Título : RELAÇÃO DE AJUDA: UM ESTUDO SOBRE IDOSOS E SEUS CUIDADORES Autora: Marcela Alice Bianco Orientadora: Profa. Dra. Elizabeth Joan Barham Resumo: O aumento exponencial do número de idosos e da expectativa de vida dos brasileiros vêm trazendo a necessidade de pesquisas e iniciativas que contribuam para a garantia da satisfação das necessidades dessa população e de um envelhecimento com qualidade e dignidade. O número de idosos na sociedade que apresenta algum grau de dependência já é muito significativo. Como existem poucos serviços públicos ou particulares para idosos no país, a tarefa de apoiar um idoso é, na maioria das vezes, desempenhada por familiares, sendo que o cuidador familiar possui um papel crucial nessa tarefa. Para garantir a qualidade e a continuidade dos cuidados que um familiar oferece a um parente idoso, acredita-se que é necessário atentar para a qualidade da relação interpessoal, uma vez que esta pode afetar as estratégias usadas em situações difíceis e sustentar o interesse do cuidador em ajudar. Nesse sentido, faz-se necessário investigar o status desta relação como primeira etapa na identificação de fatores que podem interferir na qualidade dos cuidados. Este trabalho objetivou analisar a relação idoso-cuidador familiar e identificar possíveis variáveis que podem estar envolvidas nesta questão, por meio de quatro objetivos específicos: caracterização dos idosos, caracterização dos cuidadores familiares, identificação da forma como as famílias estão estruturadas e identificação de como se dá o relacionamento entre idoso e cuidador. Observando-se os princípios éticos de pesquisa com seres humanos, foram entrevistados 39 cuidadores e 28 idosos de uma cidade do interior de São Paulo, utilizando dois roteiros de entrevista construídos com base em uma combinação de itens específicos a esta pesquisa e algumas escalas já existentes e consideradas de bom padrão de confiabilidade e precisão. Para a análise dos dados quantitativos, foram feitas análises estatísticas descritivas e comparativas para verificar a influência de vários fatores sobre o relacionamento idoso-cuidador familiar, comparando-se as respostas dadas por eles. Para a análise qualitativa dos dados, foi feita uma análise de conteúdo, buscando consenso entre os juízes em relação à escolha de categorias e posterior categorização dos dados. No que diz aos idosos entrevistados, um pouco mais da metade era homens (57%), com idade variando entre 61 e 95 anos (M = 76 anos). A maioria era casada (60,7%) ou viúva (32,1%) e possuía, em média, quatro filhos e sete netos. Como é típico desta faixa etária, o nível de escolaridade era baixo, com a maioria sem formação do primeiro grau. A grande maioria dos idosos (89,3%) relatou pelo menos uma enfermidade. Para avaliar o grau de dependência dos idosos, utilizou-se a escala de OARS (que varia de 0 a 14 pontos, sendo que quanto menor a pontuação, maior o grau de dependência). Verificou-se que a maioria não apresentou altos graus de dependência em relação às atividades básicas (M = 12,44, D.P. = 3,1) e instrumentais da vida diária (M = 9,29 , D.P.= 3,4). Além disso, de acordo com o Mini Exame do Estado Mental, a maioria dos entrevistados (70,8%) não apresentou alterações cognitivas. Com relação aos cuidadores familiares, 95% era do sexo feminino, com idade variando entre 30 e 75 anos. Em 66,7% dos casos os cuidadores eram casados e possuíam em média dois filhos. Em relação ao grau de escolaridade, nenhum dos cuidadores era analfabeto e 43,6% deles completou o Ensino Fundamental. A grande maioria (70,3%) não possuía emprego remunerado. Em 43,6% dos casos, os cuidadores relataram apresentar pelo menos um problema médico. Quanto a forma como as famílias estavam estruturadas, a maioria dos cuidadores entrevistados cuidavam de pais idosos (65,8%), seguidos de 15,8% dos entrevistados que cuidava de seu cônjuge, 13,2% que oferecia suporte a sogra e 2,6% que auxiliava o irmão ou o cunhado, respectivamente. Em 71,8% dos casos, os cuidadores ofereciam suporte a somente um idoso e, nos demais casos, a dois idosos. No geral (86,9% dos casos), existiam outras pessoas envolvidas na tarefa de cuidar dos idosos. Mesmo contando com este apoio, 70% dos entrevistados eram os cuidadores principais. em 43,6% dos casos, os idosos moravam junto com seus cuidadores, o que diz respeito à 19 famílias. No que concerne ao status do relacionamento existente entre idosos e cuidadores, os resultados encontrados mostraram que os cuidadores avaliavam vários aspectos do relacionamento de forma mais negativa do que os idosos (por ex., grau de intimidade, emissão de afeto e freqüência de conversas sobre questões importantes). Apesar desses resultados, tanto idosos quanto cuidadores valorizavam com maior intensidade aspectos subjetivos da relação, como a afetividade. Além disso, os cuidadores avaliavam o envolvimento do idoso na tomada de decisões como sendo bastante restrito, enquanto a maioria dos idosos se consideravam autônomos. Em relação às dificuldades de relacionamento, as fontes de conflito mencionadas pelos idosos e cuidadores de forma equivalente nos dois casos foram relativas a uso de medicamentos (25,4%), controle de dinheiro (12,7%), religião (11,1%) e organização da casa (6,3%). Somente o modo de educar filhos/netos foi apontado como fonte de conflito para os dois grupos de forma significativamente diferenciada (X2 (1) = 3,9, p<0,05), sendo que para os cuidadores, esta questão provoca dificuldades de relacionamento em 33,3% dos casos, enquanto para os idosos isso ocorre em 11,5% dos casos. Como forma de lidar com tais dificuldades, tanto os cuidadores como os idosos utilizam mais estratégias passivas que ativas de enfrentamento de conflitos. As estratégias apontadas como sendo utilizadas com grande freqüência foram: pedir ajuda a Deus, respeitar o outro como sendo alguém de boas intenções, melhorar o tom da conversa, encontrar um ponto comum, buscar o lado positivo da situação e manter a calma. E as estratégias menos utilizadas foram: não deixar que os sentimentos interfiram na situação, não expressar opinião e pedir ajuda profissional ou de amigos. Em parte, os resultados encontrados sobre o relacionamento refletem normas culturais que desfavorecem conversas intergeracionais sobre assuntos mais íntimos, fazendo com que barreiras interpessoais sejam criadas ao longo da trajetória do relacionamento. Problemas em relação à intimidade e à preservação da participação do idoso na tomada de decisões podem contribuir para as dificuldades experimentadas para resolver diferenças de opinião, ou mudar comportamentos inadequados. Além disso, tanto os idosos quanto os cuidadores possuíam uma concepção de velhice bastante negativa, enfatizando as perdas e limitações em detrimento dos pontos positivos encontrados na velhice. Essa concepção negativa da velhice pode influenciar a qualidade das interações entre os idosos e seus cuidadores, além de afetar de forma positiva ou negativa a forma como ambos lidam com as mudanças decorrentes da situação de cuidado e da velhice e a qualidade do suporte oferecido. Deste modo, este estudo aponta a necessidade de planejamento de intervenções para essa população, que os ajudem a melhorar suas estratégias de comunicação interpessoal e a diminuir barreiras interpessoais que possam estar comprometendo a intimidade do relacionamento; e que trabalhem com crenças a respeito da velhice e do cuidado. Tais intervenções podem promover um impacto importante sobre a qualidade da relação e por conseqüência, na qualidade dos cuidados prestados aos idoso e na qualidade de vida da díade idoso-cuidador. Palavras-chave : Idoso – Cuidador familiar – família - Relacionamento interpessoal