A formação de educadores do campo para uso das
tecnologias digitais na educação na LEdoC-UnB
Wanessa de Castroi (UnB)
Resumo:
A Licenciatura em Educação do Campo da UnB, LEdoC-UnB, busca
construir um caminho que signifique uma nova perspectiva de formação de
educadores vinculada às causas, desafios, cultura e história de resistência
dos povos do campo. Esse artigo tem como objetivo apresentar os
principais elementos desta formação, dando ênfase às estratégias de
produção de conhecimento ligadas aos processos de comunicação e às
tecnologias da informação e da comunicação, utilizadas a partir da criação
da área de conhecimento denominada Comunicação e Tecnologias da
Informação. Neste componente curricular os educandos constroem
conhecimentos acerca da educação mediada por computador e a partir da
produção de objetos de aprendizagem vinculados à sua realidade no
campo.
Palavras-chave: Educação do Campo; Tecnologias de Informação e
Comunicação; Formação de educadores.
Introdução
É notável a necessidade de se construir novos rumos para a educação do
Século XXI. O modelo educacional utilizado, ainda hoje, em nosso país remonta
àquele construído para atender às necessidades de séculos passados. Muito se
evoluiu de lá para cá em todas as áreas do conhecimento e os meios de
comunicação sofreram grandes transformações influenciando, de maneira mais
significativa, nas relações sociais e comerciais. Enfim, podemos dizer que o mundo
mudou rapidamente nos últimos tempos e a educação tem se transformado a passos
muito lentos.
Por outro lado, apesar da importância que o campo tem para a sobrevivência
de todas as pessoas, muito se tem feito para o bem-estar dos sujeitos que ali
vivem, trabalham, estudam. A maior parte das políticas públicas se tem
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estabelecido é voltada para o meio urbano, bem como aquelas voltadas à educação
escolarizada. Assim, ano após ano, as pessoas são obrigadas a saírem do campo,
local onde construíram suas raízes, para estudar na cidade ou em outras
comunidades distantes, por falta de opções em suas próprias comunidades.
Apesar disso, temos presenciado uma quebra do silenciamento1 sobre o campo
brasileiro nas pesquisas sociais e educacionais que acontece a partir da mobilização
de educadores do campo organizados, pesquisadores, universidades e educadores
inseridos em movimentos sociais espalhados por todo o país, sujeitos esses que se
colocam a serviço da construção de uma verdadeira Educação do Campo, que
esteja vinculada a um novo projeto de nação para o Brasil.
Nesta perspectiva,
Este movimento de Educação do Campo está ajudando a produzir um novo
olhar para o campo. E faz isso em sintonia com toda uma nova dinâmica
social de valorização deste território e de busca de alternativas para
melhorar a situação de quem vive e trabalha nele. Uma dinâmica que vem
sendo construída por sujeitos que já não aceitam que o campo seja lugar
de atraso e de discriminação, mas sim consideram e lutam pra fazer dele
uma possibilidade de vida e de trabalho para muitas pessoas, assim como a
cidade também deve sê-lo; nem melhor nem pior, apenas diferente; uma
escolha. (UnB-FUP, 2009a, p. 5)
Uma destas iniciativas em prol de uma educação do campo contextualizada,
voltada para a construção e reconhecimento de saberes plurais, também
denominados por Boaventura de Sousa Santos (MORAES, 2008, p. 20) como ecologia
de saberes, é a Licenciatura em Educação do Campo, que já acontece em algumas
universidades públicas brasileiras, dentre elas, a Universidade de Brasília.
O texto que se segue é o relato ainda preliminar do trabalho que é fruto de
um projeto de pesquisa de doutoramento na área de Educação e Ecologia Humana
da Universidade de Brasília. Como o projeto está em andamento, ainda não é
1
Termo utilizado por Arroyo, Caldart e Molina na apresentação do livro “Por uma educação básica do campo”, p.08,
Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.
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possível apresentar resultados finais, porém vários conhecimentos têm sido
desencadeados a partir do processo já iniciado e tencionamos apresentá-los neste
paper. O artigo foi dividido em cinco partes em que trato, em primeiro lugar, de
fazer uma apresentação da Licenciatura em Educação do Campo – UnB com a
finalidade de fazer uma contextualização.
Logo em seguida, ainda dando continuidade à contextualização, trabalho o
componente curricular denominado Comunicação e Tecnologias da Informação no
contexto da educação do campo e justifico a necessidade da realização da pesquisa
ora apresentada.
Dando sequência, trago o tema Formação docente para atuar com educação
mediada por computador, em que delimito a concepção de educação e de uso das
tecnologias com as quais trabalhamos.
Mais à frente, o leitor terá contato com uma explicação sucinta sobre os
procedimentos metodológicos que estão sendo adotados nesta investigação ainda
em construção.
Por fim, são delineados limites e perspectivas das novas estratégias
formativas a partir do quadro retratado e das expectativas dos sujeitos envolvidos
na pesquisa e na formação como um todo.
A Licenciatura em Educação do Campo na UnB
Esta Licenciatura em Educação do Campo da Universidade de Brasília –
LEdoC – habilita educadores para atuarem nos anos finais do Ensino Fundamental
e também no Ensino Médio, através de nova estratégia de formação docente,
cuja principal característica é formação multidisciplinar, capacitando estes
futuros educadores para o desenvolvimento de práticas docentes em grandes
áreas de conhecimento. Estes cursos têm como perspectiva a preparação de
educadores para uma atuação profissional que vai além da docência, incluindo
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também a formação para a gestão dos processos educativos que acontecem na
escola e no seu entorno, bem como para produção de materiais específicos para
o trabalho em escolas do campo (UnB-FUP, 2009a).
Uma das principais características diferenciadoras em relação a outras
licenciaturas é que a metodologia, por ter como foco grupos sociais do campo,
utiliza-se da Pedagogia da Alternância2, tendo diferentes tempos e espaços
formativos em sua execução. Existem os períodos de formação que acontecem
na universidade proponente, denominados Tempo Escola, e existem os períodos
de formação nas comunidades rurais das quais se originam estes sujeitos,
chamados de Tempo Comunidade, nos quais são desenvolvidas práticas
educativas em diferentes áreas de conhecimento, com a presença e o
acompanhamento dos docentes da universidade que é responsável por sua
oferta. A intencionalidade pedagógica desta metodologia é oportunizar, durante
a própria formação destes estudantes, a possibilidade de sua prática como
agente de desenvolvimento rural nas diferentes áreas de atuação para as quais
estão sendo preparados a atuar como futuros profissionais (UnB-FUP, 2009b).
É de suma importância fazer esta contextualização tendo em vista que a
Licenciatura em Educação do Campo, pelas especificidades que a compõem,
carece de uma atenção especial às questões relativas aos recursos utilizados nos
processos educativos, que quase sempre não são produzidos para e pelos
sujeitos do campo e, normalmente, trazem subjacentes ideologias que não
casam com a identidade cultural e social dos sujeitos envolvidos. Sobre este
tema Arroyo traz uma reflexão bastante pertinente, quando diz que:
É urgente rever essa cultura e estrutura seletiva e perguntar: que
estrutura de escola dará conta de um projeto de educação básica do
2
A Pedagogia da Alternância atribui grande importância à articulação entre momentos de atividade no meio
socioprofissional do jovem e momentos de atividade escolar propriamente dita, nos quais se focaliza o conhecimento
acumulado, considerando sempre as experiências concretas dos educandos (TEIXEIRA, BERNARTT & TRINDADE, 2008,
p.229).
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campo? A estrutura que tenha a mesma lógica do movimento social, que
seja inclusiva, democrática, igualitária, que trate com respeito e
dignidade as crianças, jovens e adultos do campo, que não aumente a
exclusão dos que já são tão excluídos. Tarefa urgentíssima para a
construção da educação básica do campo: criar estruturas escolares
inclusivas3 (ARROYO, 2004, p.86).
Enxergo, aqui, que quando Arroyo cita a necessidade de rever as estruturas,
fala não somente dos prédios físicos, mas também de tudo aquilo que circunda a
escola do campo: prédio, distância da escola em relação aos discentes, professores
da comunidade atendida, materiais didático-pedagógicos, enfim, tudo que é
inerente aos processos educativos vivenciados na instituição escolar. Ele deixa isto
bem claro, quando diz que “a questão que teremos de nos colocar é: que escola,
que concepção e prática pedagógica dará conta do direito à educação básica”
(idem, p.73) desses sujeitos do campo? Tem havido, segundo o autor, um
descompasso marcante entre o avanço da consciência dos direitos, promovido pela
mobilização
dos
movimentos
sociais
organizados,
e
a
educação
escolar
propriamente dita. Ou seja, os sujeitos do campo sabem de seus direitos, mas esses
lhes são negados por uma série de fatores, dentre eles, a falta de formação para
atuação nestas escolas do campo.
O currículo da escola do campo precisa privilegiar os saberes construídos por
cada comunidade, mas precisa também ter como foco os saberes necessários a uma
cidadania planetária, os saberes que preparam para a produção e o trabalho, que
preparam para a emancipação, para a justiça, os saberes que preparam para a
realização plena do ser humano como humano (idem, pp. 82-83 ) e que lhe dê o
direito de se constituir cidadão que deseja continuar no campo e ter possibilidade
de sobreviver e viver com dignidade a partir do seu próprio trabalho e da sua
própria produção. Também sobre a questão dos saberes nos falam Santos, Meneses
& Nunes (2005) quando arrazoam que:
3
Grifo do autor.
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Ao longo dos séculos, as constelações de saberes foram desenvolvendo
formas de articulação entre si e hoje, mais do que nunca, importa
construir um modo verdadeiramente dialógico de engajamento
permanente,
articulando
as
estruturas
do
saber
moderno/científico/ocidental às formações nativas/locais/tradicionais
de conhecimento. O desafio é, pois, de luta contra uma monocultura
do saber, não apenas na teoria, mas como uma prática constante do
processo de estudo, de pesquisa-ação. Como Nandy (1999) refere, o
futuro não está no retorno a velhas tradições, pois nenhuma tecnologia
é a neutra: cada tecnologia carrega consigo o peso do modo de ver e
estar com a natureza e com os outros. O futuro encontra-se, assim, na
encruzilhada dos saberes e das tecnologias. (p. 54)
A escola do campo, na maioria dos casos, ainda prescinde do uso do
computador e da Internet por diversos fatores: falta de equipamentos e
conectividade, ausência de formação dos docentes para utilização desta
tecnologia, descaso dos governos em relação às escolas do campo por acharem que
no campo não seja necessária a utilização de redes digitais, caindo no debate
simplista de que as “escolinhas rurais” não precisam disto, enfim, é preciso fazer
um casamento dos saberes locais com os saberes globais. É preciso dotar de
oportunidades de conhecimento de mundo e de desenvolvimento as comunidades
campesinas, pois o ciberespaço pode ser este interlocutor, trazendo aos sujeitos do
campo informações que auxiliem na melhoria da produção agrícola familiar. É
necessário pensarmos em estratégias que promovam este desenvolvimento rural
sem que os sujeitos do campo tenham que abandonar seu lócus de vivência, estudo
e produção para ir em busca destes conhecimentos. O acesso às informações pela
Internet pode melhorar a vida no campo, seu modo de trabalho, técnicas de plantio
e cultivo autossustentáveis e ecologicamente corretas, além de trazer às práticas
pedagógicas inovações que melhorem os processos educativos. Continuará a escola
a negar esta realidade?
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Comunicação e Tecnologias da Informação no contexto da educação
do campo
Um grande passo para o avanço das escolas do campo em direção ao
atendimento destas necessidades foi dado a partir da instalação de Casas Digitais
nas comunidades assentadas da reforma agrária, das quais fazem parte os
educandos da LEdoC, turma 2. A Casa Digital4 é um telecentro equipado com dez
computadores, mobiliário, impressora, webcam e servidor, além de tecnologia de
transmissão de voz pela Internet e o planejamento do Ministério das Comunicações
é que até o final de 2010, cada comunidade que tenha um educando da LEdoC –
Turma 2 receba uma Casa Digital.
Diante deste contexto, surgiram indagações que nos fizeram refletir sobre
uma maneira de promover a inclusão, na escola do campo, de materiais didáticopedagógicos digitais, também denominados objetos de aprendizagem, que sejam
voltados para a realidade citada e produzidos pelos sujeitos que constituem esta
realidade. Ainda dentro desta perspectiva, inquieta-nos o fato de que à escola do
campo ainda é negado o direito a fazer parte de uma cibercultura, utilizando as
ferramentas computacionais para auxiliar na promoção da fixação dos sujeitos no
campo pelo desenvolvimento rural de suas comunidades. Ao realizarmos uma
aglutinação
destes
dois
fatores
cruciais,
nos
apareceram
os
seguintes
questionamentos que ora denominamos questões de pesquisa: de que forma seria
possível a construção/elaboração de materiais didático-pedagógicos digitais e
objetos de aprendizagem pelos graduandos da educação do campo, como
elementos de sua formação, mas também como forma de disseminação de
4
O projeto Territórios Digitais faz parte do Programa Territórios da Cidadania. Os Territórios Digitais consiste na implantação
de Casas Digitais – espaços públicos e gratuitos com acesso a computadores e Internet – em assentamentos, escolas
agrícolas, comunidades tradicionais, sindicatos e Casas Familiares Rurais. Em 2008, serão alcançados os primeiros
Territórios da Cidadania. A partir de 2009 e até 2010, a meta do projeto é ter Casas Digitais nos 120 territórios do
Programa. Fonte: http://www.nead.org.br/index.php?acao=princ&id_prin=67
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informações e conhecimentos às demais comunidades campesinas? Poderiam estes
materiais serem produzidos nas Casas Digitais de suas próprias comunidades, nos
chamados Tempo Comunidade?
Pensamos nesta construção baseada na concepção trazida por Santos,
Meneses & Nunes (2005) em que,
O conceito de “construção” é aqui um recurso central para a
caracterização do processo de produção tanto do conhecimento como dos
objetos tecnológicos. Construir, nessa perspectiva, significa pôr em relação
e em interação, no quadro das práticas socialmente organizadas,
materiais, instrumentos, maneiras de fazer, competências, de modo a criar
algo que não existia antes, com propriedades novas e que não pode ser
reduzido à soma dos elementos heterogêneos mobilizados para a sua
criação. Não faz sentido, assim, a oposição entre o real e o construído,
tantas vezes invocada para atacar os estudos sociais e culturais da ciência
e da tecnologia. O que existe – conhecimento, objetos tecnológicos,
edifícios, estradas, obras culturais – existe porque é construído (2005,
p.42).
Desta forma, além de dotarmos os sujeitos de informações que subsidiariam
suas práticas pedagógicas, traríamos a possibilidade de atender a vários desafios e
propostas de ação elaborados a partir das Conferências por uma Educação Básica
do Campo (ARROYO, CALDART & MOLINA, 2004, pp. 165-174) . Quais sejam:
•
Debater o papel da educação no processo de construção do novo projeto
de desenvolvimento;
•
Multiplicar este debate em todas as escolas do meio rural e urbano e nas
demais instância educativas;
•
Compreender as raízes dos povos do campo (valores, moral, tradição,
etnias, festas, religiosidade popular, histórias da luta do povo, símbolos,
gestos,
mística...)
e
incentivar
produções
culturais
próprias,
sensibilizando a sociedade para valorizá-las;
•
Construir trabalho pedagógico, específico e articulado, com técnicos,
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pesquisadores e educadores para que busquem conhecer e respeitar os
valores culturais dos povos do campo, de acordo com as suas regiões,
tendo como eixo a construção do conhecimento e o processo
participativo;
•
Garantir acesso à cultura tecnológica contemporânea, desde que
apropriada;
•
Fazer uma conscientização dos povos do campo sobre seu direito à
educação;
•
Buscar apoio à produção e à divulgação de materiais didáticos e
pedagógicos que tratem de questões de interesse direto das pessoas que
vivem no campo;
•
Propor aos pesquisadores que os resultados de seus trabalhos sobre o
campo sejam entregues às comunidades pesquisadas;
•
Constituir uma rede de educadores e educadoras do campo, organizando
um banco de dados com registros de experiências, pesquisas, publicações
para facilitar o intercâmbio das mesmas;
•
Reorganizar as formas, os currículos e os métodos dos cursos de formação
de educadores/educadoras, para que atendam à Educação Básica e à
Educação Especial, tendo como referência a realidade do campo;
•
Criar centros de educação permanente para educadores/educadoras do
campo;
•
Produzir e publicar materiais de apoio pedagógico às escolas do campo;
•
Utilizar os espaços da mídia para divulgar o Projeto Popular Nacional.
Talvez, estes desafios sejam as melhores justificativas para se construir um
projeto de pesquisa desta envergadura. Daí surge o objetivo geral da investigação
que é: investigar de que forma seria possível a construção/elaboração de materiais
didático-pedagógicos digitais e objetos de aprendizagem pelos graduandos da
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educação do campo, como elementos de sua formação, mas também como forma
de disseminação de informações e conhecimentos às demais comunidades
campesinas.
Para operacionalizar e tornar este objetivo geral factível, traçamos os
seguintes objetivos específicos:
Î Realizar levantamento de experiências, no Brasil e no exterior, de uso do
computador na educação do campo;
Î Construir uma proposta de estratégias e metodologias transdisciplinares
de produção de material didático-pedagógico digital baseado nos
conhecimentos do campo e para os sujeitos do campo;
Î Produzir, juntamente com os sujeitos do campo, materiais pedagógicos
digitais nos Tempos Comunidade;
Î Promover a catalogação e divulgação destes materiais na Rede Mundial de
Computadores com a finalidade de subsidiar o trabalho pedagógico de
outras comunidades campesinas gerando, assim, a multiplicação de
experiências bem sucedidas e como forma de fortalecer a Educação do
Campo.
Î Pesquisar a atuação dos sujeitos em formação a partir da produção e
utilização dos materiais produzidos.
Discutir todas estas questões e construir bases teóricas que respondam e
subsidiem esta proposta de pesquisa requer trazer estudiosos que têm escrito sobre
temas de extrema relevância para a investigação que se intenta realizar. Deste
modo, tentamos promover diálogos entre os autores que mostram a importância de
se construir alternativas de formação de educadores do campo subsidiadas por
práticas pedagógicas inovadoras, que têm como base uma educação emancipadora,
voltada para a realidade do campo e que seja pautada nos paradigmas da
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complexidade e da transdisciplinaridade, visando a formação integral dos sujeitos.
Sobre esta formação, em sua proposta de formação integral, Saturnino de la Torre
e O. Barrios (2002)
concebem a formação como mudança e têm como referentes ou
pressupostos teóricos da mudança como organizadora conceitual da
realidade e princípio de construção do conhecimento; a consciência
como construto que faz presente o que estava ausente, visível o
invisível, possível o imaginário, a conformação ou tensão inferencial
que está na origem de toda mudança; a complexidade como qualidade
inerente à ação, ao pensamento e sentimento humanos; a comunicação
como veículo de expressão e realização. (...)É a comunicação, em seu
sentido mais amplo, que nos humaniza (2002, p. 78 apud MORAES,
2008, p.215).
Formação
docente
para
atuar
com
educação
mediada
por
computador
É preciso que os docentes se mostrem sensíveis e atentos às mudanças da
sociedade, com uma visão transdisciplinar e com capacidade de constante
aprimoramento e depuração de ideias e ações, isto é, ao contrário do que realiza a
formação tradicional (CASTRO, 2008, p. 59).
Oliveira (2006) também afirma posicionamento semelhante quando diz que a
compreensão das múltiplas relações em que o indivíduo está inserido deverá ter
como proposta de educação um modelo completamente diferente daquele que se
tem caracterizado em nossa sociedade, em que se compreende o fenômeno
educativo como pura transmissão do saber, colocando o aprendiz como mero
receptor de informações, incapaz de desenvolver a criticidade sobre informações e
saberes trabalhados, por isso mesmo, alheio à necessidade de transformação da
realidade social vigente.
Também Freire (1996) afirma que
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A Educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com
a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como
seres ‘vazios’ a quem o mundo ‘encha’ de conteúdos; não pode basear-se
numa consciência espacializada, mecanicistamente compartimentada,
mas nos homens como ‘corpos conscientes’ e na consciência como
consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de
conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas relações com o
mundo (p.67).
No meu ponto de vista, a formação docente precisa restituir ao educador a
possibilidade de controlar seu trabalho, de construir seu saber, de buscar a função
social da escola onde ele atua, de definir com que concepção de educação ele
trabalha, o que exige, segundo Arroyo (2000), a redefinição da função do
especialista (docente), supostamente responsável pelo controle do produto e da
função social da escola e que na sociedade atual necessita se situar em um novo
paradigma, com novos sujeitos envolvidos, que pensam diferente, se relacionam
diferente e aprendem diferente daqueles aprendidos na maior parte dos cursos de
formação docente.
As tecnologias de informação e comunicação, e em especial o computador e
o acesso à Internet, têm proporcionado aos indivíduos novas formas de aprender e
de pensar. A expansão de possibilidades nessas formas de aprendizagem não
prescinde da relação educativa e do importante papel do mediador/facilitador
como articulador dos saberes a serem construídos pelos sujeitos (CASTRO, 2007, p.
92). O papel do educador precisa se transformar assim como e com tanta
velocidade quanto se transformam as formas de aprendizagem.
O professor é, em sua essência, um pesquisador e deve ser um constante
aprendiz, deve ser um formulador de problemas e dúvidas que incitem os
educandos, deve ser um parceiro. Segundo Fagundes (2006), as novas funções do
educador são exigentes: ele precisa tornar-se um orientador confiável, um
negociador nas buscas de problematização e testagens das informações disponíveis
nas fontes da rede mundial e, sobretudo, nas buscas de novas respostas. Para
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Moraes (1997) a qualidade educativa é possível, pois,
as instrumentações eletrônicas, se adequadamente utilizadas em
educação, poderão se constituir em ferramentas importantes capazes
de colaborar para a melhoria da qualidade do processo de
aprendizagem, estimulando a criação de novos ambientes educacionais
e de novas dinâmicas sociais de aprendizagem, colaborando, assim,
para o surgimento de certos tipos de reflexões mentais que favorecem a
imaginação, a intuição, a capacidade decisória, a criatividade, aspectos
estes fundamentais para a sobrevivência individual e coletiva (MORAES,
1997, p. 09).
Moran (2004) traz o relato de que durante muito tempo o computador foi
utilizado apenas como ferramenta de apoio ao professor e ao aluno. As atividades
principais continuavam tendo como centro a fala do professor e a relação com os
textos escritos. Era como se a situação tradicional, conservadora e conteudista fosse
transportada para o computador. Os casos em que professores continuam usando o
computador nesta perspectiva ainda são muitos, e diversos também são os que ainda
resistem à entrada do computador, da Internet e de diversas mídias digitais nos
processos educativos. O trabalho com tecnologias digitais de comunicação e expressão
implica mudanças que não passam apenas pelo querer dos docentes, passam por todo
o sistema e dependem, para terem sucesso, de transformação na organização da
escola e dos espaços educativos, na dinâmica de sala de aula (o que também tem a
ver com o número de alunos por turma), no papel do educador e dos educandos e na
relação de todos eles com o conhecimento.
Um ponto crucial que Valente questiona é sobre a formação dos professores
nesta área, ele lança a pergunta:
Sem o conhecimento técnico será possível implantar soluções pedagógicas
inovadoras e vice-versa; sem o conhecimento pedagógico os recursos
técnicos disponíveis serão adequadamente usados? (2005, p.23)
A estes questionamentos ele mesmo responde que é necessário se observar
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dois aspectos importantes na implantação dessas tecnologias na educação:
•
Em primeiro lugar, o domínio do técnico e/ou do pedagógico não deve
acontecer de modo estanque, um separado do outro. O melhor, de acordo
com Valente (op. cit.), é quando os conhecimentos técnicos e pedagógicos
crescem juntos, simultaneamente, um demandando novas ideias do outro.
•
O segundo aspecto diz respeito à especificidade da cada tecnologia com
relação às aplicações pedagógicas. O educador deve conhecer o potencial
que as tecnologias e mídias têm a oferecer e como pode ser explorado nas
situações educativas.
Ainda para Valente (2005), a experiência pedagógica do educador é que vai
fazer com que ele indague se o uso do computador está ou não contribuindo para a
construção de novos conhecimentos. É o docente que vai compatibilizar as
necessidades dos educandos e os objetivos pedagógicos traçados pelo coletivo
envolvido.
Procedimentos metodológicos
A compreensão da ciência como uma atividade que é parte da cultura e
que tem uma história é central para dar sentido às ações desenvolvidas
pelos investigadores. De fato, por muito “objetiva” que se pretenda que
seja qualquer investigação, esta nunca é neutra, pois a formulação das
hipóteses, a seleção das abordagens, as linguagens e imagens utilizadas
para a realização e interpretação dos resultados da investigação são
inseparáveis das influências culturais que os cientistas incorporam e que as
instituições e políticas científicas contribuem para reproduzir ou
transformar. (SANTOS, MENESES, & NUNES, 2005, p. 57)
Por acreditar que em uma pesquisa não há neutralidade, como bem
arrazoam
Santos,
Meneses
&
Nunes
(idem),
esta
pesquisa
se
pretende
transdisciplinar e participante, com envolvimento direto dos sujeitos pesquisados e
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pesquisadores. Transformando o movimento de ação-reflexão-ação um constante
ciclo de mudança e desenvolvimento do sujeito coletivo envolvido. Santos, Meneses
e Nunes ainda completam esta ideia dizendo que
O próprio ato de conhecer, como não se cansaram de nos lembrar os
filósofos ligados ao pragmatismo, é uma intervenção sobre o mundo, que
nos coloca neste e aumenta a sua heterogeneidade. Diferentes modos de
conhecer, sendo necessariamente parciais e situados, terão conseqüências
diferentes e efeitos distintos sobre o mundo. (SANTOS, MENESES, & NUNES,
2005, p.42)
A intenção primeira nesta investigação é a de desenvolver uma pesquisa de
base teórico-epistemológico-metodológica transdisciplinar (MORAES & VALENTE,
2008). Assim sendo, convém explicitar que a presente pesquisa se propõe:
construtivista, interacionista fundada na intersubjetividade dialógica, dinâmica,
não-linear, interativa, sociocultural, afetiva, transdisciplinar e aberta.
Desse modo e para trazer a discussão ao campo da práxis, estamos
realizando, inicialmente, uma pesquisa bibliográfica que servirá de base para a
construção da prática pedagógica e auxiliará no levantamento de estratégias que
possam auxiliar na produção dos materiais digitais.
Também está sendo realizado um levantamento de experiências, no Brasil e
no exterior, de uso do computador na educação do campo que nos auxilie na
construção das estratégias metodológicas que permearão esta investigação.
Neste mesmo período, concomitante à pesquisa bibliográfica e à pesquisa
por experiências nesta área, está sendo realizada uma investigação acerca das
comunidades e educandos que fazem parte da pesquisa, de modo a realizar um
levantamento das especificidades destes para que o trabalho seja contextualizado.
Em
concomitância
a
estes
levantamentos,
vem
se
constituindo
o
sujeito/pesquisador coletivo junto às comunidades em que se concretizará a
pesquisa propriamente dita. A partir dessa constituição a pesquisa passará a ser do
pesquisador coletivo, inserido em uma investigação-ação em que pesquisador e
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sujeitos se entrecruzem numa relação dialógica de investigação e produção de
conhecimento. E onde o objetivo maior passa pela mudança da situação atual, a
transformação de forma libertadora e crítica (BARBIER, 2004).
Limites e perspectivas das novas estratégias formativas
Até o presente momento, a pesquisa tem se desenvolvido nos chamados
Tempo Escola, em que os estudantes estão presentes fisicamente na Universidade,
e que os componentes curriculares são trabalhados a partir da matriz curricular
delineada. A turma escolhida em que está acontecendo a pesquisa é a denominada
Turma 2 e que encontra-se neste momento, em seu quinto Tempo Comunidade.
Esta ocorrência se deve ao fato de que as Casas Digitais das comunidades
envolvidas estão em fase de implantação e implementação, o que ainda dificulta a
pesquisa in locu.
A perspectiva é que até o próximo Tempo Escola da turma investigada as
Casas Digitais tenham sido completamente implementadas, quando passaremos à
próxima etapa da pesquisa. Além disso, com a implementação das Casa Digitais um
novo espaço de interação e construção de conhecimentos poderá concretizar, ou
seja, o ciberespaço e a utilização das redes sociais e dos ambientes virtuais de
aprendizagem poderão se tornar: novos espaços de interação, espaços de autoria,
de divulgação de suas produções, de pesquisas, enfim, os educadores em formação
poderão usufruir da Internet e seus recursos também como espaços de formação.
Já está instalado e sendo preparado para uso do ciberespaço como mais um espaço
formativo o Ambiente Virtual de Aprendizagem Moodle, que servirá de aporte para
os diálogos diversos necessários ao trabalho no Tempo Comunidade, seja espaço
para relações internas da Licenciatura ou mesmo para divulgação de suas ações na
rede Web, o que possibilitará contatos com pares em localidades as mais diversas.
Torna-se necessário destacar, ao pensarmos em trazer os resultados obtidos
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até o momento, que os sujeitos envolvidos na pesquisa, em sua quase totalidade,
nunca haviam utilizado um computador antes das experiências desta formação. Os
processos desencadeados até o momento e a partir do componente curricular
Comunicação e Tecnologias da Informação são: aulas nos quatro semestres letivos
que desencadearam a capacidade de: criação de apresentações em editores para
este fim; produção de vídeos a partir de filmagens amadoras ou de programas com
utilização de imagens; utilização das novas tecnologias de informação e expressão
nas aulas e apresentações de seminários; registro das realidades vivenciadas no
campo e a partir de sua cultura com apoio do computador; armazenamento de
arquivos diversos na Web. Vale lembrar ao leitor que antes das referidas aulas a
capacidade de expressão relacionada a elementos de sua cultura como dança,
místicas, música era apenas física e agora, com apenas quatro semestres de
trabalho em uma área que traz uma carga horária ínfima, em comparação aos
demais componentes curriculares, os educandos desenvolveram a capacidade de
expressão pelos meios digitais, o que potencializa e promove a divulgação às
expressões de sua cultura.
O caminho até a conclusão desta pesquisa ainda é longo e tortuoso devido a
inúmeros fatores que estão bem mais relacionados à exclusão histórica pela qual
passam os sujeitos envolvidos do que pela resistência ou pela falta de habilidade
inicialmente apresentada.
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