Fundação Oswaldo Cruz Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas Pós-Graduação em Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas Dissertação de Mestrado Estudo comparativo de sistemas reveladores em ensaios imunoenzimáticos para detecção de anticorpos específicos no diagnóstico da leishmaniose tegumentar americana Lílian Dias Nascimento Rio de Janeiro 2007 Curso de Pós-Graduação em Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas Estudo comparativo de sistemas reveladores em ensaios imunoenzimáticos para detecção de anticorpos específicos no diagnóstico da leishmaniose tegumentar americana Lílian Dias Nascimento Orientador: Dr. Mauro Célio de Almeida Marzochi Co-orientadora: Dra. Sonia Regina Lambert Passos Dissertação apresentada ao Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ciências e desenvolvida no Serviço de Parasitologia (IPEC - FIOCRUZ). Rio de Janeiro 2007 ii Curso de Pós-Graduação em Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas Esta Dissertação intitula-se: “Estudo comparativo de sistemas reveladores em ensaios imunoenzimáticos para detecção de anticorpos específicos no diagnóstico da leishmaniose tegumentar americana” Apresentada por: Lílian Dias Nascimento Orientador: Dr. Mauro Célio de Almeida Marzochi Co-orientadora: Dra. Sonia Regina Lambert Passos Local: Auditório do Pavilhão de Ensino do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas Data: 27/04/2007. Horário: 9 horas Banca Avaliadora Dra. Rosely Maria Zancopé Oliveira - IPEC/FIOCRUZ (Presidente) Dra. Graziela Maria Zanini - IPEC/FIOCRUZ Dr. Valmir Laurentino Silva - ENSP/FIOCRUZ Dra. Maria de Fátima Madeira - IPEC/FIOCRUZ (Suplente) iii FICHA CATALOGRÁFICA Nascimento, Lílian Dias Estudo comparativo de sistemas reveladores em ensaios imunoenzimáticos para detecção de anticorpos específicos no diagnóstico da leishmaniose tegumentar americana / Lílian Dias Nascimento - Rio de Janeiro, 2007. 75 p.: il. Dissertação (Mestrado) - Curso de Pós-Graduação em Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas, Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas - IPEC, FIOCRUZ. 1. Leishmania (Viannia) braziliensis 2. Imunoensaio 3. Sistemas Reveladores 4. Validação I. Marzochi, Mauro Célio de Almeida (Orient.) II. Passos, Sonia Regina Lambert (Co-orient.) III. Título iv AGRADECIMENTOS Ao meu orientador, Dr. Mauro Célio de Almeida Marzochi, a quem admiro pela sua sabedoria, competência, profissionalismo e atenção a mim dedicada; À minha co-orientadora, Dra. Sonia Regina Lambert Passos, pela orientação, incentivo, paciência e dedicação durante a realização deste trabalho; À “chefe” Msc. Eliame Mouta Confort pelo apoio, incentivo e confiança sempre a mim dispensada; À Dra. Maria de Fátima Madeira e equipe pela colaboração na realização das culturas; Às “meninas” da sorologia, Marta, Andréia, Flávia, Patrícia, Elaine e Jamyra, e também Viviane e Tatiana pela ajuda e principalmente amizade nas horas difíceis (amigas.... obrigada por ter pessoas como vocês ao meu lado); A todos do Serviço de Parasitologia - IPEC, pelo constante apoio que contribuíram para a realização deste trabalho; Aos colegas de Mestrado, pela convivência e amizade nos momentos em que passamos juntos; À Coordenação de Pós-Graduação, em especial ao secretário Marcelo Eduardo Timóteo, por me receber com atenção, estando sempre disponível a ajudar; Aos professores do Curso de Pós-Graduação que contribuíram com novos conhecimentos; A todas as pessoas que me apoiaram direta ou indiretamente na realização deste trabalho. i LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABTS - 2,2’-azino-bis-3-etilbenzotiazolina-6-ácido sulfônico AP - Fosfatase Alcalina AUC - Area under the ROC curve (Área sob a curva ROC) BHI - Brain Heart Infusion BL - Blank CEP - Comitê de Ética em Pesquisa CN - Controle Negativo CP - Controle Positivo CRLeish - Centro de Referência em Leishmanioses DNA - Ácido desoxirribonucléico DO - Densidade Óptica ELISA - Enzyme-Linked Immunosorbent Assay FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz HIV - Vírus da Imunodeficiência Humana HPPA - 3 - p - hidroxifenil ácido propiônico HRP - Horseradish Peroxidase HSP - Heat Shock Protein (Proteína de choque térmico) IC - Intervalo de Confiança ICC - Intraclass Correlation Coefficient (Coeficiente de Correlação Intraclasse) IDRM - Intradermorreação de Montenegro IPEC - Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas IFI - Imunofluorescência indireta IgA - Imunoglobulina A IgG - Imunoglobulina G IgM - Imunoglobulina M LC - Leishmaniose cutânea LCD - Leishmaniose cutânea difusa LCM - Leishmaniose cutânea-mucosa LM - Leishmaniose mucosa LT - Leishmaniose tegumentar LTA - Leishmaniose tegumentar americana ii LV - Leishmaniose visceral MS - Ministério da Saúde MUP - 4-Metilumbeliferilfosfato Nm - Nanômetro OMS - Organização Mundial de Saúde OPD - O-fenilenodiamino PBS - Salina tamponada com fosfatos PBS-T - PBS pH 7,2 com 0,05% de Tween 20 PBS-TL - PBS-T com 1% de leite desnatado PCR - Reação em cadeia da polimerase pH - Potencial Hidrogeniônico PMP - Monofosfato de fenolftaleína pNPP - p-nitrofenil fosfato RFC - Reação de fixação de complemento RFU - Relative Fluorescence Units ROC - Receiver Operator Characteristic RV+ - Razão de Verossimilhança para o teste positivo RV- - Razão de Verossimilhança para o teste negativo SFB - Soro Fetal Bovino SPSS - Statistical Package for the Social Science STARD - Standards for Reporting of Diagnostic Accuracy SUS - Sistema Único de Saúde TAD - Teste de aglutinação direta Th1 - Células TCD4+ secretoras do padrão 1 de citocinas Th2 - Células TCD4+ secretoras do padrão 2 de citocinas TMB - 3,3’,5,5’-Tetrametilbenzidina VPN - Valor Preditivo Negativo VPP - Valor Preditivo Positivo WHO - World Health Organization iii LISTA DE TABELAS Tabela 1: Freqüência (%) dos diagnósticos no grupo controle. ....................... 28 Tabela 2: Razões entre as médias dos controles positivos (CP) e as médias dos controles negativos (CN) para cada diluição do conjugado e substrato. ... 35 Tabela 3: Resultados positivos e negativos do imunoensaio para os diferentes grupos segundo os três substratos. ................................................................. 38 Tabela 4: Valores de sensibilidade, especificidade, VPP, VPN, RV+ e RV- com seus respectivos IC de 95% para cada substrato. ........................................... 39 Tabela 5: Comparação das áreas sob a curva (AUC) do ensaio enzimático com os diferentes substratos ................................................................................... 40 iv LISTA DE FIGURAS Figura 1: Reação do o-fenilenodiamino com horseradish peroxidase - peróxido de hidrogênio.................................................................................................... 15 Figura 2: Reação da 3,3’,5,5’-tetrametilbenzidina com horseradish peroxidase peróxido de hidrogênio..................................................................................... 15 Figura 3: Reação do 4-metilumbeliferilfosfato com fosfatase alcalina.............. 16 Figura 4: Diluições do conjugado anti-IgG HRP para o cromógeno OPD. ....... 34 Figura 5: Diluições do conjugado anti-IgG HRP para o cromógeno TMB. ....... 34 Figura 6: Diluições do conjugado anti-IgG AP para o fluorógeno MUP............ 35 Figura 7: Distribuição das Densidades Ópticas no ELISA com o cromógeno OPD nos dois grupos - LTA (N= 189) e controle (N= 189)............................... 36 Figura 8: Distribuição das Densidades Ópticas no ELISA com o cromógeno TMB nos dois grupos - LTA (N= 189) e controle (N= 189). .............................. 37 Figura 9: Distribuição das Unidades Relativas de Fluorescência nos ensaios imunoenzimáticos com o fluorógeno MUP nos dois grupos - LTA (N= 189) e controle (N= 189)........................................................................................... 37 Figura 10: Áreas sob a curva ROC dos três sistemas reveladores .................. 40 v RESUMO O presente trabalho tem como objetivo comparar a acurácia e confiabilidade de três sistemas reveladores de ensaios imunoenzimáticos na detecção de anticorpos IgG específicos para o diagnóstico da LTA causada por Leishmania (Viannia) braziliensis. Trata-se de um estudo diagnóstico, mascarado, com repetições independentes, em população total de 378 pacientes de um ambulatório de referência no Rio de Janeiro, dos quais 189 amostras de soro de pacientes com diagnóstico parasitológico positivo para LTA e 189 com diagnóstico confirmado para outras doenças cutâneas do espectro de diagnóstico diferencial de LTA. Nos ensaios imunoenzimáticos foram empregados antígenos parcialmente solúveis obtidos de formas promastigotas de L. (V.) braziliensis e na revelação, dois cromógenos, 1,2-ortofenilenodiamino (OPD) e 3,3’,5,5’-tetrametilbenzidina (TMB) e um fluorógeno, 4- metilumbeliferilfosfato (MUP). O desempenho de cada sistema revelador foi comparado através dos seus parâmetros de acurácia, Coeficiente de Correlação Intraclasse (ICC) e as áreas sob a curva ROC (Receiver Operating Characteristic). A sensibilidade foi idêntica (97,4%) para todos os sistemas. A confiabilidade foi excelente (ICC = 98,61%; 98,74% e 99,11%) e a especificidade variou de 93,7%, 95,8% a 97,4% para OPD, MUP e TMB, respectivamente, sem significância estatística. A não diferença entre as excelentes performances dos três reveladores sugere que se utilize o TMB por possuir vantagens de ordem operacionais como baixo custo referente ao equipamento de leitura, fácil manipulação, estabilidade e menor toxicidade. vi ABSTRACT The present work has the objective to compare accuracy and reliability of three revealing systems of immunoenzymatic assays in the detection of specific IgG antibodies for the diagnosis of ATL caused by Leishmania (Viannia) braziliensis. This is a diagnostic, masked study, with independent repetitions, in a total population of 378 patients of a reference clinic in Rio de Janeiro, of which 189 serum samples of patients with positive parasitological diagnosis for ATL and 189 with diagnostic confirmed for other cutaneous pathologies of the spectrum of differential diagnosis with ATL. The immunoenzymatic assays was performed using partially soluble antigens obtained from promastigote forms of L. (V.) braziliensis and as substrates, two chromogenics, 1,2-o-phenylenediamine (OPD) and 3,3',5,5' - tetramethylbenzidine (TMB) and one fluorogenic, 4methylumbelliferyl phosphate (MUP). Performance of each revealing system was compared through its accuracy parameters, Intraclass Correlation Coefficient (ICC) and the areas under the ROC curve (Receiver Operating Characteristic). Sensitivity was identical (97.4%) for all systems. Reliability was excellent (ICC = 98.61%, 98.74% and 99.11%) and specificity varied of 93,7%, 95.8% and 97.4% for OPD, MUP and TMB, respectively, without statistically significance. The lack of difference between the excellent performances of these three substrates suggests the usage of TMB because its operational advantages like low cost of the reading equipment, easy manipulation, stability and less toxicity. vii SUMÁRIO AGRADECIMENTOS .......................................................................................... i LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ..............................................................ii LISTA DE TABELAS ..........................................................................................iv LISTA DE FIGURAS .......................................................................................... v RESUMO............................................................................................................vi ABSTRACT ....................................................................................................... vii 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................ 1 1.1. O PARASITA E SUA TRANSMISSÃO............................................................. 1 1.2. A APRESENTAÇÃO CLÍNICA NO HOMEM ...................................................... 1 1.3. EPIDEMIOLOGIA ...................................................................................... 3 1.4. DIAGNÓSTICO DA LTA............................................................................. 4 1.4.1. Diagnóstico Parasitológico............................................................ 6 1.4.2. Diagnóstico Sorológico ................................................................. 8 1.4.2.1. Resposta imune a Leishmania............................................... 8 1.4.2.2. Testes sorológicos................................................................. 9 1.4.2.2.1. Ensaios Imunoenzimáticos ........................................................... 12 1.5. AVALIAÇÃO DE TESTES DIAGNÓSTICOS .................................................. 16 1.5.1. Roteiro para determinar a validade de um teste diagnóstico ...... 20 2. JUSTIFICATIVA ........................................................................................ 23 3. OBJETIVOS .............................................................................................. 25 3.1. 3.2. 4. OBJETIVO GERAL ................................................................................. 25 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...................................................................... 25 SUJEITOS E MÉTODOS .......................................................................... 26 4.1. DELINEAMENTO DO ESTUDO .................................................................. 26 4.2. SUJEITOS DA PESQUISA ........................................................................ 26 4.2.1. População do Estudo.................................................................. 26 4.2.2. Tamanho Amostral...................................................................... 26 4.2.3. Critérios de elegibilidade e seleção da amostra.......................... 27 4.3. PARASITAS E ANTÍGENOS UTILIZADOS NOS TESTES .................................. 28 4.3.1. Cultura axênica de L. (V.) braziliensis......................................... 28 4.3.2. Preparação antigênica ................................................................ 29 4.4. PROTOCOLO TÉCNICO DO ENSAIO IMUNOENZIMÁTICO ............................... 30 4.5. CONFIABILIDADE E MASCARAMENTO....................................................... 31 4.6. ANÁLISE ESTATÍSTICA ........................................................................... 31 4.7. ASPECTOS ÉTICOS ............................................................................... 32 5. RESULTADOS.......................................................................................... 33 5.1. DILUIÇÕES DOS CONJUGADOS ANTI-IGG ................................................. 33 5.2. ENSAIOS IMUNOENZIMÁTICOS ................................................................ 36 5.2.1. Definição dos pontos de cortes (cut-off) ..................................... 36 5.2.2. Acurácia dos testes..................................................................... 38 5.2.3. Comparação do desempenho dos três reveladores utilizando a curva ROC ................................................................................................ 39 viii 5.3. CONFIABILIDADE DOS ENSAIOS IMUNOENZIMÁTICOS ................................. 41 6. DISCUSSÃO ............................................................................................. 42 7. CONCLUSÃO ........................................................................................... 47 8. REFERÊNCIAS......................................................................................... 48 9. ANEXOS ................................................................................................... 60 ANEXO 2 - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .......................... 66 ANEXO 3 - TERMO DE COMPROMISSO E RESPONSABILIDADE .............................. 73 ANEXO 4 - APROVAÇÃO NO CEP/IPEC ............................................................ 74 ix 1. INTRODUÇÃO 1.1. O parasita e sua transmissão As leishmanioses constituem um complexo de doenças amplamente distribuídas nos países do Novo e Velho Mundo com uma importante diversidade clínica e epidemiológica (Desjeux, 1996). As leishmanioses são antropozoonoses causadas por protozoários flagelados pertencentes ao gênero Leishmania da ordem Kinetoplastida e família Trypanosomatidae. Estes protozoários são parasitas intracelulares obrigatórios e heteroxênicos, necessitando de pelo menos dois hospedeiros para completar seu ciclo biológico. Apresentam duas formas morfologicamente distintas: promastigota, presente no trato digestivo do vetor, e amastigota, encontrada nas células fagocíticas do hospedeiro vertebrado (Lainson et al., 1987a; Killick-Kendrick, 1990a). As formas promastigotas são transmitidas ao hospedeiro através da picada de fêmeas de dípteros da sub-família Phlebotominae, pertencentes aos gêneros Phlebotomus no Velho Mundo e Lutzomyia no Novo Mundo (Killick-Kendrick, 1990b). 1.2. A apresentação clínica no homem Dependendo da espécie de Leishmania envolvida e da relação do parasita com seu hospedeiro, a doença pode apresentar diferentes formas clínicas variando de lesões autoresolutivas ou persistentes que acometem, seja isolada ou concomitantemente, a pele e mucosas do nariz, boca, faringe e laringe e, por isso, recebem o nome de leishmaniose tegumentar (LT) até um 1 comprometimento visceral acometendo principalmente o baço e fígado (Saravia et al., 1989; Grimaldi & McMahan-Pratt, 1991). A leishmaniose visceral (LV) é a forma sistêmica da doença em que os parasitas apresentam acentuado tropismo por células do sistema fagocítico mononuclear do baço, fígado, medula óssea e tecidos linfóides. Também conhecida como Calazar, a LV se caracteriza por febre irregular, perda de peso, hepatoesplenomegalia, linfadenopatia e anemia, podendo ser fatal antes ou mesmo após o tratamento (Desjeux, 1996). Pelo envolvimento cutâneo e de mucosas no continente americano, a leishmaniose tegumentar americana (LTA) pode ser classificada em leishmaniose cutânea (LC), leishmaniose mucosa (LM), leishmaniose cutâneomucosa (LCM) e leishmaniose cutânea difusa (LCD) (Marzochi & Marzochi, 1994). A LC é a forma clínica mais freqüente que produz exclusivamente lesões cutâneas, ulcerosas ou não, porém limitadas. Esta forma inicia-se geralmente como uma pápula no local da picada do inseto, progredindo para uma úlcera cutânea arredondada ou ovóide com bordas elevadas bem delimitadas e eritrematosas com fundo granuloso (Marsden & Nonato, 1975; Marsden, 1985; Costa et al., 1987). As lesões podem ser múltiplas ou uma única curando-se espontaneamente ou após tratamento terapêutico específico (Marzochi & Marzochi, 1994; Oliveira-Neto et al., 2000). Cerca de 3 a 5% dos casos de LC progridem para a forma cutâneo-mucosa (Marsden et al., 1986). A LCM é classicamente descrita como secundária e metastática, com a possibilidade de ocorrer acometimento da mucosa por contigüidade a lesões de 2 pele ou por inoculação direta do parasita (Marzochi & Marzochi, 1994). A mucosa nasal, isoladamente ou associada a outras áreas, constitui a localização mais comum. Esta forma não tende a evoluir para a cura espontânea e as lesões são mais resistentes à terapêutica antimonial (Marsden et al., 1986; Oliveira-Neto et al., 1998). A LCD é a forma anérgica da doença que se caracteriza por lesões cutâneas múltiplas, não ulceradas, ricas em parasitas, formadas distantes do local da picada do inseto, estendendo-se por grande área da superfície corporal e de difícil tratamento (Marzochi & Marzochi, 1994). Na LTA, as principais espécies relacionadas à doença são L. (Leishmania) amazonensis, L. (L.) mexicana, L. (Viannia) peruviana, L. (V.) guyanensis, L. (V.) panamensis e L. (V.) braziliensis, sendo esta última encontrada em todas as regiões endêmicas do Brasil (Lainson et al., 1987b; Marzochi & Marzochi, 1994; Desjeux, 1996; Weigle & Saravia, 1996). 1.3. Epidemiologia Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS/WHO), as leishmanioses são endêmicas em 88 países, 21 do Novo Mundo e 66 do Velho Mundo. Estima-se que aproximadamente 350 milhões de pessoas no mundo estejam expostas a fatores de risco para as infecções, com uma incidência de dois milhões de novos casos por ano, sendo que 1,5 milhões de LT e 500 mil de LV. Do número total de casos de LT, 90% ocorrem em apenas seis países: Afeganistão, Arábia Saudita, Irã, Síria, Brasil e Peru (World Health Organization, 1998). 3 Nos últimos 20 anos, a incidência de LTA no Brasil vem aumentando em praticamente todos os Estados. A existência de surtos epidêmicos nas regiões Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e mais recentemente na região Amazônica está relacionada à mudança nos perfis epidemiológicos da doença, que era considerada predominantemente silvestre. Com o processo migratório, urbanização de áreas adjacentes a ambientes rurais e ocupação de encostas nas periferias urbanas, a transmissão passou também a ocorrer no peridomicílio e no intradomicílio, condicionado à adaptação de algumas espécies de flebotomíneos ao meio ambiente urbano e envolvendo animais domésticos, principalmente o cão, como reservatórios (Dias et al., 1977; Oliveira-Neto et al., 1988; Marzochi & Marzochi, 1994). A LTA constitui um problema de saúde pública em nosso país e sua importância reside não somente na sua alta incidência e ampla distribuição geográfica, mas também na possibilidade da existência de lesões destrutivas, desfigurantes e até incapacitantes, com grande repercussão no campo psicossocial do indivíduo (Gontijo & Carvalho, 2003). 1.4. Diagnóstico da LTA O diagnóstico da LTA abrange aspectos epidemiológicos, clínicos e laboratoriais. Freqüentemente a associação de alguns desses elementos é necessária para se chegar ao diagnóstico final. Diante do amplo espectro de lesões produzidas pela LTA, o diagnóstico clínico nem sempre se torna simples e imediato, mas pode ser realizado com base nas características dessas lesões associadas a anamnese, onde os 4 dados epidemiológicos são de grande importância (Saravia et al., 1989). No entanto, existem diversas doenças cujas formas cutâneas se assemelham às da leishmaniose tegumentar. Dentre elas estão as úlceras traumáticas, piodermites, paracoccidioidomicose, neoplasias cutâneas, hanseníase, tuberculose cutânea e esporotricose, fazendo-se necessário o diagnóstico diferencial antes do início do tratamento adequado (Furtado, 1980; Kar, 1995; Ministério da Saúde, 2006; Barros et al., 2005). O teste cutâneo, a intradermorreação de Montenegro (IDRM) é largamente utilizada na rotina ambulatorial e possui um grande valor presuntivo no diagnóstico da LTA, sendo também bastante útil nos inquéritos epidemiológicos de áreas endêmicas (Shaw & Lainson, 1975). Esse teste detecta reações de hipersensibilidade tardia uma vez que a resposta imune característica da LT é do tipo celular (Carvalho et al., 1995). No entanto, a IDRM apresenta restrições quanto a ausência de discriminação entre doença e infecção; doença atual e pregressa, podendo permanecer positiva mesmo após o tratamento (Montenegro, 1926); e ainda em pacientes com leishmaniose cutânea difusa e em imunodeprimidos, o resultado tende a ser negativo. Um outro problema apresentado em alguns pacientes foi a alergia ao diluente do reagente do teste, o que acarretou em um resultado falso positivo na IDRM, levando ao fabricante a trocar o thimerosal utilizado como veículo pelo fenol (Marzochi et al., 1998; Paranhos-Silva et al., 2001; Fagundes et al., 2003). 5 1.4.1. Diagnóstico Parasitológico Na LTA, o diagnóstico parasitológico é considerado diagnóstico de certeza ou definitivo, pois se baseia na evidenciação do parasita através de pesquisa direta ou indireta (Garham, 1971; Furtado, 1972). A pesquisa direta é o procedimento de primeira escolha, por ser rápido, de fácil execução e ter baixo custo. O material é obtido da lesão por escarificação, punção aspirativa ou biópsia da borda (imprint), fixado em uma lâmina de vidro e corado pelas técnicas de Giemsa ou Leishman para a posterior visualização das formas amastigotas. A sensibilidade do método apresenta valores que variam entre 42% (Pirmez et al., 1999), 56,4% (Weigle et al., 2002) e 77% (Lopez et al., 1993b), devido à espécie de Leishmania envolvida, à escassez de parasitas na lesão e também pode ser ainda menor em lesões onde o tempo de evolução é superior a um ano (Ministério da Saúde, 2007). Na pesquisa indireta é realizado o cultivo dos parasitas, o qual pode ser in vitro ou in vivo. No cultivo in vitro, o material de biópsia da lesão deve ser inoculado diretamente em meios de cultura apropriados, estéreis, para se tentar o isolamento do parasita, pois a freqüente contaminação fúngica e bacteriana pode impossibilitar o diagnóstico. No cultivo in vivo, o parasita pode ser isolado através da inoculação em animais de laboratório. Desvantagens como o longo tempo necessário para a evolução da doença no animal, a exigência de um espaço físico adequado para a manutenção desses animais e a eficácia do isolamento variar conforme a espécie de Leishmania faz com que 6 não se utilize essa técnica para o diagnóstico (Melo, 1981; Ministério da Saúde, 2007). Sob o ponto de vista histológico, as lesões de LTA, tanto cutâneas quanto mucosas, são descritas como uma reação inflamatória crônica granulomatosa. O infiltrado dérmico é constituído sobretudo por linfócitos, plasmócitos e histiócitos, onde os parasitas são dificilmente encontrados (Pessôa & Barretto, 1948; Magalhães et al., 1986). No entanto, o diagnóstico histopatológico de certeza só é possível mediante a detecção do parasita. Caso contrário, as alterações serão somente sugestivas do diagnóstico (Gontijo & Carvalho, 2003). Baixa sensibilidade, tempo elevado para a execução e necessidade de técnicos treinados são limitações dos métodos para a evidenciação da Leishmania. Por isso, novas técnicas para a identificação do parasita vêm sendo utilizadas como a técnica da reação em cadeia da polimerase (PCR) (Pirmez et al., 1999; Oliveira et al., 2003). Esta técnica consiste na amplificação do DNA ribossomal e DNA do minicírculo do cinetoplasto provenientes de materiais como sangue periférico e biópsias de lesões de pacientes, sendo esses os alvos ideais pois estão presentes em múltiplas cópias e possuem regiões conservadas e regiões variáveis (Bruijn & Barker, 1992; Meredith et al., 1993; Uliana et al., 1994). Por ser um método com altos índices de sensibilidade que variam de 80% (Lopez et al., 1993b), 94% (Pirmez et al., 1999) a 100% (Oliveira et al., 2003), espera-se que a utilização dessa ferramenta possa auxiliar em situações onde a escassez do parasita inviabilize o isolamento, em pacientes com infecção subclínica ou em inquéritos 7 epidemiológicos (Lopez et al., 1993a; Coutinho et al., 2002; Leontides et al., 2002). Entretanto, as exigências técnicas e o custo relativamente elevado ainda reduzem seu emprego na rotina laboratorial. 1.4.2. Diagnóstico Sorológico 1.4.2.1. Resposta imune a Leishmania Em 1970, Bryceson postulou que na leishmaniose experimental a resistência à infecção é dependente da imunidade celular envolvendo linfócitos e macrófagos. Além disso, que a interação entre estas células, associada à produção local de fatores solúveis, poderia resultar em um efeito citotóxico sobre os macrófagos parasitados na lesão e concomitantemente destruição dos parasitas. A resolução da infecção é dependente da espécie de Leishmania envolvida e da resposta imune do hospedeiro (Coutinho et al., 1987). A partir da década de 80, estudos mostraram a importância dos linfócitos T, CD4+ e CD8+, na resolução da infecção (Mitchell et al., 1980; Milon et al., 1995). O balanço entre as respostas do tipo Th1 e Th2 são fundamentais para o curso da infecção, sendo a resistência mediada por Th1 e a susceptibilidade por Th2 (Coutinho et al., 1998; Rocha et al., 1999). Na resposta imune humoral, a produção de anticorpos específicos antiLeishmania, independente da forma clínica, é predominantemente constituída por imunoglobulina G (IgG). Estudos relatam baixas concentrações séricas de imunoglobulina A (IgA) anti-Leishmania em pacientes com leishmaniose cutâneo-mucosa (LCM), níveis moderados de imunoglobulina M (IgM) anti- 8 Leishmania nos dois primeiros meses de infecção e assim como a correlação entre a dosagem de subclasses de IgG (IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4) com os diferentes perfis clínicos da doença (Guimarães et al., 1989; Guimarães et al., 1990; O'Neil et al., 1993; Ulrich et al., 1995; Souza et al., 1998). 1.4.2.2. Testes sorológicos Apesar das controvérsias na literatura a respeito da sensibilidade e especificidade das técnicas aplicadas ao imunodiagnóstico, do seu valor limitado devido aos baixos níveis séricos de anticorpos específicos na leishmaniose tegumentar e das reações cruzadas que ocorrem freqüentemente com amostras de pacientes portadores de outras doenças infecciosas, os testes sorológicos são as principais ferramentas utilizadas no diagnóstico em situações onde a evidenciação do parasita não é possível (Roffi et al., 1980; Teixeira & Vexenat, 1996). Em 1919, Moses descreveu a reação de fixação de complemento (RFC), o primeiro teste sorológico para a leishmaniose visceral. A RFC foi utilizada em inquéritos soro-epidemiológicos e considerada importante no diagnóstico precoce da doença e no monitoramento da eficácia do tratamento (Pampiglione et al., 1974; Bettini et al., 1977). No entanto, o teste apresentava reações cruzadas com outras doenças parasitárias e infecções micóticas (Manuel & Behin, 1982). O teste de hemaglutinação indireta foi utilizado por Cascio et al. (1963) em pacientes também com leishmaniose visceral. Além de não haver diferença na resposta às diversas espécies de Leishmania, o teste possui reação 9 cruzada com soros de pacientes de outras doenças como a malária, esquistossomose, doença de chagas entre outras (Bray & Lainson, 1967; Antunes et al., 1972). Chaffee (1963) descreveu padrões diferentes de precipitação obtidos através da imunodifusão dupla de Ouchterlony a partir de preparações antigênicas de Leishmania donovani, L. tropica e L. braziliensis, porém sem especificidade na resposta do soro com o antígeno homólogo (Bray & Lainson, 1966). A contraimuneletroforese é mais sensível que a imunodifusão e o tempo de execução do teste é menor (Kar, 1995). Outro teste sorológico utilizado no diagnóstico da leishmaniose é o teste de aglutinação direta (TAD) descrito por Allain e Kagan (1975). No diagnóstico da LV, o TAD possui limitações no que diz respeito à não distinção entre infecção recente, de cura e reações cruzadas com soros de pacientes com tripanosomíase africana (Harith et al., 1987). A simplicidade no preparo do antígeno, a facilidade na execução e estabilidade dos reagentes permitiu a recomendação deste teste quando outras técnicas não estivessem disponíveis (Barral-Netto et al., 1986). Diferentemente da LV, os anticorpos circulantes na leishmaniose tegumentar não estão em concentrações suficientemente elevadas para permitirem um excelente desempenho dos testes sorológicos acima descritos. Por isso, somente após o advento de técnicas de marcação, como as reações de imunofluorescência e os ensaios imunoenzimáticos, é que o papel dos anticorpos específicos anti-Leishmania foi melhor estudado (Behforuz et al., 1976; Anthony et al., 1980). 10 A partir de sua descrição na década de 60 por Oddo e Cascio (1963), a reação de imunofluorescência indireta (IFI) vem sendo amplamente utilizada no diagnóstico da LT, em área de L. (V.) braziliensis, devido à sua boa sensibilidade, 76,4% (Souza et al., 1982), e especificidade, 85,6% e 86,2% (Guimarães et al., 1991; Barroso-Freitas, 2006), embora apresente reações cruzadas com pacientes de leishmaniose visceral e tripanosomíases (Camargo & Rebonato, 1969; Furtado, 1980). Em área de L. (V.) guyanensis e em casos isolados de infecção por L. (L.) amazonensis, a sensibilidade da IFI é menor (Silveira et al., 1999; Ministério da Saúde, 2007). Vários estudos foram realizados utilizando como antígenos de IFI diferentes espécies de Leishmania tanto nas formas promastigotas quanto nas amastigotas (Convit & Pinardi, 1969; Guimarães et al., 1974; Badaro et al., 1983), comparando o uso de antígeno homólogo e heterólogo em relação ao agente infeccioso (Shaw & Voller, 1964) e também a utilização de soros não diluídos ou em diluições muito baixas visando avaliar a ocorrência de reações cruzadas com soros de pacientes de outras doenças endêmicas (Araujo & Mayrink, 1968). Diversos autores observaram que os níveis dos anticorpos circulantes na leishmaniose tegumentar diminuem ou desaparecem após o tratamento específico ou na vigência de regressão espontânea. Esse fato possibilita a utilização da IFI no monitoramento terapêutico e no controle de cura (Chiari et al., 1973; Walton, 1980; Souza et al., 1982; Schubach et al., 1998). No Brasil, o Ministério da Saúde (MS) preconiza a utilização da IFI, no Sistema Único de Saúde (SUS), como teste de referência para o diagnóstico 11 sorológico da leishmaniose visceral humana e canina. Na LTA, a IFI e o ensaio imunoenzimático são úteis nos casos de lesões extensas ou múltiplas e nos casos de lesões mucosas, e devem ser realizados preferencialmente em centros de referência (Ministério da Saúde, 2007). 1.4.2.2.1. Ensaios Imunoenzimáticos Nos últimos anos, vários ensaios imunoenzimáticos vêm sendo descritos para a detecção de anticorpos específicos na leishmaniose. Métodos como o Dot-ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay), cujo antígeno é adsorvido em papel de nitrocelulose e o aparecimento de cor na superfície do papel indicando positividade é facilmente observado, possui grande utilidade em inquéritos epidemiológicos para LV podendo mesmo ser usado nas áreas endêmicas (Pappas et al., 1983); e o immunoblotting que além de ter elevadas sensibilidade (91%) (Brito et al., 2000) e especificidade (100%) (Brito et al., 2000; Gonçalves et al., 2002), permite identificar perfis de proteínas antigênicas da Leishmania reconhecidos pelos soros de indivíduos infectados. Entretanto, seu emprego no diagnóstico é restrito por ser uma técnica que necessita de equipamentos e reagentes próprios, sua execução é demorada e não existe uma padronização do perfil antigênico das espécies de Leishmania. O teste de ELISA é o mais empregado por ser um teste rápido, que permite automação, possui desempenho semelhante à reação de imunofluorescência indireta (Engvall & Perlmann, 1972; Voller et al., 1976) e ainda possibilita a utilização de extratos solúveis de Leishmania como antígeno (Hommel et al., 1978; Anthony et al., 1980). 12 Os antígenos utilizados nos ensaios imunoenzimáticos são de importância crucial para a acurácia do teste. Autores descrevem que a utilização no ELISA de antígenos homólogos em substituição a antígenos heterólogos no diagnóstico da LTA pode aumentar a sensibilidade e a especificidade (Nascimento et al., 2003; Barroso-Freitas, 2006). No entanto, o mesmo não ocorreu quando Guimarães et al. (1991) compararam extratos antigênicos de L. braziliensis e L. major-like, não mostrando diferença na performance entre ambos. Ainda em relação aos antígenos, alguns estudos identificaram certas moléculas com propriedades imunogênicas como a proteína de choque térmico (HSP) 60 (Rey-Ladino et al., 1997), HSP83 (Celeste et al., 2004) e a glicoproteína 63 (Bouvier et al., 1985), sendo algumas destas espécieespecíficas, como potenciais candidatas a sua utilização no imunodiagnóstico, porém ainda não houve comprovação da eficácia dessas frações antigênicas. Outro parâmetro que pode afetar o desempenho do ensaio imunoenzimático é o limiar de detecção do sistema revelador. Geralmente, a utilização de reveladores cromogênicos nos imunoensaios é sensível o suficiente para ser usada na rotina sorológica. Todavia, quando os constituintes-alvo estão presentes em pequenas concentrações, como os baixos níveis de anticorpos na LTA, é necessário o uso de procedimentos capazes de amplificar o sinal enzimático (Avrameas, 1992). Um desses mecanismos é a utilização de reveladores que geram produtos fluorescentes ou luminescentes. Compostos fluorescentes podem ser 13 detectados mesmo estando presentes em quantidades extremamente pequenas (Avrameas & Guilbert, 1971; Ishikawa, 1973). Na década de 60 os sistemas reveladores utilizavam radioisótopos como moléculas de detecção. No decorrer dos anos outras moléculas foram desenvolvidas e atualmente as mais utilizadas são as enzimas que convertem substratos incolores em coloridos ou moléculas não fluorescentes em fluorescentes. O ensaio é quantitativo e a intensidade da cor gerada é proporcional à quantidade da enzima presente. As enzimas mais utilizadas são a horseradish peroxidase (HRP) e a fosfatase alcalina (AP). A HRP é uma glicoproteína pertencente ao grupo de ferroprotoporfirinas e é composta por uma cadeia polipeptídica com quatro pontes dissulfídricas e 18% de carboidratos. O pH ótimo para sua atividade é aproximadamente 5,0, onde se liga ao peróxido de hidrogênio (H2O2) resultando em um complexo que oxida uma variedade de aminas e fenóis doadores de hidrogênio (Shannon et al., 1966). O-fenilenodiamino (OPD) (C6H8N2 . HCl) é um cromógeno cuja oxidação pela HRP-H2O2 produz 2,3-diaminofenazina (Figura 1), um composto solúvel cuja cor varia de laranja a marrom, e após a adição de ácido sulfúrico ou clorídrico sua intensidade pode ser medida em espectrofotômetro a 492 nm (Bovaird et al, 1982). 14 Figura 1: Reação do o-fenilenodiamino com horseradish peroxidase peróxido de hidrogênio. 2,3-diaminofenazina 3,3’,5,5’-tetrametilbenzidina (TMB) (C16H20N2) é o cromógeno mais utilizado nos imunoensaios onde a enzima catalisadora da reação é a HRP. Sua oxidação (Figura 2) produz um composto de cor azul que com a acidificação torna-se amarelo cuja absorbância é obtida a 450 nm (Frey et al., 2000). Figura 2: Reação da 3,3’,5,5’-tetrametilbenzidina com horseradish peroxidase - peróxido de hidrogênio. Fonte: Frey, A., Meckelein, B., Externest, D. and Schmidt, M. A. 2000. A stable and highly sensitive 3,3',5,5'-tetramethylbenzidine-based substrate reagent for enzyme-linked immunosorbent assays. J Immunol Methods, 233 (1-2): 47-56. 15 Outra enzima utilizada nos ensaios imunoenzimáticos é a fosfatase alcalina, uma metaloenzima com dois átomos de zinco por molécula. 4metilumbeliferilfosfato (MUP) (C10H9O6P) é um substrato cuja hidrólise pela fosfatase alcalina gera um composto, 4-metilumbeliferone (Figura 3), que é intensamente fluorescente em pH 10,3, com emissão de fluorescência a 448 nm e excitação máxima a 364 nm (Fernley & Walker, 1965) . Figura 3: Reação do 4-metilumbeliferilfosfato com fosfatase alcalina. Fosfatase Alcalina 4-metilumbeliferilfosfato 1.5. 4-metilumbeliferone Avaliação de Testes Diagnósticos Os médicos dedicam grande parte de seu tempo determinando diagnóstico para as queixas ou anormalidades de seus pacientes. A maioria dos bons clínicos usa juízo crítico, conhecimento amplo da literatura e um tipo de abordagem empírica de como organizar a informação diagnóstica. Entretanto, estabelecer um diagnóstico é um processo imperfeito resultando em probabilidade e não em certeza de se estar correto e a utilização das leis de probabilidade auxilia na interpretação do testes diagnósticos (Fletcher et al., 1996). 16 Clínicos e epidemiologistas sempre solicitam exames sorológicos para o diagnóstico e esperam resultados que sejam confiáveis, porém, em alguns casos, os exames podem gerar informações que nem sempre são compatíveis com o diagnóstico. A grande quantidade de métodos e técnicas empregados nos exames sorológicos é uma indicação da dificuldade de obtenção de resultados com absoluta acurácia. Essa finalidade poderia ser atendida por um método altamente sensível e específico, mas que inexiste (Teixeira & Vexenat, 1996). Na avaliação da qualidade de testes diagnósticos são utilizados dois conceitos: a precisão e a validade de um “teste” (OPAS, 1997). A precisão ou confiabilidade não constitui um atributo do desenho da investigação como um todo, e sim uma qualidade exclusiva dos instrumentos de coleta de dados (Almeida Filho & Rouquaryol, 2002). Portanto, refere-se à concordância dos resultados de um exame ou de um instrumento na mão de diferentes avaliadores, em momentos distintos. A confiabilidade marca a variação da medida, definindo a estabilidade ou consistência da mensuração. Outras terminologias utilizadas são reprodutibilidade, quando o teste é realizado em laboratórios e com avaliadores distintos, e repetibilidade, quando o mesmo avaliador realiza o teste em momentos diferentes. Os resultados gerados pelos ensaios imunoenzimáticos expressos sob a forma de densidade óptica (DO) são variáveis contínuas e a confiabilidade destas é medida através do Coeficiente de Correlação Intraclasse (ICC Intraclass Correlation Coefficient). O ICC combina informações sobre correlação e diferenças sistemáticas entre leitores ou aferições, ele varia de -1 17 a 1 e quanto maior o ICC, menor a contribuição dos erros no processo de medida na variação total . Validade ou acurácia de um teste refere-se ao grau em que o exame é capaz de determinar o verdadeiro valor do que está sendo medido, informa se os resultados representam a “verdade” ou o quanto se afastam dela. Para tal, comparam-se os resultados do teste com um “padrão-ouro”, este é o indicador mais fiel da verdade e pode ser o verdadeiro estado do paciente, um conjunto de exames julgados mais adequados ou uma outra forma de diagnóstico que sirva de referência (OPAS, 1997). Da mesma forma que o descrito para a confiabilidade, a acurácia pode ser medida através de propriedades inerentes ao teste diagnóstico como: • Sensibilidade: É a capacidade do teste de detectar a doença quando ela está de fato presente, ou seja, expressa a probabilidade de um teste dar positivo na presença da doença (verdadeiros positivos); • Especificidade: É a capacidade do teste de afastar a doença quando ela está ausente, ou seja, expressa a probabilidade de um teste dar negativo na ausência da doença (verdadeiros negativos); • Valores preditivos: É a probabilidade de doença dados os resultados de um teste diagnóstico. O valor preditivo positivo (VPP) expressa a probabilidade de um paciente com o teste positivo ter a doença e o valor preditivo negativo (VPN), a probabilidade de um paciente com teste negativo não ter a doença; • Razão de Verossimilhança (Likelihood Ratio): É a razão entre a probabilidade de um determinado resultado de um teste diagnóstico 18 em indivíduos portadores da doença e a probabilidade do mesmo resultado em indivíduos sem a doença. A razão de verossimilhança para o teste positivo (RV+) expressa quantas vezes é mais provável encontrar um resultado positivo em pessoas doentes quando comparado com pessoas não doentes e razão de verossimilhança para o teste negativo (RV-), quantas vezes é mais provável encontrar um resultado negativo em pessoas doentes quando comparado com pessoas não doentes. Um teste sensível é o teste de escolha quando a penalidade por deixar de diagnosticar a doença é grande ou na fase inicial de um processo diagnóstico onde um grande número de possibilidades está sendo considerado e se quer reduzi-lo. Um teste específico é útil para confirmar um diagnóstico sugerido por outros dados e é necessário quando os resultados falsos positivos podem lesar o paciente física, emocional ou financeiramente. Sem dúvida, é desejável dispor de um teste 100% sensível e 100% específico que raramente é encontrado na prática, pois na tentativa de melhorar a sensibilidade freqüentemente resulta na piora da especificidade (OPAS, 1997). Assim, para um teste como o ensaio imunoenzimático no qual se utilizam medidas contínuas é necessário determinar um ponto de corte (cutoff) entre os valores considerados positivos e negativos. Uma maneira de expressar a relação entre sensibilidade e especificidade é através da construção da curva ROC (Receiver Operator Characteristic). Desenvolvida na década de 1950 para a análise de detecção de sinal de radares e introduzida na área médica na década de 1960, a curva ROC se 19 tornou uma importante ferramenta na avaliação de testes diagnósticos (Zweig & Campbell, 1993). A curva ROC é construída plotando-se a taxa de verdadeiros positivos (sensibilidade) contra a taxa de falsos positivos (1-especificidade) ao longo de uma faixa de pontos de corte. Os valores nos eixos vão de uma probabilidade de 0 a 1 (0 a 100%). Testes de bom poder discriminatório concentram-se no canto superior esquerdo da curva ROC e testes de menor poder discriminatório têm curvas mais próximas à diagonal que vai da esquerda inferior à direita superior. Esta diagonal mostra a relação entres a taxa de resultados verdadeiros positivos e falsos positivos que seria obtida por um teste que não traz nenhuma informação diagnóstica (Fletcher et al., 1996). Além de auxiliarem na identificação do melhor ponto de corte, as curvas ROC são muito utilizadas para comparar dois ou mais testes diagnósticos para a mesma doença. Nesse caso, o poder discriminatório do teste pode ser mensurado através do cálculo da área sob a curva ROC (AUC - Area under the ROC curve), quanto maior a AUC melhor será o teste diagnóstico. 1.5.1. Roteiro para determinar a validade de um teste diagnóstico O delineamento de estudos para avaliar a utilidade clínica ou populacional de testes diagnósticos deve incorporar dois aspectos. O primeiro deles diz respeito aos princípios de randomização e mascaramento (OPAS, 1997). A randomização ou aleatorização corresponde ao processo de alocação aleatória de pacientes ou espécimes clínicos em grupos buscando uma distribuição equilibrada de variáveis de confundimento. E o mascaramento é 20 realizado para minimizar o viés de mensuração, impedindo o comportamento de um modo sistemático por parte do avaliador, caso saiba que tipo de intervenção ou confirmação diagnóstica está submetido aquele paciente ou espécime clínica (Almeida Filho & Rouquaryol, 2002). O segundo aspecto a ser levado em conta refere-se à prática clínica vigente como, por exemplo, se o teste será aplicado nas mesmas condições de seu uso na rotina laboratorial (OPAS, 1997). Em 1999, um grupo do Cochrane Colloquium discutindo sobre a baixa qualidade metodológica de artigos que reportavam avaliações de testes diagnósticos, desenvolveram um roteiro de itens que deveriam ser incluídos em trabalhos sobre estudos de acurácia diagnóstica. Esse roteiro foi denominado STARD (Standards for Reporting of Diagnostic Accuracy) (Bossuyt et al., 2003). O STARD inicia-se com a certificação através da identificação de palavras-chave de que se trata de um estudo de acurácia diagnóstica seguido de questionamentos sobre a justificativa do estudo, como vantagens na introdução de um novo teste ou comparação de acurácia entre diversos testes e/ou grupos participantes. A metodologia deve contemplar os seguintes tópicos: • Sujeitos da pesquisa: definição da procedência e dos critérios de elegibilidade da população a ser estudada, qual a base clínica e laboratorial para o recrutamento, qual o critério adotado para a definição da amostragem, é o estudo prospectivo ou retrospectivo; • Métodos: Etapas do processamento do teste índice e do teste de referência, especificações técnicas dos materiais utilizados, 21 detalhamento da interpretação dos resultados dos testes que serão avaliados, informação sobre mascaramento na realização dos testes; utilização de métodos estatísticos para a análise dos resultados. Os resultados devem conter informações referentes às características clínicas e demográficas da população do estudo e se em todos os participantes foram aplicados os testes propostos, tabulação dos resultados do testes índice e de referência, estimações de parâmetros de acurácia diagnóstica com medidas de quantificação de incerteza (intervalo de confiança - IC), destino dos resultados perdidos ou indeterminados. E finalizando, a discussão deve abordar a aplicabilidade clínica dos achados do estudo. 22 2. JUSTIFICATIVA No Centro de Referência em Leishmanioses (CRLeish), situado no Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (IPEC), foram atendidos cerca de 230 pacientes com LTA provenientes do Estado do Rio de Janeiro entre os anos de 2002 e 2004. Esses pacientes foram submetidos à rotina clínica e laboratorial, na qual os métodos diagnósticos (IDRM, sorologia, histopatologia, cultura e exame direto) são realizados. Os testes sorológicos contribuem para o diagnóstico da LTA, apesar do seu valor limitado devido à baixa resposta humoral e às reações cruzadas com outras doenças (Roffi et al., 1980; Teixeira & Vexenat, 1996), com sinais clínicos semelhantes, especialmente a esporotricose cuja incidência aumentou recentemente no Rio de Janeiro (Barros et al., 2001; Barros et al., 2004). Vários outros parâmetros podem afetar o desempenho dos métodos imunoenzimáticos, como as frações antigênicas empregadas, o grau de avidez e afinidade dos anticorpos pelos antígenos e o limiar de detecção da técnica. Alguns autores relacionaram o aumento da sensibilidade no ensaio imunoenzimático com o uso de reveladores fluorogênicos e sua utilização em detrimento dos cromógenos (Shalev et al., 1980; Labrousse et al., 1982; Rakhmanova & MacDonald, 1998). Neste estudo, pretendeu-se comparar a acurácia de três tipos de reveladores no ensaio imunoenzimático para LTA. Baseado na literatura foram selecionados os cromógenos OPD (o-fenilenodiamino-Sigma®), utilizado na rotina do nosso laboratório, o TMB (3,3’,5,5’-tetrametilbenzidina-Sigma®) e o fluorógeno MUP (4-metilumbeliferilfosfato-Molecular Probes®), cujos limiares 23 de detecção para IgG são, respectivamente, 2; 0,3 e 0,5 ng/mL (Porstmann & Kiessig, 1992). A escolha do antígeno L. braziliensis a ser empregado no ensaio imunoenzimático deste estudo decorreu ao fato desta espécie ser a mais prevalente e identificada como etiologicamente associada a LTA no Rio de Janeiro e, também pelos resultados de estudos de acurácia do ELISA realizados por nosso grupo, comparando antígenos L. braziliensis e L. majorlike. Nascimento et al. (2003) observaram uma sensibilidade de 65,4% com antígeno L. major-like e 84,4% com L. braziliensis, e especificidade de 84,4% e 91,7%, respectivamente. Os resultados de Barroso-Freitas (2006) corroboraram os nossos, com sensibilidade e especificidade de 95,7% e 100% para L. braziliensis e de 78,7% e 82,8% para L. major-like. 24 3. OBJETIVOS 3.1. Objetivo Geral Comparar a acurácia de três sistemas reveladores utilizados em ensaios imunoenzimáticos para a detecção de anticorpos IgG específicos no diagnóstico da leishmaniose tegumentar americana causada por Leishmania (Viannia) braziliensis. 3.2. • Objetivos Específicos Comparar a sensibilidade, especificidade, valores preditivos e razões de verossimilhança dos ensaios imunoenzimáticos para os sistemas reveladores; • Determinar a confiabilidade do ensaio imunoenzimático para os diferentes sistemas reveladores; • Indicar o revelador mais adequado no ensaio imunoenzimático para o diagnóstico sorológico da LTA no Serviço de Parasitologia do IPEC. 25 4. SUJEITOS E MÉTODOS 4.1. Delineamento do Estudo Estudo diagnóstico seccional, mascarado, randomizado, com repetições independentes para comparação de três sistemas reveladores em ensaios imunoenzimáticos para o diagnóstico da leishmaniose tegumentar americana, em população de pacientes atendidos no ambulatório do CRLeish - IPEC. 4.2. Sujeitos da Pesquisa 4.2.1. População do Estudo A população do estudo foi constituída de pacientes atendidos no ambulatório do CRLeish - IPEC no período de janeiro de 2003 a julho de 2005. 4.2.2. Tamanho Amostral O tamanho amostral calculado foi de 378 indivíduos, sendo 189 em cada grupo (casos versus controles) considerando uma sensibilidade esperada de 84% (para o método em avaliação - ensaio imunoenzimático) (Nascimento et al., 2003); uma diferença limite de equivalência entre os dois métodos de 5%, um nível de significância de 5% e um poder de 80% utilizando-se a fórmula de cálculo amostral para equivalência de duas proporções. As variações de tamanho amostral ocorreram segundo a expectativa de performance para o teste ELISA convencional, em avaliação, e segundo a magnitude da margem de erro admitida. 26 4.2.3. Critérios de elegibilidade e seleção da amostra As amostras de soro incluídas no estudo foram provenientes de pacientes atendidos no ambulatório de CRLeish e que foram submetidos ao protocolo padrão de rotina clínica (Anexo 1) no período acima citado. O critério de confirmação para o grupo de pacientes com LTA foi o diagnóstico parasitológico positivo obtido através da cultura, imprint ou histopatologia. Amostras de soro de pacientes com outras doenças cutâneas que compõe o espectro do diagnóstico diferencial com LTA foram utilizadas como grupo controle, e a confirmação do diagnóstico realizada pela positividade na cultura, histopatologia ou exame direto para a dada doença. A partir do banco de dados de pacientes do CRLeish, as amostras de soro foram selecionadas aleatoriamente utilizando o programa EPI-Info 6.0. A fim de que não houvesse erro na classificação, o prontuário de todos os pacientes selecionados foi revisto para a confirmação do diagnóstico. Dos 189 pacientes com LTA, 166 possuíam leishmaniose cutânea, 14 com leishmaniose cutâneo-mucosa e nove com a forma mucosa. No grupo controle, o diagnóstico encontrado mais freqüente foi o de esporotricose, seguido de piodermite, úlcera vascular, neoplasia, dermatofitose, sífilis e paracoccidioidomicose (Tabela 1). Para este estudo, foi considerada somente a primeira amostra de soro coletada do paciente para diagnóstico e antes do início da terapêutica apropriada. Todas as amostras utilizadas foram diluídas 1:2 em glicerina e estocadas no freezer (-20ºC) no Serviço de Parasitologia, IPEC. 27 Tabela 1: Freqüência (%) dos diagnósticos no grupo controle. Diagnóstico Diferencial N % Esporotricose 158 83,6 Piodermite 14 7,4 Úlcera Vascular 11 5,9 Neoplasia 3 1,6 Dermatofitose 1 0,5 Sífilis 1 0,5 Paracoccidioidomicose 1 0,5 189 100 TOTAL 4.3. Parasitas e antígenos utilizados nos testes Neste estudo foram utilizados antígenos parcialmente solúveis obtidos de formas promastigotas de Leishmania (Viannia) braziliensis (MHOM/BR/75/M2903). Os parasitas foram obtidos de cultura em fase logarítmica de crescimento, a partir de uma curva de crescimento e definiu-se o terceiro dia como o melhor ponto para a obtenção desses parasitas (BarrosoFreitas, 2006). 4.3.1. Cultura axênica de L. (V.) braziliensis Inicialmente, realizou-se um repique da cultura de manutenção (meio bifásico-NNN+Schneider) para 50 mL do meio líquido utilizado para o 28 crescimento parasitário. Após três dias, a cultura foi quantificada em câmara de Neubauer empregando-se o Azul de Trypan (0,2% em salina tamponada com fosfatos - PBS). Um novo repique foi realizado com um inóculo inicial de 1x106 células/mL para garrafas de cultura com 250 mL do meio BHI (Brain Heart Infusion - Difco®) suplementado com 10% de soro fetal bovino (SFB), 200 U/mL de penicilina, 200 µg/mL de estreptomicina e 1% de urina humana (Shamsuzzaman et al., 1999). Após três dias de incubação em estufa a 2628ºC, tempo estipulado pela curva de crescimento, os parasitas foram coletados e processados. 4.3.2. Preparação antigênica As culturas foram transferidas para tubos cônicos estéreis de 50 mL e centrifugados a 5500g por 10 minutos a 4ºC (Centrífuga Refrigerada Coulter Allegra 21R - Beckman®). Descartando-se o sobrenadante, o sedimento foi ressuspenso em PBS pH 7,2 e centrifugado novamente a 5500g por 10 minutos a 4ºC. Esse processo foi repetido três vezes. Após a última lavagem, o sedimento foi ressuspenso em tampão de lise contendo inibidores de protease (1mM iodoacetamina, 1mM phenylmethylsulphonyl fluoride e 1mM phenantroline), e submetidos a 30 ciclos de congelamento (gelo seco + etanol) e descongelamento (banho-maria à 60ºC) adicionado de duas horas de ultrasom (50/60 Hz - Transsonic 310 - Elma®) para o rompimento total dos parasitas. A seguir, o material foi novamente centrifugado, agora a 10000g por 5 minutos a 4°C e o sobrenadante coletado para a dosagem do teor protéico 29 pelo método de Folin-Lowry (Lowry et al., 1951). O antígeno foi separado em alíquotas e conservado a -20°C até o momento do uso. 4.4. Protocolo técnico do ensaio imunoenzimático Utilizou-se a metodologia descrita por Voller et al.(1976), descrita a seguir. Placas de poliestireno de 96 poços (nº 436110 para fluorógeno e nº 439454 para cromógeno - Nunc Maxisorp®) foram sensibilizadas com 100 µL do antígeno total parcialmente solúvel de Leishmania (V.) braziliensis na concentração de 5 µg/mL diluído em tampão carbonato-bicarbonato pH 9,6 e posteriormente incubadas overnight (18 horas) a 4ºC. Após quatro lavagens com PBS pH 7,2 com 0,05% de Tween 20 (PBS-T), em lavadora automática (Tecan - Columbus Washer®), foi adicionado em cada poço 100 µL das amostras de soro diluídas a 1:40 em PBS-T com 1% de leite desnatado (Molico®; PBS-TL), incubando-se por 45 minutos a 37ºC em câmara úmida. Seguindo-se mais quatro novas lavagens, foram adicionados 100 µL de antiIgG cadeia γ-específica conjugada à peroxidase (HRP) (A3187 - Sigma®), nas diluições de 1:4000 para OPD e 1:12000 para TMB, ou à fosfatase alcalina (AP) (A3150 - Sigma®) na diluição de 1:150000 para MUP, diluídos em PBSTL. Após 45 minutos de incubação a 37ºC em câmara úmida e quatro novas lavagens, foram adicionados 100 µL da solução reveladora. • OPD: 10 mg de OPD (P6912 - Sigma®), 10 µL de peróxido de hidrogênio (H2O2) em 25 mL de tampão citrato-fosfato pH 5,0; • TMB: Solução pronta para o uso (T0440 - Sigma®); 30 • MUP: 0,1mM de MUP (M6491 - Molecular Probes®) em tampão dietanolamina pH 9,8. As placas foram incubadas por 15 minutos (OPD) e 30 minutos (TMB e MUP) na ausência de luz, interrompendo-se a reação por adição a cada poço de 50 µL de 1N H2SO4 (OPD e TMB) e 100 µL 3N NaOH (MUP). A densidade óptica e a fluorescência (Relative Fluorescence Units - RFU) dos poços foram determinadas em leitor de placas (Tecan Genius®). Na leitura das placas com os cromógenos OPD e TMB utilizaram-se os filtros com comprimento de onda de 492 nm e 450 nm, respectivamente; e para o fluorógeno MUP os filtros de emissão de 465 nm e excitação de 360 nm. 4.5. Confiabilidade e Mascaramento Para avaliar a confiabilidade dos testes, foram realizadas duas aferições de cada amostra pelo mesmo técnico em dois momentos distintos para cada sistema revelador. Os testes foram realizados com mascaramento das amostras, isto é, sem que o avaliador soubesse o grupo ao qual pertencia a amostra, se caso ou controle a fim de minimizar viés. 4.6. Análise Estatística A sensibilidade, especificidade, valores preditivos positivo, negativo e as razões de verossimilhança foram calculados utilizando o Statistical Package for the Social Science (SPSS) versão 11.0, com respectivos intervalos de confiança de 95%. A confiabilidade do ensaio imunoenzimático foi analisada pelo coeficiente de correlação intraclasse com intervalo de confiança de 95%. 31 Foram estabelecidos cut-offs para cada tipo de ensaio imunoenzimático segundo o sistema revelador utilizado. Os resultados foram expressos em DO e RFU e tratados como variáveis contínuas mediante a curva ROC. O desempenho dos diferentes testes foi comparado através de suas curvas ROC (AUC), utilizando-se o software MedCalc 8.2. Os valores das áreas sob a curva foram comparados pelo teste Anova. 4.7. Aspectos Éticos A rotina clínica de atendimento dos pacientes, incluindo a obtenção de espécimes clínicos para os estudos e a realização de teste de Montenegro, foi previamente submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa do IPEC, constituindo o projeto: “Estudo para a sistematização do atendimento de pacientes com Leishmaniose Tegumentar Americana no Centro de Referência em LTAInstituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas - FIOCRUZ”, aprovado no CEP/IPEC sob o número 0016.0.009-02. Os pacientes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido (Anexo 2) para a realização da rotina clínica e/ou entrada no Programa de Leishmanioses do IPEC. Este estudo não acarretou em modificações na rotina de atendimento ambulatorial de pacientes e um termo de compromisso (Anexo 3) para manter o anonimato dos sujeitos da pesquisa foi assinado pelos responsáveis do projeto e aprovado no CEP/IPEC sob o número 0015.0.009.000-06 (Anexo 4). 32 5. RESULTADOS 5.1. Diluições dos conjugados anti-IgG Para a titulação do conjugado foram utilizadas quatro amostras de soro positivas de pacientes confirmados parasitologicamente para leishmaniose como controles positivos (CP) e quatro amostras de soro negativas de indivíduos saudáveis como controles negativos (CN). A concentração ótima para o conjugado anti-IgG HRP foi encontrada a partir da sua diluição em 1:2000, 1:4000 e 1:8000 para o cromógeno OPD (Figura 4) e em 1:6000, 1:12000 e 1:18000 para o TMB (Figura 5). Para o fluorógeno MUP, diluiu-se o conjugado anti-IgG AP nas concentrações 1:50000, 1:100000, 1:150000 e 1:200000 (Figura 6). Para a definição dessas concentrações, considerou-se a diluição com a maior razão entre a média dos controles positivos e a média dos controles negativos. As diluições escolhidas foram 1:4000, 1:12000 e 1:150000 para OPD, TMB e MUP, respectivamente. A tabela 2 mostra as razões para cada diluição e cada sistema revelador na qual derivaram a escolha das diluições do conjugado. 33 Figura 4: Diluições do conjugado anti-IgG HRP para o cromógeno OPD. 2,200 2,000 1,800 1,600 1,400 DO 1,200 1,000 0,800 0,600 0,400 0,200 0,000 1:2000 1:4000 1:8000 Diluições do conjugado BL CN1 CN2 CN3 CN4 CP1 CP2 CP3 CP4 BL: Blank; CN: Controle Negativo; CP: Controle Positivo; DO: Densidade Óptica Figura 5: Diluições do conjugado anti-IgG HRP para o cromógeno TMB. 1,600 1,400 1,200 1,000 DO 0,800 0,600 0,400 0,200 0,000 1:6000 1:12000 1:18000 Diluições do conjugado BL CN1 CN2 CN3 CN4 CP1 CP2 CP3 CP4 BL: Blank; CN: Controle Negativo; CP: Controle Positivo; DO: Densidade Óptica 34 Figura 6: Diluições do conjugado anti-IgG AP para o fluorógeno MUP. 50000 45000 40000 35000 RFU 30000 25000 20000 15000 10000 5000 0 1:50000 1:100000 1:150000 1:200000 Diluições dos conjugados BL CN1 CN2 CN3 CN4 CP1 CP2 CP3 CP4 BL: Blank; CN: Controle Negativo; CP: Controle Positivo; RFU: Unidade Relativa de Fluorescência Tabela 2: Razões entre as médias dos controles positivos (CP) e as médias dos controles negativos (CN) para cada diluição do conjugado e sistema revelador. Revelador Diluições 1:2000 1:4000 1:8000 Média CP 1,511 1,129 0,582 Média CN 0,374 0,156 0,139 Razão 4,0 7,2 4,2 TMB 1:6000 1:12000 1:18000 1,286 1,230 0,706 0,252 0,142 0,092 5,1 8,7 7,7 MUP 1:50000 1:100000 1:150000 1:200000 39605 37338 34443 14730 12106 8523 5556 2796 3,3 4,4 6,2 5,3 OPD 35 5.2. Ensaios Imunoenzimáticos Com as concentrações ótimas definidas, foram realizadas duas aferições de cada grupo (casos e controles) para cada sistema revelador. 5.2.1. Definição dos pontos de cortes (cut-off) Os pontos de corte (cut-off) dos imunoensaios foram definidos através da curva ROC. A leitura de densidade óptica (DO) considerada como cut-off para o OPD foi 0,203 e 0,239 para o TMB, e a unidade relativa de fluorescência (RFU) para o MUP foi 11103. As figuras 7,8 e 9 representam a distribuição dos resultados, em DO ou RFU, de cada grupo no ensaio imunoenzimático para cada revelador (OPD, TMB E MUP, respectivamente), tendo como cut-off os valores acima. Figura 7: Distribuição das Densidades Ópticas no ELISA com o cromógeno OPD nos dois grupos - LTA (N= 189) e controle (N= 189). OPD 1,800 1,600 1,400 1,200 1,000 0,800 0,600 0,400 0,200 0,203 0,000 LTA Controles 36 Figura 8: Distribuição das Densidades Ópticas no ELISA com o cromógeno TMB nos dois grupos - LTA (N= 189) e controle (N= 189). TMB 1,500 1,350 1,200 1,050 0,900 0,750 0,600 0,450 0,300 0,239 0,150 0,000 LTA Controles Figura 9: Distribuição das Unidades Relativas de Fluorescência nos ensaios imunoenzimáticos com o fluorógeno MUP nos dois grupos LTA (N= 189) e controle (N= 189). MUP 45000 40000 35000 30000 25000 20000 15000 11103 10000 5000 0 LTA Controles 37 Os resultados nos imunoensaios das amostras de cada grupo (189 pacientes de LTA e 189 pacientes com outras doenças cutâneas) com os três reveladores estão descritos na tabela 3. Não foram observadas diferenças com significância estatística entre as médias das leituras obtidas para os pacientes de leishmaniose cutânea, leishmaniose cutâneo-mucosa e leishmaniose mucosa para os reveladores OPD (0,874; 0,940; 0,967) p= 0,505, TMB (0,820; 0,831; 0,884) p= 0,179 e MUP (25973; 28798; 29489) p= 0,180, respectivamente. As amostras (N=5) com resultados falso-negativos foram as mesmas em todos os sistemas reveladores. Tabela 3: Resultados - N (%) - positivos e negativos do imunoensaio para os diferentes grupos segundo os três reveladores. Teste OPD LTA (%) Controles (%) Positivo 184 (97,4) Negativo Total TMB MUP LTA (%) Controles (%) LTA (%) Controles (%) 12 (6,4) 184 (97,4) 6 (3,2) 184 (97,4) 8 (4,2) 5 (2,6) 177 (93,6) 5 (2,6) 183 (96,8) 5 (2,6) 181 (95,8) 189 (100) 189 (100) 189 (100) 189 (100) 189 (100) 189 (100) 5.2.2. Acurácia dos testes Os parâmetros de acurácia indicaram sensibilidade de 97,4% para os três reveladores e especificidade de 93,7%, 97,4% e 95,8% para OPD, TMB e MUP, respectivamente (Tabela 4). A utilização do TMB revelou uma especificidade ligeiramente maior que o OPD (p= 0,082) e MUP (p= 0,397), 38 com valor preditivo positivo e negativo de 97,4%. A razão de verossimilhança para o teste negativo foi idêntica nos três sistemas e no TMB, a razão de verossimilhança para o teste positivo foi 36,8, ou seja, há uma chance 36,8 vezes maior de se encontrar um resultado positivo no teste em pacientes com a doença quando comparado com pacientes sem a doença. Tabela 4: Valores de sensibilidade, especificidade, VPP, VPN, RV+ e RVcom seus respectivos IC de 95% para cada revelador. Revelador Sensibilidade (%) (IC 95%) Especificidade (%) (IC 95%) VPP (%) (IC 95%) VPN (%) (IC 95%) RV + OPD 97,4 (93,9; 99,1) 93,7 (89,2; 96,7) 93,9 (89,3; 96,9) 97,3 (93,4;98,9) 15,3 0,03 TMB 97,4 (93,9; 99,1) 97,4 (93,9; 99,1) 97,4 (92,9; 98,7) 97,4 (93,6;99,0) 36,8 0,03 MUP 97,4 (93,9; 99,1) 95,8 (91,8; 98,1) 95,8 (91,7;98,0) 97,3 (93,5;99,0) 23,0 0,03 VPP: valor preditivo positivo; VPN: valor preditivo negativo; RV+: razão de verossimilhança positiva; RV-: razão de verossimilhança negativa e IC: Intervalo de Confiança 5.2.3. Comparação do desempenho dos três reveladores utilizando a curva ROC A área sob a curva (IC 95%) para o OPD e TMB foi idêntica 0,984 (0,966; 0,994 e 0,965; 0,994, respectivamente) e para o MUP foi 0,986 (0,968; 0,995), essa pequena diferença não atingiu significância estatística (Tabela 5). 39 RV - A observação da figura 10 mostra que as AUC se sobrepõem independente do tipo de revelador utilizado. Tabela 5: Comparação das áreas sob a curva (AUC) do ensaio enzimático com os diferentes reveladores Diferença entre AUC Erro padrão p valor 0,006 IC 95% da diferença -0,012 a 0,013 OPD e TMB 0,000 OPD e MUP 0,002 0,007 -0,012 a 0,015 0,797 TMB e MUP 0,002 0,006 -0,009 a 0,013 0,722 0,976 Figura 10: Áreas sob a curva ROC dos três sistemas reveladores 1,0 Sensibilidade ,8 Legenda Linha de referência ,5 MUP ,3 TMB 0,0 0,0 OPD ,3 ,5 ,8 1,0 1 - Especificidade 40 5.3. Confiabilidade dos ensaios imunoenzimáticos Para a avaliação da confiabilidade foram realizados estudos de repetibilidade, isto é, um mesmo avaliador realizou o teste para cada amostra em dois momentos distintos e o resultado foi analisado pelo coeficiente de correlação intraclasse (ICC). O valor do ICC para o OPD foi 0,993 (0,991; 0,994), 0,996 (0,995; 0,996) para o TMB e 0,994 (0,992; 0,995) para o MUP, com seus respectivos IC de 95%. A confiabilidade foi considerada excelente para os três sistemas reveladores. 41 6. DISCUSSÃO O problema do diagnóstico acurado em LTA continua relevante e atual tendo em vista que nos últimos 20 anos, a incidência de LTA vem aumentando consideravelmente, com uma média anual de 32 mil novos casos, tornando-se cada vez mais um grave problema de saúde pública (Ministério da Saúde, 2006). Em nosso estudo asseguramos o padrão de referência para os casos selecionados através do sugerido na literatura, isto é, a identificação de amastigotas em amostras teciduais ou esfregaços, e a cultura in vitro de parasitas presentes em biópsias (Melo, 1981; Gontijo & Melo, 2004). Por se tratar de um estudo diagnóstico do tipo caso-controle e com vistas a maximizar a representatividade interna da amostra, assegurou-se que os controles fossem provenientes do mesmo ambulatório em que os casos foram captados, e que por isso compartilharam a suspeita clínica inicial de LTA. Outros aspectos de robustez do delineamento deste estudo foram a randomização dos controles e o mascaramento na realização dos testes (Bossuyt et al., 2003). Como tem ocorrido em outros trabalhos do grupo do IPEC, a esporotricose foi o diagnóstico diferencial mais freqüente (Barroso-Freitas, 2006) tendo em vista a ocorrência de surto no Rio de Janeiro (Barros et al., 2001; Barros et al., 2004). Fato que contribui para a generabilidade externa deste estudo, talvez para clientela do Estado do Rio de Janeiro. Como preconizado em estudos diagnósticos avaliamos a confiabilidade das técnicas realizadas. Comparando-se com um estudo para o diagnóstico da 42 LTA, nossos índices de confiabilidade (ICC: OPD - 0,993; TMB - 0,996; MUP 0,994) foram excelentes, em consonância com o encontrado por BarrosoFreitas (2006) no teste ELISA com o antígeno de L. braziliensis (ICC 0,940). Não houve a possibilidade de pesquisar reprodutibilidade, ou seja, a análise destas mesmas amostras em outro laboratório. As técnicas imunoenzimáticas vêm sendo utilizadas em inúmeras doenças, inclusive em inquéritos soro-epidemiológicos, devido a sua facilidade e rapidez na execução, automatização, boa acurácia e baixo custo (ParanhosSilva et al., 1996; Braga et al., 1998). Este estudo se insere no âmbito da utilização destes imunoensaios no diagnóstico das leishmanioses e especificamente no que tange aos aperfeiçoamentos quanto à busca de uma preparação antigênica ideal para a pesquisa de anticorpos anti-Leishmania, dos limiares de positividade das amostras (cut-off), das melhores diluições dos conjugados enzimáticos e dos reveladores a serem utilizados (Barral-Netto et al., 1986). Possivelmente devido à opção por utilizar o antígeno de Leishmania (Viannia) braziliensis nos imunoensaios, a qual é a espécie predominante no Rio de Janeiro, obtivemos ótimos parâmetros de acurácia, independente do revelador utilizado. Este resultado confirma estudos anteriores que também demonstraram o aumento da acurácia dos testes pela utilização de antígenos homólogos em detrimento dos heterólogos (Mosleh et al., 1995; Nascimento et al., 2003; Saha et al., 2005; Barroso-Freitas, 2006). Embora seja um item imprescindível para a execução de um ensaio imunoenzimático e existam inúmeros tipos de reveladores disponíveis no 43 mercado, são raros os estudos que elegem o revelador como objeto de avaliação (Shekarchi et al., 1985; Crowther et al., 1990; Roberts et al., 1991), e não encontramos em nossa revisão de literatura estudos com este delineamento para a pesquisa de anticorpos específicos anti-Leishmania no diagnóstico da LTA. Também a definição da diluição ótima dos anticorpos anti-IgG cadeia γespecífica, conjugados à peroxidase e à fosfatase alcalina que permitiria melhor distinguir indivíduos não infectados de pacientes com LTA, é de difícil comparação porque em estudos publicados estas decisões não têm os métodos descritos, sendo um item rotineiro mencionado na metodologia do teste. No estado da arte, há consenso que a determinação de diluições deva ser determinada nas condições de cada laboratório e a cada mudança de lote, uma vez que inúmeras variáveis influenciam o desempenho. Apesar de alguns dados na literatura apontarem o aumento da sensibilidade através do uso de fluorógenos (Shalev et al., 1980; Avrameas, 1992), essa afirmativa não foi observada em nossos resultados. A sensibilidade encontrada (97,4%) em nosso estudo foi idêntica nos três sistemas reveladores, resultado congruente com o de Crowther et al. (1990) que utilizando os mesmos reveladores na detecção do vírus da febre aftosa também encontraram sensibilidades similares entre o fluorógeno e o cromógeno. E com o de Shekarchi et al. (1985), quando comparou o cromógenos pNPP e o fluorógeno MUP para a detecção de anticorpos contra o vírus da rubéola e antígenos do vírus herpes simplex. 44 Por outro lado, Roberts et al. (1991) detectaram melhor desempenho com fluorógenos, utilizando os cromógenos TMB, ABTS (2,2’ - azino-bis - 3 etilbenzotiazolina - 6 - ácido sulfônico), PMP (monofosfato de fenolftaleína) e pNPP (p-nitrofenil fosfato), e os fluorógenos HPPA (3 - p - hidroxifenil ácido propiônico) e MUP na detecção de anticorpos anti-HIV. A sensibilidade obtida pelo fluorógeno HPPA foi ligeiramente superior (limite de detecção 1,7 vezes maior) ao TMB e MUP, e estes últimos foram equivalentes. O cromógeno ABTS que segundo Bos et al. (1981) possui performance semelhante ao OPD, obteve um desempenho inferior ao TMB. Shekarchi et al. (1985) concluíram pela utilização de um revelador fluorogênico para a detecção de anticorpos contra o vírus da rubéola e de antígenos do vírus herpes simplex com base em outros parâmetros uma vez que a acurácia foi semelhante. Foi menor o tempo de incubação necessário para a revelação do MUP em ambos os vírus, e mais baixa a concentração de antígeno usado na detecção dos anticorpos anti-rubéola. Não detectamos diferenças relevantes no tempos de incubação nem na concentração de antígeno Leishmania (V.) braziliensis que foi de 5 µg/mL em todos os sistemas testados. Entretanto, uma desvantagem no ensaio imunoenzimático revelado com o fluorógeno MUP reside no rápido decréscimo na emissão do sinal de fluorescência, exigindo que a leitura seja realizada imediatamente para não prejudicar o resultado, e no fato do equipamento apropriado para a medição da intensidade da fluorescência ter um custo bastante elevado, reafirmando o benefício do uso dos cromógenos (Crowther et al., 1990; Gee et al., 1999). 45 É interessante ressaltar que obtivemos uma pequena diferença nas especificidades para os três reveladores sem significância estatística, sendo a mais elevada para o TMB. No entanto, uma limitação no que diz respeito ao desenho de estudo se refere ao fato do cálculo do tamanho amostral ter sido realizado estimando diferenças percentuais nos parâmetros de acurácia da ordem de 5%, que foi uma estimativa maior do que as diferenças encontradas. Do ponto de vista clínico-laboratorial uma diferença de desempenho desta magnitude (5%) ou maior apontaria para não similaridade. Uma vez que as acurácias dos reveladores têm sido indistinguíveis, outros parâmetros estão sendo considerados para a escolha do sistema revelador adequado. Assim, alguns autores propõem a utilização do TMB por ser altamente estável e não mutagênico e/ou carcinogênico (Bos et al., 1981), possuir baixo custo em relação aos fluorógenos, fácil manipulação (Blais et al., 2004), disponibilidade comercial sob a forma de kits (Frey et al., 2000; Blais et al., 2004), além de ser mais sensível que o OPD cujas propriedades mutagênicas foram demonstradas no teste de Ames (que detecta a citotoxicidade e mutagenicidade causadas por compostos químicos) (Voogd et al., 1980; Porstmann & Kiessig, 1992). Considerando os argumentos acima e a acurácia similar dos três reveladores pretendemos substituir o OPD pelo TMB na rotina do laboratório. 46 7. CONCLUSÃO 1 - Os três reveladores (OPD, TMB e MUP) nos ensaios imunoenzimáticos revelaram índices de sensibilidade idênticos (97,4%) e especificidade semelhantes (OPD - 93,7%; TMB - 97,4%; MUP - 95,8%), sem diferença estatística significante na detecção de anticorpos IgG para o diagnóstico da LTA. 2 - O desempenho dos sistemas reveladores, comparados através da curva ROC, mostrou uma pequena diferença entre eles, porém sem significância estatística. 3 - A confiabilidade foi excelente nos três sistemas reveladores. 4 - A utilização do revelador TMB como escolha para sua implementação no ensaio imunoenzimático para o diagnóstico da LTA no Serviço de Parasitologia deve-se ao fato de ser estável, não mutagênico ou carcinogênico e de fácil manipulação. 47 8. REFERÊNCIAS Allain, D. S. and Kagan, I. G. 1975. A direct agglutination test for leishmaniasis. Am J Trop Med Hyg, 24 (2): 232-6. Almeida Filho, N. and Rouquaryol, M. Z. 2002. Introdução à Epidemiologia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Medsi. 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ANEXOS Anexo 1 - Protocolo de Atendimento Clínico do Projeto “Estudo para a sistematização do atendimento de pacientes com Leishmaniose Tegumentar Americana no Centro de Referência em LTA - Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas - Fiocruz”, CEP/IPEC nº 0016.0.009-02. Centro de Referência em Leishmaniose Tegumentar Americana Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas – Fiocruz Rotina para o atendimento de pacientes Critério Clínico para encaminhamento de pacientes para o IPEC Paciente proveniente de área endêmica ou suspeita; apresentando lesão cutânea ulcerosa ou tuberosa, única ou múltipla, com evolução superior a 30 dias; com ou sem adenopatia associada e reação de Montenegro positiva (superior a 5 mm de enduração). Outros pacientes provenientes de área endêmica, porém, de difícil diagnóstico: apresentando lesões sugestivas e reação de Montenegro negativa; adenomegalia localizada sem lesão cutânea; má resposta ou recidiva após um primeiro tratamento para LTA. Rotina para Diagnóstico Clínico-Laboratorial (pré-tratamento) Avaliação clínica e dermatológica: Exame clínico geral e exame dermatológico com descrição e documentação fotográfica ou filmagem das lesões. Avaliação otorrinolaringológica: Realizada com fibra ótica, para descrição e documentação fotográfica ou filmagem das lesões. Sangue: Resposta linfoproliferativa a antígenos de Leishmania e S. schenckii "in vitro" Reação em cadeia da polimerase (PCR) para Leishmania Sorologias para LTA, VDRL, paracoccidioidomicose, histoplasmose, esporotricose Eletroforese de hemoglobina (úlceras de perna) Hemograma Bioquímica: glicose, uréia, creatinina, TGO, TGP, fosfatase alcalina, gama GT, amilase, lipase Coagulograma (pacientes com indicação de biópsia mucosa) 60 Eletrocardiograma (ECG) Reações intradérmicas: PPD, esporotriquina e Montenegro (nos casos negativos inicialmente) Utiliza-se a leishmanina produzida por Biomanguinhos – Fiocruz, contendo 40 µg de nitrogênio protéico por mililitro e fenol 0,4% como conservante. Após assepsia local com álcool 70o, injeta-se 0,1 mL de antígeno por via intradérmica na face anterior do antebraço. O grau de resposta cutânea é medido 48 horas após a injeção. A enduração é marcada com caneta esferográfica, medida em milímetros, decalcada em papel umedecido e arquivada no prontuário do paciente. Uma enduração de 5 mm ou mais em seu maior diâmetro é considerada positiva. Aspirado do bordo da lesão cutânea e / ou de gânglio periférico: Direto no tubo a vácuo (cultura para Leishmania) Após injeção de 0,1 mL de salina estéril (com antibiótico) 0,9% no tubo à vácuo (cultura para Leishmania) Biópsia cutânea e/ou mucosa e / ou de gânglio periférico: Formol (histopatologia e imunohistoquímica) Solução salina estéril (cultura para fungos e micobactéria) Solução salina estéril com antibiótico (cultura para Leishmania) Imprint em lâmina de vidro Congelação a –70 oC (imunopatologia e reação em cadeia da polimerase PCR) Radiografia do tórax e dos seios da face: direcionados pela história e/ou exame clínico (rotina apenas nos casos mucosos) Outros exames: direcionados pela história e/ou exame clínico Tratamento Padrão Medidas Gerais: Tratamentos para outras doenças concomitantes como hipertensão arterial, diabetes etc. deverão, preferencialmente, ser iniciados antes ou durante a investigação diagnóstica, a fim de se iniciar o tratamento específico com o paciente o mais compensado possível. A infecção secundária deverá ser tratada com cuidados locais (água, sabão de coco e anti-sépticos) e, se necessário, antibióticos orais, pelo menos, na semana que anteceder à biópsia de pele, a fim de diminuir a contaminação bacteriana das culturas para Leishmania. No caso da presença de crostas e obstrução nasal, as cavidades nasais deverão ser instiladas com solução fisiológica de cloreto de sódio 0,9% por várias vezes ao dia durante todo o período do acompanhamento, a fim de possibilitar uma boa visualização das mucosas das cavidades nasais, assim como o alívio sintomático do paciente. 61 Nos casos de lesões abaixo dos joelhos, o repouso com os membros inferiores elevados durante o maior tempo possível, é um excelente método terapêutico auxiliar. Medidas específicas: Em princípio, todos os pacientes deverão ser tratados, ambulatorialmente, com antimoniato de N-metil-glucamina (Glucantime®) na dosagem de 5 mg A administração EV, quando indicada para diminuir o Sb5+/kg/dia1 IM. desconforto local, deverá ser realizada, de preferência, em ambiente hospitalar. Pacientes idosos ou apresentando outras complicações clínicas, poderão ser tratados em regime de internação ou de hospital-dia. O antimoniato de N-metil-glucamina (antimoniato de meglumina) é apresentado em ampolas de 5 mL contendo 1,5g de N-metil-glucamina, equivalente a 405 mg de Sb5+. Portanto, 5 mL correspondem a 405 mg de Sb5+ e cada mL a 81 mg de Sb5+. Os pacientes com a forma cutânea serão tratados inicialmente durante 30 dias. Caso seja indicado, o tratamento poderá ser prorrogado, na mesma dosagem, por mais 10 a 30 dias consecutivos (ver acompanhamento clínico). Os pacientes com a forma mucosa serão tratados por um mínimo de 30 dias, porém o tratamento será continuado, preferencialmente sem interrupção, até a epitelização e/ou desinfiltração das mucosas. Pacientes com lesões na laringe ou com extensas lesões nas vias aéreas e digestivas superiores deverão ser internados a fim de prevenir a instalação de um quadro de insuficiência respiratória por edema local, mais provável de ocorrer nas primeiras 72 horas após início do tratamento. A profilaxia com corticosteróides deverá ser iniciada antes da primeira dose do tratamento específico. Utiliza-se hidrocortisona 100 mg EV 6/6h durante um mínimo de 24 horas e descontinuada durante os próximos dois dias, Pacientes que necessitem interromper temporariamente o tratamento por toxicidade, ao recomeçar, deverão dar seqüência ao tratamento a partir da última dose administrada, como se não tivesse havido qualquer interrupção. Os casos de lesões recidivantes e as possíveis evoluções para forma mucosa (ver acompanhamento clínico), deverão ser retratadas, inicialmente, com a mesma dosagem e pelo mesmo período que os pacientes virgens de tratamento, porém se possível, em regime de internação ou hospital-dia. Em caso de insucesso no segundo tratamento, avaliar a possibilidade de utilização da dose de 10-20 mg Sb5+/kg/dia1 ou de outra droga como a anfotericina B ou a pentamidina. A anfotericina B deverá ser diluída em solução de glicose 5% a uma concentração de 0,1 mg/mL (não utilizar soluções contendo eletrólitos). A administração deve ser diária ou em dias alternados, por um período de 1 a 4 horas de infusão endovenosa. A dose inicial é de 0,3-0,5 mg/Kg/dia aumentando-se progressivamente até 1 mg/Kg/dia, até alcançar a dose 1 Exemplo de cálculo de dose para um paciente de 60 kg: 5 mg Sb5+/kg/dia = 300 mg Sb5+/dia = 3,7 mL/dia, arredondando, = 3,5 mL/dia EV ou IM. 20 mg Sb5+/kg/dia = 1200 mg Sb5+/dia = 14,8 mL/dia, arredondando, = 15 mL/dia EV ou IM. 62 máxima diária de 50 mg. As doses totais recomendadas são de 1 a 1,5g para LC e, de 2,5 a 3g para LM. A Pentamidina pode ser encontrada sob a formulação de mesilato e de isotionato, em frascos/ampolas contendo 300 mg. A formulação de isotionato costuma ser melhor tolerado. A droga deve ser administrada após a alimentação devido a sua ação hipoglicemiante. A dose habitual é de 2-4 mg/Kg, IM, em dias alternados durante 5 a 25 semanas, ou por período mais prolongado se necessário. O Ministério da Saúde recomenda que a dose total não ultrapasse 2g e alguns autores têm utilizado esquemas curtos com sucesso. Pacientes com uma ou duas lesões cutâneas, que por qualquer motivo apresentem impossibilidade de receber medicação parenteral regular ou que apresentem sinais de toxicidade importante à medicação sistêmica, poderão ser submetidos a tratamento intralesional com N-metil-glucamina. Rotina de Acompanhamento Exames laboratoriais para monitorização da toxicidade: Hemograma, glicose, uréia, creatinina, TGO, TGP, fosfatase alcalina, gama GT, amilase, lipase e ECG deverão ser realizados durante o tratamento a cada 7, 10 ou 15 dias; imediatamente após o tratamento; e depois, apenas os exames alterados, até a sua normalização. Em casos de alterações persistentes ou rapidamente progressivas, recomenda-se a suspensão temporária do tratamento até a normalização dos exames. Para Anfotericina B acrescentar dosagens de Na e K e utilizar intervalos de uma semana ou menos. Ao utilizar-se a Pentamidina, a glicemia deve ser acompanhada mensalmente durante 6 meses sempre que a dose total ultrapassar 1g. Sorologias para LTA: Deverão ser realizadas em todas as consultas de retorno.Quando as consultas forem realizadas em outros locais, o sangue deverá ser centrifugado e o soro poderá ser transportado imediatamente em isopor com gelo ou estocado congelado (preferencialmente a –20oC) e posteriormente transportado em isopor com gelo para o laboratório. Sorologia anti-HIV: Deverá ser solicitada nos casos de evolução aberrante (lesões fora do padrão clínico usual, apresentando exuberância parasitária, teste de Montenegro não reator etc.) e má resposta terapêutica. Acompanhamento clínico Casos cutâneos Avaliação clínica e dermatológica: Devem ser repetidas a cada 15, 10 ou 7 dias durante o tratamento, de acordo com as condições clínicas do paciente, e no 30o dia. 63 Ao término do tratamento espera-se que as lesões estejam com pouquíssima infiltração (não endurecidas à palpação) e epitelizadas (recoberta por uma "pele fina"), embora mantenham algum eritema (cicatriz rósea). Nos casos em que não ocorra epitelização das lesões (geralmente úlceras localizadas abaixo dos joelhos), manter sem tratamento (apenas cuidados locais) e reavaliar quinzenalmente. Caso não ocorra uma tendência progressiva para a epitelização, reavaliar o diagnóstico (principalmente nos casos sem comprovação parasitológica) e/ou a necessidade de repetir o tratamento. A partir da constatação da epitelização das lesões, os pacientes deverão ser reavaliados após 1, 3, 6, 12 meses e então anualmente, pelo mínimo de 5 anos. Ao longo do primeiros 6-12 meses deve-se observar a progressiva regressão do eritema e da infiltração da cicatriz, geralmente acompanhada de atrofia da epiderme e áreas de hiper e de hipopigmentação. Avaliação otorrinolaringológica Nos pacientes sem lesão mucosa anterior ao tratamento, devem ser realizadas, no mínimo, com 6 e 12 meses e então anualmente, por um mínimo de 5 anos, para constatar que não houve desenvolvimento de lesões mucosas. Casos mucosos Avaliação clínica: Devem ser repetidas a cada 15, 10 ou 7 dias durante o tratamento, de acordo com as condições clínicas do paciente, e no 30o dia. Caso haja indicação de prorrogação do tratamento as reavaliações devem seguir com a periodicidade necessária. Avaliação otorrinolaringológica: Após o 30o dia de tratamento deverão ser a cada 15, 10 ou 7 dias de prorrogação do tratamento, de acordo com as condições clínicas do paciente. A partir da constatação da epitelização das lesões, os pacientes deverão ser reavaliados após 1, 3, 6, 12 meses e então anualmente, por um mínimo de 5 anos, para constatar a manutenção da cicatrização das lesões. Recidivas de lesões e/ou evolução de um caso de forma cutânea para a forma mucosa Pacientes com lesões recidivantes, deverão reiniciar a investigação diagnóstica (principalmente aqueles sem comprovação parasitológica) e/ou repetir o tratamento, de preferência em regime de internação ou hospital-dia. Pacientes que evoluírem da forma cutânea para a forma mucosa, necessariamente deverão seguir a rotina de investigação inicial para pacientes mucosos. Em ambos os casos, atentar para a possibilidade para a co-infecção pelo HIV ou outras doenças associadas de natureza infecciosa ou degenerativa. 64 Calendário para pacientes tratados em outras unidades de saúde Pacientes de Forma Cutânea MOMENTO FREQÜÊNCIA Confirmação do diagnóstico: LOCAL IPEC Durante o tratamento: A cada 15, 10 ou 7 dias o Imediatamente após o Unidade de origem No 30 dia Unidade de origem Caso persista lesão não Quinzenalmente até a constatação da Unidade de origem epitelizada: epitelização (dentro de mais 2 meses) tratamento: Caso persista a lesão aberta ou caso IPEC ocorra piora nesse período Primeiro ano após o tratamento: Anos subseqüentes: 2 e 4 meses Unidade de origem 1, 6 e 12 meses IPEC Anualmente durante no mínimo 5 anos IPEC Pacientes de Forma Mucosa FREQÜÊNCIA MOMENTO Confirmação do diagnóstico: LOCAL IPEC Durante o tratamento: A cada 15, 10 ou 7 dias Unidade de origem Imediatamente após o No 30o dia IPEC Caso necessite prorrogar o A cada 7 ou 10 dias para Unidade de origem tratamento: acompanhamento clínico geral tratamento: A cada 10 ou 15 dias até a IPEC constatação da cura clínica Primeiro ano após o tratamento: 1, 3, 6 e 12 meses IPEC Anos subseqüentes: Anualmente durante no mínimo 5 anos IPEC 65 Anexo 2 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 1 INSTITUIÇÃO: INSTITUTO DE PESQUISA CLÍNICA EVANDRO CHAGAS FIOCRUZ COORDENADOR DA PESQUISA: ARMANDO DE OLIVEIRA SCHUBACH ENDEREÇO: Av. Brasil 4365-Manguinhos-Rio de Janeiro-RJ-CEP 21045-900 TELEFONES:(0xx21)598-4260/598-4263/598-4266/290-1943/FAX(0xx21)590-9988 NOME DO PROJETO DE PESQUISA: ESTUDO PARA A SISTEMATIZAÇÃO DO ATENDIMENTO DE PACIENTES COM LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA NO CENTRO DE REFERÊNCIA EM LTA - INSTITUTO DE PESQUISA CLÍNICA EVANDRO CHAGAS - FIOCRUZ NOME DO VOLUNTÁRIO: _________________________________________ A leishmaniose tegumentar americana (LTA) é uma doença que atinge seres humanos e animais, incluindo o cão, causada por parasitos chamados leishmanias. A doença é transmitida pelo "mosquito palha", que vive em regiões de mata, plantações de banana, manga etc. localizadas próximas às moradias humanas, onde costuma entrar para se alimentar de sangue de pessoas e animais domésticos. A LTA se apresenta como feridas na pele de difícil cicatrização. Algumas vezes, a LTA pode se tornar mais grave, envolvendo as mucosas de revestimento interno do nariz e da garganta, mesmo vários anos após a cicatrização da ferida na pele. Atualmente, não temos como saber qual paciente adoecerá de novo e qual permanecerá curado definitivamente. Outras doenças como infecções por bactérias, tuberculose, sífilis, esporotricose, outras micoses, tumores e etc. podem se manifestar de forma 1 a 1 via: Prontuário Médico 2a via: Paciente 66 parecida com a leishmaniose e precisam ser diferenciadas para que se possa iniciar o tratamento correto. Entretanto, com os exames existentes atualmente, nem sempre se consegue ter certeza absoluta sobre qual a doença em questão. No momento, várias perguntas precisam ser respondidas como: de que outras maneiras a LTA pode se manifestar? Como se comportam os exames de laboratório antes, durante e após o tratamento? Quais pacientes, mesmo após o tratamento, irão reabrir suas cicatrizes ou irão desenvolver doença dentro do nariz ou na garganta? Que outras doenças parecidas estão sendo confundidas com a LTA e quais exames devem ser utilizados para esclarecimento? Qual o papel dos seres humanos como reservatórios da doença? Quais as melhores formas de tratamento? Que medidas devem ser tomadas para controlar o problema? Pelo presente documento, você está sendo convidado(a) a participar de uma investigação clínica a ser realizada no IPEC-FIOCRUZ, com os seguintes objetivos: Descrever aspectos da LTA: manifestações clínicas e exames de laboratório, tentando estabelecer padrões de apresentação da doença e seu modo de evolução, comparando com outras doenças. Avaliar o uso dos antimoniais e outras drogas utilizadas no tratamento da LTA levando em consideração o tempo de tratamento, toxicidade, facilidade de administração, custo e ausência de envolvimento das mucosas do nariz e da garganta. Isolar, identificar e comparar as leishmanias causadoras da LTA provenientes de diversas localidades. Este documento procura esclarecê-lo sobre o problema de saúde em estudo e sobre a pesquisa que será realizada, prestando informações, detalhando os procedimentos e exames, benefícios, inconvenientes e riscos potenciais. A sua participação neste estudo é voluntária. Você poderá recusar-se a participar de uma ou todas as etapas da pesquisa ou, mesmo, se retirar dela a qualquer momento, sem que este fato lhe venha causar qualquer 67 constrangimento ou penalidade por parte da Instituição. O seu atendimento médico não será prejudicado caso você decida não participar ou caso decida sair do estudo já iniciado. Os seus médicos poderão também interromper a sua participação a qualquer momento, se julgarem conveniente para a sua saúde. A sua participação com relação ao Projeto consiste em autorizar a realização de uma série de exames para o diagnóstico da sua doença, e que parte deste material, assim como os resultados destes exames de rotina, sejam utilizados neste estudo. Também será necessária a sua autorização: 1) para a utilização de documentação fotográfica ou filmagem de suas lesões para estudo 2) para que parte do material coletado periodicamente para a realização de exames para acompanhamento da evolução da sua doença, assim como os resultados destes exames de rotina e do seu tratamento sejam utilizados neste estudo 3) para que parte das amostras coletadas seja estocada a fim de servir para outros estudos que tenham como finalidade a melhor compreensão da doença, o desenvolvimento e avaliação de novos métodos diagnósticos; avaliação da resposta ao tratamento etc., desde que tal estudo seja previamente analisado e autorizado por um Comitê de Ética em Pesquisa. Os exames e procedimentos aplicados lhe serão gratuitos. Você receberá todos os cuidados médicos adequados para a sua doença. Participando deste estudo você terá algumas responsabilidades: seguir rigorosamente as instruções do seu médico; comparecer à unidade de saúde nas datas marcadas; relatar a seu médico todas as reações que você apresentar durante o tratamento, tanto positivas quanto negativas. Caso você necessite de atendimento médico, durante o período em que estiver participando do estudo, procure o Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas - FIOCRUZ, mesmo fora do seu agendamento. Em caso de necessidade ligue para o Dr. Armando de Oliveira Schubach, Dra. Fátima Conceição-Silva ou Dra. Mariza Salgueiro nos telefones acima. Caso você apresente qualquer quadro clínico que necessite de internação, a equipe médica providenciará seu leito no Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas - FIOCRUZ. Seus animais com suspeita de LTA poderão ser 68 atendidos gratuitamente pela médica veterinária Dra. Tânia Maria Pacheco Schubach no Serviço de Zoonoses do IPEC. Sua identidade será mantida como informação confidencial. Os resultados do estudo poderão ser publicados sem revelar a sua identidade e suas imagens poderão ser divulgadas desde que você não possa ser reconhecido. Entretanto, se necessário, os seus registros médicos estarão disponíveis para consulta para a equipe envolvida no estudo, para o Comitê de Ética em Pesquisa, para as Autoridades Sanitárias e para você. Você pode e deve fazer todas as perguntas que julgar necessárias antes de concordar em participar do estudo, assim como a qualquer momento durante o tratamento. O seu médico deverá oferecer todas as informações necessárias relacionadas à sua saúde, aos seus direitos, e a eventuais riscos e benefícios relacionados à sua participação neste estudo. Procedimentos, exames e testes que serão utilizados: Antes do tratamento haverá coleta de informações sobre a doença; exame médico geral e exame da pele com descrição e documentação fotográfica ou filmagem das lesões; exame interno do nariz e da garganta com um aparelho chamado fibra ótica, que permite ver lesões pequenas ou em locais de difícil acesso, para descrição e documentação fotográfica ou filmagem das lesões (se necessário será aplicado "spray" anestésico local). Retirada, com anestesia local, de um pequeno fragmento da lesão de pele, de mucosa ou de "íngua" para realização de exames tanto para diagnóstico (aspecto microscópico do tecido doente e culturas para tentativa de isolamento de possíveis agentes de doença como fungos, bactérias e leishmanias) quanto para pesquisa (identificação de células e outros componentes da resposta inflamatória, assim como novos métodos de identificação dos possíveis agentes da doença). Outros materiais também poderão ser coletados na tentativa de isolamento do agente causador da doença: aspiração com seringa e agulha do bordo da lesão e de secreções em lesões de pele fechadas. Outros exames também serão realizados para diagnosticar outras doenças possíveis de serem confundidas com a LTA, para classificar a gravidade da 69 doença e avaliar os efeitos dos medicamentos a serem utilizados durante o seu tratamento: um a quatro testes cutâneos (injeção da décima parte de um mililitro de um reativo para determinada doença na pele da região anterior do antebraço, a qual deverá ser revista entre 2 a 3 dias após a injeção); exames de sangue (quantidade equivalente a aproximadamente três colheres de sopa), exame de saliva (coletada com um tipo de cotonete), radiografia dos pulmões e da face (se necessário complementada por tomografia computadorizada); e eletrocardiograma. O tratamento da LTA em pacientes humanos costuma ser com o medicamento glucantime por via intramuscular (IM), intravenosa (IV) uma injeção ao dia, geralmente, durante um período de 30 dias contínuos ou com intervalos de descanso. Excepcionalmente, para idosos, pacientes com doenças graves ou que não tolerem o tratamento normal, poderá ser utilizada a via intralesional (IL). O tempo do tratamento poderá ser diminuído ou aumentado conforme a necessidade. Outras opções de tratamento são a anfotericina B (IV) e a pentamidina (IM), ambas injetáveis e necessitando medidas de acompanhamento parecidas com as do glucantime. Após o início do tratamento, você deverá comparecer a aproximadamente três consultas dentro de 10, 20 e 30 dias. Caso as lesões não cicatrizem totalmente, o tratamento poderá ser continuado pelo período de tempo necessário. Ao se atingir a cura clínica, você deverá retornar para consulta de reavaliação em 1, 3, 6, 9 e 12 meses após o término do tratamento. E, a partir de então, pelo menos uma vez por ano durante um prazo indefinido (no mínimo 5 anos). A cada retorno deverão ser realizados avaliação médica e exames de sangue (na quantidade aproximada de uma ou duas colheres de sopa) para avaliar os efeitos dos medicamentos utilizados no seu tratamento e/ou para avaliar a evolução da doença. Outros exames, como o eletrocardiograma durante o tratamento, poderão ser realizados quando indicados. 70 Inconvenientes e riscos principais conhecidos até os dias atuais: A coleta de sangue poderá causar alguma dor no momento da punção venosa e, eventualmente, poderá haver a formação de uma área arroxeada no local, que voltará ao normal dentro de alguns dias. Ocasionalmente, os testes na pele poderão, apresentar uma reação forte com inflamação do local, formação de bolhas e, mais raramente, formação de ferida. Todo o processo costuma regredir dentro de alguns dias a poucas semanas. Tanto os testes na pele quanto o anestésico injetado no momento da biópsia (retirada de um pequeno fragmento de pele para exame) poderão causar alergia, geralmente limitada ao aparecimento de áreas vermelhas, empoladas e com coceira na pele e que respondem bem a medicamentos anti-alérgicos. Mais raramente poderá haver uma reação mais severa com dificuldade de respirar e necessidade de cuidados mais intensos, existentes no IPEC. No local da biópsia poderá ocorrer inflamação e dor, acompanhados ou não de infecção por bactérias. Caso isso ocorra, poderá ser necessário o uso de medicamentos para dor e antibióticos. Os medicamentos glucantime e pentamidina costumam causar efeitos indesejáveis, não devem ser utilizados na gravidez e seu uso em mulheres em idade reprodutiva deve ser acompanhado de uso de método anticoncepcional eficaz como preservativo de látex masculino ou feminino ("camisinha"), diafragma feminino ou anticoncepcional oral ("pílula"). Quando o tratamento não puder ser adiado, a anfotericina B poderá ser utilizada na gravidez. Os exames com raios-x também não devem ser realizados em grávidas. Formas de ressarcimento: Sempre que necessário, nos dias de seu atendimento, poderá ser fornecida alimentação conforme rotina do Serviço de Nutrição e Serviço social do IPEC para pacientes externos. Benefícios esperados: Espera-se que, ao final do tratamento, você esteja curado da LTA, embora as consultas de retorno por vários anos após o tratamento sejam necessárias 71 para a confirmação da cura. Os resultados deste estudo poderão ou não beneficiá-lo diretamente, mas no futuro, poderão beneficiar outras pessoas, pois espera-se também que este estudo contribua para que o diagnóstico e acompanhamento do tratamento de pacientes com LTA possa ser feito de forma mais eficaz e segura. Caso a sua investigação demonstre outro diagnóstico diferente de LTA, você será devidamente orientado a buscar o tratamento mais adequado para o seu caso. Declaro que li e entendi todas as informações referentes a este estudo e que todas as minhas perguntas foram adequadamente respondidas pela equipe médica, a qual estará à disposição para responder minhas perguntas sempre que eu tiver dúvidas. Recebi uma cópia deste termo de consentimento e pelo presente consinto, voluntariamente, em participar deste estudo de pesquisa. _______________________________________________ _______________ Nome paciente: Data _______________________________________________ _______________ Nome médico: Data _______________________________________________ _______________ Nome testemunha 2: Data _______________________________________________ _______________ Nome testemunha 2: Data 2 Apenas no caso de pacientes impossibilitados de manifestar o seu consentimento por escrito. No caso de menores de 18 anos, deverá ser assinado pelo pai, mãe ou responsável legal. 72 Anexo 3 - Termo de Compromisso e Responsabilidade TERMO DE COMPROMISSO E RESPONSABILIDADE Eu, Mauro Célio de Almeida Marzochi, coordenador do projeto de pesquisa intitulado “Estudo comparativo de sistemas reveladores em ensaios imunoenzimáticos para detecção de anticorpos específicos no diagnóstico da leishmaniose tegumentar americana (LTA) causada por Leishmania (Viannia) braziliensis”, comprometo-me a manter o anonimato e a confidencialidade dos participantes do projeto. A identidade dos participantes, assim como os resultados obtidos com este projeto, serão mantidos em um banco de dados sob a minha responsabilidade. Os resultados obtidos com esta pesquisa serão divulgados em comunicações científicas mantendo o anonimato dos participantes e o material biológico utilizado nesse projeto só poderá ser empregado em outras pesquisas após submissão e aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa. Rio de Janeiro, 04 de julho de 2005. Mauro Célio de Almeida Marzochi Sonia Regina Lambert Passos Orientador Co-orientadora Lílian Dias Nascimento Mestranda 73 Anexo 4 - Aprovação no CEP/IPEC 74 75