18º ENCONTRO ESTADUAL DE NOTÁRIOS E REGISTRADORES DE MINAS GERAIS – BELO HORIZONTE – 20 A 22 DE AGOSTO DE 2.009 OS TÍTULOS PARTICULARES NO REGISTRO DE IMÓVEIS EDUARDO PACHECO RIBEIRO DE SOUZA DECLARAÇÃO DE LIMA Um sistema registral moderno, eficaz, ágil e flexível, deve contar com os seguintes requisitos básicos: a) A utilização do documento público como continente dos atos destinados a serem inscritos no Registro, de forma que a ele acedam somente títulos notariais, judiciais e administrativos em virtude da fé pública que deles dimana. A autenticidade dos documentos públicos coadjuva a segurança jurídica dos Registros. A FORMA NOS NEGÓCIOS JURÍDICOS IMOBILIÁRIOS - O sistema jurídico brasileiro se fundamenta na liberdade de forma para a contratação dos negócios jurídicos. - A regra geral - não existe obrigatoriedade de forma para a contratação. - Voluntariedade - Consensualismo - Princípio da liberdade das formas. - Existem casos em que a lei excepciona a regra geral. A lei civil impõe forma em determinados tipos de negócios jurídicos. - O descumprimento da forma invalida o negócio jurídico. Art. 104 - A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei. (grifo nosso) – O negócio jurídico é nulo quando não revestir a forma prevista em lei (art. 166, IV, do C.C.) (Código Civil) POR QUE A ESCRITURA PÚBLICA? O instrumento particular favorece a clandestinidade, a evasão fiscal e a lavagem de dinheiro, dentre outros problemas. Por seu turno, o instrumento público, lavrado nas notas do tabelião, instrumentaliza nos negócios imobiliários a fase obrigacional, contribuindo para a segurança final que se espera do sistema notarial e registral. O duplo controle, tabelião/registrador, certamente é um dos pontos principais nos quais nos apoiamos para afirmar que o sistema registral imobiliário brasileiro é bastante seguro. Temos, na qualificação notarial e posteriormente na registral, duas fases presididas por profissionais do direito a afastar as possibilidades de nulidade. HIPÓTESES DE EXIGIBILIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA (exemplos) a) para a constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País (art.108 do C.C.); b) na lavratura de pactos antenupciais (art.1.653 do C.C. – será nulo se não se observar a forma); c) na cessão de quinhão hereditário (art.1.793 do C.C.); d) na aquisição de imóvel rural por estrangeiro (art.8º e art.15 da Lei 5.709); e) nos atos de interesse de analfabeto (art.215, §2º; art.221 e art.654 do C.C.); f) na lavratura de testamento de cegos (art.1.867 do C.C.); g) na celebração de negócios jurídicos com a cláusula de não valer sem instrumento público (art.109 do C.C.); h) na outorga de mandato quando o ato a ser praticado exige escritura pública – atração de forma (art.657 do C.C.); i) na instituição de bem de família (art.1.711 do C.C.); j) na emancipação (art.5º, parágrafo único, I, do C.C.); l) na constituição de renda (art.807 do C.C.). VANTAGENS DA ESCRITURA PÚBLICA (PROF. JOÃO TEODORO DA SILVA) 1. Quanto à autoria. O instrumento produzido pelo tabelião de notas é uma das espécies de documento de cunho oficial e, por força da lei, tem presunção de veracidade, ou seja, faz prova não só de sua formação, mas também dos fatos que o tabelião declarar que ocorreram em sua presença (Código de Processo Civil, art. 364). É, pois, verdadeiro enquanto não for decretada, por sentença judicial, a sua falsidade. A escritura pública, especificamente, tem autor declarado, o tabelião, responsável pelo que nela se contém, inclusive pelos erros. (...) 2 – Quanto à fé pública. Se o documento público em geral merece fé por força de lei, o que é produzido por tabelião goza de fé num sentido muito mais amplo. A escritura notarial é dotada de uma fé pública personalizada. (...) 3 – Quanto ao lugar. A escritura pública dá certeza do lugar de sua realização, necessariamente no território de competência do tabelião de notas. (...) 4 – Quanto à data. A escritura pública dá certeza da data de sua realização. Já o instrumento particular pode omitir a data, ser pré-datado ou pós-datado. A lei processual assinala essa precariedade (art. 370 CPC). (...) 5 – Quanto à identidade das pessoas. A escritura pública dá certeza, pela fé de conhecimento do tabelião, de que é a própria e não outra a pessoa que se apresenta. 6 – Quanto à capacidade das pessoas. A escritura pública dá certeza quanto à capacidade jurídica de quem dela participa, por ser inerente à função notarial essa prévia verificação. 7 – Quanto à personalização jurídica da parte. A escritura pública dá certeza quanto à existência legal da parte que é pessoa jurídica. 8 – Quanto à legitimidade da representação. A escritura pública dá certeza de que o representante de uma pessoa natural ou jurídica tem poderes ou atribuições bastantes para a prática do ato, conforme verificação prévia do tabelião. Há certeza da legitimidade do mandato, da identidade e da capacidade do procurador. (...) 9 – Quanto à expressão da vontade. A escritura pública dá certeza de ter sido outorgada por alguém no domínio de sua vontade, isto é, lúcido, livre de constrangimento ou ameaça. (...) 10 – Quanto ao consentimento. A escritura pública dá certeza de que a pessoa que a tiver assinado o fez conscientemente, porquanto, ao lavrá-la, o tabelião tem o dever de dar esclarecimento às partes sobre o significado e as conseqüências do ato que pretendem praticar. (...) 11 – Quanto ao conteúdo. A escritura pública dá certeza do seu conteúdo imutável e plenamente conhecido do signatário, mediante a obrigatória leitura que este faz ou lhe é feita pelo tabelião. 12 – Quanto à titularidade e à disponibilidade. A escritura pública dá certeza da titularidade dos direitos negociados e da disponibilidade do objeto, uma vez que, para lavrá-la, o tabelião exige a comprovação desses direitos, examinando o título ou os títulos de modo a não deixar dúvida. (...) 13 – Quanto à licitude do objeto. A escritura pública dá certeza de ser lícito o objeto da negociação, porque é de autoria de um técnico que a lavra em conformidade com a lei. (...) 14 – Quanto às obrigações fiscais. A escritura pública dá certeza do cumprimento das obrigações tributárias concernentes ao negócio jurídico realizado, porque o tabelião é fiscal rigoroso na exigência do pagamento dos tributos. 15 – Quanto à redação. A escritura pública dá certeza de estar redigida com técnica adequada, em linguagem clara, concisa e precisa, que não deixa dúvidas. 16 – Quanto à conservação. A escritura pública dá certeza de perenidade, porque o tabelião é zeloso depositário dos livros que a contêm. (...) 17 – Quanto à publicidade. A escritura pública, como sua designação já indica, dá certeza de sua publicidade e de ser acessível, via de regra, em qualquer tempo. (...) 18 – Quanto à orientação das partes. O autor da escritura pública é jurista especializado que orienta as partes com imparcialidade. (...) 19 – Quanto ao custo. Na escritura pública, a remuneração do seu autor é conhecida e fixada em lei. (...) 20 – Quanto à comodidade. Para a escritura pública, o tabelião, via de regra, providencia a documentação necessária. (...) 21 – Quanto ao registro. Se a eficácia do negócio depende do registro da escritura pública, o tabelião pode incumbir-se de promovê-lo. Caso seja obstado o registro por erro, o tabelião providencia a retificação. Tudo sem custos adicionais. A UTILIZAÇÃO DO INSTRUMENTO PARTICULAR NO BRASIL - Ordenações Manoelinas, promulgadas em 1521 - Ordenações Filipinas, que vigoraram a partir de 1.603 - Código Civil Português de 1.867 - Brasil - Código Civil Brasileiro de 1.916 - Lei Hipotecária de 20 de junho de 1774 - Decreto 482, de 1846 - Sistema registral hipotecário brasileiro - Alvará de 30 de outubro de 1793 - Lei 840, de 15 de setembro de 1840 - Decreto 482, de 14 de novembro de 1846 - A Lei 1.237, de 24 de setembro de 1864 - Decreto 3.453, de 26 de abril de 1865 - Decreto 169-A, de 19 de janeiro de 1890 - Decreto 370, de 2 de maio de 1890 - Código Civil Brasileiro de 1916 - Decreto 18.542, de 24 de dezembro de 1928 - O Decreto 4.857, de 9 de novembro de 1939 - Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973- Registros Públicos - O Código Civil de 2002. - Decreto-lei 167 de 14 de fevereiro de 1967 - Financiamento Rural - Decreto-lei 413 de 9 de janeiro de 1.969 - Financiamento Industrial - Lei 6.313 de 16 de dezembro de 1975 – Financiamento Exportação - Lei 6.840 de 03 de novembro de 1980 - Financiamento Comercial - Lei 8.929 de 22 de agosto de 1994- Financiamento rural – M. futuro - Lei n. 8.934, de 18 de novembro de 1994 – Juntas Comerciais - Lei 6.404 de 15 de dezembro de 1.976 – Sociedades Anônimas - Decreto-lei n. 58, de 10 de dezembro de 1937 – Loteamentos rurais - Lei 6.766, de 19 de dezembro de 1979 - Loteamentos urbanos - Lei 4.591 de 16 de dezembro de 1964 - Condomínios e Incorporações imobiliárias - Decreto 59.566 de 14 de novembro de 1966 - Estatuto da Terra - Lei 9.307, de 23 de setembro de 1996 - Arbitragem - Lei 9.636, de 15 de maio de 1998 - Caixa Econômica Federal - Lei 10.188 de 12 de fevereiro de 2001 - arrendamento residencial - Lei 10.931 de 02.08.2004 - Patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, Letra de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário e Cédula de Crédito Bancário - Lei 10.998 de 2004 - Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social – PSH - Lei 4.380 de 21 de agosto de 1964 - O SFH – Sistema Financeira da Habitação, Na legislação brasileira o documento público é a regra e é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo vigente no País (art. 108). Contudo, o documento particular vem sendo utilizado nas hipóteses em que a lei o admite, excepcionalmente, convivendo com o documento público. O que ocorre é que as disposições especiais referentes aos documentos particulares se baseiam em razões diversas das que conduziram o legislador de 2.002 a exigir o documento público como regra. São outros o objeto, o espírito e fim das disposições especiais. Para exemplificar podemos citar a legislação relativa aos parcelamentos do solo (Decreto-lei 58/37 e Lei 6.766), que exige o depósito de um memorial no Registro de Imóveis, do qual consta o contrato-tipo (Dec.-lei 58) ou o exemplar do contratopadrão de promessa de venda (Lei 6.766), tendo esta enumerado no art. 26 indicações obrigatórias do contrato, visando a proteção do comprador. Qualquer pessoa pode examinar o processo de loteamento e os contratos depositados, livre de emolumentos (art. 24). O contrato-padrão rege as relações entre as partes quando o devedor não cumpre a obrigação (art. 27). Como se vê, há uma proteção à parte teoricamente mais fraca na relação, que se sujeita a um contrato-padrão que passou pela qualificação do registrador, consta de acervo público e que, como contrato de adesão que é, merece interpretação mais favorável ao aderente, nos termos da Lei 8.078 (Código do Consumidor) e dos arts. 423 e 424 do Código Civil. ACESSO DOS INSTRUMENTOS PARTICULARES AO REGISTRO IMOBILIÁRIO Escritura Pública Executivo Públicos Escritura lavrada em consulado Legislativo Documentos Judiciário Autoridades brasileiras Autoridades estrangeiras Particulares Lei 6.015/73 - art. 221, II - são admitidos a registro os “escritos particulares, autorizados em lei, assinados pelas partes e testemunhas, com as firmas reconhecidas, dispensado o reconhecimento quando se tratar de atos praticados por entidades vinculadas ao Sistema Financeiro da Habitação”. O dispositivo estaria revogado quanto à exigência do reconhecimento de firma? Art. 194 da Lei 6.015/73: “o título de natureza particular apresentado em uma só via será arquivado em cartório, fornecendo o oficial, a pedido, certidão do mesmo”. A SEGURANÇA JURÍDICA FORTALECIDA PELO INSTRUMENTO PÚBLICO Não obstante se possa afirmar que o instrumento público tem convivido pacificamente com o instrumento particular no Brasil, tal convivência decorre da permissividade imposta pela legislação, ao admitir a contratação por instrumento particular sem avaliar suas conseqüências. A convivência pacífica, entretanto, não significa que os instrumentos particulares contribuam para a paz social e a segurança jurídica no mesmo patamar que os instrumentos públicos. À evidência não têm como fazê-lo. PATOLOGIA JURÍDICA DOS CONTRATOS PRIVADOS – SÉRGIO JACOMINO - São contratos volantes, que não encontram repouso num livro público. Estarão nos lugares mais insólitos. Ou perdidos nalgum escaninho esquecido – justamente quando deles mais necessitamos. Alguns estão em sites protegidos em algum lugar imponderável do cyberspace, prática que se tornou comum depois das violências perpetradas pela Polícia Federal em algumas bancas renomadas. -São formados na obscuridade e para a opacidade. São como espíritos que muitos crêem não existirem. Atormentam a vida do Fisco e encarnam para obrar a maravilhosa lavanderia invisível dos trópicos. - São contratos ‘partiais’ – i.e., representam uma das partes, já que se fazem sob a cura de um advogado ou de um simples corretor de imóveis que em regra são patrocinados por uma das partes contratantes. Imagine o interesse da corretagem na concretização do negócio. - São contratos clandestinos e imperfeitos. São chamados a Juízo quando devem produzir seus efeitos. - São contratos que acabam criando um pernicioso efeito de tropismo judicial. Chamado a resolver os intrincados problemas deles decorrentes, o Judiciário acaba relevando e socorrendo o contratante e de quebra criando uma jurisprudência leniente com a informalidade, desídia e clandestinidade jurídicas. Vale mais um contrato particular, do que uma hipoteca registrada. Esse fenômeno ocorre nestas plagas e certamente é motivo de escândalo internacional, embora se compreenda o sentido social ínsito. - O contrato privado é muito mais caro. Não há controle público; os preços não são fixados por Lei. Quando muito, quando lavrados por advogados, os honorários são fixados em tabelas corporativas, onde impera a livre negociação, com fixação de piso que culmina píncaros da tabela notarial. O exemplo da contratação imobiliária assistida por advogados em São Paulo é assaz eloqüente: 2% do valor do imóvel” Se a exigência de forma for eliminada, nem por isso o cidadão comum passará, subitamente, a saber redigir contratos. Conseqüentemente, passará a recorrer a outros juristas – solicitadores, advogados, assistentes, professores das faculdades de direito, etc. –, juristas esses que, esperamos, não aceitarão redigir contratos contrários à lei, continuando, assim, o duplo controle da legalidade. A função será mantida, o agente que a desenvolve é que passará a ser outro. Sendo assim, quem pretende a desformalização, caso pretenda que se continuem a redigir negócios conformes à lei, deve assumir que apenas quer mudar o agente. O que colocará a questão de saber por quê. Sobretudo quando se sabe que a função só é verdadeiramente desempenhada por alguém que seja imparcial em face das partes e que não tenha interesse perante um eventual conflito futuro” (grifo nosso). Mestra Mónica Jardim. A indagação da Dra. Mónica Jardim ecoa: por que querem mudar o agente? A quem interessa? Com certeza não interessa à sociedade. Os cidadãos não têm qualquer benefício com o instrumento particular, mais caro, menos técnico, parcial, sem a segurança da conservação, sem o amparo da fé pública, instrumentos de evasão fiscal e lavagem de dinheiro, mais suscetíveis a demandas judiciais, enfim, desvantajosos em todos os sentidos com relação à escritura pública. Por fim, reafirmamos que a conclusão da declaração de Lima está correta, o instrumento público coadjuva a segurança jurídica dos registros; e que os instrumentos particulares, ao acessarem o registro imobiliário exigem uma qualificação mais cautelosa, por todas as vicissitudes apontadas. MUITO OBRIGADO! EDUARDO PACHECO RIBEIRO DE SOUZA CAM