Gabinete da Desembargadora Beatriz Figueiredo Franco
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 102492-25.2015.8.09.0000 (201591024927)
COMARCA
: GOIANIRA
3ª CÂMARA CÍVEL
AGRAVANTE
: RANDEL MILLER DE ASSIS SANTOS
AGRAVADO
: MINISTÉRIO PÚBLICO
RELATORA
: DESª. BEATRIZ FIGUEIREDO FRANCO
DECISÃO
RANDELL MILLER DE ASSIS SANTOS, prefeito do
município de Goianira devidamente representado nos autos da ação civil pública
por ato de improbidade administrativa proposta em seu desfavor e do Secretário
Municipal de Infraestrutura e Transporte Belchior Augusto Caetano pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, agrava de instrumento da decisão
fotocopiada às fs. 47/55, proferida pela juíza de direito da 2ª Vara Cível, Criminal,
das Fazendas Públicas, Registros Públicos e Ambiental da Comarca de Goianira.
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No ato agravado a julgadora de origem identificou nas
informações colhidas pelo Ministério Público (procedimento preparatório nº
201400097383) indícios de que o Prefeito do Município de Goianira e o Secretário
Municipal de Infraestrutura e Transporte procederam à celebração de contratos
temporários sem observar os critérios da legislação de regência. Observou que,
apesar de a Lei municipal nº 1.479/2013 autorizar a modalidade excepcional da
contratação, os agentes políticos assumiram a mão de obra antes da vigência
normativa, além disso, não se atentaram para a exigência de processo seletivo
simplificado, para o limite do quantitativo de pessoal a integrar os quadros e para a
necessária proibição do desvio de funções dos servidores admitidos.
Considerou também o prenúncio de que os corréus
estejam atuando no sentido de forjar um processo administrativo para justificar o
ingresso dos contratados no serviço público. Ressaltou que a prefeitura é dotada de
assessoria jurídica, a qual sinalizou a impropriedade dos ajustes de trabalho.
Asseverou que o Tribunal de Contas dos Municípios considerou ilegais os atos de
admissão de pessoal relacionados na ação. Em atenção às manifestações
preliminares, estimou que não houve argumento ou prova contundente a afastar os
indícios de ato de improbidade administrativa.
Com reservas ao nível de cognição liminar, a julgadora
singular reputou presentes os requisitos para a concessão da medida cautelar
postulada no processo de origem: fumus boni iuris e periculum in mora. Ponderou
que a presença dos agentes políticos nos cargos de representação é indicativo de
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risco à instrução processual e lesão à ordem pública, porque podem coibir
investigações, omitir informações e coagir testemunhas, além do dolo empregado
em suas condutas, visto que tinham conhecimento de que praticavam atos ilegais,
lesionando a ordem pública. Adverte que os valores utilizados para pagamento aos
servidores contratados temporariamente geram dano ao erário, devendo por isso ser
cautelarmente resguardada a efetividade do processo para o caso de condenação. O
dispositivo recebeu a seguinte redação:
Diante do exposto, recebo a petição inicial; concedo
a medida liminar, determino o afastamento dos
requeridos Randel Miller de Assis Santos e Belchior
Augusto Caetano, de seus cargos e consequentemente de
suas funções por 30 (trinta) dias, sem prejuízo de suas
remunerações, devendo o vice-prefeito assumir o encargo
que passa a lhe caber e providenciar legalmente
substituto para o referido secretário municipal, enquanto
perdurar esta decisão; e decreto a indisponibilidade e
bloqueio dos bens dos requeridos.
Proceda-se a constrição nas contas bancárias dos
réus por meio do BacenJud, especificamente no valor de
R$ 1.863.630,43 (um milhão, oitocentos e sessenta e três
mil, seiscentos e trinta reais e quarenta e três centavos)
referente ao réu Randel Miller de Assis Santos e de R$
569.078,34 (quinhentos e sessenta e novel mil, setenta e
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oito reais e trinta e quatro centavos) referente ao ré
Belchior Augusto Caetano, bem como registre-se
informação de bloqueio de bens no RENAJUD.
Oficie-se ao Detran-GO, bem como aos Cartórios
de Registro de Imóveis de Goianira-GO e de GoiâniaGO, para que procedam averbação a respeito da
indisponibilidade e bloqueio dos bens.
O agravante exibe suas razões recursais às fs. 02/45. Após
sobrelevar a admissibilidade e, bem assim, o cabimento do recurso pela via
instrumental, sublinha a ilegalidade da decisão agravada.
Questiona o decreto de afastamento do cargo. Encampa
orientação doutrinária e jurisprudencial segundo as quais a regra prevista no artigo
20, parágrafo único, Lei federal nº 8.429/1992 não se aplicaria aos detentores de
mandato eletivo.
Por eventualidade argumenta que, ainda que admitida a
aplicação do dispositivo aos agentes mandatários, a medida é notadamente
excepcional e somente se justifica diante de prova contundente de que o acusado
efetivamente ameace a instrução do processo, sob pena de ser concebida como
antecipação da pena. Diz que a julgadora de entrada não apontou qualquer
informação apta a comprovar que sua permanência na gestão do município durante
a tramitação da ação possa implicar prejuízos à colheita de provas. Afirma que
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desde a protocolização da petição que inaugura o processo de origem até a data em
proferida a decisão agravada já se passaram cerca de 300 (trezentos) dias e não há
qualquer evidência de que o regular exercício de seu mandato possa obstar a
apuração dos fatos.
Explica que o risco de lesão à ordem pública, aventada
como justificativa para a decisão liminar, não constitui fundamento idôneo para a
suspensão do mandato. Conclui que a manutenção da decisão agravada tal como
proferida permite deduzir que o decreto cautelar de afastamento do cargo é
imanente à todas ações de improbidade administrativa instauradas contra agentes
detentores de mandato eletivo.
Acrescenta que as provas necessárias à instrução são
substancialmente documentais e que já foram produzidas nos autos do
procedimento interno havido no âmbito do Ministério Público Estadual. Noticia
que assim que tomou ciência da indagação do Tribunal de Contas dos Municípios
acerca da propriedade dos mesmos contratos questionados no feito de origem
deixou de proceder à qualquer contratação similar. Conclui que não há motivo
fático ou jurídico para o seu afastamento do cargo, acrescendo à asserção lições
jurisprudenciais e doutrinárias acerca da matéria. No enredo, destaca os prejuízos à
população goianirense em caso de imprevistas alternâncias na chefia do Poder
Executivo local, patentes a instabilidade administrativa ao lado da potencial
interrupção de serviços públicos e projetos administrativos.
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Adentra ao mérito da ação de entrada, dizendo que há
clara certeza da respeitante improcedência. Lembra que o artigo 83-A da Lei
Orgânica do Município e, bem assim, várias outras leis municipais permitem a
realização de contratações nos moldes das que foram celebradas. Depreende que a
afirmação subtrai o fumus boni iuris inicialmente identificado na instância
comarcana.
Também se insurge contra a indisponibilidade e bloqueio
de seus bens. Considera que a determinação não encontra espaço se há provas de
que os serviços admitidos a partir dos contratos temporários foram efetivamente
prestados, como na hipótese. Evoca o perigo de dano inverso caso efetivada a
constrição, pois, mesmo depois de absolvidos, esses agentes públicos terão
respondido com a indisponibilidade patrimonial temporária, e, além do mais, o
descrédito público.
Requer a concessão de medida liminar a bem da
suspensão da decisão agravada, supondo presentes os requisitos legais. Em
desfecho, pede a confirmação da providência, reformando-se o ato agravado.
Acompanham a inicial os documentos de fs. 46/1.290.
Preparo recursal comprovado à f. 70.
Na decisão de fs. 1.291/1.293 o juiz plantonista deixou de
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apreciar o mérito da liminar requestada, por não detectar a necessária urgência
capaz de justificar a atuação sob o regime de plantão judiciário.
Relatados. Decido.
O recurso é próprio e tempestivo, presentes também as
demais condições de admissibilidade. A teor dos artigos 12, caput, Lei federal nº
7.347/1985, e 522, Código de Processo Civil, ambos aplicáveis subsidiariamente
ao rito da ação de improbidade administrativa, recebo o agravo sob o regime de
instrumento.
O agravante aspira, in limine litis, atribuir efeito
suspensivo ao agravo de instrumento. Como regra, o agravo de instrumento detém
mera devolutividade (artigo 497, Código de Processo Civil). Cumpre ao relator,
monocraticamente, se presente requerimento expresso acompanhado dos
pressupostos escritos nos artigos 558 e 527, III, ou 273, todos do Código de
Processo Civil, atribuir efeito suspensivo ope judicis ao reclamo, ou deferir a
antecipação, total ou parcial, da pretensão recursal, a depender da natureza do
pedido. Assentes a relevância da fundamentação e o perigo de lesão grave e de
difícil reparação, cabíveis as medidas assecuratórias. Oportuna, neste ponto, a lição
de Araken de Assis1.
[...] Por conseguinte, só cabe ao relator suspender
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Manual dos Recursos, 2ª ed., São Paulo: RT, 2008, p. 527.
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os efeitos da decisão e, a “fortiori”, antecipar os efeitos
da pretensão recursal, respeitando dois pressupostos
simultâneos: a relevância da motivação do agravo, o que
implica prognóstico acerca do futuro julgamento do
recurso no órgão fracionário, e o receio de lesão grave e
de difícil reparação resultante do cumprimento da
decisão agravada até o julgamento definitivo do agravo,
presumindo-se sua ocorrência nos atos explicitamente
mencionados no art. 558, caput (v.g., a decisão que
decreta a prisão civil do agravante). […]
E há outra superposição bastante delicada: a do
receio de lesão grave e de difícil reparação, exigindo
tanto como requisito no cabimento do agravo de subida
imediata (art. 522, caput), quanto nas providências
contempladas no art. 527, III. […]. Por definição,
inexistindo o receio de lesão grave e de difícil reparação,
o agravo de instrumento não é cabível, devendo o relator
convertê-lo em retido (art. 527, II); todavia, para o
relator deferir uma das providências do art. 527, III,
conforme hipótese, tal receio não bastará, mostrando-se
necessário o recorrente alegar e evidenciar a relevância
dos fundamentos do agravo de instrumento.
Na
espécie,
foram
devidamente
justificadas
pelo
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agravante o receio de demora na prestação jurisdicional e, na mesma esteira, a
plausibilidade da pretensa reforma do ato agravado.
Adstrita à seara preliminar do exame processual, infere-se
que ao decretar o afastamento cautelar por 30 (trinta) dias e a indisponibilidade de
bens à ordem de R$ 1.863.630,43 (um milhão, oitocentos e sessenta e três mil,
seiscentos e trinta reais e quarenta e três centavos) e R$ 569.078,34 (quinhentos e
sessenta e novel mil, setenta e oito reais e trinta e quatro centavos) para os corréus,
medidas excepcionais e notadamente gravosas nos pontos de vista econômico e
político, a decisão agravada reverberou incontestável prejuízo patrimonial ao
agravante, além do notório desgaste junto aos cidadãos goianirenses, por ser ele o
atual detentor do mandato de Prefeito. Incontestável por isso a lesividade da
decisão agravada.
Extrai-se do exame perfunctório do recurso que, em
princípio, não há neste agravo de instrumento evidências de que a permanência do
agravante no cargo de prefeito objetivamente implique prejuízos à instrução da
ação civil pública por ato de improbidade administrativa. Apesar de sabidamente
aplicável aos prefeitos a tutela cautelar enunciada no artigo 20, parágrafo único,
Lei federal nº 8.429/1992, na espécie a medida carece de fundamentos concretos,
máxime porque não é dado ao julgador, em juízo hipotético, nem mesmo com
suporte nos poderes inerentes ao exercício do mandado de prefeito, presumir que o
agravante possa dolosamente fraudar a verdade real e comprometer a instrução da
demanda. Registre-se, por oportuno, que a simples declaração de que o prefeito
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estaria forjando documentos para justificar a contratação temporária, colhida de
uma só das pessoas contratadas, retirada de um universo de centenas, não demostra
a efetiva intenção deliberada em neblinar o processo, não servindo para justificar o
afastamento do agente político que, vale dizer, possui mandato temporário.
Ainda sem olvidar a superficialidade típica do momento
processual, também impende sinalizar a aparente prematuridade do decreto de
indisponibilidade de bens. Consciente de que a medida constritiva representa tutela
de evidência (artigo 7º e do artigo 17, § 7º, Lei 8.429/1992, aliada à interpretação
conforme à garantia assegurada pelo artigo 5º, XXXV, Constituição Federal)
cumpre considerar que, apesar de impugnar a nulidade dos contratos temporários
considerados ilegais, a petição inicial da ação civil pública (fs. 369/407) noticia
que os agentes admitidos prestaram os serviços ajustados, não havendo, ao menos
no atual estágio do processo, prova do efetivo prejuízo financeiro ao erário e nem
do enriquecimento ilícito de qualquer das partes contratantes. Circunstância que
retrai a motivação do comando de indisponibilidade de bens.
Vale anotar, em desfecho, que graças ao efeito expansivo
subjetivo decorrente deste recurso (artigo 509, Código de Processo Civil),
delineado pela natureza unitária do litisconsórcio passivo estabelecido na ação de
origem, somado ao fato de que os argumentos de defesa são comuns, esta decisão
aproveita ao corréu Belchior Augusto Caetano. Neste sentido: STJ, 2ª Turma, REsp
1367969/SP, rel. Min. Humberto Martins, DJ de 19.08.2014 e 5ª Turma, AgRg no
REsp 770326/BA, rel. Min. Celso Limongi, DJ de 27.09.2010.
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A par dessas considerações, determino a suspensão dos
efeitos da decisão agravada até o julgamento final de mérito deste recurso.
Oficie-se ao juízo de origem, informando sobre esta
decisão.
Após, intime-se o agravado para apresentar contrarrazões
no prazo legal.
Ultimadas as providências determinadas, vistas à douta
Procuradoria-Geral de Justiça.
Goiânia, 25 de março de 2015.
DESª. BEATRIZ FIGUEIREDO FRANCO
Relatora
Dec24927/F
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