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O POPULISMO PENAL: UMA AFRONTA DIRETA AO DIREITO
CONSTITUCIONAL1
Marcus Tobias Freitas de Araújo2
Resumo: O populismo penal é um tema de suma importância para a análise da
política criminal nacional atual. Sua importância se deve ao fato deste tema ser
utilizado exaustivamente tanto pela mídia como políticos para ludibriar a população.
Seu grande trunfo é fazer a população acreditar que impunidade é sinônimo de falta
de legislação penal que, somada a uma parcela de primitiva reação popular
emocional e à violência hiperdramatizada, tem-se uma fórmula efetiva de controle
social. Posto isso é de extrema importância se pensar em populismo penal como
uma barreira a aplicação de um direito democrático e justo. Trata-se de um ardiloso
meio de controle social, que afronta diretamente a constituição. Visto por essa ótica,
é bem nítida a relação nociva que representa o populismo penal para com a
aplicação de um direito garantista baseado nos ideais constitucionais.
Palavras-Chave: Populismo Penal. Democracia. Constitucional.
CRIMINAL POPULISM: A DIRECT AFFRONT TO CONSTITUTIONAL
LAW
Abstract: The penal populism is a topic extremely important for the analysis of
current national crime policy. Its importance is due to the fact this theme is used
exhaustively by the media as well politicians to hoodwink the population. His huge
asset is to make the population believe that impunity is synonymous of lack of
legislation criminal that, when added to a parcel of primitive popular reaction
emotional and a dramatic violence, has become an effective formula of social control.
That said it is extremely important to think of penal populism as a barrier to
implementing a democratic right and just. It’s a cunning means of social control,
which directly affront constitution. Seen in this point of view, it is quite clear that the
relationship harmful penal populism represents the application of a law garantista
based on constitutional ideals.
Keywords: Penal Populism. Democracy. Constitutional.
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Artigo elaborado com base em Monografia apresentada ao Curso de Pós Graduação em Ciência
Penais da Universidade Anhanguera, como requisito final para a obtenção de grau de Especialista,
orientada pelo Prof. Acácio Miranda.
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Graduado em Direito pela Universidade da Amazônia (UNAMA), Belém-PA. Advogado. Pósgraduado em Ciências Criminais pela Universidade Anhanguera (lato sensu).
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1 INTRODUÇÃO
Nos dias atuais observa-se uma crescente tendência mundial no sentido da
aplicação de um direito mais garantista que possua como principal objetivo um maior
respeito à legislação constitucional. Países com grande desenvolvimento social e
aqueles que almejam tal status começam a perceber, após séculos de punitivismo
radical, que o direito penal não é a panaceia das mazelas sociais e a sua utilização
deve ser restrita somente aos casos que realmente demandem a sua guarda.
O Brasil não é exceção neste campo, apesar da pífia situação social e de
décadas de política hiperpunitivista, uma grande parte da comunidade jurídica já
vem acolhendo os ideais garantistas e cada vez mais essa corrente vem crescendo
no país. Em que pese à importância de uma aplicação desta política em caráter
emergencial no sistema jurídico penal do Brasil, tal aplicação encontra fortes
barreiras ao seu avanço e expansão, a principal delas e mais pérfida é chamada de
Populismo Penal.
Este discurso punitivista bastante atual basicamente é composto pela junção
dos demais discursos punitivistas (lei e ordem, direito do inimigo, tolerância zero,
entre outros) com a adição do quesito visibilidade e “publicidade”, pois como todos
bem sabemos a alma de todo negócio é a propaganda. Por isso, utilizando-se da
mídia e grande parte dos meios de comunicação, o populismo penal destila o
hiperpunitivismo radical sobre o país, sobretudo para as massas desinformadas e
sem conhecimento sobre o assunto, que são presas fáceis para o seu discurso
adocicado.
Como junção de outros discursos pré-existentes, o populismo penal já é
aplicado por várias décadas, no entanto com a disseminação dos diversos meios de
comunicação e o advento da sociedade do espetáculo (Debord) este discurso passa
a contar com um grande incremento e seus “tentáculos” passam a alcançar muito
mais telespectadores incautos, seja canalizando a raiva da população para um
“eleito” como também de certa forma exercendo função legislativa, visto que em
meio ao clamor popular aliado a sensação de insegurança e medo, o legislador
acaba por aprovar várias leis rígidas que muitas vezes acabam por causar uma
“diarreia” legislativa, pois muitas vezes tais leis são editadas sem a observância de
algumas já em vigor e às vezes até em disparidade com a própria constituição.
Esse fenômeno é nomeado e explicado pelo ilustre Gomes (2012e):
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[...] Em primeiro lugar, já não podemos falar em processo, e sim, em
teleprocesso. Não temos mais juízes, sim, telejuízes. Não mais sessões,
sim, telesessões. Não mais votos, sim, televotos. Não mais o público, sim,
teleaudiência. Se no campo das democracias populistas latinoamericanas o
que prepondera é o telepresidente, na era da Justiça telemidiatizada o que
temos é o telerelator, telerevisor etc.
Não há dúvida que com o telejulgamento ganhamos em espetáculo
(estética), mas corre-se sempre o risco de se perder em segurança, porque
o poder dos holofotes pode fazer da prudência, do equilíbrio e da sensatez
estrelas que brilham pela ausência.
A Justiça se tornou muito mais percebida. Agora conta com teleaudiência,
com rating. Para usar um bordão famoso, nunca na história deste país os
ministros se tornaram conhecidos pelos seus nomes, que estão se
transformando em marcas (estrelas midiáticas) e, dessa forma, começam a
ter um alto valor político-mercadológico.
A espetacularização da Justiça populista não é uma vara mágica que
resolva seus conhecidos problemas, ao contrário, a telejustiça é muito mais
morosa e, tal como uma telenovela, gasta um semestre para desenvolver o
enredo de um teleprocesso (prejudicando o andamento de centenas de
outros).
O STF, na sua nova função de telejulgador populista, está lavando a alma
do povo brasileiro (disse um órgão midiático). E também nos proporciona
(como toda televisão) tele-entretenimento, com acalorados “bate-bocas”,
entre cortados por suaves e inteligentes telemensagens de Ayres Britto do
tipo “o voto minerva me enerva”. [...]
Como bem nos alerta o ilustre jurista, o julgamento passa a ser um espetáculo
populista digno de um final de telenovela, e neste sentido observamos grandes
batalhas de réplicas e tréplicas com uma pitada de conflito de egos que asseguram
a chama e o frenesi generalizado, os atores desta teledramaturgia devem atender as
expectativas do público espectador sob pena de rejeição e apedrejamento midiático,
de forma que se algum tempo atrás condenar exigia muita coragem por parte do
magistrado, hoje em dia para se absolver, exige-se o dobro. Por fim ainda observase neste fenômeno advindo do discurso populista, a convicção de que a voz do povo
é a voz de Deus, assertiva essa que no âmbito do direito penal se revela um grande
perigo e um risco imensurável, pois as rédeas da justiça quando guiadas pela pura
emoção vingativa popular se mostram cegas e infundadas.
Sob este prisma fica bem clara a ameaça que o Populismo hiperpunitivista
representa não só para a aplicação de um direito garantista constitucional mais
também para a própria manutenção de um estado democrático de direito.
2 O POPULISMO PENAL HIPERPUNITIVISTA
Para adentrar na esfera de conhecimento do populismo penal, deve-se
previamente conhecer os fundamentos e nuances do movimento punitivista, bem
como uma das bases do direito penal moderno, denominada política criminal.
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Primeiramente cabe elucidar e deixar bem claro o importante papel da política
criminal como engrenagem do sistema penal, sua função consiste basicamente na
criação de estratégias concretas de controle de criminalidade, fundamentadas no
estudo prévio do delito e no saber criminológico (criminologia).
É de extrema importância compreender como o populismo penal interfere de
forma nociva no dia a dia da sociedade e no ordenamento jurídico. Analisar seus
fundamentos e demais discursos que lhe sustentam. Podemos através da
importante contribuição dada pelo professor Luiz Flávio Gomes, ter uma noção
básica do que se trata esse assunto (GOMES, 2012d):
Mais crimes e mais populismo penal. O lulismo diminuiu a pobreza, mas não
radicalizou a clássica ordem econômica, não estabeleceu nenhum confronto
extremado com o capitalismo escravagista, ou seja, procurou manter a
ordem econômico-social dada (que é extremamente injusta e criminógena).
O lulismo se funda no paradoxo de ter promovido avanços sociais sem
eliminar a acumulação primitiva de capital (Karl Marx), que consiste numa
associação de maximização dos lucros, uso da violência e destruição de
uma série de vítimas individuais e sociais. A pujança do capitalismo à
brasileira, que é primitivo e escravagista, significa maximização dos lucros
mediante o uso da violência.
É disso que decorre, em grande parte, o aumento da criminalidade
(tradicional) que gera (cada vez mais) insegurança; mais insegurança gera
mais medo; mais medo (gerenciado pela mídia) gera mais demanda
punitivista; mais demanda punitivista gera mais populismo penal, ou seja,
mais exploração da emotividade popular decorrente do delito, com
postulação de mais penas, mais rigor punitivo etc. Quanto mais o Estado
perde sua capacidade para gerenciar os conflitos sociais, mais se torna
punitivo, porque os políticos se tornam impotentes para resolver tais
conflitos. Essa impotência política e econômica se transforma em potência
penal, turbinada pelo populismo penal (midiático), que é a única que pode
cumprir o papel simbólico de tranquilizar (ilusoriamente) a população. Quem
não tem muito que oferecer em termos de segurança para a população, só
pode fazer o que os mágicos fazem: iludir o espectador (valendo-se do
poderoso auxílio da mídia).
A saber, o “lulismo” ao qual o autor faz alusão no texto, trata-se da política
adotada pelo ex-presidente durante esses últimos anos, que prega a elevação das
classes sociais em especial, a emergente (classe C) somado a ampla utilização de
programas assistenciais por parte do governo, que nada mais é do que uma política
do pão e circo moderna.
Posto isso, observa-se que nos dias atuais, apesar de ser um assunto
bastante comentado no universo jurídico, existem pouquíssimos materiais nacionais
referentes ao assunto, o que é alarmante, visto a necessidade de aplicação de
medidas urgentes para frear este discurso, que como consequência tem trazido
vários efeitos maléficos para a sociedade, vejamos (GOMES, 2012a) :
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Entre 1994 e 2009 o número de presídios construídos no país cresceu
253%, chegando a 1.806 estabelecimentos prisionais em 2009. Apesar de
tantos gastos com segurança pública, prisões, policiais etc. ninguém matou
mais que o Brasil, no ano de 2009, em números absolutos, alcançando
51.434 homicídios dolosos (de acordo com os dados do Datasus –
Ministério da Saúde ). Com esse montante (26,9 pessoas a cada 100 mil
habitantes), o Brasil conquistou o 3º país mais homicida da América Latina e
o 20º do mundo. Em 1979, tínhamos 9,4 mortes para cada 100 mil
habitantes. Em 2009 pulamos para 26,9. Em 30 anos, as mortes
intencionais triplicaram.
Já são mais de 3 décadas de populismo penal, nunca na história brasileira
houve edição de tanta lei em matéria penal. Onde estamos pecando em nossa
política criminal? A resposta é óbvia, os agentes do populismo penal buscam cuidar
dos efeitos não das causas do problema, guiado por um discurso extremista e
irracional que confia no rigor da norma penal para solução da criminalidade, e o pior,
este discurso descarta totalmente a utilização da criminologia e da política criminal,
disciplinas estas que foram concebidas para estudar o fenômeno criminológico e
buscar soluções para os mesmos. A criação indiscriminada de tipos penais para a
solução do problema da criminalidade nos leva a uma “diarreia” legislativa, que nada
soluciona, pelo contrário, só trás mais problemas, como demonstrado por pesquisa,
dentre eles a hipertrofia do sistema penitenciário, que se encontra falido e cuja sua
única função é encarcerar uma minoria eleita “inimiga” da elite.
Os agentes do populismo penal propõem soluções milagrosas e fáceis para
problemas extremamente complexos, “a punição é o remédio, então vamos utilizar
uma super dosagem para tratar o paciente que não apresenta melhora”. No entanto,
cabe observar que esse discurso não é ingênuo, talvez uma vítima que profere este
discurso, possa estar a fazê-lo ingenuamente, mas os verdadeiros mentores do
populismo penal, não o fazem com boa fé, estes tem plena consciência de todo os
males que o discurso punitivo exerce, no entanto este mesmo discurso alimenta
muito dos seus interesses.
Outra mazela trazida pelo populismo penal é a inversão da finalidade da pena,
que passa a ter caráter de vingança popular, vingança esta que se regozija com o
sofrimento do criminoso, estabelecendo uma ligação entre a dor causada ao
criminoso e a ofensa praticada por ele.
Tal satisfação pelo sofrimento alheio e explicado por Nietzsche (1998),
segundo tal, fazer sofrer causa um prazer infinito, tal sofrimento desencadeia uma
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verdadeira comemoração, sem o caráter cruel não existe o deleite por parte do ser
humano, no entanto é importante frisar que, quando adicionamos esta conotação
(prazer festivo) ao castigo, este deixa de ter seu caráter fundamental e passa a ser
somente vingança, é nisso justamente que se fundamentam os agentes do
populismo penal, para eles não basta somente o castigo do delinquente, este castigo
deve gerar comemoração, a população deve se deleitar com a “vingança”, com o
sofrimento, crueldade e massacre do infrator.
Os agentes do populismo penal executam ainda toda uma cobertura de como
este castigo está sendo executado, desde programas de televisão que mostram
policiais em ação a reconstituições de crimes, tais programas são muito populares,
pois entram pela sala do cidadão , exploram os seus sentimentos e por fim levam a
falsa sensação de “justiça feita” com a punição do delinquente, seja com a sua
prisão em uma cela superlotada ou até mesmo com a notícia de sua morte
(execução).
Brilhantemente o professor Gomes (2012c) faz comentários pertinentes sobre
esse assunto:
Isso equivale a um tipo de hino do extermínio festivo, que é o escopo final
do populismo penal vingativo. Hino cantado e ensinado, inclusive nas vias
públicas, com aplausos populares. Hino que, em certo sentido, recebeu o
beneplácito do Supremo Tribunal Federal, ao validar (em 2010) a lei de
anistia que acobertou os crimes contra a humanidade do tempo da ditadura.
Hino que zomba da Corte Interamericana de Direitos Humanos (da OEA),
que condenou o Brasil a investigar e punir tais crimes. Trata-se de hino que
festeja a indução ao crime, com requintes de crueldade. A lógica do
extermínio festivo, que tem ampla aceitação na nossa ambiência jurídica e
socioeconômica escravagista, por si só, não explica o título do Brasil de 20º
país mais violento do mundo, mas seguramente é um dos fatores mais
relevantes.
O ilustre doutrinador Gomes é o autor que mais aborda o tema do Populismo
penal, em seus artigos ele se mostra um crítico ferrenho de tal discurso, para
entender melhor esse fenômeno vejamos uma consideração feita em um de seus
muitos artigos (GOMES,2012b):
Há muitos anos estamos assistindo no Brasil ao paroxismo (extrema
intensidade) do extravagante e bárbaro espetáculo midiático promovido pelo
populismo penal, que constitui o eixo da chamada “Criminologia midiática”,
que explora à exaustão o “catastrófico”, o “ridículo”, o “aberrante”, o
“sanguinário”, havendo amplo apoio popular a essa absurda hiperdimensão
dos fatos, com a edição de chocantes imagens, que incrementam a cultura
do medo e da violência.
Alguns programas oferecem verdadeiros shows televisivos que mostram
acareações entre criminosos (suspeitos) e vítimas, incutindo no imaginário
popular um determinado estereótipo de criminoso, que reforça a
maniqueísta ideologia do bem e do mal, excluindo-se dessa exploração
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sensacionalista os delinquentes que não correspondem ao modelito
explorado pelos meios massivos de comunicação.
É chegada a hora de impor limites a essa incivilizada “Criminologia
midiática” que, globalizada desde os EUA, anda prestando mais desserviço
que utilidade à evolução da sociedade, na medida em que mostra uma
realidade mais caótica do que ela é, para alcançar objetivos privados por
meios tortuosos ou pouco claros, tal como se fazia na preparação dos
golpes de estado, tão frequentes no nosso continente latino-americano.
A base do populismo penal é formada pelo sensacionalismo midiático, que
como se retira das palavras do nobre doutrinador, cria um estereótipo de criminoso e
o elege inimigo da sociedade, tudo isso sustentado por interesse que claramente
não é social, esta “criminologia midiática”, como chama o doutrinador, acaba por
semear o caos onde não existe, expondo de forma exaustiva as mazelas sociais
com fins mórbidos.
A pior consequência deste quadro se dá no fato de que em meio ao clamor
público os agentes do populismo penal, acabam por legislar. Visto que o
sensacionalismo exposto desta forma acaba por comover a população, que exige do
legislador medidas, que no final acaba por legislar segundo interesses desses
agentes.
Outro perigo iminente apontado pela doutrina é o fato do ataque ao judiciário
por parte do populismo penal, são vários os advogados ou juízes que já foram
“apedrejados” pela sociedade por consequência de um discurso populista punitivo,
como se não bastasse tal discurso afetar diretamente o legislativo.
O judiciário não pode se acovardar diante da ameaça populista, pois ela
acima de tudo ameaça gritantemente os mandamentos constitucionais e vai de
contra tudo que prega o direito garantista, sob este tema, ensinam Toron, Vilardi e
Bottini (2011):
É, sim, perfeitamente possível e legítimo criticarem-se as decisões judiciais
de que grau sejam. Inadmissível, porém, é a desqualificação dos juízes e
dos tribunais quando tomam decisões que não seguem a vontade dita
popular. Não sucumbir aos apelos de uma espécie de populismo penal, que
busca haurir a legitimidade da jurisdição penal na vontade do povo,
representa o ponto culminante da razão de ser do Judiciário independente
numa democracia constitucional. A jurisprudência criminal do STJ, é
verdade que aqui e ali pode nos decepcionar, mas é francamente inovadora
e comprometida com os valores constitucionais de proteção ao indivíduo e
da dignidade humana.
O poder emanado do povo jamais pode ser usado para o cometimento de
atrocidades e vilanias, usar de ardil para manipular a sociedade para o cumprimento
de uma falsa justiça, a meu ver, é a maior tirania que existe.
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Posto isto, é de extrema importância se pensar em populismo penal como uma
barreira a aplicação de um direito democrático e justo, trata-se de um ardiloso meio
de controle social, que afronta diretamente a constituição. O Estado Social acaba
por ser deixado de lado para dar lugar a um Estado Penal. Investimentos em ensino,
lazer, cultura, saúde, habitação são colocados em segundo plano, priorizando-se o
setor repressivo. A toda hora o Congresso Nacional anuncia novas medidas de
combate ao crime, que alguns meses depois se mostram ineficazes ou uma afronta
direta a constituição. Visto por esta ótica, é bem nítida a relação nociva que
representa o populismo penal para com a aplicação de um direito garantista
baseado nos ideais constitucionais.
Por fim, cabe salientar que uma profunda análise nas causas, consequências,
fundamentos, ou seja, um estudo completo sobre o populismo penal é de extrema
importância para a construção de um parapeito contra a sua expansão desenfreada.
O populismo penal fere tudo que é precioso ao direito constitucional garantista. Este
tipo de discurso não deve proliferar como forma de alienação da sociedade, muito
menos como controle social.
2.1 POPULISMO E FUNÇÃO DA PENA
O ordenamento jurídico pátrio estabelece a função da pena em dois
momentos, primeiramente no momento da sentença,
com fundamentação
encontrada no artigo 59 do Código Penal: “O juiz, atendendo à culpabilidade,
estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para a reprovação e prevenção
do crime: as penas aplicáveis dentre as cominadas”, a função da pena neste
momento é revestida de um duplo caráter, a saber, caráter retributivo e caráter
preventivo.
Já em um segundo momento, mais especificamente na execução, a pena
passa a ter a finalidade de integração social, também conhecida como prevenção
especial, como bem pode observar no artigo 1º da lei de execução penal, "A
execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão
criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado
ou do internado".
Atualmente o modelo tripartido oferecido por Roxin (1997, p. 78) é o mais
aceito pela doutrina, tal modelo é conceituado da seguinte forma (GOMES, 2006):
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(a) no momento da cominação legal abstrata, a pena tem finalidade
preventiva geral (seja negativa: intimidação; seja positiva: definição ou
chamada de atenção para a relevância do bem jurídico protegido);
(b) na fase da aplicação judicial a pena tem finalidade preventiva geral
(confirmação da seriedade da ameaça abstrata, assim como da importância
do bem jurídico violado), repressiva (reprovação do mal do crime, fundada e
limitada pela culpabilidade) e preventiva especial (atenuação do rigor
repressivo para privilegiar institutos ressocializadores alternativos: penas
substitutivas, sursis etc.) e
(c) na última etapa, na da execução, prepondera (formalmente) a finalidade
de prevenção especial positiva (proporcionar condições para a
ressocialização ou para a realização de um processo de diálogo − Dotti −),
porém, na prática, o que se cumpre é a função preventiva negativa da
inocuização (mero enclausuramento, sem nenhum tipo de assistência ao
recluso, sem a oferta das condições propícias a sua reinserção social).
Posto isso, vale observar que atualmente a pena de prisão não cumpre de
forma alguma a sua função ressocializadora. Além do mais, devido as próprias
facilidades de fugas no nosso sistema e sua fragilidade, nem no isolamento do preso
obtemos êxito. Por fim, a pena ainda é executada de forma totalmente desumana e
cruel, ou seja, claramente inconstitucional. A ressocialização nos presídios está
longe de ser uma prioridade, e as penitenciárias passam a ser verdadeiras
faculdades do crime. Presídios em condições deprimentes, “entupidos” de gente
cooperam, e muito, para formar essa realidade. Nenhuma atitude é tomada para se
implementar condições propícias à integração social do preso.
E como grande causador dessa situação, encontramos o discurso do
Populismo-Hiperpunitivista. Tal discurso distorce todos os fundamentos da pena
discutidos anteriormente e a transforma em instrumento de vingança popular, o
delinquente passa a ser considerado como inimigo da sociedade, em alguns casos
se desconsidera sua humanidade, tratando o mesmo como animal, logo a pena deve
refletir toda a raiva e repúdio sentido pela sociedade, o delinquente deve sofrer tudo
aquilo que ele causou, como bem explica Gomes (2012c):
Quando uma promessa é descumprida ou um acordo desonrado (ou seja:
quando alguém é acusado de um crime, tendo descumprido ou
supostamente descumprido as regras sociais e legais vigentes), a dor e o
sofrimento daquele que deve (do criminoso devedor) serviria como
equivalente ao desprazer causado pela promessa não cumprida (pela
violação da norma).
Fica bem claro então que a pena passa a ter somente caráter retributivo,
devendo unicamente satisfazer os anseios vingativos da sociedade, pouco
importando a ressocialização do infrator.
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2.2 UM DEBATE SOBRE EMOÇÃO (VINGANÇA POPULAR E CARÁTER
RETRIBUTIVO DA PENA)
Como já exaustivamente mencionado, o populismo hiperpunitivista utiliza-se
principalmente da emoção para justificar o injustificável, que, no entanto, pela falta
de informação, lamentavelmente vem ganhando mais adeptos.
O jornalista Recondo (2012) sintetiza este fenômeno de forma bem clara:
É regra facilmente comprovada: sempre que um crime provoca o clamor
popular, o Congresso inicia um movimento para desengavetar projetos ou
votar propostas novas a favor do endurecimento das penas ou pela
restrição de direitos. Foi assim com o sequestro do empresário Abílio Diniz e
a aprovação da Lei de Crimes Hediondos; foi assim após o assassinato do
menino João Hélio e a aprovação da redução da maioridade penal na
Comissão de Constituição e Justiça do Senado; foi assim depois dos
ataques do PCC em São Paulo e a aprovação de 11 projetos de lei,
incluindo o que proibia o uso de telefones celulares nos presídios, prática
que persiste até hoje.
O massacre de Realengo agora mobiliza o Legislativo. O foco é a venda de
armas legais. Alguns chamam esse movimento de populismo penal: usar os
holofotes da imprensa para propor leis que vão ao encontro do que a
opinião pública eventualmente pede no momento de revolta. Outros
justificam que esse movimento é natural no Legislativo, obrigado a dar
respostas à opinião pública e às alterações que ocorrem na sociedade.
Passado o clamor ou ante uma crise em outra área, esse movimento
arrefece. Ou então mostra-se que legislar para atender tão somente a vox
populi pode ser desastroso. A Lei de Crimes Hediondos é a prova: o
Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucional um dos principais
pontos da lei e obrigou o Congresso a mudar o texto.
Fica bem claro que o discurso utiliza-se dos ânimos acalorados provocados
por um delito, a chave então do populismo é a emoção, sem dúvida, sem o clamor
popular estimulado pelo choque que o delito provoca no seio social, tal discurso
jamais prosperaria. Bastaria uma linha de raciocínio minimante lógica para concluir
que o mesmo é ilógico e infundado, mais é justamente neste ponto que a emoção é
o grande trunfo do populismo, desprovida totalmente de racionalidade e pensamento
lógico, ela elimina completamente qualquer raciocínio crítico. A questão que fica no
ar então é, como pode seres racionais serem levados por discurso tão medíocre e
sem fundamento?
A explicação é bem simples... O sofrimento satisfaz. Desde os tempos mais
remotos umas das melhores formas de entreter o ser humano é causando
sofrimento alheio, e igualmente como hoje, os governantes se utilizam desse
conhecimento como uma forma de controle social, desviando a atenção da
sociedade do que realmente é importante.
Brilhante consideração faz o professor Gomes (2012c) sobre o assunto:
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O sofrimento do criminoso (do inimigo, que às vezes é apenas um suposto
criminoso) gera prazer, um prazer equivalente à satisfação do crédito (do
direito de vingar). Há uma equivalência (subjetiva, psicológica) entre a dor
infligida contra o infrator e o dano causado (ou supostamente causado) por
ele. Existe uma espécie de compensação entre o sofrimento do acusado e a
ofensa por ele praticada (ou supostamente praticada). O ser humano sente
prazer em ver seu semelhante (o devedor, o acusado, o condenado, o
preso) sofrer ou ser humilhado, sobretudo, quando possível, publicamente
(midiaticamente). A raiva e o ódio (ou seja: a vingança) são descarregados
sobre o acusado (sobre o bode expiatório) como forma de punição
prazerosa pelo que ele fez (ou pelo que ele é).
Como bem explicado, além da própria retributividade que a punição passa a
representar e adicionado a ela o caráter de exemplo, o delinquente passa a ser bode
expiatório para coibir que os demais pratiquem o mesmo delito, isso tudo e claro
fermentado com requintes de crueldade e tratamento desumano, afinal o “bandido”
deve sofrer tudo (ou mais) o que causou, somente assim estará aplacado o desejo
de “justiça” da sociedade.
Tal prazer com o sofrimento alheio é explicado por Gomes (2012c), com base
em Nietzsche (1998):
Fazer sofrer (pondera Nietzsche, em A genealogia da moral) causa um
prazer infinito. “Fazer sofrer é, assim, uma verdadeira festa. Sem crueldade
não existe gozo possível: isso é o que ensina a mais longa história do ser
humano.” O castigo, quando a ele se agrega o adicional (simbólico) do
prazer festivo, deixa de ser tal para se transformar em pura vingança. Os
agentes do populismo penal não se contentam nunca com o simples
castigo. Quando falam em castigo do delinquente, na verdade, estão
querendo o prazer festivo gerado pela vingança, pelo sofrimento, pela
crueldade, pelo massacre, pelo aniquilamento (do criminoso, do inimigo).
Seria ingenuidade nossa crermos que o sofrimento não faz parte da vida e
muito mais se pensássemos que a crueldade é algo já banido em nossas relações
pessoais. Com o advento da moral moderna se pretende evitar o sofrimento e a
crueldade a qualquer preço, e sob nossa ótica, a mera existência de tais elementos
nos provoca horror e repúdio. No entanto, para Nietzsche (1998), estes desejos
obscuros fazem parte da vida, nós somente os renegamos para nos tornarmos seres
mais espiritualizados.
Deve-se, no entanto, evitar o sofrimento, e se não for possível, deve-se
reduzi-lo ao máximo, em consideração à ideia de que toda pessoa merece respeito.
Tal concepção permitiu um abrandamento da aplicação das penas, assim como
houve um deslocamento: se antes, era um espetáculo público diante do olhar de
todos – e o castigo servia de exemplo, hoje, se em alguns países a pena capital
ainda persiste, é aplicada atrás dos portões das prisões. Nota-se também uma
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grande tendência à extinção da pena capital. Mostrando que nos deixar levar pelo
calor do momento para tomar decisões referentes à pena de um indivíduo, se revela
um grande retrocesso.
2.3 PRINCIPAIS AGENTES DO POPULISMO PENAL
Após uma análise exaustiva, percebemos claramente que o populismo
hiperpunitivista é um discurso insosso e sem bases concretas, que se fundamenta
unicamente no irracionalismo emocional da sociedade, quando vítima de um delito
com grande repercussão. Quem então em sã consciência pregaria um discurso que
não possui a menor base de fundamentos e cujos argumentos possuem uma
incongruência alarmante? A resposta se mostra bem simples e clara: o populismo
penal é um discurso que se vende fácil, e principalmente, que elege mais fácil ainda.
O discurso populista hoje em dia é o cabo eleitoral de muito candidato por aí,
a segurança pública passou a ser clichê e assunto indispensável na campanha de
quem pretende se eleger, afinal o que a população mais deseja nesses tempos de
“insegurança” é mais punição. Gomes (2010b) faz uma importante observação sobre
o assunto:
Que pena que agora (nestas eleições) inclusive os parentes das vítimas da
violência (pais, mães etc.) acabaram também contaminados pelo vírus do
populismus poenalis. O populismo penal, precisamente porque explora (no
pior sentido da palavra) uma emoção atávica e primitiva do ser humano
(medo do crime), sempre constituiu terreno fértil para a germinação da
clássica "bancada parlamentar da bala" (ou do "chumbo grosso"),
constituída (sobretudo) de milicianos, policiais (ou ex-policiais) civis,
militares ou federais, juízes aposentados ou membros do Ministério Público.
Agora são os parentes das vítimas da violência que estão tentando se
eleger sob a virótica bandeira do populismo penal (O Estado de S. Paulo de
12.09.10, p. A12). Eles não veem eficiência na solução dos crimes, mas
prometem (nas suas campanhas) exatamente a mesma coisa (que sempre
foi oferecida pela classe política): mais rigor penal, irracionalidade,
desproporcionalidade, legislação vingativa emergencial etc. Mais e mais da
mesma enganação! A articulista (O Estado de S. Paulo de 12.09.10, p. A12)
escreveu: "Os candidatos vítimas de violência não têm plataformas tão
radicais ou populistas de combate ao crime". Será?
Como bem demonstrado pelo ilustre doutrinador, são vários os atores do
populismo hiperpunitivista penal dentre eles poderíamos destacar alguns e suas
principais características:
- Apresentadores, mídia em geral: são os grandes “diretores” do espetáculo
que se tornou o direito penal, e em grande parte sãos responsáveis pela
disseminação deste discurso, suas principais armas são a grande visibilidade e seus
comentários “a La Galvão Bueno” nas matérias sensacionalistas carregadas de
13
emoção e irracionalismo, fora isso o mais surpreendente é quando nos
“presenteiam” com o seu “enorme” conhecimento sobre direito penal, disparando
argumentos “brilhantes” e soluções milagrosas para a criminalidade.
- Juízes e Promotores: alguns representantes dessas classes adeptos do
populismo muitas vezes são os protagonistas da “nova telenovela brasileira”, eles
fazem valer os anseios e desejos vingativos da sociedade, e dão aplicabilidade às
leis esdrúxulas, frutos da ignorância popular sobre o assunto. Destaca-se que em
que pese o grande e ilibado saber jurídico de alguns, possuem um sério problema
com o princípio da presunção de inocência, de forma que raramente o aplicam, o
que resulta em uma enxurrada de denúncias sem fundamento que passam
facilmente adiante resultando em processos que muita das vezes não dão em nada,
gerando constrangimento para todos. Além disso, tendem a ver os acusados como
meras folhas de um processo, tratando de forma genérica como se todos fossem
culpados, fora isso grande parte nunca visitou um presídio e tem calafrios somente
de pensar em entrar em um.
- Políticos em geral: utilizam o populismo penal da mesma forma que Getúlio
Vargas utilizava décadas atrás, ou seja, como meio de controle social. A maioria das
consequências danosas deste movimento não chega a afetar a vida desses agentes,
sendo este discurso utilizado somente para angariar votos e promover interesses
particulares, de certa forma são os grandes manipuladores por trás desse discurso,
muita das vezes sendo os “cabeças” de esquemas que envolvem a própria mídia,
que por motivos óbvios raramente chegam ao conhecimento público.
Gomes (2010b) faz importante consideração sobre os objetivos desses
agentes:
Emotividade, irracionalidade e desproporcionalidade são as marcas
registradas do populismo penal, cujos defensores depositam muita fé
(acreditam) e pregam o rigor punitivo (do castigo) como "solução" para o
problema da violência e da segurança pública no nosso país.
Neste momento, cabe uma análise desses motivos, a meu ver acredito que
algumas pessoas pregam o populismo e o rigor punitivo como solução para o
problema da violência, no entanto, no âmbito do movimento essas seriam uma
minoria ingênua, emocional e irracional. É o caso da sociedade em geral. Já grande
parte dos mentores do populismo tem plena consciência dos resultados infames que
este pode gerar para a sociedade, no entanto, utilizam-se para aproveitar as
vantagens já exaustivamente demonstradas.
14
2.4 AFRONTA DIRETA À CONSTITUIÇÃO E AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE
DIREITO
Como bem demonstrado, é bem clara a nocividade da proliferação deste
discurso para a constituição e o próprio estado democrático de direito. Em um país
que busca cada vez mais avanços no campo social e democrático, o populismo
hiperpunitivista demonstra ser um forte inimigo.
Se de um lado temos grandes profissionais na área do Direito, sendo eles
doutrinadores, pesquisadores, juízes, promotores e advogados que cada vez mais
vem criando jurisprudência no sentido garantista constitucional, do outro temos a
mídia influenciando a população, intitulando o garantismo como “protetor de
bandidos”, e fazendo ardilosamente as massas a acreditarem que as garantias
constitucionais são “brechas” na lei, pelo qual os delinquentes podem escapar das
“garras” da justiça. Esse eterno conflito deve ser resolvido com maior esclarecimento
da população, o que obviamente não é interesse de uma minoria e grandes
articuladores deste discurso.
Uma série de ataques diretos a dispositivos constitucionais são bem
observados na análise crítica de Rosa (2012):
Não se pode é acreditar, tal qual Dr. Bacamarte, que a prisão por si resolve
os problemas sociais. Aliás, em vários anos julgando nunca foi instaurada
ação penal em face de traficantes. O que se vê é gente "desdentada,
moradora de bairros pobres" sendo presa sob a alegação de combate ao
tráfico. Mescla de ingenuidade com cinismo. Depois de presa, essa gente é
abandonada em locais públicos com pouca comida, sem atendimento e cai
na ajuda recíproca de quem está dentro, os quais, no fundo, domimam
internamente. E há sempre alguém defendendo ressocialização. Em que
mundo vivem? O dinheiro que um preso custa por ano, em programas
sociais bem articulados, seria muito melhor investido. Mas não! A lógica é
colocar gente feia e fedida presa, tal qual se fez recentemente na onda
higienista do centro de Florianópolis. Alguém acha que o sujeito sonha ser
mendigo? Foi escolha dele? Prender? Assim é que no contexto atual diante
do custo exponencial da manutenção de segregados, cuja eficiência não se
mostra mais ajustada aos anseios do Estado mínimo, precisa-se ousar.
Como bem posto pelo autor, são várias as garantias usurpadas, no que em
tese deveria ser um estado democrático de direito, tudo isso para um fim econômico
de uma minoria. Os danos como fartamente demonstrado são gravíssimos, e
impedem um importante avanço tanto no mundo jurídico como no seio social, que
seria a implementação do já citado Garantismo Minimalista. Movimento este que
começa a engatinhar para a sua ascensão mais tem como principal impedimento o
discurso populista hiperpunitivista, que não somente ataca o garantismo como
15
consequentemente ataca à própria constituição, visto que o garantismo nada mais é
do que a interpretação concreta do texto constitucional.
Todos os princípios vistos anteriormente são fortemente descaracterizados
pelo Populismo de forma que fica impossível a coexistência dos mesmos. E como
tais princípios são indispensáveis para o bom funcionamento da ordem jurídica, o
populismo deve ser combatido como um vírus que afeta órgãos imprescindíveis para
o bom funcionamento de um sistema.
Vejamos então como Gomes (2010a) se posiciona sobre o assunto:
São sete décadas de populismo penal incandescente e nada de resultado
positivo. As prisões estão abarrotadas (quase 500 mil presos), mas a
criminalidade não diminuiu e a violência não se arrefeceu. Esse modelo de
mais rigor punitivo como "solução" para o problema da criminalidade
brasileira está esgotado. Transformou-se numa bandeira ilusória, puramente
simbólica, que só tem valor eleitoreiro (porque o povo ainda
equivocadamente acredita no discurso punitivista).
Temos que lutar (com todas nossas forças) por um programa de prevenção
sério e efetivo da violência (e da criminalidade em geral). Temos que
repensar toda nossa política criminal e mudar radicalmente de rumo,
adotando medidas concretas de prevenção primária (que cuidam das raízes
do crime), secundária (criando obstáculos ao crime) e terciária (o criminoso
não pode sair da cadeia pior do que entrou).
É chegado o momento de agirmos com responsabilidade e o máximo de
cientificidade nessa área. De "soluções" milagrosas, eleitoreiras e irracionais
já estamos (todos) fartos. O populismo penal, por tudo que apresentou até
hoje no Brasil, é anti-tiririca: com ele, a cada dia pior fica.
A situação se resume ao brilhante posicionamento do professor, chegou o
momento de se decidir realmente o destino que iremos seguir. O garantismo
minimalista e o populismo hiperpunitivista não podem coexistir, aliás, a análise
correta a se fazer é que o populismo hiperpunitivista não pode coexistir com o
estado democrático de direito.
3 CONCLUSÃO
Após exaustiva análise do assunto, conclui-se que deve-se extirpar as
práticas populistas, pois como bem demonstrado, tais práticas e discurso irracional,
além de trazer sérios males a sociedade em geral, acabam por frear e dificultar a
disseminação do discurso garantista constitucional.
A opção pela defesa dos ideais garantistas encontra-se fundamentada na
análise fática e histórica do país, que por vários anos tem adotado uma postura
punitivista, sem que seja observada nenhuma melhora no campo da criminalidade,
visto que hoje somos um dos países mais violentos do mundo, superando alguns
países muito mais pobres e desiguais, confirmando que o problema da violência não
16
está somente na desigualdade e muito menos ainda na falta de legislação penal, já
que possuímos um vasto “arsenal” legislativo nesse campo e mesmo assim
apresentamos mais problemas que países que não investem neste âmbito.
Por fim vale ressaltar um questionamento universal na doutrina: será que todo
esse aparato e altas somas financeiras não seriam mais bem aplicados no
investimento da qualidade de vida desses que se buscam enjaular e massacrar?
Não seria muito mais barato gastar com educação, saúde e infraestrutura em geral,
do que sustentar esse maquinário carcerário falido que não gera nenhuma
perspectiva de renda?
A resposta é bem visível, no entanto só nos leva a mais um questionamento,
é interessante mudar as coisas ou é mais fácil e cômodo deixar como estão?
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