Obstrução Respiratória Alta Piva, Celiny, Garros 1 Obstrução respiratória alta em pediatria* *Texto modificado: Garros D, Piva J, Garcia. Obstrução respiratória alta em Pediatria. IN: Piva J, Garcia PC (Eds). Medicina Intensiva em Pediatria. Rio de Janeiro : Revinter. 2005. p377-400. Introdução torna turbulento (1), e a resistência ao fluxo se A via aérea da criança se diferencia da tornará inversamente proporcional a quinta do adulto em muitos aspectos: a) a laringe é potência do raio. Portanto o esforço será mais cefálica (ao nível de C2-C3 ao invés de C5- dependente do grau de obstrução e da luz da via C6 no adulto) e anterior em relação às vértebras aérea. Nos quadros mais graves, há um intenso cervicais; b) a laringe tem uma conformação em esforço respiratório, com tiragem inter e funil e estrutura maleável, tornando-se facilmente subcostal e até mesmo retração esternal durante colapsável e passível de compressão externa; c) a inspiração (Figura 1). a inserção anterior das cordas vocais é mais inferior, produzindo uma angulação anterocaudal; d) a epiglote em lactentes se projeta anteriormente em um ângulo de 45 graus tornando a intubação mais difícil; e) a língua é relativamente grande em relação as demais estruturas da orofaringe; f) a região subglótica apresenta um pronunciado estreitamento que Figura 1: Retração esternal conseqüente a pode ser objeto obstrução ou dificuldade na obstrução respiratória alta progressão do tubo traqueal; g) lactentes e crianças pequenas tem uma região occipital mais Sinais clínicos e sua correlação anatômica protuberante, que causar excessiva flexão do A obstrução de via aérea pode ser fixa, pescoço, bem como uma traquéia mais curta e limitando o fluxo de ar nas fases ins e macia sendo propensa ao colapso. expiratória, ou variável, com limitação mais A redução no raio da via aérea acarreta acentuada em uma fase da respiração. um aumento dramático na resistência ao fluxo de O nível da obstrução (extra ou intratorácico) ar. Estima-se que a redução no diâmetro pode ser definido de acordo com a fase do traqueal de 4 para 2mm, representa um aumento estridor. Estridor inspiratório reflete obstrução ao de 16 vezes na resistência ao fluxo aéreo (no nível supraglótico ou glótico (crupe), enquanto caso de ser fluxo laminar)! Quando a criança que o estridor expiratório é peculiar de está doente, agitada e taquipnêica o fluxo se obstruções abaixo das cordas vocais verdadeiras Obstrução Respiratória Alta Piva, Celiny, Garros 2 (ex: traqueomalácea). Lesões fixas geralmente diagnóstico de traqueíte exudativa, corpo geram estridor ins e expiratório (3). estranho, e compressão pela artéria inominada. Obstrução extra-torácica: Os pacientes com Porém, a sensibilidade foi muito menor para obstrução extra-torácica podem apresentar: laringomalacia (5%) e traqueomalácea (62%) (4). afonia ou rouquidão, tosse rouca e/ou metálica e Obstruções intratorácicas: O sintoma mais estridor. O curso da doença pode ser agudo freqüente é a sibilância expiratória. O diagnóstico (laringite (laringite diferencial mais importante é obviamente com espasmódica), crônica (estenose subglótica ou asma. Ao exame, os detalhes antropométricos, a progressiva – ex: papiloma de laringe). presença de cianose, o baqueteamento digital, infecciosa), recorrente Durante o exame é importante atentar tórax em barril, retrações e uso de músculos se os sintomas pioram ou aliviam com o acessórios da respiração podem auxiliar na repouso, com a agitação, com a posição ou com determinação da etiologia. o sono da criança. A presença de agitação, Os exames mais solicitados incluem dispnéia importante, retrações severas, cianose, Raio X de tórax, teste de suor, teste de função letargia ou coma indicam risco de morte e pulmonar e o estudo contrastado de esôfago e exigem intervenção imediata (entubação). estômago para detectar fístulas, anel vascular, Em condições agudas os exames etc.(6). laboratoriais e radiológicos são relegados a um segundo plano sendo o aspecto clínico o mais Patologias específicas relevante. Nessas condições, não se deve 1. Laringomalácea é a anomalia congênita mais aguardar por uma gasometria para decidir a comum da via aérea. Ela se caracteriza pela intubação traqueal. O uso da gasometria pode flacidez da cartilagem da laringe resultando em retardar a tomada de atitude, visto que colapso das pregas ariepiglóticas sobre a glote hipercapnia associada à hipoxemia é um sinal durante a inspiração (9). O estridor é usualmente tardio e ocorre de forma súbita. Hemocultura e inspiratório, agudo e posicional – diminui na swab posição nasofaríngeo podem auxiliar na prona. Com freqüência ele é identificação causa infecciosa. O Raio X de tórax intermitente, aumentando com a atividade física pode ser útil para demonstrar edema pulmonar e agitação sendo detectável desde o nascimento associado a obstrução de via aérea superior ou a ou nas primeiras semanas de vida. O choro do presença de pneumotórax. O raio X de pescoço lactente é normal. Problemas de alimentação e poucas vezes é util, podendo auxiliar no baixo ganho de peso podem estar relacionados diagnóstico de algumas condições tais como a ao esforço respiratório crônico. A epiglotite (sinal do “dedo polegar”). Numa revisão e fluoroscopia confirmam o diagnóstico. O de 144 casos, as radiografias de pescoço problema desaparece ao redor de 2 anos de apresentaram sensibilidade de 86% para o idade. laringoscopia Obstrução Respiratória Alta Piva, Celiny, Garros 3 Tratamento é raramente necessário. 2. Epiglotite. É uma condição que exige Quando ocorre infecção viral, a criança com tratamento urgente por sua rápida progressão e laringomalácea pode piorar muito e necessitar risco de obstrução total da via aérea. Se trata de intubação endotraqueal por colapso da via aérea uma inflamação aguda da região supra glótica, associado ao edema inflamatório e dificuldade que afeta em sua maioria crianças entre 2 e 4 de eliminar secreções. Na crise aguda de anos de idade(1). Felizmente, devido a dispnéia (precipitada por doença viral), deve ser vacinação contra o Hemóphilus influenzae tipo B, admitida à emergência pediátrica e administrar a incidência desta doença tem decrescido oxigênio dramaticamente. (cateter nasal ou mascara). Outros microorganismos Dependendo do grau de dispnéia, a alimentação podem causar epiglotite, incluindo Staphilococus por via oral pode ser suspensa e utilizada SNG aureus, Klebsiela sp ou Candida albicans. para descompressão gátrica (e, inclusive O curso clínico se caracteriza por febre alimentação). É prática em nosso serviço, de surgimento recente e progressão rápida, nessas situações, realizar nebulizações com estridor e disfagia. A criança se apresenta tóxica, vasoconstritor (ver adiante, página 5) associado prostrada e se posiciona caracteristicamente de a administração de corticosteróide. Quando não forma que seu tórax é inclinado para frente, com há melhora, o uso de pressão positiva expiratória posição preferencial sentada, respiração bucal e (CPAP nasal nos lactentes pequenos e BIPAP a hipersalivação (sialorréia). nas crianças maiores por máscara ou tubo Tratamento: Idealmente a criança com nasofaríngeo) pode ser benéfica. Em alguns epiglotite deve ser manejada em ambiente de casos, se torna necessário intubar o paciente e UTI com pediatra experiente com acesso à via mantê-lo com PEEP adequado (geralmente entre aérea (ou anestesista pediátrico). Radiografias 8-10) para evitar o colapso da via aérea. laterais de pescoço só vão atrasar o manejo, Por outro lado, pacientes com com risco de vida pelo estresse que acarretam. condições clínicas que normalmente já tem Havendo dúvida diagnóstica em criança estável, comprometimento da via aérea podem ter curso o raio x de região cervical pode apresentar o mais difícil com essa condição. Prematuridade, clássico sinal de “dedo polegar”. O antibiótico síndrome de Down, cardiopatas cianóticos, (Ampicilina, encefalopatas, desnutridos graves são alguns Cefotaxime) deve ser administrado após a via exemplos (7). Nesses casos e naqueles em que aérea ter sido assegurada e hemocultura obtida. Ceftriaxone, Cefuroxima, ou a laringomalácea interfera no ganho ponderal e Mantenha a criança sentada. Procure desenvolvimento da criança, a melhor alternativa acalmá-la com a presença constante dos pais ou é a epiglotoplastia ou a traqueostomia. pessoa conhecida. Administre O2 umidificado e monitorize a saturação de oxigênio com saturômetro de pulso. Obstrução Respiratória Alta Piva, Celiny, Garros A intubação traqueal deve ser realizada imediatamente, pela pessoa com mais 4 extubação, que responde as medidas convencionais. experiência com este procedimento. Mantenha o cirurgião e o anestesista de sobreaviso, assim 3. Laringotraqueíte (LT) (ou laringite viral como aguda) é uma doença comum (3% das crianças material para cricotireotomia ou traqueostomia disponíveis. menores que 6 anos), afetando lactentes de 3 Devido à inflamação pode ser difícil meses a crianças de 5 anos, a maioria ao redor identificar as estruturas na hipofaringe. Uma de 18 meses. É geralmente benigna (apenas 2% compressão torácica permite a saída de bolhas dos casos necessitarem admissão hospitalar), de ar pela glote indicando que alí deve ser sendo que 0,5 a 2% dos internados necessitarão passado o tubo endotraqueal, utilizando-se tubo intubação e ventilação mecânica (25, 26, 28). de tamanho menor que o usual para a idade (- Em 16 anos (1978-94) da UTIP do H. São Lucas 0.5 mm). Utilizamos a técnica de seqüência da rápida de entubação (sedação, analgesia, (306/13101) das internações na unidade (29). PUC-RS, relaxamento muscular e bloqueio de reações). laringite representou 2.3% Sinais e sintomas clássicos: febre baixa, Se com a laringoscopia direta ou uso de com um pródromo viral de alguns dias que se broncoscópio não foi possível obter acesso a via associa com tosse rouca ou “ladrante” aérea, a cricotireotomia (5) ou traqueostomia (“semelhante a um cachorro ou a foca”) e deve ser realizada. estridor inspiratório (podendo ser bifásico em A criança intubada ficará na UTIP, casos mais severos) (30).Em razão das cordas ventilada com mínimo peep para prevenir vocais serem poupadas, com freqüência a voz atelectasias e com pressão de suporte, com da criança é normal (31). restrição de movimentos (mãos contidas) e O diagnóstico Epiglotite, decidido com base em fatores clínicos e a periamigdaliano, história natural da doença. A maioria dos casos hemangioma e neoplasia (incluindo massas no podem ser extubados dentro de 24 hrs, desde mediastino anterior) (30). a apresente uvulite, corpo abscesso estranho, estabilidade O grau de tiragem intercostal e cardiovascular, afebril e exista um escape de ar subcostal não se correlaciona muito bem com ao redor do tubo endotraqueal. Se a extubação gravidade, mas existe evidência de que a não pode ser feita em 4-5 dias, está indicada a retração esternal quando presente é um sinal de endoscopia para verificar a possibilidade de alerta granulação ou de outra anormalidade não ainda Parainfluenza é o causador de aproximadamente diagnosticada. 75% dos casos, porém Adenovirus, Sincicial pacientes criança bacteriana, envolve sedação. O momento da extubação será que traqueite diferencial Aproximadamente apresentarão estridor 10% após dos a para iminente obstrução. O respiratório e Influenza perfazem o restante. virus Obstrução Respiratória Alta Piva, Celiny, Garros 5 O diagnóstico é basicamente clínico, mucosa da região subglótica, diminui o edema. contudo o Raio X (figura 2) de pescoço quando O efeito Beta-adrenérgico pode beneficiar os realizado pode demonstrar estreitamento (sinal pacientes sibilância, relaxando a musculatura de “ponta de lápis”). O hemograma não auxilia brônquica. A forma L é o componente ativo, no diagnóstico. O uso da endoscopia deve ficar portanto a Adrenalina pura (L) pode ser usada reservado para casos atípicos (30). com eficácia similar (26). Neste caso utilizamos na nebulização uma dose de 0,5 ml de adrenalina 1:1.000 para cada 1 a 2 quilogramas de peso (máximo de 5 ml). O efeito desaparece em 2 horas, e o benefício máximo é observado em 30-60 min após a nebulização (35). Vários estudos prospectivos também foram necessários para finalmente demonstrar que a Adrenalina Figura 2: Sinal da ponta do lápis (estreitamento além de melhorar o estado clínico do paciente da laringe por quadro inflamatório). pode prevenir intubações (25, 33). Tratamento Estudo recentes indicam que pacientes Oxigênio e Umidificação. O ar ou oxigênio podem ser observados em ER e mandados para umidificado e a hidratação adequada são as casa após um período de observação de medidas A aproximadamente 2-4 horas (5), especialmente administração de oxigênio pode ser feita por se corticoide foi usado concomitantemente (36). cânula nasal, tubos ou máscara facial. Oxigênio Aproximadamente 5% dos pacientes tratados por cânulas nasais ocasiona ressecamento da com adrenalina e esteróides, que receberam alta via aérea com espessamento de secreções, da sala de emergência voltarão para receber aumento de perda insensível de água e atenção médica, porém o relapso dos sintomas é diminuição da função muco-ciliar. A umidificação raro em crianças com mínimos sintomas teoricamente poderia melhorar a eliminação de (escores de 0-2) (26). secreções pela tosse, reduzir a irritação da via Corticosteroides. Não há dúvida no benefício dos aérea inflamada fazendo com que a criança se corticosteróides no curso clínico do crupe em sinta mais confortável (33). pacientes internados e ambulatoriais (37). Nebulização com vasoconstritor. O uso de Comparadas adrenalina racêmica em nebulização (0.05– 0.1 receberam esteróides necessitaram menos ml/Kg a intervalos de 2/2 ou 1/1 hora misturado adrenalina racêmica, a estada na emergência foi com SF em nebulização com oxigênio) foi mais curta e ainda o tempo de permanência descrita em 1971 para tratamento do crupe (30). hospitalar foi abreviado. O mecanismo de ação O efeito vasoconstritor (alfa-adrenérgico) na do corticóide em crupe ainda não está bem mais tradicionais no crupe. com placebo, crianças que Obstrução Respiratória Alta definido, embora as Piva, Celiny, Garros suas propriedades 6 a preferencial pela facilidade de administração e antiinflamatórias parecem ser a razão mais menor custo (41). plausível. Alguns autores sugerem que, devido a Admissão em UTIP e Intubação. Qualquer sua rápida ação (2 horas), outro mecanismo seja criança com sinais de obstrução progressiva e responsável. Sugerem que a droga diminui a sinais de hipóxia deve ser admitida numa UTIP. vasodilatação capilar da mucosa A decisão de intubar deve ser baseada e sua permeabilidade (36). principalmente em critérios clínicos que indiquem A dexametasona por via oral (VO) demonstrou ser tão eficaz quanto hipercapnia e iminente insuficiência respiratória, a incluindo aumento no estridor, freqüência administração IM, sendo mais barata, menos respiratória, freqüência cardíaca, tiragem e o invasiva e mais fácil de administrar. O uso de IM aparecimento de cianose, sinais de cansaço e só se justifica se o paciente não pode receber alteração no estado mental da criança (27). VO ou está vomitando (26). A dose mais O tubo a ser utilizado deve ser pelo comumente utilizada é de 0.6 mg/kg (com menos 0,5 mm menor que o calculado para a máxima dosagem de 10mg), o que equivale a 6 idade. A extubação só acontecerá em média 5-7 mg/kg de prednisolona em termos de efeito dias após, podendo ser feita na dependência da corticosteróide– uma dose talvez até alta demais presença de escape de ar e melhora do quadro para a o crupe. Isso motivou os pesquisadores a geral do paciente. É importante destacar que diminuí-la em posteriores estudos esses pacientes podem ser mantidos com Recentes estudos mostram que a pressão de suporte apenas e PEEP adequado Budesonida (2 mg) por nebulização é tão eficaz para evitar atelectasias. A sedação é quanto a dexametasona via IM em reduzir fundamental nos primeiros dias de tratamento, hospitalizações e melhorar o quadro clínico em com restrição dos movimentos da criança casos de leve a moderada gravidade que se (ataduras macias nas mãos) para se evitar auto- apresentam na sala de emergência (36). A extubação. A partir de alguns dias as crianças budesonida é um glicocorticosteróide sintético maiores aprendem que o tubo é a garantia de com forte atividade antiinflamatória tópica e sua via aérea e a sedação pode ser minimizada baixa atividade sistêmica (28). A dexametasona com cuidado. também pode ser usada por via inalatória, com Mistura Hélio e Oxigênio (HeliOx) - A densidade resultados semelhantes ao da budesonida. (39). do gás Hélio é menor que a do ar. Portanto, Um estudo recente realizado em duas ocasionará uma resistência menor ao fluxo de ar emergências Canadenses comparou os 3 na via aérea alta onde existe normalmente um regimes de administração – IM, VO ou fluxo turbulento. Isso diminuirá o trabalho nebulização- e concluiu que eles são igualmente respiratório. A mistura de oxigenio e Hélio eficazes, de modo que se sugere que a VO seja (HeliOx) deve ser administrada numa proporção Obstrução Respiratória Alta Piva, Celiny, Garros 7 de 40/60% respectivamente, pois com oxigênio O tratamento é de suporte, com ar ou em maior percentagem o efeito anti-turbulência oxigênio umidificado quando a criança chega a do Hélio se perde. A maioria desses pacientes ser admitida na sala de emergência. A partir daí são hipoxêmicos, daí que não se recomenda o o tratamento segue a mesma linha de conduta aumento da proporção de hélio na mistura (1). da laringotraqueíte, com uso de corticóide e adrenalina racêmica(43). 4. Crupe Espasmódico (Laringite Estridulosa) A laringite estridulosa (LE) parece ser 5. Laringotraqueíte Bacteriana de origem alérgica (27), e não inflamatória, cujo É uma forma grave de laringo- fator desencadeante pode ser uma infecção viral traqueobonquite. Os agentes etiológicos mais pelos mesmos vírus que tendem a causar a freqüentes laringotraqueíte. Talvez exista nessas crianças influenzae, Streptococous piogênico (grupo A), uma sensibilidade a certos antígenos virais (27). S. são pneumoniae, Staphilococus Neisseria aureus, sp, H. Moraxella A LE tende a ocorrer durante a noite, catarralis, Klebsiella sp. Uma revisão dos tipicamente em crianças entre 3 meses a 3 anos aspirados traqueais de 14 pacientes com L. de idade. No início, é difícil distingui-la da bacteriana diagnosticados por visualização direta laringotraqueíte viral, pois a criança pode vir revelou que 13 dos 30 isolamentos eram de apresentando os sintomas de um resfriado, mas germes anaeróbios. Mais de 75% das culturas tem um aspecto sadio. Inicialmente o paciente obtidas continham mais de um organismo, acorda a noite com tosse ladrante, seca, intensa sugerindo que uma vez lesada (por uma infecção e de viral prévia), a mucosa se torna vulnerável a apresentar típico estridor, mantendo-se afebril. A colonização bacteriana, levando eventualmente história clássica é de súbita melhora com o a infecções oportunistas (13, 44). desenvolve dispnéia súbita, além contato com ar frio ambiental ou administração A confirmação diagnóstica se faz com de vapor (no chuveiro!), permanecendo no dia endoscopia, seguinte uma rouquidão leve e tosse rouca. Os purulento difuso na laringe e traquéia, com sintomas representam um súbito edema da necrose da mucosa (pseudomembranas). Nos região subglótica, e a criança pode ter ataques lactentes, a obstrução pode ser séria a ponto de repetidos na mesma noite ou em noites ocluir a via aérea requerendo-se intubação subseqüentes. A recorrência é comum. imediata. A hemocultura é geralmente negativa. À endoscopia, a mucosa laríngea aparece apenas edemaciada no demonstrando um exudato O leucograma pode mostrar leucocitose com crupe desvio à esquerda. O raio X lateral de pescoço espasmódico e vermelha e inflamada na pode evidenciar severo estreitamento subglótico laringotraqueíte (27). ou traqueal difuso e/ou irregularidade dos contornos traqueais; porém ele pode ser normal. Obstrução Respiratória Alta Piva, Celiny, Garros O quadro clínico inicial é de uma L. 8 6. Inalação e Queimaduras viral, no entanto ocorre uma piora gradual do Grandes queimados exibem paciente com febre alta, toxicidade, prostração e concomitante lesão por inalação em até 35-50%) progressiva obstrução da via aérea. O detalhe e esses pacientes são responsáveis por 50 a importante é que a criança não responde bem a 80% da mortalidade atribuída a queimaduras terapia usual para o crupe. A progressão para (63). A ocorrência de lesões por inalação em obstrução total da via aérea e parada respiratória queimadura aumenta o risco de mortalidade em não é incomum. Diferente da epiglotite, a 20% e a presença de pneumonia aumenta em sialorréia e disfagia não são comuns assim como 40%. Inalação de fumaça expõe o paciente a não adotam a posição corporal típica (semi- lesão térmica, asfixiantes químicos como o sentado). Não é raro observar L. bacteriana monóxido de carbono e cianeto e a irritantes da progredindo para síndrome do choque tóxico e mucosa. septicemia (45) (46). A intubação traqueal é recomendada Tratamento em qualquer paciente queimado em que existe Via aérea – Os cuidados são semelhantes ao da suspeita clínica de lesão térmica da via aérea: epiglotite. O diagnóstico é clínico, a laringoscopia quer seja pela história (ambiente fechado, direta e intubação não devem ser adiadas nos grande quantidade de material sintético) ou pelo casos duvidosos ou graves. A entubação exame físico (vítima inconsciente, queimaduras endotraqueal se fará como descrito em L. viral, nos lábios e nariz, estridor, voz abafada e rouca, sempre utilizando tubo 0.5 a 1 mm menor que o cinza nas narinas e/ou boca). Alguns centros indicado para o tamanho e idade da criança. Não preferem realizar broncoscopias seriadas para é infrequente a necessidade de se trocar o tubo tomar essa decisão, pois é um método sensível com freqüência devido a quantidade de secreção e específico para avaliar o grau de lesão (63). que passa a obstruí-lo. Por isso a aspiração do Em pediatria preferimos estabelecer a via aérea tubo endotraqueal deve ser feita com freqüência. artificial precocemente. Existem alguns possíveis O paciente deverá ser convenientemente sedado cenários em relação a obtenção de via aérea: com analgesia. O tempo de permanência Intubação profilática: Indicado em crianças com intubado é maior que em L.viral e Epiglotite queimaduras envolvendo face, orofaringe ou a (aproximadamente 10 dias). via aérea propriamente dita mas sem sintomas e Antibióticos – Cobertura para os germes apenas hiperemia perceptível na visualização indicados se faz necessária (vancomicina direta. Sabe-se que quanto mais tarde for associada a cefalosporina de 3a ou 4a geração). postergado o procedimentoo mais difícil será Umidificação, Adrenalina e Corticosteróide – sem obter a via aérea, exigindo técnicas mais valor terapêutico para essa condição, a não ser apuradas que exista edema sub-glótico pós extubação. broncópio flexível de fibra ótica). Da mesma (p.ex. intubação assistida por Obstrução Respiratória Alta Piva, Celiny, Garros 9 maneira, a aspiração de líquidos quentes pode exigindo anestesia. É importante sempre lembrar gerar edema extremo de via aérea, exigindo que o uso de relaxantes musculares do tipo intubação precoce mesmo não havendo sinais succinilcolina (despolarizante) estão contra- clínicos externos de queimada ou inalação. indicados após 48 hrs da queimadura, pelo risco Nesse estágio, a intubação pode ser feita de hiperpotassemia induzida por essas drogas utilizando a técnica de seqüência rápida. Esse efeito começa 5-15 dias após a Intubação queimadura queimadura e permanece por até 3 a 16 meses.. estabelecidos: o quadro clínico de queimadura Em casos de intubação prolongada, a de via aérea estabelecida lembra o de epiglotite; traqueostomia tem sido recomedada, com baixa assim sendo a intubação deve ser feita por morbidade (5). pessoal com treinado sinais de (intensivista, cirurgiáo e Fístula traqueoesofágica pode surgir anestesista), utilizando técnica inalatória com O2 como complicação no paciente com via aérea a 100%, sem uso de relaxantes musculares ou queimada. É sempre recomendável sempre sedação endovenosa, no bloco cirúrgico. deixar um pequeno escape de ar, pois existe Intubação por razões não relacionadas a via evidência que esse achado se deve a pressão aérea: a colocação de tubo endotraqueal pode elevada no balonete (64). ser necessária por alterações no nível de consciência, por lesão pulmonar evidente, pneumonia, sepse ou procedimento cirúrgico Referência: Este texto foi modificado exclusivamente para a disciplina de Trauma e Emergências, FAMED-PUCRS, sob cuidados de JSantana e FBruno. Refere-se ao cap. 20 sobre “Obstrução respiratória alta em Pediatria” de Garros D, Piva J, Garcia. IN: Piva J, Garcia PC (eds). Medicina Intensiva em Pediatria. Rio de Janeiro: Revinter. 2005. p377-400.