UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA Programa de Pós-Graduação em Letras/Linguística Rogéria Tarocco dos Santos O USO DE AMEAÇAS DIRETIVO-COMISSIVAS COMO ESTRATÉGIA DE FORMULAÇÃO DE ACORDO EM AUDIÊNCIAS DE CONCILIAÇÃO Juiz de Fora 2012 Rogéria Tarocco dos Santos O USO DE AMEAÇAS DIRETIVO-COMISSIVAS COMO ESTRATÉGIA DE FORMULAÇÃO DE ACORDO EM AUDIÊNCIAS DE CONCILIAÇÃO Dissertação de mestrado apresentada ao programa de Pós-Graduação em Linguística da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Juiz de Fora, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Letras – Linguística. Orientadora: Sonia Bittencourt Silveira Juiz de Fora 2012 Santos, Rogéria Tarocco. O uso de ameaças diretivo-comissivas como estratégia de formulação de acordo em audiências de conciliação / Rogéria Tarocco dos Santos. – 2012. 129 f. : il. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2012. 1. Linguística. 2. Atos de ameaças. 3. Diretivos. 4. Comissivos. 5. Propostas. 6. Resolução de conflito. I. Título. ROGÉRIA TAROCCO DOS SANTOS “O USO DE AMEAÇAS DIRETIVO-COMISSIVAS COMO ESTRATÉGIA DE FORMULAÇÃO DE ACORDO EM AUDIÊNCIAS DE CONCILIAÇÃO” Dissertação de Mestrado apresentada à banca de defesa como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Linguística. Aprovada em 20/08/2012, pela Banca Examinadora composta por: _________________________________________ Profa. Dra. Sonia Bittencourt Silveira (UFJF) Orientadora _________________________________________ Profa. Dra. Amitza Torres Vieira (UFJF) Membro Titular Interno _________________________________________ Profa. Dra. Nilza Barrozo Dias (UFF) Membro Titular Externo AGRADECIMENTOS Obrigada. É uma simples palavra, mas, na maioria das vezes, esquecemos de dizê-la. Este é o momento de lembrá-la. Os meus agradecimentos... A Deus, sem o qual este trabalho jamais teria sido escrito. A Ti autor da vida, que me sustentou até este momento, me amparando todas as vezes que cogitei desistir, meu maior agradecimento. À Nossa Senhora Desatadora dos Nós por sua intercessão poderosa. Aos meus pais, Rogério e Beatriz, que sempre priorizaram minha educação e me deram condições de chegar até aqui, um título tão sonhado e que se faz realidade pela misericórdia de Deus. Obrigada, mãe! Obrigada, pai! Aos familiares, irmã, cunhado, sobrinho, avó, tios e primos que rezaram e torceram por esta conquista. Ao Ederson que me incentivou a acreditar que eu era capaz de terminar este trabalho. Às queridas professoras Sonia Bittencourt Silveira, Patrícia Fabiane Amaral da Cunha Lacerda, Nilza Barrozo Dias e Amitza Torres Vieira. E a todo corpo docente da UFJF. Agradeço imensamente à professora Sonia, por aceitar me orientar, por me permitir pesquisar um objeto que estava fora de seu projeto de pesquisa, por suportar meus atrasos e por cada palavra dita, quanta sabedoria há em cada uma delas. Cada minuto de orientação valeu mais do que as incontáveis horas sozinhas em busca de resultados. Minha eterna gratidão à professora Patrícia que aceitou me co-orientar, mas que, por um atraso meu, não foi possível estabelecer a tão sonhada interface. Por me ensinarem a amar Linguística, Nilza e Amitza, aqui estou. Eu só tenho a agradecer as duas pelos anos de iniciação científica que passamos juntas, certamente, contribuíram para este momento. Não imaginaria concluir esta fase sem a avaliação de vocês, também agradeço por aceitarem o convite para esta banca. À amiga Gabriela Abreu por todo carinho ao traduzir meus textos. Às amigas Priscila e Simone por ouvirem minhas angústias e reclamações durante este período e a todas as colegas de turma por todo companheirismo do primeiro ano de mestrado. Aos Filhos de Maria, família que me acolheu e que soube entender minha ausência neste momento decisivo. Pela incessante intercessão, obrigada. À Universidade Federal de Juiz de Fora, meus eternos agradecimentos pela concessão da bolsa de monitoria que me permitiu atuar na Revista Veredas, momento de muito aprendizado. Agradeço à comissão editorial: bolsistas e editoras da revista. A todos os autores que antecederam este trabalho e tornaram possível minha dissertação. Obrigada! RESUMO O presente trabalho tem como objetivo investigar as principais funções que os atos de fala diretivos e comissivos exercem na negociação de acordos em resoluções de conflitos. E, em particular, a relação desses atos com a produção de ameaças na formulação de acordos em audiências de conciliação, realizadas pelo órgão de defesa do consumidor, o PROCON. Para a análise, selecionamos cinco audiências intituladas: ―Banco Sul‖, ―Brasimac‖, ―Gesso‖, ―Ok veículos‖ e ―Rui Pedreiro‖, estas foram gravadas em áudio e transcritas de acordo com as convenções da Análise da Conversa. Com base em uma perspectiva performativa da linguagem, formulada inicialmente pela Teoria clássica dos Atos de Fala (AUSTIN, 1962; SEARLE, 1969) e discutida por CASANOVA (1996), GARCIA (1997) e SALGUEIRO (2010), iniciamos a análise a partir da suposição de que diretivos e comissivos deveriam configurar uma mesma categoria, pois ambos os atos estão relacionados à obrigação. O primeiro se refere a obrigações impostas aos outros e o segundo, a obrigações assumidas pelo falante/escritor. Assim, buscamos investigar o papel dos: (i) diretivos nas negociações de conflitos e (ii) comissivos nas resoluções. Os dados foram analisados a partir de uma perspectiva qualitativa e interpretativa, seguindo as orientações teórico-metodológicas de perspectiva interacional pragmática. Alguns dos resultados demonstraram que: (i) os diretivos têm um relevante papel na produção dos diferentes enquadres construídos pelas partes oponentes; há sempre duas versões sendo disputadas (a do reclamado e a do reclamante), e é o uso dos diretivos que revela esses enquadres; (ii) os comissivos têm importância na resolução do conflito, só há resolução quando o reclamado se compromete com alguma ação que é do interesse do reclamante e (iii) a hipótese, que diretivos e comissivos estão intrinsecamente ligados, tem fundamento, visto que, durante as negociações, as partes fazem uso de ameaças do tipo diretivo-comissivas, que apresentam ao mesmo tempo uma parte diretiva e outra comissiva. Nas audiências analisadas, as partes apenas entram em acordo, após o uso de ameaça feita ou pelo mediador ou pelo reclamado. Não foram encontradas ameaças usadas pelos reclamantes que fossem eficientes na produção do acordo. PALAVRAS- CHAVE: atos de ameaça; diretivos; comissivos; propostas; resolução de conflito. ABSTRACT This study aims to investigate the main functions of directive and commissive speech acts in the negotiation of agreements in conflict resolution. And, specifically, the relation of these acts with the production of threats in the formulation of agreements in conciliation hearings, organized by the consumer defense organ, PROCON. For this analysis, we select five hearings entitled: ―Banco Sul‖, ―Brasimac‖, ―Gesso‖, ―Ok veículos‖ and ―Rui Pedreiro‖ record in audio and translated using the notations suggested by Conversation Analysis. Based on the theoretical assumptions of a performative perspective on language, formulated initially by the classical Speech Act Theory (AUSTIN 1962; SEARLE 1969) and applied by CASANOVA (1996), GARCIA (1997) and SALGUEIRO (2010) to specific issues, we started the analysis considering the supposition that directive and commissives must set the same category, because both acts are related to obligation. The first one refers to obligations imposed to other person and the second, assumed by the speaker/writer. Thus, we seek to investigate: the role of (i) directive acts in the negotiation of conflict and (ii) commissive in their resolutions. The data were analyzed from a qualitative and interpretative perspective, following the theoretical and methodological orientations of an interactional perspective in pragmatics. Some of the results found were: (i) the directives have a relevant role in the production of the different frames, constructed by the opponent parties: there is always two versions being disputed (the respondent one and the claimant one), and it is the use of directive which reveals these framings; (ii) the commissives are important to the conflict resolution: there is resolution only when the respondent undertake to do any action of claimant‘s interest and (iii) the hypothesis, that directives and commissives are intrinsically linked, is grounded, since, during the negotiations, the parties make use of threats of the directive-commissives types, which present, at the same time, a directive part and a commissive one. Most of the time, in the hearings analysed, the parties only reach any kind of agreement, after the use of threats by mediator or the respondent. There wasn‘t found any threat used by claimants which effectively has reached an agreement. KEY-WORDS: threat acts; directives; commissives; proposals; conflict resolution. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO...........................................................................................................11 2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS...................................................................................13 2.1 A teoria clássica dos atos de fala: um breve panorama.................................13 2.1.1 As contribuições de John L. Austin.....................................................13 2.1.2 A dicotomia: constativos / performativos.............................................14 2.1.3 Fim da dicotomia constativo / performativo.........................................16 2.1.4 Atos locucionário, ilocucionário e perlocucionário..............................17 2.1.5 Tipologia dos atos de fala ....................................................................18 2.1.6 As contribuições de John Searle...........................................................18 2.1.7 Atos de enunciação, atos proposicionais e atos ilocucionários............19 2.1.8 Em busca de critérios de classificação: regras normativas e regras constitutivas.....................................................................................................................20 2.1.9 Uma nova tipologia dos atos de fala: os critérios de Searle.................23 2.2 Por uma abordagem pragmática da teoria dos atos de fala............................26 2.2.1 Das críticas à aplicação da Teoria dos Atos de Fala em estudos pragmáticos......................................................................................................................26 2.3 Diretivos e Comissivos: novas contribuições................................................30 2.3.1 Diretivos: ordens, pedidos e sugestões.................................................30 2.3.2 Comissivos: promessas e propostas......................................................32 2.3.3 Relação entre diretivos e comissivos: ameaças....................................34 3. METODOLOGIA........................................................................................................43 3.1 Enfoque teórico-metodológico......................................................................43 3.2 O contexto de pesquisa: o PROCON.............................................................44 3.3 A natureza da pesquisa..................................................................................46 3.4 A geração dos dados......................................................................................46 4. ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS..............................48 4.1 Análise dos dados..........................................................................................48 4.1.1 Audiência Banco Sul............................................................................48 4.1.2 Audiência Rui Pedreiro........................................................................57 4.1.3 Audiência Ok veículos..........................................................................65 4.1.4 Audiência Gesso...................................................................................78 4.1.5 Audiência Brasimac.............................................................................88 4.2. Discussão dos resultados..............................................................................98 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................101 6. REFERÊNCIAS........................................................................................................104 7. ANEXOS...................................................................................................................107 11 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como objetivo examinar as principais funções desempenhadas pelos atos de fala diretivos e comissivos produzidos em contexto institucional mediado: audiências de conciliação do PROCON. Encontramos nos postulados teóricos da Sociolinguística Interacional e da Análise da Conversa as bases sobre as quais este trabalho será desenvolvido, assim, os fenômenos de linguagem serão estudados a partir da interação social em que são produzidos. O corpus analisado é composto por cinco audiências de conciliação, realizadas no PROCON, intituladas ―Banco Sul‖, ―Rui Pedreiro‖, ―Ok veículos‖, ―Brasimac‖ e ―Gesso‖. O PROCON atua na resolução de conflitos relacionados ao consumo de bens e serviços, o objetivo das audiências promovidas por esse órgão é buscar um acordo entre as partes, para que não seja necessário um processo judicial. Normalmente, o consumidor procura o PROCON na tentativa de responsabilizar a empresa ou pessoa, fornecedora de bens ou serviços, pelos danos sofridos, que, por sua vez, tenta se eximir da responsabilidade, atribuindo-a a terceiros ou até mesmo ao próprio consumidor. O mediador, então, atua de modo a promover um acordo entre as partes. A relevância da presente investigação para a área de interação deve-se ao fato de analisarmos os atos de fala em dados reais de fala, de forma sequencial, considerando os macro-atos e o contexto nos quais estão inseridos. Partimos da observação de Searle (1995 [1979]) que diretivos e comissivos deveriam compor uma mesma categoria pelo fato de compartilharem a direção do ajuste mundo-palavra, ou seja, ambos os atos tentam que uma ação seja realizada no mundo a partir do uso da palavra. A partir dessa observação, buscamos na literatura algum trabalho que se dedicasse a investigar a relação entre diretivos e comissivos e, encontramos os postulados de Salgueiro (2010) que apontam as ameaças como o ato de fala representativo da relação entre diretivos e comissivos. Motivados por tal constatação, desenvolvemos algumas perguntas de pesquisa: 1- Qual o papel desempenhado pelos diretivos nas audiências? 2- Em qual momento da audiência, os comissivos são usados e com que finalidade? 3- Ameaças podem ser encontradas em contexto de conflito? 12 4- Qual a função das ameaças em situações de conflito, em especial, em audiências de conciliação? A presente dissertação está dividida em cinco capítulos que fornecem ao leitor uma visão do caminho desenvolvido na pesquisa. No capítulo seguinte, apresentaremos uma revisão teórica dos principais trabalhos sobre atos de fala. Iniciaremos a apresentação com a Teoria clássica dos Atos de Fala que tem Austin (1990 [1962]) e Searle (1981 [1969], 1995 [1979]) como seus principais representantes. Em seguida, identificaremos as falhas apontadas nesta teoria e discutiremos a possibilidade de aplicá-la à análise do discurso, ressaltando os trabalhos de Pereira & Gray (1999), Schiffrin (1994) e Cooren (2000). Finalizando o capítulo teórico, apresentaremos estudos recentes sobre os atos diretivos e comissivos. O estudo dos diretivos de Casanova (1996), as observações sobre propostas (comissivos) de Garcia (1997) e os postulados de Salgueiro (2010) sobre ameaças diretivo-comissivas. Em seguida, no terceiro capítulo, apresentaremos algumas considerações sobre a metodologia de pesquisa adotada, sobre o contexto de pesquisa e a geração dos dados utilizados. No quarto capítulo, aplicaremos a teoria à análise dos dados a fim de verificar em quais momentos da audiência os participantes fazem uso de diretivos e comissivos e o papel desempenhado por esses atos, como também verificar a ocorrência de ameaças em contextos de conflito. A partir da análise discutiremos os resultados obtidos. No último capítulo, responderemos às perguntas investigativas apresentadas nesta introdução, baseando-nos na análise desenvolvida no capítulo anterior. As referências e os anexos encerram o trabalho. 13 2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS Como o objetivo principal do trabalho é investigar as funções dos atos de fala diretivos e comissivos em contexto de conflito, faz-se necessário apresentar, ainda que de forma breve, um panorama da teoria clássica dos atos de fala, uma vez que é necessário conhecer os conceitos basilares desta teoria. Em seguida, apresentaremos as críticas feitas a Teoria dos Atos de Fala e discutiremos a possibilidade de aplicá-la a partir de uma perspectiva interacional. Por fim, faremos uma revisão de alguns estudos recentes que se dedicam ao estudo dos atos diretivos e comissivos. 2.1 A teoria clássica dos atos de fala: um breve panorama 2.1.1 As contribuições de John L. Austin Austin representa um divisor de águas nos estudos da linguagem que até então eram realizados por filósofos ou gramáticos. Os primeiros analisavam frases em termos de verdade ou falsidade, essas construções tinham como principal função descrever ou asseverar um dado estado de coisa. Os gramáticos focalizavam principalmente os diferentes tipos de frases usadas para fazer uma afirmação ou para fazer uma pergunta e assim por diante. Embora esses estudiosos tivessem sido capazes de distinguir uma afirmação de uma pergunta, por exemplo, nenhum deles se dedicou a justificar o porquê das diferenças em termos das ações realizadas. Nos estudos feitos pelos filósofos, foi constatado que muitas afirmações não podiam ser testadas em termos de verdade/falsidade e, por isso, eram consideradas sem sentido. Como Austin (1990 [1962]) observa, devido ao grande número de frases afirmativas consideradas sem sentido, os próprios filósofos se questionaram se elas estavam mesmo sendo usadas para asseverar um estado de coisas. Desse questionamento, surgiu um novo modo de análise, revelando que algumas dessas frases, de fato, não eram afirmativas, uma vez que não faziam constatações, mas sim alteravam um dado estado de coisas. Dessa constatação, surgem os construtos teóricos de Austin, copilados na obra How to do things with words (1962) e que, posteriormente, foram chamados de Teoria 14 dos Atos de Fala. Nas seções seguintes, apresentaremos o legado teórico deixado pelo autor. 2.1.2 A dicotomia: constativos / performativos Ao estabelecer a diferença entre dizer e fazer, Austin (op. cit.) formula a distinção entre enunciados constativos e performativos. Os primeiros são proposições que podem ser analisadas em termos de verdade ou falsidade, ou seja, são as frases chamadas de afirmativas, pelos filósofos da linguagem, aquelas que asseveram ou descrevem um estado de coisas (dizer algo). Os segundos são proposições que, gramaticalmente, se assemelham a essas frases, mas que, ao serem proferidas, realizam ações (fazer algo), por muito tempo, essas foram consideradas sem sentido e ficaram de fora dos estudos linguísticos. A esses últimos, os performativos, Austin (op. cit.) dedica grande parte de sua teoria. A análise feita por Austin (op. cit.) inicia-se com os enunciados que não eram considerados nos estudos realizados pelos filósofos, por não serem passíveis de análise com os mesmos critérios das frases afirmativas, mas que eram perfeitamente inteligíveis ao contrário do que postulavam os filósofos. Em comum, destaca-se, nesses proferimentos, uso do verbo na primeira pessoa do singular no presente do indicativo da voz ativa que, ao serem proferidos, realizavam ações ao invés de relatá-las. Dos exemplos apresentados pelo autor, destacamos: (1) ―Batizo este navio com o nome de Rainha Elizabeth.‖ – quando proferido ao quebrar-se uma garrafa contra o casco do navio. (2) ―Aposto cem cruzados como vai chover amanhã.‖ 1 Nos exemplos acima, percebemos que os falantes não descrevem nem declaram a ação que estariam praticando, mas sim estão realizando uma ação ao mesmo tempo em que a enunciam. O autor ressalta que é evidente que o critério de verdade/falsidade não é aplicável a esse tipo de enunciado, que foi chamado de performativo. Austin (op. cit.) ressalta que, para haver realização de uma ação, não basta o proferimento do ato, é necessário também que as circunstâncias sejam apropriadas, assim como é necessário que os participantes realizem as ações de forma conveniente. 1 Exemplos de Austin (1990 [1962], p. 24) 15 Dessa forma, se uma dessas condições não for preenchida, o ato pode ser mal-sucedido (infeliz) e a ação não vir a acontecer. Às condições que garantem o sucesso dos enunciados performativos, ele chamou de condições de felicidade. O autor esquematiza seis regras para que a realização de um ato seja feliz (bem-sucedido): (AI) Deve existir um procedimento convencional que apresente um efeito também convencional. (A2) As circunstâncias e as pessoas devem ser adequadas ao procedimento. (BI) O procedimento deve ser executado por todos participantes corretamente e (B2) completamente. (TI) Os participantes devem ter os pensamentos, sentimentos e intenções em conformidade com o procedimento e (T2) devem ater-se a conduta2. A transgressão de qualquer uma das regras acima implica o insucesso do ato, podendo gerar um desacerto, quando as palavras proferidas não realizam a ação (A1, A2, B1 e B2), como nos casos em que a pessoa que profere as palavras não é a apropriada a fazê-lo; ou um abuso, quando as palavras proferidas não foram sinceras (T1 e T2), não havia a intenção de se fazer o que estava sendo proferido, como nos casos em a pessoa faz uma promessa sem a intenção de cumpri-la. Após fazer uma reflexão sobre casos de infelicidades – atos mal-sucedidos –, Austin (op. cit.) passa a questionar as diferenças entre os enunciados constativos e os performativos. E propõe que os enunciados constativos não sejam analisados apenas em termos de verdade/falsidade, mas também à luz de outros parâmetros, tais como: a pressuposição e a implicação3. Em um enunciado como ―Todos os filhos de João são calvos‖4, pressupomos que João tenha filhos, o fato de proferirmos esse enunciado também implica que acreditamos que tal constatação seja verdadeira. Caso João não tenha filhos, tal afirmação é nula (falsa), esse tipo de pressuposição se assemelha às condições de felicidade dos performativos. Não seria aceitável proferirmos esse enunciado, se não acreditássemos que os filhos de João sejam calvos, ou seja, sem sinceridade, seria um ato nulo. 2 Austin (1990 [1962], p. 31) Segundo Austin (1990 [1962], p. 57), ―a pressuposição e a implicação são duas maneiras pelas quais a verdade de uma declaração pode estar ligada de modo importante com a verdade de outra, sem que se dê o caso de que uma implique logicamente a outra.‖ 4 Exemplo de Austin (1990 [1962], p. 53) 3 16 Da mesma forma, um enunciado performativo como ―Previno-o de que o touro está por atacá-lo‖5 só será proferido caso o touro esteja por atacar, se isso não está para acontecer, a análise dessa falha não está prevista nas condições de felicidade (nem nulo, nem insincero), o mais adequado seria dizer que essa advertência foi falsa – ou nos termos de Austin, equivocada – , ou seja, ao contrário do que era postulado, esses enunciados também podiam ser analisados com os mesmos critérios das frases afirmativas. Uma vez que alguns enunciados constativos são passíveis de serem analisados de acordo com os mesmos critérios que os performativos e que alguns destes, por sua vez, podem ser pensados como verdadeiros ou falsos, a distinção não se justifica, como veremos na próxima seção. 2.1.3 Fim da dicotomia constativo / performativo Austin constata que a dicotomia constativos / performativos não se justifica, pois uma frase afirmativa, quando analisada dentro da situação na qual foi proferida, pode ser infeliz. Dessa forma, as condições de felicidade dos performativos podem ser usadas para a análise dos constativos. Ao ser superada a dicotomia, emerge uma Teoria dos Atos de Fala. Ao se voltar para a análise da performatividade dos enunciados, Austin (op. cit.) separa os performativos explícitos dos primários. Os primeiros são aqueles em que é evidente a ação realizada, essa evidência se deve ao uso do verbo performativo, conceito este que esmiuçaremos adiante. Nos performativos explícitos, como ―Prometo que estarei lá amanhã‖6, a ação realizada, uma promessa, está explícita – uso do verbo prometer. Já nos perfomativos primários, a ação realizada não fica claramente definida, como em ―Estarei lá amanhã‖, ao proferir esse enunciado, podemos nos perguntar se trata-se de uma promessa. Nesse caso, ao omitir o verbo performativo implica diferença na pragmática do enunciado, tanto que não podemos negar que ―Prometo que estarei lá amanhã‖ é uma promessa, mas podemos proferir ―Estarei lá amanhã‖ e negá-lo como promessa – nesse sentido, tal proferimento seria apenas uma previsão. 5 6 Exemplo de Austin (1990 [1962], p. 58) Exemplos de Austin (1990 [1962], p. 67) 17 Austin (op. cit.) chama de verbo performativo aquele que, gramaticalmente conjugado na primeira pessoa do singular do presente do indicativo na voz ativa, designa a ação que realiza, por exemplo: prometer, ordenar, batizar etc. O critério gramatical é importante, visto que se o verbo estiver flexionado no passado, deixa de ser performativo, pois a ação deixa de ser realizada e passa a ser um relato de um fato passado. 2.1.4 Atos locucionário, ilocucionário e perlocucionário Avançando em seus postulados, Austin (op. cit.) apresenta três novos conceitos: ato locucionário, ilocucionário e perlocucionário. O ato locucionário corresponde ao proferimento de um enunciado com sentido e referência. O ato ilocucionário corresponde à realização do ato com um dado objetivo e força, se uma promessa, uma declaração, um pedido etc. O ato perlocucionário corresponde aos efeitos que um enunciado desperta no interlocutor, esses efeitos dependem das circunstâncias da enunciação e não são previsíveis, ou seja, nem sempre o efeito produzido, era o esperado pelo enunciado. Ao desejar que alguém feche a porta, podemos proferir diferentes enunciados, com forças ilocucionárias diferentes, mas com o mesmo objetivo que é o de que nosso interlocutor feche a porta. Por exemplo, podemos enunciar tal objetivo com força de ordem (―Feche a porta‖) ou de pedido (―Peço que feche a porta‖). Em ambos os enunciados, o objetivo ilocucionário é o mesmo, que a porta seja fechada, mas o efeito perlocucionário depende do que a ordem produz no interlocutor, por exemplo, ela pode ter sido usada para marcar poder, fazendo com que o interlocutor se sentisse humilhado, e é a reação do interlocutor que corresponde ao efeito perlocucionário. Dos três atos propostos por Austin (op. cit.), o que tem maior destaque em sua teoria é o ato ilocucionário. Segundo o autor, o estudo do significado pode ser realizado independente dos outros dois atos. Essa autonomia do ato ilocucionário será criticada por Searle (1969), como veremos adiante. 18 2.1.5 Tipologia dos atos de fala Ao emergir uma Teoria dos Atos de Fala, Austin (1990 [1962], p. 123) propõe a substituição da crença na dicotomia constativos / performativos pela ideia de que os atos de fala podem ser relacionados em grupos, são eles: os vereditivos, os exercitivos, os comissivos, os compormentativos, e os expositivos. Os vereditivos são os atos que anunciam vereditos, na maioria das vezes, relacionados a atos jurídicos, alguns exemplos dos verbos perfomativos que realizam esse tipo de ato são: condenar, absolver e decretar. Os exercitivos são os atos que influenciam no comportamento do interlocutor, alguns verbos que realizam esse tipo de ato são: ordenar, demitir, designar. Os comissivos são atos em que o falante se compromete com o que diz, alguns verbos performativos desse ato são: prometer, pretender, jurar. Os comportamentais são os atos relacionados a comportamentos sociais, como congratular, pedir desculpas, agradecer, felicitar. Por fim, os expositivos são atos com os quais realizamos exposições, podemos destacar alguns verbos performativos: afirmar, negar, relatar, informar. 2.1.6 As contribuições de John Searle Como o próprio Austin (op. cit.) observa no fim da obra How to do things with words, ele se ocupou mais da elaboração da teoria do que no uso efetivo desta. Nas palavras do autor, os postulados deixados mostraram ―o que deveria ser feito ao invés de fazê-lo‖ (AUSTIN, 1990 [1962], p. 132). Como consequência dessa lacuna, foram feitas algumas revisões na teoria, dentre as quais destacamos a de John R. Searle (1981 [1969]). A crítica de Searle (op. cit) gira em torno da falta de critérios para classificar os atos de fala (quais foram os critérios adotados?), assim como a falta de limites que separam os diferentes tipos. Então, o que o autor faz, praticamente, é sistematizar a Teoria dos Atos de Fala, delimitando as fronteiras entre os tipos de atos através de condições e regras, esses conceitos abordaremos adiante. Apesar de sistematizada, a teoria proposta por Searle (op. cit) tem como base a mesma ideia defendida por Austin (op. cit.) a de que ao falarmos, estamos, na verdade, 19 executando atos de fala, tais como: ordenar, prometer, perguntar etc. E esses atos são considerados a unidade mínima da comunicação linguística. Todas as críticas, reformulações e/ou novas contribuições serão apresentadas nas seções que seguem. 2.1.7 Atos de enunciação, atos proposicionais e atos ilocucionários Como acima mencionamos, a base da teoria dos atos de fala proposta por Searle (1981 [1969]) segue a ideia já defendida em Austin (op. cit.) de que ―todo dizer é um fazer‖, ou seja, que ao proferirmos um enunciado, estamos agindo no mundo. A primeira diferenciação feita por Searle (1981 [1969]) diz respeito às definições de ato locucionário, ilocucionário e perlocucionário. Para o autor, toda vez que dizemos algo, estamos realizando atos locucionários, sendo impossível separar a dimensão locucionária (proferimento) da dimensão ilocucionária (ação realizada), que aconteceriam simultaneamente. Assim, os atos locucionários já seriam atos ilocucionários. Esse termo passa a ser usado, então, para se referir ao ato de fala completo. À noção de ato ilocucionário, Searle (1981 [1969]) agrega as noções de ato de enunciação (correlata ao conceito de ato locucionário) e a de ato proposicional (conjunção dos atos de referir e predicar). O autor destaca que, ao executarmos um ato ilocucionário, estamos ao mesmo tempo executando atos de enunciação e proposicionais. Os exemplos citados por Searle (1981 [1969], p. 34), reproduzidos abaixo, elucidam as diferenças entre esses atos: 1 – João fuma muito. 2- João fuma muito? 3- Fuma muito, João! 4- Oxalá João fumasse muito. 5- João Felício é um fumante inveterado. O ato de enunciação corresponde à ação de enunciar uma sequência de palavras, a mesma ideia que implica o conceito de ato locucionário. No caso dos exemplos acima, 20 ao enunciar a frase 5, temos um ato de enunciação diferente das frases anteriores, pois se trata de uma frase formada por outras palavras. Já o ato proposicional corresponde ao conteúdo do que é dito, que é o mesmo em todos os exemplos acima, pois a referência é a mesma – João – e é feita uma mesma predicação – fuma muito. O que faz com que cada uma dessas frases se diferencie ou se relacione é o ato ilocucionário. Em 1 e 5, por exemplo, temos um mesmo ato ilocucionário, um ato assertivo, mas já em 3, temos um ato ilocucionário diferente, um diretivo. Em relação ao ato perlocucionário proposto por Austin (1962), Searle (1981 [1969]) não faz nenhuma observação, concordando com aquele que todo ato ilocucionário provoca, nos interlocutores, consequências ou efeitos. Por exemplo, ao proferirmos um aviso, a reação do nosso interlocutor pode ser se assustar ou ficar alarmado. Como podemos perceber, as observações iniciais de Searle (1969), pouco se diferenciam das de Austin (1962). O que Searle fez, inicialmente, foi reformular o termo ato locucionário, passando a chamá-lo de ato de enunciação, acrescentar o conceito de ato proposicional e manter os conceitos de ato ilocucionário e perlocucionário. A diferença está na ideia da simultaneidade dos atos. Searle (1981 [1969)] defende que são todos esses atos que compõem um ato de fala completo, ou seja, passa a valorizar as dimensões (locucionária e perlocucionária) que foram, de certa forma, negligencias por Austin (1962). É ao buscar critérios para classificar os diferentes tipos de atos de fala que a teoria de Searle (1981 [1969]) passa a apresentar novas contribuições para a Teoria dos Atos de Fala, como veremos na próxima seção. 2.1.8 Em busca de critérios de classificação: regras normativas7 e regras constitutivas A hipótese defendida em Searle (1981 [1969], p. 52) é a de que ―falar uma língua é executar atos de acordo com regras‖. O conceito de ato corresponde ao de ato ilocucionário visto na seção anterior. Quanto ao conceito de regra, o autor faz distinção entre dois tipos: regras normativas e regras constitutivas. 7 Alguns autores traduzem o termo rules regulatives, como regras reguladoras, mas na tradução de 1981, o termo é traduzido como regras normativas. 21 As regras normativas são aquelas que controlam comportamentos já existentes, as que atuam de modo independente, por exemplo, as regras de cortesia. Essas regras podem ser parafraseadas como ―faça X‖ (ou se Y, faça X), no caso das regras de etiqueta: segure a faca com a mão direita para cortar os alimentos. As regras constitutivas são aquelas que criam ou definem um comportamento, as que atuam de modo dependente, por exemplo, as regras do futebol. Essas podem ser parafraseadas como ―fazer X conta como Y (no contexto C)‖, no caso do futebol, ao chutar ou cabecear a bola entre as traves do gol conta como gol. As regras de interesse para o estudo proposto por Searle (1981 [1969]) – e também para a presente pesquisa – são as regras constitutivas, pois são elas que governam certos atos de fala, por exemplo, o prometer e afirmar e, consequentemente, criam essas formas de comportamento. Nos capítulos seguintes de Os atos de fala – um ensaio de Filosofia da Linguagem, Searle (1981 [1969]) se dedica a formular um conjunto de regras constitutivas de certos tipos de atos de fala, iniciando com o ato de prometer. Antes de formular as regras, Searle (1981 [1969]) postula as condições de felicidade, denominadas por ele de condições necessárias e suficientes – conjunto de condições que possibilitam um ato ser bem-sucedido. Essas condições explicam as noções que um ato implica e também são uma maneira de preparar o caminho para a formulação das regras. Searle (1981 [1969], p. 75) adverte que as promessas consideradas, em sua análise, são exemplos idealizados, seu trabalho se restringe às promessas categóricas, deixando de lado as hipotéticas, isso porque ele acredita que a análise das promessas simples pode servir de modelo para as mais complexas. O autor formula nove condições que apresentamos abaixo de forma resumida: Condição 1: o falante e o ouvinte dominam a mesma língua e não têm problemas para se comunicar, tais como surdez ou afasia, nem estão atuando ou contando piadas; Condição 2: a promessa tem que ter um conteúdo proposicional; Condição 3: o conteúdo da promessa tem que estar relacionado com uma ação possível e futura do falante; Condição 4: o que está sendo prometido tem que representar vantagem para quem recebe a promessa8; 8 A distinção básica entre promessa e ameaça, segundo Searle (1981 [1969]), é que a promessa é algo feito para alguém, enquanto ameaça é algo feito a alguém. 22 Condição 5: o conteúdo da promessa não pode ser algo que acontecerá de qualquer forma; Condição 6: o falante tem a intenção de cumprir o ato; Condição 7: o falante pretende se colocar sob a obrigação de levar a cabo o ato prometido, isso é mais do que ter a intenção de cumprir o ato, é o reconhecimento de ter assumido uma obrigação; Condição 8: o falante tem a intenção de que o ouvinte reconheça sua intenção; Condição 9: a linguagem usada para fazer a promessa obedece as regras semânticas da língua.9 Essas condições são classificadas como: condições preparatórias (como 4 e 5); condições de sinceridade (como 6) e condições essenciais (como 7). Elas são usadas como base de comparação entre os atos de fala. São as diferenças entre as condições que determinam se o ato é uma advertência ou um pedido, por exemplo. Assim, Searle vai delineando os critérios que alegava faltar na teoria de Austin (1962) para estabelecer as diferenças entre os atos. A partir das condições, Searle formula cinco regras que governam o ato de prometer, destacadas abaixo: Regra 1: uma promessa deve ser proferida, quando seu conteúdo for uma ação que se realizará no futuro. Essa regra é derivada das condições 2 e 3 e é chamada de regra de conteúdo; Regra 2: uma promessa deve ser proferida se seu conteúdo for de interesse do ouvinte. Regra 3: uma promessa deve ser proferia se seu conteúdo não diz respeito a ocorrência de algo óbvio. As regras 2 e 3 são derivadas das condições preparatórias 4 e 5 e são chamadas de regras preparatórias. Regra 4: uma promessa deve ser proferida se o falante pretende cumprir a ação. Essa regra deriva da condição 6 e é chamada de regra de sinceridade. Regra 5: uma promessa deve ser proferida se o falante pretende assumir a obrigação de realizar a ação. A análise da promessa é apenas um modelo analítico do qual são extraídas as condições que governam os demais atos ilocucionários. Como nosso objetivo é apresentar um panorama geral dos conceitos-chave da Teoria dos Atos de Fala não 9 Searle (1981 [1969]), p. 77 – 82. 23 adentraremos nas condições de todos os atos, apenas apresentaremos, na seção abaixo, a tipologia que emerge de uma classificação baseada nas regras constitutivas. 2.1.9 Uma nova tipologia dos atos de fala: os critérios de Searle Embora Austin (1990 [1962]) não tenha estabelecido claramente critérios formais para a distinção dos atos ilocucionários, sua divisão estava associada aos verbos performativos. Assim, ao utilizar o verbo prometer, o falante estaria realizando uma promessa. As diferenças entre os verbos performativos são, segundo Searle (1995 [1979]), uma boa maneira de distinguir os atos, mas não funcionam como critérios confiáveis. Para uma taxonomia segura, o autor faz uma revisão das condições mencionadas acima, apresentando-as como dimensões a serem observadas na elaboração dos critérios, dessas, destacamos as três centrais. A primeira dimensão a ser observada se refere ao propósito do ato, uma promessa se difere de uma ordem, por exemplo, pois têm propósitos diferentes, a primeira tem como propósito fazer com que o falante assuma uma obrigação e a segunda, levar o ouvinte a fazer algo. A segunda dimensão diz respeito à direção do ajuste, isto é, a relação entre palavra e mundo, alguns atos são adequação do mundo às palavras, enquanto outros atos são adequação das palavras ao mundo, ou seja, de que forma enunciados podem realizar no mundo ações e como estas podem ser realizadas via enunciados. A terceira dimensão a ser observada para a diferenciação dos atos é o estado psicológico que expressam, cada ato apresenta um diferente estado em relação ao seu conteúdo proposicional: crença, desejo, intenção. Para estabelecer as distinções deve ser observado também que um mesmo conteúdo proposicional pode ser expresso por diferentes forças ilocucionárias, estas são dependentes da relação entre falantes e ouvintes. Por exemplo, se alguém desejar que a porta seja fechada, pode fazer um pedido ou dar uma ordem, porém para ordenar é necessário que o falante exerça poder sobre o ouvinte. 24 Após apresentar os critérios considerados confiáveis para a distinção entre atos de fala, Searle (1995 [1979]) passa a criticar a tipologia proposta por Austin (1962). A crítica está centrada na falta de princípios de classificação10. Na classificação proposta por Austin (1962), há uma associação entre verbo e ato, por exemplo, o ato de prometer está associado ao verbo prometer, porém, como Searle (1995 [1979]) observa nem todos os verbos catalogados por Austin são perfomativos, ou seja, nem sempre a enunciação de um verbo realiza a ação por ele expressa. Outra crítica é o fato de as categorias se sobreporem, um mesmo verbo aparece em categorias distintas, isso acontece, pois muitos verbos não satisfazem a definição dada à categoria a que pertencem, ou mesmo, por não existir uma definição precisa das categorias. Diante da inconsistência dos critérios de classificação de Austin (1962), uma nova tipologia é proposta. Tipologia Assertivos Propósito Direção do Estado ajuste psicológico Comprometer o Palavra-mundo falante a com verdade Crença Exemplo Concluir, deduzir, etc da proposição expressa Diretivos Levar o ouvinte a Mundo-palavra Vontade Pedir, fazer algo (desejo) convidar, mandar, etc Comissivos Comprometer o Mundo-palavra Intenção Prometer, etc Diferentes Agradecer, estados desculpar-se, psicológicos etc Não há Demitir, falante com uma ação futura Expressivos Expressar um Não há estado psicológico Declarações Realizar a ação Palavra-mundo que expressam 10 Mundo-palavra batizar, Dos critérios usados por Searle (1995 [1979]), focalizaremos apenas a direção do ajuste, por ser este o critério que aproxima diretivos e comissivos. 25 excomungar, etc (Quadro I – Tipologia dos Atos de Fala, Searle (1995 [1979]), p. 19 – 31) Ao propor os comissivos, Searle (1995 [1979]) ressalta que a direção do ajuste destes é a mesma dos diretivos – mundo-palavra –, o que, segundo ele, seria mais elegante agregá-los a uma mesma categoria. Segundo o autor, esses atos diferem devido ao propósito, uma promessa (comissiva), por exemplo, pretende comprometer o falante a fazer algo, enquanto, um pedido (diretivo) pretende levar o ouvinte a fazer algo. Para formular uma única categoria era necessário provar ou que a promessa é uma espécie de pedido ou que este impõe ao ouvinte uma obrigação, como não consegue uma análise com base em nenhum desses critérios, Searle (1995 [1979]) opta por manter duas categorias distintas. Embora, não tenha provado que pertençam a uma mesma categoria, é incontestável, não só pela direção do ajuste, mas, principalmente, pelo fato desses atos atribuírem obrigação, que diretivos e comissivos compartilham um traço. Diretivos são obrigações impostas ao outro, enquanto comissivos são obrigações assumidas para si. Este trabalho, então, também busca a existência de uma relação entre diretivos e comissivos. Embora a Teoria dos Atos de Fala tenha representado um avanço nos estudos linguísticos, ela é fortemente criticada, como veremos abaixo (seção 2.2). Desta forma, para que possamos buscar uma relação existente entre atos diretivos e comissivos, precisaremos primeiro repensar essa teoria a partir de uma perspectiva interacional. Uma última contribuição que convém destacar, na teoria proposta por Searle, (1995 [1979]) é a noção de ato de fala indireto. Por definição, um ato de fala indireto é um enunciado no qual um ato ilocucionário é performado por meio de um outro ato. Por exemplo, ao dizer ―Você pode alcançar o sal?‖11, o falante não está fazendo uma pergunta sobre a capacidade física (poder) do ouvinte, mas sim um pedido para que este passe o sal. Cabe destacar que, nosso objetivo não foi esgotar a Teoria dos Atos de Fala, mas sim apresentar, de forma breve, seus pontos centrais. 11 Exemplo de Searle (1995 [1979], p. 48) 26 2.2 Por uma abordagem pragmática da teoria dos atos de fala 2.2.1 Das críticas à aplicação da Teoria dos Atos de Fala em estudos pragmáticos A principal crítica a Teoria dos Atos de Fala está centrada no fato de que esta trabalha com sentenças construídas e situações hipotéticas. Dessa forma, a teoria não conseguiria captar a complexidade das interações humanas. Outra crítica diz respeito às questões contextuais. Ao postular os atos de fala indiretos, a Teoria dos Atos de Fala já reconhecia a contribuição de informações contextuais para a identificação de atos que se realizavam indiretamente, porém não discutia como o contexto contribuía para essas diversas interpretações. A proposta de analisar os atos de fala como pertencentes a um contexto é formulada principalmente por van Dijk (1977 apud PEREIRA & GRAY, 1999), este considerava impossível analisar os atos de forma isolada, visto que atos individuais se organizam em sequências mais amplas ou em macro-atos, sendo estas uma exigência analítica para a identificação de atos individuais. Os atos de fala individuais estão organizados em macro-atos, apenas se estes forem considerados é possível identificar aqueles. Para a identificação do ato individual é necessário, então, relacioná-lo com a intenção do falante, seus objetivos e planos, na realização do ato. Nas palavras de van Dijk (1992 apud PEREIRA & GRAY, 1999), para compreender uma sequência de atos de fala, é preciso interpretar as associações entre atos de fala subsequentes. A proposta de van Dijk (1992 apud PEREIRA & GRAY, 1999, p. 174) para a análise de atos em sequência é distinguir atos subordinados de superordenados. O exemplo usado pelas autoras, para ilustrar esses tipos, é o seguinte: se alguém diz que está com frio e, em seguida, pede para que se desligue o ar condicionado; o ato subordinado, ―estou com frio‖, auxilia o mais importante, que é o ato superordenado, ―desligue o ar‖. Esse exemplo demonstra que as sequências de atos devem ser analisadas tendo em vista os macro-atos. Segundo van Dijk (1981 apud PEREIRA & GRAY, 1999), existem regras que regulam as sequências de atos adequadas ou não num dado momento. Essas regras funcionam, então, como organizadoras das ações, indicando a função de um ato em relação a outros atos. Com base nessas regras, o ouvinte é capaz de interpretar os atos de fala e, de fazer associações entre atos isolados e o macro-ato. Assim, é a compreensão 27 do macro-ato que permite aos interactantes interpretar as diferentes ações realizadas durante a interação. Como destacam Pereira e Gray (1999), a visão de van Dijk, porém, ainda é uma visão textual e não interacional de análise. Segunda as autoras, uma visão interacional é reivindicada por Sbisá e Fabbri (1980 apud PEREIRA & GRAY, 1999) ao propor dois modelos de análise. O primeiro examina os atos e as ações do ponto de vista do falante, e o segundo, as negociações de sentido construídas pelos participantes durante a interação. O presente trabalho se filia a este segundo modelo. Outra observação importante feita por Sbisá e Fabbri (op. cit.) tenta exatamente preencher uma lacuna deixada pela Teoria clássica dos Atos de Fala, que é explicar como o ouvinte consegue compreender o ato realizado pelo falante, visto que nem todos os atos têm suas forças ilocucionárias explícitas e muitos, ainda, podem ser realizados de forma indireta. Segundo os autores, uma resposta possível está relacionada às propriedades sintático-semânticas das sentenças, que expressam não só o conteúdo proposicional, mas também a intenção do falante. Caso essa força seja ambígua, é o contexto que auxilia na identificação do objetivo ilocucionário. Por meio da formulação de hipóteses que são confirmadas ou desconfirmadas sequencialmente no curso da interação, o ouvinte seria capaz de compreender o ato ilocucionário. Como destacam Sbisá e Fabbri (op. cit.), nem sempre o contexto é suficiente para se captar a intenção comunicativa do falante, isso porque um único enunciado pode executar mais de um ato ilocucionário e nem sempre é possível delimitar a extensão de um ato de fala, ou seja, seu início e seu fim. O que demonstra a complexidade, mas não impossibilidade, de se aplicar a Teoria dos Atos de Fala a partir de uma perspectiva interacional. A análise de Schiffrin (1994) ilustra a complexidade desse tipo de aplicação. Como a própria Schiffrin (1994) reconhece a Teoria dos Atos de Fala não foi elaborada para ser uma teoria de análise do discurso, embora possa ser usada para tal, como ela mesma demonstra ao analisar as diferentes ações que um mesmo enunciado pode executar. Utilizando dados gravados em uma visita feita à casa do casal que participaria da entrevista sociolinguística para Schiffrin (1987 apud SCHIFFRIN 1994), a autora demonstra que o enunciado – ―Você quer uma bala?‖12 – proferido por um dos 12 Exemplo de Schiffrin (1994, p. 62) Henry: (a) Y‘want a piece of candy? 28 participantes, Henry, pode ser identificado como uma pergunta, um pedido e uma oferta. Segundo a autora, uma análise do discurso que considere a aplicação da Teoria dos Atos de Fala, deve se preocupar em: (i) identificar um enunciado como um ato de fala particular, e (ii) entender como um ato de fala inicial cria um ambiente apropriado para o próximo ato. Tradicionalmente, um ato de fala é identificado ao satisfazer determinadas regras e condições. Assim, o enunciado, ―Você quer uma bala?‖, pode ser: (1) Uma pergunta, porque satisfaz as condições deste ato: o falante não tem conhecimento sobre um dado estado de coisas, mas gostaria de ter, e era evidente que ele não conseguiria sem perguntar para o ouvinte. (2) Um pedido de informação, porque satisfaz as condições deste ato: o falante acredita que o ouvinte é capaz de executar e quer que este execute a ação.13 (3) Uma oferta, porque satisfaz as condições deste ato: o falante não tem conhecimento se o ouvinte quer o que é ofertado. Após demonstrar que o enunciado, ―Você quer uma bala?‖, pode executar os três atos destacados acima, Schiffrin (1994) elege a oferta14 como a ação, de fato, executada pelo ato, por ser esta a real intenção comunicativa do falante. Segundo a autora, só é possível entender o enunciado em questão como uma oferta, se tal enunciado for entendido antes tanto como uma pergunta, quanto como um pedido. A relação entre esses três atos ilustra os aspectos importantes da teoria dos atos de fala que podem ser aplicados ao discurso: os princípios classificatórios dos atos de fala e a visão de que enunciados são multifuncionais. A visão da multifuncionalidade ajuda a revelar de que forma um enunciado disponibiliza opções de resposta e, portanto, a possibilidade de sequências subjacentes. Como Schiffrin (1994) destaca, a análise de um único ato como pergunta, pedido ou oferta conduz, naturalmente, a análise do(s) enunciado(s) seguinte(s). Então, para aplicar a Teoria dos Atos de Fala ao discurso é preciso não só identificar o ato de fala, mas também combinar esses atos em sequências. Irene: (b) No. z Zelda: (c) She‘s on a diet.z Debby: (d) Who‘s noto n [a diet. Irene: (e) [I‘m onI‘m on a diet 13 Schiffrin (1994) diferencia perguntas de pedidos. Segundo a autora, para a tradicional teoria dos atos de fala, as perguntas são, normalmente, executadas por meio de uma interrogativa, enquanto os pedidos por meio do imperativo. 14 Em uma oferta o ouvinte tem a possibilidade de escolha, pode aceitar ou refutar aquilo que é oferecido. 29 Voltando ao enunciado analisado por Schiffrin (1994), ―Você quer uma bala?‖, no turno seguinte, a ouvinte, Irene, para a qual o enunciado se dirigia, responde: ―Não‖. O enunciado proferido por Irene pode ser entendido como uma resposta à pergunta, assim como uma informação atendendo ao pedido e também como uma refutação à oferta. Como destaca a autora, é mais fácil argumentar que o enunciado de Irene é uma resposta, pois no caso do par pergunta-resposta, não é necessário nenhuma informação adicional que justifique o não dado por Irene. Mas já no caso de ser uma informação, o não de Irene parece fornecer uma informação incompleta. E, no caso de ser uma recusa, esta, normalmente, é acompanhada de uma justificativa. Dando continuidade a análise dos turnos seguintes, Schiffrin (1994) demonstra que o enunciado, ―Ela está de dieta‖, produzido por outra participante, Zelda, também pode ser considerado resposta ao enunciado de Henry e também como um esclarecimento tanto para o pedido de informação quanto para a refutação de Irene. Os dados analisados pela autora demonstram, então, que um ato pode executar diferentes ações, por exemplo, ―Você quer uma bala?‖ é uma pergunta, um pedido e uma oferta. Em contrapartida, uma mesma ação pode ser executada por atos diferentes, por exemplo, o ―Não‖, de Irene, e o ―Ela está de dieta‖, de Zelda, funcionam como resposta à pergunta, ao pedido e à oferta. Em suma, ao analisar atos de fala na interação, Schiffrin (1994) demonstra que a identificação de um ato frequentemente depende da realização de outro ato. Cabe ressaltar que, nosso objetivo aqui não é explorar toda a pesquisa da autora, mas sim ilustrar que a Teoria dos Atos de Fala pode ser usada de forma situada. Também Cooren (2005) defende que a Teoria dos Atos de Fala pode contribuir para a análise da conversa. A autora inicia seu artigo recuperando a crítica feita por Schegloff (1988) a respeito da análise de pré-sequências. Segundo Schegloff (1988 apud COOREN, 2005, p. 21), a Teoria dos Atos de Fala não explica os mecanismos inferenciais por meio dos quais os interlocutores entendem pré-sequências. De fato, como observa Cooren (2005), a Teoria clássica dos Atos de Fala não analisa pré-sequências, mas isso não significa que ela não seja capaz de explicar fenômenos conversacionais. O que a autora defende é que a teoria, ao contrário do que se pensa, pode antecipar a identificação de pré-sequências para os estudos da análise da conversa. 30 2.3 Diretivos e Comissivos: novas contribuições Nesta seção, buscamos destacar trabalhos recentes, por nós encontrados, que, de certa forma, revisitam a Teoria dos Atos de Fala. Primeiramente, abordaremos o trabalho de Casanova (1996), apesar de trabalhar os atos de fala de uma forma formalista, a autora apresenta contribuições muito esclarecedoras que influenciaram a presente análise no que diz respeito aos diretivos. Em seguida, destacaremos o trabalho de Garcia (1997), embora a autora não utilize a Teoria dos Atos de Fala explicitamente, os apontamentos feitos por ela contribuem para uma análise, em contexto de conflito, dos atos comissivos. Por fim, ressaltaremos o trabalho de Salgueiro (2010) cujo objetivo é apresentar uma relação entre os atos diretivos e comissivos. Assim, o autor se dedica ao estudo das ameaças, ato este que é também o foco do presente trabalho. 2.3.1 Diretivos: ordens, pedidos e sugestões Para analisar a relação existente entre atos diretivos e comissivos, consideramos importante conhecê-los e analisá-los separadamente. Em uma breve pesquisa feita na literatura sobre diretivos, destacamos o trabalho de Casanova (1996). Embora, esse trabalho seja uma classificação formalista dos atos diretivos, baseada em exemplos retirados, em sua maioria, de textos literários, ele nos forneceu pistas importantes para uma análise interacional dos diretivos. Primeiramente, há de se distinguir duas classes de diretivos, os de resposta física e os de resposta verbal. No primeiro caso, espera-se que o ouvinte realize uma ação física, como em: ―Tire o livro de cima da mesa‖. Enquanto no segundo, o esperado é obter uma resposta verbal, ―Que justificação é que ela te deu?‖15 Os diretivos, sejam eles de resposta física ou verbal, são expressões do querer do falante sobre o ouvinte, essa vontade pode ser expressa por meio de uma ordem ou de um desejo. O objetivo ilocucionário dos diretivos é levar o ouvinte a realizar a ação expressa pelo ato. A distinção entre ordem e desejo depende, como aponta Casanova (1996), de um traço específico, o da coercividade. Se uma ordem não for cumprida haverá, para aquele que não a cumpriu, uma punição, enquanto nada acontecerá a quem não realizar um 15 Exemplos de Gouveia (1996, p. 395) 31 desejo. Assim, o que legitima que um enunciado tenha força ilocucionária de ordem são as relações de poder subjacentes, pois o falante só poderá punir o ouvinte sobre o não cumprimento de algo, se houver diferenças nas relações de poder. Do contrário, só é possível a manifestação do desejo. De acordo com Casanova (1996), um desejo pode até ser reforçado, mas ele não terá força ilocucionária de ordem, da mesma forma que uma ordem pode ser atenuada, porém, continuará sendo uma ordem. A autora destaca ainda, que a ordem expressa em um enunciado, só terá força de ordem se estiver dentro dos limites de poder daquele que a proferiu. No caso do PROCON, por exemplo, o mediador não poderá determinar de que forma o reclamado deverá ressarcir o consumidor, mas, caso as partes não cheguem a um acordo, ele poderá encaminhá-las para uma instância superior. O poder, porém, pode ser conferido não apenas por reconhecimento social ou institucional, mas também pode emergir de determinadas circunstâncias contextuais, por exemplo, um bandido em posse de uma arma, ordena a entrega do dinheiro. A ordem que emerge de relações contextuais é classificada por Casanova (op. cit.) como ordem subjetiva. O desejo pode ser expresso em forma de pedido ou de sugestão. A distinção entre essas formas de expressão está na direção de interesses. O primeiro tem como objetivo beneficiar o falante; enquanto o segundo, o ouvinte. A sugestão, por sua vez, pode se manifestar na forma de conselho, aviso ou instrução. A sugestão pode ser ou não do interesse do falante, ou seja, este pode se empenhar ou não para que a sugestão seja cumprida. Quando há empenho, o diretivo caracteriza-se como conselho e quando não há, como instrução. Outro aspecto apontado por Casanova (op. cit.) para diferenciar conselhos de instruções é o fato destas não serem personalizadas, ou seja, não são dirigidas a um ouvinte em especial, enquanto aqueles o são. Quando a sugestão reveste-se de um caráter preventivo é classificada como aviso, este pode ser ou não personalizado. O quadro abaixo, extraído de Casanova (1996, p. 435), ilustra as subclasses dos atos diretivos: ORDEM QUERER DESEJO Objectiva (i.e. ordem social ou reconhecida) Subjectiva Pedido ( LOC) Sugestão ( ALOC) personalizada institucionalmente conselho 32 despersonalizada Quadro 2 – subclasses de diretivos (CASANOVA, 1996, p. 435)16 aviso aviso instrução 2.3.2 Comissivos: promessas e propostas As promessas foram amplamente estudadas por Austin (1962) e, principalmente, por Searle (1981 [1969]), sendo inclusive a ato modelar do qual foram extraídas as condições e regras dos demais atos de fala, como já apresentamos na seção 2.1.8. Em contrapartida, não encontramos nenhum estudo recente, de viés interacionista, que abordasse as promesas, apenas relevantes informações sobre propostas em contexto de conflito observadas por Garcia (1997). O trabalho de Garcia (op. cit.) discute o papel dos mediadores e das partes no processo de geração de ideias para a resolução do conflito. Cabe ressaltar que, o contexto analisado pela autora, embora seja de conflito, difere do analisado na presente pesquisa. De acordo com Garcia (op. cit.), as pesquisas que estudam a mediação em audiências de conciliação têm demonstrado que criar soluções potenciais é uma parte importante do processo. A autora aponta duas maneiras, identificadas nas negociações, de gerar soluções: resolução de problemas e estratégias de “disputa”17. A resolução de problemas é uma série de estratégias de negociação que inclui tempestade de ideias na busca de soluções. Nas negociações em que essa estratégia é utilizada a solução tende a ser benéfica para ambas as partes, isso porque várias ideias são apresentadas antes de se tomar uma decisão. Entretanto, essa estratégia só parece levar a uma solução benéfica para ambas as partes se nenhuma delas estiver comprometida com uma solução particular. Quando isso acontece, tem-se a estratégia de “disputa”. As sequências de negociação podem ser iniciadas por dois tipos de enunciado, de acordo com Maynard (1984 apud GARCIA, 1997): sugestões e relatos de posição. A sugestão é um enunciado que propõe uma solução neutra, que pode ser aceita ou 16 Legenda do quadro 2: Loc = locutário Aloc= alocutário 17 Tradução nossa dos termos ―problem-solving‖ e ―‗contentious‘ strategies‖ (GARCIA, 1997 p. 221) 33 rejeitada pelas partes. Já os relatos de posição também sugerem uma solução, mas são formulados de modo a indicar uma ideia pessoal, preferência ou desejo, ou seja, aquele que o faz já expressa o que deseja para a resolução do conflito. Nos dados de Garcia (op. cit.), os mediadores formulam as soluções potenciais como sugestões, enquanto as partes formulam como relatos de posição. Assim, os relatos de posição das partes são entendidos como ofertas. Embora a autora não diferencie relatos proferidos pelas partes, para o contexto analisado na presente pesquisa – que aqui antecipamos –, achamos necessário fazer essa diferenciação: o relato produzido pela parte reclamante, não nos parece oferta, mas sim um pedido; enquanto, o produzido pela parte reclamada, sim, por se tratar do que esta pode propor para a resolução do conflito, por ser formulada em contexto de conflito, preferimos classificar esse tipo de oferta como proposta. Como ressalta Garcia (1997), em seus dados, as sugestões dos mediadores são normalmente construídas em forma de pergunta, podendo as partes aceitar ou recusar. Todavia, alguns mediadores podem trabalhar de forma a persuadir uma das partes a aceitar a proposta. Para que se chegue a um acordo, é necessário que as duas partes aceitem a sugestão feita pelo mediador. Dessa forma, a solução proposta pelo mediador nem sempre implica aceitação das partes, essa sugestão normalmente é entendida como estratégia de resolução do problema, mas quando o mediador toma uma posição em relação a uma proposta, esta pode ser considerada um relato de posição, o que é considerado problemático para a audiência, pois nos dados analisados por Garcia (1997), o mediador deve assumir um posicionamento neutro. É necessário, mais uma vez, anteciparmos o contexto de pesquisa com o qual trabalhamos, o PROCON, que será apresentado detalhadamente na seção 3.2, apenas para ressaltar que, nos dados gerados nesse contexto, a postura do mediador não é neutra, ele se alinha ao consumidor, tentando levar o reclamado a formular um acordo que beneficie o reclamante. Como já mencionamos, quando uma ideia é apresentada por uma das partes, esta é formulada como um relato de posição. Esses relatos são afirmações do que a parte aceitaria ou gostaria que fosse feito para se resolver o conflito. Antes de pedir que seja feita uma proposta, o mediador solicita ao pleiteante que relate sua posição. É possível que uma das partes apresente, antes do relato, uma proposta, quando isso acontece, o mediador apenas tenta convencer a outra parte a aceitá-la. 34 A consequência de se apresentar, primeiro, uma proposta é a dificuldade de voltar a disputar um acordo melhor. Isso porque, segundo Garcia (1997), as sugestões apresentadas pelas partes são normalmente entendidas como ofertas. Dessa forma, as partes não têm tanta liberdade no processo de geração de ideias. Apresentado o relato de posição de uma das partes, a outra pode aceitar ou refutar. No primeiro caso, as partes entram em acordo; no segundo, inicia-se um processo de negociação, mas se cada lado tenta sustentar sua posição, a audiência termina sem resolução. Em suma, tanto mediadores quanto as partes podem gerar ideias para a resolução do conflito, mas de formas diferentes. Mediadores usam estratégias de resolução de problemas para gerar ideias, pois podem sugerir soluções sem se comprometerem, sem riscos. Ao contrário, as partes não têm liberdade para participar criativamente do processo de geração de ideias, porque os relatos produzidos são entendidos como ofertas, sendo difícil mudar de posição após apresentá-la. Ao tomar uma posição, então, o disputante tem sua participação no processo de geração de soluções limitada. 2.3.3 Relação entre diretivos e comissivos: ameaças Como Searle (1995 [1979]) destaca, diretivos e comissivos compartilham traços, ambos estão relacionados à obrigação. No primeiro ato, o falante impõe obrigação ao ouvinte, enquanto no segundo, o falante assume uma obrigação. Essa relação é tão evidente que o autor chega a sugerir classificá-los em uma mesma categoria, porém, como essa questão não é aprofundada, as categorias distintas são mantidas. Em busca de uma relação entre atos diretivos e comissivos, encontramos o trabalho de Salgueiro (2010), que assumiu grande relevância na presente pesquisa. Neste trabalho, o autor destaca as ameaças como a interface diretivo-comissiva. Tradicionalmente, as ameaças aparecem, tanto na tipologia de Austin (1962) quanto na tipologia de Searle (1975), na categoria dos comissivos, junto com as promessas, uma vez que esses dois atos compartilham o mesmo propósito: o falante se compromete em realizar uma ação futura. Como Salgueiro (2010) destaca, dos estudos que se dedicaram à análise das promessas, poucos deram atenção à relação existente entre promessas e as ameaças. Em sua análise, o autor demonstra que promessas e ameaças estão intrinsecamente relacionadas a ponto de constituírem um par inseparável. A falta de atenção na relação 35 existente entre promessas e ameaças se deve ao fato de os estudos tradicionais considerarem apenas as promessas básicas, do tipo: (1) (Eu prometo que) ano que vem comprarei um carro para você18. Nesse tipo de promessa, o falante oferece realizar uma ação ao ouvinte como recompensa por uma ação que este realizou, ou como gesto de pura generosidade. Salgueiro (2010) representa a promessa elementar pela fórmula: EP: Pr (S d a) Em que EP é a promessa elementar; Pr corresponde a fórmula ―eu prometo‖, S é o falante (aquele que promete), d equivale a fazer e a, ação prometida. No caso das ameaças, o falante pode ameaçar sem que o ouvinte tenha realizado qualquer ação para merecer a ameaça, apenas como demonstração de poder. Em casos de vingança, a ameaça se constitui uma forma de fazer aquele que a recebe sofrer por antecipação. A ameaça pode ser representada pela seguinte fórmula: ET (ameaça elementar): Th (S d a) Sendo ET, a ameaça elementar, que inclui expressões do tipo: ―Você vai me pagar‖, ―Eu vou te matar‖ ou: (2) Eu vou comer o seu fígado19. Como Salgueiro (op. cit.) ressalta, ao descrever promessas e ameaças como comissivos, Searle (1975) estava considerando as promessas e ameaças elementares em que o falante se compromete com a realização de uma ação futura. A diferença é que, na promessa, a ação futura é benéfica (ou acredita-se que seja) para aquele que a recebe, enquanto na ameaça, é prejudicial (ou acredita-se que seja). Das ameaças estudadas, Salgueiro (op. cit.) destaca que as que recebem maior atenção são as de natureza condicional, tal como: ―Se você não me der o dinheiro, eu 18 19 Exemplo de Salgueiro (2010, p. 216) – I promise that next year I’ll buy you a car. Exemplo de Salgueiro (2010, p. 216) – I’ll have your guts for garters! 36 atiro‖20. Também são comuns as promessas de natureza condicional ―Se você fizer o dever de casa, trarei figurinhas‖21. Porém, segundo o autor, os estudos sobre esses tipos de promessas e ameaças, ao classificá-las como comissivos, desconsideram que o objetivo, na verdade, é diretivo – convencer o ouvinte a fazer algo. Dessa forma, o autor ressalta a necessidade de distinguir as promessas e as ameaças condicionais daquelas que ele chama de diretivo-comissivas. As promessas ou ameaças condicionais são aquelas que a ação futura está sujeita a satisfação da condição expressa, porém, o objetivo ilocucionário não é levar o ouvinte a cumprir a condição, pois seu cumprimento está fora do poder deste. Os exemplos mencionados por Salgueiro (2010, p. 217) são: (3) Se eu ganhar na loteria, (eu prometo que) eu comprarei um carro para você. (4) Se eles me fizerem chefe do departamento, farei sua vida impossível.22 As fórmulas usadas para representar esses tipos de promessas e ameaças são respectivamente: CCP (promessa condicional comissiva): P → Pr (S d a) CCT (ameaça condicional comissiva): P → Th (S d a) Já nas promessas e nas ameaças diretivo-comissivas, o objetivo ilocucionário é diretivo, o compromisso do falante com a realização da ação futura não está sujeito apenas ao cumprimento da condição, mas ao cumprimento desta pelo ouvinte. Os exemplos mencionados por Salgueiro (2010, p. 218) são: (5) Se você parar de fumar (eu prometo que) eu comprarei um carro para você. (6) Se você não parar de ver Juliet, eu te mato.23 Esse tipo de promessa e de ameaça é formalmente representado por Salgueiro (2010), como: 20 Exemplo de Salgueiro (2010, p. 217) – If you dont´t give money, I’ll shoot you. Exemplo de Salgueiro (2010, p. 217) – If you do your homework I’ll take you to the pictures. 22 Exemplos (3) e (4) de Salgueiro (2010, p 217) – ―If I win the lotery (I promise that) I’ll buy you a car‖ e ―If they make me head of the department, I’ll make life impossible for you.‖ 23 Exemplos (5) e (6) de Salgueiro (2010, p. 218) – ―If you give up smoking (I promise you) I’ll buy you a car.” e “If you don’t stop seeing Juliet I’ll kill you.” 21 37 DCCP (promessa condicional diretivo-comissiva): Re (R d a1) ^ ((R d a1) → Pr (S d a2)) DCCT (ameaça condicional diretivo-comissiva): De (R a a1) ^ (¬ (R d a1) → Th (S d a2)). Sendo que Re corresponde a ―eu peço‖ e De, ―eu exijo‖. Salgueiro (op. cit.) propõe analisar promessas e ameaças diretivo-comissivas separadamente das elementares, mas incluindo, pelo menos em parte, as condicionais. Walton (2000 apud SALGUEIRO, 2010, p. 218), utilizando a terminologia da Teoria dos Atos de Fala, apresenta o que seriam as condições das ameaças diretivocomissivas. Condições preparatórias: o ouvinte tem razões para acreditar que o falante pode cumprir o evento em questão, é presumido pelo falante e pelo ouvinte que sem a intervenção do falante, o evento não ocorrerá; Condição de sinceridade: tanto o falante quanto o ouvinte presumem que a ocorrência do evento não é de interesse do ouvinte, este irá evitar sua ocorrência, se possível, e tomará as medidas cabíveis, se necessário. Condição essencial: o falante está realizando um compromisso de fazer o ouvinte ver que o evento ocorrerá a não ser que o ouvinte realize a ação nomeada pelo falante. É notável que existe uma relação entre promessas e ameaças, mas também existem diferenças, das quais Salgueiro (op. cit.) aponta as duas principais. A primeira diferença está relacionada à parte antecedente ao ato comissivo, ou seja, com a construção condicional. Nas promessas diretivo-comissivas, o antecedente coincide com o conteúdo da parte diretiva, já nas ameaças desse tipo, a parte antecedente é a negação da parte diretiva. Por exemplo, em uma promessa diretivocomissiva, do tipo: ―se você se comportar, trarei um presente‖, a parte que antecede o ato comissivo, poderia ser expressa pelo diretivo ―se comporte‖; já em uma ameaça diretivo-comissiva, do tipo: ―se você não parar de chorar, vou colocá-lo de castigo‖, a expressão da parte diretiva nega aquilo que se deseja, no caso, ―pare de chorar‖. Como destaca Salgueiro (op. cit.), as promessas e as ameaças diretivocomissivas anunciam para os ouvintes as consequências de atender a parte diretiva. No caso das promessas, as consequências são prêmios, já no caso das ameaças são 38 punições. Em ambos os casos, considera-se que apenas a expressão do desejo não seria suficiente para que a parte diretiva fosse satisfeita. Então, para atingir o objetivo, o falante precisa mostrar as vantagens, no caso da promessa, e as desvantagens, no caso da ameaça. Há, nesse ponto, uma interface com os postulados de Casanova (1996) em relação às ordens subjetivas. Segunda a autora, ordens subjetivas são aquelas cujo poder emerge do contexto, por exemplo, um assaltante não tem nenhum poder legitimado socialmente, mas em um assalto, ele adquire poder, tanto que falas como, ―passe a bolsa‖ ou ―me dá o dinheiro‖ são entendidas como ordem. Dessa forma, as ameaças diretivo-comissivas podem funcionar como estratégias para adquirir poder na interação. Não estamos querendo dizer com isso, que ameaças do tipo diretivo-comissivas serão usadas apenas por um falante que não tenha poder, uma vez que é possível que um chefe ameace um subordinado, mesmo já possuindo poder sobre este, mas sim que o uso desse tipo de ameaça pode levar o ouvinte a realizar o desejo do falante. A segunda diferença está relacionada ao tipo de diretivo envolvido, pedido, no caso das promessas e exigência, no caso das ameaças. Essa diferença, no entanto, é mais uma questão relativa ao grau do que ao tipo. Tradicionalmente, as diferenças apontadas entre promessas e ameaças diretivocomissivas estão relacionadas ao fato de que as promessas, em muitas línguas naturais, podem ser explicitadas – ―eu prometo‖. Já as ameaças normalmente não são, não é comum fazer uso da expressão, ―eu ameaço‖. Segundo Salgueiro (op. cit.), embora tal constatação seja verdadeira, a importância dada a essa diferença é um tanto exagerada, uma vez que há outros meios de explicitar uma ameaça, ou a força ilocucionária desta. Primeiramente, Salgueiro (op. cit.) destaca que não é porque não se usa o verbo ―ameaçar‖ na primeira pessoa do singular do presente do indicativo que não existem mecanismos para explicitar uma ameaça. O tom de voz, construções do tipo, ―você vai pagar por isso!‖ ou ―o dinheiro ou a vida!‖ podem ser, segundo ele, consideradas formas de explicitar uma ameaça. Ou ainda, receber um, ―Sim, eu estou te ameaçando‖, como resposta à pergunta: ―Você está me ameaçando?‖. O autor ressalta que apesar desses mecanismos não serem considerados por muitos estudiosos, esses exemplos parecem mostrar que as ameaças podem sim ser explicitadas. A observação feita por Salgueiro (op. cit.) sobre o uso de ameaças em situações de conflito aberto merece destaque, visto que nossos dados foram gerados em audiências de conciliação, atividade marcada pelo conflito. O autor destaca que nessas 39 situações, os falantes não precisam suavizar as palavras, podendo até ser benéfico acentuar a seriedade das ameaças tornando-as mais ou menos explícitas. Dessa forma, em uma disputa, as ameaças podem ser usadas como estratégias para se conseguir que seu pedido ou oferta seja atendido. O fato de não explicitar uma ameaça também está relacionado a questões sociais, como aponta Salgueiro (op. cit.), as ameaças são extremamente hostis. Explicitar uma ameaça é ferir as regras de polidez, por isso também que a ameaça não é explícita, ela se manifesta por meio de insinuações ou de forma indireta. O fato de não ter sua força ilocucionária explicitada, não faz a ameaça um ato anormal, até porque a maioria dos atos produzidos no dia-a-dia se difere, e muito, das formas canônicas. A partir da constatação dessa diferença, alguns autores questionam se ameaças e promessas deveriam ser classificadas sob um mesmo rótulo. Para estes autores, isso afetaria a Teoria dos Atos de Fala, que tradicionalmente os classifica como comissivos. Mas, segundo Salgueiro (op. cit.), esse questionamento não afeta as bases da teoria, apenas sua classificação, pois bastaria reclassificar as ameaças. Outro aspecto ressaltado para diferenciar promessas de ameaças é a existência de uma diferença no valor deôntico desses atos. Promessas geram obrigações para o prometedor, do contrário, o ato não se constitui uma promessa. Em contrapartida, as ameaças parecem não gerar tal obrigação, pelo menos para a pessoa ameaçada, pois esta não fará nenhuma reivindicação caso a ameaça não seja cumprida, ao contrário das promessas, que, se não forem cumpridas, provavelmente, serão contestadas por aqueles que a receberam. Esse pensamento gera duas dúvidas: (i) a obrigação é uma regra constitutiva das promessas e (ii) as ameaças não podem gerar obrigações? Em relação à primeira dúvida, Salgueiro (op. cit.) questiona se, ao descobrir que o ouvinte não tem o interesse no cumprimento da promessa, o falante se sente na obrigação de cumpri-la? Esse questionamento pode, como sugere o autor, colocar em questão a asserção de que promessas geram obrigações. Porém, essa discussão não é aprofundada por ele, que se dedica ao esclarecimento da segunda dúvida. Em relação à segunda dúvida, Salgueiro (op. cit.) questiona se a obrigação não é mesmo um componente constitutivo da ameaça. No caso das ameaças elementares prototípicas, normalmente, estão envolvidos apenas o falante e o ouvinte. Neste caso, parece que a única fonte de obrigação é a 40 necessidade do falante em manter sua credibilidade, esta necessidade pode não gerar uma obrigação moral, contudo pode ser um motivo para que o falante cumpra a ameaça ou, pelo menos, é uma boa razão para cumpri-la. Apesar de elementares, essas ameaças não são, para Salgueiro (op. cit.), as mais comuns. Para o autor, as ameaças mais típicas envolvem a presença de pelo menos uma testemunha direta ou indireta, que poderá vir a ser ameaçada futuramente. Uma vez que essa testemunha é um possível alvo de ameaça, o falante se vê na obrigação de realizar o ato, para, assim, manter sua credibilidade. Ameaças podem funcionar como promessas indiretas, neste caso também gerariam uma obrigação àquele que proferiu a ameaça. Salgueiro (op. cit.) levanta a hipótese de que a ameaça feita a um ouvinte pode ser benéfica para uma testemunha. Dessa forma, essa testemunha poderá vir a reivindicar o cumprimento da ameaça. Com esses exemplos, o autor quer mostrar que promessas e ameaças estão interligadas e que a natureza desses atos é dependente de fatores externos ao falante e ao ouvinte. Dessa interligação entre promessas e ameaças emerge uma nova associação: toda ameaça condicional está associada com uma promessa condicional complementar e vice-versa. Quando uma mãe promete comprar um videogame a um filho, caso este faça o dever de casa, implicitamente, ela transmite a ameaça de que não comprará se ele não fizer. Esquematicamente promessas e ameaças complementares diretivo-comissivas são, respectivamente, representadas: DCCP* (Re (Rda1) ^ ((Rda1)→Pr(Sda2)) ^ (¬(Rda1) →Th(¬(Sda2))) DCCT* De(Rda1) ^ (¬(Rda1) →Th(Sda2)) ^ ((Rda1) →Pr(¬(Sda2))) A diferença entre uma DCCP e a promessa implícita na DCCT é que o incentivo oferecido pelo falante é, no caso das ameaças, meramente o fato de o falante se abster de prejudicar o ouvinte; enquanto na promessa, o incentivo é uma melhoria na situação atual do ouvinte. Da mesma forma, a diferença entre uma DCCT e a ameaça implícita na DCCP é que naquela, o ouvinte será prejudicado pela ação, enquanto nesta, apenas deixará de obter o que é explicitado na promessa. Conforme destaca Salgueiro (op. cit.) o mais importante é o ato de fala total, independente dos mecanismos semânticos e pragmáticos que podem ser empregados nos casos típicos. Geralmente, em uma DCCT, a ameaça é expressa explicitamente, enquanto o diretivo associado e a promessa complementar ficam implícitos, mas nem 41 sempre é assim. O autor cita o exemplo do ladrão de banco, que depois de ameaçar matar os reféns se não lhe derem um helicóptero, diz: ―Se eu conseguir o que quero, não matarei ninguém24‖, ou seja, manifesta explicitamente a promessa complementar deixando implícito o diretivo e a ameaça. As observações feitas acima revelam que promessas e ameaças, do tipo condicional diretivo-comissivas, estão tão interligadas que, uma ameaça é sempre acompanhada de uma promessa e vice-versa. Para encerrar seu artigo, Salgueiro (op. cit.) discute uma última suposta assimetria que poderia abalar a Teoria dos Atos de Fala, a discussão se ameaças são atos ilocucionários ou perlocucionários. Para alguns autores, não é claro que a ameaça seja um ato ilocucionário, enquanto a promessa não gera dúvidas. Esses estudiosos chamam a atenção para o fato de os atos perlocucionários serem tratados como efeitos naturais, que podem emergir na interação. As ameaças parecem ter o ato perlocucionário como uma regra essencial ou constitutiva, não como um efeito. Por exemplo, a intimidação parece ser um elemento constitutivo da ameaça e não um efeito. Salgueiro (op. cit.) passa a questionar, então, se a perlocução é essencial apenas para as ameaças. Se levarmos em consideração a classificação de Searle (1975 apud SALGUEIRO, 2010) para os diretivos, veremos que estes têm a intenção de provocar no ouvinte um dado efeito, que é o de modificar a conduta futura deste. Como destaca o autor, o fato de os diretivos produzirem nos ouvintes um dado efeito – que é essencial a esses atos – não é questionado como um problema que pode abalar a Teoria dos Atos de Fala. Da mesma forma, o fato de ameaças produzirem um efeito no ouvinte, em nada altera a teoria. Essa intenção de provocar no ouvinte uma resposta comportamental é consubstancial não só às ameaças, mas também às promessas, ambas são tanto diretivos quanto comissivos. Diante do exposto, Salgueiro (op. cit.) defende que não tem fundamento diferenciar promessas de ameaças por causa da natureza ilocucionária ou perlocucionária, pois ambas provocam no ouvinte um efeito que é parte de suas constituições. Em síntese, promessas e ameaças compartilham os mesmos tipos formais básicos e as diferenças em termos de explicitude, valor deôntico e natureza ilocucionária x perlocucionária têm sido exageradas. Entretanto, Salgueiro (op. cit.) 24 Exemplo de Salgueiro (2010, p. 224) – “If I get what I want, I won’t kill anyone.” 42 aceita que ameaças são diferentes de promessas. Uma diferença importante deve-se ao fato de promessas serem benéficas para o ouvinte, enquanto ameaças não o são. Logo, o cumprimento bem sucedido de promessas requer a consentimento tácito ou explícito do ouvinte, que pode ―desativar‖ a promessa ao não aceitá-la. Ameaças, por outro lado, parecem não serem passíveis de ―desativação‖; a forma mais bem sucedida de desativar uma ameaça é via uma contra-ameaça, Outra diferença é que promessas são atos essencialmente intersubjetivos – seu desempenho envolve a participação conjunta de falante e ouvinte –, ameaças são mais unilaterais (embora possa haver a participação de outras pessoas, terceiras partes, etc), significando que promessas são mais difíceis de adequar à Teoria clássica dos Atos de Fala, que é basicamente intencionalista e não interacionista. 43 3. METODOLOGIA 3.1 Enfoque teórico-metodológico Destacamos que, para análise dos dados, nos apoiamos nos construtos teóricos advindos de duas correntes: Sociolinguística Interacional (doravante SI) e Análise da Conversa (doravante AC). Os estudos propostos pela SI para a comunicação verbal procuram explicar como os sentidos são construídos na interação face a face. Essa corrente destaca que uma atividade interpretativa do código linguístico envolve não só o conhecimento léxico-sintático, mas também o reconhecimento, pelos participantes, das sinalizações verbais e não-verbais, o que Gumperz (1982 apud RIBEIRO & GARCEZ, 1998) denomina de pistas de contextualização. As pistas de contextualização afetam diretamente a maneira pela qual uma mensagem pode ser interpretada, uma vez que contribuem para a construção de uma base contextual. Essas pistas podem ser de natureza vocal (prosódia, uso de expressões formulaicas, etc) ou não vocal (gestos, expressões faciais, etc). As pistas não vocais são adquiridas no contexto em processo semelhante ao processo de aquisição da linguagem, sendo próprio de cada cultura. Essa visão ressalta que o contexto é estabelecido de forma dinâmica e contínua na interação. Dessa forma, são os falantes que, através das pistas, implicitamente sinalizam uns para os outros como estas devem ser entendidas em uma sequência. A visão de contexto considerada neste trabalho baseia-se nos postulados teóricos de Goffman (1998). Para o autor, os estudos da linguagem devem considerar a situação social em que a fala ocorre, nesse sentido, devem ser consideradas todas as ações dos participantes. Um outro conceito importante para este estudo é o de enquadre que, segundo Goffman (1974), refere-se à definição da situação – o que está acontecendo aqui e agora, podendo ser visto como um princípio que organiza o sentido atribuído às ações dos interagentes no curso de uma dada interação social. Segundo Tannem & Wallat (1998, p. 123), enquadres interpretativos são necessários ―para compreender qualquer elocução, um ouvinte (ou falante) deve saber dentro de qual enquadre ele foi composto‖. Em Forms of talk, Goffman (1981) introduz o termo footing para descrever como se dão os alinhamentos, as posturas, as atitudes dos interagentes em relação a suas elocuções e, com isto, a forma como se posicionam e são posicionados no discurso. 44 Também de forma breve, passamos a apresentar a segunda corrente relevante para o presente trabalho. Um dos conceitos desenvolvidos pela AC de grande contribuição para os estudos linguísticos é o de organização sequencial. Esse conceito chamou a atenção para a análise sequencial dos atos de fala, ao ressaltar que a ação que um ato desempenha, depende de sua posição em relação a outros atos. Os estudos passaram, então, a considerar a fala em interação, gravada em áudio. Para conseguir representar toda a complexidade dos dados gravados foi desenvolvido, por Gail Jefferson, um modelo de transcrição, utilizado até hoje. Assim, a prática analítica da AC concentra-se nos sentidos atribuídos pelos participantes à interação, ou seja, preocupa-se com os sentidos que os participantes atribuem a suas ações no curso das interações. Dentre as consequências metodológicas da escolha dessas duas correntes, destacamos que a análise opera com dados reais de fala, estudados de forma sequencial. Nas seções seguintes, apresentaremos alguns comentários sobre o contexto no qual a pesquisa foi desenvolvida, a saber, o PROCON. Depois, destacaremos a natureza desta pesquisa; e, por fim, a geração dos dados que constituem o corpus. 3.2 O contexto de pesquisa: o PROCON O presente trabalho analisa dados de interação provenientes de audiências de conciliação ocorridas no PROCON (Procuradoria de Proteção e Defesa do Consumidor). O PROCON é um órgão de defesa do consumidor que tem suas diretrizes legais de atuação reguladas pelo Código de Defesa do Consumidor25 (doravante CDC). Segundo Salles e Cunha (2008, p. 14), ―as figuras jurídicas constituídas pelo código são, de um lado, consumidores (reclamantes), e, de outro lado, fornecedores de bens e serviços (reclamados)‖. No contexto, o consumidor é denominado reclamante, este busca o órgão para manifestar sua insatisfação com relação a um serviço prestado ou a um produto adquirido. A sua intenção é provar, por meio de argumentos, que sua reclamação é pertinente, consequentemente, a responsabilidade pelos danos é atribuída ao reclamado. 25 Conjunto de normas que visam à proteção aos direitos do consumidor, assim como disciplinar as relações e as responsabilidades entre fornecedores de bens e serviços e consumidores. Instituído pela Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990. 45 O reclamado é, por sua vez, o fornecedor de bens e serviços, que responde pelos danos causados ao reclamante. A sua intenção é se eximir de qualquer responsabilidade atribuída, transferindo-a para terceiros ou para o próprio consumidor. A interação entre reclamante e reclamado é mediada por um representante do PROCON, denominado mediador. Este pode ser um estagiário de Direito treinado para atuar no órgão ou um advogado. Cabe destacar que outros participantes, além desses já mencionados, podem estar presentes nas audiências de conciliação, tais como: familiares do reclamante, advogado de uma das partes, entre outros. A partir de uma reclamação feita pelo consumidor, o órgão atua no processo de mediação entre reclamante e reclamado. O primeiro procedimento tomado se dá no dia da reclamação. Diante do consumidor, há a tentativa de resolver o problema por telefone. Caso não seja possível, o reclamado é então intimado a comparecer, em data e horário marcados, à audiência de conciliação. Essas audiências são organizadas de modo que cada uma das partes possa apresentar seu ponto de vista, denominado, neste trabalho, de enquadre. O objetivo desse tipo de audiência é encontrar uma solução para a reclamação, para atingir essa meta, o mediador auxilia as partes nas tentativas de formulação de um acordo. De acordo com Oliveira (2010), as audiências são organizadas em três fases. Na primeira, é feito o enquadre legal da reclamação. Na segunda fase, as partes relatam suas versões do ocorrido com o objetivo de atribuir responsabilidade umas às outras. A última é a fase de encerramento, podendo haver acordo ou não. O PROCON é caracterizado como ―um fórum de justiça popular de baixo custo, em que as partes advogam em causa própria, sem a presença obrigatória de um advogado‖ (SALLES e CUNHA, 2008, p. 14). Consequentemente, o órgão de defesa do consumidor, juridicamente, não tem força legal para obrigar as partes a assumir um comprometimento legal, tampouco pode tomar as decisões resolutivas, a não ser encaminhar os casos não resolvidos para os juizados especiais. Dessa forma, o único recurso que as partes dispõem para a resolução do problema é a linguagem, esta funciona como uma importante ferramenta do processo de argumentação. Por fim, é importante destacar que essas audiências de conciliação constituem encontros institucionais. Segundo Drew e Heritage (1992), o que determina a ―institucionalidade‖ de uma interação não é o contexto físico no qual se desenvolve, mas sim a relevância da identidade institucional ou profissional dos participantes 46 envolvidos. Na interação institucional devem ser observadas algumas peculiaridades, tais como: distância social entre os participantes, existência ou não de agenda prédeterminada, direitos e deveres relativos à participação no encontro. 3.3 A natureza da pesquisa No presente trabalho, adotamos a abordagem qualitativa e interpretativa. Essa abordagem teve início no final do século XIX, quando os cientistas sociais passaram a se perguntar se o método positivista usado para análise dos dados deveria continuar servindo de modelo para o estudo dos fenômenos sociais. O método positivista era oriundo das ciências físicas e naturais, utilizado a fim de testar hipóteses e quantificar os dados. Dada a complexidade dos fenômenos sociais, os cientistas sociais perceberam a necessidade de desenvolver uma metodologia própria para seus estudos, voltada para a interpretação dos dados. Segundo Denzin & Lincoln (2000), o termo qualitativo enfatiza as qualidades de processos e de significados, que não são medidos em termos de quantidade ou frequência, mas sim entendidos no contexto no qual ocorrem. Pesquisas dessa natureza utilizam o ambiente como fonte de geração dos dados, sendo o pesquisador o instrumento fundamental, pois é ele quem descreve e busca interpretar o sentido dos fenômenos sob a perspectiva dos participantes. O objetivo central da pesquisa qualitativa é elucidar, no contexto real de ocorrência, de que forma os participantes de uma interação constroem sentido. A linguagem é estudada em uso, assim, a pesquisa deve focalizar as co-construções e as negociações estabelecidas no curso das interações, procurando entender de que forma os recursos linguísticos são utilizados para atender os objetivos da comunicação. Em suma, a abordagem qualitativa é caracterizada pela imersão do pesquisador no contexto de pesquisa a fim de interpretar os dados e, consequentemente, a realidade. 3.4 A geração dos dados A geração dos dados é uma importante etapa na pesquisa qualitativa. Os dados desse tipo de pesquisa podem ser: descrições detalhadas de fenômenos, de comportamentos, de experiências, fragmentos de documentos, correspondências, fotos, 47 vídeos, gravações e transcrições de entrevistas e discursos, interações entre indivíduos e grupos, entre outros. No presente trabalho, utilizamos audiências de conciliação gravadas em fitas K7 e MP3, em uma cidade da Zona da Mata Mineira. As gravações foram transcritas segundo as convenções da Análise da Conversa. Os dados foram extraídos do corpus do Projeto ―A construção de identidades do consumidor no PROCON‖, coordenado pela professora Doutora Sonia Bittencourt Silveira na Universidade Federal de Juiz de Fora. Adotamos, além do registro em áudio das falas, notas de campos de algumas das audiências, realizadas de acordo com as orientações em etnografia. E com algumas entrevistas, realizadas após as audiências, com os consumidores. Na análise utilizaremos cinco audiências de conciliação, a saber: ―Banco Sul‖, ―Rui Pedreiro‖, ―Ok Veículos‖, ―Gesso‖ e ―Brasimac‖. Cabe destacar que não analisamos todos os diretivos, selecionamos apenas os utilizados na construção dos enquadres e nas negociações do acordo. Destacamos, por fim, que os nomes dos participantes, assim como dos estabelecimentos comerciais foram trocados a fim de preservar a identidade dos envolvidos. 48 4. ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 4.1 Análise dos dados As audiências, via de regra, apresentam três momentos relacionados aos atos diretivos e comissivos. Primeiramente, os diretivos são usados para abrir espaço para que as partes apresentem seus enquadres da reclamação. Ao apresentarem seus enquadres, as partes iniciam uma fase de negociação, os diretivos aparecem, neste momento, para verificar informações a fim de ser possível atribuir obrigações. No momento das negociações, para conseguir que um acordo seja firmado, os participantes podem fazer uso de ameaça, estratégia diretivo-comissiva que visa à resolução do conflito. Após as negociações, as partes podem ou não se comprometer com a resolução do conflito. Quando há o comprometimento, emergem os usos comissivos, mas só há acordo quando ambas as partes aceitam o que é proposto. 4.1.1 Audiência Banco Sul Resumo: Na audiência Banco Sul, o reclamante, Lucas, reivindica o cancelamento de um seguro saúde que aceitou fazer porque o banco impôs como condição para conseguir o empréstimo de que precisava. O reclamado, Rui, representante do banco, alega que não houve imposição, o seguro, como um produto do banco, foi oferecido ao cliente. O reclamado sugere que seja feito o cancelamento do seguro, mas sem se comprometer com a realização deste. Após a mediadora, Ana, sugerir que seja feito o ressarcimento das parcelas já debitadas, Rui acata essa sugestão e ainda se compromete a ajudar na realização do cancelamento. a) Os diretivos na construção de macro-atos: enquadre do reclamante x enquadre do reclamado Na audiência Banco Sul, primeiramente, é a mediadora quem apresenta a versão do reclamante sobre a venda do seguro, enquadrando a ação do banco como IMPOSIÇÃO. Em seguida, em resposta à acusação feita pela mediadora, o reclamado apresenta sua versão, enquadrando a venda do seguro como OFERTA. As negociações de enquadres podem ser observadas nos excertos abaixo: (1) 16 Ana a reclamação dele aqui, é que ele:: (0,5) é::, -foi 49 → 17 18 19 junto ao banco sul, requerer um empréstimo, (0,5) e foi:: obrig-, => uma das condições pra ele conseguir um empréstimo, foi obrigado a adquirir o seguro. = (2) → 30 31 32 33 34 35 36 Ana [então ele veio ] ao procon nos questionar, porque a intenção dele não era fazer o seguro, ele não- não tá interessado no seguro, (0,8) mas ele se viu obrigado a assinar o contrato do seguro, pra conseguir a liberação do empréstimo, que: que foi o motivo que o levou ao banco. [entendeu?] A mediadora, Ana, utiliza as expressões – ―uma das condições‖, ―foi obrigado‖ e ―se viu obrigado a assinar o contrato do seguro‖ – para, em nome do reclamante, revelar o enquadre legal dado pelo PROCON à situação: imposição. Esse enquadre é realizado ora de forma implícita ―ele se viu obrigado a assinar o contrato do seguro‖, ora de forma explícita ―foi obrigado a adquirir o seguro‖. Ao enquadrar como imposição, a mediadora reivindica que o reclamado assuma responsabilidades que visem à resolução do conflito, criando uma obrigação para ele. O papel do mediador é fazer com que as partes cheguem a um consenso para resolução do conflito. Embora não defina as ações que devam ser tomadas, o mediador atribui aos participantes responsabilidades, embasado não só no relato dos consumidores, como também e, principalmente, na lei, no caso do PROCON, pelo CDC. Ao tomar o turno de fala, o reclamado, Rui, apresenta seu enquadre acerca da reclamação, como pode ser observado nos excertos abaixo: (3) → 37 38 39 40 41 Rui [ é , o:: ] o que eu tenho pra dizer a você, é o seguinte.(0,5)com relação ao que nós recebemos um relato do procon, (0,5) tá? tava: dando:: a entender, que fosse operação casada não é operação casada. Primeiramente, o reclamado refuta o enquadre dado pelo PROCON, de que se trata de venda casada, portanto, imposição. A refutação de Rui é uma tentativa de eximir o banco da responsabilidade que um enquadre como esse implica em termos legais. Na sequência de excertos abaixo, Rui constrói seu enquadre para a reclamação: oferta. 50 (4) → → → 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 Rui Ana Rui Ana Rui Ana Rui Rui Rui Ana Rui acho que todas as instituições financeiras, hoje, tem os seus produtos a oferecer. = =humhum.= =tá? Todas.= =humhum.= =é::: a partir do momento, em que o cliente proCUranos, a-, a-, a-, a-, um empréstimo, com certeza, eu acho que qualquer lugar, quer vender o peixe dele.= =claro.= =entendeu? (0,5) então o quê que cê oferece. oferece o produto, mas (0,5) os produtos do banco, não é: camisa, não é calça. (0,5) não é sapato. claro. = =são::, são:: (0,5) esses seguros, são previdências, são coisas que trazem rentabilidade pro cliente. As expressões usadas por Rui – ―oferecer‖, ―quer vender o peixe dele‖, ―os produtos do banco são seguros‖ – revelam o enquadre legal que constrói, o de oferta. E que essa é ainda benéfica para o cliente, pois traz rentabilidade. Ainda que a organização de preferência da oferta seja a de aceitação, aquele que a recebeu tem liberdade de escolha, pode aceitar ou recusar o que lhe foi oferecido, ao contrário da imposição. Então, ao enquadrar como oferta, Rui defende que o procedimento do banco foi normal, que não houve nenhuma infração e, portanto, a instituição não tem nenhuma responsabilidade sobre a aceitação do cliente. O enquadre construído pelo reclamado não é aceito pela mediadora, que mantém o de imposição. Diante da insistência de Rui em afirmar seu enquadre de oferta, Ana faz uso do diretivo para pedir que Lucas apresente sua versão dos fatos, como podemos perceber no excerto abaixo: (5) → 127 Ana ô:: (.)lucas, como se passou lá? No excerto acima, o diretivo é um pedido de informação, que busca verificar a versão do reclamante acerca da transação bancária a fim de confrontá-la com a versão do reclamado. (6) 142 Lucas 143 aí (ela falou)”olha, temos um seguro aqui,” seguro não. ela falou saúde. (.)”temos um plano de um 51 → 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 155 156 157 158 159 saúde,” (.)entendeu? e “é bom que você faç-“ (eu falei assim) “eu num quero, porque eu já tenho plano de saúde, eu já te- eu já tenho. no no: momento” eu num falei que eu tinha: um seguro de vida.(.) eu tenho que um seguro de vida em grupo, (.)pela emppela empresa também. Aí, eu no dia eu falei assim ó, “eu num quero porque, (.) aí ela falou assim “aí vai fica difícil” (.)não é? aí eu falei com ela assim, “então se se eu: então quer dizer que: eu sou obrigado.” eu falei né, com ela “eu sou obrigado a fazer,” ela falou “não. não é bom usar esses te:rmos.” aí ela foi e chamou a: a a menina do seguro, pra me explicar, não é? talvez eu não tô explicando direito pra ele,(.) aí como eu estava precisando do dinheiro, eu fui, assinei(.) o cont- o contrato, não é? o::: o seguro. No excerto acima, o diretivo da fala da funcionária – ―é bom que você faç-‖ (linha 144), funciona como uma ameaça, estratégia essa que será aprofundada no item (b) desta seção. Agora convém apenas observar que o relato da situação desconstrói o enquadre sustentado até então pelo representante do banco, pois demonstra que, se o reclamante não fizesse o seguro não conseguiria o empréstimo de que precisava, como fica evidente na fala da funcionária, linhas 150 e 151, ―aí vai ficar difícil‖, legitimando o enquadre de imposição, uma vez que não houve opção de escolha. Mesmo prevalecendo o enquadre do reclamante, Rui tenta se eximir de qualquer responsabilidade para resolução do conflito. O reclamado, usando sequências diretivas, sugere, várias vezes, que seja feito o cancelamento do seguro, como aprofundaremos no subitem a seguir. O uso dos diretivos nas tentativas de resolução do conflito (7) → 86 87 88 89 90 Rui é o: que: o que eu posso dizer a ele é o seguinte. (0,5) pra ele pedir o cancelamento, ele pedir o cancelamento, (0,5) agora com relação a: as duas parcelas que já lhe debitadas, isso aí não tem como ser retroagido. Para solucionar o conflito, já no início da audiência, Rui sugere que seja feito o cancelamento do seguro. O diretivo aqui é usado para fazer um aconselhamento. Nos termos de Casanova (1996), temos um conselho, que é como a autora chama as sugestões que são personalizadas, ou seja, aquelas dirigidas a uma pessoa em particular. 52 Cabe destacar que essa solução exime Rui completamente de qualquer responsabilidade, ele não se envolverá no cancelamento, como também não haverá o ressarcimento das parcelas já pagas. Rui argumenta que não pode haver estorno, porque o reclamante aceitou o contrato, o débito foi permitido. O conselho dado por Rui para resolução do conflito não pode ser considerado proposta, pois não houve, de sua parte, um comprometimento com a resolução. (8) → 169 Rui pede o cancelamento, ué.= 171 Rui =se pra você não é interessante, cancela. (9) → Nos excertos acima, assim como no excerto (7), não podemos considerar uma proposta de solução do conflito, pois também não há comprometimento com a resolução. No excerto (7), o cancelamento foi sugerido, foi formulado como um conselho, ―é o: que: o que eu posso dizer a ele é o seguinte. (0,5) pra ele pedir o cancelamento‖, até podemos trocar o verbo dizer por sugerir, ―o que eu posso sugerir a ele é o seguinte‖. Já nos excertos (8) e (9), temos o uso da forma imperativa que a priori os caracterizaria como ordem. Porém, não há, aqui, a relação de poder destacada por Casanova, o reclamado não exerce poder sobre o reclamante, portanto, segundo a autora, sua fala não seria ouvida como uma ordem, apenas como conselho. Cabe destacar que, particularmente, no excerto (9), o imperativo é usado em uma construção condicional, o que atribui a responsabilidade ao consumidor, ou seja, o poder de decisão é de Lucas e, por isso, não teríamos uma ordem, mas sim, novamente, um conselho (sugestão personalizada). Também nessas construções, Rui se exime da responsabilidade de resolver o conflito, pois a solução para este, que é cancelar o seguro, cabe a Lucas. Nesses termos, o cancelamento é enquadrado como algo da ordem do desejo do reclamante e não como uma obrigação do reclamado. (10) → 196 Rui 197 198 199 eu vou sugerir a você, que se você algum dia você tiver em alguma outra instituição chegar e impor financeira, entendeu? se você for abrir uma conta, ou fazer um empréstimo, o que for,(.) se alguém isso pra 53 200 201 202 203 204 205 você, você chame um gerente, que com certeza, a: as as pessoas que estão instruídas pra administrar a agência, elas não vão acatar isso. mesmo que seja (.) é: bom pra pra organização deles. Isso não não vai ser feito (.) porque: a gente sabe, que isso não pode ser feito.= No excerto (10), o diretivo é usado, novamente, para fazer um aconselhamento, que agora serve para a vida do reclamante e não só para a situação em questão. Cabe destacar a linha 200, na qual o uso da forma imperativa ―chame‖ que, por ser usada em um conselho e por Rui não exercer poder sobre o reclamante, perde sua força de ordem. (11) → 221 Rui 222 223 =eu vou pedir a você, pra você fazer o seguinte então,(.) você lembra o nome da pessoa, que fechou o seguro pra você? (12) → 237 Rui 238 239 240 241 242 243 244 245 então tá. você vai procurar a selma, e vai pedir o cancelamento. (.) tá? e:: e o:: (.)no que ela falar já pra você que não será feito o cancelamento, aí você vai mandar ela procurar o rui. (fala) “olha, tive hoje uma audiência com o rui.” você vai lá HOJE, tá? (porque hoje lá foi o dia inteiro) você vai: procurar por ela,(.) pede pra ela, pra ela entrar em contato comigo,(.) que eu vou pedir de imediato, o cancelamento disso aí, hoje. é: e Já no final da audiência, os diretivos serão usados de forma a instruir o reclamante quanto aos procedimentos necessários para a resolução do conflito. Como podemos perceber no excerto (11), o diretivo ―você lembra o nome da pessoa, que fechou o seguro pra você?‖, é um pedido de informação, que funciona como uma présequência. Com essa pergunta, Rui já quer direcionar o reclamante para quem incumbirse-á de cancelar o seguro. Já no excerto (12), há uma sequência de diretivos ―vai procurar‖, ―vai pedir‖, ―vai mandar‖, nessas construções, a perífrase de futuro está sendo usada com valor imperativo, tanto que podemos substituir por ―procure‖, ―peça‖ e ―mande‖. Temos também usos do imperativo em sua forma canônica ―vai‖ e ―pede‖. Novamente, Rui faz uso de formas imperativas para dar instruções de como o reclamante deve proceder na agência para fazer o cancelamento. Temos, então, que reinterpretar o sentido de instrução proposto por Casanova (1996). Segundo a autora, a instrução é sempre despersonalizada, ou seja, não é dirigida para uma pessoa em particular. Porém, como 54 se pode perceber claramente, no excerto (12), embora os diretivos sejam direcionados para uma pessoa em particular, o teor do enunciado tem força de instrução e não de conselho. Então, estamos considerando instrução, sequências injuntivas, que dizem como fazer, independentemente de ser para um interlocutor específico. b) Estratégia para negociação do acordo: ameaça Na audiência Banco Sul, há dois momentos de ameaça. O primeiro é apenas relatado, pois é anterior à audiência, se refere ao momento em que o reclamante foi ao banco para conseguir o empréstimo. Como podemos perceber no excerto abaixo, a fala da funcionária soa como ameaça, pois para conseguir o empréstimo, o reclamante precisaria de fazer o seguro também. (13) → 142 Lucas 143 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 155 156 157 158 159 aí (ela falou)”olha, temos um seguro aqui,” seguro não. ela falou saúde. (.)”temos um plano de um saúde,” (.)entendeu? e “é bom que você faç-“ (eu falei assim) “eu num quero, porque eu já tenho plano de saúde, eu já te- eu já tenho. no no: momento” eu num falei que eu tinha: um seguro de vida.(.) eu tenho que um seguro de vida em grupo, (.)pela emppela empresa também. Aí, eu no dia eu falei assim ó, “eu num quero porque, (.) aí ela falou assim “aí vai fica difícil” (.)não é? aí eu falei com ela assim, “então se se eu: então quer dizer que: eu sou obrigado.” eu falei né, com ela “eu sou obrigado a fazer,” ela falou “não. não é bom usar esses te:rmos.” aí ela foi e chamou a: a a menina do seguro, pra me explicar, não é? talvez eu não tô explicando direito pra ele,(.) aí como eu estava precisando do dinheiro, eu fui, assinei(.) o cont- o contrato, não é? o::: o seguro. No excerto acima, o diretivo da fala da funcionária – ―é bom que você faç-‖ (linha 144), funciona como uma ordem subjetiva. Segundo Casanova (1996), podemos falar em ordem quando há diferenças nas relações de poder: quem tem poder manda em quem não tem. A ordem é dita subjetiva, quando o poder é instaurado na interação. No contexto mencionado, o falante adquire poder e impõe ao outro o seu querer. Assim, a fala da atendente do banco é interpretada como uma ordem, pois é ela quem vai autorizar o empréstimo, ou seja, naquela situação ela tem poder para pressionar o cliente 55 a aceitar o seguro oferecido pelo banco. A forma do enunciado é de conselho, mas, na interação, adquire força ilocucionária de ordem. A ordem subjetiva de Casanova (1996) é, nos termos de Salgueiro (2010), uma ameaça, tanto que podemos transformar a fala da funcionária em uma ameaça explícita: ―se você não fizer o seguro, não libero o empréstimo‖. Tradicionalmente, as ameaças são classificadas como atos comissivos, pois o falante se compromete a fazer ou deixar de fazer algo futuramente que é prejudicial ao ouvinte, no caso, ela não emprestará o dinheiro solicitado, porém, o objetivo aqui é fazer com que o reclamante contrate o seguro, ou seja, impor uma obrigação para o consumidor. Temos, portanto, uma ameaça diretivo-comissiva. A parte diretiva tem como objetivo ilocucionário fazer com que o consumidor assine o contrato, se isso for feito, a funcionária se compromete em autorizar o empréstimo, parte comissiva. A segunda ameaça é uma estratégia utilizada, neste caso, pela mediadora para conseguir que o reclamado assumisse responsabilidades na resolução do conflito. Como pudemos perceber na seção anterior, Rui estava relutante em fazer qualquer proposta para beneficiar o cliente e firmar um acordo. É apenas após ser implicitamente ameaçado pela mediadora que ele se compromete com a resolução. (14) → 210 211 212 213 214 215 216 217 218 219 220 221 222 223 Ana Rui Ana Rui Ana Rui Rui =eu acho que diante da denúncia dele, ele tá aqui confirmando o:, não é? o que foi: o que foi forçado lá na hora, o banco deveria, (.) devolver as duas parcelas que já foram pagas= =tá = =porque:: <ele se sentiu pressionado a fazer.>= =humhum. entendeu? ele ele adquiriu um produto que ele não queria,(.) pra poder conseguir o outro que ele queria. [ então ]HOUve uma pressão.= [eu vou ]= =eu vou pedir a você, pra você fazer o seguinte então,(.) você lembra o nome da pessoa, que fechou o seguro pra você? No excerto (14), Ana chama o reclamado a se responsabilizar pela infração cometida pelo banco, comprovando que o enquadre apresentado por Rui, diante dos fatos apresentados pelo reclamante, não tem fundamento legal. Ao desconstruir o enquadre de oferta, a mediadora legitima o enquadre do consumidor, o de imposição, o que configuraria, portanto, venda casada. 56 De acordo com o artigo 6º, parágrafo IV, do CDC, é de direto do consumidor a proteção por prática impositiva no fornecimento de serviços. Com base nesse artigo, a mediadora utiliza, implicitamente, o poder do órgão que representa para pressionar o reclamado a apresentar uma proposta, nos termos sugeridos por ela. A leitura da audiência como um todo, nos permite interpretar a fala da mediadora como uma ameaça, podendo ser explicitada pela seguinte paráfrase: ―se o banco não fizer uma proposta, será encaminhado para a justiça para responder por venda casada‖. Como destaca Salgueiro (2010), para que um enunciado conte como uma ameaça basta que o contexto favoreça essa leitura, não há necessidade de que a ameaça seja explícita para ser considerada como tal. No excerto acima, a fala da mediadora é uma estratégia diretivo-comissiva, pois seu objetivo é convencer o reclamado a apresentar uma proposta, ou seja, a ameaça é, ao mesmo tempo, diretiva e comissiva, pois impõe uma obrigação ao ouvinte (fazer uma proposta), se esta não for cumprida, o falante realizará uma obrigação que será prejudicial ao ouvinte (encaminhará o caso para a justiça). O reclamado entende a fala da mediadora como uma ameaça, tanto que, no turno seguinte (linhas 221, 222 e 223) – já analisado no excerto (11) –, ele já se mostra disposto a colaborar no cancelamento. Segundo Garcia (1997), mediadores podem sugerir ideias para a resolução do conflito sem se comprometer, mas é relevante notar que nos dados do PROCON, a sugestão da mediadora não é neutra, como postula a autora, alinhada ao consumidor, ela sugere o ressarcimento das parcelas, o que é benéfico apenas para o reclamante. Cabe ressaltar que a mediadora faz uso de uma forma verbal modalizada (futuro do pretérito). Possivelmente, porque a mediadora tem consciência que não cabe a ela determinar quais são as ações a serem cumpridas para a resolução do conflito; ela não tem o poder de proferir atos declarativos, ou seja, sua fala não muda a realidade ou um dado estado de coisas. c) O papel dos comissivos na resolução do conflito Como visto no item anterior, Ana faz uso de uma estratégia diretivo-comissiva, o que faz com que Rui mude sua postura e assuma a sugestão dela como proposta, como perceberemos nos excertos abaixo: 57 (15) → → 244 Rui 245 246 247 248 249 250 251 252 253 254 entrar em contato comigo,(.) que eu vou pedir de imediato, o cancelamento disso aí, hoje. é: e (barulho externo) quanto ao ressarcimento, o ressarcimento dessas duas parcelas pra você, é: eu não vou garantir agora, porque nós não fomos ressarcidos. (.)tá? mas eu peço a você um prazo de Quinze dias, tá? pra que a gente faça o ressarcimento das seguintes parcelas pra você, (.) sem correção nenhuma(.)foi dois e- foi dois e oitenta e cinco? nós vamos creditar pra você os doze e oitenta e cinco de duas vezes. No excerto acima, linhas 244 e 245, ―eu vou pedir de imediato, o cancelamento disso aí, hoje.‖, Rui se compromete em realizar o cancelamento do seguro, temos, portanto, o uso de um comissivo, quando o falante se compromete a realizar a ação expressa no ato de fala. Quanto ao ressarcimento das parcelas já debitadas, também há um comprometimento com a devolução, mas ressalta que os valores pagos não serão corrigidos. Novamente, Rui se compromete com a resolução do conflito, assume para si a obrigação de verificar junto ao banco o ressarcimento das parcelas, portanto, usa um comissivo nas linhas 249, 250 e 251, ―eu peço a você um prazo de Quinze dias, tá? pra que a gente faça o ressarcimento das seguintes parcelas‖. Cabe ressaltar que, quando se compromete com o cancelamento, Rui usa o pronome de primeira pessoa do singular e quando se compromete com a devolução das parcelas, faz uso das formas que marcam a primeira pessoa do plural (―nós‖ e ―a gente‖), isso porque para a devolução, Rui não tem como arcar com a responsabilidade, sem dividi-la com a instituição que representa. 4.1.2 Audiência Rui Pedreiro Resumo: Na audiência Rui Pedreiro, a reclamante, Lúcia, alega que o reclamado não cumpriu o que teria sido acordado para a construção de sua casa, que seria entregar a casa no ―ponto para morar‖ e ainda pediu mais material de construção do que foi efetivamente usado. Para o reclamado, Rui, não só o acordo, ―entijolar e bater laje‖, foi cumprido, como também excedeu o combinado, fazendo o emboço e o piso, inclusive usando seu próprio material. O mediador, Jorge, classifica o problema como falta de comunicação: cada um entendeu o acordo de uma forma. Como as partes tentam sustentar sua versão e como não há qualquer documento que sirva como registro do que foi acordado entre eles, reclamante e reclamado são encaminhados ao juizado especial. 58 a) Os diretivos na construção de macro-atos: enquadre do reclamante x enquadre do reclamado Na audiência Rui Pedreiro, os diretivos desempenham importante papel na apresentação dos enquadres. Para o reclamado, o serviço contratado, ―entijolar e bater a laje‖, foi CUMPRIDO, como também excedeu o combinado, fazendo o emboço e o piso. Para a reclamante, o serviço combinado, ―no ponto para morar‖, NÃO FOI CUMPRIDO, pois a casa está com muitos problemas. Os diretivos também são usados para apresentação de uma reclamação específica, a do pedido excessivo de material. O uso dos diretivos, para as negociações dos enquadres, pode ser observado nos excertos abaixo: (16) → 01 02 03 04 Jorge mas então o quê que: é o quê que foi abordado. o senhor per- o senhor falou assim o senhor me perguntou o quê que foi abordado. então vamos lá o quê que foi abordado? = No excerto (16), temos o início da audiência que é aberta com o uso de um diretivo, ―então vamos lá o quê que foi acordado?‖, como podemos perceber nas linhas de 1-4. Tradicionalmente, esse tipo de diretivo é classificado como pedido de informação. Embora, esse pedido tenha como função primeira verificar e/ou buscar informações, é ele que abre espaço para que as versões das partes sobre o serviço contratado sejam apresentadas. O primeiro a apresentar sua versão é o reclamado, Rui, como podemos perceber nos turnos seguintes. (17) → → 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 Rui Jorge Rui Jorge Rui Jorge Rui Jorge Rui =nós concordamos assim. hum. eu ver a casa dela. hum. pra mim entijolar. hum. e bater a laje. hum. eu ainda dei um emboço por dentro eu falei com ela e::eu não trabalho com acabamento (0.8) porque até na minha casa ac-acabamento quem faz são os outros eu pago pra fazer. (1.0) inclusive eu tô com banheiro pra fazer lá em casa. 59 No excerto (17), o reclamado apresenta seu enquadre: ―entijolar e bater a laje‖. Ao delimitar o acordo a essas duas ações, Rui restringe sua obrigação a esses serviços, portanto, o emboço feito por ele já seria algo além do combinado, tanto que ele usa o verbo ―dar‖, na linha 13, ―dei o emboço‖. Como entregou a casa nas condições acordadas e ainda emboçada, Rui constrói seu enquadre de serviço cumprido. Em seguida, o mediador reformula a versão de Rui sobre o combinado, e este a confirma e acrescenta ter feito também o piso e que a casa tinha sido recebida com satisfação pela reclamante, legitimando seu enquadre de acordo cumprido. Cabe ressaltar, que, para legitimar sua versão, Rui se posiciona como uma pessoa generosa, ele teria feito também o emboço e o piso que não estariam dentro do que combinaram, portanto, não pode ser cobrado a esse respeito. (18) → 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 Rui Jorge Rui Jorge [entijolar e bater a laje] ainda dei um emboço pra ela, fiz o piso, ela tratou comigo de me pagar (.)o que ela pagava por mês, ela entrou dentro da casa toda satisfeita,(1.0) agora deu esse problema. eu não entendi em vez de ela me pagar, ela me trouxe aqui. (2,0) bom, foi isso que aconteceu ou [não. a senhora combinou, a senhora combinou ] [eu acho que ela não tá querendo é p a g a r.] com ele que só iria [é:: é:: é] No excerto (18), o diretivo, linhas 31 e 32, é usado como pedido de confirmação da versão do reclamado. Mas antes que a reclamante tome o turno conversacional para apresentar sua versão, Rui, em sobreposição à fala do mediador, acusa a reclamante de não ter efetuado o pagamento do serviço, essa acusação será retomada no item (b), desta seção. (19) → 35 36 37 38 39 40 Lúcia Jorge Lúcia Jorge Lúcia >[ n ã o. ]< [ o:: o:: o::] >[ n ã o. ]< só iria ser [entijolado] e tal. >[ n ã o. ]< nã:o, não foi isso [q u e combinamos ] não. fazer Em resposta ao diretivo, ―bom, foi isso que aconteceu ou [não‖, Lúcia, primeiramente, refuta, em sobreposição, a versão apresentada por Rui, como podemos 60 perceber nas linhas 35, 37 e 39. Neste momento, há um confronto de versões, Lúcia apresenta seu enquadre do contrato, como poderemos verificar no excerto abaixo: (20) → 50 51 52 53 54 Lúcia Rui [ e l e ] ele falou que ia me dar a casa no ponto pra mim MORAR, pra mim MORAR. se ele não ia fazer o piso, se ele não ia rebocar, como é que eu ia morar? e ela não tá morando, hum, ainda a filha ainda. No excerto (20), temos a versão da reclamante, que seria entregar a casa no ―ponto para morar‖, o que, para ela, incluiria acabamento (emboço e piso), pois sem isso, na opinião dela, não teria como morar na casa. Ao incluir o acabamento como parte do acordo, Lúcia refuta o posicionamento de Rui, o de que isso teria sido feito fora do combinado. Dessa forma, ela inclui o acabamento no que define como obrigação de Rui. Ao questionar, na linha 54, que a reclamante está morando na casa, Rui desconstrói o enquadre dela, legitimando o enquadre de contrato cumprido. A reclamante se justifica que mora na casa por não ter para onde ir, porém, essa justificativa não é evidência suficiente para sustentar o enquadre por ela apresentado, o de que o contrato não foi cumprido. Esta audiência tem uma segunda reclamação: o pedido excessivo de material, que teria sido usado de forma indevida, esta reclamação, focalizaremos no subitem seguinte. O uso dos diretivos nas tentativas de resolução do conflito Quando Rui acusa Lúcia de ter reclamado do gasto excessivo de material, a reação dela é questionar a informação fornecida, como destacamos no excerto abaixo: (21) → 58 59 60 61 Rui Lúcia =ainda gastei material meu agora eu tenho como (.)usei material dela. oh, isso vai custar (caro) [eu falei pra senhora ver i s s o ( )]= =[eu falei que o senhor usou meu material?] Como podemos perceber, o diretivo usado pela reclamante, linha 61 do excerto acima, é um pedido de confirmação. Ao questionar a natureza da reclamação, Lúcia refuta ter acusado o reclamado de ter usado material de forma indevida, criando, assim, 61 uma situação embaraçosa, pois se ela não reclamou, o mediador fez um registro que não corresponde à reclamação original. Ao refutar ter feito tal acusação, a reclamante se exime da responsabilidade pelo dito. A refutação de Lúcia não é aceita pelo reclamado, pois para este vale o que está escrito, tanto que pede pela leitura da súmula da reclamação, como podemos perceber no excerto abaixo: (22) → 62 63 64 65 Rui Lúcia Rui ah mas aqui consta.= =mas ecomo que teve desvio de material consta, cê quer ler por favor? (.) no papel No excerto acima, ao usar o diretivo, linhas 64 e 65, Rui pretende confrontar Lúcia com a reclamação feita inicialmente: a de que ela reclamou do desvio de material. Cabe ressaltar que, Rui faz um pedido ao mediador ao invés de ordenar a leitura, pois, como destaca Casanova (1996), a interpretação do imperativo como ordem, só se dá numa relação desigual de poder, como o representante do PROCON detém mais poder, o reclamado pôde apenas manifestar seu desejo de que a leitura da súmula da reclamação fosse feita. Nas linhas 64 e 65, Rui, além de usar o verbo querer para formular seu pedido, também usa a expressão de cortesia, ―por favor‖, ambos os usos atenuam a força diretiva do pedido. Como podemos perceber no excerto abaixo, a leitura da súmula da reclamação confirma que Lúcia reclamou do uso indevido de material. Assim, ela não tem como se eximir dessa responsabilidade, mas até que a reclamante se comprometa com o dito, há um longo processo de negociação de responsabilidades, que gera até mesmo um desalinhamento entre reclamante e mediador – o que não é esperado no PROCON. (23) 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 Jorge Rui Lúcia Rui Jorge foi o que a senhora me falou. ah aí ah, eu falei o seguinte, eu tenho um xerox aqui ó (o meu) o outro tá com meu advogado. reclamado ó o reclamante contrat- a reclamante contratou o serviço de pedreiro, do reclamado, para a construção de uma casa, após o término da obra a reclamante alega havi- (0.8) haver vários problemas na construção da casa.< a reclamante alega ainda que foi pedido pelo reclamado mais material de 62 → 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 Rui Jorge Rui Jorge Lúcia Rui Jorge Lúcia Rui Jorge Lúcia construção do que foi (efetivamente) usado na obra sendo que esse material foi a ela fornec-, foi por ela fornecido ao reclamado.> agora eu quero [s a b e r o n d e] [a senhora me falou] tá esse material.= =a senhora me falou que ele tinha é:: que a senhora tinha dado material demais. a senhora acha até que ele usou material é: da senhora a mais que a senhora tinha dado. o::, eu falei [t u d o] que ele me pediu. [ falou ] isso aí. a senhora deu = eu [ comprei ] [e tá usado] na casa. =e a senhora falou que-, que a senhora-, que a senhora achou que ele não usou tudo que foi mal usado. até que a senhora comprou muito cimento, muito tijolo, foi o que a senhora me passou aqui. [foi o que a senhora me passou a q u i (.) ], [ eu: falei isso mesmo, eu falei isso mesmo] Na linha 68, em resposta ao questionamento da reclamante, o mediador confirma a informação apresentada por Rui, de que Lúcia havia reclamado do gasto indevido do material. Na linha 70, a reclamante tenta propor uma versão diferente, mas é interrompida por Rui e, em seguida, é feita a leitura da súmula. Mesmo após a leitura, o mediador ainda precisa explicitar, nas linhas 85 a 88, os termos da reclamação feita por Lúcia. Há, nesse momento, um desalinhamento, como já mencionado, entre consumidor e mediador, pois Lúcia tenta se eximir da responsabilidade pelo dito, tanto que na linha 89, ela propõe que seja substituída a acusação (linhas 87 e 88) por uma descrição não acusatória, ―eu falei [t u d o] que ele me pediu‖ (linha 89), na tentativa de desqualificar sua ação como acusação. Só na linha 99, Lúcia se compromete com o dito. Sobre essa reclamação, Rui se defende dizendo que todo o material foi usado na casa, que a fundação feita sustenta duas casas, justificando, assim, o aparente uso excessivo do material. Podemos perceber que o conflito gira em torno de um contrato mal formulado, as partes não conseguem apresentar claramente o que tinham combinado, consequentemente, o mediador não sabe quais eram as obrigações do reclamado na construção da casa. Diante do apresentado até esta parte da audiência, o mediador classifica o problema como falta de comunicação. Segundo Jorge, as partes interpretaram de formas diferentes o serviço contratado. Com essa observação, o mediador desconstrói os enquadres apresentados pelas partes. Segundo ele, não é possível falar em cumprimento 63 ou não do contrato, pois não há um consenso sobre o que foi combinado. Consequentemente, não se pode atribuir obrigações. Dessa forma, o mediador instrui a reclamante a procurar auxílio no juizado especial, como podemos perceber no exceto abaixo: (24) → → → 187 Jorge 188 189 190 191 192 193 194 195 196 197 198 199 200 201 202 203 204 205 206 207 208 209 210 211 212 213 214 215 216 217 218 aqui porque ele fala uma coisa, a senhora fala outra.(0.5) a senhora e, segundo a senhora ele tem uma dívida com a senhora porque ele não executou o problema-, o- o serviço da maneira que deveria ser executada. (0.8) e a senhora tem uma dívida com ele que a senhora reconheceu então, o que a gente va(0.5) o que eu posso sugerir pra senhora é o seguinte, se a senhora (0.5)é afirma(0.2) diz que pode provar que ele não efe- efetuou o serviço combinado na maneira que foi feito. (0.8) o que ele, o que eu posso fazer pra senhora é orientar a senhora pra procurar a justiça, (0.5)tá. o juizado especial, qualquer forma de justiça. até mesmo na, na justiça comum e pleitiar lá, através dessas provas que a senhora tem, a- a- a- (1.0) arrumar o que foi, é o que não foi efetivamente é:: construído. agora eu sugiro a senhora que a senhora arque com a sua parte para a senhora poder exigir a parte dele. entendeu. porque se a senhora chega na, na justiça e e fala que não tem é- é que tá um problema e a senhora não pagou pelo que a senhora pediu, o- o juiz não vai lhe dar ganho de causa. a senhora tá devendo e ele tá devendo. então fica a pendenga. então vamos ver prime- pra ge-, pra você pedir você pedir um direito cê tem que cumprir com as suas obrigações. se a senhora não tá cumprindo (( mediador conversa com outra pessoa.)) tá se a senhora nã::o tá cumprindo com as suas obrigações,(1.0) a senhora não pode exigir dele. o o ((o mediador conversa com outra pessoa)) a senhora não pode exigir dele que ele cumpra com as dele. (0.8) tá. então é (0.5) o que o procon podia fazer Diante da impossibilidade de acordo, pois não há um consenso acerca do que foi combinado, o mediador faz uma sugestão. Porém, nesse exemplo, não podemos pensar na classificação de Casanova (1996) para sugestões personalizadas, pois teríamos um conselho. Na linha 193, o mediador começa a sugestão com o verbo ―sugerir‖, mas quando diz, de fato, o que a reclamante deve fazer (linha 197), ele usa o verbo ―orientar‖. Então, teríamos uma orientação/instrução, o que fazer para solucionar o conflito: encaminhar a questão à justiça, uma vez que o acordo não foi possível. Então a sugestão, apesar de ser personalizada, é classificada como instrução. 64 Já na linha 203, podemos aplicar a classificação de Casanova (1996), embora o mediador continue usando o verbo sugerir, o diretivo agora sim funciona como um conselho. Este atribui uma obrigação para a reclamante, a de pagar pelo serviço prestado, pois essa ação é condição necessária para que ela possa pleitear na justiça seus direitos. O conflito desta audiência gira em torno de um contrato mal formulado, tanto que as partes não chegam a um consenso do que foi contratado, cada um interpretou o acordado da sua forma. Assim, podemos dizer que como não houve um contrato, nem se chegou a um consenso, não se pode estabelecer as obrigações que cabem às partes. b) Estratégia para negociação do acordo: ameaça Nesta audiência, há dois momentos de ameaça, sendo essa estratégia usada por ambas as partes. Primeiramente, é o reclamado quem ameaça a reclamante, como destacamos abaixo: (25) → 167 Rui 168 169 170 171 172 173 174 [se a senhora fala] comigo que não teria como pagar, eu num ia cobrar nunca. sabe que eu nunca cobrei nada de ( ).não gosto de cobrar. aqui, tem um vizinho meu que eu fiz uma casinha pra ele, ele já mora a seis meses e ele não me deu um tostão. nunca cobrei ele. (0.5) a senhora agora vai me: pagar. (0.8) ah que daqui nós vamos no ministério, nós vamos na junta= No excerto (25), a fala de Rui, ―agora vai me: pagar. (0.8) ah que daqui nós vamos no ministério, nós vamos na junta=‖, funciona como ameaça elementar: o falante se compromete em realizar uma ação futura que é prejudicial ao ouvinte, neste caso, levar o caso à justiça. Essa estratégia, porém, não altera os rumos da audiência, ou seja, a reclamante não se compromete a pagar o que deve à parte reclamada, mesmo porque, segundo sua versão, o combinado não foi cumprido. A reação de Lúcia é fazer uso da mesma estratégia, como destacamos abaixo: (26) → 175 Lúcia 176 =ah nós vamos onde tiver que ir seu rui. o senhor então vai ficar provando, vamos ver o quê que vai 65 177 provar. No excerto (26), Lúcia demonstra não se intimidar com a ameaça feita por Rui e retribui com a mesma ameaça, ―vamos onde tiver que ir ... vamos ver o quê que vai provar‖. Ela também faz uso de um tipo de ameaça que Salgueiro (2010) classifica como elementar. Sua fala é um ato comissivo, pois nela há o compromisso com uma ação futura, a de processar o reclamado pelo serviço mal prestado. Assim como essa estratégia não funciona com ela, também não funciona com a parte reclamada, esta não se sente intimidada pela ameaça, tanto que não faz nenhuma proposta para a solução do conflito, se mantém firme na sustentação do seu enquadre e na tentativa de mostrar que quem está errada é a reclamante. c) O papel dos comissivos na resolução do conflito Na audiência Rui pedreiro, as partes não entram em acordo. Rui refuta a acusação de não ter cumprido o contrato, como também a de ter pedido mais material do que foi efetivamente utilizado. Lúcia, por sua vez, não concorda que a casa tenha sido entregue nas condições combinadas, como também aponta falhas na construção da casa. O mediador enquadra o problema como falha de comunicação e encaminha as partes para o juizado especial. Cabe destacar que, nesta audiência, a reclamante não faz nenhum pedido para solução do conflito, tampouco o reclamado apresenta uma proposta, consequentemente, nenhuma das partes assume para si obrigações, logo, não encontramos ações de natureza comissiva nesta audiência. 4.1.3 Audiência Ok veículos Resumo: Na audiência Ok veículos, o reclamante, José, reivindica participação financeira nos gastos que teve com o carro semi-novo comprado no estacionamento do reclamado, Lucas. Este se nega a ter qualquer tipo de despesa, pois o consumidor teve total liberdade na escolha do carro, assim como o direito de levá-lo ao seu mecânico de confiança. Uma das mediadoras, Ana, não aceita essa justificativa de Lucas para não arcar com os gastos do carro. Ao ficar ciente de que o reclamado vende carro em um estacionamento e não em uma concessionária autorizada, a mediadora o pressiona a assumir responsabilidades com os gastos do reclamante. Lucas, então, se compromete com o pagamento de uma peça e em verificar os custos de outra para confirmar ou não seu pagamento também. 66 a) Os diretivos na construção de macro-atos: enquadre do reclamante x enquadre do reclamado Na audiência Ok veículos, os diretivos pouco desempenham papel na apresentação dos enquadres. Esses, praticamente, são construídos a partir dos relatos de cada uma das partes. De um lado, o consumidor baseia a reclamação no fato de SENTIR-SE LESADO. De outro, o reclamado argumenta que a reclamação é infundada, pois o que é reivindicado é de DESGASTE NATURAL, por ser um carro usado. (27) → 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 Lucas Marta Lucas Marta Lucas Marta Lucas >ele fez uma reclamação. não é isso?< fez↓. é porque: ele comprou:: um mo::nza, (0.5) na tu:a:: (1.2) >lá no meu estacionamento.< na loja, né? (0.5) e: no primeiro mês de uso o carro::: (0.2) apresentou alguns (0.2) defeitos ou- e ele teve que:: (0.5) arca:r com isso. = =°sei°. (0.8) então ele tava querendo:: que:- porque: (.) como saiu da loja ele tem que ter noventa dias de:: (0.5) [garantia]. [garantia] de motor e caixa. No início da audiência, é o reclamado, Lucas, o primeiro a fazer uso de um diretivo. O pedido de informação dele, linha 03, abre espaço para que a mediadora apresente a reivindicação do consumidor. Embora a apresentação dela seja interrompida pelo reclamado, na linha 16, quando passam a discutir o que a garantia cobre, já podemos perceber que a mediadora reivindica, em nome do reclamante, que algum procedimento seja tomado pelo reclamado, na forma de ressarcimento pelos prejuízos sofridos A construção ―ter que‖, usada pela mediadora na linha 14, legitima a reivindicação feita pelo consumidor. Segundo Cunha Lacerda (2011), construções desse tipo possuem sentido deôntico26, dessa forma o uso dessa construção atribui responsabilidade ao reclamado. Nos turnos seguintes, o reclamado Lucas apresenta seu enquadre, como destacamos nos excertos abaixo: 26 Modalidade deôntica é aquela relacionada à instanciação de obrigações e permissões. 67 (28) → 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 Lucas Marta Lucas Marta Lucas ele esteve na lo:ja, pra comprar um carro.>uma uno< um ponto seis zero. (0.5) unhum.= =comp- (0.8) >olhou a uno, levou a uno no mecânico. voltou (0.5) dizendo< que a uno tinha um defeito. (0.5) mandamos arrumar. ele passou o final de semana com o carro. (1.0) não- não- não no domingo, [(.)> lá] na na< no sábado (não sei) na segunda- feira, [↑unhum.] >ele ligou dizendo que não queria< o carro. (29) → 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 Lucas AÍ, (0.8) >>ele falou que não<< queria ficar com o carro. aí >ele falou assim<, então eu vou escolher outro carro. >(então) cê< fica a vontade. escolheu um gol.(.)levou o gol pro mecânico dele. (.)o mecânico reprovou o carro.(.)ele voltou. aí ele escolheu um monza(0.5)levou o monza no mecânico. (0.2) o monza tá tudo certo. tá. serve pra você. serve. ficou com o monza. (1.0) levou o monza. no dia que: >no- no-< depois no sábado, o monza apareceu um defeito, quebrou a: um- uma balança lá. (0.5) ele ainda me ligou, foi mandado arrumar a balança. agora depois de três meses ou dois meses que >(tem- que ele me) comprou o carro,< ele me trouxe essa reclamação, dizendo que tem algumas coisas- que foram gastas algumas coisas no (.)carro. <agora o que foi gasto no carro, (0.2) eu nem sei o quê que é. nem vi. Lucas ele tá alegando ó:leo, filtro- é: ve:la, essas coisas (.) tem que ser fe:ito (0.2) quem compra um carro usa:do, (.) unh[um]?, [ a] gente fala. >tem que fazer a revisão no carro.< (.) ele me comprou ciente a essas coisas. (0.8). <porque a gente não enganou ele em nada. (1.0) agora. essa reclamação que ele fe::z, (1.5) num posso- (0.5) agora a garantia de motor e caixa, a gente é- a gente:: (.) é obrigado. (30) → 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 Marta Lucas Nos excertos de (28) a (30), temos o relato do reclamado Lucas sobre a compra do veículo. O enquadre que ele quer construir é de que o cliente teve total liberdade de escolha, que pôde levar o carro em seu mecânico de confiança e que, se o veículo foi comprado foi porque não apresentava nenhum defeito, ou seja, o reclamado quer mostrar que o consumidor não foi enganado, consequentemente, não tem fundamento o fato de ter se sentido lesado. Além disso, o reclamado também quer mostrar que o carro é usado e que, portanto, é necessário fazer a manutenção do veículo – informação esta 68 que ele também diz ter passado para o consumidor –, pois os problemas apresentados são de desgaste natural. Particularmente no excerto (30), o uso da construção ―ter quer‖, linhas 86 e 90, pelo reclamado atribui a responsabilidade de fazer a manutenção ao consumidor. Ao construir esse enquadre, o reclamado quer se eximir, já de início, de qualquer responsabilidade que possa ser a ele atribuída durante a audiência. Nos turnos seguintes, o reclamante José justifica que não ficou com nenhum dos carros vistos, pois apresentavam problema, inclusive, diz explicitamente que foi enganado, como podemos perceber no excerto abaixo: (31) → 132 Lucas 133 134 135 Marta 136 José 137 138 139 140 141 ºcerto.º >me- me< venderam o carro como direção hidráulica, =>o carro não tinha direção hidráulica.< (1.8) ººunhum::.ºº <propaganda enganosa, né.= falar uma coisa que não tem. (1.2) voltei lá no sábado. (0.8) ah, >o carro (dá pra ir- (não) apresentava o defeito isso e aquilo. =voltei. (0.2) tudo bem↓ conversei levei um gol, (.) >peguei um gol,< (.) o mecânico reprovou, (0.2) O relato acima é uma tentativa de desconstruir a imagem apresentada pelo reclamado Lucas, de que o reclamante não teria sido enganado, um dos carros vistos foi oferecido com direção hidráulica sem tê-la. Em seguida, o reclamante passa a questionar os gastos que teve com o carro ainda no primeiro mês de uso. A versão do reclamante é também apresentada por meio de relatos, como destacamos abaixo: (32) → 193 José 194 195 196 197 198 199 200 201 202 203 204 205 206 207 =arrumou o carro. (.) tudo bem. aí: (0.8) passou tudo bem. aí: teve um dia que eu levei o carro pro esporte, fui jogar bola, o carro me: deixou na mão lá. não- não ligava >nem pro caramba. (do mesmo jeito.)< levei logo no:: meu mecânico e tá a notinha aqui. eu tenho que trocar ainda: (0.5) quatrocentos re- já- fora o que eu gastei eu tenho que (.) gastar mais quatrocentos e pouco, porque eu tenho que trocar (1.0) um negócio >que você sabe< que: desde o primeiro dia que eu peguei (1.0) tá dando- tá com problema, e tenho que trocar(.) bomba elétrica. é duzentos e poucos reais. eu com o carro que eu- tenho dois meses- paguei a segunda prestação agora, e vou gastar mais de mil e cem reais no carro. =>num tem condição. = é três prestações que eu vou pagar.< 69 Como podemos perceber no excerto (32), o reclamado José enquadra as despesas que está tendo com o carro como um gasto injusto, pois além de estar pouco tempo com o veículo, o valor pago no conserto poderia ser usado para pagar as prestações. Com esse enquadre, José tenta atribuir responsabilidades a Lucas, inclusive, aponta que o carro já tinha saído da loja com um dos problemas. Após o relato das versões, conseguimos vislumbrar os enquadres que as partes estão tentando sustentar. O reclamante José sente-se lesado pelos gastos, enquanto o reclamado Lucas defende o desgaste natural das peças devido ao tempo de uso do carro. Diante da refutação de Lucas em aceitar o enquadre do consumidor, a mediadora, Marta, em alinhamento ao consumidor, – como normalmente acontece nas audiências de conciliação – ressalta que o consumidor sentiu-se lesado, desconsiderando, assim, o enquadre de desgaste natural. Como poderemos perceber no excerto seguinte, mesmo após seu enquadre ser desconsiderado pela mediadora, o reclamado insiste em sustentá-lo. Diante disso, a mediadora faz uso de um diretivo para verificar a fundamentação do enquadre do consumidor, como destacamos abaixo: (33) → 229 230 231 232 233 234 235 236 237 238 239 240 241 242 243 244 245 246 Marta Pedro José Lucas Lucas José Marta José [o consumidor] se sent[iu lesa::]do?= [aqui a↓]((mostra alguma coisa a José)) <esse cabo de ignição, um cabo de vela que ele teve que trocar, = =ºse sentiu lesado mas (.) >>a partir do momento- a gente não enganou ele em nadaº. ele levou o carro no mecânico dele, o mecânico dele- o mecânico aprovou o carro pra ele comprar.<< (1.2) porque se o carro tivesse ruim, ele não tinha comprado o carro. (1.5) [ºdeu defeito:º]. [não. era um de]feito que: dava pra:: perceber:: ou não? claro. que- num tem jeito. ( ), [bomba elétrica, uma peça elétrica], Como podemos observar no excerto (33), o diretivo usado por Marta, na linha 243, abre espaço para que o reclamante ratifique seu enquadre, pois os problemas apresentados não eram visíveis. Cabe ressaltar que o diretivo usado pela mediadora tenta enquadrar a reclamação no artigo 26 do CDC, segundo o qual o consumidor 70 dispõe de noventa dias para reclamar de problemas visíveis. Como o carro estava no prazo e também, por não se tratar de defeito visível, o reclamante tem seu direito, de que o reclamado contribua com os gastos dos reparos, legitimado pelo CDC. Nesta audiência, os diretivos não desempenharam importante papel na apresentação das versões, mas eles são usados nas tentativas de resolução do conflito, como aprofundaremos no subitem abaixo: O uso dos diretivos nas tentativas de resolução do conflito (34) → 310 Marta 311 312 313 não, pera aí::::: (dá uma paradinha gente pode faze:r, (.) corre:ia, eu:- José:. ºva::mos com calma.º (1.8) °aqui°). (2.2) vamos ver o quê a <por isso, (.) pra trocar. porque: eu: entendo [muito pouco ]= Como ambas as partes estavam apenas sustentando seus enquadres, a mediadora Marta sugere que as propostas para a resolução do conflito sejam apresentadas. Como podemos perceber no excerto (34), no diretivo usado pela mediadora, linha 311, há uma perífrase de futuro, ―vamos ver‖, com valor imperativo, mas ao se incluir na busca por uma resolução, a construção tem sua força diretiva atenuada, soando como um convite. Com esse convite, ela reivindica que tanto o reclamante, quanto o reclamado assumam responsabilidades para a construção de uma proposta – de acordo com o que estaria ou não coberto pela garantia. Nos turnos seguintes, o reclamante José concorda com a mediadora Marta que o reclamado Lucas não deve arcar com todas as despesas, enquanto este continua sustentando seu enquadre e se negando a pagar pelos gastos do consumidor. A mediadora, fazendo uso de um diretivo, pede explicitamente que as partes apresentem suas propostas, como destacamos abaixo: (35) → 327 Marta 328 329 330 331 José 332 333 Lucas 334 335 [ então vamos fazer ] o:: seguinte, (.) é:: Lucas, (1.2) apresenta uma proposta, (.) do que você pode pagar aqui pra ele, depois você vai apresentar a sua contraproposta.= =já paguei trezentos reais de mecânico, (<ainda tá:::)(só que o carro ainda não [tá:: ó-)] º[isso aí] eu não tenho. eu tenho sócio, eu tenho que conversar com e:le. isso aí eu num posso [( )]º 71 No excerto (35), a mediadora tenta fazer com que as partes entrem em acordo, o diretivo usado na linha 328 é uma ordem, tanto que ela usa a forma imperativa, ―apresenta‖. Segundo Casanova (1996), um enunciado pode ser interpretado como ordem, se houver diferença de poder na relação. Como a mediadora é representante do PROCON, podemos dizer que ela é instituída legalmente de poder, apesar disso o reclamado se nega a apresentar uma proposta. Nos turnos seguintes, o reclamado sustenta seu enquadre de que se o consumidor teve liberdade de escolha, não tem como obrigação arcar com os gastos, que ele considera desgaste natural. Diante da refutação, por parte do reclamado, para apresentar sua proposta, a mediadora Marta se dirige ao consumidor, pedindo para que este então comece a apresentar seu pedido, como destacamos abaixo: (36) → 349 Marta 350 351 José 352 então::: você começa com a sua propo:sta. (vamos ver o quê) ele faz? >eu quero [o ↑lícito] uai.< qualquer lícito. ele sabe [o quê]= Ao usar o diretivo, linha 349, a mediadora quer verificar o que o reclamante deseja que seja pago. Novamente, a mediadora faz uso da forma imperativa, ―começa‖27. Por também exercer poder sobre o reclamado, o diretivo usado por ela pode ser interpretado como ordem. Embora, atenda a solicitação, o reclamado não faz nenhum pedido explícito, pede apenas o pagamento do lícito, atribuindo ao reclamado a responsabilidade de decidir o que deve ser reembolsado. Nos turnos que seguem ao trecho destacado acima, o reclamante Lucas resiste a apresentar qualquer tipo de oferta, a mediadora, então, insiste para que, pelo menos, o reclamante diga o que gostaria que fosse pago para resolver o conflito, os excertos abaixo confirmam isso: (37) → 27 461 Marta 462 José 463 é (voltam-) vão:::- faz a sua proposta.= =é igual:- >se eu- se eu < num mandasse trocar algumas coisas aqui no carro?, o quê que aconteceria A forma gramaticalmente correta do imperativo é ―comece‖, porém, estamos considerando ―começa‖ como imperativo, visto que no Português brasileiro, o imperativo afirmativo de segunda pessoa do singular normalmente é usado com o pronome de tratamento você. 72 464 465 com o motor. o carro não ia parar. (1.0) você não te:m- que trocar? (38) → 470 471 472 473 474 475 476 477 478 479 Marta José Marta José então faz sua proposta. [v ã o lá José] [não, minha propor]sta é o q[eu- eu-] [é tudo.] eu quero o segui:nte. eu quero que ele- (.) que elevê o quê que ele pode fazer, porque eu não tenh-, não é que eu num tenha condição. eu não vou: (.) pagar mil e cem reais num conserto, (.) que eu tô pagando trezentos reais num carro, trezentos e pouco. eu vou pagar mais mil reais a mais. não tem condição. Nos excertos (37) e (38), o diretivo usado pela mediadora, linhas 461 e 470, respectivamente, soa como pedido. A mediadora utiliza o verbo ―fazer‖, normalmente, usado em construções do tipo: ―faz um favor‖. Mesmo sendo instado pela mediadora a apresentar um pedido ao reclamado, José se nega a dizer quais peças gostaria e/ou acha justo que sejam pagas. Mais uma vez, deixa para que o reclamado avalie o que pode pagar. Segundo Garcia (1997), quando uma das partes toma uma posição, ou seja, apresenta o que gostaria que ocorresse para solucionar o conflito, ela está limitando sua participação na negociação do acordo, pois ela não terá mais como voltar atrás e corre o risco de receber menos do que a outra parte poderia estar disposta a fazer. Nesse sentido, conseguimos entender a recusa de José em formular um pedido explícito, pois se ele reivindica o pagamento de uma nota apenas, não poderá mais pleitear o pagamento de todas as notas, por exemplo. Diante da recusa do reclamante José em apresentar seu pedido, a mediadora Marta volta a insistir que o reclamado Lucas, então, faça a sua proposta, como destacamos no excerto abaixo: (39) → 493 494 495 496 497 498 499 500 501 502 Marta José Marta Lucas olha, com mais esse preço que você vai gastar, você compraria [u::::::::m-] [com certeza]. (0.5) um outro carro. (0.8) vão Lucas. vão vê o quê que a gente pode fazer aqui? (1.5) °a reclamação dele° (.) se o carro tivesse:: quebra:do, fundido o motor igual perante a garantia, (.) aí [ sim ] 73 No excerto acima, ao se incluir na solicitação de apresentação de proposta, fazendo uso da primeira pessoal do plural, ―vão‖, uso coloquial de ―vamos‖, o diretivo usado por Marta pede sua força de ordem e soa como um convite. Como já destacamos, o PROCON é um órgão de defesa do consumidor, portanto, a mediadora está defendendo o enquadre deste e que não é justo que ele arque sozinho com os consertos. Até este momento da audiência, o reclamado Lucas está relutante em aceitar fazer qualquer tipo de acordo, pois a garantia dada por ele cobre apenas motor e caixa, após um longo período de discussão, sem chegar a um consenso, entra na audiência a advogada do PROCON, Ana. A advogada Ana faz uso de sequências diretivas para verificar o enquadre legal da reclamação. A primeira preocupação dela é se o carro ainda está na garantia de noventa dias, ao saber que sim, a advogada refuta o argumento do reclamado Lucas de que a garantia cobre apenas motor e caixa e atribui a ele a obrigação de arcar com qualquer defeito que não fosse perfeitamente visível. Ela também atribui ao reclamante a obrigação de pagar as peças que são de desgaste natural do carro. Agora é a advogada Ana quem reivindica que uma proposta seja apresentada, como destacamos abaixo: (40) → 608 609 610 611 612 613 614 615 616 617 618 619 Ana Lucas Marta Lucas Marta Lucas Pedro Lucas [ºvocê tem que apresentar uma proposta para eleº]. =é:: balança, >não mas ele-< ele não quer proposta nenhu:ma. é:: p[ a s t i l h a ], [mas você veio aqui] para (apresentar) s[ua proposta]. [trava de pa]stilha, disco de fre:io. a correia é dentro do motor, você tem que abrir o motor para você ver. é (você vê que), tudo isso são coisas de desgaste natural do carro. O diretivo usado pela advogada Ana é uma ordem, também legalmente instituída de poderes, a advogada reivindica que o reclamado assuma responsabilidades e que apresente uma proposta. A construção usada por ela – ―tem que apresentar‖ – tem, nesse contexto, força imperativa, equivale a ―apresente‖. A mediadora, Marta, reporta que o reclamado Lucas se recusa a apresentar qualquer proposta, enquanto este, paralelamente, discute com o reclamante José que as peças trocadas são de desgaste natural do carro. 74 Para dar prosseguimento à audiência, a advogada Ana faz uso de uma sequência de diretivos com o objetivo de verificar informações, dentre as perguntas feitas por ela, destacamos: (41) → 710 Ana 711 712 José 713 Lucas 714 [e nota] fiscal do carro? cadê ela?= =nu- nu- nu me deram. ºº( ) o carro )ºº. ((riso de José)) é a:::::de terceiro e a ( Ao descobrir, através do uso do diretivo acima, que o reclamado não emitiu nota fiscal da venda do carro, pois o veículo foi vendido em uma empresa não autorizada a fazer transações de compra e venda (um estacionamento), a representante do PROCON consegue mudar o rumo da audiência, como destacaremos no item (b), desta seção. b) Estratégia para negociação do acordo: ameaça Das audiências analisadas, esta é a que a ameaça aparece mais claramente funcionando como uma importante estratégia para encaminhar a audiência para a resolução do conflito. A mediadora é quem faz uso dessa estratégia, a fim de conseguir que o reclamado – relutante em fazer uma proposta – seja desarmado e se proponha a solucionar o conflito. Como observado no final da seção anterior, a mediadora, ao fazer uso de um diretivo, descobre que não foi emitida a nota fiscal de compra do produto, pois o carro foi vendido em um local não licenciado para venda de automóveis. A primeira ameaça, então, é feita, mais de forma implícita, como destacamos abaixo: (42) → 755 Ana 756 757 758 759 760 761 Lucas 762 763 se você vendeu lá dentro do seu:: do::- da- do- da:: sua loja (0.8) no seu contrato social, está como vendedor de carro, você vai me desculpar mas você tem que dar uma nota fiscal. (6.0) o quê que nós vamos fazer aí pra resolver isso é :: lucas? (9.5) deixa eu ver. oh! essa bomba aqui eu pago toda. pronto, pra não ter conversa pra não ter- pra não te::r-, essa bomba (elétrica). 75 No excerto (42), a mediadora usa a construção, ―você tem que dar uma nota fiscal‖ para chamar o reclamado a assumir responsabilidades para a resolução do conflito. A ameaça aqui é implícita, a mediadora não fala em sonegação de imposto, mas é isso que quer significar. Esse enunciado pode ser interpretado como uma ameaça, tanto que, no turno seguinte, Lucas faz a proposta de pagar por uma peça. Cabe ressaltar que até este momento da audiência, o reclamado sustentava seu enquadre de que os problemas apresentados eram de desgaste natural do carro e que não era sua obrigação arcar com nenhuma despesa. Podemos explicitar essa ameaça pela seguinte paráfrase: ―se não fizer uma proposta, vou denunciá-lo para a receita federal‖. A ameaça é, portanto, diretivocomissiva, o objetivo é primeiro convencer o reclamado que não há alternativa a não ser a de fazer uma proposta. Ao apresentar a proposta, consequentemente, estará se comprometendo a realizar, futuramente, a ação prometida. O diretivo que aparece nas linhas 758 e 759 serve para abrir espaço para a apresentação da proposta. Cabe destacar que a mediadora se dirigiu ao reclamado, várias vezes, pedindo a apresentação de uma proposta e ele sempre se negava, até ser ameaçado, o que demonstra a força dessa estratégia na resolução do conflito. A mesma estratégia é usada no excerto abaixo: (43) → 830 Ana 831 832 833 834 835 Lucas [se a gente for pedir essa n o t a f i s c a l . ] (3.5) se a gente for pedir essa nota fiscal, vai ficar mais enrolado ainda, né? (3.2) duzentos e cinquenta e um, é tudo que eu posso pagar. No excerto acima, novamente a mediadora ameaça, implicitamente, a denunciar o reclamado para a Receita Federal pela falta da nota fiscal do produto, ―se a gente for pedir essa nota fiscal (...) vai ficar pior‖. A ameaça é também do tipo diretivocomissiva, tem como objetivo fazer com que o reclamado melhore a proposta feita (parte diretiva), caso contrário, a mediadora se compromete a fazer uma ação que é prejudicial ao reclamado (parte comissiva), denunciará o caso à Receita Federal. Dessa vez, porém, a estratégia falha, pois o reclamado permanece com a proposta de pagar apenas uma peça. 76 Novamente, a mediadora tenta melhorar a proposta apresentada pelo reclamado para a solução do conflito. Dessa vez, ela explicitamente, ameaça a encaminhar a questão para a justiça, como destacamos abaixo: (44) → 849 Ana 850 851 então a gente encaminha isso pra justiça::, e pra receita pra- pra: questionar sobre as not[ as também. ] A ameaça é aqui diretivo-comissiva, fica claro, no excerto acima, que o objetivo da mediadora é convencer o reclamado a melhorar a proposta. Ameaças diretivocomissivas são, primeiramente, uma estratégia de persuasão, o objetivo é levar o ouvinte a realizar algo que é do interesse do falante, ou seja, atribuir a ele uma obrigação, que é o mesmo objetivo dos atos diretivos. Caso o ouvinte não seja persuadido, o falante se compromete a realizar uma ação futura para prejudicá-lo, por isso, esse tipo de ameaça é classificado como diretivo-comissiva. Após uma longa negociação, essa estratégia surte efeito novamente, o reclamado se compromete a verificar também o valor de outra peça para decidir se responsabilizarse-á também por ela. Como o compromisso é o de verificar e não o de pagar por mais uma peça, a mediadora novamente faz uso de uma ameaça diretivo-comissiva, como destacamos abaixo: (45) → 1317 Ana 1318 1319 1320 1321 1322 Pedro 1323 Ana 1324 =então que::, a proposta seria ele pagar essas duas peças, tá?. e se que ele vai nos dar uma resposta até amanhã cedo, (1.2) de que:: se vai realmente arcar com isso, e que dia que entrega, para gente ver vai encerrar ou não es[s a : -]= >[é igual]< =esse processo, TÁ? e:: vê também com relação a::, a nota fiscal, né.= No excerto acima, a mediadora já considera o pagamento de duas peças como a proposta do reclamado e faz questão de lembrá-lo se assim não for, o processo não será encerrado, pois ele terá que responder, na justiça, pela sonegação. c) O papel dos comissivos na resolução do conflito 77 Como visto no item anterior, Ana faz uso de ameaças do tipo diretivocomissivas, o que faz com que Lucas mude sua postura e assuma responsabilidades no conserto do carro, como perceberemos nos excertos abaixo: (46) [13: 55] [14: 01] → 761 Lucas 762 763 deixa eu ver. oh! essa bomba aqui eu pago toda. pronto, pra não ter conversa pra não ter- pra não te::r-, essa bomba (elétrica). No excerto acima, o reclamado Lucas, finalmente, aceita pagar por uma das peças. Como o reclamado assume a obrigação de pagar pela bomba elétrica, temos o uso de um comissivo. Como vimos, no item (b) acima, a mediadora tenta negociar com o reclamado uma proposta melhor. Após uma longa discussão, o reclamado Lucas se compromete a verificar o valor de mais uma peça, um sensor e, dependendo do valor deste, também assumirá a responsabilidade no pagamento do sensor, como destacamos abaixo: (47) → 1156 Lucas 1157 1158 1159 1160 1161 Ana 1162 Lucas 1163 [o negócio é o seguinte ]. eu vou apreçar uma bomba disso aqui, isso aqui eu já me proponho a pagar, porque eu já tô falando aqui. (.) [e isso aqui], eu vou ver quanto que custa, . e te ligo para você e= [o sensor? ] =te falo. eu dou meu parecer:, eu compro ou não compro. isso aqui eu já não proponho a pagar não. No excerto acima, Lucas usa o comissivo para se comprometer em verificar o valor de mais uma peça para dar resposta no dia seguinte se arcará também com essa despesa, o reclamado não se compromete com o pagamento, mas sim, em verificar a possibilidade de pagar também pelo sensor. A audiência termina com o reclamado Lucas se comprometendo com o pagamento da bomba e em verificar se pagará também o sensor, a advogada Ana estipulou um prazo até o dia seguinte para que o acordo fosse firmado ou não. 78 4.1.4 Audiência Gesso Resumo: Na audiência Gesso, a reclamante Sandra alega que o reclamado não concluiu o serviço combinado, além disso, o que já foi feito não corresponde ao valor pago por ela. O reclamado, Pedro, por sua vez, alega que o serviço foi interrompido pela própria consumidora e que, por isso, não está concluído. Ele alega também que não é possível fazer o cálculo proporcional do valor pago com o que já está concluído, pois o orçamento corresponde ao serviço prestado integralmente. Como as partes não entram em acordo, a advogada, Carla, encaminha o caso para o juizado especial. a) Os diretivos na construção de macro-atos: enquadre do reclamante x enquadre do reclamado Na audiência Gesso, os enquadres são construídos com base nos relatos das partes. De um lado a reclamante, Sandra, alega que PAGOU MAIS do que foi feito, reivindicando, assim, a conclusão da obra com base no valor já pago. De outro, o reclamado, Pedro, alega que não é possível calcular se o que já foi feito corresponde ao valor pago, pois o orçamento corresponde ao VALOR TOTAL DO SERVIÇO. Os diretivos abrem espaço para a apresentação desses enquadres, mas são usados, principalmente, para atribuir responsabilidades. Primeiramente, destacamos os diretivos desencadeadores da apresentação dos enquadres, assim como os próprios enquadres. (48) → 01 02 Flávia bom, ô: seu pedro eu não sei se você se inteirou na carta do que tava acontecendo No excerto (48), a mediadora, Flávia, verifica através de um diretivo, no caso, um pedido de informação implícito, se o reclamado, Pedro, está ciente da reivindicação da reclamante, Sandra. Esse diretivo abre espaço para que o reclamado apresente sua versão da reclamação, como destacamos abaixo: (49) → 22 23 24 25 26 27 28 29 Pedro é: . então nós fechamos o valor com ela de dois mil reais pra quê: ela tem três quarto na casa dela, tem um banheiro suíte, um banheiro social, um hall de escada , um lavabo ,cozinha, sala de jantar e ela é ligada ( ) foi apresentado pra gente um projeto de uma firma concorrente nossa então nós orçamos o valor em cima desse o desse projeto vão fazer vão fazer papapá. ficou 79 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 estabelecido que ela nos daria quinhentos reais mensais ,lá teve problema de parte elétrica, a cozinha atrasou um pouquinho, o:: azulejo pra poder, fomos embora, aí ela nos pagou mil reais, duas prestações de quinhentos reais, aí nós fizemos, os três quartos tão concluídos tem um friso do quarto dela que o esposo dela alegou que tinha um armário que vai ser feito que a posição do projeto não estava de acordo porque ia avançar o guarda-roupa e o friso não poderia ser ali o projeto na ma mas nós concordamos também num não tinha problema não. (1.8) o banheiro tem que fazer ( ) rapaz pra fazer o projeto (1.4) um vidro que ela desejasse cortar porque era vidro jateado tem que ela que tem que decidir. eu posso sugerir mas quem tem que decidir é eles. não sou eu, cê entendeu. a sala dela deu um problema técnico, de execução , não tinha no projeto da menina os tubos passando, depois passaram a ter, entendeu. então foi sugerido em função do que ocorreu um detalhe , por vários detalhes a gente sugeriu e deixou eles decidirem , um dia o esposo dela pegou e falou as- eu quero parar o serviço. (1.56) ele também não falou eu quero parar definitivo, de repente falou quero parar pra poder ver o que podia ser feito ( ) não retomou mais, ele não falou mais. aí eu fui lá, peguei o material nosso (1.45) aí depois ele quis negociar o valor de novo , ele alegou que não tinha o dinheiro e tal aí que até fez um acordo do outro valor. e ele não chegou em acordo porque eles não chegaram acordo, ué. mas que parou o serviço foram eles. (50) → 62 63 64 65 66 67 68 Pedro [ só q]ue nem valor, ela falou mil reais, nós não executamos o serviço, nós fechamos um serviço de dois mil reais. não tem discriminação do que é mil que deixa de ser mil. nós temo um valor, dois mil. a gente conclui. agora, só que tem como a gente vai receber se ela quer que a gente conclui, tá entendendo. O excerto (49) é um relato, no qual o reclamado esclarece que o serviço foi interrompido a pedido da parte reclamante, com isso, Pedro se exime da responsabilidade de não ter cumprido o acordo. Ele destaca, ainda, que todos os problemas que surgiram no projeto não foram da responsabilidade dele, mas sim por indecisão da consumidora ou por problemas no próprio projeto apresentado. No excerto (50), o reclamado apresenta seu enquadre da reclamação. Segundo ele, o valor total do serviço é de dois mil reais não sendo possível especificar o que, em serviços, corresponde ao valor já pago. Ao dizer que está disposto a concluir o serviço, faz uso de um comissivo, pois assume a responsabilidade de concluir os serviços iniciados, esse ato será aprofundado item (c), desta seção. 80 Novamente, o diretivo é usado pela mediadora, dessa vez para abrir espaço para o relato da reclamante, como veremos abaixo: (51) → 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 Flávia sandra, a sra. tem alguma coisa [ ( ) ] Sandra [ flávia,] o negócio é o seguinte, desde o início começou-se o serviço eles trabalhavam três dias e só iam pra receber dinheiro no meu serviço. isso aconteceu duas vezes. eu já até coloquei pra você. sendo que esses detalhes se vai por vidro ou não, depois o carlos conversou com o lucas e falou, conversou com o cara do vidro e falou, a gente não tem condição de pôr vidro agora, aí o cara do vidro falou olha, vocês mandam fazer o acabamento que tem que ser feito depois a gente quando você puder você encaixam o vidro. ficou feito isso. só que, o serviço todo deu três partes foram feitas; foram três sancas, mas assim, onde vai entrar iluminação que estava no projeto, isso aí não foi [ mexido. ] Na linha 69, do excerto acima, o diretivo, nos termos de Casanova (1996), é classificado como pedido, no caso, de informação, ao usá-lo, a mediadora abre espaço para a versão da reclamante. Ao tomar a palavra, Sandra refuta a acusação de ter atrasado o projeto por indecisão. Como também alega ter interrompido o serviço, porque o reclamado pouco fazia, apenas ia receber o pagamento. Em seguida, ela passa a apontar quais partes do acordo não foram cumpridas na tentativa de atribuir ao reclamado responsabilidades. Nos turnos seguintes, a reclamante continua tentando responsabilizar o reclamado por falhas na execução do projeto e categoriza o serviço prestado como de má qualidade. Dessas tentativas, o reclamado se defende atribuindo responsabilidade a parte reclamante, como também refuta que o serviço prestado seja ruim, embasando seu argumento em serviços já executados e o tempo em que trabalha no ramo. Após vários turnos discutindo a qualidade do serviço prestado, o reclamado, Pedro, faz uma proposta para a resolução do conflito, como destacaremos no subitem que apresenta o uso dos diretivos nas tentativas de resolução do conflito. Após a proposta, a reclamante inicia a apresentação de seu enquadre, como podemos perceber nos turnos abaixo: (52) 244 Sandra [olha só, o]lha só o o orçamento do dia vinte e 81 → 245 246 247 248 249 250 251 252 253 254 255 256 três. olha só quartos os três quartos trezentos reais, então vamos somar tá. o corredor que só tá no forro, não tem mais nada. aqui tá o corredor com rebaixo, ou seja, teria de ter o acabamento, duzentos reais. vamos fingir que tá está pronto. quinhentos tá= Pedro =mas ninguém falou que está pronto= Sandra =o banheiro, os banheiros, banheir- cem reais. a friso da- da- da- da porta também não tá colocado trinta reais. cozinha cem reais. se você somar são 600 reais se estivesse pronto. e não [tem nada pronto. não tem] No excerto (52), a reclamante, com base no orçamento fornecido, faz os cálculos de quanto sairia o serviço já prestado, para mostrar que ainda não foi realizado o referente ao valor pago, mas ela ainda não explicita seu enquadre, apenas após a insistência do reclamado em oferecer-se para concluir o serviço, mediante o pagamento do valor restante, que ela apresenta seu enquadre, como destacamos abaixo: (53) → 339 340 341 Sandra [ eu não quero o flávia! ]eu quero os mil reais que eu paguei, que eles façam os m[il reais ] No excerto (53), ao mesmo tempo, a reclamante refuta a proposta do reclamado e apresenta seu pedido que é compatível com seu enquadre, de que o serviço realizado até então não corresponde ao valor já pago por ela. Cabe destacar que enquadre aqui não é entendido como as partes classificam o problema, mas sim, o que sugerem para a resolução do conflito. De um lado, a reclamante reivindica a conclusão do serviço referente ao valor pago e de outro, o reclamado se dispõe a concluir o serviço mediante o pagamento do valor total. O uso dos diretivos nas tentativas de resolução do conflito Diante dos enquadres apresentados, as partes passam a negociar o acordo. Para verificar a possibilidade de o pedido da reclamante ser atendido, a mediadora faz uso de um diretivo, como destacamos abaixo: (54) → 371 372 Flávia vamos fazer o seguinte. o senhor acha que tem mil reais na casa dela pro::nto. 82 373 374 375 376 377 378 Pedro eu acho não. eu num num, não é que acha que tem não, tá entendendo. como o valor dela foi fechado pra fazer dois mil, então vão orçar hoje e a gente vai achar mil reais lá, tá entendendo. e ela vai orçar e ela vai não vai achar. porque isso aí e tá numa interrogaçãozinha aí e::: quem [vai chegar isso aí.] No excerto acima, o pedido de informação da mediadora parece querer confrontar o reclamado com a avaliação da reclamante. Cabe destacar que a mediadora, ao fazer esse confronto, está legitimando o enquadre da reclamante, pois o direcionamento que dá às negociações – verificar se o serviço prestado corresponde ao valor de mil reais – tem como base o enquadre de Sandra, o de pagou mais do que foi de fato realizado. O reclamado, contudo, se nega a considerar o enquadre da reclamante. Segundo ele, qualquer negociação deve partir do pressuposto de que há um contrato firmado de dois mil reais e que implica a conclusão da obra. Diante da refutação dele, a reclamante faz uso de um diretivo, como apontamos abaixo: (55) → 378 379 380 381 382 383 384 385 386 387 388 389 390 391 392 393 394 395 396 397 Sandra Pedro Carlos Sandra Pedro Sandra Pedro Sandra Carlos [porque olha, o] senhor lembra que quando a gente conversou no:: telefone, o senhor falou que:: quanto que era o metro quadrado. não, eu sei. doze mil, doze reais o metro linear. o dela lá só tem quadrado na cozinha, no banheiro:: suíte, entendeu no no banheiro social, no lavabo é só tem isso por que foi o que foi feito. forro[ liso. forro liso. ] [ não, não importa. ]forro liso é [ forro, minha filha, tá entendendo.] [ tá! doze hoje. quando eu orcei, ]tá, ( ) seis reais o metro quadrado. mas [eu te paguei na época, te paguei em maio,] [ mas você orc-, olha só não, não] te paguei em abril e maio. [forro não, forro a seis reais não pode] No excerto (55), Sandra insiste em negociar seu enquadre, pois, para ela é possível estabelecer uma correspondência entre valor pago e serviço realizado. Ao fazer uso do diretivo, linhas 380 e 381, a reclamante quer provar que é possível estabelecer proporção entre serviço prestado e valor pago. Nos turnos seguintes, as partes trocam várias ofensas e acusações, a ponto de o reclamado desistir da proposta feita inicialmente, como destacamos abaixo: 83 (56) → 643 644 Pedro e se você me der [eu num quero]= mil reais pra mim fazer hoje Diante do impasse, entra na audiência a advogada do PROCON, Carla. A advogada faz uso de um diretivo, como destacamos abaixo: (57) → 691 692 693 694 695 Carla [ existe um contrato.] Flávia não, não existe [contrato] Sandra [ eu tenho] recibo que eu paguei mil reais Flávia ela só tem um recibo Na linha 691 acima, a advogada faz uso de um diretivo, classificado como pedido de informação. Ao questionar sobre o contrato, a advogada procura um documento legal no qual poderia se basear para atribuir responsabilidades às partes. Nos turnos seguintes após essa informação, as partes trocam novas ofensas. Então a advogada tenta organizar a audiência, fazendo uso de uma sequência de diretivos, ela instrui as partes quanto ao objetivo da audiência e as limitações do órgão. (58) → 761 762 763 764 765 766 767 768 769 770 771 772 773 774 775 776 777 778 Carla dessa reunião aqui hoje é uma conciliação, tá. chegar num acordo em comum. agora, discuti::r, trocar ofensas, não vai chegar a lugar nenhum. então cada um tem que manter a calma e tentar entrar num acordo, porque se não entrar, vai sair daqui do mesmo jeito que entrou, tá. então a gente tem aqui que se acalmar, ver a proposta de cada um e ver se há acordo e se não há. se não houver não vai ter jeito de resolver aqui. cês vão ter que ir na justiça resolver, entendeu. porque não existe um contrato de prestação de serviço pra gente dizer se foi descumprido o prazo, se foi descumprido forma de pagamento, se foi descumprido forma de serviço a ser executado. não existe nada por escrito que a gente possa discutir em cima. então a gente tem que usar aqui o bom senso, tá? você contratou um serviço, tá insatisfeita, não foi feito no prazo devido. eles alegam também [ que:::] Na linha 764, ao usar o diretivo, ―tem que manter a calma e tentar entrar num acordo‖, a mediadora instrui as partes sobre o comportamento que devem assumir na audiência, visto que em boa parte desta, os litigantes estavam se ofendendo ao invés de 84 tentarem resolver o problema. Novamente, estamos revendo a classificação proposta por Casanova (1996), pois também nesse exemplo, temos uma sugestão personalizada, ou seja, dirigida particularmente para reclamante e reclamado, mas a força aqui é de instrução e não de conselho, devido ao papel exercido pela advogada. A orientação se resume em: manter a calma e analisar a proposta do outro, caso não haja acordo, serão encaminhados para a justiça. No excerto acima, também destacamos a importância do contrato na atribuição de responsabilidades, como este não existe, as representantes do PROCON não podem atribuir responsabilidades, pois não há como comprovar o que foi acordado. Nas linhas 775 e 776, o diretivo, ―a gente tem que usar aqui o bom senso‖, a força já não é mais de instrução, mas sim de conselho, como prevê Casanova (1996). Após dar mais instruções, a advogada faz uso de um diretivo para verificar a possibilidade de acordo, como destacamos abaixo: (59) → 780 781 782 783 784 785 786 787 788 789 790 791 792 793 794 795 796 797 798 799 800 801 802 803 804 805 806 807 808 809 810 811 812 Carla que não foi feito, que hou-, que houve problemas. então, cada um tem o seu lado, os seus as suas razões. nós estamos aqui pra tentar chegar num consenso. se for possível, ótimo. se não for, cês vão ter que resolver isso em outro lugar, entendeu. com perícias té::cnicas, com processos juduciais, tá. Sandra ãhn, rãn Carla aqui é conciliação. discutindo nós não vamos chegar numa conciliação. então eu pergunto, há meio de algum acordo, tem como eles terminarem o serviço Pedro é o que nós propor, a gente vai propor isso= Carla =só um minuto Sandra olha só, o negócio é o seguinte. eu não quero que eles terminem com base naquilo que já foi feito, porque eu paguei mil reais acreditando igual cê falou eu teria até que ter um contrato. eu não tenho porque tudo que eu tenho foi anotado de combinar, tá, de preço, isso é isso, isso é tanto, isso é tanto. ((barulho no fundo)) eu acreditei, eu confiei tanto é que ele mesmo acabou de falar ainda há pouco que achou até legal que eu já tinha pago, chegou na cozi, não tinha nem ( ) eu já tava pagando, paguei mil reais, entendeu? só que o que tá lá primeiro não fo- o pouco que tá lá não foi concluído, entendeu. o cara, os pintores que eu fiz orçamento, todos eles falaram "olha infelizmente esse teto de forro liso eu tenho que dar três mãos de massa porque as placas são muito ruins, são todas muito remendadas", tudo quebrado, quebradinho, mal feito. a minha sala não tem condição, tá olha olha o tipo de placa, olha as quebraduras da minha [ sala, minha sala tá assim, tá.] 85 Nas linhas 789 e 790, o uso do diretivo, ―há meio de algum acordo, tem como eles terminarem o serviço‖, abre espaço para que a reclamante manifeste sua aceitação ou refutação da proposta feita pelo reclamado, a de concluir o serviço mediante o pagamento dos mil reais restantes. A reclamante recusa a proposta apresentada (linhas 793 e 794) e, novamente, relata o porquê de desistir do serviço, acusando o reclamado de realizar um serviço de péssima qualidade. Mais uma vez, a advogada faz uso de um diretivo, desta vez para confirmar que a reclamante não aceitava a proposta, como destacamos abaixo: (60) → 858 859 860 861 Carla não quer que eles terminem Sandra não quero, o que eu queria é que os mil reais queque eu já paguei fossem feitos. mil reais porque nem isso lá tem No excerto acima, a advogada se dirige à reclamante para confirmar se a proposta não tinha mesmo sido aceita. Nos turnos seguintes, a reclamante confirma a refutação da proposta. Diante da refutação de Sandra, a advogada faz uso, mais uma vez, do diretivo, dessa vez, ela se dirige ao reclamado na tentativa de saber quanto da obra já estava concluída, como pode-se perceber no excerto abaixo: (61) → 1009 Carla [quantos po]rcento do serviço tá feito Assim como a mediadora, que conduz a audiência inicialmente, a advogada do PROCON conduz as negociações de modo a legitimar o enquadre da reclamante, a pergunta feita por ela pretendia verificar se o pedido da reclamante, de conclusão do serviço referente ao valor pago, era factível. O reclamado não responde claramente a pergunta e passa a justificar que não pode aceitar o pedido de Sandra, pois isso não foi combinado, então a advogada pergunta explicitamente se há como estabelecer uma relação entre valor pago e serviço executado: (62) → 1099 1100 1101 1102 Carla Pedro [tem mil, eu quero saber o seguinte, tem mil reais.] mas ela que tá estabelecendo que mil. nós temo é dois mil, a gente quer [fazer o serviço dela. ] 86 Pedro se nega a responder, tendo como parâmetro o enquadre da reclamante. Desse modo, a tentativa de Carla de sugerir essa linha argumentativa é contestada. Mais adiante essa questão é reformulada e reapresentada. A advogada, então, faz uso de um diretivo, agora não mais para verificar a reivindicação, mas sim para atribuir responsabilidades ao reclamado. (63) → 1135 1136 1137 1138 1139 1140 1141 Carla Pedro [o sr.] tem que ter uma noç[ão se o sr. fez 10, 20, 30, 40, 50% de serviço, ué ] [ não, não não, é porque eu posso cobrar dois mil reais,] não isso dá, nós fizemos mais de 50%, ué. o custo maior, o maior é a placa de gesso, que custa mais Como percebemos no excerto acima, a construção usada pela mediadora, ―tem que ter noção‖, demonstra que é de responsabilidade do reclamado saber quanto do serviço já foi executado. O reclamado se vê obrigado a responder, tomando como referência o enquadre da reclamante, não para confirmá-lo, mas sim para refutá-lo. Como a reclamante insiste no seu enquadre de que o serviço prestado não corresponde ao valor pago, o reclamado, por sua vez, insiste que não tem como fazer esse cálculo. Para encerrar a audiência, a advogada instrui as partes a procurarem a justiça, pois o PROCON não dispõe de peritos para avaliar qual das partes está com a razão. (64) → 1314 1315 1316 1317 1318 1319 1320 1321 1322 1323 1324 1325 1326 1327 1328 1329 Carla infelizmente num (5.78). é uma pena não conseguir resolver isso logo né. porque normalmente nessas reuniões a gente consegue chegar num consenso. foi pago mil rea::is, o que foi feito lá por exemplo dá, foi feito mais ou menos mil, morre por aqui, ninguém deve ninguém. ou foi feito oitocentos, te dou duzentos, ou foi feito mil e duzentos cê dá me deve duzentos. sempre chega-se num consenso, mas infelizmente, com vocês aqui, a gente não tá conseguindo chegar a conclusão nenhuma. (1.46) e pelo o que eu já vi, a flávia já ficou aqui a bastante tempo, já tentei intervir e continua o mesmo impasse, né. então a gente (2.66) vai depender de opiniões de terceiros especializados pra avaliar esse caso, principalmente porque não existe um [contrato ] 87 Carla informa às partes que no PROCON o conflito deve ser resolvido discursivamente, sem a necessidade de consultar especialistas. Quando isso não ocorre, as partes são aconselhadas a procurar outra instância, neste caso, a Justiça Comum. b) Estratégia para negociação do acordo: ameaça Na audiência Gesso, há apenas uma ocorrência de ameaça. A advogada, Carla, na tentativa de levar as partes a firmarem um acordo as ameaça, como destacamos abaixo: (65) → 780 781 782 783 784 785 786 Carla que não foi feito, que hou-, que houve problemas. então, cada um tem o seu lado, os seus as suas razões. nós estamos aqui pra tentar chegar num consenso. se for possível, ótimo. se não for, cês vão ter que resolver isso em outro lugar, entendeu. com perícias té::cnicas, com processos juduciais, tá. A ameaça usada pela advogada é do tipo diretivo-comissiva, podendo ser parafraseada como, ―se não fizerem um acordo, terão que enfrentar uma briga judicial‖, ao fazer essa ameaça, o objetivo é de que as partes passem da refutação para uma efetiva negociação, ou seja, que firmem um acordo. Porém, nesta audiência, esta estratégia não surte efeito, pois a reclamante não aceita a proposta do reclamado, que é a de conclusão do serviço mediante o pagamento dos mil reais restantes, nem o reclamado aceita o pedido da reclamante, que é de executar o serviço referente ao valor já pago, como aprofundaremos no item abaixo. c) O papel dos comissivos na resolução do conflito Na audiência Gesso, as partes não entram em acordo. Pedro refuta o pedido da reclamante de terminar o serviço referente ao valor já pago; Sandra, por sua vez, não aceita a proposta do reclamado de concluir o serviço mediante o pagamento do restante do valor. Para a advogada, as partes começaram o serviço de forma errada, pois não firmaram um contrato para poderem reivindicar seus direitos, caso houvesse falha, e 88 encaminha as partes para a justiça, pois só lá há peritos capacitados para estabelecer os direitos e deveres. Ao apresentar uma proposta para a solução do conflito, o reclamado faz uso de um comissivo, pois se compromete em terminar a obra, mas como para que isso acontecesse, a reclamante teria que efetuar o restante do pagamento e como essa o negara, os comissivos que visam à resolução do conflito não são felizes em termos de produção de um acordo. Abaixo, reproduzimos o excerto (50), no qual Pedro se compromete a concluir o serviço, mas a condição para isso é o pagamento do restante do valor combinado. → 62 63 64 65 66 67 68 Pedro [ só q]ue nem valor, ela falou mil reais, nós não executamos o serviço, nós fechamos um serviço de dois mil reais. não tem discriminação do que é mil que deixa de ser mil. nós temo um valor, dois mil. a gente conclui. agora, só que tem como a gente vai receber se ela quer que a gente conclui, tá entendendo. 4.1.5 Audiência Brasimac Resumo: Na audiência Brasimac, a reclamante, Diana, reivindica a devolução de um aparelho de som e a restituição do dinheiro, pois, após várias vezes, o aparelho ter sido levado na assistência técnica, o defeito permanecia. O reclamado, Pedro, representante da empresa na qual o aparelho foi comprado, oferece à consumidora a troca do aparelho por outro novo a escolha dela, sendo o valor das parcelas já pagas considerado uma entrada para a nova compra. A reclamante alega que o aparelho já lhe causou muitos problemas e refuta a oferta do reclamado. Após uma longa negociação, intermediada pelo advogado da assistência técnica, Mário, a consumidora acaba por aceitar a troca, mas por outro produto. O reclamado se compromete a verificar junto à empresa a possibilidade de o valor já pago ser usado para compra de outro produto. a) Os diretivos na construção de macro-atos: enquadre do reclamante x enquadre do reclamado Na audiência Brasimac, as duas possibilidades de enquadres da resolução do conflito são apresentadas, primeiramente, pela estagiária Tânia, são elas: devolução e troca. A reclamante, Diana, reivindica que seja feita a DEVOLUÇÃO do aparelho e o ressarcimento das parcelas já pagas. Enquanto, o reclamado, Pedro, oferece a TROCA do som por outro, sendo o valor das parcelas já pagas transformado na entrada da nova compra. 89 Nesta audiência, os diretivos são usados mais para verificação de informações, apenas em poucos momentos desempenham papel importante para apresentação dos enquadres, como destacamos abaixo: (66) → 15 16 17 18 19 20 21 Neusa Tânia Neusa Tânia =e qual o problema que tá acontecendo?= = >não o problema é que< de acordo com o que: ela fala de ter ido já pra assistência, por quatro vezes >pelo mesmo problema< ela já teria direito, = =sei= =a outro produto, ou o dinheiro de volta. então eu não [tenho como] Na linha 15 do excerto acima, o diretivo usado pela mediadora Neusa funciona como um pedido de informação que abre espaço para que os enquadres legais da reclamação sejam apresentados. É a estagiária, Tânia, quem apresenta os enquadres. Cabe ressaltar que, a troca ou a devolução são direitos assegurados ao consumidor pelo artigo 18 do CDC. Segundo esse artigo, é o consumidor quem escolhe se quer devolver ou se quer trocar, então, ao consumidor é facultado o poder de decisão. Após a apresentação dos enquadres legais, temos um primeiro momento na audiência no qual discutem o defeito do aparelho e o fato de o problema persistir apesar de ter estado na assistência técnica por três vezes. Nesse momento, tanto a mediadora, quanto a consumidora tentam atribuir responsabilidades à assistência técnica. Em defesa desta, seu advogado, Mário, justifica que a assistência técnica realizou todos os procedimentos para consertar o aparelho e que não houve falhas da parte deles. A primeira tentativa de enquadre da situação a ser apresentada pela reclamante é a de que houve falha na prestação de serviço por parte da assistência técnica, como podemos perceber no excerto abaixo: (67) → 110 111 112 113 114 115 116 117 118 119 120 121 Neusa Diana Neusa Diana senhora diana, nessas idas e vindas vocês fizeram também mais de trinta dias, não já? no- na primeira vez nesse- nesse tempo de um mês, eu desci com ele três vezes. (1.0) dentro de um mês. aí foi, eu levei ele pra casa >quando vi que eu ia pagar uma prestação que até tava atrasada (de um cliente que ela calculou lá) e tal< aí eu cheguei em casa o som tava com o mesmo defeito! não- aí- aí já tinha dado mais de trinta dias. isso em outubro? ( ) aí já tinha- aí tava com mesmo problema (2.0) (mas olha só) na primeira vez ela só me deu essa ordem. 90 122 123 124 Neusa 125 Diana 126 Neusa nem falou o que foi feito nesta constando nada.= =não tá especificando, não? constando só: lá assim o cd não lê. se::i= ordem, não tá O diretivo da mediadora Neusa, linhas 110 e 111, é um pedido de informação, que abre espaço para que um primeiro enquadre de Diana seja apresentado. A reclamante argumenta que o aparelho não foi consertado pela assistência técnica e, a cada retirada do conserto, não era especificado para ela qual era o defeito do aparelho. Podemos pensar que há uma acusação implícita aqui, não era especificado, porque não era consertado e, por isso, o defeito permanecia. Se essa acusação fosse verdadeira, eles estariam agindo de má fé. Tal enquadre é entendido como uma acusação, tanto que, nos turnos seguintes, o advogado da assistência técnica, Mário, defende a assistência técnica da acusação de não constar na nota a descrição do defeito, pois segundo ele, a nota que a reclamante tem é a de entrada do aparelho. A mediadora Neusa, por alinhamento comum entre mediador e consumidor, também ressalta que mesmo nas notas da assistência não constam todos os serviços prestados. Dessa forma, Mário, advogado da assistência técnica, direciona o assunto para as negociações do acordo, como destacamos no excerto seguinte. Assim, ele consegue desviar o foco da audiência da acusação à empresa que representa. Com isto, são apresentados os enquadres sobre os quais a audiência se desenvolve. (68) → 153 154 155 156 157 158 159 Mário Neusa Mário Neusa Diana é doutora: vamos- vamos ser prático= =é= =a gente ta- a gente tá discutindo aqui o sexo dos anjos. o quê que a doutora- o que que a dona diana tá querendo, senhora diana eu queria a devolução do dinheiro, o dinheiro é: = No excerto acima, podemos perceber que Mário muda de tópico conversacional (linha 153) e, nas linhas 156 e 157, temos o diretivo sendo usado para pedir que a reclamante formule uma proposta concreta para a resolução do conflito. Esse diretivo abre espaço para que Diana apresente seu enquadre, o de devolução. Na linha 158, a mediadora passa a palavra para a reclamante que apresenta seu pedido para a resolução do conflito, a devolução do dinheiro. O pedido de Diana é um tanto vago, pois a reclamante não explicita o valor a ser restituído, como também 91 constrói seu pedido a partir de uma construção modalizada, ―eu queria a devolução do dinheiro‖, o que demonstra que Diana não faz uso de uma construção que marque o poder de escolha que a ela é facultado pelo CDC. Cabe destacar que nesta audiência as partes não negociam obrigações, a única tentativa – em relação à prestação de serviço por parte da assistência técnica – é interrompida pelo advogado desta, Mário. As negociações do acordo giram em torno de duas possibilidades legais, uma de interesse da reclamante, a devolução, e outra de interesse do reclamado Pedro, a troca. Novamente, o advogado da assistência técnica, Mário, faz uso de um diretivo que abre espaço para apresentação da proposta, como podemos observar no excerto abaixo: (69) → 231 Mário 232 233 Pedro 234 235 236 237 238 239 240 241 242 =é mas isso é sorte o senhor falou mesmo.(2.0) você quer fazer alguma proposta, pedro? deixa eu falar:, eu tô ouvindo aqui mais a gente quer servir bem. eu assumi a loja lá no mês sete, a senhora não gostaria por exemplo de ir na loja, e escolher um aparelho, nós temos lá experiente, outro modelo, outra potência, pra gente resolver. a gente faria por exemplo uma troca, a senhora pagou os- os valores que a senhora pagou consideraria como entrada na nova compra, e você escolhe outro produto >por exemplo,< tem experiente, tem da aka, tem,= No excerto acima, no turno de Mário, temos um pedido para apresentação de proposta. Cabe destacar que, neste momento, o advogado da assistência técnica, Mário, assume as funções do mediador, conduzindo as negociações do acordo. Em seu turno, Pedro, gerente da empresa reclamada, se compromete com a resolução do conflito, oferecendo a troca por outro produto. Ao oferecer algo diferente do que foi pedido por Diana, Pedro implicitamente recusa-se a aceitar o pedido de devolução. Finalmente, o reclamado apresenta seu enquadre, o de troca. O uso dos diretivos nas tentativas de resolução do conflito A proposta do reclamado Pedro é refutada pela reclamante que argumenta não querer o produto, pois quando seu marido foi, pela primeira vez, à loja reclamar do problema, foi maltratado pelo antigo gerente da empresa. Diana parece, implicitamente, 92 incluir em sua reclamação a existência de danos morais, mas essa questão não é aprofundada, nem explicitada na audiência. O reclamado Pedro se apresenta como o novo gerente e propõe a troca do aparelho como resolução do conflito. Diante da oferta do reclamado Pedro, a mediadora do PROCON, Neusa, verifica junto à reclamante se esta a aceita. (70) → 289 Neusa 290 291 Diana 292 Neusa aí no caso seria uma: decisão mesmo, né? da senhora que é a consumidora= =não, mas eu não gostaria. certo. a senhora prefere mesmo [a:: devolução] Por meio de uma pergunta indireta, linhas 289 e 290, a mediadora tem como objetivo verificar se a proposta foi aceita pela reclamante. Diante da refutação desta, a mediadora reformula o pedido da consumidora, reafirmando seu enquadre de devolução, como percebemos na linha 291. Nos turnos seguintes, o advogado da assistência técnica, Mário, tenta mostrar para a consumidora que se ela não aceitar a proposta terá que peregrinar na justiça para conseguir a restituição do dinheiro e que um processo judicial é oneroso. Por várias vezes, o advogado da assistência técnica, Mário, tenta fazer com que a consumidora aceite a proposta de troca, como aprofundaremos no item (b) desta seção. Diante do enquadre construído pelo advogado da assistência técnica, de que um processo judicial seria muito desgaste, a reclamante faz uso de um diretivo, a fim de verificar a possibilidade de outra proposta que não seja a troca por outro som, como observaremos abaixo: (71) → 459 Diana 460 461 Mário 462 [>será que não teria como resolver de uma maneira<] é::, melhor pra mim ? mas se o pedro, ele- ele é empregado, ele não é dono da firma [não. ele tem um limite.] ele não= O diretivo usado por Diana no excerto (71) é um pedido para que seja feita uma proposta que melhor atenda a seus interesses, com esse diretivo, ela demonstra que está aberta a negociações, pois não está disposta a enfrentar uma ação judicial. O advogado da assistência técnica é que responde ao diretivo, argumentando que o reclamado é apenas um representante da empresa. Desse modo, ele não pode decidir 93 nada por si mesmo, ainda assim, Diana reapresenta seu pedido por uma proposta melhor. (72) → 499 Diana 527 Pedro 528 529 [o que que o senhor pode fazer por mim?] e a gente tá lá na nova- na unidade lá há algum tempo, a gente pode tentar resolver, ué? vê lá o produto, né? o josé, (escolhe, vê.) No excerto anterior, o advogado Mário adverte a consumidora que o reclamado não tem o poder de mudar a proposta, pois esta já vem da empresa da qual ele é apenas um representante, apesar disso, no excerto acima, Diana usa novamente um diretivo, linha 499, para conseguir uma proposta melhor. Mesmo sem muito poder, nas linhas seguintes, Pedro se dispõe a fazer uma nova proposta: se propõe a verificar a possibilidade de trocar por outro produto ao invés de por outro aparelho de som, uso comissivo que será abordado no item (c). (73) → 534 535 536 537 538 539 540 541 542 543 544 Diana Mário Pedro Mário Diana Pedro Neusa Diana Pedro [tem jeito de você me dá o produto] no valor que eu paguei? é o:= =no valor das três parcelas?= =é= =é= =o valor na conclusão, calculamos aqui [tudo] [mais] o valor a vista! pois é eu verifico lá, a gente vê sim pra você = No excerto (73), o diretivo usado, nas linhas 534 e 535, constitui um pedido de proposta, que é aceito pelo reclamado. Ele se compromete a verificar junto à empresa a possibilidade de atendê-la, como veremos no item (c) desta seção. (74) → 564 565 566 567 568 569 570 Neusa Diana Neusa Diana [a s e n h o r a] tem certeza que você quer um outro produto ou a se[nhora-] [ é: ] [tá na dúvida?] [porquenão] se ele puder ou me devolvê o dinheiro, aí se ele não consegui, outro produto.= 94 No turno de Neusa, esta verifica via uso de um diretivo se a reclamante quer mesmo a troca por outro produto. Nas linhas 569 e 570, percebemos que esta é a segunda opção de Diana. Nos turnos seguintes, a mediadora volta a verificar se a reclamante está mesmo disposta a aceitar o acordo, como obtém a mesma resposta, a mediadora esclarece que não há possibilidade de haver devolução, que a proposta agora é a de troca por outro produto. A reclamante aceita assim mesmo. Para garantir os termos do acordo, a mediadora Neusa faz uso de mais um diretivo: (75) → 797 Neusa 798 799 Pedro =de um: liquidificador que custa cem reais. e os 83 e 40? vocês vão restituí em dinheiro? não, eles vão [comprar outro] produto No excerto acima, a mediadora quer garantir que será restituído o valor total pago pela consumidora (cento e oitenta e três reais e quarenta centavos). Com esse diretivo, ela quer que a parte reclamada se comprometa a trocar por mais de um produto, caso o valor do escolhido seja inferior ao valor pago. Como a proposta é, na verdade, verificar junto à empresa a troca do valor pago por outro produto e não a troca imediata, a reclamante faz uso de um diretivo para verificar se seus direitos estão garantidos assim mesmo, como destacamos abaixo: (76) → 850 Diana 851 852 Neusa =posso te fazer uma pergunta? e se a empresa não aceitar no caso essa proposta? não, mas aceita. O questionamento da reclamante é respondido pela mediadora Neusa, que afirma que a empresa aceitará a proposta, argumentando que o que foi proposto é muito bom para a empresa e que a reclamante está abrindo mão de sua vontade – que era receber o dinheiro de volta – apenas para evitar uma ação judicial. 95 b) Estratégia para negociação do acordo: ameaça Durante a audiência, a consumidora, Diana, mostra que o conserto do som causou muitos transtornos a ela, que tinha que incomodar colegas de trabalho para poder levar o aparelho na assistência técnica. Em um momento da audiência no qual a mediadora discutia com o advogado, Mário, sobre a restituição das parcelas já pagas com a devida correção, a reclamante, menciona não querer criar problema, apenas resolver o conflito. O advogado da assistência técnica, Mário, se aproveita desses comentários para tentar forçá-la a aceitar a proposta inicial, a de considerar o valor pago uma entrada na compra de um outro som. O advogado passa a ameaçar implicitamente a reclamante, através da construção do enquadre de quão problemático é recorrer à justiça para a resolução de problemas relativamente pequenos. (77) → 304 Mário 305 306 307 [obrigação legal não, não] se a senhora quiser a restituição, é:- é- a empresa não- quisesse negar a restituí-la, a senhora vai ter que conversar em juízo pra poder- 395 Mário 396 397 398 399 400 =isso demora- a ação judicial demora um ano, um ano e meio, e aí fica naquela lenga, lenga. o aparelho tá funcionando hoje, que é pior se o aparelho tivesse com defeito agora definitivo, o aparelho tá funcionando hoje, isso que é o pior de tudo, [entend-] 436 437 438 439 440 441 442 443 444 445 446 447 deixar bem claro pra senhora, não tenho nada a ver com a empresa. mas eu tô até me colocando porque: a senhora e eu sabemos o incômodo que é uma pendenga judicial= =ah é extremamente cansativo porque [( )] [se ela tá] se ela tá se achando cansada, desse vai e vem até vindo na fase do procon, [se- sepa-] [que é um fase ] extremamente rápida= =se- se passar pra fase judicial, a senhora vai se sentir esgotada [porque,] (78) → (79) → → Mário Neusa Mário Neusa Mário 96 (80) → 475 Mário 476 477 478 Diana 479 480 481 Mário 482 483 porque se a empresa falar de são paulo, ó eu não vou, não vou restituí o dinheiro. ele fica de pés e mãos atados. a senhora[sabe disso , ué] [mas não é a finan]ceira que já pagou pra ele? (.) <nã:o dona diana.> a senhora não tá entendendo. se a empresa falar lá, não vamos restituí, vamos brigar na justiça, a senhora vai ficar esperando um ano.= Na sequência acima, o advogado, Mário, através de ameaças diretivo-comissivas implícitas, que podem ser sintetizadas e parafraseada como, ―se você não aceitar a proposta, terá que brigar na justiça e esta é demorada‖, tenta convencer a reclamante a aceitar a proposta do reclamado. Cabe ressaltar que aqui a ameaça é para forçar a aceitação da proposta. Essa estratégia é bem sucedida, a consumidora abre meu de seu poder de escolha, a ela facultado pelo CDC e aceita a troca por outro produto. Esse exemplo demonstra o quanto essa estratégia pode ser eficaz, pois a consumidora que já tinha optado pela devolução, excerto (68), desiste para aceitar a troca. c) O papel dos comissivos na resolução do conflito A primeira proposta feita pelo reclamado, Pedro, é feita ainda na apresentação do enquadre, como destacamos no excerto (69). Ao oferecer a troca do aparelho de som que esteve na assistência técnica por um novo, à escolha da cliente, sendo o valor já pago considerado como entrada da nova compra, o reclamado assume responsabilidades na solução do conflito. Sua fala, ―a gente faria por exemplo uma troca, a senhora pagou os- os valores que a senhora pagou consideraria como entrada na nova compra, e você escolhe outro produto‖, é, então, um ato comissivo. Embora a reclamante não aceite a proposta de troca por outro som, ela acaba fazendo o pedido para que a troca seja por outro produto. O reclamado, então, se compromete com a resolução do conflito, só que aqui o comissivo não é a garantia da troca, mas sim o compromisso de verificar junto à empresa que representa a possibilidade de atender ao pedido da reclamante, como demonstramos nos excertos (72) e (73). 97 No excerto abaixo, o reclamado esclarece que a proposta é verificar com a empresa a possibilidade de atender ao pedido da reclamante e que não está se comprometendo ainda a cumpri-la. (81) → 891 Pedro 892 893 894 895 896 897 898 =não é mesmo a:- e a cassic também aí no caso aí, tá abrindo mão, doutora e tem as prestações atrasadas aí, e o aparelho não tava parado lá na assistência esse período todo. eu tô propondo (1.5) aqui: envolve aí a sua proposta, dessa resolução pelo som pra poder considerar a entrada pra resolver. isso aqui: é um opção que ela deu que eu vou consultar: pra tentar resolver num tô definindo o acordo. Nas linhas 897 e 898, o reclamado faz uso do comissivo, mas se comprometendo apenas em consultar a empresa para ver se há a possibilidade de atender ao pedido da reclamante. A mediadora estabelece um prazo de cinco dias, havendo resposta positiva da empresa, o contrato será firmado. 98 4.2 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Na análise dos dados, os atos de fala diretivos e comissivos se mostraram muito recorrentes e apresentam funções específicas bastante interessantes nas audiências de conciliação do PROCON. Dentre as funções observadas desses atos de fala, podemos destacar: apresentação do enquadre (diretivos), estratégia para levar a formulação do acordo (ameaças diretivo-comissivas) e resolução do conflito (comissivos). Os diretivos apareceram, principalmente, no início das audiências. Com exceção da audiência Banco Sul, todas foram iniciadas com um diretivo. Particularmente na audiência Ok veículos, o reclamado é quem abre a audiência e o faz com um diretivo. Esse primeiro uso do diretivo serve para abrir espaço para que as partes apresentem suas versões, estas são apresentadas em forma de relato. Não há regra para quem inicia a apresentação do enquadre. Nas audiências Banco Sul e Ok veículos, por exemplo, as mediadoras apresentam primeiro a versão dos reclamantes. Independente de qual enquadre é apresentado primeiro, o diretivo é dirigido a parte que não se manifestou, abrindo espaço para que a outra versão seja apresentada, neste momento há um confronto de versões. Ao serem construídos os enquadres, inicia-se a fase de negociação. Nesta, inevitavelmente, as partes tentam sustentar seus enquadres. Os diretivos são usados com o objetivo de verificar informações a fim de poder atribuir responsabilidades. As negociações são conduzidas pelos mediadores de modo a legitimar os enquadres dos reclamantes. Com exceção das audiências Rui Pedreiro e Brasimac. Nesta, o advogado da assistência técnica assume, em muitos momentos, a postura de mediador e tenta convencer a reclamante a aceitar o enquadre do reclamado; naquela, o mediador desconsidera ambos os enquadres, considerando o problema uma falha de comunicação. Os diretivos, em sua maioria, são classificados como pedido de informação. Mas, encontramos também outras ocorrências, tais como: conselho, instrução, ordem, convite e pedido de confirmação. Dos tipos de diretivos encontrados, destacamos, primeiramente, o conselho. Segundo Casanova (1997), quando uma sugestão é personalizada, ou seja, dirigida a uma pessoa em particular, esse diretivo é denominado conselho. É conselho também, quando o falante se empenha para que a sugestão seja cumprida. 99 Na audiência Banco Sul, porém, o reclamado não parece estar comprometido com a resolução do conflito, tanto que seus conselhos não foram considerados propostas devido à falta de comprometimento. Na maioria das ocorrências, o reclamado fez uso do imperativo, mas, como não possuía poder, esses usos não foram entendidos como ordem. Também nesta audiência, encontramos uma ocorrência que tinha forma de conselho, mas tinha força de ordem, o que demonstra que uma forma pode assumir várias funções, como destacou Schiffrin (1994). A fala da funcionária ao oferecer o seguro ao reclamante, ―é bom que você faça‖, no contexto, adquiriu força impositiva, por ela deter o poder de liberação do empréstimo. Quando as sugestões não são personalizadas, o diretivo é denominado instrução. Porém, encontramos nas audiências Banco Sul e Rui Pedreiro, exemplos de instrução personalizada. Parece que o que diferencia instruções de conselhos é que naquelas, aquele que orienta sabe exatamente o que fazer e como o orientado deve proceder; já nestes, o aconselhador diz ao aconselhado o que ele imagina que pode resolver o problema e/ou como ele procederia se estivesse passando por situação semelhante. Por fim, destacamos as ordens. Já mencionamos que, o imperativo quando usado por uma pessoa que não detinha poder na interação, não era entendido como ordem. Porém, mesmo quando usado pelo mediador, único participante das audiências instituído de poder legal, os imperativos também não foram interpretados como ordem, conforme, vimos na audiência Ok veículos. Ocorreu que ao fazer uso de construções do tipo ―ter que‖, nos pareceu que o mediador conseguia acentuar a força imperativa de seu ato, como na audiência Gesso, a mediadora consegue saber quantos por centos do serviço está concluído após o uso dessa construção. Conforme mostrado nas análises, quando as partes não entravam em acordo, o mediador, na maioria das vezes, usava de ameaças diretivo-comissivas para tentar pressionar o reclamado. Nas audiências Banco Sul e Ok veículos, as mediadoras, ao fazer uso de ameaças do tipo diretivo-comissivas, conseguem que os reclamados, relutantes em firmar um acordo, façam uma proposta para o consumidor. Na audiência Gesso, a mediadora dirigiu a ameaça diretivo-comissiva a ambas as partes, porém seu ato não foi feliz, nenhuma das partes se sentiu pressionada a apresentar uma proposta. Na audiência Brasimac, é o representante da assistência quem faz uso da ameaça diretivo-comissiva a fim de pressionar a reclamante a aceitar a proposta do reclamado, também, nesta audiência, o uso da ameaça funcionou como estratégia para se conseguir formulação de 100 acordo. Na audiência Rui Pedreiro, as partes fazem uso de ameaça elementar, o reclamado ameaça e é a ameaçado pela reclamante de levar o caso na justiça, mas essa estratégia não é bem sucedida. Embora os dados não sejam suficientes para generalizações, eles sugerem que somente ameaças diretivo-comissivas parecem funcionar como estratégia para se conseguir formulação do acordo. Essa estratégia parece ser mais eficiente quando proferida pelo mediador diretamente para a parte reclamada. Quando o uso da ameaça enquanto estratégia para se conseguir a formulação do acordo se mostra eficiente, os reclamados fazem uso de comissivos, ou seja, formulam propostas. Na audiência Banco Sul, o reclamado acata a sugestão da mediadora enquanto proposta. Na audiência Ok veículos, o reclamado formula sua própria proposta. Nessas duas audiências, a proposta não é negociada, pois foi conseguida somente após ameaça. Nas audiências Rui Pedreiro e Gesso, as partes não chegam a um acordo, portanto, não aparecem ocorrências de comissivos. A única audiência em que a proposta é negociada é a Brasimac, o pedido da reclamante não é atendido pelo reclamado, a proposta deste não é aceita pela reclamante, sendo o acordo um meiotermo. 101 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Iniciamos a análise dos atos de fala diretivos a partir da tipologia proposta por Casanova (1994). Ao longo da pesquisa, pudemos constatar que a tipologia proposta pela autora é bastante geral, sendo necessária adaptá-la ao tipo de atividade sob análise. Segundo Casanova (1994), as sugestões podem ser classificadas como instrução, conselho ou aviso. A distinção entre instrução e conselho é o fato deste ser personalizado (dirigido a uma pessoa em particular) e aquela não. Porém, como constatamos nos dados, instruções podem ser dirigidas a uma pessoa em particular. A autora também distingue instrução de conselho, postulando que nas instruções, a realização daquilo que é instruído é indiferente para aquele que instrui, enquanto nos conselhos, o falante demonstra interesse na realização daquilo que é aconselhado. Mais uma vez, os dados demonstram o contrário, o falante pode dar um conselho e ser indiferente a sua realização. Os dados nos levam a reformular o conceito de instrução proposto por Casanova (1994), esta é toda sequência injuntiva, que diz como fazer, independentemente de ser dirigida a um interlocutor específico. E também o conceito de conselho, este é uma possibilidade apresentada, podendo não haver, por parte daquele que aconselha, nenhum empenho para que o aconselhado execute o que lhe foi apresentado. A instrução difere do conselho, então, não pelo fato de ser ou não personalizada, mas sim, pelo fato de que nas instruções, aquele que orienta sabe como o orientado deve proceder e fornece a ele um passo a passo. Enquanto em um conselho, o aconselhador diz ao aconselhado o que ele imagina que pode resolver o problema e/ou como ele procederia se estivesse passando por situação semelhante. A análise dos diretivos também nos forneceu subsídios para responder a primeira pergunta levantada: qual o papel desempenhado pelos diretivos nas audiências? Os diretivos desempenham duas funções importantes. Primeiro, são esses atos que abrem espaço para que os enquadres dos reclamantes e reclamados sejam apresentados. Os enquadres são apresentados em forma de relato, podendo ser relatados pelas próprias partes ou pelos mediadores. Segundo, após serem feita as apresentações dos enquadres, os diretivos passam a ser usados para verificar informações a fim de atribuir obrigações. Normalmente, os mediadores negociam o acordo tendo como base o enquadre dos reclamantes, o que mostra a filiação entre mediador e consumidor. No PROCON, os mediadores não estão 102 livres, como postula Garcia (1997), para gerar ideias para a resolução do conflito, tanto que os mediadores raramente apresentam sugestões para a resolução do conflito. As negociações são conduzidas de modo a levar o reclamado a apresentar uma proposta para o reclamante ou que este apresente um pedido para o reclamado. A segunda pergunta – em qual momento da audiência, os comissivos são usados e com que finalidade? – pôde ser respondida após análise das propostas. É quando os reclamados apresentam uma proposta que os usos comissivos emergem. Os comissivos são usados para propor uma solução para o conflito. Porém, devemos observar que: (i) só há proposta quando há comprometimento por parte do falante e (ii) só há resolução, quando o reclamante aceita o que é proposto pelo reclamado. As propostas são, portanto, comissivos que visam à resolução do conflito. Entretanto, dificilmente os reclamados apresentam uma proposta espontaneamente, o objetivo deles é se eximir de toda e qualquer responsabilidade na resolução do conflito. Para isso os mediadores, principalmente, fazendo uso de ameaças do tipo diretivo-comissiva, conseguem levar os reclamados a apresentarem uma proposta. Assim, já respondemos a terceira pergunta: ameaças podem ser encontradas em contexto de conflito? O uso de ameaças do tipo diretivo-comissiva apontam para a comprovação da relação entre atos diretivos e comissivos, como já prevista por Searle (1995 [1979]). O autor, porém, não identifica um ato que comprove a relação entre diretivos e comissivos. Avançando em relação aos estudos do autor, identificamos um ato de fala, ameaça, que ilustra claramente a relação entre esses dois atos. As ameaças diretivo-comissivas também se mostraram como uma estratégia bastante eficaz na formulação de acordo, mais do que a atribuição de responsabilidades. Enquanto em vários momentos das audiências, as partes trocam acusações sem surtir efeito para a resolução do conflito, a ameaça diretivo-comissiva leva imediatamente a uma mudança nos rumos das audiências. Finalmente, podemos responder à última pergunta: qual a função das ameaças em situações de conflito, em especial, em audiências de conciliação? Essa estratégia é usada para levar as partes à formulação de acordo. Embora não seja uma regra, a ameaça diretivo-comissiva é mais eficaz quando produzida pelo mediador e endereçada ao reclamado. Acreditamos que ao analisarmos as ameaças diretivo-comissivas em audiência de conciliação, contribuímos para a aplicação dos postulados de Salgueiro (2010), 103 embora o autor tenha feito importantes observações sobre as ameaças, ele não chegou a analisá-las em dados reais de fala, como apresentado neste trabalho. Acreditamos ter contribuído também para ilustrar que é possível aplicar a teoria dos atos de fala para analisar dados reais de fala, de forma sequencial, considerando os macro-atos e o contexto nos quais estão inseridos. Apesar das contribuições salientadas, ressaltamos que devido ao corpus analisado ser relativamente pequeno, não podemos fazer nenhuma generalização categórica. Embora as conclusões sejam restritas ao corpus analisado, elas apontam para possibilidades de uso da linguagem. 104 6. REFERÊNCIAS ATKINSON, J. M. & HERITAGE, J. Transcript notation. In: Structures of social action: studies in conversation analysis. Cambridge, U.K.: Cambridge University Press, 1984. AUSTIN, J. L. Quando dizer é fazer – palavras e ação. Tradução de Danilo Marcondes de Souza Filho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. CASANOVA, I. A força ilocutória dos actos directivos. In: FARIA, I.H., PEDRO, E.R., DUARTE, I. GOUVEIA, C.A.M. (org). Introdução À Linguística Geral e Portuguesa. 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Ocorrências Sinais pausa com menos de um segundo, medida com cronômetro , (2.8) pausa em segundos, medida com cronômetro [ início de sobreposição de fala ] finalização de sobreposição de fala = ausência de pausa entre a fala de dois falantes distintos . entonação descendente , indicando finalização do enunciado ? enunciado com entonação de pergunta ↑ subida do contorno prosódico ↓ descida no contorno prosódico : alongamento de vogal* - corte na fala ou auto-interrupção MAIÚSCULA forte acento ou ênfase no volume da voz palavra trecho sublinhado indica acento fraco no volume da voz ―palavras‖ (( )) trecho entre aspas indica fala relatada comentários do analista (palavra) transcrição duvidosa ( transcrição impossível ) °palavra° trecho marcadamente mais suave ou devagar que o restante da fala ao redor* >palavra< fala comprida ou acelerada* * a duplicação dos símbolos indica maior intensidade do fenômeno 108 7.2 Banco Sul28 28 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 Ana 86 87 88 89 90 91 Rui Rui Rui Ana Lucas Ana Rui Rui Ana Rui Rui Ana Rui Ana Rui Ana Rui Rui Rui Ana Rui a reclamação dele aqui, é que ele:: (0,5) é::, -foi junto ao banco sul, requerer um empréstimo, (0,5) e foi:: obrig-, => uma das condições pra ele conseguir um empréstimo, foi obrigado a adquirir o seguro. = => sei. < qual, que é, a agência (que atendeu ele) (0,5) eu queria confirmar a agência. qual que é a agência?, Oitocentos (0,5) e nove. é oitocentos e no:ve. (2.0) >agência zero oitocentos, ok.< (4.0) >o contrato do: [lucas, não tá aqui não.<] [então ele veio ] ao procon nos questionar, porque a intenção dele não era fazer o seguro, ele não- não tá interessado no seguro, (0,8) mas ele se viu obrigado a assinar o contrato do seguro, pra conseguir a liberação do empréstimo, que: que foi o motivo que o levou ao banco. [entendeu?] [ é , o:: ] o que eu tenho pra dizer a você, é o seguinte.(0,5)com relação ao que nós recebemos um relato do procon, (0,5) tá? tava: dando:: a entender, que fosse operação casada não é operação casada. (0,5) acho que todas as instituições financeiras, hoje, tem os seus produtos a oferecer. = =humhum.= =tá? Todas. = =humhum. = =é::: a partir do momento, em que o cliente proCUranos, a-, a-, a-, a-, um empréstimo, com certeza, eu acho que qualquer lugar, quer vender o peixe dele. = =claro. = =entendeu? (0,5) então o quê que cê oferece. oferece o produto, mas (0,5) os produtos do banco, não é: camisa, não é calça. (0,5) não é sapato. claro. = =são::, são:: (0,5) esses seguros, são previdências, são coisas que trazem rentabilidade pro cliente. é o: que: o que eu posso dizer a ele é o seguinte. (0,5) pra ele pedir o cancelamento, ele pedir o cancelamento, (0,5) agora com relação a: as duas parcelas que já lhe debitadas, isso aí não tem como ser retroagido. (0,5) As audiências não foram reproduzidas integralmente, destacamos apenas os trechos relevantes para esta análise. 109 92 93 94 95 96 97 98 99 100 101 Rui 127 128 129 130 131 132 133 134 135 136 137 138 139 140 141 142 143 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 155 156 157 158 159 160 161 162 163 164 165 166 Ana Ana Rui Ana Rui Ana Rui Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas 196 Rui 197 198 199 200 201 202 203 por quê? é:: porque a partir do momento, em que ele:: aceita (0,5) o-, o-, o débito, (0,5) é porque ele assinou o contrato.= =sim (.)ele [assinou ] o contrato, porque= [tendeu? ] =[ele precisava ]= [ é: eu acho, ] do em[préstimo, não é ?] [ é eu acho, é ] não é? foi uma imposição,[que foi] ô:: (.)lucas, como se passou lá? (2.0) O dia do contrato?= =o dia do contrato.= ah ah fui fazer fui fazer o empréstimo, não é? (.)aí (.) fui abrir a pra abrir a conta, eu já- eu já tinha. uma conta Hum hum= =e eu num as- não sabia (.)porque a:: eu trabalho na loja américa,= =hum = =então,(.) eu achei que quando eles, passaram a carta carta salário,(.) eles tinham anulado a minha conta.(.)(aí ela falou) “você tem uma conta aqui”.= =hum= aí (ela falou)”olha, temos um seguro aqui,” seguro não. ela falou saúde. (.)”temos um plano de um saúde,” (.)entendeu? e “é bom que você faç-“ (eu falei assim) “eu num quero, porque eu já tenho plano de saúde, eu já te- eu já tenho. no no: momento” eu num falei que eu tinha: um seguro de vida.(.) eu tenho que um seguro de vida em grupo, (.)pela emppela empresa também. Aí, eu no dia eu falei assim ó, “eu num quero porque, (.) aí ela falou assim “aí vai fica difícil” (.)não é? aí eu falei com ela assim, “então se se eu: então quer dizer que: eu sou obrigado.” eu falei né, com ela “eu sou obrigado a fazer,” ela falou “não. não é bom usar esses te:rmos.” aí ela foi e chamou a: a a menina do seguro, pra me explicar, não é? talvez eu não tô explicando direito pra ele,(.) aí como eu estava precisando do dinheiro, eu fui, assinei(.) o cont- o contrato, não é? o::: o seguro. (2.0) você: ela deu a entender, que se você não fizesse o seguro, ela não libe- [não]= [ é ] [libera]ria [o: o] [ é é ] [é é ] deu a entender que sim.( )aí vai ficar difícil, então. eu vou sugerir a você, que se você algum dia você tiver em alguma outra instituição chegar e impor financeira, entendeu? se você for abrir uma conta, ou fazer um empréstimo, o que for,(.) se alguém isso pra você, você chame um gerente, que com certeza, a: as as pessoas que estão instruídas pra administrar a agência, elas não vão acatar isso. mesmo que seja (.) é: bom pra pra organização deles. Isso não não vai 110 204 205 206 207 208 209 210 211 212 213 214 215 216 217 218 219 220 221 222 223 Ana Rui Ana Rui Ana Rui Ana Rui Ana Rui Rui 237 Rui 238 239 240 241 242 243 244 245 246 247 248 249 250 251 252 253 254 ser feito (.) porque: a gente sabe, que isso não pode ser feito.= não é um meio legal de se vender [o produto, não é?] [ é ] [ agora ] [igual, ] =eu acho que diante da denúncia dele, ele tá aqui confirmando o:, não é? o que foi: o que foi forçado lá na hora, o banco deveria, (.) devolver as duas parcelas que já foram pagas= =tá = =porque:: <ele se sentiu pressionado a fazer.>= =humhum. entendeu? ele ele adquiriu um produto que ele não queria,(.) pra poder conseguir o outro que ele queria. [ então ]HOUve uma pressão.= [eu vou ]= =eu vou pedir a você, pra você fazer o seguinte então,(.) você lembra o nome da pessoa, que fechou o seguro pra você? então tá. você vai procurar a selma, e vai pedir o cancelamento. (.) tá? e:: e o:: (.)no que ela falar já pra você que não será feito o cancelamento, aí você vai mandar ela procurar o rui. (fala) “olha, tive hoje uma audiência com o rui.” você vai lá HOJE, tá? (porque hoje lá foi o dia inteiro) você vai: procurar por ela,(.) pede pra ela, pra ela entrar em contato comigo,(.) que eu vou pedir de imediato, o cancelamento disso aí, hoje. é: e (barulho externo) quanto ao ressarcimento, o ressarcimento dessas duas parcelas pra você, é: eu não vou garantir agora, porque nós não fomos ressarcidos. (.)tá? mas eu peço a você um prazo de Quinze dias, tá? pra que a gente faça o ressarcimento das seguintes parcelas pra você, (.) sem correção nenhuma(.)foi dois e- foi dois e oitenta e cinco? nós vamos creditar pra você os doze e oitenta e cinco de duas vezes. 7.3 Rui Pedreiro 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 Jorge Rui Jorge Rui Jorge Rui Jorge Rui Jorge Rui mas então o quê que: é o quê que foi abordado. o senhor per- o senhor falou assim o senhor me perguntou o quê que foi abordado. então vamos lá o quê que foi abordado? = =nós concordamos assim. hum. eu ver a casa dela. hum. pra mim entijolar. hum. e bater a laje. hum. eu ainda dei um emboço por dentro eu falei com ela e::eu não trabalho com acabamento (0.8) porque até na minha casa ac-acabamento quem faz são os outros eu pago pra fazer. (1.0) inclusive eu tô com 111 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 Jorge Rui Jorge Rui Jorge Rui Jorge Lúcia Jorge Lúcia Jorge Lúcia 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 Lúcia 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 Jorge Rui Lúcia Rui Lúcia Rui Lúcia Rui Lúcia Rui Rui Jorge Rui Jorge Lúcia banheiro pra fazer lá em casa. hum. (tô esperando uma pes- ter dinheiro) [t e r] [então] o senhor tinha combinado com ela que o senhor só ia entijolar [e b a t e r a l a j e ] [entijolar e bater a laje] ainda dei um emboço pra ela, fiz o piso, ela tratou comigo de me pagar (.)o que ela pagava por mês, ela entrou dentro da casa toda satisfeita,(1.0) agora deu esse problema. eu não entendi em vez de ela me pagar, ela me trouxe aqui. (2,0) bom, foi isso que aconteceu ou [não. a senhora combinou, a senhora combinou ] [eu acho que ela não tá querendo é p a g a r.] com ele que só iria [é:: é:: é] >[ n ã o. ]< fazer [ o:: o:: o::] >[ n ã o. ]< só iria ser [entijolado] e tal. >[ n ã o. ]< nã:o, não foi isso [q u e combinamos ] não. [ e l e ] ele falou que ia me dar a casa no ponto pra mim MORAR, pra mim MORAR. se ele não ia fazer o piso, se ele não ia rebocar, como é que eu ia morar? e ela não tá morando, hum, ainda a filha ainda. claro eu vou morar [na r u a]? [ quebre-] quebrei o galho dela. o senhor falou que não= =ainda gastei material meu agora eu tenho como (.)usei material dela. oh, isso vai custar (caro) [eu falei pra senhora ver i s s o ( )]= =[eu falei que o senhor usou meu material?] ah mas aqui consta.= =mas ecomo que teve desvio de material (.) no papel consta, cê quer ler por favor? reclamado ó o reclamante contrat- a reclamante contratou o serviço de pedreiro, do reclamado, para a construção de uma casa, após o término da obra a reclamante alega havi- (0.8) haver vários problemas na construção da casa.< a reclamante alega ainda que foi pedido pelo reclamado mais material de construção do que foi (efetivamente) usado na obra sendo que esse material foi a ela fornec-, foi por ela fornecido ao reclamado.> agora eu quero [s a b e r o n d e] [a senhora me falou] tá esse material.= =a senhora me falou que ele tinha é:: que a senhora tinha dado material demais. a senhora acha até que ele usou material é: da senhora a mais que a senhora tinha dado. o::, eu falei [t u d o] que ele me pediu. 112 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 Rui Jorge Lúcia Rui Jorge Lúcia [ falou ] isso aí. a senhora deu = eu [ comprei ] [e tá usado] na casa. =e a senhora falou que-, que a senhora-, que a senhora achou que ele não usou tudo que foi mal usado. até que a senhora comprou muito cimento, muito tijolo, foi o que a senhora me passou aqui. [foi o que a senhora me passou a q u i (.) ], [ eu: falei isso mesmo, eu falei isso mesmo] 167 Rui 168 169 170 171 172 173 174 175 Lúcia 176 177 [se a senhora fala] comigo que não teria como pagar, eu num ia cobrar nunca. sabe que eu nunca cobrei nada de ( ).não gosto de cobrar. aqui, tem um vizinho meu que eu fiz uma casinha pra ele, ele já mora a seis meses e ele não me deu um tostão. nunca cobrei ele. (0.5) a senhora agora vai me: pagar. (0.8) ah que daqui nós vamos no ministério, nós vamos na junta= =ah nós vamos onde tiver que ir seu rui. o senhor então vai ficar provando, vamos ver o quê que vai provar. 184 Jorge 185 186 Rui 187 Jorge 188 189 190 191 192 193 194 195 196 197 198 199 200 201 202 203 204 205 206 207 208 209 210 211 212 213 214 215 216 217 218 219 220 hum hum (.) tá (.) bom. eu tô vendo que não é- que não existe forma de ter [acordo ] [ n ã o.] aqui porque ele fala uma coisa, a senhora fala outra.(0.5) a senhora e, segundo a senhora ele tem uma dívida com a senhora porque ele não executou o problema-, o- o serviço da maneira que deveria ser executada. (0.8) e a senhora tem uma dívida com ele que a senhora reconheceu então, o que a gente va(0.5) o que eu posso sugerir pra senhora é o seguinte, se a senhora (0.5)é afirma(0.2) diz que pode provar que ele não efe- efetuou o serviço combinado na maneira que foi feito. (0.8) o que ele, o que eu posso fazer pra senhora é orientar a senhora pra procurar a justiça, (0.5)tá. o juizado especial, qualquer forma de justiça. até mesmo na, na justiça comum e pleitiar lá, através dessas provas que a senhora tem, a- a- a- (1.0) arrumar o que foi, é o que não foi efetivamente é:: construído. agora eu sugiro a senhora que a senhora arque com a sua parte para a senhora poder exigir a parte dele. entendeu. porque se a senhora chega na, na justiça e e fala que não tem é- é que tá um problema e a senhora não pagou pelo que a senhora pediu, o- o juiz não vai lhe dar ganho de causa. a senhora tá devendo e ele tá devendo. então fica a pendenga. então vamos ver prime- pra ge-, pra você pedir você pedir um direito cê tem que cumprir com as suas obrigações. se a senhora não tá cumprindo (( mediador conversa com outra pessoa.)) tá se a senhora nã::o tá cumprindo com as suas obrigações,(1.0) a senhora não pode exigir dele. o o ((o mediador conversa com outra pessoa)) a senhora não pode exigir dele que ele cumpra com as dele. (0.8) tá. então é (0.5) o que o procon podia fazer pela senhora que é tentar solucionar o problema através de um acordo nós estamos fazendo.tirando 113 221 222 223 224 225 226 227 228 229 230 231 isso, infelizmente não tem jeito. eu vou relatar isso aqui tá. quando não existe um acordo o procon até é costuma tomar medidas administrativas, ju- é perante a pessoa que foi a quem foi feita a reclamação, no caso o senhor rui. eu acho que nem isso nós vamos fazer. nem vamos sugerir isso, pelo fato da senhora ainda tá também em débito com ele e ter havido uma falta de comunicação. a-, apesar de não ter nada documentado, vocês não passaram nada por escrito, nada foi só aque-, aquele para o aquele papelzinho = 7.4 Ok veículos 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 Lucas Marta Lucas Marta Lucas Marta Lucas Marta Lucas Lucas Marta Lucas Lucas Marta Lucas Marta Lucas José Lucas (( med. 1 conversa com alguém)) (3.8) >ele fez uma reclamação. não é isso?< fez↓. é porque: ele comprou:: um mo::nza, (0.5) na tu:a:: (1.2) >lá no meu estacionamento.< na loja, né? (0.5) e: no primeiro mês de uso o carro::: (0.2) apresentou alguns (0.2) defeitos ou- e ele teve que:: (0.5) arca:r com isso. = =°sei°. (0.8) então ele tava querendo:: que:- porque: (.) como saiu da loja ele tem que ter noventa dias de:: (0.5) [garantia]. [garantia] de motor e caixa. (0.8) é só motor e caixa?= =só motor e caixa. (0.2) a garantia cobre. (1.2) pode procurar sabe- <se o carro tiver fundido, (.) ou a caixa quebrar, a responsabilidade é >do- do- do-< de quem vendeu. (0.5) pois [é-] [e ] recomendação:- sobre a documentação de carro roubado. isso aí é:- (0.8) a lei: fala, muito claro isso. = ele esteve na lo:ja, pra comprar um carro.>uma uno< um ponto seis zero. (0.5) unhum.= =comp- (0.8) >olhou a uno, levou a uno no mecânico. voltou (0.5) dizendo< que a uno tinha um defeito. (0.5) mandamos arrumar. ele passou o final de semana com o carro. (1.0) não- não- não no domingo, [(.)> lá] na na< no sábado (não sei) na segunda- feira, [↑unhum.] >ele ligou dizendo que não queria< o carro. nã[o]. [en]tão tudo ↑bem.= 114 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 Lucas 132 133 134 135 136 137 138 139 140 141 142 143 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 155 156 157 158 159 Lucas Marta Lucas Marta Lucas Marta Marta José Marta José Marta José AÍ, (0.8) >>ele falou que não<< queria ficar com o carro. aí >ele falou assim<, então eu vou escolher outro carro. >(então) cê< fica a vontade. escolheu um gol.(.)levou o gol pro mecânico dele. (.)o mecânico reprovou o carro.(.)ele voltou. aí ele escolheu um monza(0.5)levou o monza no mecânico. (0.2) o monza tá tudo certo. tá. serve pra você. serve. ficou com o monza. (1.0) levou o monza. no dia que: >no- no-< depois no sábado, o monza apareceu um defeito, quebrou a: um- uma balança lá. (0.5) ele ainda me ligou, foi mandado arrumar a balança. agora depois de três meses ou dois meses que >(tem- que ele me) comprou o carro,< ele me trouxe essa reclamação, dizendo que tem algumas coisas- que foram gastas algumas coisas no (.)carro. <agora o que foi gasto no carro, (0.2) eu nem sei o quê que é. nem vi. (1.0) ºhumº, (.) ele tá alegando ó:leo, filtro- é: ve:la, essas coisas (.) tem que ser fe:ito (0.2) quem compra um carro usa:do, (.) unh[um]?, [ a] gente fala. >tem que fazer a revisão no carro.< (.) ele me comprou ciente a essas coisas. (0.8). <porque a gente não enganou ele em nada. (1.0) agora. essa reclamação que ele fe::z, (1.5) num posso- (0.5) agora a garantia de motor e caixa, a gente é- a gente:: (.) é obrigado. cês trouxeram [o::] ºcerto.º >me- me< venderam o carro como direção hidráulica, =>o carro não tinha direção hidráulica.< (1.8) ººunhum::.ºº <propaganda enganosa, né.= falar uma coisa que não tem. (1.2) voltei lá no sábado. (0.8) ah, >o carro (dá pra ir- (não) apresentava o defeito isso e aquilo. =voltei. (0.2) tudo bem↓ conversei levei um gol, (.) >peguei um gol,< (.) o mecânico reprovou, (0.2) unhum. (0.5) aí peguei um monza, >levei no mecânico, o mecânico tava bo- olhou o: carro,< o motor é carro usado. não ia mexer no carro?, (.) olhou o carro tava bom. (.) certo. (0.5) °unhum°.= =<aí o primeiro dia que eu peguei o monza, peguei o monza no sábado, (0.8) no sábado (.) o monza já quebrou a balança não sei o quê que aconteceu lá que eles (não teve- o defeito no coisa- =>>no primeiro dia.<< (.) no tempo (.) do- levei- isso aconteceu de tarde,= peguei o monza (.) lá por volta de dez onze horas da manhã, (0.2) fiquei trabalha:ndo, depois fui pro lava-a-jato, (1.0) saí de lá com o carro cinco horas da tarde, parei o carro na Prudente de Moraes, depois que eu liguei o carro, (0.5) deu defeito. 115 160 161 162 163 164 165 Marta 166 José 167 168 >acusou o defeito.= aí na mesma hora ligamos pra ele. (1.0) “ah não, vê o quê que cês podem fazer aí deixa no (.) estacionamento que a gente resolve na segundafeira”.< conseguimos:- arrumar o negócio lá e levamos no mecânico no sábado mesmo. °unhum°?= =aí o cara deu uma olhada, >tal tal <. (0.5) aí não suspeitou de nada porque o carro voltou:: (.)ao normal. 193 José 194 195 196 197 198 199 200 201 202 203 204 205 206 207 =arrumou o carro. (.) tudo bem. aí: (0.8) passou tudo bem. aí: teve um dia que eu levei o carro pro esporte, fui jogar bola, o carro me: deixou na mão lá. não- não ligava >nem pro caramba. (do mesmo jeito.)< levei logo no:: meu mecânico e tá a notinha aqui. eu tenho que trocar ainda: (0.5) quatrocentos re- já- fora o que eu gastei eu tenho que (.) gastar mais quatrocentos e pouco, porque eu tenho que trocar (1.0) um negócio >que você sabe< que: desde o primeiro dia que eu peguei (1.0) tá dando- tá com problema, e tenho que trocar(.) bomba elétrica. é duzentos e poucos reais. eu com o carro que eu- tenho dois meses- paguei a segunda prestação agora, e vou gastar mais de mil e cem reais no carro. =>num tem condição. = é três prestações que eu vou pagar.< 229 230 231 232 233 234 235 236 237 238 239 240 241 242 243 244 245 246 247 248 249 250 251 252 253 254 255 256 257 258 259 260 261 262 [o consumidor] se sent[iu lesa::]do?= [aqui a↓]((mostra alguma coisa a José)) <esse cabo de ignição, um cabo de vela que ele teve que trocar, = =ºse sentiu lesado mas (.) >>a partir do momento- a gente não enganou ele em nadaº. ele levou o carro no mecânico dele, o mecânico dele- o mecânico aprovou o carro pra ele comprar.<< (1.2) porque se o carro tivesse ruim, ele não tinha comprado o carro. (1.5) [ºdeu defeito:º]. [não. era um de]feito que: dava pra:: perceber:: ou não? claro. que- num tem jeito. ( ), [bomba elétrica, uma peça elétrica], Marta Pedro José Lucas Lucas José Marta José Lucas José Lucas José Lucas [ºagora, essas coisas que eleº] tá::: aleg- isso aí é coisa de um carro usado. isso aí é um carro noventa e quatro. (0.5) (estamos) no ano dois mil. faz seis anos= =é:: mas [eu num paguei nem:: duas prestações. eu vou gastar mil reais? num tem condição]. [agora se ele comprou esse carro e não tinha condições] de comprar:, igual ele alego:u que não tinha condição (nenhuma) de comprar [e pagar em di:a] [ eu não- ] >eu não aleguei que eu não tenho condição de comprar, não.< [cê que tá falando]. ninguém [forçou ele ] a comprar na:da. 116 263 264 265 266 267 268 269 270 Marta José Lucas José 310 311 312 313 314 315 316 317 318 319 320 321 322 323 324 325 326 327 328 329 330 331 332 333 334 335 336 337 338 339 340 341 342 343 344 345 346 347 348 349 350 351 352 Marta Lucas José Lucas Marta José Marta José Lucas José Marta José Lucas Marta [( )] [ cê que] tá falando.] [ninguém for]çou ele a comprar NADA.] >eu te- eu tenho [tanta condição de pagar, que tem dois meses]= [º( )º] =[as duas prestações já estão pagas lá, tá?] não, pera aí::::: José:. ºva::mos com calma.º (1.8) (dá uma paradinha °aqui°). (2.2) vamos ver o quê a gente pode faze:r, <por isso, (.) pra trocar. porque: (.) corre:ia, eu:- eu: entendo [muito pouco ]= [correia de carro-] =de carro, [ma:s-]= [NÂ::O]. tem coisa aqui [( )]= =[é des[gaste: e ta::l] =COM CERTEZA. [tem coisa aqui: que tem que não-] [°(isso aí o mecânico)° ] [t e r i a q u e t e r olhado]. [tem coisa aqui que tem-] com certeza. que nu:m- é parte não. mas pe- a maioria é:- (.) com certeza, [mas (tem que checar)]. [ então vamos fazer ] o:: seguinte, (.) é:: Lucas, (1.2) apresenta uma proposta, (.) do que você pode pagar aqui pra ele, depois você vai apresentar a sua contraproposta.= =já paguei trezentos reais de mecânico, (<ainda tá:::)(só que o carro ainda não [tá:: ó-)] º[isso aí] eu não tenho. eu tenho sócio, eu tenho que conversar com e:le. isso aí eu num posso [( )]º [<NÃO. mas] aqui você veio como:- o representa::nte legal da sua em[pre::::sa, ] Lucas Marta Lucas Marta Lucas Marta José 461 Marta 462 José 463 464 465 466 º[(pô. mas eu] tenho que falar com ele)º. (0.5) então a gente:-= =não posso? (.) >porque senão a gente tá se passando como (tratante),< como:: (um:::-) (1.2) ( ). ºno direito dele. ué.º (1.8) então::: você começa com a sua propo:sta. (vamos ver o quê) ele faz? >eu quero [o ↑lícito] uai.< qualquer lícito. ele sabe [o quê]= é (voltam-) vão:::- faz a sua proposta.= =é igual:- >se eu- se eu < num mandasse trocar algumas coisas aqui no carro?, o quê que aconteceria com o motor. o carro não ia parar. (1.0) você não te:m- que trocar? (.) 117 467 468 469 470 471 472 473 474 475 476 477 478 479 Marta José 493 494 495 496 497 498 499 500 501 502 Marta 608 609 610 611 612 613 614 615 616 617 618 619 620 621 622 623 624 625 626 627 628 629 630 631 632 Ana Lucas Marta Lucas Marta 710 711 712 713 714 715 716 717 Ana Marta José Marta José José Marta Lucas Lucas Pedro Lucas Pedro Lucas José Lucas Ana Pedro José José Lucas Ana José Ana >°claro.°< então:::: não é peça do motor, uai? (1.2) então faz sua proposta. [v ã o lá José] [não, minha propor]sta é o q[eu- eu-] [é tudo.] eu quero o segui:nte. eu quero que ele- (.) que elevê o quê que ele pode fazer, porque eu não tenh-, não é que eu num tenha condição. eu não vou: (.) pagar mil e cem reais num conserto, (.) que eu tô pagando trezentos reais num carro, trezentos e pouco. eu vou pagar mais mil reais a mais. não tem condição. olha, com mais esse preço que você vai gastar, você compraria [u::::::::m-] [com certeza]. (0.5) um outro carro. (0.8) vão Lucas. vão vê o quê que a gente pode fazer aqui? (1.5) °a reclamação dele° (.) se o carro tivesse:: quebra:do, fundido o motor igual perante a garantia, (.) aí [ sim ] [ºvocê tem que apresentar uma proposta para eleº]. =é:: balança, >não mas ele-< ele não quer proposta nenhu:ma. é:: p[ a s t i l h a ], [mas você veio aqui] para (apresentar) s[ua proposta]. [trava de pa]stilha, disco de fre:io. a correia é dentro do motor, você tem que abrir o motor para você ver. é (você vê que), tudo isso são coisas de desgaste natural do carro. (1.0) a correia dentada. (0.5) isso aí são tudo de desgaste. (2.0) não tem nada aí que:: ºnão?º bomba e[lé t r i ca ] [tensor d e ] velocidade, bomba, também tudo é desgaste. ((risos do José e Pedro)) (.) bomba elétrica= =ah! então tudo é desgaste. ((risos)) então tudo é desgaste, ué. [e a:::::e a nota] fiscal do carro? cadê ela?= =nu- nu- nu me deram. ºº( ) o carro é de terceiro ( )ºº. ((riso de José)) =(mas tem que ter) uma no[ta de venda, ué. ] º[mas tem que ter tudo, uê.]º tem que ter uma nota de venda, uê! (quer dizer que) 118 718 719 720 721 722 723 724 725 726 727 728 729 730 731 732 733 734 735 736 737 738 739 740 741 742 743 744 745 746 747 748 749 750 751 752 753 754 755 756 757 758 759 760 761 762 763 764 765 766 767 768 769 770 771 Lucas Marta Lucas José Ana José Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas Ana Lucas Ana José Ana Lucas José Ana Lucas 830 Ana 831 832 833 você é isento de- de pagar imposto? ºunhumº. do carro é( ) a senhora não me conhece, sabe onde é o problema do carro= =tá, mas se você tem uma con[cessionária, você tem que você tem que emitir uma nota.] [meu estacionamento, meu estacionamento ] ahã! então você não tem uma- uma loja de vender carro= =então ele não pode vender carro, não é? (1.0) porque estacionamento é um estacionamento, ele não pode vender carro. (9.0) ((Med está analisando as notas de orçamento de peças)) (técnico caro é por conta do vencedor) ok! automóveis, é estacionamento?= =ºé estacionamentoº. e o senhor vende carro lá dentro? vende, carro também. porque lá pode fazer tudo. (1.5) o contrato social, não é? então não é só estacionamento?= =não é só estaciona[mento.] é [ uma concessionária de vender carro ] [ pode vender carro também isso que eu tô ] falando então tem que emitir nota fiscal dos carros que você vender. (.) algumas coisas. (.) por que algumas? (.) porque esse carro é de terceiro, isso não é meu. (.) ah! você vai me desculpar ma:s, tem coisa errada aí, né?= =aquise você vendeu lá dentro do seu:: do::- da- do- da:: sua loja (0.8) no seu contrato social, está como vendedor de carro, você vai me desculpar mas você tem que dar uma nota fiscal. (6.0) o quê que nós vamos fazer aí pra resolver isso é :: lucas? (9.5) deixa eu ver. oh! essa bomba aqui eu pago toda. pronto, pra não ter conversa pra não ter- pra não te::r-, essa bomba (elétrica). (0.5) o sensor de temperatura, desde o dia que eu peguei o carro (( tosse )) tá- tá- o carro vem oscilando. (.) vão pagar essa nota aqui. (0.5) não é NEM A METADE do que ele gastou. (0.8) essa aqui eu pago ó:: pedir essa n o t a gente for pedir essa enrolado ainda, né? [se a gente for f i s c a l . ] (3.5) se a nota fiscal, vai ficar mais 119 834 835 836 837 838 839 840 841 842 843 844 845 846 847 848 849 850 851 852 853 854 855 856 857 858 859 860 861 862 863 864 865 866 867 868 869 870 871 872 873 Lucas Pedro Ana José Ana José Ana Lucas José Lucas José Lucas José Lucas José Lucas José Ana José (3.2) duzentos e cinquenta e um, é tudo que eu posso pagar. (2.2) ( ). (0.5) é vocês que sabem. NÃO::, que isso- eu já [ gastei aqui ó: ] [senão, a gente] encaminha isso pra [justi:ça, encaminha isso pra receita] [seiscentos e trinta e um seiscentos e trinta e cinco] cento e dez com quatrocentos e oitenta e oito que eu vou pagar, quanto que vai dar aí? eu pagava trê- quatro prestações do carro. (.) então a gente encaminha isso pra justiça::, e pra receita pra- pra: questionar sobre as not[ as também. ] [você quiser re]ceber os duzentos e cinquenta e um, [eu te pago ] [ nã::o , ] não quero receber duzentos e cinquenta e um não. que eu vou gastar duzentos e cinquenta e um. agora, isso aqui eu não tenho como eu te pagar. (isso não). nã::o, mas tem coisa aqui que tem- tem aqui que::se quiser receber os du[zentos e cinquenta e um]. [ não quero ]. me dá um prazo que eu [te pago]. [ nã::o ]. (2.8) (pra morrer). (.) não! morrer ai eu morro no prejuízo também. (.) quê que você aceitaria. (.) não, eu quero ver eu quero o justo. igual aqui ó, você acha justo, você comprar um carro, você pa[ gar mi:l e: ] 1156 Lucas 1157 1158 1159 1160 1161 Ana 1162 Lucas 1163 [o negócio é o seguinte ]. eu vou apreçar uma bomba disso aqui, isso aqui eu já me proponho a pagar, porque eu já tô falando aqui. (.) [e isso aqui], eu vou ver quanto que custa, . e te ligo para você e= [o sensor? ] =te falo. eu dou meu parecer:, eu compro ou não compro. isso aqui eu já não proponho a pagar não. 1317 1318 1319 1320 1321 1322 1323 1324 1325 =então que::, a proposta seria ele pagar essas duas peças, tá?. e se que ele vai nos dar uma resposta até amanhã cedo, (1.2) de que:: se vai realmente arcar com isso, e que dia que entrega, para gente ver vai encerrar ou não es[s a : -]= >[é igual]< =esse processo, TÁ? e:: vê também com relação a::, a nota fiscal, né.= =é igual o motor, [o motor não funciona sem apar- sem Ana Pedro Ana Pedro 120 1326 1327 o jogo de ele vela. isso tudo, o motor em si, é o conjunto]. (.) ele não tem como funcionar. 7.5 Gesso 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 Flávia bom, ô: seu pedro eu não sei se você se inteirou na carta do que tava acontecendo Pedro não, mas eu sei o que está acontecendo já faz tempo já a gente sabe [o que está ]acontecendo. Flávia [ hum, hum ] Pedro olha, nós fomos indicados pra prestar um serviço ( ) tá, Sandra infelizmente, né. Pedro não, aí:: você vai entra num [ mérito que não vai ser julgado ] Sandra [ não, isso também não tem a ver ]( ) Pedro num va:i, é infelizmente, nós já temos ( ) que fala felizmente também. já tenho [dezesseis anos ] Flávia [ n ã o, per ]aí num vão, num vão entrar no mérito Pedro Então fala pra ela. não deixa eu falar, ela já teve oportunidade de falar Flávia hã hã, mas depois ela vai falar [ também ] Pedro [ va:i l]ógico. Flávia deixa que ele fala agora depois ( ) Pedro é: . então nós fechamos o valor com ela de dois mil reais pra quê: ela tem três quarto na casa dela, tem um banheiro suíte, um banheiro social, um hall de escada , um lavabo ,cozinha, sala de jantar e ela é ligada ( ) foi apresentado pra gente um projeto de uma firma concorrente nossa então nós orçamos o valor em cima desse o desse projeto vão fazer vão fazer papapá. ficou estabelecido que ela nos daria quinhentos reais mensais ,lá teve problema de parte elétrica, a cozinha atrasou um pouquinho, o:: azulejo pra poder, fomos embora, aí ela nos pagou mil reais, duas prestações de quinhentos reais, aí nós fizemos, os três quartos tão concluídos tem um friso do quarto dela que o esposo dela alegou que tinha um armário que vai ser feito que a posição do projeto não estava de acordo porque ia avançar o guarda-roupa e o friso não poderia ser ali o projeto na ma mas nós concordamos também num não tinha problema não. (1.8) o banheiro tem que fazer ( ) rapaz pra fazer o projeto (1.4) um vidro que ela desejasse cortar porque era vidro jateado tem que ela que tem que decidir. eu posso sugerir mas quem tem que decidir é eles. não sou eu, cê entendeu. a sala dela deu um problema técnico, de execução , não tinha no projeto da menina os tubos passando, depois passaram a ter, entendeu. então foi sugerido em função do que ocorreu um detalhe , por vários detalhes a gente sugeriu e deixou eles decidirem , um dia o esposo dela pegou e falou as- eu quero parar o serviço. (1.56) ele também não falou eu quero parar definitivo, de repente falou quero parar pra poder ver o que podia ser feito ( ) não retomou mais, ele 121 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 não falou mais. aí eu fui lá, peguei o material nosso (1.45) aí depois ele quis negociar o valor de novo , ele alegou que não tinha o dinheiro e tal aí que até fez um acordo do outro valor. e ele não chegou em acordo porque eles não chegaram acordo, ué. mas que parou o serviço foram eles. Sandra deixa eu te [ falar] Pedro [ só q]ue nem valor, ela falou mil reais, nós não executamos o serviço, nós fechamos um serviço de dois mil reais. não tem discriminação do que é mil que deixa de ser mil. nós temo um valor, dois mil. a gente conclui. agora, só que tem como a gente vai receber se ela quer que a gente conclui, tá entendendo. Flávia sandra, a sra. tem alguma coisa [ ( ) ] Sandra [ flávia,] o negócio é o seguinte, desde o início começou-se o serviço eles trabalhavam três dias e só iam pra receber dinheiro no meu serviço. isso aconteceu duas vezes. eu já até coloquei pra você. sendo que esses detalhes se vai por vidro ou não, depois o carlos conversou com o lucas e falou, conversou com o cara do vidro e falou, a gente não tem condição de pôr vidro agora, aí o cara do vidro falou olha, vocês mandam fazer o acabamento que tem que ser feito depois a gente quando você puder você encaixam o vidro. ficou feito isso. só que, o serviço todo deu três partes foram feitas; foram três sancas, mas assim, onde vai entrar iluminação que estava no projeto, isso aí não foi [ mexido. ] 244 245 246 247 248 249 250 251 252 253 254 255 256 Sandra [olha só, o]lha só o o orçamento do dia vinte e três. olha só quartos os três quartos trezentos reais, então vamos somar tá. o corredor que só tá no forro, não tem mais nada. aqui tá o corredor com rebaixo, ou seja, teria de ter o acabamento, duzentos reais. vamos fingir que tá está pronto. quinhentos tá= Pedro =mas ninguém falou que está pronto= Sandra =o banheiro, os banheiros, banheir- cem reais. a friso da- da- da- da porta também não tá colocado trinta reais. cozinha cem reais. se você somar são 600 reais se estivesse pronto. e não [tem nada pronto. não tem] 339 340 341 342 343 344 345 346 347 348 349 350 351 352 353 Sandra [ eu não quero o flávia! ]eu quero os mil reais que eu paguei, que eles façam os m[il reais ] Pedro [nós não te]mos condições de fazer isso, ué, Sandra o resto,eu já tô, já vou pegar outra firma, entendeu, já vou ligar pra o ( ) já vou conversar com a[mazinha ela vai lá, vai esperar vê o que que eles vão terminar lá pra acabar de dar jeito no resto, porque não tem jeito, cê viu o estado da minha sala, não tem jeito Pedro você tá falando, (1.5) nós não sua a [sala que o seu marido] interrompeu. Sandra [ eu tô com pintor lá, ] lógico, e[u tô]= Carlos [ ( ) ] 122 354 355 356 357 358 359 360 361 362 363 364 365 366 367 368 369 370 371 372 373 374 375 376 377 378 378 379 380 381 382 383 384 385 386 387 388 389 390 391 392 393 394 395 396 397 398 399 400 Sandra =com pin[tor lá ] Pedro [não foi ]nem rejuntado Sandra esperando ficar pronto pra acabar de fazer minha cozinha Flávia calma ( ), deixa eu te falar. ô, seu pedro, ela alega que te pagou mil reais= Pedro =mas nós não fechamos mil reais, fechamos dois mil reais, Flávia não [ ( ) ] Pedro [ ela alega,] nós alegamos que já tem mil reais. Sandra [ ué, eu tenho dois recibos ( ) ] Flávia [ não eu tô ( ) não quero quem s]ou eu pra ficar aqui, pra julgar Pedro [ eu tô conversando com você também], eu tô querendo conversar com você. eu também não, eu também não, tá certo Flávia vamos fazer o seguinte. o senhor acha que tem mil reais na casa dela pro::nto. Pedro eu acho não. eu num num, não é que acha que tem não, tá entendendo. como o valor dela foi fechado pra fazer dois mil, então vão orçar hoje e a gente vai achar mil reais lá, tá entendendo. e ela vai orçar e ela vai não vai achar. porque isso aí e tá numa interrogaçãozinha aí e::: quem [vai chegar isso aí.] Sandra [porque olha, o] senhor lembra que quando a gente conversou no:: telefone, o senhor falou que:: quanto que era o metro quadrado. Pedro não, eu sei. doze mil, doze reais o metro linear. o dela lá só tem quadrado na cozinha, no banheiro:: suíte, entendeu no no banheiro social, no lavabo Carlos é Sandra só tem isso por que foi o que foi feito. forro[ liso. forro liso. ] Pedro [ não, não importa. ]forro liso é [ forro, minha filha, tá entendendo.] Sandra [ tá! doze hoje. quando eu orcei, ]tá, ( ) seis reais o metro quadrado. mas [eu te paguei na época, te paguei em maio,] Pedro [ mas você orc-, olha só não, não] Sandra te paguei em abril e maio. Carlos [forro não, forro a seis reais não pode] Pedro [ não, não aqui, não isso não existe, p]laca é quatro reais Carlos forro a seis reais não foi pode não 622 623 624 625 626 627 628 629 630 631 632 Flávia peraí gente. não peraí sandra vamo com calma, não , não gente, aqui não é pra bater boca não. a gente tá aqui pra tentar resolver da melhor maneira possível. num num vão bater boca não, sandra, por favor. Sandra mas cê viu, ele tá falando que eu tô mentindo. Flávia não mas, peraí por favor g[ente não, pára ] Pedro [ como você falou ][o que ( ) ] Sandra [eu tenho provas ]aqui. eu tenho provas Flávia não tá, tá mas se a gente ficar brigando a gente não 123 633 634 635 636 637 638 639 640 641 642 643 644 645 646 647 Sandra Flávia Sandra Pedro Flávia Pedro Sandra Pedro Sandra vai chegar nunca num acordo tá. eu sei que cê tá brava [que cê não ( ) ] [lógico, mil r]eais é muito difícil, cara. vai trabalhar pra ganhar [mil reais]= [eu se::i ] =( ) [ que isso] [ não ( )] nada não sandra, tô falando de dois mil reais ( peraí o sandra) e se você me der mil reais pra mim fazer hoje [eu num quero]= [ deus me livre], =hoje eu não quero [deus me] livre 691 692 693 694 695 Carla [ existe um contrato.] Flávia não, não existe [contrato] Sandra [ eu tenho] recibo que eu paguei mil reais Flávia ela só tem um recibo 761 762 763 764 765 766 767 768 769 770 771 772 773 774 775 776 777 778 779 780 781 782 783 784 785 786 787 788 789 790 791 792 793 794 795 796 797 798 Carla dessa reunião aqui hoje é uma conciliação, tá. chegar num acordo em comum. agora, discuti::r, trocar ofensas, não vai chegar a lugar nenhum. então cada um tem que manter a calma e tentar entrar num acordo, porque se não entrar, vai sair daqui do mesmo jeito que entrou, tá. então a gente tem aqui que se acalmar, ver a proposta de cada um e ver se há acordo e se não há. se não houver não vai ter jeito de resolver aqui. cês vão ter que ir na justiça resolver, entendeu. porque não existe um contrato de prestação de serviço pra gente dizer se foi descumprido o prazo, se foi descumprido forma de pagamento, se foi descumprido forma de serviço a ser executado. não existe nada por escrito que a gente possa discutir em cima. então a gente tem que usar aqui o bom senso, tá? você contratou um serviço, tá insatisfeita, não foi feito no prazo devido. eles alegam também [ que:::] Pedro [nós tiv]emos problema ( ) Carla que não foi feito, que hou-, que houve problemas. então, cada um tem o seu lado, os seus as suas razões. nós estamos aqui pra tentar chegar num consenso. se for possível, ótimo. se não for, cês vão ter que resolver isso em outro lugar, entendeu. com perícias té::cnicas, com processos juduciais, tá. Sandra ãhn, rãn Carla aqui é conciliação. discutindo nós não vamos chegar numa conciliação. então eu pergunto, há meio de algum acordo, tem como eles terminarem o serviço Pedro é o que nós propor, a gente vai propor isso= Carla =só um minuto Sandra olha só, o negócio é o seguinte. eu não quero que eles terminem com base naquilo que já foi feito, porque eu paguei mil reais acreditando igual cê falou eu teria até que ter um contrato. eu não tenho porque tudo que eu tenho foi anotado de combinar, tá, de preço, isso é isso, isso é tanto, isso é 124 799 800 801 802 803 804 805 806 807 808 809 810 811 812 tanto. ((barulho no fundo)) eu acreditei, eu confiei tanto é que ele mesmo acabou de falar ainda há pouco que achou até legal que eu já tinha pago, chegou na cozi, não tinha nem ( ) eu já tava pagando, paguei mil reais, entendeu? só que o que tá lá primeiro não fo- o pouco que tá lá não foi concluído, entendeu. o cara, os pintores que eu fiz orçamento, todos eles falaram "olha infelizmente esse teto de forro liso eu tenho que dar três mãos de massa porque as placas são muito ruins, são todas muito remendadas", tudo quebrado, quebradinho, mal feito. a minha sala não tem condição, tá olha olha o tipo de placa, olha as quebraduras da minha [ sala, minha sala tá assim, tá.] 858 859 860 861 Carla não quer que eles terminem Sandra não quero, o que eu queria é que os mil reais queque eu já paguei fossem feitos. mil reais porque nem isso lá tem 1009 1010 1011 1012 1013 1014 1015 Carla Pedro [quantos po]rcento do serviço tá feito não, o percentual que tá lá tá:::, tá em termos porque só falta cortar os vidros jateados, cortar e colocar moldura. ela não decidiu o tamanho que ela quer do vidro. do jeito que ela é se colocar deste tamanho ela vai achar ruim, se por deste a:: então ela que [define] 1099 1100 1101 1102 1103 1104 1105 1106 1107 1108 1109 1110 1111 1112 1113 1114 1115 1116 1117 1118 1119 1120 1121 1122 1123 1124 1125 1126 1127 1128 1129 Carla [tem mil, eu quero saber o seguinte, tem mil reais.] mas ela que tá estabelecendo que mil. nós temo é dois mil, a gente quer [fazer o serviço dela. ] [tinha que ter pelo menos] quantos por cento. o contrato completo é dois mil o contrato dois mil, isso aí:: (flávia, não concordo) tá, mas ela não quer [mais , ela não quer mais ] [mas não tem discriminado,] mas não tem discriminado, mas não tem discriminado que cês façam o serviço cês tão discutindo não tem nem mais clima [pro senhor ir dentro da casa dela fazer] [ mas nós não temos o dinheiro, mas eu ]não tenho dinheiro pra (ela, quer que eu dou) os quatrocentos reais dela como. dr. carla, se eu paguei mil reais, quantos por cento tinha que ter de serviço pronto. não. eu quero saber o seguinte. não cinquenta porcento pelo menos, a sra. concorda. não, então vamos lá, vamos lá, vamos lá. olha só, eu fiz três quartos dela aí, aí ela vai entrar noutro mérito, não vai chegar não vou te dar os valores desde o início ô:::, só um momentinho, deixa eu acabar de perguntar pra ele. eu queria saber , sr. pedro, entre serviço e material o que que tem na casa dela. serviço e material não num num a gente não sabe falar assim não sabe por causa de quê, serviço de Pedro Sandra Carla Pedro Sandra Carla Pedro Carla Pedro Sandra Carla Pedro Sandra Pedro Sandra Carla Pedro 125 1130 1131 1132 1133 1134 1135 1136 1137 1138 1139 1140 1141 1314 1315 1316 1317 1318 1319 1320 1321 1322 1323 1324 1325 1326 1327 1328 1329 Carla Pedro Carla decoração às vezes cê (cobra) um valor em função da dificuldade, grau de dificuldade. a gente vai cortar vidro jateado, cê tem que cravar lá, o material em si é barato, mas a mão de obra é cara, ta entendendo. então o problema dela [todinho] [o sr.] tem que ter uma noç[ão se o sr. fez 10, 20, 30, 40, 50% de serviço, ué ] [ não, não não, é porque eu posso cobrar dois mil reais,] não isso dá, nós fizemos mais de 50%, ué. o custo maior, o maior é a placa de gesso, que custa mais infelizmente num (5.78). é uma pena não conseguir resolver isso logo né. porque normalmente nessas reuniões a gente consegue chegar num consenso. foi pago mil rea::is, o que foi feito lá por exemplo dá, foi feito mais ou menos mil, morre por aqui, ninguém deve ninguém. ou foi feito oitocentos, te dou duzentos, ou foi feito mil e duzentos cê dá me deve duzentos. sempre chega-se num consenso, mas infelizmente, com vocês aqui, a gente não tá conseguindo chegar a conclusão nenhuma. (1.46) e pelo o que eu já vi, a flávia já ficou aqui a bastante tempo, já tentei intervir e continua o mesmo impasse, né. então a gente (2.66) vai depender de opiniões de terceiros especializados pra avaliar esse caso, principalmente porque não existe um [contrato ] 7.6 Brasimac 15 16 17 18 19 20 21 Neusa Tânia 110 111 112 113 114 115 116 117 118 119 120 121 122 123 124 125 126 127 128 Neusa Neusa Tânia Diana Neusa Diana Neusa Diana Neusa Mário =e qual o problema que tá acontecendo?= = >não o problema é que< de acordo com o que: ela fala de ter ido já pra assistência, por quatro vezes >pelo mesmo problema< ela já teria direito, = =sei= =a outro produto, ou o dinheiro de volta. então eu não [tenho como] senhora diana, nessas idas e vindas vocês fizeram também mais de trinta dias, não já? no- na primeira vez nesse- nesse tempo de um mês, eu desci com ele três vezes. (1.0) dentro de um mês. aí foi, eu levei ele pra casa >quando vi que eu ia pagar uma prestação que até tava atrasada (de um cliente que ela calculou lá) e tal< aí eu cheguei em casa o som tava com o mesmo defeito! não- aí- aí já tinha dado mais de trinta dias. isso em outubro? ( ) aí já tinha- aí tava com mesmo problema (2.0) (mas olha só) na primeira vez ela só me deu essa ordem. nem falou o que foi feito nesta ordem, não tá constando nada.= =não tá especificando, não? constando só: lá assim o cd não lê. se::i= =não, não, mas quando o aparelho entra, você não va:i sabê realmente o que tem no aparelho, isso aí 126 129 130 131 132 133 134 135 136 137 138 139 140 141 142 143 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 155 156 157 158 159 160 161 162 163 164 165 166 167 168 231 232 233 234 235 236 237 238 239 240 241 242 243 244 245 José Diana Mário Diana Mário José Mário José Mário Neusa Mário Neusa Diana Neusa Mário Neusa Mário Neusa Diana Neusa José Neusa Diana Mário Diana Mário Pedro Mário Pedro 289 Neusa 290 deve ser a ordem do serviço que foi dado pra senho:ra, quando o aparelho entrou.= =(absolutamente) [quando ( )] [então ele entrou todas as vezes] não, [não] calma [mais] ele [entrou] todas as vezes, né?= [calma ] =mais eu só tô te perguntando.= =não, não, calma nós não estamos aqui [exa]cerbando o:= [né?]= =calma, estamos conversando e chegando [a:- a uma solução.] [tem até uma parte] aqui, né? que você fez a descrição ó: <peça e ou defeito.> no caso até mesmo a forma também da:- da assistência técnica também, que tem o [atraso lá.] [mas teve] a reparação mecânica doutora reparação mecânica não se troca nenhuma peça, só faz o ajuste= =uma peça no:- mas não tá constando= =[não mais é: nisso que eu estou falando] na:= =[o dia que foi entregue pra ela] dezesseis do nove (0.5) é doutora: vamos- vamos ser prático= =é= =a gente ta- a gente tá discutindo aqui o sexo dos anjos. o quê que a doutora- o que que a dona diana tá querendo, senhora diana eu queria a devolução do dinheiro, o dinheiro é: = =valor pago. a senhora pagou quanto? (32.0) eu paguei duas prestações de 59, e uma de 64 reais (.) (falta 5). (9.0) eu fiz as contas aqui, deu 319?= =não. ahã= =<foram 8 de 58.08> =é mas isso é sorte o senhor falou mesmo.(2.0) você quer fazer alguma proposta, pedro? deixa eu falar:, eu tô ouvindo aqui mais a gente quer servir bem. eu assumi a loja lá no mês sete, a senhora não gostaria por exemplo de ir na loja, e escolher um aparelho, nós temos lá experiente, outro modelo, outra potência, pra gente resolver. a gente faria por exemplo uma troca, a senhora pagou os- os valores que a senhora pagou consideraria como entrada na nova compra, e você escolhe outro produto >por exemplo,< tem experiente, tem da aka, tem,= =da marca que o senhor quiser. porque aí o senhor escolhe lá, vê o preço, a gente negocia porque [pra ter uma coisa] porque aí no caso seria uma: decisão mesmo, né? da senhora que é a consumidora= 127 291 292 293 294 295 296 297 298 299 300 301 302 303 304 305 306 307 Diana Neusa Pedro 436 437 438 439 440 441 442 443 444 445 446 447 448 449 450 451 452 453 454 455 456 457 458 459 460 461 462 463 464 465 466 467 468 469 470 471 472 473 474 475 476 477 Mário Mário Diana Mário Neusa Mário Neusa Mário Diana Mário Diana Mário Diana Mário Pedro Mário Neusa Pedro Neusa Pedro Mário =não, mas eu não gostaria. certo. a senhora prefere mesmo [a:: devolução] [mesmo porque,] a gente [tá tentando mesmo porque,] [>( )<] deve salientar pra ela, desculpa pedro te cortar, porque: se a empresa não quiser fazer a restituição hoje, ela não é obrigada a fazer não. isso aí é só mesmo pra igual ela tava >falando aqui a respeito da restituição,< é: a empresa tá queren- tá querendo te propor um acordo.= =o prazo é dia quantos [dias pra mim ter a restituição] [obrigação legal não, não] se a senhora quiser a restituição, é:- é- a empresa não- quisesse negar a restituí-la, a senhora vai ter que conversar em juízo pra poderdeixar bem claro pra senhora, não tenho nada a ver com a empresa. mas eu tô até me colocando porque: a senhora e eu sabemos o incômodo que é uma pendenga judicial= =ah é extremamente cansativo porque [( )] [se ela tá] se ela tá se achando cansada, desse vai e vem até vindo na fase do procon, [se- sepa-] [que é um fase ] extremamente rápida= =se- se passar pra fase judicial, a senhora vai se sentir esgotada [porque,] [pois é.] eu não tenho tempo eu queria que [desse pra resolver da melhor maneira.]= [então! mas é o que eu tô falando pra senhora!] =(eu tô com uma tia doente.) eu tô tendo que- ela tá no cti, a gente tá tendo que é, todo dia eu tenho que passar na casa dela, pra- porque ela só tem uma filha: e [fica um pouco umauma] [ mas não é aí que tá baseado ] isso não dona diana! que [se ase a empresase a empresa ] [>será que não teria como resolver de uma maneira<] é::, melhor pra mim ? mas se o pedro, ele- ele é empregado, ele não é dono da firma [não. ele tem um limite.] ele não= [é. eu tenho que passar] =pode- é- é uma firma enorme, co::m setenta unidades como é que ele vai- se a firma lá de são paulo fala: [ó não pode. não pode] [você sabe se o seu luiz roberto:] é:: acho que é aquele gerente da empresa, [se encontra aqui?] [luiz roberto é gerente] regional.= =é: se encontra aqui em juiz de fora? ele tava::- tava viajando, eu posso verificar. porque se a empresa falar de são paulo, ó eu não vou , não vou restituí o dinheiro. ele fica de pés e mãos atados. a senhora[sabe disso , ué] 128 478 479 480 481 482 483 484 485 486 487 488 489 490 491 492 493 494 495 496 497 498 499 Diana 527 528 529 530 531 532 533 534 535 536 537 538 539 540 541 542 543 544 545 546 547 548 549 550 551 552 553 554 555 556 557 558 559 560 561 562 563 Pedro Mário (Diana) Neusa Mário José Diana Mário Diana Mário Pedro Mário Diana Pedro Neusa Diana Pedro Mário Pedro José Diana José Pedro Mário Diana Mário Pedro [mas não é a finan]ceira que já pagou pra ele? (.) <nã:o dona diana.> a senhora não tá entendendo. se a empresa falar lá, não vamos restituí, vamos brigar na justiça, a senhora vai ficar esperando um ano.= =não. tudo bem!= =( ). eu tô falando que não tem problema. só que ela tá se dano por cans- por cansada. eu tô falando, doutora porque ela falou que tá cansada desse vai e vem (.) o vai e vem judicial é muito pior. vai se demorar muito ma:is, vai se ter um- um ano de briga, isso pra si- pra assim, tem-se- tem-se um direito dela a ser garantido, por direito. que vai se discutir, pra se vê se- se ele é lícito, se ele é certo, se ele não é certo. tô falando que: de repente a proposta do- do senhor pedro, não é das piores não, eu to- tô fazendo aqui o pap( ) [o desaforo que o cara (aprontou) pra mim]= [o que que o senhor pode fazer por mim?] e a gente tá lá na nova- na unidade lá há algum tempo, a gente pode tentar resolver, ué? vê lá o produto, né? o josé, (escolhe, vê.) o que eu quero evitar pra senhora é o vai e vem mesmo dona diana. é porque esse vai e vem judicial realmente ele: é: (1.5) pra quem não lida com ele no dia-a-dia,e quando é:[( )] [tem jeito de você me dá o produto] no valor que eu paguei? é o:= =no valor das três parcelas?= =é= =é= =o valor na conclusão, calculamos aqui [tudo] [mais] o valor a vista! pois é eu verifico lá, a gente vê sim pra você = =quanto a isso não tem problema [n ã : o] [até pra] agilizar mesmo, né? eu até pedi (isso) ao rapaz lá [( )]= [pediu] =>falei assim pode trocar a trôco de um raque, de outra coisa, eu pago a diferença?< e ele falou não eu não vou fazer [nada ( )] [não, eu verifico lá pra você] o= =o senhor vai lá, escolhe o produto [( )como crédito] = [não, eu não quero não] quero. não tá dano de jeito nenhum [porque:: eu] [então doutora,] [vai trocar isso aí como crédito pra ela] [eu vou lá e verifico, eu vou lá e verifico e::] a gente dá um- entendeu? eu tenho- até isso eu teria que vê [> mais é: jogo rápido<] 129 564 565 566 567 568 569 570 Neusa 797 798 799 800 801 802 803 804 805 806 Neusa 850 851 852 853 854 855 856 857 858 859 860 861 862 863 864 865 866 867 868 869 870 871 872 873 874 875 876 877 878 879 890 891 892 893 894 895 896 897 898 Diana Neusa Diana Pedro Mário Diana Neusa Mário Diana Diana Neusa Mário Neusa Mário Pedro Neusa Mário Neusa Mário Pedro Neusa Pedro Mário Pedro Mário Pedro Neusa Pedro Mário Pedro [a s e n h o r a] tem certeza que você quer um outro produto ou a se[nhora-] [ é: ] [tá na dúvida?] [porquenão] se ele puder ou me devolvê o dinheiro, aí se ele não consegui, outro produto.= =de um: liquidificador que custa cem reais. e os 83 e 40? vocês vão restituí em dinheiro? não, eles vão [comprar outro] produto [escolhe outro], escolhe outro produto. não, mais eu não importo não. ( ) dinheiro nenhum ou ela compra (1.5) [perto disso aqui-] [até complemen]tar o crédito todo dela. tá. =posso te fazer uma pergunta? e se a empresa não aceitar no caso essa proposta? não, mas aceita. >não, não<= =a venda do produto? ele- ele- ele- ele:[( )] [( )] ele pediu um prazo- a senhora até falou, de três dias pra ele podê:: corroborar a decisão da:[da diretoria] [> mas tá um negócio<] bo:m demais pra empresa, pra empresa ( ) não aceitar. mas não depende dele, ( ) não, mas é que eu tô::= =não: sei= =eu tô vendo (1.5)(vou lá, né?) tudo leva a crer que: né? é ué= =que vai acei[ tá] [pra] poder resolver, ué? tá, a gente vai até constar aqui: no: termo de aco:rdo porque a senhora como consumidora, é: a- a princípio pretendia até receber o dinheiro. é::- o dinheiro, né? corrigi:do monetariamente tal, mas a senhora querendo tanto facilitar o acordo, que até abriu mão do que a senhora inicialmente desejava, desejando::= =[e- e mesmo a empresa também e a cassic] [coloca- colocacoloca, que esse acordo] só terá a validade daqui a::= =não é mesmo a:- e a cassic também aí no caso aí, tá abrindo mão, doutora e tem as prestações atrasadas aí, e o aparelho não tava parado lá na assistência esse período todo. eu tô propondo (1.5) aqui: envolve aí a sua proposta, dessa resolução pelo som pra poder considerar a entrada pra resolver. isso aqui: é um opção que ela deu que eu vou consultar: pra tentar resolver num tô definindo o acordo.