Onicofagia: quem disse que as unhas são para roer? Escrito por Carla Mateus, com entrevista a Cláudio Moraes Sarmento, psiquiatra TERÇA, 05 AGOSTO 2014 14:58 Joerg Steffens/Getty Images Para uns, é um vício, para outros, um escape para vencer a ansiedade. A onicofagia ou ato de roer as unhas – das mãos e dos pés – é um comportamento compulsivo de difícil controlo que pode provocar consequências graves. Quando o nervosismo e a ansiedade atacam, todos os pretextos servem de motivo para roer as unhas. E de entre os vícios e tiques mais stressantes, este é talvez o mais comum e um dos hábitos mais difíceis de abandonar. Deu por si a roer as unhas enquanto lia isto? Então, é a altura ideal para continuar a ler este artigo. Ligada à ansiedade, a onicofagia – sim, é este o termo científico atribuído à mania ou vício de roer as unhas – é um problema que afeta homens e mulheres independentemente da sua idade. Cláudio Moraes Sarmento, psiquiatra, explica-nos que, antes de mais, este tique "é um sintoma de ansiedade e não uma patologia". No entanto, "a ansiedade que causa a onicofagia é que já poderá ser uma patologia dependendo da intensidade e/ou sintomas associados", salienta. O ato de roer as unhas é um hábito comum em crianças a partir dos três anos que se pode prolongar durante a infância, adolescência ou mesmo na vida adulta. Geralmente, as pessoas que sofrem de onicofagia recorrem a este vício quando se sentem frustradas, nervosas, sob qualquer emoção negativa, ou, pelo contrário, perante períodos de tédio ou de fome. O psiquiatra revela que "sendo este um sintoma inespecífico de ansiedade, qualquer pessoa pode vir a desenvolver onicofagia pelo menos transitoriamente. Mas tal dependerá dos mecanismos de defesa de cada um para lidar com a ansiedade". As principais consequências Roer as unhas não é um hábito com meras sequelas estéticas. É verdade que na maioria dos casos, este tique causa apenas algumas mazelas nos dedos, uns rasgões na pele e umas quantas feridas. Nada mais do que isso. Mas os seus riscos podem ir mais além. As pessoas que roem as unhas tendem a magoar também as cutículas (a pele fina na base das unhas) e a zona na extremidade dos dedos. Algumas das consequências diretas mais desagradáveis da onicofagia passam por deformações nos dedos e da pele ao seu redor, bem como pela "destruição da própria matriz ungueal e a futura ausência de unha", aponta Cláudio Moraes Sarmento. Para além disso, o ato de roer a pele que fica ao redor das unhas – e que nos protege contra agentes externos – causa um trauma que permite a entrada de fungos e bactérias no local, originando infeções e inflamações. Este hábito pode também prejudicar a musculatura do maxilar e a articulação da mandíbula, desgastando o esmalte dos dentes e tornando-os mais suscetíveis a fraturas, cáries e gengivites. E para aqueles que, além de roer, também engolem as unhas, o cenário pode piorar, levando ao aparecimento de problemas gastrointestinais, como esofagite infecciosa (inflamação do esófago), gastrite e até apendicite. As deformidades nas unhas causadas por este vício podem levar a constrangimentos na vida quotidiana e a limitações profissionais – restringindo o uso das mãos nas mais diversas atividades, nomeadamente para escrever, desenhar ou tocar um instrumento de cordas –, mas também a danos psicológicos, uma vez que há pessoas que acabam por ter vergonha do aspecto das suas mãos. Como acabar com a mania? Se é verdade que, na maior parte das situações, a onicofagia acaba por desaparecer ou deixar pequenos tiques, como uma mordiscadela de vez em quando, em alguns casos, a mania cresce com o indivíduo até à idade adulta. Nessas situações, e também naquelas em que se encontram associadas disfunções psicológicas, emocionais ou sociais, é necessária a intervenção de um médico que auxilie na cessação deste hábito. Mas isso nem sempre acontece. Como Cláudio Moraes Sarmento reconhece "a maior parte das pessoas com onicofagia não procura ajuda e muito menos pela onicofagia em si mesma". No entanto, este é um problema que pode e deve ser tratado quando se torna crónico e persistente. Para que se possa eliminar este mau hábito, deve-se tentar identificar as situações que nos levam a roer as unhas e, como defende o psiquiatra, tratar a ansiedade a elas subjacente "através de medicação nos casos mais graves e/ou psicoterapia". Hoje em dia não faltam produtos e estratégias (ver caixa) para ajudar quem tem vontade de se desembaraçar deste hábito, mas é essencial querer acabar com esta mania: "a motivação para resolver o sintoma é fundamental para a adoção de estratégias comportamentais subsequentes", enfatiza o especialista. Uma das técnicas mais utilizadas no controlo da onicofagia consiste na aplicação de um verniz de sabor amargo na unha. Desta forma, quando a unhas são levadas à boca surge um mau sabor e o impulso instantâneo de as retirar. Pare de roer as unhas! Eis algumas estratégias que podem ajudar a controlar a onicofagia: Mantenha as unhas bem cortadas, evitando que as pontas mal aparadas sirvam de tentação para os roedores. - Conserve as unhas arranjadas, ou seja, polidas e pintadas. Desta forma, evita, pelo menos durante algum tempo, que caia em tentação. - Utilize vernizes com sabor. Nas farmácias poderá encontrar diversos produtos cujo sabor desagradável afasta a boca das unhas. De acordo com o psiquiatra Cláudio Moraes Sarmento, esta estratégia "pode ser útil sobretudo em crianças". - Aplique unhas falsas. Além de ser uma opção estética, as unhas de gel tapam a unha natural e ajudam a diminuir o impulso de a roer. - Procure ter as mãos ocupadas com uma bola antisstress, uma caneta ou outro objeto. Quando as mãos não estão livres, é difícil roê-las. - Mastigar pastilha elástica mantémnos ocupados em vez de roer as unhas. - No caso das crianças, pode usar vernizes com cores atrativas nas meninas e proteger as unhas dos rapazes com pensos coloridos ou pequenos adesivos. Não se esqueça que estes métodos por si só não garantem o controlo da onicofagia. Tal como em todos os vícios, a força de vontade é imprescindível para quem quer superar este hábito compulsivo. Fonte: - Cláudio Moraes Sarmento, psiquiatra