Patofisiologia do Diabetes Mellitus Dr. Marcos Mendes Disciplina de Fisiologia FMABC Conceito É um distúrbio crônico com comprometimento do metabolismo da glicose e de outras substâncias produtoras de energia, bem como pelo desenvolvimento tardio de complicações vasculares e neuropáticas. (OMS) Aspectos Históricos Origem do termo Diabetes (= sifão): Grécia Antiga 1000 aC: múmias egípcias com indícios de DM 400 aC: Índia, Charak e Surust: identificação de alterações bioquímicas na urina de diabéticos 1921: Frederick Banting e Charles Best: insulina 1922: Primeira criança com DM tratada com insulina Classificação Diabetes Mellitus insulino-dependente (tipo 1) - DMID Destruição da célula beta, levando à deficiência absoluta de insulina Início na juventude, instável e propenso à cetose Diabetes Mellitus não insulino-dependente (tipo 2) - DMNID Graus variados de resistência insulínica e de deficiência na secreção de insulina. Indivíduos obesos e não obesos de início na idade adulta ou de início na maturidade. Estável e não-cetótico Diabetes Mellitus relacionado com a desnutrição (secundário) Fonte: OMS / CID-10 Classificação Outros tipos especificados de diabetes mellitus (secundário) - Sínd. Genéticas (Sd. Turner, distrofia mioclônica, Dç. Huntigton, lipodistrofia, defeitos genéticos funcionais da célula beta, defeitos genéticos na ação da insulina etc) - Anormalidades dos receptores de insulina (deficiência ou anticorpos) - Doenças do pâncreas (pancreatite, hemocromatose,fibrose cística, carcinomas) - Endocrinopatias (Cushing, Acromegalia, Feocoromocitoma) - Induzidas por fármacos e agentes químicos (corticoide, betabloqueador, diuréticos) Diabetes gestacional Fonte: OMS / CID-10 Fatores de Risco • Idade ≥ 45 anos • História familiar de DM (pais, filhos e irmãos) • Excesso de peso (IMC ≥ 25 kg/m2) • Sedentarismo • HDL-c baixo ou triglicérides elevados • Hipertensão arterial • Doença coronariana • DM gestacional prévio • Macrossomia ou história de abortos de repetição ou mortalidade perinatal • Uso de medicação hiperglicemiante (corticosteroides, tiazídicos, betabloqueadores etc) Fonte: American Diabetes Association Valores de glicose plasmática (em mg/dL) Categorias Jejum 2 h após 75g glicose Casual Normal < 100 < 140 Glicemia de jejum alterada < 126 < 140 (se realizada) Tolerância à glicose diminuída < 126 E Diabetes mellitus ≥ 126 OU ≥ 140 e < 200 > 200 OU ≥ 200 (com sintomas) Fonte: American Diabetes Association Diagnóstico Critérios laboratoriais para o diagnóstico de DM: Sintomas de diabetes (poliúria, polidipsia, polifagia ou perda de peso inexplicada) + glicemia casual ≥ 200 mg/dL (realizada a qualquer hora do dia, independentemente do horário das refeições); OU Glicemia de jejum ≥ 126 mg/dL*; OU Glicemia de 2 horas ≥ 200 mg/dL no teste de tolerância à glicose. Fonte: American Diabetes Association Diagnóstico Critérios para o diagnóstico de DM Gestacional (DMG) Duas glicemias de jejum ≥ 110mg/dL OU Uma glicemia > 185mg/dL, após 50g de glicose OU Uma glicemia entre ≥ 140 e < 200mg/dL, após 75g de glicose OU Duas ou mais glicemias anormais ao TOTG-3h (100g) Fonte: American Diabetes Association Níveis glicêmicos desejáveis durante a gestação Jejum 70-100 Pós-prandial (1 hora) ≤ 140 Pós-prandial (2 horas) ≤ 120 Fonte: American Diabetes Association Diferenças Básicas entre DMID e DMNID DMID (tipo 1) Doença Autoimune Deficiência Insulínica Insulite Jovens e Adolescentes Autoanticorpos Indivíduos Magros Cetoacidose Início Abrupto (poliúria, polidipsia e polifagia) DMNID (tipo 2) 90 % Sd. Metabólica Deficiência Insulínica Resistência Insulínica Indivíduos Adultos Depósito amiloide : Ilhotas Obesidade (85 %) Sd. Hiperosmolar Início geralmente Lento (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Insulina (µU/ml) 360 330 300 270 240 110 80 150 120 90 60 30 0 Glucagon (µµg/ml) Glucose (mg/100 ml) Respostas de Insulina e Glucagon após uma refeição rica em carboidratos 140 130 120 110 100 90 Diabetes mellitus tipo 2 (n= 12)+ Controles sem diabetes (n= 11) Refeição Resposta de insulina deprimida/retardada Glucagon não suprimido –60 0 60 Tempo (minutos) +Insulina medida em cinco pacientes. Adaptado de Müller WA et al N Engl J Med 1970;283:109–115. 120 180 240 DM INSULINO-DEPENDENTE • 99 % - Autoimune • 1 % - Idiopática Início Abrupto: Poliúria Polifagia Polidipsia Emagrecimento Cetoacidose Diabética Predisposição Genética Fator Ambiental Desencadeador (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) DM INSULINO-DEPENDENTE Massa Céls Doença autoimune órgão-específica, progressiva, que começa anos antes do início do quadro clínico (autoimunidade), acomete as células das ilhotas de Langerhans e que ao início do quadro clínico já existe a destruição de 90 a 95 % destas células pelo processo autoimune. Início Clínica Genética & Ambiente Peptídeo C Indetectável Autoimunidade e Perda Metabólica Pré-Diabetes Tempo Diabetes Franco DMID ao diagnóstico 5 anos após diagnóstico Células Beta Nenhuma Célula Beta Insulina Componentes celulares e humorais (anticorpos) são detectados meses ou mesmo anos antes do aparecimento da doença clínica Anticorpos e Células T, NK, B MORTE! Célula Beta Célula Beta PREDISPOSIÇÃO GENÉTICA + FATORES AMBIENTAIS CÉLULA BETA AUTOIMUNIDADE CELULAR E HUMORAL TOLERÂNCIA IMUNOLÓGICA ILHOTAS LANGHERHANS T-CD4+ T-CD8+ Macróf. NK B IL-1ß TNF- INF- Insulite MENOR PRODUÇÃO INSULINA DIABETES ATIVAÇÃO CÉLS. T CD4 ESPECÍFICAS ATIVAÇÃO: • • • • CÉLS. B (B) CÉLS. NK (NK) CÉLS. CD8+ (T-CD8+) MACRÓFAGOS Insulite Infiltração das ilhotas por células mononucleares que antecede a doença clínica e persiste por semanas ou meses antes que uma destruição significativa das células beta ocorra Mononucleares No curso da insulite os macrófagos e células T ativadas secretam mediadores solúveis (citocinas, óxido nítrico, radicais livres do oxigênio), que provavelmente contribuem para a disfunção e morte da célula beta Fatores Ambientais Por que existe uma discordância em relação ao diabetes mellitus tipo 1 nos gêmeos idênticos? FATORES AMBIENTAIS? Vírus, Bactérias, Toxinas, Stress etc ? Vírus Possivelmente Implicados no Desencadeamento do DMID Coxsackie vírus (tipo de enterovírus) Rubéola Caxumba Citomegalovírus Mononucleose Infecciosa Retrovírus Reovírus 1 Hepatite Modelo de Lesão da Célula Beta Mimetismo Molecular Modelo de Lesão da Célula Beta Resposta imune contra vírus que ataca Célula Beta Complicações Agudas Cetoacidose diabética Síndrome hiperosmolar Hipoglicemia (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Cetoacidose Diabética Deficiência grave de insulina Secreção excessiva dos hormônios contrarregulatórios (GH, cortisol, glucagon e adrenalina) Hiperglicemia (> 300 mg/dL) Hipercetonemia Acidose (pH < 3,5) Diurese osmótica Desidratação (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Cetoacidose Diabética Dor abdominal e vômitos: íleo paralítico Taquicardia Hipotensão arterial Rebaixamento de consciência e coma Respiração de Kussmaul: respiração profunda e rápida (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Síndrome Hiperosmolar Hiperosmolaridade (> 320 mOsm/L) Hiperglicemia (> 600 mg/dL) Diurese osmótica Desidratação Não-cetótico SNC: Convulsões, afasia, déficit sensorial ou motor, delirium e coma (10%) (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Complicações Crônicas Retinopatia Nefropatia Neuropatia Outras: Pé diabético Aterosclerose Hipertensão arterial Dislipidemias (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Retinopatia 10 – 15% DMID e 20 vezes mais freq. que a população geral 15 – 20% DMNID após 20 anos Frequência em relação aos anos de evolução do DM: 20-25% em 5 anos 50-70% em 10 anos > 95% em 15 anos F. Proliferativa é raro antes de 10 anos, mas aumenta para 50% após 20 anos (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Retinopatia Fase Não Proliferativa: Microaneurismas seguidos de microhemorragia retiniana e exudatos Edema macular devido ao exudato, mais comum no DMNID. (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Retinopatia Fase Proliferativa: Isquemia aumenta fatores de crescimento (IGF). Crescimento de tufos finos de novos vasos e tecido fibroso que iniciam na retina e invadem o vítreo resultando no descolamento de retina e hemorragias seguido de amaurose. Novos vasos invadem o ângulo da câmara anterior resultando em glaucoma irreversível seguido de amaurose. (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Nefropatia 30 – 35% DMID e 15 – 20% DMNID Glomeruloesclerose Espessamento da lâmina basal capilar (microangiopatia) Expansão de colágeno no interior da região mesangial (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição) Valores de albuminúria e de proteinúria utilizados no diagnóstico de Nefropatia Diabética Categoria Urina de 24 horas Amostra de urina Normal: Normoalbuminúria < 20 mg/min < 17 mg/L Nefropatia Incipiente: Microalbuminúria 20 a 200 mg/min 17 a 174 mg/L Nefropatia Clínica: Macroalminúria Proteinúria > 174 mg/L > 430 mg/L > 200 mg/min > 500 mg/24h Fonte: American Diabetes Association Neuropatia Quase 50% dos diabéticos Polineuropatias (lesões simétricas) Sensorial Distal (mãos e pés) Motora (pelve e n. femural) Autonômica (prognóstico ruim) Mononeuropatias (lesões assimétricas) Lesões de nervos isolados (periféricos e cranianos) Radiculopatia (Fonte: CECIL, Tratado de Medicina Interna - Goldman, Lee & Bennett, J. Claude, 21ª Edição)