes não foi emitido BO para as vítimas. Estudos que se norteiam somente nestes registros para avaliarem acidentes de transporte podem comprometer sua validade. Para análise da mortalidade por essas causas, recomenda-se trabalhar com dados da área da Saúde (SIM), pois estes permitem cobertura melhor do que os registros policiais. Estudo de CAMPOS et al. (2010) investigou os óbitos por causas mal definidas e os óbitos não notificados ao SIM em 10 municípios da macro região nordeste de Minas Gerais no ano de 2007. O total de óbitos analisados foi de 779, dos quais 573 foram notificados ao SIM e 206 identificados por busca ativa e pelo método da autópsia verbal, portanto, encontraram uma subnotificação de 26,4% do total de óbitos. Os casos de óbitos por causas mal definidas correspondiam a 35,43% dos óbitos notificados e a 12,62% dos óbitos não notificados. A busca ativa e o método da autópsia verbal permitiram observar um novo perfil de mortalidade na região estudada e identificar CE entre os óbitos notificados por causas mal definidas, e também entre os não notificados ao SIM. Dentre os óbitos não notificados, 74 mortes (35,9%) foram por causas violentas. O estudo apontou que as dificuldades de acesso geográfico podem ser a causa deste subregistro, pois um expressivo 10 número de óbitos não foi notificado ao SIM pela falta de assistência médica com DO emitidas pelos cartórios dos municípios pesquisados. Nove municípios contavam com um profissional médico e o município que não dispunha de médico distava 15 minutos de um polo de microrregião, condição para que nenhuma DO fosse emitida por cartório. As pesquisadoras ressaltaram que a autópsia verbal possibilitou esclarecer 87% das causas dos óbitos investigados. Concluíram que as causas mal definidas de morte refletem a falta de acesso a serviços de saúde e a má qualidade da assistência médica. Estudo de MELLO JORGE et al. (1997) avaliou a mortalidade por CE no Brasil, nas capitais e Distrito Federal no período de 1977 a 1994 utilizando dados do SIM. O objetivo principal da pesquisa foi estudar os aspectos epidemiológicos desses óbitos segundo os tipos de causa, sexo e idade. Entretanto, os autores observaram, em alguns municípios, uma alta percentagem de óbitos por CE do tipo ignorado. O Rio de Janeiro, sempre com percentagens altas, apresentou 67% em 1992 e 54,8% em 1994 e Porto Alegre, no período de 1978 a 1987, apresentou percentagens em torno dos 40%. Concluíram que a qualidade dos dados por CE depende da colaboração dos médicos legistas e foi muito variável conforme a capital estudada. GAWRYSZEWSKI et al. (2005) realizaram um estudo sobre homicídios no município de São Paulo, no 2º semestre de 2001, utilizando dados das DO e informações adicionais provenientes de outras fontes como laudos de necropsia e Boletins de Ocorrência Policial. Os autores fazem uma referência de que no Brasil, os dados sobre a natureza da lesão, constantes nas DO, não são geralmente utilizados para estudos epidemiológicos por serem de má qualidade. Embora não tenha sido quantificada a melhoria da qualidade das informações, os pesquisadores concluíram que com a integração dos dados das diferentes fontes obteve-se informações mais fidedignas e foi possível traçar um perfil epidemiológico confiável para a compreensão dos homicídios nesta capital. O artigo de NJAINE et al. (1997) apresenta uma análise sobre a qualidade das informações sobre violência no Brasil utilizando dados do município do Rio de Janeiro do período de 1980 a 1994, da população de 0 a 19 anos e tendo como fontes de dados a Secretaria de Segurança Pública, a Polícia Civil e as Secretarias Estadual e Municipal de Saúde. Com base em dados de Boletins de Ocorrências de 1990 constatou-se que variáveis importantes como o “local do ferimento” estavam 11 sem informação ou informação ignorada em 48,8%. Quando analisados os dados das DO referentes aos óbitos ocorridos em 1993, informações importantes como “assistência médica”, “necropsia” e “tipo de violência” estavam sem informação ou informação ignorada em 35,2%, 32,2% e 53,2% respectivamente. Com relação às mortes por CE e seus subgrupos ocorridas no período de 1980 a 1994, foram verificados percentuais elevados de lesões ignoradas destacando-se altas percentagens de lesões ignoradas por armas de fogo. No ano de 1992, foram registrados 162 homicídios (15,1% das Causas Externas) e 427 casos de lesões ignoradas por arma de fogo (39,9% das Causas Externas) os quais se fossem adequadamente esclarecidos comporiam, na maioria dos casos, o grupo dos homicídios. Os autores atribuem esta situação à resistência do IML em determinar a circunstância do óbito por receio de implicações legais mesmo com a ressalva do Ministério da Saúde de que as informações servem apenas para fins epidemiológicos. MORBIDADE HOSPITALAR POR CAUSAS EXTERNAS Para a análise dos estudos sobre a morbidade hospitalar, deve-se reconhecer que o Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH-SUS) representa, segundo estimativas, 70 a 80% do total de internamentos hospitalares do país. Seus principais problemas são a não computação dos internamentos privados, a falta de qualidade das informações no que diz respeito ao diagnóstico e possível subregistro por limitação de emissão de Autorização de Internação Hospitalar (AIH – Anexo B) que é calculada em 9% da população residente no estado. Apesar destes fatores, é um instrumento muito utilizado para estudos sobre a assistência hospitalar pública, para a vigilância em saúde, análises econômicas em saúde e como auxiliar em estimativas de indicadores de mortalidade e de incidência de doenças. Outra consideração importante, é que as hospitalizações por acidentes ou violências exigem dois tipos de registro na AIH para melhor caracterizar cada ocorrência. O primeiro descreve a natureza da lesão e constitui o diagnóstico primário. Para este registro utilizam-se os diagnósticos contidos no Capítulo XIX da CID 10 (Lesões, envenenamentos e outras consequências de causas externas). O segundo registro, que constitui o diagnóstico secundário, diz respeito às 12 circunstâncias que ocasionou a lesão e para o seu registro utilizam-se os diagnósticos contidos no Capítulo XX da CID 10 (Causas externas de morbidade e mortalidade). Por exemplo, fratura de fêmur como diagnóstico primário (Capítulo XIX) ocasionada por acidente de trânsito como diagnóstico secundário (Capítulo XX). A Portaria GM/MS nº 142 de 1997 tornou obrigatório o registro do diagnóstico secundário nas AIH dos internamentos pelo SUS por causas acidentais ou violentas. Segundo NJAINE e REIS, 2005, antes desta portaria, a proporção de registros do tipo de CE no SIH era de 10% do total de internamentos passando para 88% no ano de 1998. Entretanto, a qualidade desta informação tem sido questionada, pois são utilizados CID “genéricos” somente pela obrigatoriedade do registro. Nesta revisão de literatura, constatou-se que não há muitos estudos com o propósito de avaliar a qualidade das informações geradas pelo SIH-SUS. Mesmo assim, os estudos abaixo descritos, foram eficientes em demonstrar que há problemas na qualidade dos dados. O estudo realizado por VERAS e MARTINS (1994) analisou a confiabilidade dos dados informados nas AIH referentes às internações ocorridas no ano de 1986 no Rio de Janeiro. Foram comparadas informações fornecidas nas AIH com informações dos prontuários. Não foi um estudo específico sobre CE, porém uma das variáveis estudadas foi o diagnóstico clínico. Encontraram problemas na confiabilidade do diagnóstico principal com relação à anotação dos dados nos prontuários, à coleta dos dados, à codificação do diagnóstico pela CID e ainda, erros de diagnóstico, maior importância ao procedimento a ser cobrado do que ao diagnóstico e baixíssima percentagem de registro do diagnóstico secundário (1,9% dos prontuários). Outro estudo sobre morbidade hospitalar foi realizado por MATHIAS e SOBOLL (1998) nas internações financiadas pelo SUS ocorridas no município de Maringá (PR) em 1992. Neste estudo semelhante ao anterior só foi analisada a variável diagnóstico. Comparou-se o diagnóstico informado na AIH (CID registrado pelos codificadores do hospital) com o do prontuário (CID codificado pelos pesquisados). O estudo mostrou que para o grupo Lesões e Envenenamentos a concordância de Kappa, que significa a proporção de concordância entre as duas fontes foi de 0,70 sendo o principal motivo da discordância a classificação apenas da causa e não da natureza da lesão. Para o grupo de Sinais, Sintomas e Afecções 13 Mal definidos o índice de Kappa foi de apenas 0,21 sendo que a maior parte das discordâncias foi classificada pela pesquisa como sendo do grupo das Doenças de Pele e TCSC e das Lesões e Envenenamentos. Quando há concordância perfeita, ou seja, os pesquisadores concordam em todos os casos, o valor de k é igual a 1. As autoras ressaltam os problemas encontrados como a má qualidade das informações dos prontuários, a falta de treinamento dos funcionários dos hospitais para a codificação das doenças e maior importância dada ao procedimento o que favorece os diagnósticos que permitem maior remuneração. Na pesquisa realizada por TOMIMATSU et al. (2009) buscou-se analisar a cobertura e qualidade das informações do SIH-SUS. Os autores estudaram os internamentos pelo SUS por CE ocorridos no ano de 2004, em 11 hospitais dos municípios de Maringá e Londrina (PR) referência para atenção a acidentes e violências. Compararam dados provenientes do banco de dados do SIH-SUS, que representam as informações fornecidas por ocasião da cobrança pelos atendimentos, com as informações colhidas manualmente pelos pesquisadores nos laudos de AIH emitidos por estes hospitais, no banco do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e nos registros de atendimentos pré-hospitalares do SIATE. Através da pesquisa os autores detectaram 4.018 internações por CE em Londrina enquanto o SIH-SUS registrou 3.002 (um subregistro de 25,3%). Em Maringá a pesquisa identificou 2.370 internações por CE e o SIH-SUS registrou 1.403 (um subregistro de 40,8%). Além disso, observaram importante defasagem na qualidade dos diagnósticos registrados. Com a pesquisa ocorreu uma grande mudança na distribuição dos tipos de CE. Em Londrina, houve um aumento de 492 para 988 (50%) nas internações por acidentes de transporte, um aumento de 195 para 355 (45%) nas internações por agressões e uma redução de 1.703 para 817 (50%) nas internações por quedas. Em Maringá as mudanças mais expressivas foram nas agressões que passaram de 4 para 78 (95%), um aumento de 38 para 256 (85%) nas internações por “demais causas de acidentes” e um aumento de 14 para 91 (85%) nas internações por exposição a forças mecânicas inanimadas. Em ambas as cidades, com o acréscimo dos internamentos por CE subregistrados pelo SIH-SUS houve um aumento dos casos de internações por causas externas de intenção indeterminada (casos em que se ignora se acidentais ou intencionais), de 57 para 929 (94%) em Londrina e de 2 para 806 (99%) em Maringá, pois mesmo com a 14 busca complementar de informações, estas internações não puderam ser melhor classificadas. Com base no estudo realizado em Londrina e Maringá, estes mesmos autores desenvolveram um trabalho, publicado em 2009, com uma proposta de intervenção para a melhoria da qualidade da informação sobre os internamentos por CE do SIHSUS nestes municípios. Propuseram as seguintes medidas de intervenção: sensibilização e capacitação dos médicos auditores; sensibilização e capacitação dos médicos dos hospitais e dos codificadores hospitalares e envio de correspondência aos hospitais mostrando a importância do registro correto da informação, que no caso de CE, implica na informação correta tanto do diagnóstico primário quanto do secundário. Os autores DELANDES e SILVA (2008) analisaram os internamentos por acidentes de trânsito ocorridos em dois hospitais públicos do Rio de Janeiro nos meses de maio e junho de 1996. Houve resultados divergentes entre os dados dos registros hospitalares e os obtidos pela pesquisa. No Hospital 1 foram registrados 127 atropelamentos enquanto a pesquisa detectou 158 casos (24,4% a mais). No Hospital 2 foram registrados 225 atropelamentos e a pesquisa identificou 143 (57% a menos). Por outro lado, no hospital 2 o item "acidentes automobilísticos" representou somente 26 casos registrados pelo hospital contra 147 identificados pela pesquisa, indicando uma possível hipernotificação de atropelamentos, os quais poderiam ser casos de colisões e outros acidentes. Embora os autores tenham detectado estas distorções, não fazem nenhuma análise sobre a qualidade das informações. Com o intuito de conhecer a qualidade dos dados de internação por CE, MELIONE e MELLO JORGE (2008) estudaram 990 internações pelo SUS, ocorridas no primeiro semestre de 2003, no Hospital Municipal de São José dos Campos, referência para o atendimento ao trauma no município, por meio da comparação dos dados registrados no Sistema de Informações Hospitalares (SIH-SUS) com os dados dos prontuários. A taxa de concordância bruta foi de boa qualidade para as variáveis relativas à vitima e à internação. Entre as CE encontraram concordância ótima para acidentes de transporte e quedas, concordância regular para agressões, fraca para complicações de assistência médica e sofrível para causas indeterminadas. Concluíram que algumas variáveis relativas à vitima e alguns tipos de CE necessitam de aperfeiçoamento da qualidade dos dados. Os autores 15 ressaltaram a importância de se desenvolver ações nas esferas municipal, estadual e federal do SUS para o aprimoramento dos dados informados no SIH. DISCUSSÃO O maior número de artigos encontrados para este estudo, voltados para a qualidade dos dados do sistema informatizado de mortalidade por CE, em comparação com aqueles que analisaram os dados de morbidade hospitalar por estas causas, provavelmente é reflexo de dois fatores. O primeiro fator diz respeito ao tempo de vigência dos sistemas de dados. O SIM foi implantado em 1976 e imediatamente passou a ser foco de preocupação de pesquisadores. Os artigos encontrados para este estudo analisam dados e informações compreendidas no período de 1978 a 2010. Por outro lado, o SIH foi implantado mais recentemente, em 1990 e, para o presente trabalho utilizaram-se publicações que analisaram a qualidade de dados de internações por CE desde 1994 até 2009. Um segundo aspecto importante a considerar é o fato do SIM ser um sistema com fins puramente epidemiológicos e representar o principal sistema utilizado para a análise da situação de saúde em nosso país. Diferentemente o SIH foi um sistema construído com o principal objetivo de controle financeiro e faturamento dos procedimentos referentes aos internamentos no SUS e, portanto, é utilizado de forma suplementar para os estudos epidemiológicos. Na análise dos estudos que visaram a qualidade dos dados de mortalidade por CE foi possível constatar que não existe fluxo contínuo e garantido de comunicação ou de repasse de informação entre os diferentes órgãos que “atendem” as vítimas de acidentes e violências, ou seja, os serviços de segurança ou de trânsito que atendem as ocorrências, os serviços hospitalares que atendem as vítimas e a polícia legal que declara o óbito. As informações importantes para a caracterização da ocorrência que levou à morte violenta e para a caracterização da sua vítima se perdem e a declaração de óbito, documento oficial do Ministério da Saúde para a documentação dos óbitos em todo território nacional, chega ao setor saúde com informações incompletas e inconclusivas, o que dificulta a construção do perfil fidedigno desses agravos e o adequado planejamento de ações por parte dos setores pertinentes, incluindo o próprio setor saúde. 16 Evidenciou-se ainda que, mesmo quando as informações importantes para a elucidação das ocorrências encontram-se presentes na documentação existente nos IML, estas não são disponibilizadas por ocasião do preenchimento da DO. Os médicos legistas não preenchem adequadamente as DO por receio de implicações legais decorrentes de preenchimentos mais assertivos, outras vezes, por julgar não ser de sua responsabilidade, negligenciam o preenchimento de variáveis que caracterizam a vítima de violência nas DO que representam informações valiosas para a construção do perfil epidemiológico desses agravos. Refere-se também a precariedade com que muitos IML funcionam, com deficiência de recursos humanos, de materiais e equipamentos. Pesquisas realizadas no município de Maringá por MATHIAS e MELLO JORGE (2001) e no Estado do Paraná por LOZADA et al. (2009), que constataram a melhoria da qualidade das informações de mortalidade por CE após processo de municipalização e descentralização da Vigilância Epidemiológica, apontam a importância do trabalho integrado e intersetorial entre os segmentos da saúde e da segurança como uma importante estratégia na busca da qualificação das informações de mortalidade por CE. É necessário que cada um dos serviços/setores envolvidos no atendimento às vítimas de acidentes e violências conheça as especificidades e competências dos demais setores/serviços e estabeleçam entre si um compromisso mútuo da busca da qualidade e de repasse de informações. Para além disso, estudos que se dedicaram ao tema mortalidade por acidentes de trânsito apontam a necessidade de instituir um instrumento mais preciso para registro das especificidades desse tipo de ocorrência, cujas características referentes aos acidentes (tipo de acidentes, condições das vias, sinalização, luminosidade, entre outros) adquirem maior importância. Estudo de CAMPOS et al.(2010) evidencia problemas na geração de informações confiáveis sobre mortalidade em virtude de dificuldades no acesso a serviços de saúde e na qualidade da assistência médica resultando em subnotificações e preenchimentos inadequados e incompletos da DO. Há localidades e municípios brasileiros que não apresentam estruturação mínima para uma adequada notificação dos óbitos de qualquer natureza inclusive por CE, pois não possuem médicos, cartórios e IML. Com relação à morbidade, apesar do pequeno número de estudos encontrados versando sobre a qualidade da informação, é possível observar que os 17 principais problemas encontrados estão relacionados com a má qualidade dos registros na Autorização de Internação Hospitalar. A pouca importância dispensada pelos profissionais de saúde dos estabelecimentos hospitalares para o registro dos diagnósticos adequados (CID) pode estar ligado a fatores entre os quais destacam-se: a valorização da AIH como documento de faturamento em detrimento de sua importância como instrumento de vigilância; a pouca ou a ausência de capacitação para o preenchimento adequado da AIH; ausência de controle sobre a qualidade do preenchimento e ausência de retorno frequente das análises do perfil de saúde realizadas a partir de informações deste sistema por parte das secretarias de saúde e núcleos de epidemiologia. É inegável a importância do banco de dados do SIH-SUS tanto para o monitoramento das CE como para o acompanhamento, controle e avaliação por parte da Auditoria Hospitalar do SUS a fim de se fazer cumprir a Portaria Ministerial 142/1997 que exige o preenchimento do diagnóstico secundário nos internamentos do SUS decorrentes de acidentes e violências. Novos encaminhamentos são necessários para aprimorar estas informações, visando à redução dos indesejáveis subregistros e dos registros incorretos e incompletos. É urgente a necessidade de sensibilização dos gestores, a capacitação dos médicos auditores para que estes possam acompanhar a qualidade dessas informações, a sensibilização e capacitação dos médicos e codificadores hospitalares, conforme propõe o trabalho de TOMIMATSU et al. (2009). Por ocasião da contratualização entre os gestores do SUS e os Hospitais, especialmente aqueles de referência ao trauma, sugere-se o estabelecimento de acordos como a inclusão de cláusulas que visem capacitações frequentes dos profissionais que atuam nestas frentes de atenção visando melhorar os registros de dados e facilitar as ações de acompanhamento, fiscalização e controle dos serviços realizados pelos auditores. O trabalho de MELIONE e MELLO JORGE (2008) ressalta a importância de se desenvolver ações nas esferas municipal, estadual e federal do SUS para o aprimoramento dos dados informados no SIH. Os resultados das pesquisas apontam diferenças na cobertura e qualidade dos dados em CE após confrontação com os dados primários disponíveis nos locais em que foram realizados os estudos, colocando em cheque sua confiabilidade no 18 momento das análises. O preenchimento incorreto, a falta de uniformidade nas notificações e campos incompletos são as principais dificuldades dos pesquisadores. Baseando-se nas publicações estudadas, no Brasil ainda são necessárias mais pesquisas que avaliem a morbidade por CE. A melhoria na forma de registros permitirá análises mais precisas, conforme apontado nesta revisão de literatura, pois em sua grande parte foi necessário que os pesquisadores revisassem o preenchimento das fichas antes de classificá-las como material para seus estudos. Neste sentido sugere-se que o Município de Curitiba implante processos de trabalho com vistas à unicidade nas ações dos auditores. Subsidiando as auditorias de rotina de liberação de AIH, análises de prontuários e fichas de atendimento ambulatorial de vítimas de acidentes e violências. CONCLUSÃO Como sinalizaram vários autores, a melhoria da qualidade das informações sobre a morbimortalidade por CE poderá ser conquistada com o trabalho integrado entre os setores de Segurança Pública, Saúde e Mídia e com investimentos para a sensibilização, melhoria das condições de trabalho e treinamento das pessoas envolvidas no processo de geração de dados. Alguns estudos demonstraram que as secretarias de saúde que realizam a busca ativa ou resgate de informações para complementar ou corrigir os dados das DO apresentam informações mais confiáveis. Como exemplo próximo, cita-se o Setor de Epidemiologia da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba que realiza de rotina a busca ativa de dados ao mesmo tempo em que desenvolve trabalhos intersetoriais. O serviço de Auditoria da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba poderá contribuir para a melhoria da qualidade dos dados de mortalidade, exigindo e acompanhando o preenchimento adequado dos prontuários médicos, dos laudos de Autorização de Internação Hospitalar e das Fichas de Atendimento Ambulatorial de Urgência (Anexo C), pois estes documentos poderão ser fontes importantes para o resgate de informações. Com relação à morbidade hospitalar, a melhoria da qualidade da informação dependerá da sensibilização, treinamento dos médicos e pessoal administrativo dos hospitais, como também da própria auditoria. A implantação, em breve, do novo 19 laudo eletrônico para a autorização dos internamentos hospitalares que apresenta campos específicos para CE, semelhantes aos da DO, permitirá ao auditor acompanhar o preenchimento correto dos CID primário e secundário na AIH, imprescindíveis para a caracterização do evento. Dessa forma, o SIH-SUS passará a fornecer informações mais confiáveis da morbidade hospitalar por estas causas. Certamente, todos os esforços que serão realizados para a melhoria da qualidade das informações sobre a morbimortalidade por Causas Externas serão importantes também para a melhoria das informações sobre outros agravos à saúde. REFERÊNCIAS ANDRADE, S.M et al. Melhoria da qualidade das informações sobre causas externas do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde: uma proposta de intervenção. Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v.10, n.2, p.70-76, jun, 2009. ANDRADE, S.M.; MELLO JORGE, M.H.P. 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ANEXOS Anexo A- Declaração de Óbito Anexo B- Laudo de Autorização de Internação Hospitalar Anexo C- Ficha de Atendimento Ambulatorial de Urgência AGRADECIMENTOS Ao apoio da família, Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba, Faculdades Pequeno Príncipe e à dedicação da orientadora Vera Lídia.