BRAZILIAN JOURNAL OF RHEUMATOLOGY
REVISTA BRASILEIRA DE REUMATOLOGIA
Official Organ of Brazilian Society of Rheumatology
Órgão Oficial da Sociedade Brasileira de Reumatologia
SEPTEMBER/OCTOBER 2011 • VOLUME 51 • NUMBER 5
SETEMBRO/OUTUBRO 2011 • VOLUME 51 • NÚMERO 5
ISSN: 0482-5004
EDITORIAL | EDITORIAL
408
410
Lupus clinical trials: medication failure or failure in study design
Estudo clínico em lúpus: falha na medicação ou falha no desenho do estudo
Morton Aaron Scheinberg
ORIGINAL ARTICLE | ARTIGO ORIGINAL
412
417
IgA nephropathy in patients with spondyloarthritis followed-up at
the Rheumatology Service of Hospital das Clínicas/UFMG
Nefropatia por IgA em portadores de espondiloartrites acompanhados
no Serviço de Reumatologia do Hospital das Clínicas da UFMG
Daniela Castelo Azevedo, Gilda Aparecida Ferreira, Marco Antônio P. Carvalho
423
428
Prevalence of clinical and laboratory manifestations and
comorbidities in polymyositis according to gender
Prevalência de manifestações clínico-laboratoriais e
comorbidades na polimiosite segundo o gênero
Fernando Henrique Carlos de Souza, Maurício Levy-Neto, Samuel Katsuyuki Shinjo
434
440
Immediate effect of the elastic knee sleeve use on individuals with osteoarthritis
Efeito imediato da utilização da joelheira elástica em indivíduos com osteoartrite
Flavio Fernandes Bryk, Julio Fernandes de Jesus, Thiago Yukio Fukuda,
Esdras Gonçalves Moreira, Freddy Beretta Marcondes, Marcio Guimarães dos Santos
447
451
Correlation of fatigue with pain and disability in rheumatoid
arthritis and osteoarthritis, respectively
Correlação de fadiga com dor e incapacidade na artrite
reumatoide e na osteoartrite, respectivamente
Gilberto Santos Novaes, Mariana Ortega Perez, Maria Beatriz Bray Beraldo,
Camila Rodrigues Costa Pinto, Reinaldo José Gianini
456
460
Prolactin, estradiol and anticardiolipin antibodies in premenopausal
women with systemic lupus erythematosus: a pilot study
Prolactina, estradiol e anticorpos anticardiolipina em amostra de mulheres
pré-menopáusicas com lúpus eritematoso sistêmico: estudo-piloto
Fabiane Tiskievicz, Elaine S. Mallmann, João C. T. Brenol, Ricardo M. Xavier, Poli Mara Spritzer
465
474
Study of the frequency of HLA-DRB1 alleles in Brazilian
patients with rheumatoid arthritis
Estudo da frequência dos alelos de HLA-DRB1 em
pacientes brasileiros com artrite reumatoide
Magali Justina Gómez Usnayo, Luis Eduardo Coelho Andrade, Renata Triguenho Alarcon, Juliana Cardoso Oliveira,
Gustavo Milson Fabrício Silva, Izidro Bendet, Rufus Burlingame, Luis Cristóvão Porto, Geraldo da Rocha Castelar Pinheiro
REVIEW ARTICLE | ARTIGO DE REVISÃO
484
490
Therapeutic effects of exercise training in patients
with pediatric rheumatic diseases
Efeitos terapêuticos do treinamento físico em pacientes
com doenças reumatológicas pediátricas
Bruno Gualano, Ana Lúcia de Sá Pinto, Maria Beatriz Perondi, Hamilton Roschel,
Adriana Maluf Elias Sallum, Ana Paula Tanaka Hayashi, Marina Yazigi Solis, Clóvis Artur Silva
497
503
Expression of complement regulatory proteins CD55,
CD59, CD35, and CD46 in rheumatoid arthritis
Expressão de proteínas reguladoras do complemento CD55,
CD59, CD35 e CD46 na artrite reumatoide
Amanda Kirchner Piccoli, Ana Paula Alegretti, Laiana Schneider, Priscila Schmidt Lora, Ricardo Machado Xavier
CASE REPORT | RELATO DE CASO
511
514
Phlegmasia cerulea dolens in patient with systemic lupus
erythematosus in the remote postpartum period
Flegmasia cerúlea dolens em paciente com lúpus
eritematoso sistêmico no puerpério remoto
José Marques Filho
517
520
Septic arthritis due to Streptococcus bovis in a patient with liver cirrhosis
due to hepatitis C virus – case report and literature review
Artrite séptica por Streptococcus bovis em paciente com cirrose hepática
devido ao vírus da hepatite C – relato de caso e revisão de literatura
Ernesto Dallaverde Neto
524
527
Takayasu's arteritis in children and adolescents: report of three cases
Arterite de Takayasu na infância e na adolescência: relato de três casos
Ana Karina Soares Nascif, Marcelo Delboni Lemos, Norma Suely Oliveira,
Paula Campos Perim, Ana Costa Cordeiro, Mariana Quintino
LETTER TO THE EDITORS | CARTA AOS EDITORES
531
533
The presence of the Brazilian rheumatology in the GRAPPA
A presença da reumatologia brasileira no GRAPPA (Group for
Research and Assessment of Psoriasis and Psoriatic Arthritis)
Cláudia Goldenstein-Schainberg, Roberto Ranza, Rubens Bonfiglioli, Sueli Carneiro,
Valderilio F. Azevedo, José Goldenberg, Morton Scheinberg
EDITORIAL
Estudo clínico em lúpus: falha na medicação
ou falha no desenho do estudo
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
heterogeneidade das manifestações do lúpus representa
importante desafio para o desenho de estudos clínicos.
O pleomorfismo das manifestações clínicas, a gravidade da doença, a influência da etnia na sua atividade e os
obstáculos para a realização de estudos com amostras maiores
dificultam a obtenção de significância estatística nos ensaios
clínicos para novas terapias. Muitos desses estudos excluem
pacientes com manifestações renais e do sistema nervoso central, na tentativa de detectar eficácia em estágios menos graves
da doença. Neste editorial tecemos alguns comentários gerais
sobre estudos recentes.
O estudo EXPLORER arrolou 257 pacientes com lúpus
extrarrenal e atividade variando de moderada a grave. Os
pacientes foram randomizados para receber rituximabe e
prednisona ou placebo e prednisona, tendo sido acompanhados por 78 semanas. Os desfechos primários e secundários
do estudo não foram atingidos. O estudo LUNAR arrolou
pacientes com nefrite lúpica comprovada por biópsia. O
desenho geral foi semelhante ao do EXPLORER, e o sucesso foi definido como resposta renal em um ano. O uso
do medicamento não teve impacto nos desfechos primários
e secundários.
O estudo The efficacy and safety of abatacept in patients
with non-life-threatening manifestations of systemic lupus
erythematosus: results of a twelve-month, multicenter, exploratory, phase IIb, randomized, double-blind, placebo-controlled
trial (Eficácia e segurança do abatacepte em pacientes com
lúpus eritematoso sistêmico e manifestações que não oferecem
risco de morte: resultados de um estudo randomizado, multicêntrico, exploratório, fase IIb, duplo-cego, controlado com
placebo, de 12 meses) avaliou o efeito de abatacepte na exacerbação da doença em um contexto de uso de glicocorticoides
orais. Para serem incluídos na pesquisa os pacientes deveriam
apresentar exacerbação de lúpus nos 14 dias anteriores à sua
entrada no estudo e utilizar dose estável de prednisona inferior
a 30 mg/dia. Foram tratados 175 pacientes: 118 randomizados
para receber abatacepte e 57 para receber placebo. O estudo não
a
410
mostrou diferença nas taxas de exacerbação para as categorias
BILAG A e B.1
Belimumabe é um anticorpo monoclonal humano que
inibe o fator estimulante de linfócitos B (B-lymphocyte stimulator – BLyS), e mostrou-se mais eficiente que placebo
no tratamento de indivíduos com lúpus eritematoso sistêmico
(LES) sorologicamente ativo. Análises de eficácia incluíram
os índices de atividade da doença SELENA-SLEDAI, BILAG
e SELENA-SLEDAI Flare Index (SFI). O desfecho primário
ocorreu na semana 52, com melhora em várias aferições
empregadas, inclusive a avaliação global pelo médico. O
sucesso de belimumabe em 52 semanas (BLISS-52) pode
ter resultado de uma nova subanálise em subpopulação de
pacientes que melhorou com o tratamento. A maioria dos
pacientes mostrou estar na categoria “B” quanto à atividade
da doença, o que significa que tinham mais autoanticorpos,
inclusive títulos mais elevados de anti-DNA e níveis mais
altos de imunoglobulinas séricas.
Considerações gerais importantes
Estudos futuros poderiam analisar se existe um racional
científico para que a avaliação de eficácia de tratamento
enfoque a redução do número de exacerbações versus a
diminuição persistente da atividade da doença. Pacientes
com LES e exacerbações periódicas podem diferir daqueles com lúpus cronicamente ativo. Pacientes com LES de
grupos raciais diferentes podem apresentar patologias e
condições diferentes, com um único paciente apresentando
diferentes variações ao longo do tempo. Os estudos futuros devem dar especial atenção à etnia como um fator que
pode afetar o desfecho. O tamanho do estudo também é
um importante desafio. Em geral, quanto maior o estudo,
maior a probabilidade de se perder um efeito terapêutico
nas análises. Por fim, um pequeno estudo pode obter êxito
e resultados estatisticamente significativos. Outros pontos
a se considerar são tempo de doença, atual envolvimento
de órgãos específicos e tratamentos anteriores. Por fim, a
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):408-411
EDITORIAL
definição de melhora dos desfechos usada em estudos deveria ser aceita universalmente como a melhor disponível.
Controvérsias em torno do uso do índice BILAG baseiam-se
em uma abordagem de intenção de tratar de acordo com
uma extensa série de critérios para classificar pacientes com
manifestações de LES surgindo em diferentes sistemas de
órgãos. Há limitações com o uso do índice BILAG isolado;
por exemplo, o uso de BILAG B como medida de desfecho
de atividade lúpica deveria ser considerado simultaneamente
ao uso de outros índices.2
auxiliar na discriminação entre falha medicamentosa e falha
no desenho do estudo.
Morton Aaron Scheinberg, PhD
Clínico e Reumatologista do Hospital Israelita Albert Einstein
Diretor científico e Coordenador de Pesquisa Clínica do
Hospital Abreu Sodré – AACD
Professor Llivre-Docente em Imunologia pela Universidade de São Paulo – USP
PhD em Imunologia pela Universidade de Boston
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
CONCLUSÕES
Considerando-se o sucesso dos estudos sobre artrite reumatoide (AR), seria de se esperar que o mesmo acontecesse com
o LES, mas isso não se mostrou verdadeiro. Espera-se que
possamos aprender com os nossos erros atuais e criar novos
e diferentes elementos de desenho clínico, assim como que
as considerações aqui esboçadas para estudos futuros possam
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):408-411
2.
Merrill JT, Burgos-Vargas R, Westhovens R, Chalmers A, D’Cruz D,
Wallace DJ et al. The efficacy and safety of abatacept in patients with
non-life-threatening manifestations of systemic lupus erythematosus:
results of a twelve-month, multicenter, exploratory, phase IIb,
randomized, double-blind, placebo-controlled trial. Arthritis Rheum
2010; 62(10):3077-87.
Peirce A, Lipsky P, Schwartz BD. Mitigate Risk and Increase Success
of Lupus Clinical Trials - Design strategies from a Lupus Research
Institute conference. The Rheumatologist, August 2010. Available
from: www.the-rheumatologist.org/details/article/863303/Mitigate_
Risk_and_Increase_Success_of_Lupus_Clinical_Trials.html.
411
ARTIGO ORIGINAL
Nefropatia por IgA em portadores de
espondiloartrites acompanhados no Serviço de
Reumatologia do Hospital das Clínicas da UFMG
Daniela Castelo Azevedo1, Gilda Aparecida Ferreira2, Marco Antônio P. Carvalho2
RESUMO
Objetivo: Determinar a frequência das glomerulonefrites nos pacientes espondiloartríticos acompanhados em Serviço
de Reumatologia Brasileiro e avaliar variáveis clínicas correlacionadas. Pacientes e métodos: Os pacientes foram
avaliados quanto às características sociodemográficas, tipo de espondiloartrite, tempo e atividade da doença, uso de
anti-inflamatórios não esteroides, presença do HLA-B27, níveis de creatinina e ureia séricas, presença de comorbidades
e presença de hematúria e/ou proteinúria. Os pacientes com hematúria foram submetidos à pesquisa de dismorfismo
eritrocitário, e aqueles com proteinúria submeteram-se à quantificação da proteína na urina de 24 horas. Biópsia renal
foi indicada para aqueles com hematúria de origem glomerular e/ou proteinúria maior que 3,5 g. Resultados: Foram
avaliados 76 pacientes. A alteração mais frequente no exame de urina de rotina foi a hematúria microscópica (44,7%),
geralmente intermitente e em amostra isolada de urina durante o seguimento do paciente. Em oito (10,5%) dos pacientes a hematúria sugeriu origem glomerular. A biópsia renal foi realizada em cinco deles, e mostrou nefropatia por IgA
em quatro (5,3%) e doença da membrana fina em um paciente. Conclusões: Notou-se alta frequência de alterações no
exame de urina desse subgrupo de pacientes, assim como alta prevalência de nefropatia por IgA. Apesar de mais estudos
sobre o assunto serem necessários para melhor esclarecimento desses resultados, a realização periódica de exames de
urina deveria ser recomendável.
Palavras-chave: glomerulonefrite, espondiloartropatias, glomerulonefrite por IgA, hematúria.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
A pesquisa de glomerulonefrites (GNF) nos pacientes acometidos por espondiloartrite (EPA) não é uma recomendação rotineira.1,2 Apesar disso, tem sido mencionada maior
frequência de acometimento renal nas EPA.3,4 Os tipos de
acometimento citados são amiloidose renal, nefropatia
relacionada aos anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs),
GNF extracapilar relacionada aos agentes antifator de necrose
tumoral (anti-TNF), GNF membranosa e GNF com depósitos
mesangiais predominantes de IgA.3-15 Há ainda uma hipótese de
que a nefropatia por IgA e a espondilite anquilosante poderiam
compartilhar mecanismos etiopatogenéticos.16
As GNF englobam grande variedade de alterações imunomediadas que causam inflamação predominantemente no
glomérulo renal. São a segunda causa de insuficiência renal
terminal no mundo.17 Sua apresentação clínica tem como
constante a presença de proteinúria e/ou hematúria, que
Recebido em 10/6/2010. Aprovado, após revisão, em 01/7/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse. Comitê de Ética: ETIC 086/07.
Serviço de Reumatologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG; Departamento do Aparelho Locomotor e Departamento de
Cirurgia, Faculdade de Medicina da UFMG; Pós-graduação em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina da UFMG; áreas de concentração
em Reumatologia.
1. Mestre em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG; Médica Especialista em
Reumatologia
2. Professor Adjunto Doutor da Faculdade de Medicina da UFMG
Correspondência para: Daniela Castelo Azevedo. Hospital das Clínicas da UFMG. Serviço de Reumatologia, Ambulatório Bias Fortes. Alameda Álvaro Celso,
175, 2° andar – Santa Efigênia. CEP: 20130-100. Belo Horizonte, MG, Brasil. E-mail: [email protected]
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):412-422
417
Azevedo et al.
pode ser ou não acompanhada de outros sintomas ou sinais
clínicos.18
Diante dessas constatações, pretende-se estudar a prevalência das GNF nos pacientes acometidos por EPA acompanhados no Serviço de Reumatologia do Hospital das Clínicas da
Universidade Federal de Minas Gerais (HC/UFMG), além de
tentar correlacionar a presença da mesma com o tempo de doença, com as características e com o grau de atividade das EPA.
PACIENTES E MÉTODOS
Foram avaliados pacientes com EPA segundo os critérios
do Grupo Europeu para o Estudo das Espondiloartropatias,1
maiores de 18 anos de idade, acompanhados no Ambulatório
de Espondiloartrites do Serviço de Reumatologia do HC/
UFMG há pelo menos um ano, durante o período de setembro de 2007 a fevereiro de 2009. Nesse ambulatório é praxe
pedir exame de urina de rotina a cada consulta. A presença
de hematúria e/ou proteinúria foi levantada inclusive em
exames de urina de rotina pregressos. Foi considerada hematúria a presença de mais de duas hemácias por campo de
maior aumento no exame de microscopia óptica do sedimento
urinário ou uma fita reagente positiva,19-21 e proteinúria o
exame de urina de rotina com os testes semiquantitativos
positivos para proteína ou proteinúria maior que 150 mg/dL
na urina de 24 horas.22
Os pacientes com exame de urina alterado, no caso de
hematúria, foram submetidos à sedimentoscopia e pesquisa de
dismorfismo eritrocitário em laboratório de referência (possível
tecnicamente nos pacientes com pelo menos nove hemácias por
campo de maior aumento no exame de microscopia óptica).
No caso de proteinúria, foram submetidos à quantificação da
mesma na urina de 24 horas.
Além da avaliação quanto às alterações no seu exame de
urina, os pacientes foram avaliados quanto a características
sociodemográficas e econômicas; características da EPA
(tempo de doença a partir do diagnóstico, atividade da doença
naqueles pacientes com predomínio do acometimento axial
pelo índice BASDAI – Bath Ankylosing Spondylitis Disease
Activity Index);23 medicamentos usados para o tratamento,
e, no caso do uso de AINEs, tempo do uso do mesmo; positividade para o HLA-B27 (por qualquer método de investigação laboratorial); avaliação da função renal (creatinina e
ureia séricas); atividade inflamatória (dosagem de proteína
C-reativa), e diagnóstico de comorbidades clínicas, sobretudo
hipertensão arterial sistêmica (HAS), definida pelos critérios
do Joint Committee on Detection, Evaluation and Treatment
418
of High Blood Pressure – JNC VII,24 e insuficiência renal
crônica (IRC), definida como a fração de filtração glomerular
menor que 60 mL/min/1,73 m² por três meses ou mais. Outras
comorbidades relevantes descritas em prontuário médico
também foram consideradas.
Biópsia renal guiada por ultrassom foi indicada para os
pacientes em que a hematúria foi confirmada pelo exame do
sedimento urinário e sugeriu origem glomerular (cilindros
hemáticos e/ou 80% ou mais das hemácias dismórficas) e/ou
encontrou-se proteinúria isolada maior que 3,5 g na urina de
24 horas, já que essa é definida como proteinúria nefrótica e
indica fortemente a presença de glomerulopatia.18
A biópsia renal foi contraindicada nos pacientes com
diátese hemorrágica incorrigível, rins menores que 9 cm ao
ultrassom de vias urinárias, HAS grave a despeito do uso de
anti-hipertensivos, cistos renais bilaterais e múltiplos, neoplasia renal, hidronefrose, infecção renal ou perirrenal não tratada,
pacientes pouco cooperativos, pacientes que se recusaram a se
submeter ao procedimento.
Os critérios de exclusão foram pacientes que não concordassem participar do estudo e menores de 18 anos.
O teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher foram
usados para avaliar as variáveis categóricas. Já para as contínuas, aplicou-se o teste t de Student, se apresentassem características de normalidade, e, caso contrário, empregou-se o teste
não paramétrico de Mann-Whitney. Para todas as análises foi
considerado nível de significância de 5% (P < 0,05). A análise
estatística foi realizada com o auxílio do software Statistical
Package for Social Sciences (SPSS®) versão 16.0 (SPSS Inc.,
Chicago, IL, EUA).
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
da UFMG (parecer nº ETIC 086/07) e pela Diretoria de
Ensino, Pesquisa e Extensão do HC/UFMG (processo
nº 142/2006).
RESULTADOS
Foram avaliados 76 pacientes com EPA. As principais características desses indivíduos podem ser vistas na Tabela 1. Dentre
os pacientes estudados, foi possível pesquisar o HLA-B27 em
51, sendo positivo em 33 deles (43,4%).
A média do BASDAI encontrada, que varia de zero a
dez, foi de 3,86 ± 2,06, com mínimo de zero e máximo de
7,64. A proteína C-reativa também foi medida, com o intuito
de contribuir para a avaliação da atividade da doença; sua
mediana foi 6, sendo os percentis 25 e 75, respectivamente,
3 e 19,6.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):412-422
Nefropatia por IgA em portadores de espondiloartrites acompanhados no Serviço de Reumatologia do Hospital das Clínicas da UFMG
Tabela 1
Características da população estudada
N (%)
Gênero
Masculino
49 (64,5)
Idade
Média = 42,7 anos; mínima 22, máxima 75
Brancos
53 (69,7)
Remuneração mensal
< 3 salários mínimos
68 (89,5)
Anos de estudo
Mediana = 8
Comorbidades
HAS
IRC
Diabetes mellitus
Sorologia positiva para HIV
Hepatopatia
29 (38,2)
2 (2,6)
2 (2,6)
Zero
1 (1,3)
Medicamentos usados para
o tratamento da EPA
AINEs
Corticoide oral
Metrotrexato
Sulfassalazina
Inibidor de anti-TNFα
63 (82,9)
34 (44,7)
26 (34,2)
1 (1,3)
1 (1,3)
Prevalência dos tipos de EPA
Espondilite anquilosante
Espondiloartrite indiferenciada
Artrite psoriásica
Artrite reativa
Artrite das doenças
inflamatórias intestinais
47 (61,8)
11 (14,5)
11 (14,5)
4 (5,3)
3 (3,9)
Manifestações clínicas articulares
e extra-articulares associadas
Entesite calcaneana
Uveíte anterior
Coxartrose
Dactilite
Fibrose pulmonar
Piúria estéril
38 (50)
29 (38,2)
21 (27,6)
9 (11,8)
1 (1,3)
1 (1,3)
EPA: espondiloartrite; HAS: hipertensão arterial sistêmica; IRC: insuficiência renal crônica;
AINEs: anti-inflamatórios não esteroidais.
Com relação ao tratamento medicamentoso, a maioria dos
pacientes estudados (82,9%) estava em uso de AINEs, em média
6,5 ± 6,2 anos, havendo uma variação no uso de zero a 29 anos.
A hematúria microscópica foi detectada nessa amostra em
pelo menos um exame de urina de rotina em 34 indivíduos
(44,7% da amostra), e em mais de uma ocasião em 22 indivíduos (28,9% dos casos). Nos pacientes com hematúria em
mais de uma ocasião, essa mostrou-se intermitente na maioria
dos casos (22,4%), ou seja, não era detectada em todos os
exames de urina. A hematúria contínua ocorreu em apenas
cinco pacientes (6,5%). A hematúria macroscópica foi menos
frequente que a micro, ocorrendo em 13 pacientes (17,1%).
Dos 24 pacientes analisados quanto à presença de dismorfismo eritrocitário, oito (10,5%) apresentaram mais de 80% das
hemácias com alterações dismórficas. Desses oito pacientes,
conseguiu-se realizar a biópsia renal em cinco, já que três se
recusaram a realizar o exame. Os resultados histopatológicos
foram: quatro (5,2%) com nefropatia por IgA e um com a
doença da membrana fina (hematúria familiar benigna). As
características dos pacientes portadores de nefropatia por IgA
estão expostas na Tabela 2.
Outras causas de hematúria encontradas, que não GNF, foram nefrolitíase (cinco pacientes (6,5%), dos quais um também
tinha nefropatia por IgA); um paciente com rim policístico e
outro paciente com hematúria de origem ginecológica, cada um
desses representando 1,3% do total. Em 20 pacientes (26%) a
etiologia da hematúria permaneceu indeterminada.
A proteinúria foi incomum na amostra estudada, sendo
detectada em apenas três pacientes (3,9%), dos quais dois com
proteinúria superior a 3,5 g em 24 horas. Esses três pacientes
também apresentavam hematúria. Não houve pessoas com
proteinúria isolada.
Tabela 2
Características dos pacientes submetidos à biópsia renal com diagnóstico de nefropatia por IgA
Pacientes
1
2
3
4
Gênero
Masculino
Masculino
Masculino
Masculino
Idade
36
43
33
44
Tipo de EPA
Artrite reativa
Espondilite anquilosante
Espondilite anquilosante
Espondilite anquilosante
Duração da EPA (anos)
16
27
9
19
HLA-B27
Positivo
Positivo
Positivo
Positivo
Creatinina (mg/dL)
1,01
2,85
0,6
0,8
Proteinúria 24 horas (mg/dL) 300
2.350
173
1.900
HAS
Não
Não
Sim
Não
EPA: espondiloartrite; HAS: hipertensão arterial sistêmica.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):412-422
419
Azevedo et al.
A presença de hematúria não esteve associada ao tipo de
EPA (P > 0,20), bem como à atividade de doença, seja aferida
pelo PCR (P = 0,954), seja pelo BASDAI (P = 0,251). Não
houve também associação entre a positividade do antígeno
HLA-B27 e a presença de hematúria (P = 0,251). Não se
encontrou associação estatisticamente significativa entre
hematúria microscópica e IRC (P = 1), HAS (P = 0,81), proteinúria (P = 0,85) e aumento dos níveis séricos de creatinina
(P = 0,40).
O uso de AINEs nessa amostra não se associou positivamente com o aumento dos níveis séricos de creatinina
(P = 0,318), nem mesmo quando se levou em consideração
seu tempo de uso (P = 0,582). Também não houve associação
estatisticamente significativa entre o uso de AINEs e a presença
de IRC (P = 0,31), hematúria (P = 1), proteinúria (P = 0,74)
e HAS (P = 1).
DISCUSSÃO
O presente trabalho avaliou a frequência das GNF nos
pacientes acometidos por EPA acompanhados no Serviço
de Reumatologia do HC/UFMG, em Belo Horizonte,
Minas Gerais.
As características clínicas dos pacientes avaliados não
diferem, em geral, do que é relatado na literatura.1,25-33 O
gênero masculino foi o mais prevalente. Houve predominância da espondilite anquilosante entre o grupo, seguida
da EPA indiferenciada e artrite psoriásica. Estudos mais
recentes mostram uma inversão dessa relação, com maior
prevalência da EPA indiferenciada com relação à espondilite
anquilosante.28 Houve maior frequência de entesite calcaneana entre as manifestações associadas, e de uveíte anterior
entre as manifestações extra-articulares. A positividade para o
HLA-B27 foi de 43,4% na população estudada. Infelizmente,
a comparação desse dado com outras populações é difícil
porque a maioria dos trabalhos avalia a frequência desse
antígeno em pacientes com espondilite anquilosante, e não
no grupo de EPA.34,35
Este estudo mostrou alta frequência de alterações no exame
de urina dos pacientes com EPA. A alteração mais comumente encontrada foi a hematúria microscópica em uma única
ocasião, que ocorreu em 34 pacientes (44,7%). Em 22 desses
pacientes (28,9%) a hematúria foi evidenciada em duas ou
mais amostras de urina, dos quais 17 (22,4%) apresentavam
hematúria intermitente, não ocorrendo em todos os exames
de urina. Hematúria contínua foi encontrada em apenas cinco
pacientes (6,5%). A alta prevalência de hematúria nessa população pode ter sido consequente à definição de hematúria usada
420
na metodologia (de duas ou mais hemácias por campo), que
privilegiou a sensibilidade do exame, pois o objetivo inicial
era triar os pacientes para a realização da sedimentoscopia
e dismorfismo eritrocitário em laboratório de referência. Na
população geral, a prevalência de qualquer hematúria (única,
intermitente ou contínua) varia de 0,18% a 16,1%; é relativamente comum no adulto e geralmente não indica a presença de
doença, sendo com frequência um achado incidental.19,36-39 Pode
ocorrer, por exemplo, como consequência de exercício físico,
de ato sexual nos dois dias precedentes à coleta da amostra e de
uso de anticoagulantes. As causas patológicas mais comuns são
anormalidades do trato urinário baixo (especialmente as que
afetam a uretra, a próstata e a bexiga). Em menos de 10% dos
casos a hematúria é de origem glomerular,19 e suas principais
etiologias são a nefropatia por IgA e a doença da membrana
fina, ou hematúria familiar benigna.40
É importante distinguir a origem da hematúria, se glomerular ou não. Na população estudada, oito (10,5%) apresentaram hematúria glomerular. Já o encontro de proteinúria foi
infrequente (3,9%) e sempre ocorreu associado à hematúria,
o que reforçou sua provável origem glomerular.
No presente trabalho a presença de hematúria não se
relacionou com o tipo de EPA, com a presença do antígeno
HLA-B27, nem com a atividade da doença. Também não houve
associação entre hematúria e presença de HAS, proteinúria e
aumento dos níveis séricos de creatinina.
A indicação da biópsia renal em pacientes com hematúria
microscópica isolada é controversa. Nos casos em que a hematúria sugere fortemente ser de origem glomerular, uma vez
pesados os riscos e benefícios individuais, somente a biópsia
renal pode levar ao diagnóstico definitivo de uma GNF.41,42
Assim, nos pacientes acometidos por EPA, em geral usuários
de AINEs e com hematúria de origem glomerular, considerou-se
justificável a realização da biópsia.
Dessa maneira, dos 76 pacientes avaliados, quatro (5,2%)
apresentaram GNF com características de glomerulopatia
proliferativa mesangial com imunodepósitos de IgA, o que
caracteriza a GNF por IgA ou doença de Berger. Entretanto,
a prevalência da GNF por IgA nos pacientes do estudo pode
ter sido subestimada, uma vez que a hematúria microscópica intermitente dificulta a pesquisa do dismorfismo e a
confirmação de origem glomerular, além de três pacientes
com suspeita de GNF terem se recusado a realizar a biópsia
renal. Esse achado contrasta com a prevalência da nefropatia
por IgA na população geral, estimada em 25 a 50 casos por
100 mil indivíduos.43,44
Há escassa literatura sobre as alterações renais em
pacientes com EPA, a maioria baseada em série de casos.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):412-422
Nefropatia por IgA em portadores de espondiloartrites acompanhados no Serviço de Reumatologia do Hospital das Clínicas da UFMG
Apesar de controversa, a maior ocorrência de GNF por IgA
nos pacientes com EPA tem sido aventada com frequência.5-7 Em 1987, Jones et al.7 avaliaram a função renal de
51 pacientes com espondilite anquilosante randomicamente
selecionados em clínicas reumatológicas. Desses, cinco pacientes (10%) tinham anormalidades persistentes (em mais
de uma ocasião) nos exames feitos para avaliar a função
renal (hematúria microscópica em todos os cinco pacientes,
diminuição da função renal e aumento da proteinúria em 24
horas em quatro destes). Nos três que foram submetidos à
biópsia renal, um tinha glomeruloesclerose segmental focal,
com imunofluorescência negativa, outro tinha nefropatia por
IgA e, por último, um tinha infiltrado celular intersticial com
fibrose e atrofia tubular e imunofluorescência e microscopia
eletrônica negativas.
No Brasil, tentou-se avaliar a frequência e a gravidade
do acometimento renal em 40 pacientes com espondilite
anquilosante acompanhados em uma clínica especializada
em reumatologia. Nessa amostra, 14 (35%) apresentaram
um ou mais sinais de envolvimento renal; nove pacientes
apresentaram hematúria, seis desses com hemácias dismórficas; quatro apresentaram microalbuminúria; dois tiveram
aumento dos níveis séricos de creatinina e quatro tiveram o
clareamento de creatinina reduzido. Não houve associação
estatística significativa entre a hematúria microscópica e
a atividade ou duração da doença, nem associação entre
a hematúria microscópica e o nível de IgA sérica. No
entanto, houve associação significativa entre a hematúria
microscópica e a diminuição do clareamento da creatinina.4
Esses pacientes não foram submetidos à biópsia renal.
Outro tipo de acometimento renal nos pacientes espondiloartríticos que tem sido mencionado é aquele advindo
do uso regular dos AINEs.3-7 Na população geral, 1% a 5%
dos pacientes desenvolvem efeitos adversos renais passíveis de intervenção médica relacionada aos AINEs. Os
problemas renais atribuídos ao uso dessas medicações são
insuficiência renal aguda, síndrome nefrótica com nefrite
intersticial, necrose papilar aguda e crônica.45 No presente
estudo, quase todos os pacientes faziam uso regular dessas
medicações (82,9%) e por tempo prolongado (média de 6,5
anos). Entretanto, não foi detectado nenhum efeito adverso
renal ao uso de AINEs nesses pacientes. Observou-se ainda
que o uso de AINEs não se associou positivamente com o
aumento dos níveis séricos de creatinina e com a presença
de hematúria, proteinúria, IRC e HAS. Isso pode ter ocorrido
devido à baixa frequência de comorbidades que predispõem
aos efeitos adversos dos AINEs nessa população, tais como
idade avançada, doença hepática, insuficiência cardíaca e
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):412-422
insuficiência renal.45 Outro motivo para esse achado seria
a prática corrente no Ambulatório de Reumatologia de se
evitar o uso de AINEs nos pacientes com presença de alguma
dessas comorbidades.
Este estudo sinaliza para a alta frequência de alterações
encontradas no exame de urina desse subgrupo de pacientes,
bem como para a alta prevalência de nefropatia por IgA.
Assim, apesar de serem necessários mais estudos sobre o
assunto para melhor esclarecimento das alterações renais
nos pacientes espondiloartríticos, a realização periódica de
exames de urina deveria ser recomendável. O diagnóstico
definitivo de GNF nesse grupo é extremamente relevante,
tendo em vista as implicações no tratamento da EPA e no
prognóstico desses pacientes.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
Dougados M, van der Linden S, Juhlin R, Huitfeldt B, Amor B, Calin A
et al. The European Spondylarthropathy Study Group preliminary
criteria for the classification of spondylarthropathy. Arthritis Rheum
1991; 34(10):1218-27.
2. Sieper J, Rudwaleit M, Baraliakos X, Brandt J, Braun J, BurgosVargas R et al. The Assessment of SpondyloArthritis international
Society (ASAS) handbook: a guide to assess spondyloarthritis. Ann
Rheum Dis 2009; 68(Supl.2):ii1-44.
3. Strobel ES, Fritschka E. Renal diseases in ankylosing spondylitis:
review of literature illustrated by case reports. Clin Rheumatol
1998; 17(6):524-30.
4. Vilar MJ, Curry SE, Ferraz MB, Sesso R, Atra E. Renal abnormalities
in ankylosing spondylitis. Scand J Rheumatol 1997; 26(1):19-23.
5. Mittal VK, Malhotra KK, Bhuyan UN, Malaviya AN. Kidney
involvement in seronegative spondarthritides. Indian J Med Res
1983; 78:670-5.
6. Wendling D, Hory B, Saint Hillier Y, Perol C. Reine et spondiloarthrite
ankylosante. Rev Rhum Mal Osteoartic 1985; 52(4):271-5.
7. Jones DW, Mansell MA, Samuell CT, Isenberg DA. Renal
abnormalities in ankylosing spondylitis. Br J Rheumatol 1987;
26(5):341-5.
8. Gupta R, Sharma A, Arora R, Dinda AK, Gupta A, Tiwari SC.
Membranous glomerulonephritis in a patient with ankylosing
spondylitis: a rare association. Clin Exp Nephrol 2009; 13(6):66770.
9. Jacquet A, Francois H, Frangie C, Yahiaoui Y, Ferlicot S, Micelli C
et al. IgA nephropathy associated with ankylosing spondylitis is not
controlled by infliximab therapy. Nephrol Dial Transplant 2009;
24(11):3540-2.
10. Agarwal S, Das SK, Kumar P, Tripathi P, Mehrotra B. Amyloidosis
in ankylosing spondylitis. J Clin Rheumatol 2009; 15(4):211.
11. Wasilewska A, Zoch-Zwierz WM, Tenderenda E, Szynaka B. IgA
nephropathy in a girl with psoriasis and seronegative arthritis. Pediatr
Dermatol 2008; 25(3):408-9.
12. Menè P, Franeta AJ, Conti G, Stoppacciaro A, Chimenz R, Fede A
et al. Extracapillary glomerulonephritis during etanercept treatment
for juvenile psoriatic arthritis. Clin Exp Rheumatol 2010; 28(1):91-3.
421
Azevedo et al.
13. Sakellariou GT, Vounotrypidis P, Berberidis C. Infliximab
treatment in two patients with psoriatic arthritis and secondary IgA
nephropathy. Clin Rheumatol 2007; 26(7):1132-3.
14. Efstratiadis G, Tsiaousis G, Leontsini M, Gionanlis L, Papagianni A,
Memmos D. Membranous glomerulonephritis complicating
ankylosing spondylitis. Clin Nephrol 2006; 66(1):75-6.
15. Matsuda M, Suzuki A, Miyagawa H, Shimizu S, Ikeda S. Coexistence
of IgA nephropathy and undifferentiated spondyloarthropathy in a
female patient. Clin Rheumatol 2006; 25(3):415-8.
16. Montenegro V, Monteiro RC. Elevation of serum IgA in
spondyloarthropathies and IgA nephropathy and its pathogenic role.
Curr Opin Rheumatol 1999; 11(4):265-72.
17. Chadban SJ, Atkins RC. Glomerulonephritis. Lancet 2005;
365(9473):1797-806.
18. Falk RJ, Jennetti JC, Nachman PH. Primary glomerular disease. In:
Brenner BM, Rector FC, Livine SA (eds.). Benner & Rectors the
Kidney. Philadelphia: WB Saunders, 2003. p. 1293-380.
19. Mariani AJ, Mariani MC, Macchioni C, Stams UK, Hariharan A,
Moriera A. The significance of adult hematuria: 1,000 hematuria
evaluations including a risk-benefit and cost-effectiveness analysis.
J Urol 1989; 141(2):350-5.
20. Fairley KF, Birch DF. Hematuria: a simple method for identifying
glomerular bleeding. Kidney Int 1982; 21(1):105-8.
21. Cohen RA, Brown RS. Clinical practice. Microscopic hematuria. N
Engl J Med 2003; 348(23):2330-8.
22. National Kidney Foundation. K/DOQI clinical practice guidelines for
chronic kidney disease: evaluation, classification, and stratification.
Am J Kidney Dis 2002; 39(2 Suppl 1):S1-266.
23. Calin A, Nakache JP, Gueguen A, Zeidler H, Mielants H, Dougados M.
Defining disease activity in ankylosing spondylitis: is a combination
of variables (Bath Ankylosing Spondylitis Disease Activity Index) an
appropriate instrument? Rheumatology (Oxford) 1999; 38(9):878-82.
24. Chobanian AV, Bakris GL, Black HR, Cushman WC, Green LA,
Izzo JL Jr. et al. The Seventh Report of the Joint National Committee
on Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood
Pressure: the JNC 7 report. JAMA 2003; 289(19):2560-72.
25. Alexeeva L, Krylov M, Vturin V, Mylov N, Erdesz S, Benevolenskaya L.
Prevalence of spondyloarthopathies and HLA-B27 in the native population
of Chukotka, Russia. J Rheumatol 1994; 21(12):2298-300.
26. Hukuda S, Minami M, Saito T, Mitsui H, Matsui N, Komatsubara Y et al.
Spondyloarthopathies in Japan: nationwide questionnaire survey
performed by Japan Ankylosing Spondylitis Society. J Rheumatol
2001; 28(3):554-9.
27. Braun J, Bollow M, Remlinger G, Eggens U, Rudwaleit M, Distler A
et al. Prevalence of spondylarthropathies in HLA-B27 positive and
negative blood donors. Arthritis Rheum 1998; 48(1):58-67.
28. Liao ZT, Pan YF, Huang JL, Huang F, Chi WJ, Zhang KX et al. An
epidemiological survey of low back pain and axial spondyloarthritis
in a Chinese Han population. Scand J Rheumatol 2009; 38(6):455-9.
422
29. Carvalho MAP, Lage RC. Espondiloartropatias. In: Carvalho MAP,
Lanna CCD, Bertolo MB (eds.). Reumatologia – diagnóstico e
tratamento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008. p. 335-63.
30. Reveille JD. HLA-B27 and seronegative spondyloarthopathies. Am
J Med Sci 1998; 316(4):239-49.
31. Hamideh F, Prete PE. Ophthalmologic manifestations of rheumatic
diseases. Semin Arthritis Rheum 2001; 30(4):217-41.
32. Sampaio-Barros PD, Bertolo MB, Kraemer MH, Neto JF, Samara AM.
Primary ankylosing spondylitis: patterns of disease a Brazilian
population of 147 patients. J Rheumatol 2001; 28(3):560-5.
33. Bomtempo CAS, Lage RC, Ferreira GA, Carvalho MAP.
Avaliação clínica, laboratorial e radiográfica de brasileiros com
espondiloartropatias. Rev Bras Reumatol 2006; 46(4):238-45.
34. Scholosstein L, Terasaki PI, Bluestone R, Pearson CM. High
association of HL-A antigen, W27, with ankylosing spondylitis. N
Engl J Med 1973; 288(14):704-6.
35. Brewerton DA, Hart FD, Nicholls A, Caffrey M, James DC,
Sturrock RD. Ankylosing spondylitis and HL-A 27. Lancet 1973;
1(7809):904-7.
36. Sutton JM. Evaluation of hematuria in adults. JAMA 1990;
263(18):2475-80.
37. Hiatt RA, Ordonez JD. Dipstick urinalysis screening, asyntomatic
microhematuria, and subsequent urological cancers in a populationbased sample. Cancer Epidemiol Biomarkers Prev 1994; 3(5):439-43.
38. Mohr DN, Offord KP, Owen RA, Melton LJ 3rd. Asymptomatic
microhematuria and urologic disease. A population-based study.
JAMA 1986; 256(2):224-9.
39. Froom P, Ribak J, Benbassat J. Significance of microhematuria in
young adults. Br Med J (Clin Res Ed) 1984; 288(6410):20-2.
40. Tiebosch AT, Frederik PM, van Breda Vriesman PJ, Mooy JM, van Rie H,
van de Wiel TW et al. Thin-basement-membrane nephropathy in
adults with persistent hematuria. N Engl J Med 1989; 320(1):14-8.
41. Cohen AH, Nast CC, Adler SG, Kopple JD. Clinical utility of kidney
biopsies in the diagnosis and management of renal disease. Am J
Nephrol 1989; 9(4):309-15.
42. Turner MW, Hutchinson TA, Barré PE, Prichard S, Jothy S. A
prospective study on the impact of the renal biopsy in clinical
management. Clin Nephrol 1986; 26(5):217-21.
43. D’Amico G. The commonest glomerulonephritis in the world: IgA
nephropathy. Q J Med 1987; 64(245):709-27.
44. Power DA, Muirhead N, Simpson JG, Nicholls AJ, Horne CH,
Catto GR et al. IgA nephropathy is not a rare disease in the United
Kingdom. Nephron 1985; 40(2):180-4.
45. Whelton A. Nephrotoxicity of nonsteroidal anti-inflammatory drugs:
physiologic foundations and clinical implications. Am J Med 1999;
106(5B):13S-24S.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):412-422
ARTIGO ORIGINAL
Prevalência de manifestações clínico-laboratoriais
e comorbidades na polimiosite segundo o gênero
Fernando Henrique Carlos de Souza1, Maurício Levy-Neto2, Samuel Katsuyuki Shinjo3
RESUMO
Objetivo: Analisar a distribuição e a influência do gênero na polimiosite (PM), quanto às manifestações clínico-laboratoriais, evolução e comorbidades. Métodos: Estudo de coorte retrospectivo, unicêntrico, em que foram avaliados 75
pacientes consecutivos com PM (Bohan e Peter, 1975) entre 1990 e 2010. Os exames complementares referem-se ao
início do diagnóstico da PM. Resultados: Este estudo avaliou 52 mulheres e 23 homens (razão 2,3:1), a maioria de cor
branca (84,0%), com média de idade de 42,7 ± 13,7 anos (16 a 67 anos), e duração média de doença de 6,9 ± 5,5 anos (0
a 20 anos). Aproximadamente 50% apresentaram recidiva da doença durante o acompanhamento, com 4,0% de óbitos.
Apesar disso, dois terços encontravam-se em remissão no desfecho do estudo. Não houve diferença entre os gêneros
quanto à distribuição das características demográficas, clínico-laboratoriais, evolução clínica e terapia medicamentosa
instituída. Com relação às comorbidades, houve alta prevalência de hipertensão arterial sistêmica (38,7%) e diabetes
mellitus (17,3%), igualmente distribuídas entre os gêneros. Verificou-se alta prevalência de depressão e fibromialgia,
porém apenas no gênero feminino. Conclusões: A prevalência de PM entre mulheres foi maior (razão 2,3:1). A prevalência de comorbidades foi alta na casuística estudada, cabendo-nos priorizar seus controles e, assim, oferecer melhor
qualidade de vida aos pacientes.
Palavras-chave: polimiosite, comorbidade, depressão, gênero e saúde, miosite.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
As doenças autoimunes sistêmicas costumam predominar em
mulheres, com incidência variando entre 2:1 a 10:1. O lúpus
eritematoso sistêmico (LES) e a síndrome de Sjögren, por
exemplo, apresentam razão 7-10:1, enquanto a artrite reumatoide (AR) e a esclerose sistêmica têm razão 2-3:1.1
O gênero masculino é considerado fator de bom prognóstico em termos de remissão em pacientes com AR em uso de
anti-TNF,2 com melhores índices nas medidas de atividade
de doença.3 Na doença de Behçet e na síndrome de Sjögren
primária, o gênero masculino encontra-se relacionado, respectivamente, a maior frequência de manifestações neurológicas4
e envolvimento pulmonar.5
A polimiosite (PM) é uma miopatia inflamatória sistêmica
crônica de causa desconhecida, que costuma afetar mais frequentemente mulheres6-8 e indivíduos entre 30 e 50 anos.8 Até
o presente momento não há estudos comparando o perfil das
manifestações da PM entre os gêneros, exceto por uma impressão geral e indireta obtida em trabalhos epidemiológicos.9,10 Por
exemplo, a doença pulmonar intersticial na PM/dermatomiosite
(DM) está associada a artrite e/ou artralgia, ao anticorpo anti-Jo-1
e ao gênero masculino.9 Chen et al.10 analisaram primariamente
os fatores preditivos de neoplasias na PM/DM, e observaram que
o gênero masculino foi fator de risco independente.
Portanto, o objetivo do presente estudo foi avaliar a distribuição e a influência do gênero na PM quanto às manifestações
clínico-laboratoriais, evolução clínica e comorbidades.
Recebido em 14/10/2010. Aprovado, após revisão, em 01/07/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse. Comitê de Ética: HC 0039/10.
Disciplina de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP.
1. Médico-Assistente do Serviço de Reumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – HC/FMUSP
2. Doutor em Medicina; Médico-Assistente do Serviço de Reumatologia do HC/FMUSP; Professor-Colaborador da Disciplina de Reumatologia da FMUSP
3. Doutor em Ciências; Médico-Assistente do Serviço de Reumatologia do HC/FMUSP; Professor-Colaborador da Disciplina de Reumatologia da FMUSP
Correspondência para: Samuel Katsuyuki Shinjo. Disciplina de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Av. Dr. Arnaldo, 455,
3° andar, Sala 3190 – Cerqueira César. CEP: 01246-903. São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected]
428
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):423-433
Prevalência de manifestações clínico-laboratoriais e comorbidades na polimiosite segundo o gênero
PACIENTES E MÉTODOS
Foram avaliados 75 pacientes consecutivos com PM provenientes da Unidade de Miopatias de nosso serviço terciário,
entre o período de 1990 e 2010. Todos os pacientes preenchiam o critério classificatório de Bohan e Peter.11,12 O estudo
foi aprovado pelo Comitê de Ética local (HC nº 0039/10), e
as informações demográficas e referentes às manifestações
clínico-laboratoriais foram obtidas dos prontuários médicos.
Os dados laboratoriais foram os solicitados de rotina, no
início do diagnóstico da PM. Creatina quinase (variação normal:
24-173 U/L), aldolase (variação normal: 1,0-7,5 U/L), aspartato
aminotransferase (até 37 U/L) e alanina aminotransferase (até
41 U/L) foram obtidas por método cinético automatizado. A
pesquisa de autoanticorpos contra componentes celulares foi
determinada por imunofluorescência indireta, utilizando células
Hep-2 como substrato; o anticorpo anti-Jo-1 foi determinado
por immunoblotting; a velocidade de hemossedimentação, por
método de Westergren; a determinação quantitativa da proteína
C-reativa foi realizada no soro através de turbidimetria. Exames
complementares (eletroneuromiografia, biópsia muscular do
bíceps – membro superior – e tomografia computadorizada do
tórax) foram solicitados de rotina nas primeiras consultas médicas. Uma vez excluídas as possibilidades de infecção e neoplasia,
a recidiva da atividade da doença foi definida como recorrência
da atividade clínico-laboratorial consequente à redução da dose
de corticosteroide e/ou suspensão de imunossupressores entre
as consultas médicas, devido à estabilidade clínica.
As comorbidades analisadas foram hipertensão arterial
sistêmica (HAS), diabetes mellitus, depressão, fibromialgia
(FM), neoplasias, infarto agudo do miocárdio (IAM) e acidente
vascular cerebral (AVC). FM foi baseada nos critérios classificatórios do American College of Rheumatology,13 e depressão
foi definida segundo Zimmerman et al.14 HAS foi baseada na V
Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial,15 e diabetes mellitus
na American Diabetes Association.
Tabela 1
Perfil demográfico, clínico e laboratorial dos pacientes com polimiosite
Todos (N = 75)
Homens (N = 23)
Mulheres (N = 52)
P
Média de idade* ± DP (anos)
42,7 ± 13,7 (16-67)
42,3 ± 14,7 (16-66)
42,9 ± 13,2 (19-67)
0,874
Tempo de doença ± DP (anos)
Duração dos sintomas ao
diagnóstico (meses)
6,9 ± 5,1 (0-20)
2,3 ± 4,4 (0-24)
6,8 ± 5,5 (1-20)
1,9 ± 2,9 (0-12)
6,9 ± 4,9 (0-20)
2,4 ± 5,0 (0-24)
0,993
0,580
Cor: branca (%)
63 (84,0)
21 (91,7)
42 (80,8)
0,323
35 (46,7)
21 (28,0)
39 (52,0)
12 (52,2)
6 (26,1)
13 (56,5)
23 (44,2)
15 (28,9)
26 (50,0)
0,618
1,000
0,626
20 (27,4)
5 (6,7)
6 (26,1)
0
14 (26,9)
5 (9,6)
1,000
0,315
22 (29,3)
21 (28,0)
49 (65,3)
33 (44,0)
59 (78,7)
3 (4,0)
6 (26,1)
7 (30,4)
15 (65,2)
9 (39,1)
17 (73,9)
1 (4,4)
16 (30,8)
14 (26,9)
34 (65,4)
24 (46,2)
42 (80,8)
2 (3,9)
0,787
0,785
1,000
0,622
0,549
1,000
38 (50,7)
12 (16,0)
12 (52,2)
3 (13,0)
26 (50,0)
9 (17,3)
0,804
0,745
4167,6 ± 4736,6
62,6 ± 61,5
186,6 ± 233,4
152,7 ± 180,5
19,7 ± 33,0
24,7 ± 20,9
5023,0 ± 5481,3
89,9 ± 89,7
187,2 ± 255,6
160,1 ± 224,7
38,8 ± 49,8
22,0 ± 20,9
3793,4 ± 4318,2
52,3 ± 42,2
186,5 ± 224,8
150,0 ± 160,8
10,1 ± 11,1
25,5 ± 20,9
0,379
0,167
0,994
0,893
0,120
0,680
7 (9,3)
13 (17,3)
2 (8,8)
6 (26,1)
5 (9,6)
7 (13,5)
1,000
0,201
Manifestação clínica
Sintomas constitucionais (%)
Acamado (%)
Envolvimento articular (%)
Envolvimento pulmonar
Dispneia (%)
Disfonia (%)
Envolvimento gastrintestinal
Disfagia (%)
Dispepsia (%)
Doença em remissão (%)
Recidiva da doença (%)
Em seguimento (%)
Óbito (%)
Autoanticorpos
Fator antinuclear (%)
Anti-Jo-1 (%)
Enzimas musculares
(início da doença)
Creatina quinase ± DP (U/L)
Aldolase ± DP (U/L)
Aspartato aminotransferase (U/L)
Alanina aminotransferase (U/L)
Proteína C-reativa (mg/L)
VHS (mm/1ª hora)
Tomografia computadorizada
Fibrose pulmonar basal (%)
Lesão em vidro-fosco (%)
*Idade quando foi realizado o diagnóstico de polimiosite.
DP: desvio-padrão; VHS: velocidade de hemossedimentação.
O valor de P refere-se a homens vs. mulheres.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):423-433
429
Souza et al.
Os resultados foram expressos em média ± desvio-padrão
(DP) ou porcentagem, sendo utilizado teste t de Student para
dados paramétricos, e de Fisher para os não paramétricos. Estes
cálculos foram realizados com o programa de computador
STATA versão 7.0 (Stata, College Station, TX, EUA), e valores
P < 0,05 foram considerados estatisticamente significativos.
RESULTADOS
Foram analisados 75 pacientes consecutivos com PM entre o
período de 1990 e 2010, com tempo de seguimento em nosso
serviço de 6,9 ± 5,5 anos, dos quais 52 eram mulheres e 23 homens, com respectiva razão 2,3:1. A maioria era branca (84,0%),
com média de idade ao diagnóstico de 42,7 ± 13,7 anos (16 a
67 anos) e duração média da doença de 6,9 ± 5,5 anos (0 a 20
anos). O tempo entre o início dos sintomas e o diagnóstico da
PM na amostragem geral foi de 2,3 ± 4,4 meses (0 a 24 meses).
As características clínico-laboratoriais dos pacientes estão apresentadas na Tabela 1. Aproximadamente metade dos pacientes
apresentou recidiva da doença durante o acompanhamento.
Apesar disso, dois terços deles encontravam-se em remissão
da doença no desfecho do presente estudo, com 4,0% de óbitos.
Como tratamento medicamentoso inicial foi usado corticosteroide (prednisona 1 mg/kg/dia, via oral, com redução gradual
em 1-2 meses após estabilidade clínica e laboratorial). Em caso
de gravidade da doença, realizou-se pulsoterapia com metilprednisolona (1 g/dia, parenteral, três dias consecutivos). Como
poupadores de corticosteroide foram utilizados azatioprina
Tabela 2
Terapia medicamentosa instituída em pacientes com polimiosite
Tratamento medicamentoso
Todos (N = 75)
Homens (N = 23)
Mulheres (N = 52)
P
Corticosteroide
Prednisona (1 mg/kg/dia) (%)
73 (100,0)
23 (100,0)
52 (100,0)
1,000
Metilprednisolona (%)
35 (46,7)
13 (56,5)
22 (42,3)
0,323
Metotrexato (%)
49 (65,3)
13 (56,5)
36 (69,2)
0,305
Azatioprina (%)
40 (53,3)
12 (52,2)
29 (53,9)
1,000
Ciclofosfamida (%)
15 (20,0)
4 (17,4)
11 (21,2)
1,000
Ciclosporina (%)
15 (20,0)
4 (17,4)
10 (19,2)
1,000
Micofenolato mofetil (%)
3 (4,0)
1 (4,4)
2 (3,9)
1,000
O valor de P refere-se a homens vs. mulheres.
Tabela 3
Comorbidades diagnosticadas após a instituição da polimiosite
Comorbidades
Todos (N = 75)
Homens (N = 23)
Mulheres (N = 52)
P
Hipertensão arterial sistêmica (%)
29 (38,7)
10 (43,5)
19 (37,3)
0,618
Pré-polimiosite (%)
18 (24,0)
5 (21,7)
13 (25,0)
1,000
Pós-polimiosite (%)
11 (14,7)
5 (21,7)
6 (11,5)
0,306
Diabetes mellitus (%)
13 (17,3)
6 (26,1)
7 (13,5)
0,201
Pré-polimiosite (%)
7 (9,3)
3 (13,0)
4 (7,7)
0,669
Pós-polimiosite (%)
6 (8,0)
3 (13,0)
3 (5,8)
0,363
Depressão major (%)
11 (14,7)
0
11 (21,2)
0,028
Fibromialgia (%)
6 (8,0)
0
6 (11,5)
0,169
Neoplasia (%)
4 (5,3)
1 (4,4)
3 (5,8)
1,000
Infarto agudo do miocárdio (%)
3 (4,0)
1 (4,4)
2 (3,9)
1,000
Acidente vascular cerebral (%)
0
0
0
1,000
O valor de P refere-se a homens vs. mulheres.
430
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):423-433
Prevalência de manifestações clínico-laboratoriais e comorbidades na polimiosite segundo o gênero
(2-3 mg/kg/dia), metotrexato (20-25 mg/semana), ciclosporina
(3-5 mg/kg/dia), micofenolato mofetil (2-3 g/dia), leflunomide
(20 mg/dia), ciclofosfamida (0,5-1,0 g/m2 de superfície corpórea), em monoterapia ou em associação, dependendo da tolerância,
efeitos colaterais e refratariedade da doença (Tabela 2). De modo
geral, todos os indivíduos receberam prednisona (1 mg/kg/dia)
e aproximadamente metade dos pacientes recebeu terapia
adicional com pulso de metilprednisolona (1 g/dia, três dias
consecutivos). O uso de ciclofosfamida parenteral foi indicado
para o acometimento pulmonar, caracterizado por progressão
da dispneia e achados de imagens compatíveis à tomografia
computadorizada. Não houve diferença entre mulheres e homens quanto à distribuição das características demográficas,
clínico-laboratoriais, evolução clínica e terapia medicamentosa
instituída (Tabelas 1 e 2).
Com relação às comorbidades (Tabela 3), depressão e FM
ocorreram apenas no gênero feminino, e apenas depressão
teve prevalência estatisticamente significativa em mulheres
(P = 0,028), com nenhuma das pacientes apresentando transtorno bipolar. Houve alta prevalência de HAS (38,7%), mesmo
antes dos sintomas e do diagnóstico da PM (24,0%); após estabelecida a miopatia, houve aumento de aproximadamente 50%
de HAS. Apresentaram diabetes mellitus 9,3% dos pacientes,
e, com o estabelecimento da PM, a ocorrência foi de 17,3%,
com a mesma distribuição em ambos os gêneros. Neoplasia
e IAM ocorreram em 5,3% e 4%, respectivamente. Dentre as
neoplasias, foram diagnosticados um caso em homem e três
em mulheres, a saber: um osteoma osteoide femoral (um ano
após o diagnóstico da PM), um carcinoma folicular tireoidiano
(um ano após a PM), um carcinoma epidermoide metastático
(três anos após a PM) e uma neoplasia renal (15 anos após a
PM), respectivamente. Não foram identificados casos de AVC.
DISCUSSÃO
O presente estudo envolveu grande casuística e avaliou
tanto a distribuição quanto a influência do gênero na PM.
Observamos predomínio do gênero feminino (2,3:1), características clínico-laboratoriais e comorbidades similares em
ambos os grupos, alta prevalência de HAS e diabetes mellitus,
com destaque à depressão major, presente apenas em mulheres.
A média de idade no início da doença, no presente trabalho,
foi de 40 anos, similar a outros trabalhos da literatura,16-33 contrastando apenas aos de Senegal e Singapura, que mostraram
médias de idade de 50 anos.24,25
De um modo geral, as doenças autoimunes tendem a
predominar no gênero feminino, inclusive nas miopatias inflamatórias idiopáticas,1,15,18-25 fato reforçado pelos dados do
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):423-433
presente estudo. O LES e a síndrome de Sjögren, por exemplo,
apresentam razões 7-10:1, enquanto AR, esclerose sistêmica e
miopatias inflamatórias idiopáticas têm razão 2,3:1.1,16,18-25 Essa
desigualdade na distribuição pode ser reflexo da influência de
hormônios sexuais endógenos e de fatores genéticos.17-24
Os dados apresentados mostram que a evolução e as características demográficas e clínico-laboratoriais da PM foram
similares em ambos os gêneros, diferente do que ocorre em
outras doenças autoimunes sistêmicas, em que o gênero pode
influenciar no curso da doença. O LES, por exemplo, tende
a apresentar prognóstico pior em homens, embora isto seja
controverso na literatura.26-29
Aproximadamente metade dos pacientes apresentava
sintomas constitucionais ou acometimento articular no
início da doença. Todos os pacientes apresentavam fraqueza muscular proximal dos quatro membros, e um quarto
estava acamado apesar do pouco tempo da instalação da
doença (cerca de dois meses). Observamos também envolvimento pulmonar (dispneia) e gastrintestinal (disfagia ou
dispepsia) em aproximadamente um terço dos pacientes,
reforçando a necessidade de avaliar os portadores de PM
não só do ponto de vista do acometimento exclusivamente
musculoesquelético.
Depressão é frequentemente presente em doenças sistêmicas crônicas como AR, por exemplo, ocorrendo em
13%-20%,30-33 enquanto em FM 33 e LES 29 está presente,
respectivamente, em 39% e 34% dos casos. Na comunidade
em geral e no antedimento primário, a depressão ocorre, respectivamente, em 2%-4% e 5%-10% dos pacientes do gênero
feminino,34 contrastando-se ao apresentado neste estudo, em
que a depressão foi vista em aproximadamente 21,2% das
mulheres. A depressão, particularmente em AR, está associada
a maior frequência de hospitalização, maior número de visitas
médicas, pior qualidade de vida, menor aderência à terapia
medicamentosa e risco aumentado de mortalidade.34-37 Ela é
duas vezes mais frequente em mulheres em comparação aos
homens,38 enquanto FM é aproximadamente dez vezes mais
prevalente.39 Nossos pacientes com depressão não tiveram
maior recidiva de doença ou de óbito. Apesar de a associação
entre depressão e FM ser relativamente comum, no presente
estudo essas duas comorbidades coexistiram apenas em
mulheres, tendo sido simultâneas em apenas uma paciente.
Houve alta prevalência de HAS e diabetes mellitus,
quando comparada com a população brasileira: 20% e
9%, respectivamente.40,41 Após o diagnóstico de PM, os
achados de HAS e de diabetes mellitus aumentaram em
50% e 100%, respectivamente, podendo refletir o uso de
corticosteroide. Recentemente, com base em banco de dados
431
Souza et al.
epidemiológicos, Limaye et al.42 demonstraram alto índice
de eventos cardiovasculares após o diagnóstico de todas
as miopatias inflamatórias idiopáticas (DM, PM e miosite
por corpúsculo de inclusão). No presente estudo ocorreram
neoplasias ao redor de 5%, sem distinção entre os gêneros,
índices semelhantes aos descritos na literatura, quais sejam,
3,3% e 7,7%.43-45
Tivemos baixa prevalência de eventos cardiovasculares
(IAM e AVC), sem distinção entre os gêneros, sendo em parte
justificada pelo curto período de tempo de acompanhamento
(aproximadamente oito anos), contrastando-se aos índices de
6%-75% descritos na literatura.46,47
Em termos evolutivos, dois terços dos pacientes encontravam-se em remissão sob corticoterapia e/ou imunossupressores. Houve recidivas em metade dos indivíduos, sem distinção
entre os gêneros, reforçando a necessidade de acompanhamento
médico regular desses pacientes. Óbito ocorreu em 4,0% dos
casos, sem distinção entre os gêneros.
Em resumo, a PM acometeu mulheres em razão 2,3:1, com
alta prevalência de comorbidades, tanto em homens como
em mulheres, com destaque à depressão major que afetou
exclusivamente o gênero feminino. Ao avaliar pacientes com
PM devemos estar atentos às comorbidades, visando ao seu
rápido controle, oferecendo, assim, melhor qualidade de vida
aos pacientes.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
432
Lockshin MD. Sex differences in autoimmune disease. Lupus 2006;
15(11):753-6.
Atzeni F, Antivalle M, Pallavicini FB, Caporali R, Bazzani C, Gorla R et al.
Predicting response to anti-TNF treatment in rheumatoid arthritis
patients. Autoimmun Rev 2009; 8(5):431-7.
Sokka T, Toloza S, Cutolo M, Kautiainen H, Makinen H, Gogus F
et al., and the QUEST-RA Group. Women, men, and rheumatoid
arthritis: analyses of disease activity, disease characteristics, and
treatments in the QUEST-RA study. Arthritis Res Ther 2009;
11(1):R7.
Ideguchi H, Suda A, Takeno M, Kirino Y, Ihata A, Ueda A et al.
Neurological manifestations of Behçet’s disease in Japan: a study
of 54 patients. J Neurol 2010; 257(6):1012-20.
Yazisiz V, Arslan G, Ozbudak IH, Turker S, Erbasan F, Avci AB et al.
Lung involvement in patients with primary Sjögren’s syndrome: what
are the predictors? Rheumatol Int 2010; 30(10):1317-24.
Callen JP. Dermatomyositis. In: Callen JP (ed.). 2 nd ed.
Dermatological signs of internal disease. Philadelphia: W.B.
Saunders; 1995. p. 13-20.
Fathi M, Lundberg IE. Interstitial lung disease in polymyositis and
dermatomyositis. Curr Opin Rheumatol 2005; 17(6):701-6.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25.
Drake LA, Dinehart SM, Farmer ER, Goltz RW, Graham GF,
Hordinsky MK et al. Guidelines of care for dermatomyositis. American
Academy of Dermatology. J Am Acad Dermatol 1996; 34(5 pt 1):824-9.
Chen YJ, Jan Wu YJ, Lin CW, Fan KW, Luo SF, Ho HH et al.
Interstitial lung disease in polymyositis and dermatomyositis. Clin
Rheumatol 2009; 28(6):639-46.
Chen YJ, Wu CY, Shen JL. Predicting factors of malignancy in
dermatomyositis and polymyositis: a case-control study. Br J
Dermatol 2001; 144(4):825-31.
Bohan A, Peter JB. Polymyositis and dermatomyositis. Pt I. N Engl
J Med 1975; 292(7):344-7.
Bohan A, Peter JB. Polymyositis and dermatomyositis. Pt II. N Engl
J Med 1975; 292(8):403-7.
Wolfe F, Clauw DJ, Fitzcharles MA, Goldenberg DL, Katz RS,
Mease P et al. The American College of Rheumatology preliminary
diagnostic criteria for fibromyalgia and measurement of symptom
severity. Arthritis Care Res 2010; 62(5):600-10.
Zimmerman M, Galione JN, Chelminski I, McGlinchey JB, Young D,
Dalrymple K et al. A simpler definition of major depressive disorder.
Psychol Med 2010; 40(3):451-7.
Sociedade Brasileira de Cardiologia – SBC; Sociedade Brasileira
de Hipertensão – SBH; Sociedade Brasileira de Nefrologia – SBN.
V Brazilian Guidelines in Arterial Hypertension. Arq Bras Cardiol
2007; 89(3):e24-79.
Toumi S, Ghnaya H, Braham A, Harrabi I, Laouani-Kechrid C,
Groupe tunisien d’étude des myosites inflammatoires. Polymyositis
and dermatomyositis in adults. Tunisian multicentre study. Rev Med
Interne 2009; 30(9):747-53.
Weitoft T. Occurrence of polymyositis in the county of Gävleborg,
Sweden. Scand J Rheumatol 1997; 26(2):104-6.
Kaipiainen-Seppänen O, Aho K. Incidence of rare systemic
rheumatic and connective tissue diseases in Finland. J Intern Med
1996; 240(2):81-4.
Araki S, Uchino M, Yoshida O. Epidemiologic study of multiple
sclerosis, myasthenia gravis and polymyositis in the city of
Kumamoto, Japan. Rinsho Shinkeigaku 1983; 23(10):838-411983;
23:838-41.
Darin M, Tulinius M. Neuromuscular disorders in childhood:
a descriptive epidemiological study from western Sweden.
Neuromuscul Disord 2000; 10(1):1-9.
Hanissian AS, Masi AT, Pitner SE, Cape CC, Medsger TA Jr.
Polymyositis and dermatomyositis in children: an epidemiologic
and clinical comparative analysis. J Rheumatol 1982; 9(3):390-4.
Mastaglia FL, Phillips BA. Idiopathic inflammatory myopathies:
epidemiology, classification, and diagnostic criteria. Rheum Dis
Clin North Am 2002; 28(4):723-41.
Flachenecker P. Epidemiology of neuroimmunological diseases. J
Neurol 2006; 253(Suppl 5):V2-8.
Koh ET, Seow A, Ong B, Ratnagopal P, Tjia H, Chng HH. Adult
onset polymyositis/dermatomyositis: clinical and laboratory features
and treatment response in 75 patients. Ann Rheum Dis 1993;
52(12):857-61.
Diallo M, Fall AK, Diallo I, Diédhiou I, Ba PS, Diagne M et al.
Dermatomyositis and polymyositis: 21 cases in Senegal. Med Trop
(Mars) 2010; 70(2):166-8.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):423-433
Prevalência de manifestações clínico-laboratoriais e comorbidades na polimiosite segundo o gênero
26. Specker C, Becker A, Lakomek HJ, Bach D, Grabensee B. Systemic
lupus erythematosus in men – a different prognosis? J Rheumatol
1994; 53(6):339-45.
27. Miller MH, Urowitz MB, Gladman DD, Killinger DW. Systemic
lupus erythematosus in males. Medicine (Baltimore) 1983;
62(5):327-34.
28. Molina JF, Drenkard C, Molina J, Cardiel MH, Uribe O, Anaya JM
et al. Systemic lupus erythematosus in males. A study of 107 Latin
American patients. Medicine (Baltimore) 1996; 75(3):124-30.
29. Garcia MA, Marcos JC, Marcos AI, Pons-Estel BA, Wojdyla D,
Arturi A et al. Male systemic lupus erythematosus in a LatinAmerican inception cohort of 1214 patients. Lupus 2005; 14(12):93846.
30. Hyrich K, Symmons D, Watson K, Silman A, BSRBR Control Centre
Consortium, British Society for Rheumatology Biologics Register.
Baseline comorbidity levels in biologic and standard DMARD
treated patients with rheumatoid arthritis: results from a national
patient register. Ann Rheum Dis 2006; 65(7):895-8.
31. Kellner H. Rheumatoid arthritis and depression. MMW Fortschr
Med 2009; 151(51-52):49.
32. Katz PP, Yelin EH. Prevalence and correlates of depressive
symptoms among persons with rheumatoid arthritis. J Rheumatol
1993; 20(5):790-6.
33. Wolfe F, Michaud K, Li T, Katz RS. Chronic conditions and health
problems in rheumatic diseases: comparisons with rheumatoid
arthritis, noninflammatory rheumatic disorders, systemic lupus
erythematosus, and fibromyalgia. J Rheumatol 2010; 37(2):305-15.
34. Katon W, Schulberg H. Epidemiology of depression in primary care.
Gen Hosp Psychiatry 1992; 14(4):237-42.
35. Julian LJ, Yelin E, Yazdany J, Panopalis P, Trupin L, Criswell LA
et al. Depression, medication adherence, and service utilization in
systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum 2009; 61(2):240-6.
36. McNamara D. Depression interferes with anti-TNF therapy.
Rheumatol News 2007; 6:1.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):423-433
37. Ang DC, Choi H, Kroenke K, Wolfe F. Comorbid depression is an
independent risk factor for mortality in patients with rheumatoid
arthritis. J Rheumatol 2005; 32(6):1013-9.
38. Marcus SM, Young EA, Kerber KB, Kornstein S, Farabaugh AH,
Mitchell J et al. Gender differences in depression: findings from the
STAR*D study. J Affect Disord 2005; 87(2-3):141-50.
39. White KP, Harth M. Classification, epidemiology, and natural history
of fibromyalgia. Curr Pain Headache Rep 2001; 5(4):320-9.
40. Passos VMA, Assis TD, Barreto SM. Hypertension in Brazil:
estimates from population-based prevalence studies. Epidemiol
Serviços Saúde 2006; 15:35-45.
41. Goldenberg P, Schenkman S, Franco LJ. Prevalência de diabetes
mellitus: diferenças de gênero e igualdade entre os sexos. Rev Bras
Epidemiol 2003; 6(1):18-28.
42. Limaye VS, Lester S, Blumbergs P, Roberts-Thomson PJ. Idiopathic
inflammatory myositis is associated with a high incidence of
hypertension and diabetes mellitus. Int J Rheum Dis 2010; 13(2):132-7.
43. Sigurgeirsson B, Lindelöf B, Edhag O, Allander E. Risk of cancer in
patients with dermatomyositis or polymyositis. A population-based
study. N Engl J Med 1992; 326(6):363-7.
44. Maoz CR, Langevitz P, Livneh A, Blumstein Z, Sadeh M, Bank I et
al. High incidence of malignancies in patients with dermatomyositis
and polymyositis: an 11-year analysis. Semin Arthritis Rheum 1998;
27(5):319-24.
45. Chen YJ, Wu CY, Shen JL. Predicting factors of malignancy in
dermatomyositis and polymyositis: a case-control study. Br J
Dermatol 2001; 144(4):825-31.
46. Gonzales-Lopes L, Gamez-Nava JI, Sanchez L, Rosas E,
Suarez-Almazor M, Cardona-Muñoz C et al. Cardiac manifestations
in dermato-polymyositis. Clin Exp Rheumatol 1996; 14(4):373-9.
47. Lundberg IE. The heart in dermatomyositis and polymyositis.
Rheumatol (Oxford) 2006; 45(Suppl 4):iv18-21.
433
ARTIGO ORIGINAL
Efeito imediato da utilização da joelheira
elástica em indivíduos com osteoartrite
Flavio Fernandes Bryk1, Julio Fernandes de Jesus2, Thiago Yukio Fukuda3,
Esdras Gonçalves Moreira4, Freddy Beretta Marcondes5, Marcio Guimarães dos Santos6
RESUMO
Introdução: A osteoartrite (OA) de joelho normalmente ocasiona dificuldades na realização de diversas atividades
rotineiras, sendo um dos principais motivos de procura por serviços médicos e fisioterapêuticos. Existem diversas
modalidades de tratamento, com resultados variados. A utilização da joelheira como recurso adjunto tem-se mostrado
controversa na literatura. Objetivo: Analisar a eficácia imediata da joelheira elástica na dor e na capacidade funcional
em indivíduos com OA de joelho. Métodos: Foram analisados 74 sujeitos sintomáticos (132 joelhos) com OA de joelho por meio dos testes Stair Climb Power Test (SCPT), Timed Up and Go (TUG) e Caminhada de 8 Metros (C8M),
além da escala visual analógica (EVA) para dor. Os testes foram realizados com e sem joelheira; a ordem e a presença
ou ausência das joelheiras durante os testes foram randomizadas e com avaliador cego. Resultados: Foi encontrada
diferença estatisticamente significante entre as duas situações comparadas (com e sem joelheira) para EVA (P < 0,001),
mostrando redução da dor com a joelheira. Análises com os três testes funcionais em ambas as condições foram realizadas, resultando diferenças estatisticamente significantes para os testes C8M e TUG (P < 0,05), mas não no SCPT
(P > 0,1339). Conclusão: A joelheira elástica foi eficiente na melhora imediata da capacidade funcional e da dor em
indivíduos com OA de joelho, pois melhorou o desempenho durante os testes propostos. Sendo assim, entende-se que
se trata de um recurso coadjuvante para o tratamento da OAJ por ser prático, útil, de fácil emprego clínico e que pode
auxiliar e/ou facilitar a realização de exercícios terapêuticos.
Palavras-chave: osteoartrite, articulação do joelho, reabilitação, instabilidade articular.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
A osteoartrite (OA) do joelho é um dos principais motivos de
procura por serviços médicos e fisioterapêuticos, e sua prevalência vem aumentando com o envelhecimento populacional.1
Os sinais e sintomas clínicos, em geral, são semelhantes e
apresentam-se como dor, rigidez, instabilidade articular, edema
e fraqueza muscular, que acarretam diminuição de habilidades
funcionais como levantar de cadeiras, subir escadas, ajoelhar-se,
ficar em pé e andar, além de aumentar a suscetibilidade de
quedas.2
Diversas formas de tratamento para OA são encontradas
na literatura, porém as não farmacológicas e não cirúrgicas
empregadas na fisioterapia são consideradas e recomendadas
como primeira linha de tratamento para a tentativa de solucionar esse problema.3
Recebido em 30/11/2010. Aprovado, após revisão, em 01/07/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse. Comitê de Ética: 281/09.
Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo e Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Diadema – Quarteirão da Saúde.
1. Fisioterapeuta; Mestrando em Ciências do Movimento Humano pela Universidade Cruzeiro do Sul – UNICSUL; Professor Titular do Curso de Especialização
em Fisioterapia Músculo Esquelética (FME) da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo – ISCMSP
2. Fisioterapeuta; Mestrando em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP
3. Fisioterapeuta; Doutor em Ciências pela UNIFESP; Professor Titular do Curso de FME da ISCMSP e do Curso de Graduação em Fisioterapia do Centro
Universitário São Camilo – CUSC
4. Fisioterapeuta pela Universidade Bandeirante de São Paulo – UNIBAN
5. Fisioterapeuta; Mestrando em Ciências pela Universidade Federal de Campinas – UNICAMP; Fisioterapeuta do Instituto Wilson Mello, Campinas/SP
6. Fisioterapeuta; Especialista em FME pela ISCMSP; Fisioterapeuta da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Diadema – Quarteirão da Saúde (ISCMD-QS)
Correspondência para: Marcio Guimarães dos Santos. Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Diadema – Quarteirão da Saúde – Setor de Fisioterapia.
Av. Antônio Piranga, 578 – Centro. CEP: 09911-160. Diadema, SP, Brasil. Telefone: +55 11 4043-8000. E-mail: [email protected]
440
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):434-446
Efeito imediato da utilização da joelheira elástica em indivíduos com osteoartrite
Dentre esses recursos destacam-se os exercícios aeróbicos e os
de fortalecimento muscular, por estarem relacionados com melhora
da dor e da função nos indivíduos portadores de OA nos joelhos.4
Entretanto, devido às limitações funcionais causadas
pelo quadro de fraqueza muscular e dor, a prescrição desses
exercícios é limitada por dificuldades técnicas, e muitas vezes
esses recursos tornam-se desinteressantes, dolorosos e consequentemente ineficazes.4
Na tentativa de minimizar o quadro álgico, outras modalidades terapêuticas, tais como eletroestimulação neuromuscular
(EENM),5 algumas formas de terapia manual,3 protocolos de
aplicação de termoterapia e crioterapia, além da utilização de joelheiras e taping,6,7 são associadas ao tratamento da OA nos joelhos.
Porém, com exceção da joelheira, todos esses recursos
dependem da perícia técnica do fisioterapeuta para sua aplicação. Dessa forma, a joelheira poderia ser um recurso prático
e de autoutilização para o controle do quadro álgico durante a
realização dos exercícios, tornando-os mais eficazes. Existem
relatos na literatura que evidenciam a melhora do senso de
posição articular, dor, rigidez e função com a aplicação da
joelheira em indivíduos com OA nos joelhos.6,8
Sendo assim, este estudo teve como objetivo investigar a
eficácia imediata da joelheira elástica na dor e na capacidade
funcional em indivíduos portadores de OA nos joelhos, visando à sua importância clínica como coadjuvante durante a
realização do tratamento baseado em exercícios. A hipótese é
que a joelheira poderia diminuir a dor e melhorar a capacidade
funcional durante os testes propostos.
MÉTODOS
Este foi um estudo randomizado e com avaliador cego, realizado no Setor de Reabilitação da Irmandade da Santa Casa
de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP), em parceria com
a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Diadema –
Quarteirão da Saúde (ISCMD-QS).
Antes da coleta dos dados todos os pacientes foram informados sobre os procedimentos que seriam realizados, e
assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido,
de acordo com a resolução 196/96 do Conselho Nacional de
Saúde, declarando participação voluntária neste estudo. Foi
obtida também a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa
da ISCMSP (Projeto n° 281/09).
Critérios de inclusão e exclusão
Todos os participantes do estudo foram encaminhados ao
Setor de Fisioterapia com diagnóstico de OA nos joelhos
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):434-446
após consulta com ortopedista. Para inclusão na pesquisa era
necessário que os pacientes apresentassem no mínimo quatro
itens dos critérios clínicos da classificação de OA de joelho,
segundo o American College of Rheumatology.9 Outro critério de inclusão foi dor acima de três pontos na escala visual
analógica (EVA) durante a atividade de subir e descer escadas.
Indivíduos com comprometimento neurológico, fibromialgia, artrite reumatoide, prótese total e/ou parcial de joelhos ou
quadris, cardiopatas descompensados, deficientes auditivos e
visuais e pacientes que não conseguissem realizar os testes
propostos foram excluídos.
Sujeitos
Foram selecionados 80 indivíduos de ambos os gêneros para
coleta de dados. Dentre estes, apenas os dados de 74 indivíduos
foram incluídos, totalizando 132 joelhos, pois conseguiram
completar a execução dos testes propostos. Os seguintes itens
foram avaliados: idade, peso, altura, índice de massa corporal
(IMC), tempo de dor nos joelhos (em anos), tamanho da joelheira e se o acometimento era unilateral ou bilateral.
Joelheiras
Foram utilizadas joelheiras elásticas sem orifícios (Tensor® –
Registro ANVISA/MS – 80017170005), por gerarem compressão
aos tecidos aumentando a área de contato, promovendo, assim,
menor pressão e diminuindo a dor na articulação do joelho.10
De acordo com o fabricante, as joelheiras eram de três
tamanhos diferentes: pequeno (P), médio (M) e grande (G). A
escolha do tamanho foi definida pela circunferência do joelho:
tamanho P de 32 a 35 cm, M de 35 a 39 cm e G de 39 a 44 cm.
Portanto, antes da escolha do tamanho da joelheira realizou-se
a perimetria no joelho do indivíduo, tomando como parâmetro
anatômico o ápice da patela; caso a circunferência do joelho
fosse uma medida entre dois tamanhos, optou-se pelo menor.
A colocação da joelheira foi realizada de acordo com as
instruções do fabricante, que determina o posicionamento
centralizado no joelho acometido permitindo movimentação
de maneira confortável.
Testes funcionais e escala de dor
Foi utilizada a EVA para quantificar a dor dos indivíduos durante as avaliações do Stair Climb Power Test (SCPT),11 uma
vez que esta escala é considerada instrumento válido para tal
finalidade.12,13 A mesma era composta de um número inicial (0)
posicionado no extremo esquerdo da linha, indicando ausência
de qualquer sintoma de dor. Este, por sua vez, estava unido
441
Bryk et al.
por uma linha de 10 cm de comprimento ao número final (10),
posicionado no extremo direito da linha, representando a pior
dor possível. Não houve graduação na linha para não afetar
a fidedignidade da mensuração, caso contrário o indivíduo
avaliado poderia sentir-se induzido a indicar valores que não
representariam sua real condição.
O SCPT foi utilizado para se obter informações referentes
a atividades funcionais complexas, de maior sobrecarga e
dificuldade para os indivíduos.
Para a realização do teste, os indivíduos foram posicionados em frente a um lance de escadas, com cinco degraus de
165 cm de largura total, 26,5 cm de comprimento e 17 cm de
altura, demarcados com fitas adesivas para delimitar a área
que o indivíduo deveria ocupar durante a subida e descida dos
degraus (40 cm).
Foi solicitado que o indivíduo subisse, virasse e descesse
os cinco degraus, sem segurar no corrimão, da forma mais
rápida e segura possível para evitar quedas. Em seguida, este
assinalava a EVA para quantificar o nível de dor apresentado
durante a realização do teste.
O SCPT foi cronometrado, sendo disparado o cronômetro
no comando verbal “já” (de “1, 2, 3 e já”), que também era
o comando de início do teste, e parado somente quando o
indivíduo avaliado estivesse com os dois pés fora da escada.
O teste Timed Up and Go (TUG) foi utilizado por ser um
teste funcional amplamente realizado para mensurar a mobilidade básica de idosos. Nele, o indivíduo avaliado inicia da
posição sentado em uma cadeira, levanta-se, anda três metros,
faz a volta em um cone para retornar, anda mais três metros
de volta para a cadeira e senta-se novamente.14 O teste foi
cronometrado, e o paciente foi instruído a dar início quando
o avaliador emitisse o comando verbal “já” (de “1, 2, 3 e já”).
Utilizou-se também o teste de Caminhada de 8 Metros
(C8M), cronometrando-se o tempo de realização. O indivíduo
avaliado foi posicionado sobre uma marca inicial e realizava o
teste da forma mais rápida e segura possível, quando o avaliador
emitia o comando verbal “já” (de “1, 2, 3 e já”). O cronômetro
foi disparado pelo avaliador no “já” e interrompido assim que o
indivíduo cruzasse a marca final dos 8 metros. Ressalta-se que o
avaliador encontrava-se posicionado no marco final do percurso.15
Procedimentos
A coleta dos dados foi realizada por dois avaliadores
(Avaliador 1 e Avaliador 2). O Avaliador 1 era responsável pela randomização da sequência dos testes, ordem da
utilização das joelheiras (com ou sem), bem como por sua
ocultação, e a escolha do tamanho de joelheira (perimetria).
442
O Avaliador 2 (“cego”) era responsável pela aplicação dos
testes propostos.
A realização dos testes foi dividida em duas etapas (com
e sem joelheira), e cada uma consistia na execução do TUG,
C8M e SCPT com preenchimento da EVA ao final do SCPT.
Durante a execução das duas etapas os indivíduos estavam com uma capa para ocultar o uso da joelheira (Figura 1),
assim o Avaliador 2 não teria como saber em qual das etapas
da avaliação o paciente estaria com a joelheira. Todos os pacientes eram orientados a não revelar se estavam usando ou
não a joelheira.
Antes do início das avaliações os participantes realizaram
uma vez os testes propostos, para aprendizado. Foi permitida
também uma pausa de cinco minutos entre as etapas da avaliação
para não haver fadiga excessiva, devido à idade e intensidade
da dor da maioria dos pacientes. Após a execução da primeira
etapa dos testes, o paciente retornava ao Avaliador 1 para que
este retirasse ou colocasse a joelheira, e, após ocultar essa situação com a capa, era novamente encaminhado ao Avaliador 2
para realizar a segunda etapa dos testes. A sequência de testes
da etapa inicial era também reproduzida na etapa final.
Figura 1
Demonstração da capa para ocultar a joelheira utilizada em
todos os testes.
Análise dos dados
Após as coletas, foi utilizado o programa estatístico Graph
Pad para processamento dos dados. A princípio foi realizado
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):434-446
Efeito imediato da utilização da joelheira elástica em indivíduos com osteoartrite
RESULTADOS
A Tabela 1 demonstra os dados demográficos referentes aos
74 indivíduos incluídos neste estudo. A média de idade da
amostra foi de 58 ± 9,7 anos, e 78% dos casos apresentavam
acometimento bilateral. O maior número de indivíduos foi do
gênero feminino (73%).
A média obtida com a EVA durante o teste SCPT para o
joelho dominante e o não dominante foi comparada para as
duas circunstâncias (com e sem joelheira). Como não foi encontrada diferença estatisticamente significante entre os dois
joelhos (P > 0,05 – Tabela 2), as médias dos dados referentes
Tabela 1
Dados demográficos dos pacientes com
OA nos joelhos (média ± DP e %)
Peso (kg)
76 (± 14)
Altura (m)
1,63 (± 0,1)
6,0
5,5
5,0
4,5
4,0
3,5
3,0
2,5
2,0
Índice de massa corporal (IMC)
24 (± 5)
Idade
58 (± 9,7)
História de dor no joelho (anos)
6 (± 6)
Número de joelhos
132
Acometimento unilateral
22%
Acometimento bilateral
78%
Gênero
Masculino
Feminino
27%
73%
Tamanho da joelheira
Pequena
Média
Grande
8%
42%
50%
Tabela 2
Média (± DP) do valor da EVA sem e com joelheira
para o joelho dominante e não dominante
Com joelheira
Dominante
Não dominante
Dominante
Não dominante
5 (± 3)
6 (± 3)
4 (± 3)
5 (± 3)
Com joelheira
Figura 2
Diferença dos valores (média ± EPM) da EVA durante SCPT
sem e com joelheira.
*Demonstra diferença significativa entre as duas circunstâncias.
10
Média de tempo em segundos
74
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):434-446
* P < 0,0001
Sem joelheira
Total de pacientes
Sem joelheira
aos joelhos dominante e não dominante foram somadas e uma
nova média foi encontrada. Dessa forma, a análise comparativa
para a EVA foi realizada somente entre os grupos sem joelheira
e com joelheira.
Após a análise inicial, comparou-se a EVA do grupo sem
joelheira e do grupo com joelheira, tendo sido encontrada diferença estatisticamente significante (P < 0,001) entre as duas
circunstâncias (Figura 2).
Por último, foram realizadas análises para os três testes funcionais em ambas as condições (sem joelheira e com joelheira),
em que se observou diferença estatisticamente significante para
os testes C8M e TUG (P < 0,05), mostrando melhor desempenho
no grupo com joelheira (Figura 3). Não se pôde observar, porém,
essa mesma diferença para o SCPT (P > 0,1339).
Média da EVA durante SCPT
o teste Kolmogorov-Smirnov (K-S) com correção pelo teste
de Lilliefors para verificação da normalidade dos dados,
em que foi considerado um nível de significância de 95%.
Inicialmente, optou-se por uma análise com o teste de MannWhitney (não pareado), para comparar o joelho dominante
com o não dominante na EVA durante o teste SCPT, com e
sem joelheira. Depois realizou-se o teste de Wilcoxon (pareado)
para comparar os testes SCPT, EVA, TUG e C8M durante as
duas circunstâncias.
Sem joelheira
Com joelheira
* P < 0,0255
9
8
* P < 0,0206
7
6
5
4
C8M
TUG
Figura 3
Diferença dos valores (média ± EPM) do teste C8M e TUG
sem e com joelheira.
*Demonstra diferença significativa entre as duas circunstâncias.
443
Bryk et al.
DISCUSSÃO
Este foi um estudo randomizado e com avaliador “cego”, com
o objetivo de avaliar o efeito imediato do uso da joelheira elástica na dor e na capacidade funcional de indivíduos com OA
nos joelhos. Com base nos resultados do presente estudo, foi
possível observar melhora estatística da dor e da capacidade
funcional durante o uso da joelheira nos testes propostos.
Estudos mostram que as joelheiras podem favorecer os
indivíduos com uma acuidade proprioceptiva ruim, podendo
prevenir entorses e, consequentemente, quedas.10,16 Existem
evidências de que estímulos cutâneos adicionais gerados pelas
joelheiras ao redor da articulação podem aumentar o senso de
posição articular, favorecendo o equilíbrio e o controle estático
e dinâmico do joelho, proporcionando, assim, mais segurança
para o indivíduo durante suas atividades do dia a dia.17,18
Por outro lado, há também teorias de que os mecanoceptores cutâneos fornecem informações ao córtex cerebral sobre
movimentos articulares do joelho, e que os efeitos estabilizadores das bandagens e suportes em grandes articulações ocorrem
devido ao estímulo somatossensorial na pele.19
Os testes C8M e TUG aplicados neste estudo demonstraram melhora na capacidade funcional dos indivíduos durante
a utilização da joelheira. Esses testes foram escolhidos com
o intuito de simular e mimetizar as atividades realizadas rotineiramente por indivíduos com OA de joelho, que apresentam
como sinais e sintomas dor, inflamação, limitação da amplitude
de movimento e rigidez articular, o que influencia na realização
de atividades funcionais.1
Sabendo desses e de outros déficits, como comprometimentos na cápsula articular e seus mecanoceptores no desempenho
neuromuscular, diminuição no senso de posição articular e propriocepção, e tendo sempre como objetivo principal aliviar os
sintomas desses indivíduos, diversas formas de terapias podem
ser empregadas. Porém, um método simples e eficaz, como é
o caso das joelheiras elásticas, ainda não foi bem estabelecido
na literatura.1,2,10,16
Bockrath et al.20 argumentaram que estímulos táteis constantes sobre a pele dos joelhos (como durante a utilização de
bandagens) podem provocar uma inibição neural, facilitando
a entrada de impulsos pelas grandes fibras aferentes e, consequentemente, reduzindo a dor; porém, não se sabe ao certo
quanto tempo esse efeito demora para ocorrer e tampouco qual
a duração do mesmo.
Apesar do conhecimento de alguns mecanismos antálgicos
propostos nesses diversos estudos, somente um estudo anterior avaliou os efeitos da joelheira elástica na dor e função
em pacientes com OA, porém a comparação foi realizada
444
entre os efeitos das joelheiras que retêm calor e joelheiras
que não possuem essa propriedade. Uma redução de 16% na
dor foi observada em curto prazo, sem diferença estatística
entre ambas as joelheiras. Entretanto, houve uma tendência
a favor da joelheira que retém o calor, podendo esta ser mais
eficaz.6 Mesmo conhecendo esse resultado, optou-se pela
utilização da joelheira elástica sem retenção de calor neste
estudo, para avaliar simplesmente a compressão executada
pela joelheira, sem a presença de nenhum outro mecanismo
que pudesse promover ou auxiliar na promoção da redução
dos sintomas.
O uso das bandagens femoropatelares para alívio da dor
também pode ser aplicado ao uso das joelheiras, por estas
distribuírem melhor a área de contato e diminuírem a pressão
sobre a articulação,21 reduzindo assim a dor por melhor equilíbrio biomecânico entre as estruturas. Sabe-se que essas duas
grandezas físicas são inversamente proporcionais, e quanto
maior for a área de contato, menor será a pressão exercida em
determinada região. Ainda nesse contexto, ocorreria também
uma compressão do compartimento extensor, diminuindo a
pressão sobre a gordura de Hoffa, que está frequentemente
inflamada na OA do joelho, reduzindo a dor.22
Dentre todas as hipóteses levantadas anteriormente,
acredita-se que o equilíbrio biomecânico por meio da melhora
da área de contato da articulação e, consequentemente, menor
pressão no mecanismo extensor, justifica os dados obtidos neste
estudo. Estes demonstram que a joelheira elástica utilizada
durante os testes funcionais (TUG e C8M) favoreceu melhora
da capacidade funcional e redução significante da pontuação
pela EVA durante o SCPT. Apenas esse teste não apresentou
diferença estatística no tempo de execução da tarefa entre as
duas circunstâncias analisadas. Porém, ressalta-se que os indivíduos foram orientados a realizar o SCPT em sua maneira
habitual e de forma segura para que não houvesse risco de
queda, tendo o intuito maior de avaliar o grau da EVA.
Com isso, pôde-se observar melhora funcional estatisticamente superior à não utilização da joelheira durante a realização dos mesmos testes funcionais, avaliados nos mesmos
pacientes e de forma randomizada.
Existem relatos que apresentam pequena redução na
dor do joelho osteoartrítico utilizando bandagens elásticas
ajustadas frouxamente ao redor do joelho, e também com o
uso de joelheiras mais complexas que geram uma força em
valgo nos joelhos com OA do compartimento tibiofemoral
medial. Porém, esses dispositivos não são métodos simples
de terapia, pois dependem de certa perícia técnica para serem
utilizados, característica inversa à das joelheiras elásticas, que
possuem a facilidade de serem aplicadas e retiradas de forma
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):434-446
Efeito imediato da utilização da joelheira elástica em indivíduos com osteoartrite
simples, pois não requerem conhecimentos específicos para
sua aplicação.23,24
Assim, o uso da joelheira pode ser efetivo durante atividades estáticas e dinâmicas. No presente estudo foi possível
observar melhora da capacidade funcional e da dor durante
o uso imediato das joelheiras elásticas, mostrando que este
pode ser um importante recurso para auxiliar no processo de
reabilitação física do paciente que sofre de OA. Tal recurso não
pode ser utilizado como única forma de tratamento, devendo
ser associado a outras estratégias terapêuticas como emprego
de exercícios terapêuticos,25,26 aplicação de laser de baixa intensidade,27 ondas curtas pulsadas28 e também à utilização de
tratamentos medicamentosos,29 como a viscossuplementação.30
Uma das limitações deste estudo é que não foi possível
acessar os exames radiográficos dos indivíduos estudados,
impossibilitando a realização de uma associação entre os
resultados obtidos e o grau de comprometimento articular. A
joelheira pode ser eficaz nos casos dos pacientes que desejam
realizar atividades que desencadeiem os sintomas álgicos,
como em alguns exercícios físicos. Contudo, como a OA de
joelho é uma doença crônica, mais estudos devem ser realizados para avaliar o uso das joelheiras elásticas a longo prazo, e
também a comparação destas com as joelheiras de neoprene.
CONCLUSÃO
Com base nos achados do presente estudo, observou-se que a
joelheira elástica foi eficiente para melhora imediata da capacidade funcional e da dor em indivíduos com OA nos joelhos,
pois melhorou o desempenho durante os testes propostos.
Sendo assim, conclui-se que se trata de um recurso coadjuvante
para o tratamento da OA do joelho por ser prático, útil e de fácil
emprego clínico, que pode auxiliar e/ou facilitar na realização
de exercícios terapêuticos.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
4.
Barker K, Lamb SE, Toye F, Jackson S, Barrington S. Association
between radiographic joint space narrowing, function, pain and
muscle power in severe osteoarthritis of the knee. Clin Rehabil
2004; 18(7):793-800.
Røgind H, Bibow-Nielsen B, Jensen B, Møller HC, Frimodt-Møller H,
Bliddal H. The effects of a physical training program on patients
with osteoarthritis of the knees. Arch Phys Med Rehabil 1998;
79(11):1421-7.
Abbott JH, Robertson MC, McKenzie JE, Baxter GD, Theis JC,
Campbell AJ; and the MOA Trial team. Exercise therapy, manual
therapy, or both, for osteoarthritis of the hip or knee: a factorial
randomised controlled trial protocol. Trials 2009; 10:11.
Bennell KL, Hinman RS. A review of the clinical evidence for exercise
in osteoarthritis of the hip and knee. J Sci Med Sport 2011; 14(1):4-9.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):434-446
18.
19.
20.
21.
22.
23.
Kocaman O, Koyuncu H, Dinç A, Toros H, Karamehmeto SS. The
comparison of the effects of electrical stimulation and exercise in
the treatment of knee osteoarthritis. Turk J Phys Med Rehab 2008;
54:54-8.
Mazzuca SA, Page MC, Meldrum RD, Brandt KD, Petty-Saphon S.
Pilot study of the effects of a heat-retaining knee sleeve on joint pain,
stiffness, and function in patients with knee osteoarthritis. Arthritis
Rheum 2004; 51(5):716-21.
Quilty B, Tucker M, Campbell R, Dieppe P. Physiotherapy, including
quadriceps exercises and patellar taping, for knee osteoarthritis
with predominant patellofemoral joint involvement: randomized
controlled trial. J Rheumatol 2003; 30(6):1311-7.
Tiggelen DV, Coorevits P, Witvrouw E. The effects of a neoprene
knee sleeve on subjects with a poor versus good joint position sense
subjected to an isokinetic fatigue protocol. Clin J Sport Med 2008;
18(3):259-65.
Altman R, Asch E, Bloch D, Bole G, Borenstein D, Brandt K et al.
Development of the criteria for the classification and reporting of
osteoarthritis. Classification of osteoarthritis of the knee. Diagnostic
and Therapeutic Criteria Committee of the American Rheumatism
Association. Arthritis Rheum 1986; 29(8):1039-49.
Powers CM, Ward SR, Chen YJ, Chan LD, Terk MR. The effect of
bracing on patellofemoral joint stress during free and fast walking.
Am J Sports Med 2004; 32(1):224-31.
Bean JF, Kiely DK, LaRose S, Alian J, Frontera WR. Is stair climb
power a clinically relevant measure of leg power impairments in
at-risk older adults? Arch Phys Med Rehabil 2007; 88(5):604-9.
Price DD, McGrath PA, Rafii A, Buckingham B. The validation
of visual analogue scales as ratio scale measures for chronic and
experimental pain. Pain 1983; 17(1):45-56.
Cheing GL, Tsui AY, Lo SK, Hui-Chan CW. Optimal stimulation
duration of TENS in the management of osteoarthritic knee pain. J
Rehabil Med 2003; 35(2):62-8.
Gan N, Large J, Basic D, Jennings N. The Timed Up and Go Test
does not predict length of stay on an acute geriatric ward. Aust J
Physiother 2006; 52(2):141-4.
Fransen M, Crosbie J, Edmonds J. Reliability of gait measurements in
people with osteoarthritis of the knee. Phys Ther 1997; 77(9):944-53.
Sharma L, Pai YC. Impaired proprioception and osteoarthritis. Curr
Opin Rheumatol 1997; 9(3):253-8.
Barrett DS, Cobb AG, Bentley G. Joint proprioception in normal,
osteoarthritic, and replaced knees. J Bone Joint Surg Br 1991;
73(1):53-6.
Chuang SH, Huang MH, Chen TW, Weng MC, Liu CW, Chen CH.
Effect of knee sleeve on static and dynamic balance in patients with
knee osteoarthritis. Kaohsiung J Med Sci 2007; 23(8):405-11.
Edin B. Cutaneous afferents provide information about knee joint
movements in humans. J Physiol 2001; 531(Pt1):289-97.
Bockrath K, Wooden C, Worrell T, Ingersoll CD, Farr J. Effects of
patella taping on patella position and perceived pain. Med Sci Sports
Exerc 1993; 25(9):989-92.
McConnell J. Management of patellofemoral problems. Man Ther
1996; 1(2):60-6.
Duri ZA, Aichroth PM, Dowd G. The fat pad. Clinical observations.
Am J Knee Surg 1996; 9(2):55-66.
Pollo FE, Otis JC, Backus SI, Warren RF, Wickiewicz TL. Reduction
of medial compartment loads with valgus bracing of the osteoarthritic
knee. Am J Sports Med 2002; 30(3):414-21.
445
Bryk et al.
24. Hassan BS, Mockett S, Doherty M. Influence of an elastic bandage
on knee pain, proprioception, and postural sway in subjects with
knee osteoarthritis. Ann Rheum Dis 2002; 61(1):24-8.
25. Fransen M, McConnell S. Exercise for osteoarthritis of the knee.
Cochrane Database Syst Rev 2008; (4):CD004376.
26. Stevens JE, Mizner RL, Snyder-Mackler L. Quadriceps strength
and volitional activation before and after total knee arthroplasty for
osteoarthritis. J Orthop Res 2003; 21(5):775-9.
27. Bjordal JM, Johnson MI, Lopes-Martins RA, Bogen B, Chow R,
Ljunggren AE. Short-term efficacy of physical interventions in
osteoarthritic knee pain. A systematic review and meta-analysis of
randomized placebo-controlled trials. BMC Musculoskelet Disord
2007; 8:51.
446
28. Fukuda TY, Ovanessian V, Alves da Cunha R, Jacob Filho Z,
Cazarini Jr C, Rienzo FA et al. Pulsed short wave effect in pain
and function in patients with knee osteoarthritis. JACERT 2008;
8(3):189-98.
29. Pereira HLA, Ribeiro SLE, Ciconelli RM. Tratamento com antiinflamatórios tópicos na osteoartrite de joelho. Rev Bras Reumatol
2006; 46(3):188-93.
30. Bellamy N, Campbell J, Welch V, Gee TL, Bourne R, Wells GA.
Viscosupplementation for the treatment of osteoarthritis of the knee.
Cochrane Database Syst Rev 2006; 2:CD005321.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):434-446
ARTIGO ORIGINAL
Correlação de fadiga com dor e incapacidade na
artrite reumatoide e na osteoartrite, respectivamente
Gilberto Santos Novaes1, Mariana Ortega Perez2, Maria Beatriz Bray Beraldo2,
Camila Rodrigues Costa Pinto3, Reinaldo José Gianini4
RESUMO
Objetivos: Investigar a correlação de fadiga com dor em pacientes com artrite reumatoide e de fadiga com incapacidade
em pacientes com osteoartrite. Métodos: Foram avaliados 20 pacientes com artrite reumatoide e 20 com osteoartrite. Fadiga
foi avaliada com escala visual analógica e questionário de avaliação multidimensional de fadiga. Utilizou-se a escala visual
analógica para avaliar dor e para a avaliação global da doença pelo paciente. Incapacidade foi avaliada pelo questionário
de avaliação de saúde. Idade, gênero, duração da doença, escolaridade, renda mensal, uso de drogas antirreumáticas e comorbidades foram obtidos. A análise estatística incluiu teste exato de Fisher, Shapiro-Wilk, Kruskal-Wallis e Spearman.
O nível de significância foi de 0,05. Resultados: A fadiga mostrou-se significativamente aumentada na osteoartrite em
comparação à artrite reumatoide quando se utilizou o questionário de avaliação multidimensional de fadiga (P < 0,05). Dor
correlacionou-se com fadiga ao se utilizar a escala visual analógica ou o questionário de avaliação multidimensional de
fadiga em artrite reumatoide (r = 0,46; P < 0,05). O questionário de avaliação de saúde foi associado à fadiga por escala
visual analógica em osteoartrite (r = 0,54; P < 0,05). Avaliação global da doença pelo paciente correlacionou-se com
fadiga pela escala visual analógica (r = 0,44; P < 0,003). Todas as pacientes eram mulheres, predominantemente idosas,
com médias de idade semelhantes, longa duração de doença e baixa renda. Conclusões: Nossos resultados confirmam
que em pacientes com artrite reumatoide a fadiga correlaciona-se com dor, enquanto em pacientes com osteoartrite ela
associa-se à incapacidade. Portanto, fadiga tem diferentes correlatos em osteoartrite e artrite reumatoide. Sugerimos que
incapacidade, e não dor, seja o correlato da fadiga em pacientes com osteoartrite.
Palavras-chave: artrite reumatoide, osteoartrite, fadiga, dor, incapacidade física.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
A fadiga é um sintoma subjetivo de baixa vitalidade, assim
como o são cansaço, exaustão, saturação, fraqueza e depleção
de energia. Tais sintomas são acompanhados de redução da
capacidade física e mental. Em um estudo, fadiga medida pela
escala visual analógica (EVA) esteve presente em 88%-98%
de pacientes reumáticos.1 Níveis de fadiga clinicamente relevantes foram detectados em cerca de 40%-80% dos pacientes
com artrite reumatoide (AR) ou osteoartrite (OA) em outros
estudos.1,2
Na AR, mais de 80% dos pacientes têm fadiga (≥ 2 cm,
EVA), e mais de 50% a têm em altos níveis (≥ 5 cm, EVA).2
Quarenta por cento dos pacientes com AR apresentam fadiga
persistente, determinada pela medida de saúde geral e incapacidade.2 A fadiga diminui com as drogas modificadoras do
curso da doença (DMCDs) e com a terapia anti-TNF.3,4 Tal
redução acha-se principalmente relacionada à melhora da dor.3
Recebido em 01/12/2010. Aprovado, após revisão, em 01/07/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse. Suporte financeiro: CNPqCEPE PUCSP-PBIC. Comitê de Ética: FR148764.
Centro de Ciências Médicas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
1. Professor Titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP
2. Doutoranda em Medicina pela PUC-SP
3. Aprimoranda em Reumatologia pela PUC-SP
4. Professor Titular de Medicina Preventiva e Social da PUC-SP; Professor do Curso de Pós-graduação da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo – FMUSP
Correspondência para: Gilberto Santos Novaes. Praça Dr. José Ermírio de Moraes, 290 – Centro. CEP: 18030-230. Sorocaba, SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):447-455
451
Novaes et al.
A fadiga foi menos estudada em pacientes com OA que
naqueles com AR, embora altos níveis de fadiga também
estejam presentes em pacientes com OA, com impacto
substancial em suas vidas.1,5 Um estudo relatou níveis de
fadiga mais elevados em pacientes com OA do que naqueles
com AR.6 A fadiga em pacientes com OA mostrou-se muito
mais relacionada à atividade física, medida como atividades da vida cotidiana, do que à dor momentânea,7 e foi
considerada um dos preditores mais fortes de incapacidade
funcional em OA.8
A fadiga na AR foi associada a gênero feminino, dor, depressão ou história de distúrbio afetivo, incapacidade funcional,
distúrbios do sono, comorbidades e tempo de doença.1,9-13 Não
se encontrou relação com inflamação, atividade da doença,
nem anemia.1,2,9 A fadiga em pacientes com OA foi descrita
em associação com os mesmos correlatos, tais como dor, distúrbios do sono, depressão, incapacidade física e baixo nível
de atividade física.1,6-8,14
Mais estudos sobre as correlações em pacientes com OA
e AR são necessários para que se aprofunde o conhecimento
sobre a fadiga em tais pacientes, assim como para auxiliá-los
quanto às estratégias de autocuidado, farmacoterapia, fisioterapia e outros tratamentos para fadiga nessas patologias.
Investigamos as possíveis inter-relações de dor, fadiga e
incapacidade em pacientes com AR e OA.
MÉTODOS
População do estudo
Este estudo avaliou 20 pacientes com diagnóstico de AR segundo os critérios para a classificação da American Rheumatism
Association, revisão de 1987,15 e 20 pacientes com OA.16 Todos
os participantes foram recrutados consecutivamente no ambulatório de Reumatologia, do Hospital de Sorocaba, da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), onde estavam
em acompanhamento regular. Todos os participantes assinaram
o termo de consentimento livre e informado.
Medida de fadiga, dor, incapacidade
e avaliação global pelo paciente
A fadiga dos pacientes foi avaliada através de EVA, composta
por uma linha reta de 10 cm de comprimento, em cujas extremidades estavam assinalados os pontos 0 (sem fadiga) e
10 (a pior fadiga possível). Considerou-se que fadiga estava
presente para uma medida de EVA ≥ 2 cm, e em nível alto
quando EVA ≥ 5 cm. A fadiga foi também conferida através do
questionário de avaliação multidimensional de fadiga (MAF,
452
do inglês, multidimensional assessment of fatigue).10,12 Tal
questionário consiste em 16 itens que avaliam aspectos subjetivos da fadiga, tais como quantidade, intensidade, exaustão,
impacto e duração. As subescalas são combinadas para criar
um índice global de fadiga, que varia de 1 (sem fadiga) até 50
(fadiga extrema). Neste estudo, considerou-se fadiga quando
esse índice foi ≥ 10. Avaliou-se dor através da EVA de 10 cm,
onde 0 correspondeu a “ausência de dor” e 10 correspondeu
a “pior dor possível”. Incapacidade foi avaliada através da
versão em português do Questionário de Avaliação de Saúde
(HAQ, do inglês, health assessment questionnaire).17 A avaliação global pelo paciente (PGA, do inglês, patient global
assessment) foi aferida usando-se uma EVA de 10 cm, onde 0
foi considerado a melhor avaliação da doença (muito bom), e
10 a pior (muito mal).
Variáveis socioeconômicas, demográficas e clínicas
As seguintes variáveis foram obtidas na visita: idade, gênero,
tempo de doença (anos), escolaridade (anos), renda mensal,
uso de drogas antirreumáticas e comorbidade.
Análise estatística
Primeiro, a distribuição das variáveis foi analisada. Para as
variáveis quantitativas empregou-se o teste de Shapiro-Wilk,
a fim de confirmar a distribuição não paramétrica. Proporções,
médias e desvio-padrão foram usados. Para comparar os
grupos AR e OA utilizou-se o teste exato de Fisher (variáveis
categóricas) ou de Kruskal-Wallis (variáveis quantitativas).
A correlação entre variáveis quantitativas foi avaliada pelo
teste de Spearman. O nível de significância adotado foi 0,05.
RESULTADOS
Fadiga avaliada pela EVA foi observada em 17 (85%) pacientes
com AR e em 19 (95%) com OA. Altos níveis de fadiga foram
detectados em 10 (50%) pacientes com AR e em 18 (90%)
pacientes com OA. Quando se utilizou o questionário MAF,
20 (100%) pacientes com AR e 19 (95%) com OA mostraram
fadiga. A fadiga medida pelo questionário MAF foi significativamente maior em pacientes com OA do que naqueles com
AR (P < 0,05).
A Tabela 1 mostra a análise socioeconômica e demográfica e as características clínicas. Em geral, os pacientes dos
dois grupos eram semelhantes: todas mulheres, com doença
de longo tempo e baixa renda. As pacientes com AR tinham
doença de longa duração e menos comorbidades em comparação àquelas com OA. A comorbidade mais frequente nos dois
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):447-455
Correlação de fadiga com dor e incapacidade na artrite reumatoide e na osteoartrite, respectivamente
Tabela 1
Análise dos parâmetros socioeconômicos,
demográficos e clínicos
Correlação entre MAF e dor em AR
12
AR (n = 20)
OA (n = 20)
Idade, anos
53,4 ± 10,6
54 ± 6,2
Gênero: feminino, %
100,0
100,0
Tempo de doença, anos
9,40 ± 6,22*
4,55 ± 3,10
Escolaridade, anos
3,90 ± 2,78
4,03 ± 3,44
Salário mensal, US$
596 ± 325
493 ± 264
Comorbidades, % pacientes
85,0
100,0
10
D
O
R
8
6
4
2
0
0
Valores expressos como média ± DP. * P < 0,05.
AR: artrite reumatoide; OA: osteoartrite.
10
20
30
40
50
60
MAF
Figura 2
Correlação de escores de dor e do questionário MAF em
pacientes com AR (r = 0,46).
MAF: avaliação multidimensional de fadiga; AR: artrite reumatoide.
50
45
40
35
E
s
c
o
r
e
s
Correlação entre MAF e HAQ em OA
30
25
AR
3
20
OA
2,5
15
10
H 2
A
Q 1,5
5
0
Dor
HAQ
PGA
MAF
EVA
1
0,5
Figura 1
Fadiga e correlatos em AR e OA.
Os escores de dor associaram-se à fadiga medida pela EVA e pela MAF em
pacientes com AR. O escore de HAQ correlacionou-se com fadiga medida pela
MAF em pacientes com OA. A PGA correlacionou-se com fadiga medida pela
EVA em pacientes com AR.
*P < 0,05. HAQ: questionário de avaliação de saúde; PGA: avaliação global
pelo paciente; MAF: avaliação multidimensional de fadiga; EVA: escala visual
analógica; AR: artrite reumatoide; OA: osteoartrite.
grupos foi hipertensão arterial (35% em pacientes com AR e
50% naquelas com OA), diabetes mellitus (15% em AR e 5%
em OA) e gastropatia (10% em AR e 15% em OA).
Não houve associação entre fadiga medida pela EVA ou
pelo questionário MAF e escolaridade, categorias de renda,
uso de drogas antirreumáticas e comorbidades. A Figura 1
mostra a análise da fadiga e correlatos. O escore de dor
correlacionou-se significativamente com fadiga medida pela
EVA e pelo questionário MAF nas pacientes com AR (P < 0,05;
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):447-455
0
0
10
20
30
40
50
60
70
MAF
Figura 3
Correlação de escores do HAQ e do questionário MAF em
pacientes com OA (r = 0,54).
MAF: avaliação multidimensional de fadiga; HAQ: questionário de avaliação
de saúde; OA: osteoartrite.
r = 0,46). O escore do HAQ correlacionou-se significativamente com fadiga medida pelo questionário MAF em pacientes com
OA (P < 0,05; r = 0,54). A PGA correlacionou-se com fadiga
medida por EVA em pacientes com AR (P < 0,003; r = 0,44).
Não se observou correlação entre PGA e fadiga em pacientes
com OA. A Figura 2 mostra a correlação entre dor e o escore
do questionário MAF em pacientes com AR (r = 0,46), e a
Figura 3 apresenta a correlação entre o escore do HAQ e o do
questionário MAF em pacientes com OA (r = 0,54).
453
Novaes et al.
Em resumo, fadiga refletiu dor e associou-se a ela em
pacientes com AR, enquanto em pacientes com OA a fadiga
associou-se à incapacidade.
DISCUSSÃO
Neste estudo, a fadiga foi avaliada nos dois grupos de pacientes (AR e OA) usando-se a EVA e o questionário MAF, e tais
medidas foram comparadas com parâmetros socioeconômicos,
demográficos e clínicos, tais como escolaridade, tempo de doença, dor, escore do HAQ e PGA. Observou-se diferença entre
a fadiga da AR e da OA e a avaliação de dor e incapacidade:
fadiga foi associada de maneira significativa à dor em pacientes
com AR e à incapacidade em pacientes com OA.
Entretanto, em outro estudo, pacientes com AR mostraram
níveis mais elevados de fadiga avaliada pela EVA do que
pacientes com OA.18 Um outro estudo relatou níveis mais
elevados de fadiga em pacientes com OA em comparação aos
com AR.6 Em nosso estudo, níveis mais elevados de fadiga
foram observados em pacientes com OA do que naqueles com
AR, quando se usou o questionário MAF. A correlação de dor e
fadiga foi exaustivamente relatada em pacientes com AR, e, em
geral, dor, depressão e fadiga correlacionaram-se de maneira
significativa e positiva.1,3,4,10,12,19-22 Stebbing et al.22 relataram
que, em pacientes com AR, a fadiga não se associou significativamente a dor, atividade da doença, incapacidade nem erosão,
mas associou-se a depressão e ansiedade. Os autores também
relataram maiores escores do questionário MAF em pacientes
com OA, e isso dependeu da incapacidade.22 Segundo nossos
achados, fadiga em pacientes com AR associou-se fortemente
à dor, independentemente da escala usada para avaliá-la. Esse
fato é consistente com a percepção de que a melhora da fadiga com drogas antirreumáticas, vista em pacientes com AR,
depende da melhora da dor.3,4
Nossos resultados também indicam que fadiga em pacientes com OA correlacionou-se com incapacidade medida no
questionário MAF. Há evidência de que fadiga mais intensa
em pacientes com OA não é relacionada ao aumento da dor,
mas à incapacidade física e psicológica.6,7,14 Pacientes com
OA descreveram a fadiga como tendo impacto em sua função
física e habilidade de participar das atividades sociais e da
vida cotidiana.5 Em um estudo, mulheres jovens com AR e
múltiplas tarefas diárias pareceram mais vulneráveis ao impacto negativo da fadiga.23 Nossos resultados sugerem que a
fadiga de pacientes com OA será mais bem tratada e resolvida
com uma estratégia para superar a incapacidade do que a dor.
As atividades da vida cotidiana representadas pelo escore do
HAQ podem ser afetadas por comorbidades, mas a extensão
454
e a doença específica responsável por esse comprometimento
ainda não foi estabelecida. Estudos adicionais devem ser realizados para confirmar os achados e melhorar a compreensão
sobre a fadiga de pacientes com AR e OA.
Em resumo, nossos resultados confirmam que a fadiga em
pacientes com AR correlaciona-se com a intensidade da dor,
enquanto que em pacientes com OA associa-se à incapacidade. Portanto, fadiga tem diferentes correlatos em OA e AR.
Sugerimos que incapacidade, e não dor, seja o correlato da
fadiga em pacientes com OA.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
Wolfe F, Hawley DJ, Wilson K. The prevalence and meaning of
fatigue in rheumatic disease. J Rheumatol 1996; 23(8):1407-17.
Repping-Wuts H, Fransen J, van Achterberg T, Bleijenberg G,
van Riel P. Persistent severe fatigue in patients with rheumatoid
arthritis. J Clin Nurs 2007; 16(11C):377-83.
Pollard LC, Choy EH, Gonzalez J, Khoshaba B, Scott DL. Fatigue in
rheumatoid arthritis reflects pain, not disease activity. Rheumatology
(Oxford) 2006; 45(7):885-9.
Wolfe F, Michaud K. Fatigue, rheumatoid arthritis, and antitumor
necrosis factor therapy: an investigation in 24,831 patients. J
Rheumatol 2004; 31(11):2115-20.
Power JD, Badley EM, French MR, Wall AJ, Hawker GA. Fatigue
in osteoarthritis: a qualitative study. BMC Musculoskelet Disord
2008; 9:63.
Zautra AJ, Fasman R, Parish BP, Davis MC. Daily fatigue in women
with osteoarthritis, rheumatoid arthritis, and fibromyalgia. Pain 2007;
128(1-2):128-35.
Murphy SL, Smith DM, Clauw DJ, Alexander NB. The impact of
momentary pain and fatigue on physical activity in women with
osteoarthritis. Arthritis Rheum 2008; 59(6):849-56.
Wolfe F. Determinants of WOMAC function, pain and stiffness
scores: evidence for the role of low back pain, symptom counts,
fatigue and depression in osteoarthritis, rheumatoid arthritis and
fibromyalgia. Rheumatology (Oxford) 1999; 38(4):355-61.
Bergman MJ, Shahouri SS, Shaver TS, Anderson JD, Weidensaul DN,
Busch RE et al. Is fatigue an inflammatory variable in rheumatoid
arthritis (RA)? Analyses of fatigue in RA, osteoarthritis, and
fibromyalgia. J Rheumatol 2009; 36(12):2788-94.
Belza BL. Comparison of self-reported fatigue in rheumatoid arthritis
and controls. J Rheumatol 1995; 22(4):639-43.
Stone AA, Broderick JE, Porter LS, Kaell AT. The experience of
rheumatoid arthritis pain and fatigue: examining momentary reports
and correlates over one week. Arthritis Care Res 1997; 10(3):185-93.
Belza BL, Henke CJ, Yelin EH, Epstein WV, Gilliss CL. Correlates
of fatigue in older adults with rheumatoid arthritis. Nurs Res 1993;
42(2):93-9.
Jump RL, Fifield J, Tennen H, Reisine S, Giuliano AJ. History
of affective disorder and the experience of fatigue in rheumatoid
arthritis. Arthritis Rheum 2004; 51(2):239-45.
Sale JE, Gignac M, Hawker G. The relationship between disease
symptoms, life events, coping and treatment, and depression among
older adults with osteoarthritis. J Rheumatol 2008; 35(2):335-42.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):447-455
Correlação de fadiga com dor e incapacidade na artrite reumatoide e na osteoartrite, respectivamente
15. Arnett FC, Edworthy SM, Bloch DA, McShane DJ, Fries JF, Cooper NS
et al. The American Rheumatism Association 1987 revised criteria
for the classification of rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 1988;
31(3):315-24.
16. Kellgren JH, Moore R. Generalized osteoarthritis and Heberden’s
nodes. Br Med J 1952; 1(4751):181-7.
17. Ferraz MB, Oliveira LM, Araujo PM, Atra E, Tugwell P. Crosscultural
reliability of the physical ability dimension of the health assessment
questionnaire. J Rheumatol 1990; 17(6):813-7.
18. Slatkowsky-Christensen B, Mowinckel P, Loge JH, Kylen TK.
Health-related quality of life in women with symptomatic hand
osteoarthritis: a comparison with rheumatoid arthritis patients,
healthy controls, and normative data. Arthritis Rheum 2007;
57(8):1404-9.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):447-455
19. Huyser BA, Parker JC, Thoreson R, Smarr KL, Johnson JC,
Hoffman R. Predictors of subjective fatigue among individuals with
rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 1998; 41(12):2230-7.
20. Fifield J, Tennen H, Reisine S, McQuillan J. Depression and the longterm risk of pain, fatigue, and disability in patients with rheumatoid
arthritis. Arthritis Rheum 1998; 41(10):1851-7.
21. van Hoogmoed D, Fransen J, Bleijenberg G, van Riel P. Physical
and psychosocial correlates of fatigue in rheumatoid arthritis.
Rheumatology (Oxford) 2010; 49(7):1294-302.
22. Stebbings S, Herbison P, Doyle TC, Treharne GJ, Highton J.
A comparison of fatigue correlates in rheumatoid arthritis and
osteoarthritis: disparity in associations with disability, anxiety and
sleep disturbance. Rheumatology (Oxford) 2010; 49(2):361-7.
23. Nikolaus S, Bode C, Taal E, van de Laar MA. New insights into the
experience of fatigue among patients with rheumatoid arthritis: a
qualitative study. Ann Rheum Dis 2010; 69(5):895-7.
455
ARTIGO ORIGINAL
Prolactina, estradiol e anticorpos
anticardiolipina em amostra de mulheres
pré-menopáusicas com lúpus eritematoso
sistêmico: estudo-piloto
Fabiane Tiskievicz1, Elaine S. Mallmann2,
João C. T. Brenol3, Ricardo M. Xavier3, Poli Mara Spritzer4
RESUMO
Introdução: O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune com maior prevalência em mulheres. A maior
incidência ocorre durante os anos reprodutivos, sugerindo que o estradiol tenha influência na apresentação clínica do
LES. Anticorpos anticardiolipina (ac-ACL) estão relacionados com a síndrome do anticorpo antifosfolipídeo (SAF), mas
podem estar presentes em pacientes com LES sem SAF, sendo relacionados com risco cardiovascular e nefrite. Objetivo:
Determinar se a presença de ac-ACL está associada a alterações hormonais em uma amostra de mulheres com LES.
Métodos: Foram avaliadas 47 mulheres com LES de acordo com os critérios do American College of Rheumatology,
com idade média de 30,8 ± 8,12 anos. Nenhuma fazia uso de anticoncepcional hormonal, e a atividade do LES foi
estimada pelo índice de atividade da doença (SLEDAI). As pacientes foram estratificadas de acordo com a presença
ou não de ac-ACL, e os níveis séricos de estradiol e prolactina foram determinados. Resultados: Nove (19,1%) das 47
pacientes tiveram ac-ACL positivos. Idade, tempo de doença e o SLEDAI foram similares entre os grupos. No entanto,
a mediana do estradiol foi menor no grupo com ac-ACL positivo [46,8 (21,0-72,1) pg/mL] com relação ao grupo com
ac-ACL negativo [122,3 (64,8-172,7) pg/mL, P = 0,004]. Conclusão: Estes resultados sugerem, pela primeira vez, uma
associação inversa entre ac-ACL e níveis de estradiol em pacientes pré-menopáusicas com LES. Considerando que tanto
níveis reduzidos de estradiol endógeno quanto presença de ac-ACL estão associados a aterosclerose, este achado pode
ser clinicamente relevante em predizer risco cardiovascular e/ou desenvolvimento de SAF no LES.
Palavras-chave: anticorpos, anticardiolipina, estradiol, lúpus eritematoso sistêmico, pré-menopausa, prolactina.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
A diferença observada na prevalência das doenças autoimunes
entre homens e mulheres tem intrigado muitos investigadores
e estimulado estudos sobre o papel dos hormônios sexuais na
imunidade. Em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico
(LES), a prevalência em mulheres durante os anos reprodutivos
é de 9:1 com relação aos homens. Além disso, a apresentação
clínica parece também diferir entre os gêneros, tendo os
homens doença renal mais grave, assim como maior envolvimento neurológico e cardiorrespiratório que as mulheres.1,2
Tem-se demonstrado que os hormônios sexuais como
testosterona, estradiol e prolactina exercem influência
sobre mecanismos do sistema imunológico em animais e
seres humanos, afetando várias funções imunes, incluindo
maturação e ativação linfocitária, assim como síntese de
Recebido em 14/03/2011. Aprovado, após revisão, em 01/07/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse. Suporte Financeiro: INCT de
Hormônios e Saúde da Mulher/CNPq e FIPE-HCPA. Comitê de Ética: GPPG/HCPA 04-215.
Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Universidade Federal do Rio Grande do Sul – HCPA/UFRGS.
1. Mestre em Endocrinologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS; Especialista em Ginecologia e Obstetrícia
2. Professora Titular da Universidade de Caxias do Sul – UCS; Doutora em Ciências Médicas pela UFRGS
3. Professor Adjunto do Departamento de Medicina Interna da UFRGS; Reumatologista do Serviço de Reumatologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre – HCPA
4. Professora Titular do Departamento de Fisiologia da UFRGS; Coordenadora da Unidade de Endocrinologia Ginecológica do Serviço de Endocrinologia do HCPA
Correspondência para: Poli Mara Spritzer. Serviço de Endocrinologia, HCPA. Rua Ramiro Barcelos, 2350 – CPE 4º andar. CEP: 90035-003. Porto Alegre, RS,
Brasil. Telefone: +55 51 3359-8027. E-mail: [email protected]
460
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):456-464
Prolactina, estradiol e anticorpos anticardiolipina em amostra de mulheres pré-menopáusicas com lúpus eritematoso sistêmico: estudo-piloto
autoanticorpos e citocinas.3 Os resultados observados são
confl itantes com relação ao papel do estrogênio, talvez
devido a efeitos distintos deste hormônio em diferentes
linhagens celulares. No entanto, considera-se que ele promova um aumento da proliferação celular e da resposta
imune humoral.4
Recentemente foi levantada a hipótese de que os hormônios sexuais poderiam estar associados às manifestações da
síndrome do anticorpo antifosfolipídeo (SAF).5,6 Esta síndrome
é definida pela presença de anticorpos antifosfolípídeos em
pacientes com história de perda fetal e/ou tromboembolismo
venoso e arterial recorrentes.
Os anticorpos antifosfolipídeos incluem o anticoagulante
lúpico, os anticorpos anticardiolipina (ac-ACL) e a anti-β2glicoproteína I, e podem causar um prolongamento nos testes
coagulométricos dependentes de fosfolipídios, como o tempo
de tromboplastina parcial ativada. Apesar dos achados laboratoriais, pacientes com anticorpos antifosfolipídeos apresentam
maior risco para eventos tromboembólicos que para hemorrágicos.5 Os ac-ACL são detectados por ELISA (enzyme-linked
immunosorbent assay) e possuem os isotipos IgG, IgM e IgA.
O IgG apresenta forte associação com trombose.7,8
O presente trabalho tem como objetivo avaliar se existe
relação entre a presença de ac-ACL (IgG e IgM) e os níveis de
estradiol e prolactina em uma amostra de mulheres em idade
reprodutiva com diagnóstico de LES.
PACIENTES E MÉTODOS
O delineamento deste trabalho é o de um estudo transversal,
não controlado. Foram incluídas no estudo 47 pacientes pré-menopáusicas, consultando no Serviço de Reumatologia do
Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), que não estivessem em uso de anticoncepcionais hormonais e com quatro
ou mais critérios diagnósticos para LES segundo o American
College of Rheumatology.9
Pacientes com alterações em provas de função hepática
(TGO, TGP ou LDH), insuficiência renal (índices de creatinina acima de 1,5), alteração de função tireoidiana, presença
concomitante de outra doença autoimune ou usuárias de drogas
que alterem os níveis circulantes de prolactina foram excluídas
do estudo.
O grau de atividade do LES foi aferido através do índice de atividade da doença (SLEDAI, do inglês, Systemic
Lupus Erythematosus Disease Activity Index).10,11 Foi considerado LES ativo quando SLEDAI ≥ 4, e inativo quando
SLEDAI < 4.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):456-464
Em todas as pacientes foram realizadas dosagens de estradiol e prolactina séricas, por eletroquimioluminescência
(Elecsys, Roche Diagnostics, Mannheim, Alemanha), com
sensibilidade analítica de 5,0 pg/mL e 0,047 ng/mL, respectivamente. Os valores de referência para estradiol são entre 10 a
520 pg/mL, e para prolactina entre 6,0 e 29,9 ng/mL. A coleta
de amostras de sangue para essas dosagens foram simultâneas
àquelas realizadas para os exames utilizados para a obtenção
do SLEDAI.
A positividade para ac-ACL (IgG e IgM) foi avaliada por
enzimaimunoensaio, kit Anticardiolipina Hemagen® (Hemagen
Diagnostics, Columbia). Valores inferiores a 10 U GPL para
IgG e 10 U MPL para IgM são considerados negativos. A
sensibilidade relativa do teste é de 95%, e a especificidade de
100% (com concordância de 98% se comparado com o kit de
referência fornecido pelo Antiphospholipid Standardization
Laboratory). Com base nessas análises, as pacientes foram
estratificadas em dois grupos: ac-ACL presentes ou ac-ACL
ausentes no soro (IgG ou IgM).
No mesmo dia da coleta foi realizada entrevista sobre a história mórbida pregressa e os antecedentes gineco-obstétricos.
Adicionalmente, foi feita revisão de prontuário para verificação da presença de diagnóstico prévio de SAF e história de
comprometimento de órgãos-alvo.
O trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética em
Pesquisa e Ética em Saúde do HCPA (GPPG 04-215), e foi
obtido consentimento pós-informado por escrito de todas as
pacientes.
Análise estatística
Foram descritas as variáveis categóricas pela frequência
absoluta e frequência relativa percentual e as variáveis quantitativas por média ± desvio-padrão quando sua distribuição
fosse simétrica, ou pela mediana e intervalo interquartil
quando assimétrica. Para comparar variáveis com distribuição simétrica entre categorias de variáveis dicotômicas foi
usado o teste t de Student, e para aquelas com distribuição
assimétrica utilizou-se o teste de Mann-Whitney. O grau de
significância aceito foi de 95% (Pα ≤ 0,05). A análise dos
dados foi realizada utilizando-se o programa SPSS v.14.0
(Chicago, IL, EUA).
RESULTADOS
A amostra foi constituída por 47 mulheres pré-menopáusicas
com idade média de 30,8 ± 8,12 anos, com diagnóstico de
LES.
461
Tiskievicz et al.
Tabela 1
Características das pacientes com LES, estratificadas segundo presença ou ausência de ac-ACL (IgG ou IgM)
ac-ACL positivo (n = 9)
ac-ACL negativo (n = 38)
P
Idade (anos)
29,75 (3,30)
32,36 (7,56)
0,51a
Tempo de doença (anos)
7,0 (8,52)
7,21 (4,70)
0,10a
Menarca (anos)
11,75 (2,06)
12,82 (1,58)
0,79a
Anti-DNA
1/40 (0-1/200)
0 (0-0)
0,49b
SLEDAI
4 (2-9)
2 (0-7)
0,193b
Prolactina (ng/mL)
10,68 (8,43-14,04)
13,38 (9,13-20,27)
0,43b
(a) Média ± DP; Teste t de Student.
(b) Mediana (intervalo IQ); Teste de Mann-Whitney.
DISCUSSÃO
Neste estudo procuramos correlacionar a presença de ac-ACL,
frequentemente encontrados em pacientes com LES e associados à presença de eventos trombóticos e SAF, com os níveis
462
500
96
400
90
300
E2
Entre as participantes do estudo, nove (19,1%) apresentavam positividade para ac-ACL no soro (IgG e/ou IgM). A
maioria das pacientes apresentava LES em remissão ou com
atividade leve, como pode ser observado pelos escores do
SLEDAI (Tabela 1).
A Tabela 1 apresenta os dados da amostra das pacientes
estudadas, estratificados pela presença ou não de ac-ACL IgG
e/ou IgM. Foram avaliados fatores que poderiam influenciar
nos níveis de estrogênio. Os grupos foram similares com relação à idade, idade da menarca e ao tempo de doença. Além
disso, não houve diferença entre os grupos quanto à atividade
lúpica estimada pelo SLEDAI ou presença de anti-DNA.
Os níveis de prolactina também foram semelhantes entre os
grupos (P = 0,43).
A Figura 1 mostra que as pacientes do grupo com ac-ACL
presentes tiveram níveis de estradiol significativamente mais
baixos que o grupo com anticorpos ausentes: 46,8 (21,0-72,1)
versus 122,3 (64,8-172,7) pg/mL, respectivamente (P = 0,004).
Não houve diferença significativa nos níveis de estradiol
entre as pacientes que coletaram amostras de sangue durante
a fase folicular precoce do ciclo menstrual (até o oitavo dia do
ciclo) e as que coletaram em outras fases do ciclo menstrual
(P = 0,737).
Nenhuma das pacientes da amostra tinha história atual ou
pregressa de infarto agudo do miocárdio ou acidente vascular
cerebral (AVC). Não foram encontradas, também, associações
entre os níveis de estradiol e presença de vasculite, nefrite ou
outras alterações vasculares associadas à SAF.
* 23
200
100
0
-100
N=
9
38
positivo
negativo
Anticorpo anticardiolipina
Figura 1
Estradiol sérico em mulheres pré-menopáusicas com ac-ACL
positivos ou negativos.
de estradiol e prolactina em um grupo de mulheres em idade
reprodutiva.
Nossos resultados evidenciam que, na amostra estudada,
a presença de ac-ACL no soro esteve associada a níveis
mais baixos de estradiol. Esse resultado diverge, em parte,
da noção de que níveis de estrogênio mais elevados costumam estar associados à produção de autoanticorpos.12 Essa
observação é relevante, tendo em vista que tanto deficiência
em estrogênios quanto ac-ACL estão relacionados com risco
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):456-464
Prolactina, estradiol e anticorpos anticardiolipina em amostra de mulheres pré-menopáusicas com lúpus eritematoso sistêmico: estudo-piloto
para doença aterosclerótica. Até o momento, a associação
entre hipoestrogenismo e presença de ac-ACL em mulheres
pré-menopáusicas com LES ainda não havia sido descrita.
É amplamente reconhecido que a oxidação da LDL (do
inglês, low-density lipoprotein) tem papel importante na
aterogênese.13 Estudos recentes têm sugerido que a produção
de ac-ACL está relacionada com a exposição a antígenos expressos em células endoteliais em processo de apoptose, bem
como com a exposição à LDL oxidada.14 Um estudo publicado
por Tuominen et al.15 evidencia que a oxidação do LDL também induz resposta imune a epítopos de cardiolipina oxidada.
Alguns autores sugerem que a aterosclerose e a autoimunidade
sejam eventos intrinsecamente correlacionados.14
Alguns estudos indicam que o estrogênio endógeno, ao
contrário do exógeno, possa diminuir a apoptose das células
endoteliais, levando a um efeito cardiovascular protetor.12,16
Nesse sentido, um trabalho publicado em 200817 investigou o
efeito in vitro do estrogênio na apoptose de células endoteliais
em cultura, demonstrando que o estrogênio inibe, embora de
forma incompleta, a apoptose induzida por TNF-α e por LDL
oxidada. Dessa forma, uma possível explicação para a associação de baixos níveis de estradiol e presença de ac-ACL seria
o aumento de ativação e apoptose endotelial provocado pelos
baixos níveis de estrogênio endógeno, levando ao aumento de
exposição a antígenos do endotélio e mesmo subendoteliais,
como a LDL oxidada.
Apesar de se tratar de uma observação original, a revisão da literatura inclui algumas evidências indiretas sobre
associação entre estrógenos, SAF e risco cardiovascular. Em
2005, Jara et al.18 publicaram um estudo que compara, pela
primeira vez, as diferenças clínicas entre homens e mulheres
com SAF no momento do diagnóstico e durante o acompanhamento. Não foi observada diferença entre os gêneros
quanto à trombose arterial e venosa ou nos níveis de ac-ACL.
No entanto, a incidência de AVC foi maior em mulheres
que em homens (31,5% e 10%, respectivamente). Embora a
incidência de doença aterosclerótica em mulheres aumente
na pós-menopausa com relação ao período da menacme,19
no estudo citado as pacientes eram jovens, mas não tiveram
proteção em relação aos homens quando do surgimento de
AVC – segundo o autor, provavelmente devido a um possível
hipoestrogenismo associado à SAF.18
Existem alguns relatos sobre o efeito da administração
exógena de estrogênios. Em um estudo publicado em 2004,
Todorova et al.20 investigaram a presença de ac-ACL (IgG
e IgM) durante o uso de terapia hormonal por um grupo de
mulheres pós-menopáusicas saudáveis, sem história clínica de
eventos trombóticos anteriores. As pacientes foram divididas
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):456-464
em dois grupos: um grupo-controle e um grupo que utilizou
terapia hormonal contendo 2 mg de 17-β estradiol mais
1 mg de acetato de noretisterona por seis meses. Não houve
mudança significativa na prevalência de ac-ACL positivos
no grupo-controle durante os seis meses de acompanhamento.
No grupo que utilizou terapia hormonal, os níveis de ac-ACL
IgM aumentaram durante o curso da terapia hormonal, sendo
a mudança significativa após o terceiro mês de tratamento,
ocorrendo uma redução dos níveis deste anticorpo no sexto
mês de tratamento, mas sem retorno aos níveis basais.20
Nessa mesma direção, um estudo em animais utilizando
ratos C57BL/6 sem doença autoimune21 mostrou que os animais tratados com estrogênio tiveram aumento na expressão
de ac-ACL IgG e IgM.
Por outro lado, evidências esparsas citadas em artigo de
revisão22 indicaram que em chinesas pós-menopáusicas tratadas
com derivado de estradiol os níveis de ac-ACL IgG diminuíram
e os de HDL (do inglês, high-density lipoprotein) aumentaram.
Dessa forma, pode-se especular que os efeitos dos estrogênios
sobre a expressão dos anticorpos antifosfolipídeos podem ser
dependentes de sua concentração, etnia, origem (endógena vs.
exógena) e do estado de ativação endotelial.23
É importante salientar que, no presente trabalho, a diferença nos níveis de estradiol entre os grupos com e sem ac-ACL
positivos foi independente das concentrações de prolactina
sérica. Hiperprolactinemia é um achado relativamente comum
em pacientes com LES e pode induzir à menor secreção
ovariana de estradiol através de mecanismos centrais comuns
de regulação (via dopamina e hormônio liberador de gonadotrofina hipotalâmicos). A ausência de hiperprolactinemia em
nossas pacientes deve-se, provavelmente, à baixa atividade
lúpica no momento de sua inclusão no estudo;24,25 porém,
mais importante, demonstra que a associação observada
entre menores concentrações de estradiol e maior frequência
de ac-ACL não foi contaminada por alterações relacionadas
com a prolactina.
CONCLUSÃO
Observou-se que em pacientes lúpicas pré-menopáusicas a
presença de anticorpos antifosfolipídeos esteve associada a
níveis circulantes mais baixos de estradiol, sem correlação
com os níveis de prolactina. Para explicar a associação inversa
entre os níveis de estradiol e a presença de ac-ACL, podemos
especular que com a diminuição dos níveis de estrogênio há um
aumento da apoptose, com consequente exposição a antígenos
que aumentam a expressão de ac-ACL. Essa observação, se
confirmada em outros estudos, levanta questões interessantes
463
Tiskievicz et al.
sobre a inter-relação entre estrogênios, endotélio e autoimunidade, com impacto potencial no risco de tromboses e de doença
cardiovascular. Assim, estudos longitudinais são necessários
para avaliar se níveis reduzidos de estradiol em mulheres com
LES no menacme podem ser considerados marcadores de risco
para aterosclerose e AVC, independente de SAF.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
Yacoub Wasef SZ. Gender differences in systemic lupus
erythematosus. Gend Med 2004; 1(1):12-7.
2. de Carvalho JF, do Nascimento AP, Testagrossa LA, Barros RT, Bonfá E.
Male gender results in more severe lupus nephritis. Rheumatol Int
2010; 30(10):1311-5.
3. Zandman-Goddard G, Peeva E, Shoenfeld Y. Gender and
autoimmunity. Autoimmun Rev 2007; 6(6):366-72.
4. Cutolo M, Brizzolara R, Atzeni F, Capellino S, Straub RH, Puttini PC.
The immunomodulatory effects of estrogens: clinical relevance in
immune-mediated rheumatic diseases. Ann N Y Acad Sci 2010;
1193(1):36-42.
5. Uthman I, Salti I, Khamashta M. Endocrinologic manifestations of
the antiphospholipd syndrome. Lupus 2006; 15(8):485-9.
6. de Carvalho JF. Influence of gender on the clinical and laboratory
spectra of patients with primary antiphospholipid syndrome.
Rheumatol Int 2010; 31(5):647-50.
7. Lim W, Crowther MA. Antiphospholipid antibodies: a critical review
of the literature. Curr Opin Hematol 2007; 14(5):494-9.
8. McIntyre JA, Wagenknecht, DR, Faulk WP. Antiphospholipid
antibodies: discovery, definitions, detection and disease. Progr Lipid
Res 2003; 42(3):176-237.
9. Smith EL, Shmerling RH. The American College of Rheumatology
criteria for the classification of systemic lupus erythematosus:
strengths, weakness, and opportunities for improvement. Lupus
1999; 8(8):586-95.
10. Griffiths B, Mosca M, Gordon C. Assessment of patients with
systemic lupus erythematosus and the use of lupus disease activity
indices. Best Pract Res Clin Rheumatol 2005; 19(5):685-708.
11. Bombardier C GD, Urowitz MB, Caro D, Chang,CH. Derivation
of the SLEDAI. A disease activity index for lupus patients. The
Committee on Prognosis Studies in SLE. Arthrits Rheum 1992;
35(6):360-40.
464
12. Batuca JR, Amaral MC, Alves JD. Humoral mechanisms of
atherogenesis. Ann N Y Acad Sci 2009; 1173:401-8.
13. Kamstrup PR. Lipoprotein(a) and ischemic heart disease – a causal
association? A review Atherosclerosis 2010; 211(1):15-23.
14. Damoiseaux J, Jeyasekharan AD, Theunissen R, Tervaert JW.
Cross-reactivity of IgM and IgG anticardiolipin antibodies with
oxidized-low density lipoproteins. Ann N Y Acad Sci 2005;
1050:163-9.
15. Tuominen A, Miller YI, Hansen LF, Kesäniemi A, Witztum JL,
Hörkkö S. A natural antibody to oxidized cardiolipin binds to
oxidized low-density lipoprotein, apoptotic cells, and atherosclerotic
lesions. Arterioscler Thromb Vasc Biol 2006; 26(9):2096-102.
16. Mendelsohn ME, Karas RH. The protective effects of estrogen on
the cardiovascular system. N Engl J Med 1999; 340(23):1801-11.
17. Florian M, Magder S. Estrogen decreases TNF-alpha and oxidized
LDL induced apoptosis in endothelial cells. Steroids 2008;
73(1):47-58.
18. Jara LJ, Medina G, Vera-Lastra O, Barile L. The impact of gender
on clinical manifestations of primary antiphospholipid syndrome.
Lupus 2005; 14(8):607-12.
19. Maturana MA, Irigoyen MC, Spritzer PM. Menopause, estrogens,
and endothelial dysfunction: current concepts. Clinics (São Paulo)
2007; 62(1):77-86.
20. Todorova M, Kamenov Z, Baleva M, Christov V, Nicolov K.
Anticardiolipin antibodies during hormone replacement therapy
in healthy postmenopausal women. Maturitas 2004; 48(4):393-7.
21. Verthelyi D, Ahmed AS. Characterization of estrogen-induced
autoantibodies to cardiolipin in non-autoimmune mice. J Autoimmun
1997; 10(2):115-25.
22. Sekigawa I, Fujishiro M, Yamaguchi A, Kawasaki M, Inui A, Nozawa K
et al. A new hypothesis of the possible mechanisms of gender
differences in systemic lupus erythematosus. Clin Exp Rheumatol
2010; 28(3):419-23.
23. Rodriguez-Alemán F, Torres JM, Cuadros JL, Ruiz E, Ortega E.
Effect of estrogen-progestin replacement therapy on plasma lipids
and lipoproteins in postmenopausal women. Endocr Res 2000;
26(2):263-73.
24. Chavez-Rueda K, Legorreta-Haquet VM, Cervera-Castillo H,
Sánchez L, Jara LJ, Zenteno E et al. Effect of prolactin on lymphocyte
activation from systemic lupus erythematosus patients. Ann N Y
Acad Sci 2007; 1108:157-65.
25. Rezaieyazdi Z, Hesamifard A. Correlation between serum prolactin
levels and lupus activity. Rheumatol Int 2006; 26(11):1036-9.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):456-464
ARTIGO ORIGINAL
Estudo da frequência dos alelos de HLA-DRB1
em pacientes brasileiros com artrite reumatoide
Magali Justina Gómez Usnayo1, Luis Eduardo Coelho Andrade2,
Renata Triguenho Alarcon3, Juliana Cardoso Oliveira4, Gustavo Milson Fabrício Silva4,
Izidro Bendet5, Rufus Burlingame6, Luis Cristóvão Porto7, Geraldo da Rocha Castelar Pinheiro8
RESUMO
Os alelos HLA-DRB1, que codificam uma sequência de aminoácidos (QKRAA/QRRAA/RRRAA) nas posições 70 a 74
da terceira região hipervariável da cadeia β1 do gene DRB1, denominada epítopo compartilhado (EC), estão associados
a maior suscetibilidade e gravidade para artrite reumatoide (AR) em diversas populações. Objetivo: Determinar a frequência dos alelos HLA-DRB1 em pacientes brasileiros com AR, e sua associação a fator reumatoide (FR) e anticorpos
antipeptídeos citrulinados (ACPA). Material e métodos: Foram incluídos 412 pacientes com AR e 215 controles. A
tipificação HLA-DRB1 foi realizada pela reação em cadeia da polimerase (PCR) usando primers específicos e hibridização
com oligonucleotídeos de sequência específica (SSOP). A pesquisa de ACPA foi determinada pela técnica de ELISA, e a
do FR por nefelometria. Para análises estatísticas foram utilizados os testes do qui-quadrado e t de Student e a regressão
logística. Resultados: Alelos HLA-DRB1*04:01, *04:04 e *04:05 associaram-se à AR (P < 0,05)); a despeito do amplo
intervalo de confiança, vale a pena ressaltar a associação observada entre o alelo DRB1*09:01 e a doença (P < 0,05).
Alelos HLA-DRB1 EC+ foram observados em 62,8% dos pacientes e em 31,1% do grupo-controle (OR 3,62; P < 0,001)
e estiveram associados a ACPA (OR 2,03; P < 0,001). Alelos DRB1-DERAA mostraram efeito protetor para AR
(OR 0,42; P < 0,001). Conclusão: Em uma amostra de pacientes brasileiros com AR de etnia majoritariamente mestiça,
alelos HLA-DRB1 EC+ estiveram associados à suscetibilidade à doença e à presença de ACPA.
Palavras-chave: HLA-DRB1, epítopo compartilhado, artrite reumatoide, polimorfismo gênico, imunogenética.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
A artrite reumatoide (AR) é uma doença sistêmica crônica,
caracterizada pelo acometimento inflamatório da membrana
sinovial das articulações, levando à destruição óssea e cartilaginosa. Sua prevalência na população adulta mundial é de 0,5%
a 1%, e no Brasil é de 0,46%.1 Apresenta pico de incidência
entre a quarta e a sexta décadas, e é duas a três vezes mais
frequente em mulheres que em homens.2
Embora sua etiologia permaneça desconhecida,3 vários
estudos sugerem que uma combinação de fatores genéticos e
ambientais esteja envolvida. O fator genético contribui com
cerca de 60% da suscetibilidade para AR.4 Embora o papel
da hereditariedade não esteja completamente compreendido,
Recebido em 19/6/2011. Aceito, após revisão, em 21/6/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse. Comitê de Ética: CEP-HUPE 2169.
Apoio financeiro: Centro de Estudos em Reumatologia Pedro Ernesto – CERPE.
Disciplina de Reumatologia do Hospital Universitário Pedro Ernesto – UERJ.
1. Mestranda do Programa de Pós-graduação em Ciências Médicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ
2. Professor-Associado da Disciplina de Reumatologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP
3. Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Reumatologia da UNIFESP
4. Biólogo-Assistente do Laboratório de Histocompatibilidade e Criopreservação da UERJ e Doutorando do Programa de Pós-graduação em Biologia Humana
e Experimental da UERJ
5. Consultor Científico de Imunologia do Sérgio Franco Medicina Diagnóstica – DASA
6. Cientista sênior da INOVA Diagnostics, Inc. San Diego, California, EUA
7. Professor Titular do Departamento de Histologia e Embriologia e Coordenador do Laboratório de Histocompatibilidade e Criopreservação da UERJ
8. Professor Adjunto da Disciplina de Reumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da UERJ
Correspondência para: Geraldo da Rocha Castelar Pinheiro. Boulevard 28 de Setembro, 77 – sala 333 – Vila Isabel. CEP: 20551-030. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Telefone: +55 21 2868-8216. Email: [email protected]
474
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
Estudo da frequência dos alelos de HLA-DRB1 em pacientes brasileiros com artrite reumatoide
o fator de risco predominante, responsável por 30% a 50%
do componente genético, parece estar ligado aos antígenos
leucocitários humanos (HLA, do inglês, human leukocyte
antigen). O HLA localiza-se no complexo principal de histocompatibilidade (MHC, do inglês, major histocompatibility
complex) presente no braço curto do cromossoma 6 (6p21.3).5
Um grupo de alelos do lócus HLA-DRB1 (DRB1*01:01,
DRB1*01:02, DRB1*04:01, DRB1*04:04, DRB1*04:05,
DRB1*04:08, DRB1*04:10, DRB1*10:01, DRB1*14:02)
codifica uma sequência de aminoácidos compartilhada
(QKRAA/QRRAA/RRRAA, onde Q = glutamina; K = lisina;
R = arginina e A = alanina), localizada no sulco de ligação ao
peptídeo, nas posições 70 a 74 da terceira região hipervariável
da molécula HLA-DR, sequência esta denominada de epítopo
compartilhado (EC).6
Acredita-se que o EC esteja envolvido na patogênese da
AR, por servir de local de ligação no processo de apresentação
de peptídeos artritogênicos para as células T CD4+ envolvidas
na resposta imunoinflamatória dessa doença. Além disso, o EC
pode estar envolvido no processo de indução de algumas células B a diferenciarem-se em plasmócitos, levando à formação
dos anticorpos antipeptídeos citrulinados (ACPA, do inglês,
anti-citrullinated peptides antibody).7 Além do seu papel na
suscetibilidade para AR, alelos que contêm as sequências do EC
(principalmente homozigotos) estão associados às formas mais
graves da enfermidade e às manifestações extra-articulares,8
bem como à presença de doença erosiva.9,10
Estudos realizados em diversos grupos étnicos mostraram a existência de variações consideráveis com relação à
associação dos alelos de HLA-DRB1 com a suscetibilidade
à AR.11 Alelos HLA-DRB1*04:01 e *04:04 estão associados à
suscetibilidade à doença em indivíduos caucasianos do norte
da Europa e dos Estados Unidos;12 o DRB1*04:05 em coreanos, japoneses e chineses;13,14 o DRB1*01:01 e o *10:01 em
gregos, espanhóis e judeus israelenses;15,16 o DRB1*14:02
em índios nativos americanos, peruanos17,18 e equatorianos;19
o DRB1*04:04 em colombianos e argentinos.20,21 No Brasil,
Bertolo et al.22 observaram associação da AR ao DRB1*01:01
e *01:02 em 65 pacientes caucasianos. Mais recentemente,
Louzada-Junior et al.23 encontraram associação da doença aos
alelos DRB1*04:01, *04:04, *04:05, *01:01 e *10:01 em 140
pacientes, de maioria étnica caucasiana.
Em contrapartida, os alelos HLA-DRB1, com uma sequência de aminoácidos comum, DERAA (D = ácido aspártico,
E = ácido glutâmico, R = arginina, A = alanina), expressa nos
alelos DRB1*01:03, *04:02, *11:02, *11:03, *13:01, 13:02 e
*13:04, parecem estar associados a menor risco para o desenvolvimento da AR, independentemente da presença do EC.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
A presença desses alelos parece também ser protetora contra
doença erosiva grave, mesmo em pacientes com ACPA.24,25
Os principais marcadores imunológicos da AR, fator
reumatoide (FR) e ACPA, aparentemente também estão envolvidos na patogênese da sinovite reumatoide. A presença
de títulos elevados de ambos foi associada à doença mais
agressiva e erosiva.26,27
Alguns estudos em pacientes com AR têm mostrado resultados contraditórios com relação à associação do EC e à
positividade do FR.28,29 Ao mesmo tempo, parece haver uma
associação dos alelos EC+ apenas em pacientes com AR que
apresentam ACPA positivos,30 e que essa associação seria mais
intensa com ACPA que com a própria AR.31 Tal associação
sugere que os alelos EC poderiam influenciar a apresentação
do antígeno levando à produção de ACPA. Mais recentemente,
foi observado que o risco conferido pelo tabagismo, principal
fator ambiental, é particularmente elevado nos indivíduos que
possuem alelos HLA-DR EC+ com ACPA.32
Tendo em conta a diversidade dos resultados da literatura
referentes à associação de alelos HLA-DRB1 à AR em diferentes etnias, o objetivo do presente estudo foi determinar a
associação entre esses alelos e a AR, incluindo a presença de
FR e/ou ACPA em uma população de pacientes brasileiros
altamente miscigenados.
MATERIAL E MÉTODOS
Pacientes e controle
Nosso estudo foi tipo caso-controle, em que foram incluídos
pacientes com AR. Todos preencheram pelo menos quatro dos
sete critérios para classificação diagnóstica da AR estabelecidos
pelo American College of Rheumatology (ACR).33 Os pacientes
selecionados não apresentavam outras doenças autoimunes e eram
acompanhados regularmente nos ambulatórios de AR das disciplinas de Reumatologia do Hospital Universitário Pedro Ernesto, da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), e do Hospital
São Paulo, da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP),
de outubro de 2007 a agosto de 2009. No grupo-controle foram
incluídos indivíduos doadores voluntários de medula óssea, de
campanhas de doação realizadas em diferentes bairros do Rio
de Janeiro, de maio de 2008 a novembro de 2009. A faixa etária
dos doadores foi de 18 a 55 anos, eram de ambos os gêneros e
não apresentavam queixa atual ou passada de artrite. Também
não foram incluídas pessoas com história familiar de AR ou
outras doenças autoimunes em parentes de primeiro grau.
Foram selecionados os maiores de 30 anos, para minimizar
o viés de análise quanto ao possível diagnóstico futuro dessa
doença neste grupo.
475
Usnayo et al.
Após serem informados sobre a natureza do estudo e terem
assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, os
participantes foram submetidos a uma entrevista clínica, com
ficha padronizada para os dois grupos. Foram registrados dados
demográficos para ambos os grupos, além de características
clínicas para o grupo dos pacientes. Ambos os grupos tiveram
amostra de sangue coletada para tipificação do HLA. O grupo
de pacientes foi submetido, também, à detecção de autoanticorpos (FR e ACPA).
Os grupos foram pareados para gênero e etnia. A atribuição da origem étnica foi realizada pelo mesmo investigador,
após solicitar aos pacientes e doadores voluntários dados
sobre sua ascendência. Foi considerado de etnia negra ou
caucasiana aquele indivíduo com os quatro avôs com ascendência negra ou caucasiana, respectivamente, e mestiço
quando pelo menos um dos avôs era de etnia diferente. Não
foram incluídos descendentes de asiáticos, com a finalidade
de evitar viés de seleção.
Em ambos os grupos foram excluídos os indivíduos que
não possuíam quantidade de DNA ou soro suficientes para
uma adequada análise da tipificação do HLA ou dosagem dos
autoanticorpos. Não foram incluídas também pessoas cuja
tipificação mostrou resultado ambíguo.
Tipificação HLA-DRB1
Os alelos HLA-DRB1 foram determinados para todos os pacientes com AR e controles. A tipificação HLA foi realizada
pela reação em cadeia da polimerase (PCR) usando primers
específicos e hibridização com oligonucleotídeos de sequência específica ((SSOP, do inglês, sequence-specific oligonucleotide probe) (One Lambda Inc., Canoga Park, CA, EUA).
Definição dos alelos HLA-DRB1 de risco para AR
Todo indivíduo com tipificação para os alelos HLA-DRB1*01:01,
*01:02, *04:01, *04:04, *04:05, *04:08, *04:10, *10:01 e
*14:02 foi considerado portador do epítopo compartilhado
(EC+), podendo ser em uma dose (EC+/-) ou dose dupla
(EC+/+). Associações de risco para AR entre alelos HLADRB1 foram realizadas a partir de combinações genotípicas
estabelecidas na ausência de EC (-/-), na presença de uma dose
do EC (+/-) ou de dose dupla do EC (+/+). A associação do
HLA-DRB1 com as características sorológicas nos pacientes
com AR também foi realizada.
Definição dos alelos HLA-DRB1 de proteção para AR
Todo indivíduo com tipificação para os alelos HLA-DRB1*01:03,
*04:02, *11:02, *11:03, *13:01, *13:02 e *13:04 foi definido
476
como portador da sequência DERAA (protetora), podendo ser
em uma dose ou em dose dupla.
Os indivíduos cuja tipificação compreendia alelos não
pertencentes à sequência do EC ou à sequência DERAA
foram definidos com X, podendo estar em uma dose ou em
dose dupla.
Assim, formaram-se seis grupos de indivíduos para análise,
de acordo com a presença dos alelos DRB1:
Grupo A: dose dupla (homozigotos) para EC (EC/EC);
Grupo B: dose única (heterozigoto) alelo EC (EC/X);
Grupo C: dose única de EC e de DERAA (EC/DERAA);
Grupo D: ausência de EC e de DERAA (X/X);
Grupo E: dose única de DERAA (DERAA/X);
Grupo F: dose dupla de DERAA (DERAA/DERAA).
Determinação de FR e ACPA
A detecção do ACPA foi realizada empregando o QUANTA
Lite ® de 2ª geração CCP ELISA (INOVA Diagnostics,
Inc – San Diego, EUA) de acordo com as instruções do
fabricante. A quantificação de FR IgM foi realizada pela
técnica de nefelometria (Dade Behring Marburg GmbH –
Alemanha). Para o FR IgM foram considerados positivos
títulos > 20 UI/mL, e elevados quando > 100 UI/mL. Para
o ACPA foram considerados positivos títulos > 20 U/mL, e
elevados quando > 60 U/mL.
Análise estatística
Os dados foram analisados utilizando o programa Epi Info 6. A
análise da associação entre as variáveis categóricas foi feita
pelo teste do qui-quadrado (com correção de Yates) ou teste
exato de Fisher. As variáveis quantitativas com distribuição
normal foram testadas utilizando-se teste t de Student para
amostras independentes ou Mann-Whitney e análises de
variância. Valores de P < 0,05 foram considerados estatisticamente significativos. Análise de regressão logística foi
utilizada para categorizar o risco de associação dos alelos
HLA-DRB1.
RESULTADOS
Foram incluídos no estudo 412 (95%) dos 430 pacientes com
AR e 215 (74%) dos 290 controles doadores voluntários de
medula óssea. As características de gênero e etnia foram
similares em ambos os grupos (P = 0,722 e P = 0,552). Os
demais dados demográficos, clínicos e laboratoriais dos pacientes com AR e do grupo-controle encontram-se descritos
na Tabela 1.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
Estudo da frequência dos alelos de HLA-DRB1 em pacientes brasileiros com artrite reumatoide
Associação de grupos alélicos HLA-DRB1 com AR
*09 (OR = 5,19) e *14 (OR = 2,26) estiveram associados à
suscetibilidade à AR (P < 0,05), enquanto os alelos DRB1*11
(OR = 0,45) e *13 (OR = 0,53) estiveram associados à proteção
ao desenvolvimento da AR (P < 0,05). De forma semelhante,
quando realizamos a tipificação dos alelos HLA-DRB1 por alta
A Tabela 2 mostra a distribuição das frequências de grupos
alélicos do HLA-DRB1 e a associação à suscetibilidade e
proteção para AR entre 412 pacientes com AR e 215 voluntários do grupo-controle. Alelos HLA-DRB1*04 (OR = 2,69),
Tabela 1
Caracterização demográfica e clínico-laboratorial de pacientes com AR e grupo-controle
Variável
AR (n = 412)
Controle (n = 215)
P
Idade (média ± DP, anos)
51,8 ± 11,5/52,5
42,6 ± 5,4
< 0,001
Gênero feminino (%)
376 (90,8)
198 (92,1)
0,722
Etnia
0,552
Mestiços (%)
272 (66)
147 (68,4)
Brancos (%)
111 (27)
58 (27)
Negros (%)
29 (7)
10 (4,7)
Tempo de doença (média ± DP, anos)
9,2 ± 7,5
—
FR+ (%)
257 (62,5)
—
Titulação do FR (média ± DP, UI/mL)
288 ± 668
—
ACPA+ (%)
294 (71,3)
—
TTitulação do ACPA (média ± DP, U/mL)
135 ± 51,5
—
AR: artrite reumatoide; ACPA: anticorpo antipeptídeo citrulinado; FR: fator reumatoide; DP: desvio-padrão.
Tabela 2
Frequências dos grupos alélicos do HLA-DRB1 (baixa resolução) em pacientes com AR e grupo-controle
Grupo alélico
AR = 412, n(%)
Controle = 215, n(%)
OR
95% IC
P
*01
113 (14)
45 (10,5)
1,36
0,93-2,00
NS
*03
73 (9)
54 (12,5)
0,68
0,46-1,00
NS
*04
186 (22,5)
42 (10)
2,69
1,86-3,92
0,001
*07
79 (9,5)
52 (12)
0,77
0,52-1,14
NS
*08
38 (5)
20 (5)
0,99
0,55-1,79
NS
*09
29 (3,5)
3 (1)
5,19
1,50-21,49
0,004
*10
27 (3)
14 (3)
1,01
0,50-2,04
NS
*11
53 (6)
57 (13)
0,45
0,30-0,68
0,001
*12
12 (1,5)
9 (2)
0,69
0,27-1,79
NS
*13
85 (10)
77 (18)
0,53
0,37-0,75
0,001
*14
38 (5)
9 (1)
2,26
1,04-5,09
0,038
*15
64 (8)
43 (10)
0,76
0,50-1,16
NS
1,29
0,61-2,80
NS
*16
27 (3)
11 (2,5)
TOTAL
824
430
AR: artrite reumatoide; OR: razão de risco; NS: não significante.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
477
Usnayo et al.
Tabela 3
Frequência alélica do HLA-DRB1 em pacientes com AR e grupo-controle
Alelos HLA-DRB1
AR = 824, n(%)
Controle = 430, n(%)
OR
95% IC
P
*01:01
68 (8,3)
26 (6)
1,40
0,86-2,29
NS
*01:02
41 (5 )
17 (4)
1,27
0,69-2,36
NS
*01:03
4 (0,5)
2 (0,5)
1,04
0,16-8,22
NS
*03
73 (8,8)
54 (12,5)
0,68
0,46-1,00
NS
*04:01
41 (5)
8 (1,9)
2,76
1,23-6,44
0,010
*04:02
14 (1,7)
5 (1,2)
1,47
0,49-4,70
NS
*04:03
9 (1,1)
5 (1,2)
0,94
0,29-3,23
NS
*04:04
42 (5)
6 (1,4)
3,80
1,53-10,0
0,002
*04:05
48 (5,8)
10 (2,3)
2,60
1,25-5,53
0,007
*04:06
3 (0,4)
1 (0,2)
1,57
0,15-39,2
NS
*04:07
7 (0,8)
3 (0,7)
1,22
0,28-5,97
NS
*04:08
12 (1,5)
0 (0,0)
ND
ND
NS
*04:10
3 (0,4)
0 (0,0)
ND
ND
NS
*04:11
7 (0,8)
4 (0,9)
0,91
0,24-3,72
NS
*07
79 (9,6)
52 (12,1)
0,77
0,52-1,14
NS
*08
38 (4,6)
20 (4,7)
0,99
0,55-1,79
NS
*09:01
29 (3,5)
3 (0,7)
5,19
1,50-21,49
0,004
*10:01
27 (3,3)
8 (1,9)
1,79
0,77-4,31
NS
*11
53 (6,4)
57 (13,2)
0,45
0,30-0,68
0,001
*12
12 (1,4)
9 (2,1)
0,69
0,27-1,79
NS
*13
85 (10,3)
77 (17,9)
0,53
0,37-0,75
0,001
*14:01
20 (2,4)
6 (1,4)
1,76
0,66-4,92
NS
*14:02
18 (2,2)
3 (0,7)
3,18
0,88-13,63
NS
*15
64 (7,8)
43 (10)
0,76
0,50-1,16
NS
*16
27 (3,3)
11 (2,6)
1,29
0,61-2,80
NS
AR: artrite reumatoide; OR: razão de risco; NS: não significante.
resolução (Tabela 3), a análise das frequências alélicas mostrou
que os alelos *DRB1*04:01 (OR = 2,76), *04:04 (OR = 3,80),
*04:05 (OR = 2,60) e *09:01 (OR = 5,19) estiveram associados
à suscetibilidade à AR (P < 0,05).
Associação dos alelos HLA-DRB1
do EC na suscetibilidade à AR
A Tabela 4 mostra a distribuição de pacientes com AR e
indivíduos do grupo-controle de acordo com a presença
dos alelos HLA-DRB1 EC+. Observamos maior frequência de genótipos heterozigotos (51%) que homozigotos
(11%) no grupo de pacientes, estando ambos associados à
478
suscetibilidade à AR (OR = 2,90, P < 0,001 e OR = 2,27,
P < 0,001, respectivamente). Por fim, observamos frequência
aumentada do EC no grupo de pacientes com AR (62,8%)
quando comparados com os controles (31,1%), conferindo
um OR = 3,59 (P = 0,05).
A análise de regressão logística dos dados dos pacientes
com AR e grupo-controle com genótipos homozigotos e heterozigotos HLA-DRB1 com EC+ e DRB1 sem EC- mostrou risco
aumentado para a doença de 3,86 vezes mais entre pacientes
que apresentam genótipos homozigotos (IC 95% 1,84-8,24;
P < 0,001), e de 3,54 vezes mais entre os que apresentam genótipos heterozigotos (IC 95% 2,40-5,21; P < 0,001).
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
Estudo da frequência dos alelos de HLA-DRB1 em pacientes brasileiros com artrite reumatoide
Tabela 4
Especificidades individuais de HLA-DRB1 associados à AR entre brasileiros
de acordo com genótipos relacionados à presença do EC
EC e genótipo
AR = 412, n(%)
Controle = 215, n(%)
OR
95% IC
P
Alelos EC+/EC-
210 (51)
56 (26)
2,90
1,99-4,23
< 0,001
*01:01
48 (11,6)
18 (8,3)
1,44
0,79-2,65
0,257
*01:02
32 (7,7)
11 (5,1)
1,56
0,74-3,37
0,280
*04:01
23 (5,5)
6 (2,7)
2,06
0,78-5,74
0,167
*04:04
27 (6,5)
4 (1,8)
3,70
1,21-12,54
0,017
*04:05
35 (8,4)
7 (3,2)
2,76
1,15-6,94
0,020
*04:08
8 (1,9)
—
NS
—
0,092
*04:10
3 (0,7)
—
NS
—
0,519
*10:01
21 (5)
7 (3,2)
1,60
0,63-4,20
0,392
*14:02
13 (3,1)
3 (1,3)
2,30
0,61-10,28
0,289
Alelos EC+/ EC+
45 (11)
11 (5)
2,27
1,11-4,77
0,023
*01:01/*01:01
1 (0,2)
1 (0,4)
NS
NS
NS
*01:02/*01:02
1 (0,2)
1 (0,4)
NS
NS
NS
*04:01/*04:01
1 (0,2)
—
NS
NS
NS
*04:04/*04:04
3 (0,7)
—
NS
NS
NS
*04:05/*04:05
1 (0,2)
—
NS
NS
NS
*14:02/*14:02
1 (0,2)
—
NS
NS
NS
*01:01/*04:01
8 (1,9)
2 (0,9)
2,11
0,41-14,50
0,532
*01:01/*04:04
3 (0,7)
—
NS
NS
NS
*01:01/*04:05
3 (0,7)
2 (0,9)
NS
NS
NS
*01:01/*10:01
2 (0,5)
—
NS
NS
NS
*01:02/*04:01
2 (0,5)
—
NS
NS
NS
*01:02/*04:04
3 (0,7)
1 (0,9)
NS
NS
NS
*04:01/*04:05
3 (0,7)
1 (0,9)
NS
NS
NS
*04:01/*10:01
2 (0,5)
—
NS
NS
NS
*04:05/*10:01
2 (0,5)
—
NS
NS
NS
Outros
9 (2,2)
3 (1,3)
1,58
0,39-7,43
0,705
Total EC+
255 (62,8)
67 (31,1)
3,59
2,49-5,17
< 0,001
AR: artrite reumatoide; EC+: epítopo compartilhado positivo; EC-: epítopo compartilhado negativo; OR: razão de risco; NS: não significante.
Associação dos alelos HLA-DRB1-DERAA
na proteção ao desenvolvimento da AR
Avaliando a influência da presença de alelos DERAA, observamos que 79 (19%) pacientes com AR e 78 (36%) controles
possuem os alelos de HLA-DRB1 codificando DERAA, o que
indica que sua presença confere proteção para AR (OR = 0,42;
IC 95% 0,28-0,61; P < 0,001).
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
O efeito de alelos DERAA na ausência de alelos EC foi
avaliado comparando os grupos D (X/X) e E (X/DERAA)
mais o grupo F (DERAA/DERAA). Indivíduos com DERAA
positivo tiveram menor risco para desenvolver AR (OR = 0,56;
IC 95% 0,34-0,92; P = 0,021).
A comparação entre os grupos B (EC/X) e C (EC/DERAA)
revelou que, na presença de um alelo EC, a codificação de alelos DERAA conferiu menor suscetibilidade para AR, embora
sem significância estatística (OR = 0,60; IC 95% 0,28-1,29;
P = 0,216) (Tabela 5).
479
Usnayo et al.
Tabela 5
Frequências de genótipos HLA-DRB1 de suscetibilidade (EC) e
proteção (DERAA) em pacientes com AR e grupo-controle
Grupo
Genótipo HLA-DRB1
AR = 412, n(%)
Controle = 215, n(%)
A
EC/EC
45 (10,9)
11 (5,1)
B
EC/X
175 (43,2)
42 (19,5)
C
EC/DERAA
35 (7,7)
14 (6,5)
D
X/X
110 (26,6)
84 (39,1)
E
X/DERAA
43 (10,4)
57 (26,5)
F
DERAA/DERAA
4 (0,9)
7 (3,3)
Alelos EC são HLA-DRB1 *01:01, *01:02, *04:01, *04:04, *04:05, *04:08, *10:01 e *14:02. Alelos DERAA são HLA-DRB1 *01:03, *04:02, *11:02, *11:03, *13:01, *13:02 e *13:04. Alelos X são todos os
outros alelos HLA-DRB1.
OR, IC 95% e valor P dos seguintes dados: Grupo B comparado ao grupo C: OR 0,60; IC 95% 0,28-1,29; P = 0,216. Grupo D comparado aos grupos E e F: OR 0,56; IC 95% 0,34-0,92; P = 0,021.
Grupo A mais B comparado ao grupo D: OR 3,17; IC 95% 2,05-4,90; P = 0,00.
Tabela 6
Frequência de alelos HLA-DRB1 EC e autoanticorpos em 412 pacientes com AR
Autoanticorpos
EC+, n(%)
EC-, n(%)
Fator reumatoide
Positivo
165 (40,04)
92 (22,33)
Negativo
91 (22,08)
64 (15,53)
Positivo
197 (47,81)
97 (23,54)
Negativo
59 (14,32)
59 (14,32)
ACPA
OR
95% IC
P
1,26
0,82-1,94
0,313
2,03
1,28-3,31
0,001
EC+: epítopo compartilhado positivo; EC-: epítopo compartilhado negativo; ACPA: anticorpos antipeptídeo citrulinado; OR: razão de risco.
Associação entre alelos HLA-DRB1 de
suscetibilidade (EC) e presença de autoanticorpos
DISCUSSÃO
Os pacientes com AR apresentaram FR positivo em 62,3%
(n = 257) e ACPA positivo em 71,3% (n = 294) dos casos,
dos quais 237 (57,5%) dos pacientes foram positivos para
ambos os autoanticorpos e somente 57 pacientes (13,8%)
foram positivos apenas para o ACPA. Observamos também
uma associação significativa entre FR e ACPA (OR = 20,79;
IC 95% 11,49-37,97; P < 0,001).
Expressavam FR+ e alelos HLA-DRB1 EC+ 165 (40,04%)
pacientes, e 197 (47,81%) expressavam ACPA+ e alelos
HLA-DRB1 EC+. Associação significativa foi observada
somente para alelos EC com ACPA (Tabela 6).
Os níveis séricos do FR para o grupo de pacientes com
genótipos EC homozigotos, heterozigotos e sem o EC foram
177,7 ± 286 UI/mL, 205,3 ± 695 UI/mL e 157,1 ± 328 UI/mL, respectivamente. Os níveis séricos médios para o ACPA, seguindo
a mesma ordem do FR, foram 131,3 ± 66 U/mL, 102,8 ± 71 U/mL
e 83,3 ± 73 U/mL, respectivamente.
Estudos genéticos realizados inicialmente em gêmeos e posteriormente em familiares demonstraram uma predisposição
familiar para AR, representando 60% do risco total para o
desenvolvimento da doença na população.4 Diversos estudos
demonstraram que o fator genético mais importante associado
à suscetibilidade da AR é a presença do HLA-DRB1 do MHC,
descoberto inicialmente por Stastny et al.34 e posteriormente
organizado na hipótese do EC por Gregersen et al.6
Técnicas modernas como as empregadas em estudos de
genoma completo (GWAS, do inglês, genome-wide association
studies) e marcadores genéticos de polimorfismo de único nucleotídeo (SNP, do inglês, single nucleotide polymorphism) confirmam
a associação significante e preponderante desses alelos com a
AR. No entanto, é importante ressaltar que a associação da AR
ao HLA-DRB1 e a hipótese do EC não explicam toda a suscetibilidade genética conferida pelo HLA. Outros genes do HLA,
sem EC, tais como os alelos HLA-DRB1*03:01, DRB1*07:01
e DRB1*09:01, embora com frequência menor, também foram
associados à maior suscetibilidade para a AR.35,36
480
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
Estudo da frequência dos alelos de HLA-DRB1 em pacientes brasileiros com artrite reumatoide
Um segundo gene associado à doença é a proteína tirosina
fosfatase N22 (PTPN22, do inglês, protein tyrosine phosphatase), presente em 8% dos pacientes com AR.32 Em menor
proporção, foram descritas associações a determinados alelos
do sinal transdutor e ativador de transcrição 4 (STAT4, do
inglês, signal transducer and activator of transcription 4), do
antígeno 4 dos linfócitos T citotóxicos (CTLA-4, do inglês,
cytotoxic T-lymphocyte antigen), do fator inibitório de migração de macrófagos (MIF, do inglês, macrophag emigration
inhibitory factor) e da peptidilarginina deaminase 4 (PADI4,
do inglês, peptidylarginine deiminase type IV).37
No presente estudo observamos que 90,8% dos pacientes
eram mulheres, semelhante à proporção encontrada no estudo
realizado por Bertolo et al.22 em 2001 (84,6%) e por LouzadaJunior et al.23 em 2008 (77,8%).
A influência da etnia é ponto fundamental quando se avalia
a associação dos genes HLA com doenças, especialmente com
AR. Além de ser um sistema altamente polimórfico, distintos
alelos são associados à AR em diferentes populações. Dessa
forma, ao estudar uma população altamente miscigenada como
a brasileira, as associações tradicionais de determinadas etnias
poderiam não ser verificadas. No intuito de controlar essa
variável, todo estudo de associação HLA e doença necessita
que os indivíduos-controle sejam oriundos do mesmo estrato
sociogeográfico dos pacientes, a fim de preservar as influências
sociais e demográficas em ambos os grupos. Nosso estudo,
além de avaliar uma amostra significativa de pacientes com AR
(n = 412), também tipificou indivíduos saudáveis (n = 215),
todos provenientes da mesma região geográfica e estrato social.
Além disso, houve predomínio de mestiços, seguido de brancos
e negros, configurando-se uma amostra altamente miscigenada (descendentes principalmente de portugueses, africanos,
indígenas, italianos, espanhóis e alemães), que acreditamos
refletir, em parte, a própria população brasileira.
Em princípio, a idade em estudos genéticos não teria
influência na suscetibilidade. Porém, em virtude da presença
de alelos HLA-DRB1 com EC+ entre 12,5% e 35%23,38 da
população sadia e da incidência maior da AR entre 30 e 55
anos,2 tentamos evitar viés de análise quanto ao diagnóstico
no grupo-controle. Por isso, decidimos incluir em nosso
grupo-controle indivíduos com idade mais avançada.
Com relação à associação do HLA-DRB1 com a doença, observamos frequência aumentada dos alelos HLA-DRB1*04:01,
*04:04 e *04:05 e associação positiva com a suscetibilidade à
AR. Este resultado está, em parte, de acordo com os observados
por Louzada-Junior et al.23 na população brasileira predominantemente caucasiana, na qual, além da associação aos alelos
citados anteriormente, também foi encontrada associação ao
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
alelo HLA-DRB1*01:01. Por outro lado, difere da observada
por Bertolo et al.,22 que também analisaram populações de origem caucasiana e observaram associação significativa somente
com alelos HLA-DRB1*01 (OR = 2,8).
Assim como observado por Louzada-Junior et al.,23 o
alelo HLA-DRB1*14:02 mostrou tendência de associação à
AR, embora de forma não significativa (OR = 3,18; IC 95%
0,88-13,63; P = 0,086). É possível que estudos com maior
número de indivíduos possam mostrar que essa associação
seja estatisticamente significante. Em um estudo com população mestiça peruana (n = 65) essa associação entre o alelo
HLA-DRB1*14:02 e a AR foi observada (OR = 2,74).18
A presença dos alelos HLA-DRB1*09 em 6,7% dos pacientes com AR e 1,3% dos controles, predominante em descendentes de negros e indígenas, mostrou associação significativa nos
genótipos heterozigotos desses alelos (OR = 5,19; IC 95% 1,5021,49; P = 0,004). Não obstante o amplo intervalo de confiança
observado, este alelo foi pela primeira vez associado à suscetibilidade à AR na população brasileira. Essa mesma associação
(HLA-DRB1*09 e AR) também foi observada em pacientes
chilenos com AR, em 1990.39 Por outro lado, estudo realizado
no Japão com 852 pacientes com AR encontrou associação com
a doença apenas no genótipo HLA-DRB1*09:01 homozigoto.36
Semelhante aos estudos de Vignal et al.35 (OR = 5,04) e
Balsa et al.38 (OR = 1,8) incluindo população etnicamente
homogênea, também encontramos associação do conjunto de
alelos HLA-DRB1 EC+ com a AR (OR = 3,59). Este resultado
é distinto ao descrito no estudo realizado por Teller et al.40 incluindo pacientes com AR e controles hispano-americanos, no
qual não foi observada associação desses alelos com a doença,
o que sugere que a hipótese do EC provavelmente não poderia
ser aplicada em estudos de população não miscigenada.
No presente estudo pode-se observar frequência aumentada
de genótipos EC heterozigotos (51%) quando comparados
aos pacientes com AR e controle com genótipos EC homozigotos (11%). Em estudo realizado por del Rincon et al.41
foram observados genótipos EC heterozigotos em 52% dos
pacientes com AR, e EC homozigotos em 22%. Entretanto,
Balsa et al.38 encontraram que 29,8% dos pacientes eram
heterozigotos e 14% eram homozigotos. Neste estudo, após
análise de regressão logística dos genótipos homozigotos e
heterozigotos HLA-DRB1 com EC+, observamos que pacientes que apresentam EC, independente de serem homozigotos
(OR = 3,86) ou heterozigotos (OR = 3,54), apresentam risco
aumentado, mas de magnitude semelhante (OR semelhantes)
para o desenvolvimento da AR. Este resultado se contrapõe
ao de del Rincon et al.,41 no qual a análise de 141 pacientes
mexicanos com AR mostrou maior risco para genótipos EC
481
Usnayo et al.
homozigotos (OR = 21,53) quando comparados com genótipos EC heterozigotos (OR = 1,84).
Com relação aos alelos HLA-DRB1 protetores para AR,
observamos que alelos HLA-DRB1 codificadores da sequência de aminoácidos DERAA estão associados a menor risco
de desenvolver AR (OR = 0,42), semelhante ao observado por
Louzada-Junior et al.23 em 2008 (OR = 0,49). Carrier et al.25
avaliaram pacientes com poliartrite de início recente e obsevaram
que os alelos DERAA não estavam associados à produção de
autoanticorpos, bem como também mostrou-se efeito protetor
para o desenvolvimento da AR (OR = 0,30). Mais recentemente,
Balsa et al.38 relataram que esses alelos conferem proteção para
AR apenas com ACPA circulante (OR = 0,58). Outro estudo
mostrou que alelos DERAA, além de conferir efeito protetor
para AR, estariam associados à enfermidade menos grave.24
Observamos maior frequência de FR (62%) e ACPA
(71%) positivos quando comparados com grupo de pacientes brasileiros com AR inicial,42 cujas frequências eram em
torno de 50%. Tal resultado pode ser justificado devido ao
nosso grupo de pacientes apresentar maior tempo de doença (em torno de nove anos). Alelos HLA-DRB1 com EC
foram relacionados com a positividade do FR e do ACPA,
embora só a associação com a presença do ACPA tenha
se mostrado significante (Tabela 6). Irigoyen et al.,29 em
2005, observaram forte associação do ACPA a alelos EC,
independentemente da presença do FR (OR = 5,8; IC 95%
4,1-8,3; P < 0,001 e OR = 3,1; IC 95% 1,8-5,3; P < 0,001).
Semelhante ao observado por Balsa et al.,38 este estudo
mostrou que genótipos HLA-DRB1 EC homozigotos apresentaram níveis séricos do ACPA mais elevados quando
comparados aos genótipos heterozigotos e aos dos pacientes
sem o EC. Em contraste, os níveis séricos de FR não diferiram em pacientes com e sem alelos EC. Observamos que
88,8% de 27 pacientes com alelo HLA-DRB1*09 apresentaram ACPA e 85% apresentaram FR, sugerindo que outros
mecanismos não EC estariam implicados no risco genético
para o desenvolvimento de FR e ACPA.
Em síntese, este estudo, com amostra populacional predominantemente mestiça e mais representativa do povo brasileiro, evidenciou que os alelos HLA-DRB1*04:01, *04:04
e *04:05 associaram-se à suscetibilidade aumentada para AR,
destacando-se também a associação ao alelo DRB1*09 nesses
pacientes. Nossos resultados corroboram a associação entre alelos DRB1 EC e a suscetibilidade à AR e ao ACPA, previamente
documentada em estudos com amostras populacionais geneticamente homogêneas. Além disso, mostramos que a presença do
EC, quer em dose única ou dupla, comportou-se como fator de
risco independente para a doença, bem como que a presença de
482
alelos DERAA apresentaram efeito protetor. Ademais, os alelos
HLA-EC estiveram associados a maior positividade e maiores
níveis séricos de ACPA. Embora as diretrizes para o diagnóstico
da AR estabelecidas pela Sociedade Brasileira de Reumatologia
em 201143 recomendem que a pesquisa do HLA-EC não deva
ser ainda um exame de rotina diária ao atendimento de pacientes
com suspeita de AR, devido ao seu custo elevado, nosso estudo
corrobora sua importância para o estabelecimento de fatores de
risco e de proteção ao desenvolvimento da AR.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
Senna ER, de Barros AL, Silva EO, Costa IF, Pereira LV, Ciconelli RM
et al. Prevalence of rheumatic diseases in Brazil: a study using the
COPCORD approach. J Rheumatol 2004; 31(3):594-7.
Pinheiro GRC. Artrite reumatoide. In: Moreira C, Pinheiro GRC,
Marques Neto JF (eds.). Reumatologia Essencial. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan; 2009. p. 338-54.
Hochberg MC, Silman AJ, Smolen JS, Weinblatt ME, Weisman MH.
Rheumatology. 4ed. Philadelphia: Mosby; 2008.
MacGregor AJ, Snieder H, Rigby AS, Koskenvuo M, Kaprio J,
Aho K et al. Characterizing the quantitative genetic contribution to
rheumatoid arthritis using data from twins. Arthritis Rheum 2000;
43(1):30-7.
Bowes J, Barton A. Recent advances in the genetics of RA
susceptibility. Rheumatology (Oxford) 2008; 47(4):399-402.
Gregersen PK, Silver J, Winchester RJ. The shared epitope
hypothesis. An approach to understanding the molecular genetics
of susceptibility to rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 1987;
30(11):1205-13.
Klareskog L, Stolt P, Lundberg K, Kallberg H, Bengtsson C,
Grunewald J et al. A new model for an etiology of rheumatoid
arthritis: smoking may trigger HLA-DR (shared epitope)-restricted
immune reactions to autoantigens modified by citrullination. Arthritis
Rheum 2006; 54(1):38-46.
Weyand CM XC, Goronzy JJ. Homozygosity for the HLA-DRB1
allele selects for extra-articular manifestations in rheumatoid
arthritis. J Clin Invest1992; 89(6):2033-9.
Weyand CM, Goronzy JJ. Inherited and noninherited risk factors
in rheumatoid arthritis. Curr Opin Rheumatol 1995; 7(3):206-13.
Massardo L, Gareca N, Cartes MA, Cervilla V, Gonzalez A, Jacobelli S. The
presence of the HLA-DRB1 shared epitope correlates with erosive
disease in Chilean patients with rheumatoid arthritis. Rheumatology
(Oxford) 2002; 41(2):153-6.
Morgan AW, Haroon-Rashid L, Martin SG, Gooi HC, Worthington J,
Thomson W et al. The shared epitope hypothesis in rheumatoid
arthritis: evaluation of alternative classification criteria in a large UK
Caucasian cohort. Arthritis Rheum 2008; 58(5):1275-83.
Gonzalez-Gay MA, Garcia-Porrua C, Hajeer AH. Influence
of human leukocyte antigen-DRB1 on the susceptibility and
severity of rheumatoid arthritis. Semin Arthritis Rheum 2002;
31(6):355-60.
Lee HS, Lee KW, Song GG, Kim HA, Kim SY, Bae SC. Increased
susceptibility to rheumatoid arthritis in Koreans heterozygous for
HLA-DRB1*0405 and *0901. Arthritis Rheum 2004; 50(11):3468-75.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
Estudo da frequência dos alelos de HLA-DRB1 em pacientes brasileiros com artrite reumatoide
14. Wakitani S, Murata N, Toda Y, Ogawa R, Kaneshige T, Nishimura Y et al.
The relationship between HLA-DRB1 alleles and disease subsets of
rheumatoid arthritis in Japanese. Br J Rheumatol 1997; 36(6):630-6.
15. de Vries N, Ronningen KS, Tilanus MG, Bouwens-Rombouts A,
Segal R, Egeland T et al. HLA-DR1 and rheumatoid arthritis in
Israeli Jews: sequencing reveals that DRB1*0102 is the predominant
HLA-DR1 subtype. Tissue Antigens 1993; 41(1):26-30.
16. Boki KA, Panayi GS, Vaughan RW, Drosos AA, Moutsopoulos HM,
Lanchbury JS. HLA class II sequence polymorphisms and
susceptibility to rheumatoid arthritis in Greeks. The HLA-DR beta
shared-epitope hypothesis accounts for the disease in only a minority
of Greek patients. Arthritis Rheum 1992; 35(7):749-55.
17. Templin DW, Boyer GS, Lanier AP, Nelson JL, Barrington RA,
Hansen JA et al. Rheumatoid arthritis in Tlingit Indians: clinical
characterization and HLA associations. J Rheumatol 1994;
21(7):1238-44.
18. Castro F, Acevedo E, Ciusani E, Angulo JA, Wollheim FA,
Sandberg-Wollheim M. Tumour necrosis factor microsatellites and
HLA-DRB1*, HLA-DQA1*, and HLA-DQB1* alleles in Peruvian
patients with rheumatoid arthritis. Ann Rheum Dis 2001; 60(8):791-5.
19. Arias MV, Domingues EV, Lozano RB, Flores CV, Peralta MM,
Salinas CZ. Study of class I and II HLA alleles in 30 Ecuadorian
patients with rheumatoid arthritis compared with alleles from
healthy and affected subjects with other rheumatic diseases. Rev
Bras Reumatol 2010; 50(4):423-33.
20. Anaya JM, Correa PA, Mantilla RD, Arcos-Burgos M. Rheumatoid
arthritis association in Colombian population is restricted to
HLA-DRB1*04 QRRAA alleles. Genes Immun 2002; 3(1):56-8.
21. Citera G, Padulo LA, Fernandez G, Lazaro MA, Rosemffet MG,
Maldonado Cocco JA. Influence of HLA-DR alleles on rheumatoid
arthritis: susceptibility and severity in Argentine patients. J
Rheumatol 2001; 28(7):1486-91.
22. Bertolo MB, Costallat LTL, Persoli LB, Costa FF. Alelos HLA-DRB1
e prognóstico da artrite reumatoide em pacientes brasileiros. Rev
Bras Reumatol 2001; 41(3):151-6.
23. Louzada-Junior P, Freitas MVC, Oliveira RDR, Deghaide NHS,
Conde RA, Bertolo MB et al. A majority of Brazilian patients with
rheumatoid arthritis HLA-DRB1 alleles carry both the HLA-DRB1
shared epitope and anti-citrullinated peptide antibodies. Braz J Med
Biol Res 2008; 41(6):493-9.
24. van der Helm-van Mil AH, Huizinga TW, Schreuder GM,
Breedveld FC, de Vries RR, Toes RE. An independent role of
protective HLA class II alleles in rheumatoid arthritis severity and
susceptibility. Arthritis Rheum 2005; 52(9):2637-44.
25. Carrier N, Cossette P, Daniel C, de Brum-Fernandes A, Liang P,
Menard HA et al. The DERAA HLA-DR alleles in patients with
early polyarthritis: protection against severe disease and lack of
association with rheumatoid arthritis autoantibodies. Arthritis Rheum
2009; 60(3):698-707.
26. Bukhari M, Lunt M, Harrison BJ, Scott DG, Symmons DP,
Silman AJ. Erosions in inflammatory polyarthritis are symmetrical
regardless of rheumatoid factor status: results from a primary carebased inception cohort of patients. Rheumatology (Oxford) 2002;
41(3):246-52.
27. Meyer O, Labarre C, Dougados M, Goupille P, Cantagrel A, Dubois A
et al. Anticitrullinated protein/peptide antibody assays in early
rheumatoid arthritis for predicting five year radiographic damage.
Ann Rheum Dis 2003; 62(2):120-6.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):465-483
28. Mattey DL, Dawes PT, Clarke S, Fisher J, Brownfield A, Thomson W
et al. Relationship among the HLA-DRB1 shared epitope, smoking,
and rheumatoid factor production in rheumatoid arthritis. Arthritis
Rheum 2002; 47(4):403-7.
29. Irigoyen P, Lee AT, Wener MH, Li W, Kern M, Batliwalla F et
al. Regulation of anti-cyclic citrullinated peptide antibodies in
rheumatoid arthritis: contrasting effects of HLA-DR3 and the shared
epitope alleles. Arthritis Rheum 2005; 52(12):3813-8.
30. Orozco G, Pascual-Salcedo D, Lopez-Nevot MA, Cobo T,
Cabezon A, Martin-Mola E et al. Auto-antibodies, HLA and PTPN22:
susceptibility markers for rheumatoid arthritis. Rheumatology
(Oxford) 2008; 47(2):138-41.
31. van der Helm-van Mil AH, Verpoort KN, Breedveld FC,
Huizinga TW, Toes RE, de Vries RR. The HLA-DRB1 shared epitope
alleles are primarily a risk factor for anti-cyclic citrullinated peptide
antibodies and are not an independent risk factor for development of
rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 2006; 54(4):1117-21.
32. Klareskog L, Catrina AI, Paget S. Rheumatoid arthritis. Lancet 2009;
373(9664):659-72.
33. Arnett FC, Edworthy SM, Bloch DA, McShane DJ, Fries JF,
Cooper NS et al. The American Rheumatism Association 1987
revised criteria for the classification of rheumatoid arthritis. Arthritis
Rheum 1988; 31(3):315-24.
34. Stastny P. Association of the B-cell alloantigen DRw4 with
rheumatoid arthritis. N Engl J Med 1978; 298(16):869-71.
35. Vignal C, Bansal AT, Balding DJ, Binks MH, Dickson MC,
Montgomery DS et al. Genetic association of the major
histocompatibility complex with rheumatoid arthritis implicates
two non-DRB1 loci. Arthritis Rheum 2009; 60(1):53-62.
36. Wakitani S, Imoto K, Murata N, Toda Y, Ogawa R, Ochi T. The
homozygote of HLA-DRB1*0901, not its heterozygote, is associated with
rheumatoid arthritis in Japanese. Scand J Rheumatol 1998; 27(5):381-2.
37. van der Helm-van Mil AH, Huizinga TW. Advances in the genetics
of rheumatoid arthritis point to subclassification into distinct disease
subsets. Arthritis Res Ther 2008; 10(2):205.
38. Balsa A, Cabezon A, Orozco G, Cobo T, Miranda-Carus E,
Lopez-Nevot MA et al. Influence of HLA-DRB1 alleles in the
susceptibility of rheumatoid arthritis and the regulation of antibodies
against citrullinated proteins and rheumatoid factor. Arthritis Res
Ther 2010; 12(2):R62.
39. Gonzalez A, Nicovani S, Massardo L, Aguirre V, Cervilla V,
Lanchbury JS et al. Influence of the HLA-DR beta shared epitope
on susceptibility to and clinical expression of rheumatoid arthritis
in Chilean patients. Ann Rheum Dis 1997; 56(3):191-3.
40. Teller K, Budhai L, Zhang M, Haramati N, Keiser HD, Davidson A.
HLA-DRB1 and DQB typing of Hispanic American patients with
rheumatoid arthritis: the “shared epitope” hypothesis may not apply.
J Rheumatol 1996; 23(8):1363-8.
41. del Rincon I, Escalante A. HLA-DRB1 alleles associated with
susceptibility or resistance to rheumatoid arthritis, articular
deformities, and disability in Mexican Americans. Arthritis Rheum
1999; 42(7):1329-38.
42. da Mota LM, dos Santos Neto LL, Burlingame R, Menard HA,
Laurindo IM. Laboratory characteristics of a cohort of patients with
early rheumatoid arthritis. Rev Bras Reumatol 2010; 50(4):375-88.
43. da Mota LM, Cruz BA, Brenol CV, Pereira IA, Fronza LS,
Bertolo MB et al. 2011 Consensus of the Brazilian Society of
Rheumatology for diagnosis and early assessment of rheumatoid
arthritis. Rev Bras Reumatol 2011; 51(3):199-219.
483
ARTIGO DE REVISÃO
Efeitos terapêuticos do treinamento físico em
pacientes com doenças reumatológicas pediátricas
Bruno Gualano1, Ana Lúcia de Sá Pinto2, Maria Beatriz Perondi3, Hamilton Roschel4,
Adriana Maluf Elias Sallum5, Ana Paula Tanaka Hayashi6, Marina Yazigi Solis6, Clóvis Artur Silva7
RESUMO
Ao longo das últimas décadas, o papel do exercício em doenças reumatológicas tem sido bastante explorado. Sabe-se,
atualmente, que a prática de atividade física promove inúmeros benefícios ao paciente com osteoporose, osteoartrite,
lúpus eritematoso sistêmico, esclerose sistêmica, miopatias idiopáticas inflamatórias, fibromialgia e artrite reumatoide. Dessa forma, o exercício físico tem sido considerado ferramenta valiosa no tratamento do paciente reumático. Os
efeitos terapêuticos do treinamento físico em doenças reumatológicas pediátricas também têm sido alvos recentes de
investigação. Em conjunto, os estudos têm revelado grande potencial terapêutico do exercício para pacientes com artrite
idiopática juvenil, lúpus eritematoso sistêmico juvenil, dermatomiosite juvenil, fibromialgia juvenil e outras causas de
dor crônica. Esta revisão narrativa tem como objetivos familiarizar o reumatologista pediátrico ao campo da ciência do
exercício, discutir os potenciais benefícios do exercício físico na reumatologia pediátrica, com ênfase nas perspectivas
desse promissor campo de atuação clínica e científica, e apresentar modelos práticos de exame de pré-participação e
contraindicações ao exercício físico.
Palavras-chave: aptidão física, atividade motora, reumatologia, criança.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
Hipócrates, há 2.400 anos, afirmou: “O que é utilizado desenvolve-se, o que não o é, desgasta-se... se houver alguma deficiência de alimento e exercício, o corpo adoecerá”. As proféticas
palavras do “pai da medicina” têm ganhado respaldo científico
cada vez mais denso. Estudos epidemiológicos demonstram
que a inatividade física aumenta substancialmente a incidência
relativa de doença arterial coronariana (45%), infarto agudo do
miocárdio (60%), hipertensão arterial (30%), câncer de cólon
(41%), câncer de mama (31%), diabetes mellitus tipo II (50%)
e osteoporose (59%).1 Evidências também indicam que a inatividade física é independentemente associada a mortalidade,
obesidade, maior incidência de queda e debilidade física em
idosos, dislipidemia, depressão, demência, ansiedade e alterações do humor.2-6
Em populações pediátricas, o sedentarismo também é
considerado o principal responsável pelo aumento pandêmico na incidência de obesidade juvenil. Além disso, recentes
achados sugerem que a inatividade física é um componente
agravante do estado geral de saúde em crianças e adolescentes
acometidos por várias doenças, incluindo as cardiovasculares,
renais, endocrinológicas, neuromusculares e osteoarticulares.7
Diante do quadro apresentado, torna-se evidente que a
prática de exercícios físicos é uma medida terapêutica de suma
relevância, considerada como tratamento de primeira escolha
Recebido em 18/1/2011. Aprovado, após revisão, em 01/7/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse. Suporte Financeiro: Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP (Grant 2010/51428-2 para Hamilton Roschel), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq (Grant 300248/2008-3 para Clóvis Artur Silva) e Federico Foundation (para Clóvis Artur Silva).
Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo – USP.
1. Professor Doutor da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo – USP
2. Médico-Assistente da Disciplina de Reumatologia da USP; Pós-doutorado
3. Médica-Assistente do Hospital das Clínicas da USP; Médica Pediatra e de Medicina do Esporte
4. Pesquisador-Colaborador da Disciplina de Reumatologia da USP; Doutor em Educação Física
5. Médica-Assistente da Unidade de Reumatologia Pediátrica, Instituto da Criança, da Faculdade de Medicina da USP; Doutorado em Ciências Médicas
6. Pós-graduanda em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina da USP; Nutricionista
7. Professor-Colaborador da Unidade de Reumatologia Pediátrica, Instituto da Criança, da Faculdade de Medicina da USP; PhD em Pediatria
Correspondência para: Bruno Gualano. Av. Prof. Mello Moraes, 65 – Butantã. CEP: 05508-030. São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected]
490
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):484-496
Efeitos terapêuticos do treinamento físico em pacientes com doenças reumatológicas pediátricas
em diversas doenças crônicas, tais como diabetes mellitus tipo II
e hipertensão arterial.
De fato, o papel do exercício nos adultos com doenças
reumatológicas também tem sido estudado. Sabe-se, atualmente, que a prática de atividade física promove inúmeros
benefícios ao paciente com osteoporose,8 osteoartrite,9 lúpus
eritematoso sistêmico,10 esclerose sistêmica,11 miopatias idiopáticas inflamatórias,12 fibromialgia13 e artrite reumatoide,14
com raros relatos de efeitos adversos. Dessa forma, o exercício
físico tem sido considerado uma ferramenta valiosa e segura
no tratamento do paciente com doença reumática.
Os efeitos terapêuticos do treinamento físico em doenças
reumatológicas pediátricas também têm sido alvos recentes de
investigação.15 Em conjunto, os trabalhos têm revelado grande
potencial terapêutico do exercício para pacientes com lúpus
eritematoso sistêmico juvenil (LESJ), dermatomiosite juvenil
(DMJ), fibromialgia juvenil (FMJ) e artrite idiopática juvenil
(AIJ).7,15 Contudo, o número de estudos controlados e com
grandes amostras ainda é limitado. Além disso, questões como
“qual o melhor tipo de treinamento?” ou “o exercício afeta o
curso natural da doença?” ainda precisam ser apropriadamente
respondidas.
Nesta breve revisão narrativa nosso objetivo será discutir
os potenciais benefícios do exercício físico na reumatologia
pediátrica, com ênfase nas perspectivas desse promissor campo
de atuação clínica e científica. Além disso, introduziremos
conceitos clássicos de treinamento físico, com o intuito de
familiarizar o reumatologista pediátrico à terminologia da
ciência do exercício.
CONCEITOS E TERMINOLOGIAS
DA CIÊNCIA DO EXERCÍCIO
O glossário a seguir engloba adaptações de definições clássicas
de fisiologia do exercício e treinamento desportivo.16
Atividade física – Movimento corporal produzido pela
contração da musculatura esquelética e que implica gasto
energético acima dos valores basais.
Exercício físico – Sequência planejada e estruturada de
movimentos com o objetivo de promover a melhora ou a
manutenção de uma capacidade física específica. O exercício
físico está inserido no contexto de atividade física.
Esporte – Fenômeno cultural caracterizado pela competição. Ao contrário do senso comum, nem sempre a prática
esportiva é saudável, haja vista a alta incidência de lesões
osteomioarticulares em atletas de alto nível. Assim, a prática
de determinadas modalidades esportivas pode ser limitada
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):484-496
ao paciente pediátrico com doença crônica (para revisão, ver
Morris).17
Treinamento físico – Sequência de exercícios organizados
ao longo de um período de tempo com o objetivo de promover
aumento do desempenho físico.
Condicionamento físico – Engloba os conceitos de condicionamento aeróbio, condicionamento neuromuscular e
flexibilidade.
Condicionamento aeróbio – Também denominado condicionamento cardiorrespiratório ou resistência aeróbia.
Refere-se à capacidade do sistema circulatório e respiratório
em fornecer oxigênio durante um exercício físico prolongado.
A medida mais utilizada para representar o condicionamento
aeróbio é o consumo máximo de oxigênio (VO2 máx), que pode
ser mensurado através de calorimetria indireta ou estimado
através de testes de campo.
Condicionamento neuromuscular – Está relacionado com
a capacidade máxima do indivíduo em se opor a uma resistência externa (força máxima) ou de manter a produção de força
submáxima por um período prolongado de tempo (resistência
de força).
Flexibilidade – Refere-se à capacidade de movimentar
uma articulação em amplitudes aumentadas. Os exercícios de
alongamento são utilizados para melhorar a flexibilidade de
um indivíduo. O bom desenvolvimento da flexibilidade está
ligado à promoção e manutenção da funcionalidade.
Exercício aeróbio – Exercício desempenhado em intensidade submáxima, permitindo a manutenção do esforço
por períodos prolongados (> 10 min). É caracterizado pela
realização de contrações de um mesmo grupo muscular em
caráter rítmico e repetido. Exemplos incluem natação, ciclismo, caminhada e corrida de média e longa duração. Quando
realizado em intensidade e frequência adequadas, promove
ganhos no condicionamento aeróbio.
Intensidade do treinamento aeróbio – A intensidade do
exercício aeróbio pode ser prescrita a partir de uma fração
com relação a uma capacidade máxima do indivíduo (p. ex.,
percentual do VO2 máx ou percentual da frequência cardíaca
máxima [FC máx] do indivíduo). O exercício é classicamente
descrito como moderado quando a intensidade é ajustada para
40%-60% do VO2 máx (50%-70% da FC máx), e intenso quando a intensidade é > 60% do VO2 máx (> 70% da FC máx).
Exercício de força ou treinamento de força – Exercício
que utiliza resistência externa (sobrecarga) para produzir
adaptações neuromusculares. Os exemplos mais comuns são os
exercícios de levantamento de peso, conhecidos popularmente
como musculação. Os exercícios de força podem ser estáticos
(ou isométricos) ou dinâmicos (ou isotônicos). Contrações
491
Gualano et al.
Tabela 1
Exame de pré-participação em programas de exercício físico e esporte para
crianças e adolescentes com doença reumatológica pediátrica
Anamnese
O que avaliar?
Sintomas e doenças atuais
Dor articular, lombalgia, fadiga, asma, diabetes mellitus, hipertensão arterial e baixa massa óssea
Medicamentos
Anti-infl amatórios não hormonais, glicocorticoides, imunossupressores e imunobiológicos
Antecedentes pessoais
Lesões osteomioarticulares, doenças e cirurgias prévias
Antecedentes familiares
Doença cardiovascular, morte súbita e osteoporose
Exame físico
O que avaliar?
Geral
Peso, estatura, índice de massa corpórea (IMC) e composição corporal
Cardiopulmonar
Sopros cardíacos, arritmias e hipertensão arterial e broncoespasmo
Musculoesquelético
Escoliose, hiperlordoses lombar e cervical, diferença de comprimento de membros
inferiores, joelhos (valgo, varo e recurvatum), pés (normais, cavos ou planos), encurtamentos
e hipotrofi as musculares, mobilidade articular (hipermobilidade ou deformidade),
alterações na marcha (hiperpronação ou supinação durante a marcha)
Adaptado de Rice46 e Garrick47.
musculares isométricas referem-se àquelas em que a resistência
externa se iguala à força interna (produzida pelos músculos), de
modo que não há movimento articular. Contrações musculares
concêntricas referem-se àquelas em que a força interna supera
a resistência externa. As contrações excêntricas referem-se
àquelas em que a resistência externa supera a força interna.
Intensidade do treinamento de força – A intensidade pode
ser definida como alta quando a resistência externa é ≥ 75%
da carga que pode ser “levantada” uma única vez (≥ 75% de
1-RM [uma repetição máxima]), e moderada se a resistência
externa situa-se entre 50%-74% de 1-RM.
Exame de pré-participação – É uma consulta médica que
inclui extensa anamnese clínica e exame físico detalhado,
incluindo a avaliação osteoarticular e postural. O objetivo
desse exame minucioso é detectar qualquer alteração física que
contraindique ou limite a prática de exercício físico. A Tabela 1
apresenta exemplo de anamnese que pode ser empregada pelo
reumatologista pediátrico em um exame de pré-participação.
REPOUSO OU ATIVIDADE FÍSICA: O QUE
É MELHOR PARA SEU PACIENTE?
Apesar do vasto corpo de conhecimento indicando que o exercício físico é capaz de prevenir e tratar a maioria das doenças
crônicas – ao passo que o sedentarismo é o principal fator de
risco que as predispõe –, é relativamente comum observar a
recomendação de repouso a pacientes com doenças reumatológicas como forma de evitar a atividade da doença ou o desgaste
articular.12 A eficácia de tal medida tem sido questionada. De
fato, há evidências de que pacientes com artrite reumatoide
engajados em programas de exercícios físicos regulares
492
apresentam menor frequência de dor e de rigidez articular
e melhor desempenho em atividades da vida diária quando
comparados a seus pares fisicamente inativos.18
Nas últimas décadas, crianças e adolescentes têm-se
tornado cada vez mais sedentários. Concomitantemente,
tem-se observado um aumento substancial na incidência de
doenças crônicas pediátricas, tais como obesidade juvenil,
hipertensão arterial, diabetes mellitus tipo II e asma.19 De
fato, especula-se que a inatividade física esteja intimamente
relacionada a dislipidemia, resistência à insulina, baixa massa
óssea, fraqueza e atrofia musculares, ganho de adiposidade,
aumento de pressão arterial, baixa qualidade de vida e autoestima reduzida.19
Os pacientes reumatológicos pediátricos apresentam diversas manifestações clínicas, como fadiga, dor crônica, rigidez,
sinovite e deformidades articulares, que predispõem ao estilo
de vida sedentário.7 Dessa forma, configura-se um perigoso
círculo vicioso, no qual os sintomas apresentados pelos pacientes levam à inatividade física que, por sua vez, agrava o
quadro clínico dos mesmos. Nesse contexto, o exercício físico
torna-se a única estratégia capaz de romper tal círculo.7 Por
isso médicos, enfermeiros e profissionais de educação física
são fortemente encorajados a recomendar atividade física para
pacientes com doenças reumatológicas pediátricas.
O mesmo papel cabe aos pais, que tendem a superproteger
seus filhos acometidos por doenças crônicas isolando-os do
convívio social e, dessa forma, predispondo-os a um estilo de
vida sedentário. Mesmo diante de uma doença ativa, estudos
em adultos têm indicado que o exercício físico – devidamente
adaptado ao paciente – pode ser seguro e eficaz.20 Não há razão para acreditar que em crianças a resposta seja diferente.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):484-496
Efeitos terapêuticos do treinamento físico em pacientes com doenças reumatológicas pediátricas
Tabela 2
Contraindicações à prática de exercícios físicos para crianças
e adolescentes com doença reumatológica pediátrica
1 - Febre
2 - Anemia
3 - Insuficiência renal aguda
4 - Cardite, serosites e resposta isquêmica ao teste de esforço*
5 - Arritmias e hipertensão arterial não controladas
6 - Desnutrição grave com perda maior que 35% do peso corporal
*É permitido exercício cuja intensidade seja 10% abaixo do limiar de isquemia. Em caso de
deformidades articulares, artrite ou miosite aguda, os exercícios devem ser adaptados de modo a
resguardar a articulação e o grupamento muscular afetados.
Indubitavelmente, os benefícios da atividade física compensam
sobremaneira os efeitos deletérios da inatividade física e, salvo
em algumas condições resumidas na Tabela 2, o paciente com
doença reumatológica pediátrica deve realizar exercícios físicos.
EVIDÊNCIAS PARA PRESCRIÇÃO DE EXERCÍCIOS
EM DOENÇAS REUMATOLÓGICAS PEDIÁTRICAS
A seguir descrevemos as manifestações clínicas e os déficits
de capacidade física apresentados por pacientes com AIJ,
DMJ, LESJ e FMJ e outras causas de dor musculoesquelética
idiopática crônica, que constituem o referencial teórico para
o emprego do exercício físico como agente terapêutico em
doenças reumatológicas pediátricas. Os resultados de estudos
clínicos envolvendo exercício nas doenças mencionadas anteriormente também serão analisados.
Artrite idiopática juvenil
Há evidências de que pacientes com AIJ poliarticular – mas
não oligoarticular – possuem redução nas capacidades aeróbia
e anaeróbia.21 Além disso, tem-se demonstrado que crianças
com AIJ apresentam baixa força isométrica com relação a
seus pares saudáveis.22 Acredita-se que a redução na força,
frequentemente observada em AIJ, esteja relacionada com o
quadro de atrofia muscular que, por sua vez, está associado à
artrite localizada, ao uso crônico de glicocorticoides e ao desuso. Takken et al.23 também observaram associação positiva
entre a capacidade anaeróbia e a função muscular em pacientes
com AIJ, sugerindo que o descondicionamento físico afeta as
atividades cotidianas nessa doença.
Estudos envolvendo programas de exercício físico têm
produzido resultados bem satisfatórios em pacientes com AIJ.
Em recente revisão, Klepper15 demonstrou que os benefícios
mais importantes relatados foram aumento de força e de
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):484-496
flexibilidade e melhora em dor, rigidez articular e qualidade
de vida. Os protocolos de treinamento físico variaram em
intensidade (60%-70% da FC máx), duração (30-60 minutos),
frequência (1-3 sessões por semana), composição (treinamento
de força, aeróbio, flexibilidade, modalidades esportivas ou a
combinação dos anteriores) e seguimento (6-20 semanas).
Interessante notar que os exercícios físicos em meio aquático
promovem benefícios semelhantes aos realizados na superfície.24 Da mesma forma, programas de alta e baixa intensidade
parecem ser igualmente efetivos e seguros.25 De fato, não há
relatos de eventos adversos decorrentes do treinamento físico
em pacientes com AIJ, e estes devem ser estimulados.
Dermatomiosite de início juvenil
Pacientes com DMJ frequentemente apresentam grande intolerância ao esforço físico.26,27 Há diversos fatores que podem
explicar esse achado, dentre os quais se destacam: aumento das
concentrações musculares de citocinas inflamatórias, inflamação
sistêmica e dos capilares que irrigam o musculoesquelético,
hipoatividade, e uso crônico de glicocorticoides, que, sabidamente, comprometem a síntese proteica e aumentam o acúmulo
de gordura corporal.27 Além disso, estudos com espectroscopia
por ressonância magnética têm indicado anormalidades bioenergéticas (p. ex., redução de 35%-40% nas concentrações
intramusculares de fosforilcreatina) em crianças com DMJ.28
Em adultos com dermatomiosite o treinamento aeróbio e
de força é capaz de aumentar a força e a função muscular, o
condicionamento aeróbio e a massa magra tanto em pacientes
com a doença controlada quanto naqueles em atividade.12 A
despeito do potencial terapêutico do exercício em DMJ, não
há estudos controlados.
Nosso grupo recentemente demonstrou que uma criança
com DMJ crônica respondeu a programa supervisionado de
treinamento de força combinado a aeróbio de maneira similar
à sua irmã gêmea homozigótica saudável.29 Nesse estudo, a
paciente apresentou melhoras clinicamente significantes nas
forças dinâmica e isométrica, além de aumento no condicionamento aeróbio. Embora o treinamento físico tenha sido
incapaz de reverter por completo os déficits de capacidade
física, essa foi a primeira evidência, de nosso conhecimento,
de que o exercício regular pode ser efetivo e bem tolerado por
uma criança com DMJ. Certamente, trata-se de intervenção
promissora que carece de investigações adicionais.
Lúpus eritematoso sistêmico de início juvenil
Pacientes com LESJ comumente apresentam intolerância
ao esforço, fraqueza muscular e fadiga exacerbada quando
493
Gualano et al.
comparados a seus pares saudáveis.7,30 Além disso, obesidade, dislipidemia, resistência à insulina e baixa massa óssea
são características prevalentes nessa doença.7,31 Tendo em
vista o amplo espectro de ação do exercício físico, torna-se
plausível especular que essa estratégia possa melhorar força,
tolerância ao esforço, condicionamento aeróbio, composição corporal e qualidade de vida em pacientes com LESJ.
Surpreendentemente, entretanto, não há trabalhos controlados
confirmando essa possibilidade.
Nosso grupo tem investigado os efeitos do treinamento
aeróbio em crianças e adolescentes com LESJ. Um dos pacientes mereceu destaque, pois também fora diagnosticado
com síndrome antifosfolípide (SAF, com tromboses venosa
profunda de membro inferior e de veia cava), secundária ao
LESJ e em uso de anticoagulação com warfarin. O paciente
em questão foi submetido a treinamento aeróbio, intensamente
supervisionado, ao longo de três meses. Um aspecto relevante observado evolutivamente foi benefício substancial no
condicionamento aeróbio, com aumento no VO2 máx, maior
tolerância ao esforço e melhor economia de corrida. Além
disso, o treinamento também beneficiou qualidade de vida,
funcionalidade e autoestima do paciente. Embora o sangramento induzido por trauma fosse uma preocupação constante ao
longo do treinamento, é importante salientar que nenhum efeito
adverso foi documentado. Estudo prospectivo com população
expressiva de LESJ está em andamento.
Fibromialgia de início juvenil e outras causas
de dor musculoesquelética idiopática crônica
Pacientes com FMJ podem apresentar dor crônica difusa, distúrbios do sono, ansiedade crônica, tensão, cefaleia, fadiga e
baixa qualidade de vida.32,33 Novamente, é possível especular
que programa regular de treinamento físico possa melhorar
função muscular, dor, qualidade do sono e qualidade de vida
nessa doença.
Encontramos apenas um estudo conduzido com essa
população. Stephens et al.34 investigaram eficácia e exequibilidade de um programa de treinamento físico em crianças e
adolescentes com FMJ ao longo de 12 semanas. Os pacientes
foram aleatoriamente indicados a um programa de treinamento
aeróbio de alta ou baixa intensidade. Ambos os grupos apresentaram melhoras na função muscular, nos sintomas inerentes
à doença, na qualidade de vida e na dor, embora os pacientes
submetidos ao treinamento mais intenso tenham experimentado
ganhos em maior número de parâmetros clínicos. Esses achados confirmam os benefícios esperados do treinamento físico
em FMJ e reforçam a necessidade de novos estudos nessa área.
494
Hipoteticamente, o treinamento físico também poderia
ser terapêutico em outras causas de dor musculoesquelética
idiopática, não inflamatória e crônica. Um exemplo é a dor
relacionada ao uso prolongado de computadores e videogames,
conhecida nos adultos como lesões de esforços repetitivos
(LER) ou distúrbio osteomuscular relacionado ao trabalho
(DORT). Com o advento da informatização, crianças e adolescentes têm passado cada vez mais tempo diante de aparelhos
tecnológicos. Como consequência, tornam-se indivíduos fisicamente inativos, mais propensos a dor crônica, tendinites e
síndrome miofascial.33 A prática regular de atividade física, o
fortalecimento muscular e a flexibilidade articular poderiam
ao menos atenuar esses sintomas.
Outra possível causa de dor musculoesquelética é a hipermobilidade articular (HA). A associação da HA com dor e/ou
lesões do sistema musculoesquelético constitui a síndrome de
hipermobilidade articular benigna (SHAB), não relacionada
com entidades congênitas, como síndrome de Marfan e síndrome de Ehlers-Danlos. Um estudo realizado pelo nosso grupo
em uma escola de São Paulo encontrou prevalência de SHAB
de 10% em adolescentes.32 É interessante notar que diversos
estudos35-38 – embora não todos39 – sugerem que pacientes
com SHAB podem apresentar menores níveis de atividade
física e de tolerância ao esforço, fraqueza muscular, distúrbios
neuromusculares e retardo no desenvolvimento motor, quando
comparados a seus pares saudáveis. Nesse contexto, evidências
recentes40,41 têm indicado que a combinação de exercícios de
força dinâmicos e isométricos promovem ganhos de propriocepção, força, equilíbrio, função muscular, redução de dor e
melhora na qualidade de vida em pacientes com SHAB. Esses
dados sugerem que a prática de atividade física pode ser de
grande valia para esses pacientes, porém novos estudos controlados com populações maiores são necessários para confirmar
esses achados iniciais.
PERSPECTIVAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo das últimas décadas, a taxa de sobrevivência e o
prognóstico de pacientes com doenças reumatológicas pediátricas têm melhorado sobremaneira. Todavia, tem crescido
a preocupação com os eventos adversos de curto, médio e
longo prazos – decorrentes do tratamento farmacológico ou da
doença per se – que afetam negativamente a capacidade física
e a qualidade de vida dos pacientes.31,42,43 Frente ao imenso
potencial terapêutico do exercício físico no tratamento dessas
doenças, chega a surpreender o limitado número de estudos
existentes. Dessa forma, há diversas hipóteses que precisam
ser mais bem investigadas.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):484-496
Efeitos terapêuticos do treinamento físico em pacientes com doenças reumatológicas pediátricas
Em primeiro lugar, há clara necessidade de realização de
ensaios clínicos aleatorizados destinados a investigar os efeitos
terapêuticos do exercício em todas as doenças reumatológicas
pediátricas, incluindo desfechos robustos, como qualidade de
vida, e seguimentos longos (p. ex., > 1 ano). Além disso, cabe
destacar que a presença de grupo-controle é de suma importância. O curso natural instável de muitas doenças reumatológicas
pediátricas, aliado às alterações de composição corporal e
capacidade física peculiares ao processo de maturação sexual
na puberdade, podem levar a uma interpretação equivocada de
dados.
É muito improvável que um único tipo de exercício promova os maiores benefícios para todos os pacientes reumatológicos pediátricos. Tomando-se como exemplo a literatura
reumatológica adulta, sabe-se que o treinamento de força de
alta intensidade resulta em maiores ganhos de força e massa
magra em pacientes com miopatias idiopáticas inflamatórias,12
ao passo que o treinamento aeróbio de baixa intensidade produz
melhores resultados clínicos em pacientes fibromiálgicos.44
Empiricamente, tem-se recomendado o treinamento isométrico
em detrimento do dinâmico, com o intuito de evitar dano articular. Contudo, tal recomendação não encontra embasamento
científico; de fato, o segundo tipo de treinamento poderia ser
até mesmo superior ao primeiro no que tange ao desempenho
funcional nas atividades da vida diária. Portanto, devem-se
explorar os tipos ideais de treinamento para as doenças reumatológicas pediátricas, tendo em mente as manifestações
clínicas e as limitações funcionais inerentes a cada uma delas.
Por fim, conforme destacado em recente revisão,45 o treinamento físico regular é capaz de atenuar a inflamação sistêmica
em doenças crônicas. Os possíveis efeitos anti-inflamatórios
do exercício poderiam ser de grande valia em doenças reumatológicas pediátricas, possivelmente reduzindo o número e/ou
as doses de drogas imunossupressoras.
A despeito das limitações encontradas na literatura, já
existe um corpo de conhecimento suficiente para considerar o
exercício físico como agente terapêutico em doenças crônicas
reumatológicas. Clinicamente, a compreensão da ciência do
exercício torna-se tarefa fundamental para o reumatologista
pediátrico, que passa a ter em mãos uma valiosa ferramenta
terapêutica. No que tange à pesquisa científica, abre-se uma
nova e promissora avenida de investigação a ser explorada.
Tecnológico – CNPq (Grant 300248/2008-3 para CAS) e
Federico Foundation (para CAS).
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
AGRADECIMENTOS
Este estudo teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo – FAPESP (Grant 2010/51428-2 para
HR), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):484-496
Katzmarzyk PT, Janssen I. The economic costs associated with
physical inactivity and obesity in Canada: an update. Can J Appl
Physiol 2004; 29(1):90-115.
Gregg EW, Pereira MA, Caspersen CJ. Physical activity, falls, and
fractures among older adults: a review of the epidemiologic evidence.
J Am Geriatr Soc 2000; 48(8):883-93.
Grundy SM, Cleeman JI, Merz CN, Brewer HB, Jr., Clark LT,
Hunninghake DB et al. Implications of recent clinical trials for the
National Cholesterol Education Program Adult Treatment Panel III
guidelines. Circulation 2004; 110(2):227-39.
Lautenschlager NT, Almeida OP. Physical activity and cognition in
old age. Curr Opin Psychiatry 2006; 19(2):190-3.
Manini TM, Everhart JE, Patel KV, Schoeller DA, Colbert LH, Visser M
et al. Daily activity energy expenditure and mortality among older
adults. JAMA 2006; 296(2):171-9.
Warburton DE, Nicol CW, Bredin SS. Health benefits of physical
activity: the evidence. CMAJ 2006; 174(6):801-9.
Gualano B, Sá Pinto AL, Perondi B, Leite Prado DM, Omori C,
Almeida RT et al. Evidence for prescribing exercise as treatment in
pediatric rheumatic diseases. Autoimmun Rev 2010; 9(8):569-73.
Guadalupe-Grau A, Fuentes T, Guerra B, Calbet JA. Exercise and
bone mass in adults. Sports Med 2009; 39(6):439-68.
Zhang W, Nuki G, Moskowitz RW, Abramson S, Altman RD,
Arden NK et al. OARSI recommendations for the management of
hip and knee osteoarthritis: part III: Changes in evidence following
systematic cumulative update of research published through January
2009. Osteoarthritis Cartilage 2010; 18(4):476-99.
Ayán C, Martín V. Systemic lupus erythematosus and exercise.
Lupus 2007; 16(1):5-9.
Pinto AL, Oliveira NC, Gualano B, Christmann RB, Painelli VS,
Artioli GG et al. Efficacy and safety of concurrent training in
systemic sclerosis. J Strength Cond Res 2011; 25(5):1423-8.
de Salles Painelli V, Gualano B, Artioli GG, de Sá Pinto AL, Bonfá E,
Lancha Junior AH et al. The possible role of physical exercise on
the treatment of idiopathic inflammatory myopathies. Autoimmun
Rev 2009; 8(5):355-9.
Busch AJ, Schachter CL, Overend TJ, Peloso PM, Barber KA.
Exercise for fibromyalgia: a systematic review. J Rheumatol 2008;
35(6):1130-44.
Long AR, Rouster-Stevens KA. The role of exercise therapy in the
management of juvenile idiopathic arthritis. Curr Opin Rheumatol
2010; 22(2):213-7.
Klepper SE. Exercise in pediatric rheumatic diseases. Curr Opin
Rheumatol 2008; 20(5):619-24.
U.S. Department of Health and Human Services. Historical
background, terminology, evolution of recommendations, and
measurement. Chap. 2. In: Physical Activity and Health: A Report
of the Surgeon General. Atlanta, GA: U.S. Department of Health
and Human Services, Centers for Disease Control and Prevention,
National Center for Chronic Disease Prevention and Health
Promotion, 1996; p.20-1.
495
Gualano et al.
17. Morris PJ. Physical activity recommendations for children and
adolescents with chronic disease. Curr Sports Med Rep 2008;
7(6):353-8.
18. Buljina AI, Taljanovic MS, Avdic DM, Hunter TB. Physical and
exercise therapy for treatment of the rheumatoid hand. Arthritis
Rheum 2001; 45(4):392-7.
19. Hardy LL, Dobbins TA, Denney-Wilson EA, Okely AD, Booth ML.
Sedentariness, small-screen recreation, and fitness in youth. Am J
Prev Med 2009; 36(2):120-5.
20. Alexanderson H, Stenström CH, Jenner G, Lundberg I. The safety
of a resistive home exercise program in patients with recent onset
active polymyositis or dermatomyositis. Scand J Rheumatol 2000;
29(5):295-301.
21. van Brussel M, Lelieveld OT, van der Net J, Engelbert RH, Helders PJ,
Takken T. Aerobic and anaerobic exercise capacity in children with
juvenile idiopathic arthritis. Arthritis Rheum 2007; 57(6):891-7.
22. Giannini MJ, Protas EJ. Comparison of peak isometric knee extensor
torque in children with and without juvenile rheumatoid arthritis.
Arthritis Care Res 1993; 6(2):82-8.
23. Takken T, van der Net J, Helders PJ. Relationship between functional
ability and physical fitness in juvenile idiopathic arthritis patients.
Scand J Rheumatol 2003; 32(3):174-8.
24. Epps H, Ginnelly L, Utley M, Southwood T, Gallivan S, Sculpher M
et al. Is hydrotherapy cost-effective? A randomised controlled trial of
combined hydrotherapy programmes compared with physiotherapy
land techniques in children with juvenile idiopathic arthritis. Health
Technol Assess 2005; 9(39):iii-iv, ix-x, 1-59.
25. Singh-Grewal D, Schneiderman-Walker J, Wright V, Bar-Or O, Beyene J,
Selvadurai H et al. The effects of vigorous exercise training on physical
function in children with arthritis: a randomized, controlled, singleblinded trial. Arthritis Rheum 2007; 57(7):1202-10.
26. Takken T, Elst E, Spermon N, Helders PJ, Prakken AB, van der Net J.
The physiological and physical determinants of functional ability
measures in children with juvenile dermatomyositis. Rheumatology
(Oxford) 2003; 42(4):591-5.
27. Takken T, van der Net J, Helders PJ. Anaerobic exercise capacity in
patients with juvenile-onset idiopathic inflammatory myopathies.
Arthritis Rheum 2005; 53(2):173-7.
28. Park JH, Niermann KJ, Ryder NM, Nelson AE, Das A, Lawton AR
et al. Muscle abnormalities in juvenile dermatomyositis patients:
P-31 magnetic resonance spectroscopy studies. Arthritis Rheum
2000; 43(10):2359-67.
29. Omori C, Prado DM, Gualano B, Sallum AM, Sá-Pinto AL,
Roschel H et al. Responsiveness to exercise training in juvenile
dermatomyositis: a twin case study. BMC Musculoskelet Disord
2010; 11:270.
30. Houghton KM, Tucker LB, Potts JE, McKenzie DC. Fitness, fatigue,
disease activity, and quality of life in pediatric lupus. Arthritis Rheum
2008; 59(4):537-45.
31. Avcin T, Cimaz R, Silverman ED, Cervera R, Gattorno M, Garay S
et al. Pediatric antiphospholipid syndrome: clinical and immunologic
features of 121 patients in an international registry. Pediatrics 2008;
122(5):e1100-7.
32. Zapata AL, Moraes AJ, Leone C, Doria-Filho U, Silva CA. Pain and
musculoskeletal pain syndromes in adolescents. J Adolesc Health
2006; 38(6):769-71.
496
33. Zapata AL, Moraes AJ, Leone C, Doria-Filho U, Silva CA. Pain and
musculoskeletal pain syndromes related to computer and video game
use in adolescents. Eur J Pediatr 2006; 165(6):408-14.
34. Stephens S, Feldman BM, Bradley N, Schneiderman J, Wright V, SinghGrewal D, et al. Feasibility and effectiveness of an aerobic exercise
program in children with fibromyalgia: results of a randomized
controlled pilot trial. Arthritis Rheum 2008; 59(10):1399-406.
35. Engelbert RH, van Bergen M, Henneken T, Helders PJ, Takken T.
Exercise tolerance in children and adolescents with musculoskeletal
pain in joint hypermobility and joint hypomobility syndrome.
Pediatrics 2006; 118(3):e690-6.
36. Adib N, Davies K, Grahame R, Woo P, Murray KJ. Joint
hypermobility syndrome in childhood. A not so benign multisystem
disorder? Rheumatology (Oxford) 2005; 44(6):744-50.
37. Kirby A, Davies R. Developmental Coordination Disorder and Joint
Hypermobility Syndrome – overlapping disorders? Implications
for research and clinical practice. Child Care Health Dev 2007;
33(5):513-9.
38. Sahin N, Baskent A, Ugurlu H, Berker E. Isokinetic evaluation of
knee extensor/flexor muscle strength in patients with hypermobility
syndrome. Rheumatol Int 2008; 28(7):643-8.
39. Juul-Kristensen B, Kristensen JH, Frausing B, Jensen DV, Røgind H,
Remvig L. Motor competence and physical activity in 8-year-old
school children with generalized joint hypermobility. Pediatrics
2009; 124(5):1380-7.
40. Ferrell WR, Tennant N, Sturrock RD, Ashton L, Creed G, Brydson G
et al. Amelioration of symptoms by enhancement of proprioception
in patients with joint hypermobility syndrome. Arthritis Rheum
2004; 50(10):3323-8.
41. Sahin N, Baskent A, Cakmak A, Salli A, Ugurlu H, Berker E.
Evaluation of knee proprioception and effects of proprioception
exercise in patients with benign joint hypermobility syndrome.
Rheumatol Int 2008; 28(10):995-1000.
42. Kuczynski E, Silva CA, Cristófani LM, Kiss MH, Odone Filho V,
Assumpção Jr. FB. Quality of life evaluation in children and
adolescents with chronic and/or incapacitating diseases: a Brazilian
study. An Pediatr (Barc) 2003; 58(6):550-5.
43. Ruperto N, Lovell DJ, Quartier P, Paz E, Rubio-Pérez N, Silva CA
et al, Paediatric Rheumatology International Trials Organization,
Pediatric Rheumatology Collaborative Study Group. Abatacept
in children with juvenile idiopathic arthritis: a randomised,
double-blind, placebo-controlled withdrawal trial. Lancet 2008;
372(9636):383-91.
44. Häuser W, Klose P, Langhorst J, Moradi B, Steinbach M,
Schiltenwolf M et al. Efficacy of different types of aerobic exercise
in fibromyalgia syndrome: a systematic review and meta-analysis
of randomised controlled trials. Arthritis Res Ther 2010; 12(3):R79.
45. Mathur N, Pedersen BK. Exercise as a mean to control low-grade
systemic inflammation. Mediators Inflamm 2008; 2008:109502.
46. Rice SG, American Academy of Pediatrics Council on Sports
Medicine and Fitness. Medical conditions affecting sports
participation. Pediatrics 2008; 121(4):841-8.
47. Garrick JG. Preparticipation orthopedic screening evaluation. Clin
J Sport Med 2004; 14(3):123-6.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):484-496
ARTIGO DE REVISÃO
Expressão de proteínas reguladoras do complemento
CD55, CD59, CD35 e CD46 na artrite reumatoide
Amanda Kirchner Piccoli1, Ana Paula Alegretti2, Laiana Schneider3,
Priscila Schmidt Lora4, Ricardo Machado Xavier5
RESUMO
A artrite reumatoide (AR) é uma doença autoimune, associada à sinovite poliarticular inflamatória, que acomete principalmente as articulações periféricas. Cerca de 1% da população mundial é afetada, sendo duas a três vezes mais prevalente
em mulheres. Apresenta patogênese complexa e multifatorial. A sinóvia das articulações afetadas é infiltrada por linfócitos
T e B, macrófagos e granulócitos. A sinóvia reumatoide adquire características proliferativas, formando o pannus, e
invade a cartilagem articular e o osso, levando à destruição da arquitetura normal da articulação e à perda de função.
A diminuição da expressão de proteínas reguladoras do complemento (PCR) parece desempenhar papel importante na
atividade da AR, associada ao agravamento dos sintomas clínicos. A superativação do sistema complemento (SC) é a
causa da exacerbação da doença em vários modelos de doenças autoimunes. O presente artigo tem por objetivo revisar
os principais aspectos relacionados à regulação do SC na AR, a fim de propiciar melhor compreensão do potencial papel
desse sistema na fisiopatologia e na atividade da doença.
Palavras-chave: artrite reumatoide, proteínas do sistema complemento, ativação do complemento.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
ARTRITE REUMATOIDE
A artrite reumatoide (AR) é uma doença crônica de caráter
inflamatório que acomete, predominantemente, articulações
diartrodiais e estruturas periarticulares, podendo adquirir
caráter sistêmico. A AR acomete cerca de 1% da população
mundial, afetando duas a três vezes mais as mulheres.1
A etiologia da doença ainda não está completamente esclarecida. Entretanto, sabe-se que fatores ambientais e genéticos
contribuem para o desenvolvimento da AR. Nos estágios precoces da doença há proliferação e edema das células na camada
sinovial, com infiltração de células B e T, macrófagos e granulócitos. A sinóvia torna-se densa, e a articulação edemaciada
e dolorosa. Com a progressão, a proliferação sinovial leva à
formação do pannus, tecido com características invasivas da
cartilagem articular e do osso. A destruição da articulação é
irreversível. Osteoclastos reabsorvem o osso; há liberação de
enzimas proteolíticas, como metaloproteinases, agrecanases
e catepsinas, responsáveis pela destruição de constituintes da
matriz extracelular, incluindo proteoglicanos do osso e cartilagem.2 A neovascularização da camada sinovial circundante à
articulação e do pannus é evidente.3 Como resultado, a cartilagem e o osso perdem sua arquitetura normal e função, tornando
a articulação deformada, instável, dolorosa e inflamada.4
A hiperplasia sinovial é uma característica marcante
desses pacientes, com membranas proeminentes e projeções
Recebido em 15/03/2011. Aprovado, após revisão, em 16/06/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse. Suporte Financeiro: FIPE-HCPA.
Hospital de Clínicas de Porto Alegre – HCPA.
1.Mestranda em Ciências Médicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS; Biomédica do Serviço de Patologia Clínica do Hospital de
Clínicas de Porto Alegre – HCPA
2.Mestre em Ciências Médicas pela UFRGS; Farmacêutico Bioquímico do Serviço de Patologia Clínica do HCPA
3.Graduanda em Biomedicina pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre – UFCSPA; Estagiária do Serviço de Patologia Clínica do HCPA
4.Mestre em Ciências Médicas pela UFRGS; Pesquisadora do Serviço de Reumatologia do HCPA
5.PhD Professor, Departamento de Reumatologia do HCPA/UFRGS; Professor da Faculdade de Medicina da UFRGS; Chefe do Serviço de Reumatologia do HCPA
Correspondência para: Ricardo Machado Xavier, PhD. Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Serviço de Reumatologia. Rua Ramiro Barcelos, 2350, sala 645
– Santana. CEP: 90035-003. Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: [email protected]
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):497-510
503
Piccoli et al.
de vilosidades na sinóvia. A presença de autoanticorpos,
como o fator reumatoide (FR) e o anticorpo contra proteínas
citrulinadas no soro, confere caráter autoimune à doença. A
característica sistêmica é dada pelo acometimento potencial
de múltiplos órgãos, que pode ter associação com a presença
desses autoanticorpos; porém, esse mecanismo ainda não está
bem elucidado.1
SISTEMA COMPLEMENTO
O sistema complemento (SC) é composto por receptores e
reguladores ligados à membrana celular e diversas proteínas
plasmáticas que interagem com células e mediadores do sistema imune (Figura 1).5 Compreendem mais de 30 proteínas
que agem em sinergia para promover inflamação e dano direto
a células, a microrganismos e a tecidos identificados como
anormais por um anticorpo específico. A maioria das proteínas
é sintetizada no fígado; entretanto, células mieloides, fibroblastos, células epiteliais e endoteliais podem produzi-las.6
As evidências na literatura sugerem que o SC tem a capacidade de desempenhar função imunorregulatória importante
através do seu papel na imunidade humoral, modulação da
imunidade de células T e regulação da tolerância para antígenos próprios nucleares. Apesar de ser bem reconhecido
por seu papel altamente eficiente na defesa contra patógenos
como bactérias, células infectadas por vírus e parasitas, o SC
também vem chamando a atenção dos pesquisadores pelo seu
potencial de dano às células do próprio organismo, por ser um
sistema complexo composto por diversas moléculas efetoras
e receptoras que estão envolvidas em múltiplas respostas
imunológicas.7
A cascata do complemento (CC) pode ser dividida em quatro fases principais: ativação inicial do complemento, ativação
e amplificação da C3 convertase, ativação da C5 convertase e
formação do complexo de ataque à membrana celular (MAC
– do inglês, membrane attack complex). Uma vez ativada, a
CC gera moléculas efetoras que interagem com receptores
celulares de maneira indiscriminada. Entretanto, a progressão
da cascata é regulada por múltiplas moléculas reguladoras e
inibidoras em todos os níveis da cascata.7
Ativação inicial do complemento
O complemento é ativado por três diferentes vias. A via alternativa é espontaneamente e constantemente ativada na membrana celular, no plasma e em outros fluidos. A via clássica é
desencadeada por um anticorpo ligado ao antígeno-alvo. A via
da lectina é iniciada através da ligação da lectina ligadora de
manose, um componente solúvel do organismo, com carboidratos presentes na superfície do microrganismo-alvo. Em 2006,
Huber-Lang et al.8 relataram uma via adicional de ativação do
complemento independente da ação da C3, mediada pela ação
da trombina sobre a C5 convertase. Outras rotas de ativação do
Figura 1
O complemento pode ser ativado
através da via clássica, da via das
lectinas e da via alternativa. O componente C1 é composto de C1q, C1r
e C1s e reconhece o imunocomplexo
ligado à membrana celular. A lectina
ligante da manose (MBL) reconhece
certos carboidratos na membrana de
alguns patógenos específicos, e o C3b
reconhece carboidratos presentes na
membrana dos patógenos. Todas as
vias de ativação originam a formação
de C3 e C5 convertases, que geram
anafilatoxinas C3a e C5a, a opsonina
C3b e o MAC. O C3b também amplifica a via alternativa.
Figura adaptada de Kemper.5
504
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):497-510
Expressão de proteínas reguladoras do complemento CD55, CD59, CD35 e CD46 na artrite reumatoide
Tabela 1
Principais funções inibidoras das proteínas reguladoras do complemento CD55/CD59
Proteína
Função regulatória do complemento
CD55
Inibe a clivagem de C3 e C5 através da inibição da formação de novas C3 e C5 convertases,
além de acelerar a degradação destas enzimas pré-formadas.
CD59
Interfere diretamente na estruturação do MAC através de sua incorporação física ao complexo
em formação, impedindo a ligação das unidades de C9 ao complexo C5b-8.
CD46
Liga-se às opsoninas C3b e C4b, agindo como cofator na sua degradação proteolítica através da serina-protease fator I.
CD35
Interage com o C3b e C4b para promover a fagocitose mediada por neutrófilos. Atua como
cofator para inativar o C3b e o C4b a iC3b e iC4b através do fator I.
complemento ocorrem através de proteases, como a plasmina,
a calicreína plasmática e a elastase, que clivam e ativam C3.9
A ativação de cada uma dessas vias resulta na primeira enzima
da cascata, a C3 convertase.
C3 convertase e amplificação
A C3 convertase cliva o componente central do complemento
C3 em C3a, um peptídeo anafilático e antimicrobiano, e na
opsonina C3b. Nas vias clássica e da lectina, a C3 convertase é
formada por um fragmento de C4b e C2a (C4b2a), ao passo que
na via alternativa o C3b e o fator Bb fazem parte desta enzima
(C3bBb).9 A clivagem é seguida por uma reação de amplificação que gera convertases de C3 adicionais, levando ao depósito de mais C3b nas proximidades de onde são geradas.9 Os
fragmentos de C3b revestem superfícies microbianas ou restos
celulares em processo apoptótico e sinalizam essas partículas
para rápida fagocitose. Na superfície da membrana das células
próprias intactas, sob condições normais, o depósito de C3b é
prevenido pelas proteínas reguladoras do complemento (PCR),
que impedem a progressão da cascata. Subsequentemente, o
C3b é inativado e degradado. Seus produtos de degradação
intermedeiam outras importantes funções efetoras.7,9
C5 convertase
Se a ativação progride, uma nova enzima é gerada – a C5
convertase (C4b2a3b para as vias clássica e da lectina, e
C3bBbC3b para a via alternativa). Esta enzima cliva C5,
liberando o poderoso peptídeo anafilático C5a e o fragmento
indutor da fase terminal, C5b.7,9
Formação do MAC
O C5b recruta os componentes C6, C7, C8 e C9 para a
superfície-alvo. A mudança de conformação dessas proteínas
solúveis e hidrofílicas e sua agregação induzem a formação de
um complexo, em que a unidade funcional é um poro inserido
na bicamada fosfolipídica que interfere na propriedade de
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):497-510
permeabilidade seletiva da membrana, permitindo a entrada de
água, íons e pequenas moléculas para o citosol, levando à lise
celular.10 Estudos recentes têm reportado funções adicionais
ao MAC, incluindo atividade estimulatória sobre as células T
helper e na ativação plaquetária.11,12
Em uma reação inflamatória aguda, o complemento atua
em todas as fases: através da ativação de mediadores pró-inflamatórios, produção de peptídeos anafiláticos, componentes
citolíticos e antimicrobianos, no recrutamento de células e na
indução de respostas efetoras. Apresenta ainda outras atividades biológicas no organismo, como opsonização e fagocitose,
solubilização e remoção de imunocomplexos (IC) e de células
apoptóticas, ação como interface entre a imunidade inata e
adaptativa. Participa também da angiogênese, da mobilização de células progenitoras hematopoéticas, da regeneração
tecidual e do metabolismo de lipídeos. Esses efeitos ocorrem
através da ligação dos produtos de ativação com receptores de
membrana específicos presentes em diferentes tipos de células.9
Proteínas reguladoras do complemento
CD55, CD59, CD46 e CD35
Para prevenir a lesão mediada pelo complemento, as células
normais possuem mecanismos regulatórios constituídos por
proteínas categorizadas em duas grandes classes: solúveis nos
líquidos biológicos, como a properdina e o fator H, e ancoradas
à membrana celular, como o CD55 (ou fator acelerador de
degradação – DAF, do inglês, decay-accelerating factor), o
CD59 (ou inibidor da lise de membrana ou protectina – MIRL,
do inglês, membrane inhibitor of reactive lysis), o CD46 (ou
proteína cofator de membrana – MCP, do inglês, membrane
cofactor protein) e o CD35 (ou receptor do complemento
tipo 1 – CR1) (Tabela 1).13
As proteínas reguladoras ancoradas à membrana celular
controlam as três vias de ativação do complemento. Já os
reguladores solúveis são mais específicos e controlam ou a
via alternativa ou a via clássica ou a da lectina, agindo quase
exclusivamente sobre C3 ou C4. Nesta revisão abordaremos,
505
Piccoli et al.
exclusivamente, as proteínas reguladoras ancoradas à membrana celular.
O mecanismo de ação e a maneira como essas proteínas
se fixam na membrana celular são diferentes entre si. O
CD55 impede a clivagem de C3 e C5 através da inibição da
formação de novas convertases de C3 e C5, além de acelerar
a degradação dessas enzimas pré-formadas.14 A proteína CD59
interfere diretamente na estruturação do MAC através de sua
incorporação física no complexo em formação, impedindo a
ligação das unidades de C9 ao complexo C5b-8.15 Já o CD46
e o CD35 atuam na inativação de C3b e C4b. O CD35 atua
também no processamento e na limpeza dos IC.13
O CD55 é uma glicoproteína globular ancorada à membrana pelo glicosilfosfatidilinositol (GPI).13 É expressa em
diferentes tipos celulares e encontrada sob forma solúvel na
lágrima, saliva, urina, líquido sinovial, líquor e plasma.16 Em
adição à sua função de regulação do complemento, atua como
modulador negativo da resposta da célula T17 e parece proteger
as células contra a lise mediada por células matadoras naturais
(NK – natural killers).18 Na mucosa epitelial, o CD55 regula o
movimento dos neutrófilos através das camadas do epitélio.19
Atua ainda como ligante de adesão intercelular, interagindo
com CD97 nos leucócitos,20 e como receptor para certos vírus
e microrganismos.21
O CD59 é também uma glicoproteína globular ancorada à
membrana pela GPI. Pelo fato de desempenhar papel crucial
na prevenção de danos às células próprias pela deposição inapropriada do MAC, esta proteína é amplamente expressa na
maioria dos tecidos e em todas as células circulantes, como na
sinóvia, nos eritrócitos e leucócitos. Seu papel na regulação do
complemento é bem definido. Entretanto, têm-se evidenciadas
propriedades de sinalização celular devido à sua localização
dentro das camadas de lipídeos – centrais para a formação
da sinapse imunológica.22 O CD59 parece estar envolvido na
adesão e ativação das células T,23 ativação de neutrófilos via
tirosina quinase24 e na indução da morte celular.25 Além do
mais, Omidvar et al.,26 avaliando o significado do CD59 nas
células-alvo na modulação da citotoxicidade, encontraram uma
suscetibilidade aumentada das células-alvo que expressavam
CD59 à lise mediada por células NK.
O MCP, ou CD46, é uma proteína transmembrana expressa
em todas as células, exceto nos eritrócitos.13 Sua função primordial é proteger as células autólogas do ataque do complemento,
através da degradação de C3. Liga-se às opsoninas C3b e C4b,
agindo como cofator em sua degradação proteolítica através da
serina-protease fator I.13 Além de seu papel na imunidade inata,
o CD46 também regula a resposta imune adquirida. A coestimulação de células T CD4+ com CD46 induz à proliferação
506
dessas células e à diferenciação a uma classe específica de
células T reguladoras, chamadas de Tr127 e caracterizadas
pela expressão de interferon γ (IFNγ), interleucina 10 (IL10)
e outras moléculas.28
Alterações nas moléculas de superfície durante a apoptose,
pela perda de CD46 e CD59, permitem a morte celular devido à
ativação do complemento e consequente opsonização por C3b
e C4b, seguida pela fagocitose.7 O CD46 é um receptor para
uma lista crescente de patógenos humanos, como herpes vírus
humano 6, vírus do sarampo, Streptococcus pyogenes, adenovírus, Neisseria sp.29-31 A ubiquidade da expressão de superfície,
a atividade regulatória e a sinalização celular contribuem para
o CD46 ser alvo de múltiplos patógenos.32
A formação e o acúmulo de IC é um dos mecanismos imunes que ocorrem na AR e nas demais doenças autoimunes. Em
condições fisiológicas, esses complexos podem ser removidos
da corrente sanguínea através de receptores do complemento
(CR), como o CD35. O CD35 é uma glicoproteína transmembrana de cadeia simples33 que interage com o C3b e o C4b para
promover a fagocitose mediada por neutrófilos, e age como
cofator para inativar o C3b e o C4b a iC3b e iC4b através do
fator I.34 É expresso em diferentes tipos celulares, tais como
eritrócitos, células mieloides e linfoides.35 Sua função biológica
varia conforme a célula em que é expresso.
Nas células fagocíticas, o CD35 medeia adesão e ingestão
de partículas revestidas por C3b e C4b, enquanto nos linfócitos
B e células dendríticas foliculares promove a localização e o
processamento do antígeno.36 Em humanos, 90% do total de
CD35 é encontrado nos eritrócitos, onde liga-se a microrganismos ou IC opsonizados por C3b ou C4b, processando e
transportando-os, através de fagócitos, até o fígado e o baço.37
Microrganismos como Leishmania, micobactérias e o HIV, ao
tornarem-se revestidos por C3b, utilizam o CD35 para entrar na
célula hospedeira.38 Mais recentemente, CD35 em eritrócitos
não infectados por Plasmodium falciparum foi identificado
como sendo receptor para os infectados.39
A relevância das PRC em humanos pode ser vista em
estudos da doença hemolítica adquirida, a hemoglobinúria
paroxística noturna (HPN), na qual mutações adquiridas na
célula-tronco hematopoética dão origem a uma linhagem de
células com bloqueio precoce da síntese de âncoras de GPI –
responsáveis por manter dezenas de proteínas com funções
específicas aderidas à membrana plasmática, entre elas CD55,
CD59 e CD46. A falência em sintetizar uma molécula madura
de GPI gera ausência de todas as proteínas de superfície normalmente ancoradas por ela.40
Há poucos relatos na literatura sobre o perfil de expressão
normal dessas proteínas nas células sanguíneas. Em 2001,
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):497-510
Expressão de proteínas reguladoras do complemento CD55, CD59, CD35 e CD46 na artrite reumatoide
Oelschlaegel et al.41 analisaram, por citometria de fluxo (CF),
amostras de 52 doadores de sangue saudáveis e obtiveram
um valor de referência de 3% de deficiência de CD55/CD59
nos eritrócitos e granulócitos circulantes. Christmas et al.42
relataram alterações nos níveis de expressão das proteínas regulatórias CD46, CD55 e CD59 em monócitos e subpopulações
de linfócitos após ativação com fito-hemaglutinina (FHA) e
lipopolissacarídeos (LPS). Apenas os monócitos apresentaram
uma elevação uniforme dos reguladores após ativação com
FHA e, com exceção do CD46, usando os LPS. Esses dados
reforçam o conceito de que a regulação da expressão destas
proteínas regulatórias não é coordenada e nem uniforme nas
diferentes subpopulações leucocitárias.43
Papel do complemento e das proteínas
CD55/CD59/CD46/CD35 na AR
Na AR, a ativação do complemento ocorre inicialmente pela
via clássica, devido à presença de autoanticorpos, IC e células
apoptóticas na articulação. Tem-se evidenciado também o envolvimento da via alternativa devido à presença de fragmentos
Bb no líquido sinovial. Esta via pode tornar-se ativa através do
FR tipo Imunoglobulina A (IgA), presente em alguns pacientes
com AR e/ou colágeno tipo-II, específico para a cartilagem, o
qual é exposto como resultado da proteólise durante o curso da
doença. Níveis elevados de produtos de ativação do complemento, como o MAC, liberação de anafilatoxinas C3a e C5a
e o aumento do consumo de C3 e C4 podem ser detectados no
líquido sinovial. Portanto, a superativação do SC e a ausência
ou diminuição na expressão de PCR são fatores que contribuem
para a exacerbação da doença.1
Possivelmente, para controlar a excessiva ativação do
complemento na articulação, o tecido sinovial expressa as
PRC. Análises da expressão das PRC na sinóvia reumatoide
revelaram aumento de CD5544 e diminuição do CD59 quando
comparada com a sinóvia não inflamada.45 Esses achados
sugerem que o CD59 possa ser a chave da proteção da membrana sinovial, e sua perda poderia estar associada à maior
suscetibilidade ao dano pelo MAC.
Williams et al.46 investigaram o papel do CD59 na proteção
do tecido articular em modelo murino de artrite induzida por
antígeno (AIA). Nesse estudo foi observado que camundongos
com deficiência em CD59 apresentaram maior deposição de
MAC e maior dano articular com relação aos controles CD59+.
Para confirmar se a exacerbação da doença era devido à ausência de CD59 na articulação, esses autores reconstituíram a
expressão de CD59 utilizando CD59 membrana-alvo recombinante (sCD59-APT542). Com isso, foi observada melhora no
grupo tratado com sCD59-APT542 com relação ao grupo que
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):497-510
recebeu CD59 recombinante não alvo (sCD59). Dessa forma,
o estudo demonstrou que o MAC é um dos maiores efetores
do dano articular no modelo AIA.
Já um estudo realizado por Hoeck et al.47 avaliando a
deleção de CD55 e/ou D97 identificou que camundongos
com deficiência de CD55 apresentam redução na atividade da
AR, diferente do que ocorre em outras doenças em que essa
deficiência parece ser um agravante. O CD55, presente nos sinoviócitos tipo fibroblastos (SF), liga-se ao receptor helicoidal
de adesão, CD97, presente nos macrófagos que estão migrando
para a articulação, exacerbando a inflamação. Segundo os
autores, camundongos deficientes em CD55, CD97 ou que
obtiveram o bloqueio da interação utilizando um anticorpo
anti-CD97 apresentaram diminuição da atividade da artrite.
Análises realizadas em articulações reumatoides revelaram
ser um ambiente hipóxico, relacionado com a proliferação
das células sinoviais e aumento da demanda metabólica,
combinados a oclusões periódicas nos microvasos e ciclos de
hipóxia-reoxigenação. Kinderlerer et al.48 reportaram que as
estatinas têm, além de efeitos anti-inflamatórios na AR, efeitos
citoprotetores, destacando melhora na regulação da expressão
das PRC e aumento da expressão de CD59 nas células endoteliais em situações de hipóxia após o uso de atorvastatina,
prevenindo, assim, a deposição de C3, C9 e a lise celular.
Na AR a inflamação não é restrita à articulação, mas ocorre
de forma sistêmica. Em 1992, Gadd et al.49 observaram um
significativo aumento na expressão de CD35 nos monócitos do
sangue periférico (SP) de pacientes com AR com relação aos
controles. Em contraste a esses dados, a expressão de CD35
nos monócitos do líquido sinovial (LS) foi significativamente
menor que a dos monócitos do SP. Segundo os autores, esses
dados indicam mudança sistêmica no imunofenótipo dos monócitos de pacientes com AR, permitindo assim o recrutamento
aos locais de inflamação.
Torsteinsdóttir et al.,50 ao avaliar a ativação dos monócitos
do SP de pacientes com AR, identificaram, por CF, uma elevada
expressão de CD35 nessas células com relação aos controles,
estando em concordância com o encontrado nos trabalhos de
McCarthy et al.51 e Gadd et al. 49 Após quatro a seis semanas de
tratamento com baixas doses de prednisolona, a expressão foi
normalizada. Segundo os autores, os monócitos dos pacientes
com AR mostraram sinais de ativação na circulação periférica,
relacionada com adesão e fagocitose e consequente infiltração
da sinóvia.
A infiltração da sinóvia por leucócitos envolve, além de
células mononucleares, neutrófilos. Jones et al.,52 com o objetivo de verificar se alterações na expressão de certas proteínas
atuam na migração dos neutrófilos para a articulação e na sua
507
Piccoli et al.
subsequente ativação e capacidade de sobreviver ao ataque do
complemento, avaliaram a expressão de CD59, CD55, CD46
e CD35 nos neutrófilos do SP e LS em pacientes com AR
e indivíduos saudáveis. Os autores identificaram expressão
diminuída nos neutrófilos do SP dos pacientes com relação à
dos controles de CD55, CD46 e CD35, e nenhuma diferença
significativa para CD59. Os neutrófilos do LS expressaram
significativamente mais CD55 e CD35 em comparação com
neutrófilos do SP; a expressão de CD46 foi menor e na de CD59
não houve diferença entre os grupos. Segundo os autores, a
diferença na expressão dessas moléculas conduz ao aumento
na adesividade, resistência ao complemento e maior capacidade
dos neutrófilos na remoção de IC.
Não está claro se essas alterações contribuem com a
doença ou são consequência do estado inflamatório crônico.
Entretanto, os dados sugerem que as PRC possam atuar sistematicamente para suprimir a atividade da doença associada à
descontrolada ativação do complemento na AR, semelhante ao
que ocorre em outras doenças autoimunes, conforme revisado
por Alegretti et al.53
Anticorpos produzidos nas doenças autoimunes se ligam
a antígenos de superfície celular ou formam IC após a ligação
com antígenos circulantes. Estes IC tendem a se depositar em
órgãos, com subsequente ativação do SC, causando danos aos
tecidos. Apesar da reconhecida ação efetora do complemento
no dano aos órgãos em doenças autoimunes, pouco se conhece sobre o mecanismo das PRC na modulação da gravidade
desse dano.13
Alguns estudos em pacientes com lúpus eritematoso
sistêmico (LES) têm demonstrado diminuição dessas PCR e
uma possível associação com a presença de citopenias nesses
pacientes. Richaud-Patin et al.54 demonstram uma redução
na intensidade de expressão de CD55 e CD59 na membrana
de eritrócitos de pacientes lúpicos com anemia hemolítica
autoimune (AHAI) secundária. O mesmo foi observado nos
linfócitos dos pacientes com linfopenia quando comparados
com os controles.55,56
CONCLUSÃO
Poucos estudos sobre o perfil de expressão de proteínas reguladoras do complemento CD55, CD46, CD35 e CD59 em
pacientes com AR são encontrados na literatura, e alguns são
controversos. A deficiência adquirida ou a superexpressão
dessas proteínas em algumas doenças autoimunes parecem
estar associadas à atividade da doença. Na AR, a maioria dos
estudos demonstra que o CD35 está aumentado nos monócitos
508
do sangue periférico, e apenas um estudo descreveu redução
de CD55, CD35 e CD46 nos neutrófilos do SP. As principais
hipóteses descritas nesses estudos, com o intuito de explicar
as alterações na expressão dessas moléculas, estão vinculadas
à ação principal como inibidoras da ativação exacerbada do
complemento, às funções imunorregulatórias ou de adesão
celular, aos fatores estimulatórios ou inibitórios que regulam
sua expressão, ou até mesmo à presença de enzimas específicas
que clivam a ligação dessas proteínas na membrana da célula.
O padrão de expressão das PCR em pacientes com AR ainda
não está bem estabelecido. Definir esse padrão de expressão
é importante para a avaliação do seu potencial significado no
desenvolvimento do processo inflamatório ou de citopenias
nesses pacientes, bem como para otimizar o uso de terapias
de depleção celular que envolvam ativação do SC, como por
exemplo, terapias anti-CD20.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
Okroj M, Heinegård D, Holmdahl R, Blom AM. Rheumatoid arthritis
and the complement system. Ann Med 2007; 39(7):517-30.
2. Lark MW, Bayne EK, Flanagan J, Harper CF, Hoerrner LA,
Hutchinson NI et al. Aggrecan degradation in human cartilage.
Evidence for both matrix metalloproteinase and aggrecanase activity
in normal, osteoarthritic, and rheumatoid joints. J Clin Invest 1997;
100(1):93-106.
3. Szekanecz Z, Gáspár L, Koch AE. Angiogenesis in rheumatoid
arthritis. Front Biosci 2005; 10:1739-53.
4. Smolen JS, Steiner G. Therapeutic strategies for rheumatoid arthritis.
Nat Rev Drug Discov 2003; 2(6):473-88.
5. Kemper C, Atkinson JP. T-cell regulation: with complement from
innate immunity. Nat Rev Immunol 2007; 7(1):9-18.
6. Wagner E, Frank MM. Therapeutic potential of complement
modulation. Nat Rev Drug Discov 2010; 9(1):43-56.
7. Zipfel PF, Skerka C. Complement regulators and inhibitory proteins.
Nat Rev Immunol 2009; 9(10):729-40.
8. Huber-Lang M, Sarma JV, Zetoune FS, Rittirsch D, Neff TA,
McGuire SR et al. Generation of C5a in the absence of C3: a new
complement activation pathway. Nat Med 2006; 12(6):682-7.
9. Ricklin D, Hajishengallis G, Yang K, Lambris JD. Complement: a
key system for immune surveillance and homeostasis. Nat Immunol
2010; 11(9):785-97.
10. Morgan BP. Complement membrane attack on nucleated cells:
resistance, recovery and non-lethal effects. Biochem J 1989;
264(1):1-14.
11. Bossi F, Fischetti F, Pellis V, Bulla R, Ferrero E, Mollnes TE et al.
Platelet-activating factor and kinin-dependent vascular leakage
as a novel functional activity of the soluble terminal complement
complex. J Immunol 2004; 173(11):6921-7.
12. Bossi F, Rizzi L, Bulla R, Debeus A, Tripodo C, Picotti P et al. C7 is
expressed on endothelial cells as a trap for the assembling terminal
complement complex and may exert anti-inflammatory function.
Blood 2009; 113(15):3640-8.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):497-510
Expressão de proteínas reguladoras do complemento CD55, CD59, CD35 e CD46 na artrite reumatoide
13. Kim DD, Song WC. Membrane complement regulatory proteins.
Clin Immunol 2006; 118(2-3):127-36.
14. Lublin DM, Atkinson JP. Decay-accelerating factor: biochemistry,
molecular biology, and function. Annu Rev Immunol 1989; 7:35-58.
15. Farkas I, Baranyi L, Ishikawa Y, Okada N, Bohata C, Budai D et al.
CD59 blocks not only the insertion of C9 into MAC but inhibits ion
channel formation by homologous C5b-8 as well as C5b-9. J Physiol
2002; 539(Pt 2):537-45.
16. Medof ME, Walter EI, Rutgers JL, Knowles DM, Nussenzweig V.
Identification of the complement decay-accelerating factor (DAF)
on epithelium and glandular cells and in body fluids. J Exp Med
1987; 165(3):848-64.
17. Heeger PS, Lalli PN, Lin F, Valujskikh A, Liu J, Muqim N et al.
Decay-accelerating factor modulates induction of T cell immunity.
J Exp Med 2005; 201(10):1523-30.
18. Finberg RW, White W, Nicholson-Weller A. Decay-accelerating
factor expression on either effector or target cells inhibits cytotoxicity
by human natural killer cells. J Immunol 1992; 149(6):2055-60.
19. Lawrence DW, Bruyninckx WJ, Louis NA, Lublin DM, Stahl GL,
Parkos CA et al. Antiadhesive role of apical decay-accelerating
factor (CD55) in human neutrophil transmigration across mucosal
epithelia. J Exp Med 2003; 198(7):999-1010.
20. Hamann J, Vogel B, van Schijndel GM, van Lier RA. The seven-span
transmembrane receptor CD97 has a cellular ligand (CD55, DAF).
J Exp Med 1996; 184(3):1185-9.
21. Pham T, Kaul A, Hart A, Goluszko P, Moulds J, Nowicki S et al.
DRA-related X adhesins of gestational pyelonephritis-associated
Escherichia coli recognize SCR-3 and SCR-4 domains of recombinant
decay-accelerating factor. Infect Immun 1995; 63(5):1663-8.
22. Kimberley FC, Sivasankar B, Paul Morgan B. Alternative roles for
CD59. Mol Immunol 2007; 44(1-3):73-81.
23. Deckert M, Kubar J, Bernard A. CD58 and CD59 molecules exhibit
potentializing effects in T cell adhesion and activation. J Immunol
1992; 148(3):672-7.
24. van den Berg CW, Cinek T, Hallett MB, Horejsi V, Morgan BP.
Exogenous glycosyl phosphatidylinositol-anchored CD59 associates
with kinases in membrane clusters on U937 cells and becomes
Ca(2+)-signaling competent. J Cell Biol 1995; 131(3):669-77.
25. Monleón I, Martínez-Lorenzo MJ, Anel A, Lasierra P, Larrad L,
Piñeiro A et al. CD59 cross-linking induces secretion of APO2 ligand
in overactivated human T cells. Eur J Immunol 2000; 30(4):1078-87.
26. Omidvar N, Wang EC, Brennan P, Longhi MP, Smith RA, Morgan BP.
Expression of glycosylphosphatidylinositol-anchored CD59 on target
cells enhances human NK cell-mediated cytotoxicity. J Immunol
2006; 176(5):2915-23.
27. Cardone J, Le Friec G, Vantourout P, Roberts A, Fuchs A, Jackson I
et al. Complement regulator CD46 temporally regulates cytokine
production by conventional and unconventional T cells. Nat Immunol
2010; 11(9):862-71.
28. Barchet W, Price JD, Cella M, Colonna M, MacMillan SK, Cobb JP et al.
Complement-induced regulatory T cells suppress T-cell responses but
allow for dendritic-cell maturation. Blood 2006; 107(4):1497-504.
29. Giannakis E, Jokiranta TS, Ormsby RJ, Duthy TG, Male DA,
Christiansen D et al. Identification of the streptococcal M protein
binding site on membrane cofactor protein (CD46). J Immunol
2002; 168(9):4585-92.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):497-510
30. Källström H, Blackmer Gill D, Albiger B, Liszewski MK, Atkinson JP,
Jonsson AB. Attachment of Neisseria gonorrhoeae to the cellular
pilus receptor CD46: identification of domains important for bacterial
adherence. Cell Microbiol 2001; 3(3):133-43.
31. Mori Y, Yang X, Akkapaiboon P, Okuno T, Yamanishi K. Human
herpesvirus 6 variant A glycoprotein H-glycoprotein L-glycoprotein
Q complex associates with human CD46. J Virol 2003; 77(8):4992-9.
32. Riley-Vargas RC, Gill DB, Kemper C, Liszewski MK, Atkinson JP.
CD46: expanding beyond complement regulation. Trends Immunol
2004; 25(9):496-503.
33. Erdei A, Prechl J, Isaák A, Molnár E. Regulation of B-cell activation
by complement receptors CD21 and CD35. Curr Pharm Des 2003;
9(23):1849-60.
34. Krych-Goldberg M, Atkinson JP. Structure-function relationships
of complement receptor type 1. Immunol Rev 2001; 180:112-22.
35. Roozendaal R, Carroll MC. Complement receptors CD21 and CD35
in humoral immunity. Immunol Rev 2007; 219:157-66.
36. Krych-Goldberg M, Hauhart RE, Subramanian VB, Yurcisin BM, 2nd,
Crimmins DL, Hourcade DE et al. Decay accelerating activity of
complement receptor type 1 (CD35). Two active sites are required
for dissociating C5 convertases. J Biol Chem 1999; 274(44):31160-8.
37. Pham BN, Kisserli A, Donvito B, Duret V, Reveil B, Tabary T et al.
Analysis of complement receptor Type 1 expression on red blood
cells in negative phenotypes of the Knops blood group system,
according to CR1 gene allotype polymorphisms. Transfusion 2010;
50(7):1435-43.
38. Cooper NR. Complement evasion strategies of microorganisms.
Immunol Today 1991; 12(9):327-31.
39. Krych-Goldberg M, Moulds JM, Atkinson JP. Human complement
receptor type 1 (CR1) binds to a major malarial adhesin. Trends Mol
Med 2002; 8(11):531-7.
40. Arruda MM, Rodrigues CA, Yamamoto M, Figueiredo MS.
Paroxysmal nocturnal hemoglobinuria: from physiopathology to
treatment. Rev Assoc Med Bras 2010; 56(2):214-21.
41. Oelschlaegel U, Besson I, Arnoulet C, Sainty D, Nowak R,
Naumann R et al. A standardized flow cytometric method for
screening paroxysmal nocturnal haemoglobinuria (PNH) measuring
CD55 and CD59 expression on erythrocytes and granulocytes. Clin
Lab Haematol 2001; 23(2):81-90.
42. Christmas SE, de la Mata Espinosa CT, Halliday D, Buxton CA,
Cummerson JA, Johnson PM. Levels of expression of complement
regulatory proteins CD46, CD55 and CD 59 on resting and activate
human peripheral blood leucocytes. Immunology 2006; 119(4):522-8.
43. Moutabarrik A, Nakanishi I, Namiki M, Hara T, Matsumoto M,
Ishibashi M et al. Cytokine-mediated regulation of the surface
expression of complement regulatory proteins, CD46(MCP),
CD55(DAF), and CD59 on human vascular endothelial cells.
Lymphokine Cytokine Res 1993; 12(3):167-72.
44. Hamann J, Wishaupt JO, van Lier RA, Smeets TJ, Breedveld FC, Tak PP.
Expression of the activation antigen CD97 and its ligand CD55 in
rheumatoid synovial tissue. Arthritis Rheum 1999; 42(4):650-8.
45. Konttinen YT, Ceponis A, Meri S, Vuorikoski A, Kortekangas P, Sorsa T
et al. Complement in acute and chronic arthritides: assessment of
C3c, C9, and protectin (CD59) in synovial membrane. Ann Rheum
Dis 1996; 55(12):888-94.
509
Piccoli et al.
46. Williams AS, Mizuno M, Richards PJ, Holt DS, Morgan BP. Deletion
of the gene encoding CD59a in mice increases disease severity in
a murine model of rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 2004;
50(9):3035-44.
47. Hoek RM, de Launay D, Kop EN, Yilmaz-Elis AS, Lin F, Reedquist KA
et al. Deletion of either CD55 or CD97 ameliorates arthritis in mouse
models. Arthritis Rheum 2010; 62(4):1036-42.
48. Kinderlerer AR, Steinberg R, Johns M, Harten SK, Lidington EA,
Haskard DO et al. Statin-induced expression of CD59 on vascular
endothelium in hypoxia: a potential mechanism for the antiinflammatory actions of statins in rheumatoid arthritis. Arthritis Res
Ther 2006; 8(4):R130.
49. Gadd SJ, Felzmann T, Majdic O, Maurer D, Petera P, Chen WJ et al.
Phenotypic analysis of functionally associated molecules on
peripheral blood and synovial fluid monocytes from arthritis patients.
Rheumatol Int 1992; 12(4):153-7.
50. Torsteinsdóttir I, Arvidson NG, Hällgren R, Håkansson L. Monocyte
activation in rheumatoid arthritis (RA): increased integrin, FC
gamma and complement receptor expression and the effect of
glucocorticoids. Clin Exp Immunol 1999; 115(3):554-60.
51. McCarthy D, Taylor MJ, Bernhagen J, Perry JD, Hamblin AS.
Leucocyte integrin and CR1 expression on peripheral blood
leucocytes of patients with rheumatoid arthritis. Ann Rheum Dis
1992; 51(3):307-12.
510
52. Jones J, Laffafian I, Cooper AM, Williams BD, Morgan BP.
Expression of complement regulatory molecules and other surface
markers on neutrophils from synovial fluid and blood of patients with
rheumatoid arthritis. Br J Rheumatol 1994; 33(8):707-12.
53. Alegretti AP, Mucenic T, Brenol JCT, Xavier RM. O papel das
proteínas reguladoras do complemento CD55/CD59 em células de
sangue periférico de pacientes com lúpus eritematoso sistêmico. Rev
Bras Reumatol 2009; 49(3):276-87.
54. Richaud-Patin Y, Pérez-Romano B, Carrillo-Maravilla E, Rodriguez AB,
Simon AJ, Cabiedes J et al. Deficiency of red cell bound CD55 and
CD59 in patients with systemic lupus erythematosus. Immunol Lett
2003; 88(2):95-9.
55. Alegretti AP, Mucenic T, Merzoni J, Faulhaber GA, Silla LM, Xavier RM.
Expression of CD55 and CD59 on peripheral blood cells from
systemic lupus erythematosus (SLE) patients. Cell Immunol 2010;
265(2):127-32.
56. García-Valladares I, Atisha-Fregoso Y, Richaud-Patin Y,
Jakez-Ocampo J, Soto-Vega E, Elías-López D et al. Diminished
expression of complement regulatory proteins (CD55 and CD59)
in lymphocytes from systemic lupus erythematosus patients with
lymphopenia. Lupus 2006; 15(9):600-5.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):497-510
RELATO DE CASO
Flegmasia cerúlea dolens em paciente com lúpus
eritematoso sistêmico no puerpério remoto
José Marques Filho1
RESUMO
As manifestações vasculares no lúpus eritematoso sistêmico não são raras, e grande parte dos casos está associada à
presença de anticorpos antifosfolípides. A flegmasia cerúlea dolens é uma incomum e grave complicação de trombose
venosa profunda de membros inferiores, com altas taxas de morbimortalidade. Encontramos na literatura apenas dois
casos de flegmasia cerúlea dolens associados à síndrome antifosfolípide, e não encontramos relatos associados ao lúpus
eritematoso sistêmico. Relatamos um caso de flegmasia cerúlea dolens, com rápida evolução para óbito, em paciente
com lúpus eritematoso sistêmico no puerpério remoto.
Palavras-chave: lúpus eritematoso sistêmico, período pós-parto, tromboflebite.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica, de natureza autoimune, que pode afetar múltiplos
sistemas e órgãos. O comprometimento vascular, tanto venoso
quanto arterial, não é raro e grande parte está associado à presença de anticorpos antifosfolípides.
Além disso, gravidez e puerpério reconhecidamente aumentam os riscos de eventos tromboembólicos. Portanto, pacientes
grávidas e portadoras de LES representam um grupo com alto
risco para fenômenos tromboembólicos. Esse risco aumenta
potencialmente na presença de anticorpos antifosfolípides.1
Pacientes portadoras de LES devem ser monitoradas de
forma cuidadosa durante a gravidez e o puerpério, devido à
alta probabilidade de surtos de reativação da doença. Além
disso, não raro, é na gravidez, e principalmente no puerpério,
que aparecem os primeiros sintomas dessa complexa doença
que, ainda hoje, desafia pesquisadores na elucidação de suas
múltiplas manifestações.
O puerpério, definido como o período desde a dequitação
da placenta até o retorno da função reprodutora da mulher, tem
duração variável, e em geral é classificado como imediato (até
10 dias), tardio (até 45 dias) e remoto (após 45 dias).2
Relatamos um caso fulminante de grave trombose venosa
profunda (TVP) de membro inferior em paciente portadora de
LES no puerpério remoto.
RELATO DE CASO
Paciente com 31 anos de idade, cor parda, em tratamento para
LES diagnosticado quatro anos antes da atual internação, com
manifestações articulares, cutâneas, hematológicas, renais e de
sistema nervoso central (psicose lúpica).
Apresentou no início do quadro altos títulos de anticorpos
anti-DNA dupla hélice (anti-dsDNA) e negatividade para
anticoagulante lúpico e anticorpos anticardiolipinas em todas
as ocasiões em que foram pesquisados, além de ausência de
história de eventos tromboembólicos.
Recebido em 24/07/2010. Aprovado, após revisão, em 01/07/2011. O autor declara a inexistência de conflitos de interesse.
Santa Casa de Misericórdia de Araçatuba.
1. Mestre em Bioética; Especialista em Reumatologia; Especialista em Clínica Médica; Doutorando em Bioética
Correspondência para: José Marques Filho. Rua Silva Jardim, 343 – Centro. CEP: 16010-340. Araçatuba, SP, Brasil. E-mail: fi[email protected]
514
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):511-516
Flegmasia cerúlea dolens em paciente com lúpus eritematoso sistêmico no puerpério remoto
Foi admitida no setor de emergência no terceiro mês de
puerpério, com febre, fadiga intensa há 10 dias, apresentando-se
ao exame físico em mal estado geral, descorada, com instabilidade hemodinâmica e dor e edema em membro inferior
esquerdo.
Tratava-se de paciente com história de três gestações, sendo
as duas primeiras anteriores ao diagnóstico de LES, todas com
realização de cesarianas. Não apresentava antecedentes de
perdas fetais ou episódios de trombose venosa ou arterial. Em
nenhuma das três gestações houve quaisquer intercorrências
clínicas com a gestante ou com os recém-nascidos.
A última gestação não foi planejada, mas ocorreu em período de mais de um ano de remissão do LES, época em que a
paciente fazia uso de azatioprina 100 mg/dia (suspensa quando
da notícia da gravidez), sulfato de hidroxicloroquina 400 mg/
dia e baixas doses de prednisona. Durante a gestação foi mantida somente com prednisona 10 mg/dia, não apresentando
nenhuma complicação.
O parto foi cirúrgico, sem complicações para a paciente
ou para o recém-nascido. Após alta da maternidade, não compareceu às consultas agendadas para controle no puerpério.
Três meses depois, deu entrada no setor de emergência e foi
rapidamente transferida para a Unidade de Terapia Intensiva.
Apresentava-se em mal estado geral, descorada, febril, com
instabilidade hemodinâmica e queixando-se de dor, aumento
de volume importante e empastamento em panturrilha esquerda, pulsos presentes, simétricos, sem cianose.
Foram feitas as hipóteses de atividade lúpica e TVP
em membro inferior esquerdo. O hemograma de entrada
demonstrou hemoglobina de 7,0 g/dL, hematócrito de 21%,
leucócitos totais de 8.600/mm3, plaquetas de 2.000/mm3,
creatinina de 2,2 mg/dL, FAN positivo 1/640 padrão homogêneo,
anti-dsDNA positivo 1/80. Não foram pesquisados outros
autoanticorpos, níveis de complemento e anti-B2GP1. Urina
tipo I com proteinúria, hematúria e cilindrúria, com pesquisa
de dímero D positiva. Ecocardiograma sem alterações, e raio x
de tórax normal. Pesquisa de anticoagulante lúpico e anticorpos
anticardiolipinas negativos.
A paciente foi tratada com reposição de volume, drogas vasoativas, antibioticoterapia, heparinização e pulsoterapia com
metilpredinisolona. Evoluiu com instabilidade hemodinâmica persistente, piora do estado geral, aumento importante da
dor e edema em todo o membro inferior esquerdo, cianose
no pé esquerdo e surgimento de flictenas com conteúdo
sero-hemorrágico e piora progressiva da perfusão. Feito o
diagnóstico de flegmasia cerúlea dolens (FCD) e indicada
trombectomia venosa com cateter de Fogart. No entanto, não
foi possível realizá-la, devido à rápida piora do quadro clínico.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):511-516
A paciente evoluiu com dispneia súbita, parada respiratória
e óbito cerca de 12 horas após sua admissão no hospital, provavelmente por embolia pulmonar. Não foi realizada autopsia.
DISCUSSÃO
A TVP é uma das doenças vasculares mais comuns. É caracterizada por edema do membro associado a comprometimento do
fluxo capilar, elevando a pressão no membro afetado, podendo
levar à hipertensão venosa e, mais raramente, à isquemia do
membro.
As complicações mais comuns incluem insuficiência
venosa crônica e síndrome pós-flebítica. Outras complicações
muito mais raras, porém dramáticas, são flegmasia alba dolens
(FAD) e FCD, ambas podendo evoluir para quadro de gangrena
úmida.3
A FAD ocorre durante a gravidez, em membros inferiores,
evoluindo com palidez intensa do membro (“branco como
leite”). Sua fisiopatologia é complexa, mas basicamente o
edema do membro leva a um aumento da pressão dos tecidos
moles, com consequente aumento da pressão em capilares. A
isquemia ocorre apenas se houver prejuízo ao fluxo capilar.4
A FCD é uma séria e rara complicação da TVP íleofemoral.
Sua incidência, igual em ambos os gêneros, é mais comum após
a sexta década de vida, ocorrendo mais frequentemente em
membros inferiores, embora possa, em 5% dos casos, ocorrer
em membros superiores.4
As afecções mais frequentemente associadas à FCD são as
neoplasias malignas e a insuficiência cardíaca grave;5 porém,
outras afecções são descritas mais raramente, como a síndrome
antifosfolípide primária,6-8 a cateterização de veia femoral, o
aneurisma de aorta abdominal e situações de hipercoagulabilidade,8 e, ainda em uma situação mais rara, a síndrome da
trombose trombocitopênica induzida por heparina.9
Os casos de FCD associada ao anticoagulante lúpico
descritos na literatura6-8 são casos de síndrome antifosfolipíde
primária, sem critérios para diagnóstico de LES, ambos com
trombose profunda de membros inferiores e boa evolução ao
tratamento clínico.
Na FCD, a trombose venosa íleofemoral extensa causa
praticamente oclusão venosa total. O membro torna-se isquêmico, extremamente doloroso e cianótico (sinal patognomônico).
A estase completa do fluxo venoso leva a edema grave, podendo
ocorrer interrupção do fluxo arterial, resultando em gangrena.
A FCD apresenta altas morbidade e mortalidade, com
necessidade de amputação do membro em muitos casos.
Essa condição enquadra-se no conceito descrito na literatura
como “doença venosa crítica”,5 que implica intervenções mais
515
Marques Filho
agressivas em fases precoces da doença, visando evitar complicações maiores, tais como gangrena e embolia pulmonar.
Apesar de relatos de regressão da FCD utilizando somente
heparina, parece consensual na literatura que uma terapia mais
agressiva melhora o prognóstico dos pacientes. Diversas modalidades de intervenção são descritas, como a trombectomia
venosa cirúrgica, as fasciotomias, a colocação de filtro em veia
cava inferior e a utilização de trombolíticos.5
No presente caso, embora o diagnóstico de FCD tenha
sido realizado precocemente, é provável que a gravidade do
quadro clínico do LES tenha colaborado para a rápida evolução
desfavorável. A associação da atividade inflamatória da doença
de base às alterações hormonais do puerpério foi fator que,
certamente, contribuiu para a ocorrência da TVP, evoluindo
de forma catastrófica para FCD e óbito.
2.
REFERENCES
9.
REFERÊNCIAS
1.
516
Guaio CRDC, Grando PED, Carvalho JF. Estudo comparativo entre
a síndrome antifosfolípide primária e a secundária – características
clínicas e laboratoriais em 149 pacientes. Rev Bras Reumatol 2008;
48(6):329-34.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
Montenegro CAB, Resende Filho J. Obstetrícia fundamental. 11ed.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008.
Perkins JMT, Magee TR, Galland RB. Phlegmasia caerulea dolens
and venous gangrene. Br J Surg 1996; 83(1):19-23.
Mousa A, Henderson P, Dayal R, Bernheim J, Kent KC, Faries PL.
Endoluminal recanalization in a patient with phlegmasia cerulea
dolens using a multimodality approach. Vascular 2005; 13(5):313-7.
Albino P, Gonçalves D, Sobrinho G, Meireles N. Phlegmasia caerulea
dolens: therapeutic considerations. Rev Port Cir Cardiotorac Vasc
2005; 12(1):41-5.
Baethge BA, Payne DK. Phlegmasia cerulea dolens associated with
the lupus anticoagulant. West J Med 1991; 154(2):211-3.
Simioni P, Prandoni P, Zanon E, Saracino MA, Scudeller A, Villalta S
et al. Deep venous thrombosis and lupus anticoagulant. A case-control
study. Thromb Haemost 1996; 76(2):187-9.
Padjas A, Brzezinska-Kolarz B, Undas A, Musial J. Phlegmasia
cerulea dolens as a complication of deep vein thrombosis in a man
with primary antiphospholipid syndrome. Blood Coagul Fibrinolysis
2005; 16(8):567-9.
Beland B, Busse H, Heinz M, Loisk HM, Ostermann H, Aken HV.
Phlegmasia cerulea dolens, cerebral venous thrombosis, and fatal
pulmonary embolism due to heparin-induced thrombocytopenic
thrombosis syndrome. Anesth Analg 1997; 85(6):1272-4.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):511-516
RELATO DE CASO
Artrite séptica por Streptococcus bovis em
paciente com cirrose hepática devido ao vírus da
hepatite C – relato de caso e revisão de literatura
Ernesto Dallaverde Neto1
RESUMO
A monoartrite continua sendo diagnóstico desafiador para reumatologistas e ortopedistas. O autor descreve um caso de
artrite séptica por Streptococcus bovis após vários episódios de derrame articular tratado com ácido hialurônico (hilano
G-F 20) e acetato de metilprednisolona em paciente de 69 anos de idade portador de cirrose hepática devido ao vírus
da hepatite C, sem presença de adenoma de cólon ou endocardite. Discutem-se as possibilidades diagnósticas para este
caso de monoartrite, bem como as patologias associadas às infecções causadas por esse microrganismo de interesse
para o reumatologista, e a possível implicação da reação da articulação ao ácido hialurônico como possível fator predisponente do derrame articular.
Palavras-chave: artrite infecciosa, Streptococcus bovis, hepatite C, cirrose hepática, ácido hialurônico.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
Dor acompanhada de sinais inflamatórios e derrame articular
em uma única articulação induzem à prática de punções e infiltrações sem definição prévia do diagnóstico de monoartrite.
Esse procedimento impede o diagnóstico etiológico, além de
causar complicações e dificultar o tratamento.
Apesar do avanço dos métodos diagnósticos em reumatologia, definir a causa da monoartrite continua sendo um dos
grandes desafios da especialidade. A conclusão diagnóstica acaba quase sempre dependendo da evolução e do aparecimento
de outros sinais e sintomas, principalmente quando o estudo
adequado do líquido sinovial não é realizado.
A artrite infecciosa deve sempre ser considerada como
diagnóstico diferencial da monoartrite, especialmente quando
o paciente está na faixa etária de maior predisposição, tem
doença articular preexistente e comorbidades que favorecem
a contaminação articular.
É descrito um caso de artrite infecciosa por Streptococcus
bovis (S. bovis) em joelho com alteração degenerativa sintomática, não responsiva ao tratamento após múltiplas artrocenteses,
infiltrações com ácido hialurônico e corticosteroides. O paciente apresentava cirrose secundária à infecção por hepatite C.
RELATO DE CASO
Homem de 69 anos de idade, com cirrose hepática e antecedente de hepatite C adquirida pós-transfusão, sem outras
comorbidades. Relatava história de três meses de dor e inchaço
de joelho esquerdo de início agudo, tendo sido submetido à
punção articular com retirada de grande quantidade de líquido de cor clara. Cinco dias após a punção houve recidiva do
inchaço, quando procurou ortopedista que diagnosticou osteoartrite de joelho e administrou ácido hialurônico (hilano G-F
20), obtendo relativa melhora por alguns dias. Contudo, após
15 dias houve recidiva do derrame articular, quando então foi
Recebido em 03/08/2010. Aprovado, após revisão, em 01/07/2011. O autor declara a inexistência de conflitos de interesse.
Instituto de Doenças Reumáticas de Santo André.
1. Postdoctoral Fellowship na University of California, Los Angeles, EUA – UCLA
Correspondência para: Ernesto Dallaverde Neto. Instituto de Doenças Reumáticas de Santo André. Rua Gastão Vidigal, 48 – Vila Bastos. CEP: 09041-181.
Santo André, SP, Brasil. E-mail: [email protected]
520
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):517-523
Artrite séptica por Streptococcus bovis em paciente com cirrose hepática devido ao vírus da hepatite C – relato de caso e revisão de literatura
Figura 1
Monoartrite de joelho, com sinais inflamatórios.
submetido à terceira artrocentese sem administração do produto
e foi solicitada ressonância magnética. Este exame mostrou
alterações degenerativas tricompartimentais, lesão tendinosa
insercional e espessamento do ligamento cruzado anterior.
Após cinco dias, observou-se novo derrame articular, sendo
submetido à quarta artrocentese e à segunda infiltração de ácido
hialurônico. Passadas três semanas, após ter sido submetido
a quatro punções articulares, procurou outro ortopedista que
procedeu artrocentese com infiltração de corticosteroide de
depósito e indicou avaliação reumatológica.
A avaliação reumatológica ocorreu três dias após a infiltração por corticosteroide, tendo sido encontrado aumento de
volume do joelho esquerdo com limitação de flexão a 90º,
sinais inflamatórios discretos e derrame articular de pequeno
volume. Exames complementares confirmaram discreta manifestação inflamatória e alterações laboratoriais compatíveis
com hepatite crônica.
Radiografias digitais das articulações dos ombros, mãos,
punhos e joelhos revelaram quadro compatível com osteoartrite
de mãos e joelhos, exibindo lesões degenerativas tricompartimentais sem calcificações. Por ocasião do retorno, o paciente
relatou piora do inchaço encontrado na visita anterior, sem dor
e sem outras manifestações clínicas. Foi submetido à punção
articular, com saída de 30 mL de líquido sinovial de aspecto
compatível com classe II, com 39.000 céls/mm³, das quais 87%
leucócitos polimorfonucleares, 8% linfócitos e 5% monócitos
e ausência de cristais. O estudo bacterioscópico e a cultura
foram negativos. O hemograma apresentava hemoglobina
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):517-523
13,7 g%, hematócrito 40,6 com 3.900 glóbulos brancos com
50% de neutrófilos, 5,5% de eosinófilos, 0,9% de basófilos,
36,9% de linfócitos e 6,7% de monócitos e 113.000 plaquetas.
A velocidade de hemossedimentação era de 23 mm na primeira
hora, e a proteína C-reativa negativa.
Houve nova recidiva de derrame 24 horas após a punção,
em grande quantidade, doloroso, acompanhado de sinais inflamatórios exuberantes (rubor e calor) e febre de 38,4ºC
(Figura 1). Na punção articular obteve-se 60 mL de líquido
sinovial, com aspecto de classe III, com baixa viscosidade,
sugerindo processo infeccioso. O diagnóstico clínico foi
artrite infecciosa, e o paciente foi internado e tratado com antibioticoterapia endovenosa com cefatriaxona 2 g associada à
oxacilina 2,0 g diárias. Durante o período que esteve internado,
submeteu-se o paciente a três outras punções articulares e a uma
lavagem articular com soro fisiológico. A cultura da primeira
amostra antes da introdução da antibioticoterapia identificou
S. bovis. Com este achado o paciente foi submetido à ecocardiografia, com resultado dentro da normalidade e sem vegetações.
Foi solicitado também antígeno carcinoembrionário (CEA)
com valor de 1,6 ng/mL, e o estudo endoscópico do aparelho
digestivo (alto e baixo) não mostrou alterações sugestivas de
doença maligna ou mesmo pólipos.
Após 10 dias de tratamento ainda havia aumento de volume
articular não doloroso, e o exame ultrassonográfico mostrou
aumento de volume pela presença de derrame anecoide com
septações delgadas e material ecogênico espesso.
Os antibióticos foram mantidos por duas semanas, com
o enfermo hospitalizado. Devido à persistência da sinovite
residual sem indícios de derrame articular, a antibioticoterapia
foi mantida por mais 10 dias no domicílio. Após 15 dias da alta
hospitalar o paciente retornou ao consultório sem limitações
de movimento ou sinais inflamatórios.
DISCUSSÃO
Tratando-se de monoartrite, é fundamental a realização de
anamnese completa que aborde os hábitos do paciente, o
comprometimento da pele e o histórico de queixas genitourinárias e digestivas, assim como a ocorrência de comorbidades.
História pregressa de envolvimento articular e da coluna devem
ser detalhadas. No diagnóstico diferencial das monoartrites
incluiu-se artrite psoriásica, espondiloartropatias com ou sem
manifestações intestinais, doenças por deposição de cristais,
artrite infecciosa, além de doença degenerativa primária ou
secundária.
Crises inflamatórias no joelho com grande volume de
líquido intra-articular em paciente idoso com diagnóstico
521
Dallaverde Neto
radiológico de osteoartrite são típicas de portadores de doença
por deposição de pirofosfato. Entretanto, para confirmar esse
diagnóstico é necessário identificar cristais de birrefringência
fracamente positiva no líquido sinovial, ação nem sempre fácil
justamente pela característica de refringência desse cristal. O
fato de não terem sido encontrados cristais no líquido sinovial
do paciente não afasta a possibilidade de pseudogota, embora
a ausência de sinais radiológicos sugestivos tornasse essa
hipótese pouco provável. Da mesma forma, considerando as
peculiaridades da gota em idosos, esse diagnóstico também
poderia ter sido considerado, e seria confirmado apenas com o
encontro de cristais de monourato de sódio no líquido sinovial.
Foi apontada também a hipótese de reação adversa ao ácido
hialurônico (hilano G-F 20), especialmente considerando-se
que as infiltrações foram feitas na presença de derrame. Embora
considerado seguro, pode causar dor e edema no local infiltrado, reações geralmente descritas como leves, que desaparecem
espontaneamente ou com terapia tópica. Contudo, tais reações
podem persistir por até três semanas, muitas vezes necessitando
de aspiração e infiltração com corticosteroide. O diagnóstico
diferencial de artrite séptica deve ser sempre considerado.
A incidência de artrite infecciosa ocasionada por infiltração intra-articular é estimada em um caso para cada 17.000
a 50.000 infiltrações, podendo ser subaguda ou insidiosa,
ocorrendo de semanas até três meses após o procedimento,
sendo mais frequente em pacientes com doença articular prévia.
O Staphylococcus aureus é a bactéria mais comumente
encontrada na artrite séptica do adulto, tanto na forma primária
quanto na que segue a trauma ou a injeções intra-articulares.
A artrite séptica, pelas potenciais morbidade e mortalidade
estimadas em 11%,1 impõe rapidez do diagnóstico e tratamento. Por essa razão, o tratamento com antibióticos deve
ser iniciado por ocasião da suspeita clínica. No presente caso,
portanto, a conduta foi prescrição de antibióticos que atuam
nessa bactéria e em outros potenciais agentes causadores, como
patógenos Gram-negativos e oportunistas, antes mesmo do
conhecimento do resultado da cultura. O doente apresentava
ainda, como fator agravante, presença de doença debilitante,
como a cirrose hepática.
O S. bovis é um enterococo considerado o microrganismo
mais frequente entre os estreptococos do grupo D, e é classificado em tipos I e II. O tipo I, mais virulento, está mais associado
a endocardite (94%) e carcinoma de cólon (71%), enquanto o
tipo II está associado nas frequências de 18% e 17% com as
complicações citadas. Infecções menos comuns causadas pelo
S. bovis incluem meningite, septicemia neonatal, peritonite
espontânea, osteomielite vertebral e artrite infecciosa sem, no
entanto, apresentar características particulares.
522
O S. bovis é causa frequente de endocardite e tem sido relacionado com doenças intestinais, principalmente ao carcinoma
do cólon,2,3 embora também esteja associado a outras neoplasias do aparelho digestivo e mesmo a doenças não malignas,
como colangite, pólipos e doenças inflamatórias intestinais.
O porquê dessa associação não está bem definido, embora
existam várias teorias. Sugere-se que o microrganismo seja por
si só carcinogênico,4 assim como seus 12 antígenos proteicos,
causando a progressão de uma lesão pré-neoplásica existente5
por meio do desencadeamento de resposta inflamatória, proliferação e transformação celular.6 Também, com certa frequência,
está associado à doença hepática crônica ou cirrose.7,8 A porta
de entrada para o S. bovis é o trato gastrointestinal, urinário,
vias biliares ou orofaringe.
O encontro do S. bovis na cultura do líquido sinovial
obriga a pesquisa que exclui a ocorrência de outras possíveis
comorbidades, como lesões neoplásicas do aparelho digestivo,
além de endocardite bacteriana. A associação com doenças
hepáticas crônicas ou cirrose contribui para o aumento da taxa
de mortalidade.9
Infecções por S. bovis em articulações são raras, e a exemplo do caso aqui relatado, os pacientes descritos por Grant,10
Marín11 e Calderón12 não desenvolveram endocardite e não
foram encontradas neoplasias concomitantemente. Um quarto
caso foi descrito13 sem comprometimento do endocárdio, mas
associado a carcinoma de sigmoide, e dois outros de infecção
tardia, que se seguiram à artroplastia de joelho associados a
carcinoma do cólon ascendente14 e do sigmoide.15 Um quinto
caso sem endocardite e/ou carcinoma do cólon foi relatado
em paciente de 76 anos de idade submetido à artroplastia de
joelho quatro meses antes, em uso de prednisona 50 mg/dia
para tratamento de mieloma múltiplo.16
Osteomielite vertebral em associação a pólipos em cólon e
bacteremia pelo S. bovis também já foram descritos.17 Em nosso
meio, Genta et al.18 descreveram um caso de bacteremia pelo
S. bovis com endocardite, adenocarcinoma de cólon, abscesso
esplênico e espondilodiscite.
Em uma revisão utilizando o MEDLINE e as bases do
LILACS e SciELO, não encontramos descrição de comprometimento articular por essa bactéria, sendo este o primeiro
caso de artrite séptica de joelho pelo S. bovis em nosso meio,
sem endocardite e sem estar associado à neoplasia intestinal.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
Grupta MN, Sturrock RD, Fiels MA. A prospective 2-year study of
75 patients with adult-onset septic arthritis. Rheumatology (Oxford)
2001; 40(1):24-30.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):517-523
Artrite séptica por Streptococcus bovis em paciente com cirrose hepática devido ao vírus da hepatite C – relato de caso e revisão de literatura
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
Klein RS, Catalano MT, Edberg SC, Casey JI, Steigbigel NH.
Streptococcus bovis septicemia and carcinoma of the colon. Ann
Intern Med 1979; 91(4):560-2.
Gold JS, Bayar S, Salem RR. Association of Streptococcus bovis
bacteremia with colonic neoplasia and extracolonic malignancy.
Arch Surg 2004; 139(7):760-5.
Klein RS, Recco RA, Catalano MT, Edberg SC, Casey JI, Steigbigel NH.
Association of Streptococcus bovis with carcinoma of the colon.
N Engl J Med 1977; 297(15):800-2.
Ellmerich S, Schöller M, Duranton B, Gossé F, Galluser M, Klein JP
et al. Promotion of intestinal carcinogenesis by Streptococcus bovis.
Carcinogenesis 2000; 21(4):753-6.
Biarc J, Nguyen IS, Pini A, Gossé F, Richert S, Thiersé D et al.
Carcinogenic properties of proteins with pro-inflammatory activity
from Streptococcus infantarius (formerly S. bovis). Carcinogenesis
2004; 25(8):1477-84.
Gonzlez-Quintela A, Martínez-Rey C, Castroagudín JF, Rajo-Iglesias MC,
Domínguez-Santalla MJ. Prevalence of liver disease in patients with
Streptococcus bovis bacteraemia. J Infect 2001; 42(2):116-9.
Alazmi W, Bustamante M, O’Loughlin C, Gonzalez J, Raskin JB. The
association of Streptococcus bovis bacteremia and gastrointestinal
diseases: a retrospective analysis. Dig Dis Sci 2006; 51(4):732-6.
Tripodi MF, Adinolfi LE, Ragone E, Durante Mangoni E,
Fortunato R, Iarussi D et al. Streptococcus bovis endocarditis and
its association with chronic liver disease: an underestimated risk
factor. Clin Infect Dis 2004; 38(10):1394-400.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):517-523
10. Grant RJ, Shang WY, Whitehead TR. Isolated septic arthritis due to
Streptococcus bovis. Clin Infect Dis 1997; 24(5):1021.
11. Marín E, Navas C, Martín-Vivaldi J, García-Tapia A, Martín-Herrera L.
Septic arthritis due to Streptococcus bovis in a patient with cirrhosis
of enolic etiology. Rev Esp Enferm Dig 2003; 95(7):506-8, 503-5.
12. Calderón J, Peiró ME, Peñalver E. Septic arthritis due to
Streptococcus bovis. Med Clin (Barc) 1992; 98(4):137-8.
13. García-Porrúa C, González-Gay MA, Monterroso JR, SánchezAndrade A, González-Ramirez A. Septic arthritis due to Streptococcus
bovis as presenting sign of ‘silent’ colon carcinoma. Rheumatology
(Oxford) 2000; 39(3):338-9.
14. Vince KG, Kantor SR, Descalzi J. Late infection of a total knee
arthroplasty with Streptococcus bovis in association with carcinoma
of the large intestine. J Arthroplasty 2003; 18(6):813-5.
15. Apsingi S, Kulkarni A, Gould KF, McCaskie AW. Late Streptococcus
bovis infection of knee arthroplasty and its association with
carcinoma of the colon: a case report. Knee Surg Sports Traumatol
Arthrosc 2007; 15(6):761-2.
16. Thota PN, Sanaka MR, Conwell DL. A 76-year-old man with septic
arthritis. Cleve Clin J Med 2002; 69(7):549-53.
17. Robbins N, Wisoff HS, Klein RS. Vertebral osteomyelitis caused by
Streptococcus bovis. Am J Med Sci 1986; 291(2):128-9.
18. Genta PR, Carneiro L, Genta EM. Streptococcus bovis bacteremia:
unusual complications. South Med J 1998; 91(12):1167-8.
523
RELATO DE CASO
Arterite de Takayasu na infância e na
adolescência: relato de três casos
Ana Karina Soares Nascif1, Marcelo Delboni Lemos2, Norma Suely Oliveira1,
Paula Campos Perim2, Ana Costa Cordeiro2, Mariana Quintino2
RESUMO
A arterite de Takayasu (AT) é uma vasculite sistêmica que acomete principalmente a aorta e seus ramos. Apesar de ser
a terceira vasculite mais frequente na infância, sua ocorrência na faixa etária pediátrica é pouco descrita. Relatamos
três casos de AT na faixa etária pediátrica com ênfase nas manifestações clínicas, alterações angiográficas e abordagem
terapêutica.
Palavras-chave: arterite de Takayasu, pediatria, sinais e sintomas, terapêutica.
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
INTRODUÇÃO
A arterite de Takayasu (AT) é uma vasculite granulomatosa
sistêmica de grandes vasos que acomete preferencialmente a
aorta e seus grandes ramos. A AT é a terceira vasculite mais
frequente da infância.1 A maioria dos pacientes diagnosticados
é mulher na terceira década de vida;1 contudo, há descrições
da doença em crianças tão jovens quanto sete meses de idade.2
O diagnóstico de AT baseia-se nos critérios diagnósticos da
EULAR/PRINTO/PRES, que compreendem: anormalidades
angiográficas, alterações de pulsos arteriais periféricos, diferença da pressão arterial (PA) sistólica dos quatro membros,
hipertensão arterial, sopro de grande artéria e provas de fase
aguda elevadas.3
O tratamento requer uso dos corticosteroides, que
podem ser associados a imunossupressores ou a agentes
biológicos. Alguns casos beneficiam-se com a intervenção
cirúrgica. 1
Apesar do reconhecimento crescente do número de casos
de AT em crianças e adolescentes, a descrição da doença nessa
população ainda é escassa e pouco difundida em nosso meio.4
Por conseguinte, descrevemos os casos de três pacientes com
AT diagnosticados segundo critérios estabelecidos3 atendidos no ambulatório de Reumatologia Pediátrica do Serviço
de Reumatologia do Hospital Universitário Cassiano
Antônio Moraes da Universidade Federal do Espírito Santo
(HUCAM/UFES) no período de dezembro de 2007 a janeiro
de 2010. Os dados foram obtidos mediante revisão dos prontuários, após consentimento informado.
RELATO DE CASO
Caso 1
Paciente do gênero feminino, 15 anos, admitida em outubro de
2007 com queixa de fadiga, cefaleia e claudicação intermitente
de membros superiores (MMSS) há um ano, com sintomas
atribuídos à anemia crônica. Ao exame físico: MMSS com
pulsos periféricos não palpáveis e PA nos mesmos inaudível, PA sistêmica aferida em membros inferiores (MMII)
de 220/110 mmHg à direita e 160/90 mmHg à esquerda e
presença de sopro carotídeo bilateral. Exames laboratoriais
Recebido em 27/09/2010. Aprovado, após revisão, em 01/07/2011. Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse.
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES.
1. Professora Adjunta do Departamento de Pediatria da Universidade Federal do Espírito Santo – UFES
2. Aluno de graduação em Medicina da UFES
Correspondência para: Ana Karina Soares Nascif. Departamento de Pediatria – Hospital Universitário Cassiano Antônio de Moraes (HUCAM). Avenida Marechal
Campos, 1468 – Maruípe. CEP: 29042-715. Vitória, ES, Brasil. Telefone: +55 27 3335-7167. E-mail: [email protected]
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):524-530
527
Nascif et al.
com evidência de atividade inflamatória, e exames de imagem
sugestivos de AT.
Em dezembro de 2007, devido ao acometimento arterial
extenso e à gravidade clínica, optou-se por pulsoterapia mensal com metilprednisolona (MTP), associada à pulsoterapia
com ciclofosfamida (CFA) e prednisona oral 1 mg/dia, além
de anti-hipertensivos. A paciente não apresentou resposta à
imunossupressão instituída, sendo modificada por metotrexato
subcutâneo (MTX SC) 25 mg/semana aliado ao corticoide oral.
Devido à persistência dos sintomas e da hipertensão arterial
após 18 meses do início da terapêutica, foi prescrito infliximabe
(5 mg/kg/dose), no total de seis infusões. Após início de terapia
biológica, a paciente evoluiu com remissão dos sintomas, sendo
possível a redução progressiva do corticoide oral, mantendo-se,
entretanto, hipertensão arterial sistêmica (HAS) a despeito do
uso de cinco anti-hipertensivos.
A
Caso 2
Paciente do gênero feminino, 16 anos, admitida em junho de
2009 com queixa de fadiga há cinco anos, anemia crônica e
hipertensão arterial recém-diagnosticada. Teve diagnóstico
ecocardiográfico prévio de coarctação de aorta (CoAo). Ao
exame físico: HAS com diferença de PA entre os membros
(MM) – membro superior direito (MSD) 180/130 mmHg,
membro superior esquerdo (MSE) 160/120 mmHg e MMII
200/140 mmHg e sopro carotídeo e abdominal. Os exames
laboratoriais evidenciaram aumento de velocidade de hemossedimentação (VHS) e proteína C-reativa (PCR); os exames
de imagem sugeriram AT e excluíram CoAo.
Prescreveu-se pulsoterapia mensal com MTP e prednisona
oral 1 mg/kg/dia, associados a anti-hipertensivos. Em novembro de 2009, devido à hipertensão arterial de difícil controle,
foi submetida a angioplastia transluminal percutânea com
colocação de stent em artéria renal esquerda e embolização de
aneurisma com micromolas fibradas. As imagens antes e após
o procedimento estão mostradas na Figura 1. Após o procedimento, foi suspensa a pulsoterapia e associou-se MTX SC
25 mg/semana, permitindo redução gradual da corticoterapia
oral. A paciente evoluiu com redução parcial da PA, mantendo
uso de quatro classes de anti-hipertensivos.
Caso 3
Paciente do gênero feminino, iniciou queixas diárias de cefaleia e dor abdominal aos 8 anos de idade, com diagnóstico
prévio presuntivo de enxaqueca abdominal. Aos 10 anos foi
encaminhada ao Serviço de Reumatologia devido a hipertensão
arterial e achado ecográfico de aneurisma de aorta ascendente.
528
B
Figura 1
Arteriografia convencional da paciente do caso 2. (A) Artéria
renal esquerda tortuosa com área de estenose (seta preta) e aneurisma (seta branca). (B) Fluxo em artéria renal e ramo restaurado
após colocar stent e embolização do aneurisma.
Ao exame físico: HAS, diferença significativa de PA entre
MMSS (170/100 mmHg em MSE e 150/90 mmHg em MSD),
pulso radial de amplitude reduzida à esquerda e sopro diastólico
em foco aórtico. Exames laboratoriais com aumento de provas
inflamatórias; os exames de imagem realizados sugerem AT.
Iniciada pulsoterapia com MTP associada à prednisona oral
1 mg/kg/dia e, posteriormente, pulsoterapia com CFA devido à
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):524-530
Arterite de Takayasu na infância e na adolescência: relato de três casos
Tabela 1
Provas de atividade inflamatória e achados radiológicos
Caso 1
Caso 2
Caso 3
VHS ao diagnóstico
107 mm/1ª hora
51 mm/1ª hora
77 mm/1ª hora
PCR ao diagnóstico
74,2 mg/L
14 mg/L
13,2 mg/L
VHS após tratamento
6 mm/1ª hora
28 mm/1ª hora
17 mm/1ª hora
PCR após tratamento
Negativo
5,7 mg/L
Negativo
Exames de imagem
Arteriografia convencional abdominal:
oclusão de artérias subclávias e
estenose extensa de carótidas;
aorta torácica pérvia com segmento
estenosado em terço proximal de aorta
descendente, aorta abdominal pérvia
com artéria renal direita afilada.
Angiotomografia abdominal:
estenose renal bilateral, aneurisma em
artéria renal esquerda, estenose em
aorta abdominal infrarrenal, aneurisma
em aorta abdominal infrarrenal.
Angiotomografia abdominal:
aneurisma em aorta ascendente
e em artéria renal direita.
Arteriografia renal:
aneurisma e oclusão parcial
de artéria renal direita.
VHS: velocidade de hemossedimentação; PCR: proteína C-reativa.
resposta parcial ao corticoide. Paciente evoluiu com remissão
parcial dos sintomas, porém desenvolveu síndrome de Cushing
exógena com HAS refratária ao uso de cinco medicações
anti-hipertensivas, optando-se por manutenção da terapêutica
imunossupressora com MTX SC 25 mg/semana.
A Tabela 1 descreve as provas de atividade inflamatória
(ao diagnóstico e após o tratamento) e achados radiológicos
das pacientes ao diagnóstico.
DISCUSSÃO
A AT é pouco descrita na faixa etária pediátrica, especialmente
em nosso meio. Na literatura internacional, um artigo de revisão recente apresentou o total de 241 casos publicados de AT
na faixa etária pediátrica.5 Até o momento temos conhecimento
de 21 casos pediátricos publicados no Brasil.5-9 Descrevemos
neste relato de caso três pacientes, o que corresponde a 14,2%
dos casos nacionais publicados.
Devido à inespecificidade das manifestações clínicas
iniciais, à evolução insidiosa e à necessidade do exame físico cardiovascular minucioso, acredita-se que muitos casos
não são diagnosticados ou são suspeitados tardiamente.10
Todas as pacientes relatadas receberam diagnóstico inicial
de patologias diferentes da AT: anemia crônica, CoAo e
enxaqueca abdominal, após um, dois e cinco anos do início
dos sintomas.
Na infância, a cefaleia é o sintoma inicial inespecífico mais
frequente da AT, ocorrendo em 31% dos casos.1,10 Nossos três
casos apresentaram cefaleia, reforçando a inclusão da AT no
diagnóstico diferencial etiológico. Duas pacientes relataram
fadiga, condizente com a literatura1 e corroborando para necessidade de valorização desta queixa. Uma paciente relatou
claudicação de MMSS, que é altamente específica de AT.3 Dor
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):524-530
abdominal ocorre em 5% a 50% dos casos,10 e foi relatada em
nossa paciente mais jovem.
A hipertensão arterial é o achado mais comum no exame
físico na criança e no adolescente com AT (82,6%), o que
frequentemente levanta a suspeita diagnóstica.10 Todas as
pacientes eram hipertensas ao diagnóstico, o que levou ao
encaminhamento de duas delas. Na literatura, a prevalência
desses achados varia amplamente, ocorrendo em 5% a 58%
dos pacientes, provavelmente devido ao pequeno número de
casos publicados.
As provas de atividade inflamatória estão elevadas na maioria dos casos,3,10 semelhante aos nossos resultados. O achado
das provas elevadas, associado ao quadro clínico, embasou a
solicitação dos exames de imagem e auxiliou no diagnóstico
das nossas pacientes.
A aparência característica da angiografia é o envolvimento difuso da aorta. A lesão mais comumente encontrada é a
estenose (53%), seguida da oclusão (21%) e do aneurisma
(10%). As artérias mais afetadas são as renais (73%).10 Nossos
casos são condizentes com a literatura: duas pacientes tinham
associação de estenose, oclusão e aneurisma, e uma paciente
tinha estenose e oclusão difusa da aorta. Todas apresentavam
acometimento de artéria renal.
O tratamento da AT consiste na prescrição de corticosteroides, que podem ser associados, inicialmente ou durante a
evolução, à CFA ou ao MTX nos casos de doença progressiva,
e aos agentes biológicos nos casos resistentes. A intervenção
cirúrgica pode ter bons resultados nos casos de hipertensão
renovascular grave.1,10 Todas as pacientes receberam tratamento
inicial com corticosteroides, posteriormente associados ao
MTX. Apenas o caso 2 não recebeu CFA, pois foi submetida
ao procedimento endovascular. O caso 1 recebeu infliximabe
devido à resistência aos imunossupressores. Todas as nossas
529
Nascif et al.
pacientes evoluíram com boa resposta à terapêutica e normalização das provas inflamatórias, mantendo HAS a despeito
do uso de anti-hipertensivos.
A descrição de casos raros, como os relatados neste artigo,
possibilita melhor conhecimento da AT na infância pelos pediatras e reumatologistas, permitindo o diagnóstico precoce e
melhores resultados terapêuticos.
REFERENCES
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
530
Cassidy JT, Petty RE, Laxer RM, Lindsley CB. Textbook of Pediatric
Rheumatology. 5ed. Philadelphia: Elsevier; 2005.
Gronemeyer PS, deMello DE. Takayasu’s disease with aneurysm of
right common iliac artery and iliocaval fistula in a young infant: case
report and review of the literature. Pediatrics 1982; 69(5):626-31.
Ozen S, Pistorio A, Iusan SM, Bakkaloglu A, Herlin T, Brik R et al.
EULAR/PRINTO/PRES criteria for Henoch-Schönlein purpura,
childhood polyarteritis nodosa, childhood Wegener granulomatosis
and childhood Takayasu arteritis: Ankara 2008. Part II: Final
classification criteria. Ann Rheum Dis 2010; 69(5):798-806.
4.
Kostic D, Barros FSC, Ribeiro CT, da Silva JDM, Campos LMA,
Aykawa NE et al. Arterite de Takayasu em uma lactente com
história de dois familiares acometidos. Pediatria (São Paulo) 2010;
32(1):63-6.
5. Campos LM, Castellanos AL, Afiune JY, Kiss MH, Silva CA.
Takayasu’s arteritis with aortic aneurysm associated with Sweet’s
syndrome in childhood. Ann Rheum Dis 2005; 64(1):168-9.
6. Castellanos AZ, Campos LA, Liphaus BL, Marino JC, Kiss MH,
Silva CA. Takayasu’s arteritis. An Pediatr (Barc) 2003; 58(3):211-6.
7. Ultachalk F, Terreri MT, Len C, Hatta FS, Lederman H, Hilário MO.
Arterite de Takayasu na infância: estudo clínico e angiográfico de
cinco casos. Rev Bras Reumatol 2000; 40(4):189-95.
8. Hilário MO, Terreri MT, Prismich G, Len C, Kihara EN,
Goldenberg J et al. Association of ankylosing spondylitis, Crohn’s
disease and Takayasu’s arteritis in a child. Clin Exp Rheumatol
1998; 16(1):92-4.
9. Mesquita ZB, Sacchetti S, Andrade OVB, Mastrocinque TH,
Okuda EM, Bastos W et al. Arterite de Takayasu na infância: revisão
da literatura a propósito de seis casos. J Bras Nefrol 1998; 20:263-75.
10. Brunner J, Feldman BM, Tyrrell PN, Kuemmerle-Deschner JB,
Zimmerhackl LB, Gassner I et al. Takayasu arteritis in children and
adolescents. Rheumatology (Oxford) 2010; 49(10):1806-14.
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):524-530
CARTA AOS EDITORES
A presença da reumatologia brasileira no
GRAPPA (Group for Research and Assessment
of Psoriasis and Psoriatic Arthritis)
© 2011 Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.
Prezados Editores,
No sentido de pontuar a participação brasileira no GRAPPA,
enviamos a carta a seguir:
A artrite psoriásica (APs) passou a ser identificada como
entidade específica após os estudos de Verna Wright em Leeds,
no Reino Unido. Já no final da década de 1950, Verna entendia
que artrite erosiva na ausência de fator reumatoide sérico associado a intensa atividade inflamatória constituía uma condição
clínica distinta da artrite reumatoide e da osteoartrite.1 Alguns
anos depois, John Moll, também de Leeds, juntamente com
Verna Wright, estabeleceu através de sua clássica publicação
os critérios de classificação da APs, incorporando os cinco
diferentes tipos de apresentação clínica da doença.2 É interessante destacar que Verna criou a unidade de reumatologia de
Leeds em 1964, onde os estudos de APs se firmaram, e faleceu
em 1988, tendo sido figura marcante do Congresso Brasileiro
de Reumatologia em Belo Horizonte, em 1980, a convite do
Prof. Paulo Madureira.
Junto com a evolução dos conhecimentos epidemiológicos
e fisiopatológicos, cresceu o conceito de “doença psoriásica” como condição inflamatória sistêmica caracterizada por
manifestações clínicas envolvendo diferentes órgãos e associada à comorbidades específicas, como diabetes mellitus e
hipertensão. Portanto, e diante da necessidade de aumentar a
interação e a compreensão da APs do ponto de vista não apenas
reumatológico – mas também dermatológico –, reuniões multidisciplinares tornaram-se realidade e estimularam a criação do
GRAPPA – Group for Research and Assessment of Psoriasis
and Psoriatic Arthritis, ou Grupo para Pesquisa e Avaliação
de Psoríase e de Artrite Psoriásica – em 2003.3
O GRAPPA é uma organização internacional com objetivos educacional, científico e sem fins lucrativos, que promove
a cooperação de diversas disciplinas médicas. Atualmente,
agrega cerca de 320 pesquisadores de destaque e líderes de
opinião dentre reumatologistas, dermatologistas, radiologistas,
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):531-534
geneticistas, epidemiologistas, representantes de pacientes e da
indústria biofarmacêutica, com cerca de 60% dos integrantes
estabelecidos fora da América do Norte. A primeira reunião
oficial do GRAPPA foi realizada em agosto de 2003 em Nova
Iorque, quando prioridades iniciais de pesquisa foram estabelecidas. Para alcançar seus objetivos e metas, o GRAPPA
criou comissões responsáveis por áreas distintas e relevantes
à abordagem do paciente com psoríase (PSo) e APs, como
as de Avaliação de Articulações Periféricas, Avaliação da
Coluna Vertebral, Publicações, Imagem, Website, Instrumentos
de Avaliação Clínica, Qualidade de vida/Função/Inclusão,
Governança, Histologia/Imuno-histoquímica e Diretrizes do
Tratamento. A identificação de biomarcadores e de instrumentos clínicos adequados para avaliação de pacientes com APs,
validados para a prática clínica e para estudos clínicos, é fundamental e mandatória; biomarcadores preditores de envolvimento articular em pacientes com PSo e de dano articular na APs
estão sendo desenvolvidos em conjunto pelo GRAPPA e pelo
OMERACT (Outcome Measures in Rheumatology Clinical
Trials), além de instrumentos específicos para diagnóstico,
acompanhamento e tratamento, indispensáveis na abordagem
do paciente com “doença psoriásica”.
Várias atividades têm sido realizadas pelo GRAPPA:
publicações, revisões baseadas em evidências, priorização de
domínios de investigação e pesquisa por consenso finalizado
pelo OMERACT, lançamento de intranet, que possibilita
comunicação e publicações, reuniões internacionais de dermatologia e reumatologia, reuniões periódicas em vários países.
Projetos de pesquisa com colaboração internacional estão em
andamento, abordando aprimoramento e validação de medidas
de desfecho para APs, desenvolvimento de instrumentos para
avaliar qualidade de vida, função e inclusão, padronização das
avaliações histológica e imuno-histoquímica de pele e membrana sinovial, atualização dos critérios de classificação para
APs (CASPAR), imagem, impacto socioeconômico e efeito da
533
CARTA AOS EDITORES
terapia, produção de vídeo na web para treinamento e projeto
de medidas de avaliação de desfechos e resposta.
Dentre as metas para o futuro, o GRAPPA pretende
criar redes de comunicação entre seus membros, a indústria,
as ligas de atendimento e agências reguladoras, promover
reuniões e comunicação na intranet para compartilhar conhecimentos, desenvolver e realizar pesquisas em colaboração,
educação e outros projetos, desenvolver e validar critérios
para definir APs, revisar, desenvolver e validar medidas de
desfecho eficazes e viáveis para avaliação de APs e PSo,
promover registros de pacientes, trabalhar com representantes
de pacientes para educação e sensibilização do público, trabalhar com representantes das companhias farmacêuticas para
gerar e realizar pesquisas sobre terapias eficazes, trabalhar
com representantes das agências reguladoras para estabelecer diretrizes adequadas para aprovação de novas terapias,
trabalhar com outras organizações profissionais, como o
American College of Rheumatology, a American Academy of
Dermatology e o OMERACT para motivar o conhecimento
acerca da APs e da PSo nas referidas disciplinas, definir
diretrizes de tratamento para as autoridades governamentais
e outras partes interessadas.
De fato, nos últimos anos o GRAPPA tem atuado de maneira extraordinária no sentido de promover encontros educacionais e científicos que facilitam o desenvolvimento e a difusão
de informação sobre PSo e APs, entre diferentes especialistas
médicos que atuam nestas áreas, como nós reumatologistas e
dermatologistas. Dessa forma, tem sido possível intensificar
pesquisa, diagnóstico, acompanhamento e tratamento da PSo
e da APs. Recentemente, em setembro de 2010, graças aos
esforços de membros brasileiros do grupo e à ampla receptividade da Sociedade Brasileira de Reumatologia, foi possível
realizar a primeira reunião do GRAPPA na América Latina
(GRAPPA CBR 2010), durante o XXVIII Congresso Brasileiro
de Reumatologia em Porto Alegre, RS, que congregou, entre
nós brasileiros, vários participantes, além dos 10 palestrantes
estrangeiros convidados. A partir desse evento formou-se um
grupo brasileiro dentro do GRAPPA, coeso e reconhecido, que
já participa de alguns dos projetos desenvolvidos. Atualmente,
esse grupo está definindo metas de trabalho para o futuro que
permitam uma participação mais ativa dentro do GRAPPA em
534
harmonia com a comissão de espondiloartrites da Sociedade
Brasileira de Reumatologia.
A efetivação desses eventos e de estudos conjuntos entre
nós reumatologistas e outros especialistas e profissionais que
desejam contribuir para a PSo e a APs visa fornecer evidências
científicas para avanços no manejo clínico e terapêutico, tornando possível melhorar a qualidade de vida e o prognóstico
dos portadores de APs. Nesse sentido, reuniões sistemáticas
conjuntas devem tornar cada vez mais sólida a presença da
reumatologia brasileira no âmbito do GRAPPA em nível
mundial, que conta com a participação de três dermatologistas
(Flávia Lisboa, Marcia Ramos-e-Silva e Cid Sabbag) e oito
reumatologistas brasileiros (nós sete, autores desta carta, e
Roberto Acayaba de Toledo). Como membros, participamos
de várias reuniões anuais e somos incentivados a fazer parte
de projetos e comissões específicas.
Cláudia Goldenstein-Schainberg
Professora-Colaboradora da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo – USP
Roberto Ranza
Professor da Residência em Reumatologia da
Universidade Federal de Uberlândia – UFU
Rubens Bonfiglioli
Professor-Assistente de Reumatologia da Pontifícia
Universidade Católica – PUC-Campinas
Sueli Carneiro
Professora Adjunta da Faculdade de Ciências Médicas – UERJ
Dermatologista e Reumatologista do Hospital Universitário – UFRJ
Docente de Pós-graduação em Ciências Médicas – UERJ, e Medicina – UFRJ
Valderilio F. Azevedo
Professor-Assistente em Reumatologia da
Universidade Federal do Paraná – UFPR
José Goldenberg
Professor Livre-Docente de Reumatologia da
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP
Hospital Israelita Albert Einstein
Morton Scheinberg
Professor Livre-Docente em Imunologia – USP
Rev Bras Reumatol 2011;51(5):531-534
Download

RBR 51(5) - Book.indb - Sociedade Brasileira de Reumatologia