Universidade do Sul de Santa Catarina Direito Internacional Disciplina na modalidade a distância 2a Edição revista e atualizada Palhoça UnisulVirtual 2006 direito_internacional.indb 1 2/1/2007 15:32:53 direito_internacional.indb 2 2/1/2007 15:33:13 Apresentação Este livro didático corresponde à disciplina Direito Internacional. O material foi elaborado visando a uma aprendizagem autônoma, abordando conteúdos especialmente selecionados e adotando uma linguagem que facilite seu estudo a distância. Por falar em distância, isso não significa que você estará sozinho. Não esqueça que sua caminhada nesta disciplina também será acompanhada constantemente pelo Sistema Tutorial da UnisulVirtual. Entre em contato sempre que sentir necessidade, seja por correio postal, fax, telefone, e-mail ou Ambiente Virtual de Aprendizagem. Nossa equipe terá o maior prazer em atendêlo, pois sua aprendizagem é nosso principal objetivo. Bom estudo e sucesso! Equipe UnisulVirtual. direito_internacional.indb 3 2/1/2007 15:33:13 direito_internacional.indb 4 2/1/2007 15:33:13 Milene Pacheco Kindermann Direito Internacional Livro didático 2a Edição revista e atualizada Design Instrucional Carolina Hoeller da Silva Boeing Palhoça UnisulVirtual 2006 direito_internacional.indb 5 2/1/2007 15:33:13 Copyright © UnisulVirtual 2006 Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição. 342.12 G53 Kindermann, Milene Pacheco Direito internacional : livro didático / Milene Pacheco Kindermann ; design instrucional Carolina Hoeller da Silva Boeing. – 2. ed. rev. e atual. – Palhoça : UnisulVirtual, 2006. 168 p. : il.; 28 cm. Inclui bibliografia. ISBN 85-7817-072-5 ISBN 978-85-7817-072-1 1. Direito internacional público. I. Boeing, Carolina Hoeller da Silva. II. Título. Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul Créditos Unisul - Universidade do Sul de Santa Catarina UnisulVirtual - Educação Superior a Distância Campus UnisulVirtual Rua João Pereira dos Santos, 303 Palhoça - SC - 88130-475 Fone/fax: (48) 3279-1541 e 32791542 E-mail: [email protected] Site: www.virtual.unisul.br Reitor Unisul Gerson Luiz Joner da Silveira Vice-Reitor e Pró-Reitor Acadêmico Sebastião Salésio Heerdt Pró-Reitor Administrativo Marcus Vinícius Anátoles da Silva Ferreira Campus Tubarão e Araranguá Diretor: Valter Alves Schmitz Neto Diretora adjunta: Alexandra Orseni Campus Grande Florianópolis e Norte da Ilha Diretor: Ailton Nazareno Soares Diretora adjunta: Cibele Schuelter Campus UnisulVirtual Diretor: João Vianney Diretora adjunta: Jucimara Roesler Equipe UnisulVirtual Administração Renato André Luz Valmir Venício Inácio Biblioteca UnisulVirtual Soraya Arruda Waltrick Coordenação dos Cursos Adriano Sérgio da Cunha Ana Luisa Mülbert Ana Paula Reusing Pacheco Diva Marília Flemming Elisa Flemming Luz Itamar Pedro Bevilaqua Janete Elza Felisbino Jucimara Roesler Lauro José Ballock Luiz Guilherme Buchmann Figueiredo Marcelo Cavalcanti Mauri Luiz Heerdt Mauro Faccioni Filho Mauro Pacheco Ferreira Nélio Herzmann Onei Tadeu Dutra Patrícia Alberton Patrícia Pozza Rafael Pete. da Silva Raulino Jacó Brüning Design Gráfico Cristiano Neri Gonçalves Ribeiro (coordenador) Adriana Ferreira dos Santos Alex Sandro Xavier Fernando Roberto Dias Zimmermann Higor Ghisi Luciano Pedro Paulo Alves Teixeira Rafael Pessi Vilson Martins Filho Equipe Didático-Pedagógica Angelita Marçal Flores Carmen Maria Cipriani Pandini Caroline Batista Carolina Hoeller da Silva Boeing Cristina Klipp de Oliveira Dalva Maria Alves Godoy Daniela Erani Monteiro Will Dênia Falcão de Bittencourt Elisa Flemming Luz Enzo de Oliveira Moreira Flávia Lumi Matuzawa Karla Leonora Dahse Nunes Márcia Loch Patrícia Meneghel Silvana Denise Guimarães Tade-Ane de Amorim Vanessa de Andrade Manuel Viviane Bastos Viviani Poyer Monitoria e Suporte Harrison Laske (coordenador) Alessandro Rosa Caroline Mendonça Edison Rodrigo Valim Gislane Frasson de Souza Josiane Conceição Leal Rafael da Cunha Lara Vinícius Maycot Sera. m Djeime Sammer Bortolotti Carla Cristina Sbardella Grasiela Martins James Marcel Silva Ribeiro Lamuniê Souza Liana Pamplona Maira Marina Martins Godinho Marcelo Pereira Marcos Alcides Medeiros Junior Maria Isabel Aragon Olavo Lajús Priscilla Geovana Pagani Ricardo Alexandre Bianchini Silvana Henrique Silva Secretária Executiva Viviane Schalata Martins Tecnologia Osmar de Oliveira Braz Júnior (coordenador) Giorgio Massignani Rodrigo de Barcelos Martins Sidnei Rodrigo Basei Edição --- Livro Didático Produção Industrial e Logística Arthur Emmanuel F. Silveira Eduardo Kraus Francisco Asp Jeferson Cassiano Almeida da Costa Projetos Corporativos Diane Dalmago Vanderlei Brasil Secretaria de Ensino a Distância Karine Augusta Zanoni (secretária de ensino) Professor Conteudista Milene Pacheco Kindermann Design Instrucional Carolina Hoeller da Silva Boeing Projeto Gráfico e Capa Equipe UnisulVirtual Diagramação Higor Ghisi Luciano Vilson Martins Filho (2a Edição) Revisão Ortográfica Simone Rejane Martins Sumário Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 Palavras da professora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 Plano de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 UNIDADE UNIDADE UNIDADE UNIDADE UNIDADE UNIDADE 1 2 3 4 5 6 – – – – – – Noções de Direito Internacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 Fontes do Direito Internacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 Sujeitos do Direito Internacional Público. . . . . . . . . . . . . . . . 49 Conflitos internacionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103 Direitos humanos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127 Conflitos de leis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137 Para concluir o estudo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 155 Sobre a professora conteudista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159 Respostas e comentários das atividades de auto-avaliação . . . . . . . . . . . . 161 direito_internacional.indb 7 2/1/2007 15:33:14 direito_internacional.indb 8 2/1/2007 15:33:14 Palavras da professora Caro aluno, Seja bem-vindo à disciplina de Direito Internacional! Nosso compromisso, a partir de agora, é o de buscar entender como acontecem, sob a ótica do Direito, os movimentos da sociedade internacional, sempre fazendo um link com a sociedade nacional. Os conteúdos da disciplina Direito Internacional serão abordados de forma progressiva, permitindo que, ao longo da jornada, você faça algumas discussões sobre acontecimentos da atualidade e sua repercussão na sociedade internacional, uns de acordo com o Direito Internacional posto, outros nem tanto... Você verá que vai ser muito gostoso aprender os conceitos de Direito Internacional e aplicá-los na formação do gestor em comércio exterior. — Já pensou você visitando outro país, ou recebendo um cliente de outro país, e podendo discutir os temas internacionais com conhecimento de causa? Ingresse no conteúdo da disciplina e bons estudos! Profª Milene Pacheco Kindermann. direito_internacional.indb 9 2/1/2007 15:33:14 direito_internacional.indb 10 2/1/2007 15:33:14 Plano de estudo O plano de estudos visa orientar você no desenvolvimento da disciplina. Ele possui elementos que o ajudarão a conhecer o contexto da disciplina e a organizar o seu tempo de estudos. Ementa Noções gerais. Sujeitos de Direito Internacional. Tratados internacionais. Nacionalidade. Direitos humanos. Solução de conflitos internacionais. Conflitos de leis. Globalização. Objetivos Geral O objetivo maior desta disciplina é possibilitar ao aluno o conhecimento dos principais institutos do Direito Internacional, para que, a partir desses, possa entender como funcionam as questões jurídicas dentro da sociedade internacional. Específicos direito_internacional.indb 11 Compreender o significado dos principais conceitos jurídicos (noções gerais) utilizados nas relações de caráter internacional (globalizadas). Realizar análises sobre as inter-relações existentes entre os institutos da esfera jurídica internacional. 2/1/2007 15:33:14 Depreender das fontes do Direito Internacional (especialmente os tratados) temas e condutas legais que, no seu futuro cotidiano profissional, influenciarão a prática profissional. Entender como a sociedade internacional se organiza, por meio do conhecimento das peculiaridades dos seus principais sujeitos (Estados e organizações internacionais governamentais e suas relações com o indivíduo – nacionalidade, direitos humanos). Estudar as formas de solucionar, amigavelmente ou não, os conflitos entre os Estados. Conhecer como os países se utilizam de elementos de conexão para evitar ou resolver possíveis conflitos de aplicação das suas legislações em situações da vida pública ou privada. Conteúdo programático/objetivos Veja, a seguir, as unidades que compõem o livro didático desta disciplina e os seus respectivos objetivos. Esses se referem aos resultados que você deverá alcançar ao final de uma etapa de estudo. Os objetivos de cada unidade definem o conjunto de conhecimentos que você deverá possuir para o desenvolvimento de habilidades e competências necessárias à sua formação. Carga horária A carga horária total da disciplina é 60 horas-aula. Unidades de estudo: 6 Unidade 1 – Noções de Direito Internacional Nesta unidade você vai aprender os conceitos e características do Direito Internacional, as relações entre o Direito Internacional e o Direito Nacional e os princípios do Direito Internacional. 12 direito_internacional.indb 12 2/1/2007 15:33:14 Como objetivos de aprendizagem desta unidade espera-se que você possa compreender como se organiza a sociedade internacional, na ótica jurídica, e qual o papel do Direito nesta sociedade; entender como o Direito Internacional se interrelaciona com o Direito interno dos países; e conhecer quais são os princípios basilares desta disciplina em constante construção. Unidade 2 – Fontes do Direito Internacional Nesta unidade você vai aprender quais são as fontes do Direito Internacional Público e do Direito Internacional Privado, e realizar um estudo dos tratados: conceito, condições de validade, processo de elaboração, efeitos, interpretação, extinção, tratamento brasileiro dos tratados internacionais. O objetivo desta unidade é possibilitar a você compreender como são as fontes do Direito Internacional Público e do Direito Internacional Privado, estudar os tratados e identificar a partir desse estudo como os países passam a adotar condutas legais no plano internacional. Unidade 3 – Sujeitos do Direito Internacional Público Nesta unidade você vai aprender sobre o Estado e suas características no plano político, físico e pessoal, as características da Santa Sé e os conceitos e características das organizações internacionais. Os objetivos desta unidade são os de possibilitar o seu conhecimento dos sujeitos do Direito Internacional Público, que são os Estados (incluindo-se aí a Santa Sé) e as organizações internacionais. E, ainda, compreender o Estado, que é o principal sujeito do DIP, e suas vertentes política, pessoal e física. Unidade 4 – Conflitos internacionais Nesta unidade você conhecerá as causas dos conflitos internacionais, os meios pacíficos e os meios bélicos para solução desses conflitos. O objetivo desta aprendizagem é o de conhecer como são tratados os casos de conflitos entre os países e quais são os possíveis meios utilizados para a solução desses conflitos, como esses são utilizados e as diferenças entre cada um deles. 13 direito_internacional.indb 13 2/1/2007 15:33:14 Unidade 5 – Direitos humanos Na Unidade 5 você estudará sobre a classificação dos direitos humanos e a proteção internacional desses direitos. O objetivo é o de compreender a proteção internacional dos direitos humanos, trazendo para a discussão um histórico das principais convenções internacionais de proteção aos direitos humanos e como as principais organizações internacionais atuam no sentido de garantir a proteção a esses direitos. Unidade 6 – Conflitos de leis Na última unidade de estudo você verá os conflitos de leis e as formas de solução, e conhecerá os principais elementos de conexão utilizados em questões civis, comerciais e processuais, presentes na legislação brasileira. Como objetivos de aprendizagem estão: conhecer os conflitos de normas existentes nas relações internacionais de caráter privado, além das soluções encontradas pelos sistemas jurídicos para evitar, minimizar ou resolver esses possíveis conflitos; compreender o Direito Internacional Privado brasileiro, ou seja, como o Direito brasileiro resolve os conflitos de normas nas relações privadas internacionais; compreender como se aplicam as teorias de remessa e os elementos de conexão, decifrando que legislação nacional será aplicada num caso privado de relações internacionais. O processo de ensino e aprendizagem na UnisulVirtual leva em conta instrumentos que se articulam e se complementam, portanto, a construção de competências se dá sobre a organização de metodologias e por meio das diversas formas de ação/ mediação. São elementos desse processo: o livro didático; o AVA (Ambiente virtual de Aprendizagem); e as atividades de avaliação (complementares, a distância e presenciais). 14 direito_internacional.indb 14 2/1/2007 15:33:14 Agenda de atividades/cronograma Agenda de atividades/ Cronograma Verifique com atenção o AVA, organize-se para acessar periodicamente a sala da disciplina. O sucesso nos seus estudos depende da priorização do tempo para a leitura, da realização de análises e sínteses do conteúdo e da interação com os seus colegas e tutor. Não perca os prazos das atividades. Registre no espaço a seguir as datas com base no cronograma da disciplina disponibilizado no AVA. Use o quadro para agendar e programar as atividades relativas ao desenvolvimento da disciplina. Atividades obrigatórias Avaliação a Distância 1 Avaliação Presencial Avaliação Presencial (2ª chamada) Avaliação Final (caso necessário) Demais atividades (registro pessoal) 15 direito_internacional.indb 15 2/1/2007 15:33:15 direito_internacional.indb 16 2/1/2007 15:33:15 UNIDADE 1 Noções de Direito Internacional Objetivos de aprendizagem Compreender como se organiza a sociedade internacional na ótica jurídica e qual o papel do Direito nessa sociedade. Entender como o Direito Internacional se inter-relaciona com o direito interno dos países. Conhecer quais são os princípios basilares desta disciplina em constante construção. 1 Seções de estudo Seção 1 Conceitos e características do Direito Internacional. Seção 2 Relações entre o Direito Internacional e o Direito Nacional. Seção 3 Princípios do Direito Internacional Público. direito_internacional.indb 17 2/1/2007 15:33:15 Universidade do Sul de Santa Catarina Para início de estudo Para começar a entender porque se estuda o Direito Internacional e porque ele foi criado, vale a pena perguntar: estamos sozinhos no planeta? A resposta parece óbvia... Claro que não! Basta olhar o mapamúndi ou um globo terrestre que você verá um aglomerado de países, pintados em cores diferentes, sinalizando que cada unidade daquelas é composta de um território, pessoas que ali habitam e um Governo que lhes organiza. Você sabe também que cada unidade dessas constitui-se num país diferente. Essas diferenças é que tornam o mundo interessante! Olhos puxados, cabelos crespos, peles brancas como o leite, negras como chocolate, comidas diferentes, bebidas “malucas”, hábitos... Quanta diversidade! No meio de tudo isso, há o relacionamento entre os Governos e entre as pessoas desses países. Com tanta diversidade, como garantir que os relacionamentos dêem certo? Não é fácil! Pense em você e em seu círculo de parentes, amigos, colegas e companheiros de trabalho... Vocês sempre concordam em tudo, ou há divergências? E como resolvem tais divergências? Amigavelmente? Entram num acordo? Um cede para o outro? Brigam? Discutem? Rompem a amizade? Ficam meses sem se falar? Pois é, lá no mundo exterior os relacionamentos também passam por essas situações. Em razão disso, por meio das normas do Direito Internacional, a comunidade de nações procura se organizar, usando regras jurídicas para criar um ambiente favorável às boas relações internacionais, tentando organizar a sociedade (se auto-organizar) e criar meios pacíficos de resolver as divergências (nem sempre se consegue isso, mas se tenta). Bom, nesta unidade você irá estudar os conceitos iniciais para tentar entender como funciona este nosso mundo! 18 direito_internacional.indb 18 2/1/2007 15:33:15 Direito Internacional SEÇÃO 1 - Conceito e características do Direito Internacional Conceito do Direito Internacional O Direito Internacional é a parte do Direito que cuida (busca disciplinar) das relações internacionais existentes entre países ou entre pessoas de nacionalidades diferentes. O Direito Internacional tem profunda relação com a área das Relações Internacionais, servindo de instrumento dessas. É por meio do Direito Internacional que as relações internacionais entre os Estados acontecem com maior segurança, e as relações privadas de caráter internacional são facilitadas. O Direito Internacional divide-se em duas áreas de estudo: a pública e a privada. O Direito Internacional Público trata dos interesses internacionais públicos, regulando os direitos e deveres internacionais dos Estados, dos organismos internacionais e dos indivíduos perante os Estados. O objetivo do Direito Internacional Público é o de regular os interesses dos países, objetivando a diminuição de conflitos e o alcance da paz mundial. Os países do Mercosul chegam a um acordo sobre a tarifa de imposto de importação e exportação de carnes. Isso vai facilitar (ou, dependendo, pode dificultar) o comércio de carnes entre os países que fazem parte do bloco. — Compreendeu o que é o Direito Internacional Público? Então observe agora o que é o Direito Internacional Privado. Unidade 1 direito_internacional.indb 19 19 2/1/2007 15:33:15 Universidade do Sul de Santa Catarina Ordenamento jurídico é o conjunto de normas jurídicas existentes dentro de um país. O Brasil, por exemplo, tem uma infinidade de normas jurídicas de diferentes assuntos: penais, civis, constitucionais, administrativas, comerciais, tributárias, processuais, trabalhistas, previdenciárias, etc. Todas essas normas compõem o ordenamento jurídico interno do país. Cada país tem o direito de definir suas normas internas como lhes convier, de acordo com os valores de sua sociedade, seus costumes e necessidades. Chama-se ordenamento porque as normas seguem uma ordem entre si, evitando que uma não se sobreponha à outra. Já o Direito Internacional Privado pode ser conceituado como o conjunto de normas reguladoras das relações de ordem privada da sociedade internacional, conjugando leis de ordenamentos jurídicos distintos e indicando a lei competente a ser aplicada. O objetivo do Direito Internacional Privado é decidir qual lei será aplicada quando houver divergências entre as leis internas de dois países em questões de interesse privado. Aproveitando a situação do comércio de carnes do Mercosul, citada anteriormente, quando duas empresas vão realizar um contrato internacional de compra e venda (importação e exportação), a lei de que país será aplicada nesse contrato? A do país exportador ou a do país importador? O Direito Internacional Público auxilia, por meio de tratados, a formação do Direito Internacional Privado. Assim, dois ou mais países firmam um tratado de comércio (DIPubl) e, com base nesse tratado, as empresas dos países envolvidos assinam contratos e realizam negócios (DIPriv). Características do Direito Internacional Público No plano internacional não existe autoridade superior nem milícia (força militar) permanente. Os Estados se organizam horizontalmente e prontificam-se a proceder de acordo com as normas jurídicas na exata medida em que essas tenham constituído objeto de seu consentimento. Os Estados possuem direitos formalmente iguais (igualdade soberana) e devem fazer suas próprias leis. A coordenação é o princípio que preside a convivência organizada de tantas soberanias. 20 direito_internacional.indb 20 2/1/2007 15:33:15 Direito Internacional O Estado soberano não é originalmente submetido a uma jurisdição internacional diante de Corte de Justiça Internacional alguma. Sua concordância em ser julgado por uma Corte é que confirma a autoridade dessa, de modo que a sentença (decisão da Corte) se torne obrigatória e que seu eventual descumprimento configure um ato ilícito. Para que você possa observar como a sociedade internacional se organiza de forma diferente da sociedade nacional, observe as duas figuras apresentadas a seguir. Para a sociedade internacional, costuma-se, em razão do princípio da coordenação, usar uma linha reta, na qual um Estado instala-se ao lado do outro, nem acima, nem abaixo, observe: Poder de julgar de um tribunal ou de uma autoridade. Por exemplo, no seu município, o juiz local tem o poder de julgar os casos que acontecem na cidade. Esse poder é chamado de jurisdição. Que se opõe ao princípio da subordinação, no qual um Estado manda no outro. Figura 1.1 - Horizontalidade de Estados. Isso encontra-se confirmado na Carta da ONU (Carta de São Francisco), que criou a organização, no que diz respeito à composição da Assembléia Geral das nações unidas, órgão de caráter decisório, no qual todos os países membros da entidade, independente de seu tamanho territorial, potência financeira ou bélica, população, ou outro fator, têm o mesmo voto igualitário. Cada país vale um voto! Já no plano interno dos Estados, nota-se uma outra figura, uma pirâmide, sendo que no seu topo está o Estado e na sua base os cidadãos (é a sociedade de pessoas físicas e jurídicas do país). Figura 1.2 - Pirâmide de relacionamento Estado-cidadão. Unidade 1 direito_internacional.indb 21 21 2/1/2007 15:33:15 Universidade do Sul de Santa Catarina Isso significa que o Estado tem poder sobre os seus subordinados, gerando uma relação de poder em que os indivíduos se submetem ao poder exercido pelo Governo que ele mesmo elegeu. É um direito inerente ao ser humano, naturalmente estabelecido por Deus ou pela natureza humana. As regras do Direito Internacional são obrigatórias. Não se trata de cortesia internacional, de conveniência ou comodidade. As normas não são apenas uma espécie de moral internacional e, há muito tempo, ultrapassaram a condição de meros enunciados de direito natural. Entretanto elas não compõem um direito homogêneo. O caráter jurídico de uma regra internacional decorre da objetividade do seu enunciado, da generalidade de sua aplicação e de sua compatibilidade com o conjunto de regras já admitidas no sistema (SEITENFUS; VENTURA, 1999, p. 23). O Direito Internacional é histórico e conjuntural, vindo a desenvolver-se de acordo com a conjuntura política da época. Ele acompanha a sociedade internacional nos seus movimentos. Quando acabou a Segunda Guerra Mundial, após todos os horrores sofridos na Europa, os países resolveram criar a ONU – Organização das Nações Unidas, com a finalidade de estabelecer um sistema que evitasse, no futuro, uma nova guerra mundial, criando um Conselho de Segurança, que, embora as críticas à sua atuação (ou à falta dela), até o momento conseguiu evitá-la. SEÇÃO 2 - Relação entre o Direito Internacional e o Direito Nacional Enquanto o direito interno subordina os sujeitos de direito a um poder central que estabelece a lei e os faz respeitá-la, graças a um aparelho institucional, que pode recorrer à força, o Direito Internacional pressupõe a promulgação em comum, por meio de acordo, de uma regulamentação, cabendo a cada Estado avaliar a dimensão do dever que lhe incumbe e as condições de sua execução (SEITENFUS; VENTURA, 1999, p. 25). 22 direito_internacional.indb 22 2/1/2007 15:33:16 Direito Internacional O âmbito de aplicação do Direito Internacional não é outro que não o território dos Estados. O Direito Internacional não é celebrado para execução somente nos espaços internacionais (alto-mar, pólo antártico, espaço ultraterrestre). Pelo contrário, nos limites territoriais de cada Estado é que a aplicação das normas internacionais se torna mais importante, permitindo a harmonização da sociedade. O problema surge, muitas vezes, quando há divergência entre as normas criadas internacionalmente e as normas do plano interno do Estado. Há nessa situação um confl ito de normas (entre o internacional e o nacional), que pode gerar duas possibilidades: seguir o Direito Internacional e estar de acordo com a comunidade internacional; observar apenas o Direito Interno. Para estudar os efeitos desse embate entre normas de diferentes origens, foram estabelecidas algumas teorias. Dualismo – segundo Rezek (1994, p. 4), para os dualistas (Carl Heinrich Triepel, na Alemanha, e Dionízio Anzilotti, na Itália), o Direito Internacional e o Direito Interno são sistemas rigorosamente independentes e distintos, de tal modo que a validade jurídica de uma norma interna não se condiciona à sua sintonia com a ordem internacional. Essa teoria lembra dos limites de validade das normas jurídicas no Direito Nacional e que as normas do Direito Externo somente são aceitas internamente quando introduzidas no plano doméstico. Ou seja, no caso de igualdade entre as normas internacionais e nacionais, aplicam-se ambas, mas no caso de desigualdade, há a prevalência da norma interna, até que essa mude o suficiente para permitir a aplicação da norma internacional. Ainda, para os dualistas, não há a necessidade premente de harmonizar os dois Direitos, porque acreditam na possibilidade de haver a dualidade de ambientes de aplicação das normas. Monismo – conforme apregoa Seitenfus (1999, p. 26), prevê uma unidade lógica e sistemática das regras internas e internacionais, o que implica em um imperativo de subordinação entre uma e outra. O monismo se manifesta pela introdução, geralmente Unidade 1 direito_internacional.indb 23 23 2/1/2007 15:33:16 Universidade do Sul de Santa Catarina nos textos constitucionais dos Estados, de uma cláusula que estipula a supremacia de um direito sobre o outro, hierarquizando suas fontes. Para os monistas é importante a harmonização das normas, pois compõem um único ordenamento jurídico. O que se propõe é a eliminação da dualidade de regras, evitando o conflito de normas. E, em razão dessa característica, a corrente dividiu-se em duas: monista internacionalista – prevê a unicidade da ordem jurídica sob o primado do Direito Internacional, a que se ajustariam todas as ordens internas (Hans Kelsen é o maior expoente dessa corrente). Pregam a ordem jurídica única e a impossibilidade de o Estado sobreviver em clima de hostilidade com a comunidade internacional em razão da não aceitação interna do direito externo (REZEK, 1996); monista nacionalista – prevê o primado do Direito Nacional de cada Estado soberano, sob cuja ótica a adoção dos preceitos de Direito Internacional reponta como faculdade discricionária. Pregam a soberania dos Estados sobre a da comunidade internacional e a supremacia da Constituição de cada país (SEITENFUS; VENTURA, 1999). Nesse caso, cada Estado possui a soberania de definir qual aplicação terá a norma internacional dentro do seu ordenamento jurídico interno (se será lei ordinária, lei complementar, status constitucional). O predomínio do dualismo ou do monismo repercute em soluções práticas exigidas pelo convívio internacional. No tratamento constitucional dado aos tratados internacionais, verificam-se três possibilidades: a) há cláusulas que conferem aos tratados o valor de Direito Interno; b) há cláusulas determinando a supremacia dos tratados sobre o Direito Interno, podendo haver prevalência sobre a Constituição, sobre as demais leis ou sobre outros tratados; c) há cláusulas que prevêem a necessidade de incorporação do texto do tratado ao ordenamento interno, logo a internalização 24 direito_internacional.indb 24 2/1/2007 15:33:16 Direito Internacional do acordo, para que ele encontre sua vigência – equiparação dos tratados à lei ordinária. (SEITENFUS; VENTURA, 1999). SEÇÃO 3 - Princípios do Direito Internacional Público Os princípios do DIP são divididos em três grupos (MONSERRAT FILHO, 1986), de acordo com seus objetivos, e servem para guiar as ações dos Estados no plano internacional. 1) Princípios relativos à defesa da paz mundial: renúncia à ameaça ou uso da força; solução pacífica das controvérsias; segurança coletiva; busca do desarmamento; proibição de propaganda de guerra. 2) Princípios relativos à cooperação entre todos os Estados e povos, independente de qualquer diferença: respeito à soberania e igualdade de direitos de todos os Estados; não-intervenção nos assuntos internos; obrigação de cooperar com todos os Estados em base eqüitativa; cumprimento de boa-fé das obrigações assumidas. 3) Princípios relativos ao livre desenvolvimento de todos os povos: igualdade de direitos e autodeterminação dos povos; respeito aos direitos humanos. Síntese Nesta unidade você aprendeu que o Direito Internacional disciplina as relações internacionais. Se essas relações acontecerem no âmbito dos Estados e das Organizações Unidade 1 direito_internacional.indb 25 25 2/1/2007 15:33:16 Universidade do Sul de Santa Catarina Internacionais Governamentais, será usado o Direito Internacional Público. Se essas relações acontecerem no âmbito privado, entre pessoas de diferentes nacionalidades, elas usarão o Direito Internacional Privado. Você viu que a sociedade internacional se organiza de forma horizontal, baseada no princípio da cooperação entre os Estados, sendo que nenhum Estado é naturalmente submetido à jurisdição de outro ou de alguma Corte Internacional de Justiça. Assim, o Direito Internacional tem característica obrigatória em razão da força dos pactos assumidos pelos Estados, e é histórico e conjuntural, pois acompanha os movimentos da sociedade internacional. Você estudou, também, como se relacionam o Direito Internacional Público e o Direito Interno por meio da aplicação das teorias dualista e monista nacionalista e internacionalista. E, por último, foram listados os princípios utilizados pelo Direito Internacional. Atividades de auto-avaliação Vamos exercitar o raciocínio? Você viu que o Direito Internacional disciplina as relações internacionais entre Estados. Quando esse é aplicado, ele funciona dentro do território dos Estados, se relacionando com o Direito Interno, chegando ao dia-a-dia do cidadão, das empresas e de toda a organização do país. Então, vamos imaginar como é a relação desses dois Direitos (interno e internacional), na prática. O Estado assina um tratado de proibição de uso de armas de fogo pelo cidadão comum. Só os agentes de segurança do país é que podem usá-las. Dentro do 26 direito_internacional.indb 26 2/1/2007 15:33:16 Direito Internacional país há uma legislação de permite o uso de armas de fogo pelo cidadão comum, desde que esse solicite uma autorização junto ao Governo. Indique e justifique a sua escolha de qual dos direitos será aplicado no país (Direito Internacional – tratado – ou Direito Nacional – lei interna), no caso de uso das seguintes teorias: 1) da teoria dualista; 2) da teoria monista internacionalista; 3) da teoria monista nacionalista. Unidade 1 direito_internacional.indb 27 27 2/1/2007 15:33:16 Universidade do Sul de Santa Catarina Saiba mais Para saber mais, você pode ler: SEITENFUS, R.; VENTURA, D. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 28 direito_internacional.indb 28 2/1/2007 15:33:17 UNIDADE 2 Fontes do Direito Internacional Objetivos de aprendizagem Compreender as fontes do Direito Internacional Público e do Direito Internacional Privado. Verificar o estudo dos tratados, que é a principal fonte do Direito Internacional. Identificar a partir das fontes do Direito Internacional (especialmente os tratados) temas e condutas legais. 2 Seções de estudo Seção 1 Fontes do Direito Internacional Público e do Direito Internacional Privado. Seção 2 Estudo dos tratados. direito_internacional.indb 29 2/1/2007 15:33:17 Universidade do Sul de Santa Catarina Para início de estudo Agora que você já sabe para que serve o Direito Internacional e como ele interage com o Direito interno dos países, você vai estudar as fontes do DI. Este estudo é importante, talvez até mesmo um dos mais importantes dentro da disciplina, uma vez que é justamente por meio do entendimento dessas fontes que você irá perceber como o Direito Internacional nasce e é aplicado, como os Estados compõem as regras internacionais de convivência e em que nível elas são cumpridas pelos países, quando passam a fazer parte do ordenamento jurídico do Estado. Por exemplo, se o Brasil assina um tratado no âmbito da OMC – Organização Mundial do Comércio irá causar um grande benefício para a empresa em que você trabalha, porque vai facilitar a exportação dos produtos que ela produz para um determinado grupo de países. — Mas a partir de quando esse tratado pode ser aplicado? Será que no dia seguinte à sua assinatura pelo Presidente da República você já pode usar os benefícios deste tratado para exportar os produtos da sua empresa para um dos países que fazem parte do tratado? Isto é o que você vai descobrir a partir de agora... Bom estudo! 30 direito_internacional.indb 30 2/1/2007 15:33:17 Direito Internacional SEÇÃO 1 - Fontes do Direito Internacional Público e do Direito Internacional Privado Imagine-se fazendo um contrato internacional. Você representa os interesses de uma empresa brasileira e a outra pessoa com quem você está negociando representa os interesses de uma empresa canadense. Você descobriu esse contato via internet. Agora, você quer saber se é possível realizar tal contrato com a empresa canadense. — Você vai se perguntar: o Brasil e o Canadá têm relações diplomáticas e comerciais? O produto, objeto desse contrato, pode ser vendido no Canadá e no Brasil? Que legislação você deve usar para realizar o contrato, a brasileira ou a canadense? E se esse contrato gerar algum problema depois, será resolvido via justiça brasileira ou canadense? Você terá muito que pesquisar antes de fechar o contrato, não é mesmo? Mas para isso você vai buscar uma fonte de consulta. Primeiramente é necessário que você saiba o conceito de fonte, observe! Considera-se fonte do direito o “lugar” de onde o direito nasce. No entanto, observe que importa para esse estudo também a “forma” como esse direito nasce. O primeiro tipo de fonte é chamado de fonte material ou primária. Dela sai a matéria do Direito Internacional, isto é, do que ele é feito. São os movimentos da sociedade internacional. Esses movimentos históricos, sociais, religiosos, culturais, bélicos, entre outros, são a matéria-prima do Direito Internacional. Por exemplo, se o assunto é meio ambiente, cada país vai expor a sua posição quanto ao tema, negociando um meio termo, que resuma o acordo de vontades das partes envolvidas. Se o planeta está precisando de mais proteção ao meio ambiente, essa será a tônica do Direito Internacional a ser convencionada pelos países que estão discutindo o tema. Unidade 2 direito_internacional.indb 31 31 2/1/2007 15:33:17 Universidade do Sul de Santa Catarina O segundo tipo de fonte é chamado de fonte formal ou secundária. Ela indica a forma como foi feito o direito. A matéria discutida pelos Estados (a questão de meio ambiente, por exemplo) pode ser apresentada por meio das fontes formais do Direito Internacional, que são os tratados e convenções internacionais, o costume, os atos unilaterais, os princípios gerais do Direito e as resoluções das organizações internacionais. Os tratados e convenções internacionais são as manifestações expressas (escritas) dos acordos de vontades (consenso) entre Estados. Essas manifestações surgem de duas formas: a de tratados especiais ou tratados-contratos, que estipulam as regras, uma a uma, de como se deve cumprir a obrigação; e a de tratados gerais ou tratados-lei (também chamados normativos), que estipulam as normas gerais e os princípios que devem seguir os países sobre determinado assunto. Por exemplo, se os países que compõem a Floresta Amazônica fazem um tratado dizendo que o uso dos recursos da Amazônia será feito de forma sustentável, mantendo o equilíbrio do ecossistema, esse tratado terá um princípio normativo, será um tratado-lei. Mas se, além disso, os Estados estabelecem também cláusulas dizendo que os países deverão proibir o uso de queimadas para limitar a extração de madeira somente quando houver um programa de reflorestamento e estabelecer normas quanto à pesca nos rios da região, estabelecendo também prazos para cumprimento dessas regras e penalidades no caso de seu descumprimento, aí estarão fazendo, também, um tratado-contrato. Atualmente, é muito comum que sejam construídos tratados que tragam esses dois tipos em seu texto, gerando, assim, uma norma e um contrato. 32 direito_internacional.indb 32 2/1/2007 15:33:17 Direito Internacional O costume é o conjunto de normas consagradas por longo uso e observadas nas relações internacionais como obrigatórias. Distingue-se do uso pela idéia de obrigação. Sua força obrigatória procede, antes de tudo, de uma prática geral, admitida como lei. Por exemplo, um Chefe de Estado quando visita outro país deve ser recebido com honras, pompas e com toda a proteção diplomática cabível. Isso decorre de um costume internacional. — Compreendeu? Então prossiga e observe agora o que são os atos unilaterais. Os atos unilaterais são aqueles atos em que a manifestação da vontade de um sujeito de direito (nesse caso do Estado) é suficiente para produzir efeito jurídico, não necessitando do consentimento do outro sujeito envolvido. Tais atos são assumidos pelo sujeito do DIP, restringindo sua própria competência ou assumindo obrigações de caráter jurídico. São atos unilaterais: o reconhecimento – que é a admissão de um direito ou pretensão de outro sujeito. Por exemplo, quando um Estado reconhece o nascimento de um novo Estado; o protesto – que é a negação de um direito ou pretensão de outro sujeito. A reclamação feita por um Estado a outro, que infringiu uma norma de Direito Internacional, não reconhecendo determinado direito que o Estado infrator imagina ter é um exemplo. Por exemplo, quando o Governo americano declarou guerra ao Iraque, o Governo brasileiro manifestou-se de forma contrária a essa atitude. Isso é um protesto; Unidade 2 direito_internacional.indb 33 33 2/1/2007 15:33:17 Universidade do Sul de Santa Catarina a notificação – que é a manifestação da vontade ou do posicionamento de um sujeito perante outro. A título de exemplo, a carta de ratificação, que é uma informação remetida às partes envolvidas no tratado, de que o país já confirmou no plano interno (no seu território) o texto do tratado; a renúncia – que é o abandono a um direito. Por exemplo, um Estado que renúncia ao direito de cobrar as dívidas do Estado devedor, perdoando-as; a denúncia – que é o desligamento de um sujeito de um acordo ou tratado. O Tratado de Assunção, por exemplo, permite a denúncia do tratado, possibilitando aos Estados se desligarem do Mercosul; a adesão – que é aderência a um pacto já formulado por outros sujeitos do DIP. O Tratado de Assunção permite a terceiros países integrantes da ALADI a entrada no Mercosul. Os Princípios Gerais do Direito são as normas de justiça objetiva (valores obrigatórios para a convivência em sociedade) de onde o direito tira o seu fundamento. Esses princípios são inúmeros e apontados como já consagrados na jurisprudência internacional: proibição do abuso do direito; “pacta sun servanda”, que significa o respeito à boa fé nas obrigações internacionais, a responsabilidade internacional pela prática de ato ilícito e restituição do que foi obtido por enriquecimento ilícito; a obrigação de reparar não apenas o dano emergente, mas também o lucro cessante; a exceção da prescrição liberatória, etc. 34 direito_internacional.indb 34 2/1/2007 15:33:17 Direito Internacional Você pode observar que a origem de tais princípios está no Direito Civil e no Direito Processual Civil. Recentemente foi incorporada a essa lista de princípios a noção de “patrimônio comum da humanidade” (MELLO, 1996, p. 54). As resoluções internacionais são resoluções (decisões) de organizações internacionais, obrigatórias para os Estados-membros da organização, como é o caso das resoluções do Conselho de Segurança da ONU. São, ainda, fontes de integração, interpretação ou aplicação do DIP, que venham a suprir lacunas deixadas pelas outras fontes formais, a doutrina, a jurisprudência internacional e a eqüidade. Na área do Direito Internacional Privado, além das fontes citadas acima, também são usadas a legislação interna dos países, que serão aplicadas de forma comparada com a legislação do outro país envolvido, e a jurisprudência dos Estados, ou seja, as decisões dadas nos tribunais dos países. SEÇÃO 2 - Estudo dos tratados A doutrina é o posicionamento sobre os assuntos jurídicos escritos em livros e artigos por estudiosos da área (juristas). Já a jurisprudência internacional é a decisão dada pelos juízes das Cortes Internacionais de Justiça, que vira sentença judicial e serve de base para novas decisões de casos semelhantes. A eqüidade é o uso do senso comum na busca do que for mais próximo da justiça (no sentido de justo) para o caso. Um exemplo é comparar a legislação do Brasil e do Canadá, como no caso do contrato que mencionamos no início desta unidade A principal fonte formal do DIP são os tratados. Nesta seção você vai aprender a definir esse instrumento jurídico, as condições que ele deve preencher para que possa ter validade e o passo-apasso para a elaboração de um tratado. Aproveite para observar os efeitos dos tratados junto aos Estados envolvidos e junto a terceiros, saber como são interpretados e quais são as causas de extinção de um pacto. Siga em frente! Unidade 2 direito_internacional.indb 35 35 2/1/2007 15:33:17 Universidade do Sul de Santa Catarina Conceito Os tratados são atos jurídicos, por meio dos quais se manifesta o acordo de vontades entre duas ou mais pessoas internacionais (ACCIOLY ; SILVA, 1996). De acordo com Rezek (1996) tratado é todo ato formal concluído entre sujeitos de Direito Internacional Público, e destinado a produzir efeitos jurídicos. No artigo 2º da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, assinada em 23 de maio de 1969, consta como conceito de tratado: A Convenção de Havana foi celebrada da VI Conferência Interamericana, em Havana, Cuba, em 20 de fevereiro de 1928, congregando somente Estados do continente americano. A Convenção de Viena foi celebrada em 23 de maio de 1969, em Viena, Áustria, e tem caráter universal, podendo ser aplicada a países de todos os continentes. [...] um acordo internacional celebrado por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer conste de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja a sua denominação particular. (RANGEL, 1993, p. 243). Sendo assim, o tratado é um acordo produzido por Estados (inclui-se aí a Santa Sé) ou por organizações internacionais governamentais, gerando efeitos de ato jurídico e de norma, celebrado por escrito, além de ser regido pelo Direito Internacional Público. As normas que estabelecem as regras sobre a elaboração, efeitos e validade dos tratados são as Convenções de Havana (CH), de 1928 (ratificada pelo Brasil), e Convenção de Viena (CV), de 1969 (não-ratificada), ambas sobre direito dos tratados. Os tratados podem ser convencionados por dois sujeitos (tratados bilaterais) ou por mais de dois sujeitos (multilaterais). Segundo a sua natureza jurídica podem ser tratados-lei, que fi xam normas gerais de Direito Internacional ou tratados-contrato, que procuram regular os interesses recíprocos dos Estados. Podem dividir-se ainda em executados (quando a execução se dá de uma só vez) e executórios (quando a execução se dá sempre que ocorre uma situação). Os tratados podem receber várias denominações, que nem sempre indicam diferenças entre um e outro, pois o uso dessas denominações não é padrão no mundo todo. Assim, podemos 36 direito_internacional.indb 36 2/1/2007 15:33:18 Direito Internacional encontrar tratados que se chamam: convenção (Convenção de Viena), declaração (Declaração Universal dos Direitos Humanos), protocolo (Protocolo de Kyoto), carta (Carta da ONU), tratado (Tratado de Assunção), acordo (Acordo Quadro entre União Européia e Mercosul), concordata (esse é utilizado para fins religiosos), pacto (Pacto da Liga das Nações), e outras nomenclaturas possíveis, mas todas consideradas tratados. Condição de validade dos tratados Para que um tratado possa produzir todos os efeitos desejados, há que se observar a presença de condições de validade (requisitos que não podem faltar), que são: capacidade das partes – são capazes os Estados (art. 1º da Convenção de Havana – CH, e art. 6º da Convenção de Viena – CV) e os organismos internacionais, ambos sujeitos de Direito Internacional Público (art. 3º da CV); habilitação dos agentes signatários – é representada pela apresentação dos plenos poderes. Os Chefes de Estado e respectivos Ministros de Relações Exteriores geralmente têm reconhecida a sua competência originária por meio das Constituições dos países. E deles é dispensável a apresentação de credenciais (carta de plenos poderes). No entanto, no caso de não serem eles os agentes a firmarem os tratados, exige-se a apresentação da carta de plenos poderes, que deverá ser firmada pelo Chefe de Estado ou pelo Ministro das Relações Exteriores dos países. A pessoa designada na carta de chancelaria para representar o país recebe o nome de plenipotenciário (arts. 2º e 7º da CV); objeto lícito e possível – o objeto do tratado deve visar uma coisa materialmente possível e permitida pelo Direito e pela moral internacional; consentimento mútuo – é a expressão do acordo de vontades. Nos tratados multilaterais, vale a vontade da maioria de dois terços dos Estados contratantes. No caso de vício de consentimento (erro, dolo, corrupção do representante do Estado, coerção exercida sobre o referido representante e coerção decorrente de ameaça ou emprego de força, além de adoção de tratado com desconhecimento de direitos obrigatórios) pode o tratado Unidade 2 direito_internacional.indb 37 37 2/1/2007 15:33:18 Universidade do Sul de Santa Catarina ser anulado ou simplesmente não ser ratificado. A CV prevê a manifestação da vontade nos artigos 9º a 17, e no caso de vício de consentimento que cause a anulação aplicam-se as regras contidas nos arts. 42 a 53; forma e redação dos tratados – (art. 3º da CH e art. 2º da CV) a redação de um tratado pode ocorrer em tantas línguas, quanto forem os idiomas oficiais dos signatários, ou pode ser lavrado em apenas um idioma, a critério das partes. O formato de um tratado baseia-se nos seguintes itens: - preâmbulo – introdução ao tratado, que segue logo abaixo do título do mesmo, com a indicação das partes contratantes e dos motivos ou objetivos do tratado; - articulado – as disposições do tratado, convencionadas entre as partes e apresentadas em forma de cláusulas ou artigos; - declaração – as partes declaram que assinam o tratado, assumindo o pacto (pode ser feita de forma expressa, por meio de um artigo específico, ou implícita, pela simples presença das palavras acordam, concordam, convencionam ou declaram geralmente escritas no final do preâmbulo); - indicação do lugar e da data em que está sendo escrito o tratado; - assinaturas dos agentes habilitados – representantes dos Estados que fazem parte do tratado, sendo que a ordem de assinaturas pode ser lado a lado, alfabética ou por sorteio, o que não indica qualquer grau ou ordem de importância de um Estado sobre o outro (princípio da coordenação). Ao final do tratado podem ser feitas as reservas ou ressalvas, que são as declarações unilaterais dos Estados signatários se desobrigando de alguma cláusula do tratado. Estão previstas nos arts. 6º e 7º da CH e nos arts. 2º, 19 a 23 da CV. 38 direito_internacional.indb 38 2/1/2007 15:33:18 Direito Internacional Processo de elaboração dos tratados Os tratados obedecem um processo de elaboração que segue (em sua maioria) os determinados passos. Negociação é a fase em que os sujeitos interessados discutem o tema do tratado, chegando a um consenso. Geralmente são utilizados nas negociações protocolos de intenções, nos quais os Estados ou a organização internacional definem seus interesses a respeito daquele tema. As negociações podem se dar de forma bilateral ou por assembléia (organismos internacionais). Encerram com a lavratura do texto final do tratado e sua assinatura pelo representante do Estado ou da organização internacional. Ratificação é o ato administrativo mediante o qual um Chefe de Estado confirma um tratado firmado em seu nome ou em nome de Estado, declarando aceito o que foi convencionado pelo agente signatário. Geralmente só ocorre a ratificação depois que o tratado foi devidamente aprovado pelo Parlamento (referendado). Essa ratificação (confirmação) é que faz com que o tratado passe a valer plenamente. No Brasil cabe ao Congresso Nacional aprovar internamente um tratado. O Chefe de Estado (Presidente da República), por meio de seu Ministério de Relações Exteriores, encaminha à Câmara dos Deputados um pedido de referendo do tratado. Analisado o tratado e aprovado pela Câmara, segue o texto do tratado para o Senado. Lá, uma vez aprovado o texto, será emitido um decreto legislativo. Referendo é um ato do Congresso Nacional em que o texto de lei será integralmente aprovado ou integralmente rejeitado, não cabendo modificar o texto que está sendo votado. No caso dos tratados, o texto não pode ser modificado porque foi assinado em consenso com os demais países, na fase da negociação. Convém salientar que por ser um tratado o procedimento de referendo não admite mudanças, supressões ou acréscimos ao seu texto. Ele deve ser aprovado ou reprovado na sua totalidade. O quórum exigido às duas casas legislativas (Câmara dos Deputados e Senado Federal) para a aprovação de tratados é o da maioria simples, utilizando o mesmo procedimento de lei ordinária, com exceção dos tratados sobre direitos humanos, cujo quorum exigido é de três quintos dos votos. Unidade 2 direito_internacional.indb 39 39 2/1/2007 15:33:18 Universidade do Sul de Santa Catarina O Estado deve abster-se de atos contrários ao tratado mesmo antes de sua ratificação. Aprovado o tratado pelo legislativo, por meio de referendo, o Chefe de Estado pode emitir a ratificação. Nos tratados multilaterais, se escolhe um dos países para guardar o original do tratado e receber as cartas de ratificação. Em geral, a ratificação é feita por meio de um documento, a que se dá o nome de carta de ratificação, assinado pelo Chefe do Estado e pelo Ministro das Relações Exteriores. Com a troca de cartas (tratados bilaterais) ou o depósito das mesmas em um depositário, se oficializa o pacto. A CH prevê a ratificação nos arts. 5º e 6º. Já a CV prevê este instituto nos arts. 2º e 14. O registro e a publicação do tratado acontecem após a ratificação. Implicam no registro do texto do tratado pelo depositário e das cartas de ratificação dos países que o confirmam. A publicação é a notícia de que houveram ratificações ao tratado, dada pelo depositário aos demais Estados participantes do pacto. Se o tratado acontece no âmbito de uma organização internacional, como a ONU, por exemplo, o registro deverá ser feito perante a sua Secretaria, que se encarrega da publicação do tratado. Se não envolve uma OIG, o registro e a publicação serão feitos pelo depositário. A publicação dará efeito internacional ao tratado (arts. 4o. e 8o. da CH, e art. 24 da CV). Internamente, a publicação segue as regras do Direito de cada país e implica na produção de efeitos internos. No Brasil esta publicação ocorre através de decreto do Presidente da República, no Diário Oficial da União (DOU). Após esta publicação interna, o tratado (agora decreto presidencial) passa a valer no território nacional. No caso da adesão a um tratado, o Estado não participa da negociação do seu texto, mas quer fazer parte do tratado, mesmo posteriormente, porque esse tratado está correspondendo aos seus interesses. Tal adesão é um ato unilateral do Estado e consiste na emissão da carta de adesão ao depositário do tratado, pelo Chefe de Estado do país aderente, uma vez já aprovado o texto do tratado internamente pelo seu Parlamento (arts. 9º e 19 da CH e art. 15 da CV). No momento da adesão cabe fazer reservas ou ressalvas. 40 direito_internacional.indb 40 2/1/2007 15:33:19 Direito Internacional Competências constitucionais brasileiras O procedimento brasileiro quanto aos tratados não é claro e direto. Não há uma definição expressa de qual posição os tratados assumem na hierarquia de normas brasileira e nem como é o procedimento que devem utilizar para sua inserção interna. Na Constituição Brasileira de 1988 verificam-se as atribuições do Chefe de Estado. Das atribuições do Presidente da República Art. 84 - Compete privativamente ao Presidente da República: […] IV - sancionar, p romulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; […] VII - manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos; (BRASIL,CF,2006) Das atribuições do congresso nacional Quanto ao Congresso Nacional, verifica-se na Constituição: Art. 49 - É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional; II - autorizar o Presidente da República a declarar guerra, a celebrar a paz, a permitir que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente, ressalvados os casos previstos em lei complementar. (BRASIL,CF,2006) Unidade 2 direito_internacional.indb 41 41 2/1/2007 15:33:19 Universidade do Sul de Santa Catarina Efeitos dos tratados Um tratado passa a gerar efeitos no âmbito internacional a partir de sua ratificação pelos membros envolvidos. A regra geral é de que os efeitos dos tratados devem ser produzidos somente entre as partes envolvidas (arts. 10, 11 e 13 da CH, e arts. 26 a 30 da CV). No caso de atingirem um terceiro país, seguem-se regras diferentes, conforme o seu efeito. Assim, se o tratado causa prejuízo aos interesses de outro Estado, deve-se proceder à reparação, no caso de danos, ou ao pedido formal de desculpas, se não houver danos. Já se há o benefício de terceiro país, esse pode usufruir do benefício enquanto durar, mas não tem o poder de executar o tratado. Isso somente poderá ocorrer se o Estado vier a fazer parte do tratado por adesão (art. 9º da CH, e arts. 34 a 38 da CV). Posição dos tratados na legislação brasileira A Constituição Federal é totalmente omissa quanto ao tratamento que deva ser dado aos tratados. Assim, a jurisprudência do STF – Surpremo Tribunal Federal criou a regra de que os tratados, por passarem pelo mesmo procedimento da lei ordinária, devem receber o status desse tipo legal. Dessa forma, os tratados em geral aparecem no mesmo patamar das leis ordinárias, devendo obedecer a hierarquia definida no artigo 59 da Constituição Federal (BRASIL,CF,2006): Art. 59 - O processo legislativo compreende a elaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções. 42 direito_internacional.indb 42 2/1/2007 15:33:19 Direito Internacional Esse artigo legal remete a uma pirâmide de normas, que estabelece a relação de hierarquia entre elas, sendo que o topo da pirâmide indica a lei mais importante e a base da pirâmide a lei de menor força legal. Os tratados, transformados em leis ordinárias, obedecem as normas constitucionais e as leis complementares, e revogam (derrubam) as leis ordinárias de mesmo patamar, as leis delegadas, as medidas provisórias, os decretos legislativos e as resoluções. Exceções a essa regra aparecem no caso do Direito Tributário, sendo que o Código Tributário Nacional fi xou uma regra de obediência aos tratados em matéria tributária, conforme segue (BRASIL,CF,2006): Art. 96 - A expressão “legislação tributária” compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes. Art. 98 - Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha. Há, ainda, o tratamento diferenciado que a Constituição Federal aponta para os tratados de direitos humanos, que venham a acrescentar novos direitos, dando o mesmo status de norma constitucional. Os parágrafos do art. 5º da CF/88 assim dispõem (BRASIL,CF,2006): Unidade 2 direito_internacional.indb 43 43 2/1/2007 15:33:19 Universidade do Sul de Santa Catarina Art. 5º [...] § 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. § 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão. (acréscimo da Emenda Constitucional nº 45/2004). Interpretação dos tratados São utilizadas as seguintes regras para a interpretação dos tratados: a) a interpretação autêntica (art. 3º da CH e art. 33 da CV), utilizando como critérios a interpretação das palavras em sentido próprio e usual, estas palavras devem possuir o sentido da época da celebração do tratado, devem ser interpretadas conforme o seu uso no Estado, apresentam-se contrárias a todo o tratado, deve-se optar pela interpretação mais ampla. Quando redigido em duas línguas, e havendo discrepância no conteúdo, cada Estado se obriga pelo texto em sua língua, se feito numa terceira língua, deve-se buscar o significado do termo nessa língua; b) a relevância do princípio da boa-fé (art. 31 da CV), no qual deve-se buscar a verdadeira intenção das partes à época da celebração dos tratados, podendo ser consultados os trabalhos preparatórios para solucionar as obscuridades (arts. 31 e 32 da CV); c) deve-se buscar o procedimento costumeiro das partes no cumprimento de um tratado; d) as cláusulas ambíguas devem ser interpretadas de acordo com seu efeito útil; e) as estipulações especiais prevalecem sobre as gerais; 44 direito_internacional.indb 44 2/1/2007 15:33:19 Direito Internacional f) a cláusula proibitiva prevalece sobre a imperativa, que prevalece sobre a permissiva; g) a analogia. Extinção dos tratados São causas de extinção dos tratados: • execução integral do tratado; • expiração do prazo convencionado; • verificação de uma condição resolutiva prevista no tratado; • acordo mútuo entre as partes; • renúncia unilateral por parte de Estado ao qual o tratado beneficia de modo exclusivo; • denúncia admitida expressa ou tacitamente pelo próprio tratado; • impossibilidade de execução; • inexecução do tratado por uma das partes contratantes; • a guerra sobrevinda entre as partes contratantes; • prescrição liberatória. As causas de extinção de um tratado podem ser analisadas à luz dos arts. 14 a 17 da CH e arts. 54 a 64 da CV. Síntese Nesta unidade você aprendeu que o Direito Internacional é proveniente do movimento da sociedade internacional, acompanhando a sua evolução e o seu cenário. As normas de DIP Unidade 2 direito_internacional.indb 45 45 2/1/2007 15:33:19 Universidade do Sul de Santa Catarina se materializam sob diversas maneiras (fontes materiais), mas a principal delas é o tratado. Você aprendeu que o tratado é um instrumento escrito e assinado pelos sujeitos do DIP (Estados e organizações internacionais). Aprendeu que eles podem ser bilaterais ou multilaterais e receber várias denominações. Você viu que para ter validade o tratado tem que preencher certas condições, que são a capacidade das partes, a habilitação dos agentes signatários, um objeto lícito e possível, obedecer uma forma e ter presente a manifestação do consentimento das partes envolvidas. Acompanhou também o processo de elaboração de um tratado, divido em três fases: negociação, ratificação e registro e publicação. Além de ter estudado quais são as competências do Presidente da República e do Congresso Nacional na elaboração do tratado. Nesta unidade foi possível observar como devem ser produzidos os efeitos de um tratado, como devem ser interpretados e as causas de sua extinção, e, ainda, a controversa posição dos tratados dentro do ordenamento jurídico brasileiro (posição na esfera constitucional, como lei complementar ou como lei ordinária). De posse de todos esses conhecimentos, você agora deve fazer um exercício de reflexão, respondendo as atividades de autoavaliação. Com o estudo feito nesta unidade em mente, você já pode passar para a próxima unidade, na qual estudaremos 46 direito_internacional.indb 46 2/1/2007 15:33:20 Direito Internacional os sujeitos de DIP (aqueles que elaboram os tratados que você estudou aqui). Atividades de auto-avaliação Agora que você está no final do capítulo, vamos exercitar o que aprendeu. 1) O tratado é um ato bilateral ou multilateral. Relacione como os atos unilaterais podem incidir num tratado. 2) Analisando as fases de elaboração de um tratado, a partir de qual fase (negociação, ratificação ou publicação) esse tratado passa a vigorar dentro do território nacional brasileiro? Unidade 2 direito_internacional.indb 47 47 2/1/2007 15:33:20 Universidade do Sul de Santa Catarina 3) A partir do momento que o tratado entra em vigor no território nacional, ele passa a conviver com as demais leis aqui existentes, podendo revogá-las, complementá-las, alterá-las ou simplesmente criar um novo direito. Como os tratados se posicionam perante as leis do ordenamento jurídico brasileiro? Saiba mais Sobre o processo legislativo brasileiro, visite o site da Câmara dos Deputados no endereço <http://www2.camara.gov.br/ processolegislativo>. Sobre os tratados que o Brasil assinou com outros países, visite o site do Ministério das Relações Exteriores no endereço <http:// www2.mre.gov.br/dai/bilaterais.htm>. Conheça também as convenções de Havana: <http://www2.mre. gov.br/dai/tratados.htm> e Viena: <http://www2.mre.gov.br/dai/ dtrat.htm>. 48 direito_internacional.indb 48 2/1/2007 15:33:20 UNIDADE 3 Sujeitos do Direito Internacional Público 3 Objetivos de aprendizagem Conhecer os sujeitos do Direito Internacional Público: Estados (incluindo-se aí a Santa Sé) e organizações internacionais. Compreender o Estado, que é o principal sujeito do DIP, e suas vertentes política, pessoal e física. Seções de estudo Seção 1 O Estado e suas características. Seção 2 O Estado no plano físico. Seção 3 O Estado no plano pessoal. Seção 4 As características da Santa Sé. Seção 5 As organizações internacionais: conceitos e características. direito_internacional.indb 49 2/1/2007 15:33:20 Universidade do Sul de Santa Catarina Para início de estudo - Você já sabe quais são as fontes que criam o Direito Internacional Público não é mesmo? Nas unidades anteriores você estudou que os tratados são a principal fonte do DIP, estudou também que esses tratados são elaborados pelos sujeitos do DIP. Nesta unidade você vai conhecer mais sobre os sujeitos do DIP, ou seja: os Estados e as organizações internacionais. O Estado é o principal sujeito do DIP. E, em razão disso, você irá explorá-lo sob três ênfases: a política, a pessoal e a física. Trocando em miúdos, como o Estado se comporta nas relações com outros membros da sociedade internacional, na ênfase política. Na ênfase pessoal, você vai estudar como o Estado se relaciona com as pessoas (nacionais e estrangeiros). Por último, na ênfase física, você vai descobrir como o Estado exerce seu poder sobre o território. As organizações internacionais, por sua vez, só existem em razão da vontade dos Estados de fundarem entidades que agrupem a si próprias, mediante objetivos comuns. Como se fosse um clube, uma fundação ou mesmo uma empresa, que tem personalidade jurídica diferente de seus fundadores. Os Estados, por ficção jurídica, conferem a essas entidades uma personalidade jurídica própria, diferente das personalidades jurídicas dos Estados. Essas organizações internacionais desempenham um importante papel na sociedade internacional, tentando aproximar mais os Estados e evitar conflitos. Passe, agora, a estudar esses sujeitos. 50 direito_internacional.indb 50 2/1/2007 15:33:20 Direito Internacional SEÇÃO 1 - O Estado e suas características O principal sujeito das relações internacionais públicas (e, por conseqüência, do DIP) é o Estado. Para melhor estudá-lo, vamos dissecá-lo em três partes: o Estado no plano político, o Estado no plano físico e o Estado no plano pessoal. Assim, você vai estudar como o Estado se relaciona com os outros Estados da comunidade internacional, como exerce poderes sobre um território e como se relaciona com as pessoas físicas que entram e saem de seu território. Inicie agora o estudo. Você vai gostar de entender como o Estado funciona. O Estado no plano político Constituição do Estado (requisitos, modelos e formas de nascimento) Conforme estabelece a Convenção Interamericana sobre os Direitos e Deveres dos Estados, firmada em Montevidéu, em 1933, são elementos constitutivos de um Estado: uma população permanente – massa de indivíduos, nacionais e estrangeiros, que habitam o território em determinado momento histórico; um território determinado – com fronteiras definidas e devidamente ocupado; um Governo próprio – com poder interno (autonomia) e poder externo (independência); capacidade de entrar em relação com os demais Estados – reconhecida pelos demais membros da comunidade internacional. São os requisitos para que o Estado seja considerado como um Estado pela comunidade internacional. A existência desses elementos, e de todos eles em conjunto, é de suma importância, uma vez que se não estiverem todos presentes, não se considerará um Estado plenamente. Veja o caso da Palestina, em que se discute se é ou não é um Estado. Unidade 3 direito_internacional.indb 51 51 2/1/2007 15:33:20 Universidade do Sul de Santa Catarina Possui um Governo (autoridade palestina), possui uma população permanente (as pessoas que residem no território desenhado da Palestina), mas lhe falta o domínio sobre o território (situação que parece estar sendo equacionada neste nosso momento histórico), o que faz com que muitos países não reconheçam a Palestina como um Estado. Em razão da capacidade de exercer seus direitos e obrigações os Estados classificam-se em razão de diferentes modelos de organização de poder: a) Simples ou unitários – são os Estados plenamente soberanos em relação aos negócios externos e sem divisão de autonomias no tocante aos internos. Ex.: a maioria dos Estados europeus. b) Compostos – são entidades estatais que se agrupam por vontade (coordenação) ou por força de um Estado mais poderoso sobre outro (subordinação): por coordenação – associação de Estados soberanos ou de unidades estatais que, em pé de igualdade, conservam apenas uma autonomia de ordem interna, enquanto o poder externo é investido num órgão central. Existiam vários modelos de Estados compostos, como a união real, a união pessoal e a confederação de Estados, mas atualmente só existe o modelo federação. Na Federação de Estados a personalidade externa existe somente no superestado, o Estado Federal. Os seus membros, ou seja, os Estados Federados, possuem simplesmente a autonomia interna, sujeita essa, entretanto, às restrições que forem impostas pela Constituição Federal. Brasil, Argentina, Estados Unidos são exemplos de Estados Federados; por subordinação – atualmente não existem mais Estados compostos por subordinação. Tratavam-se de uniões em que os integrantes não se achavam em pé de igualdade, ou não possuíam plena autonomia, ou se achavam despidos do gozo de determinados direitos, entregues a outros. Eram os Estados vassalos, 52 direito_internacional.indb 52 2/1/2007 15:33:20 Direito Internacional protetorados ou Estados clientes, países satélites (o caso da ex-URSS), e países sob tutela (colônias). No momento, podemos indicar como uma situação de subordinação a intervenção norte-americana no Iraque. A Comunidade Britânica de Nações é uma associação de Estados que não se inclui em nenhuma dessas categorias. Trata-se de livre associação, que mantém a plena soberania dos Estados membros e a igualdade de posição. Quando os elementos constitutivos se agrupam, ocorre o nascimento de um novo Estado. Como atualmente os territórios do globo já se encontram ocupados, o nascimento de um Estado novo pode acontecer em razão dos seguintes fatos: a) separação de parte da população e do território de um Estado, subsistindo a personalidade internacional da pátria-mãe. Foi o caso do Brasil, quando tornou-se independente de Portugal. A pátria-mãe (Portugal) continuou a existir no cenário internacional, mas nasceu uma nova personalidade jurídica (o Brasil), com território definido, uma população permanente, um Governo próprio (autônomo e autoproclamado independente), sendo que nos faltava o reconhecimento internacional, que foi comprado da Inglaterra. Mais recentemente vimos o caso do Timor Leste, que se separou da Indonésia; b) dissolução total de um Estado, não subsistindo a personalidade do antigo Estado. É o caso da Tchecoslováquia, que deu origem à República Tcheca e à Eslováquia; c) fusão, que é a junção de dois ou mais países sob uma nova personalidade. É o caso da Alemanha, que fundiu a Alemanha Ocidental e a Alemanha Oriental, divididas no pós-Segunda Guerra em torno de um Estado novo, a Alemanha (lembre-se da divisão com a construção do muro de Berlim e da unificação com a queda do muro). Unidade 3 direito_internacional.indb 53 53 2/1/2007 15:33:20 Universidade do Sul de Santa Catarina Reconhecimento (de Governo, de beligerância e de Estado) Apenas para relembrar, você já estudou o reconhecimento na Unidade 2, como um ato unilateral praticado por um Estado. Esse reconhecimento pode ser de diversas situações. Interessanos, neste momento, o reconhecimento de um Estado. Isso significa a decisão do Governo de um outro Estado já existente de aceitar uma nova entidade como um Estado. O reconhecimento pode ter efeito declaratório (apenas reconhecendo uma situação já existente) ou constitutivo (criando um novo Estado), podendo ser feito de forma expressa (formalmente por meio de ato escrito) ou tácita (de forma indireta, por exemplo, recebendo o Chefe do Estado novo com honras e pompas de Chefe de Estado dentro do território do país), individual (de país para país) ou coletiva (vários Estados declaram o reconhecimento do novo Estado por meio de um tratado multilateral), condicionada (ao pagamento de certo valor, por exemplo) ou sem a imposição de condições. No entanto, nos casos de separação, nem sempre o reconhecimento de um novo Estado se dá de forma tranqüila pela pátria-mãe. Se está havendo um problema interno (tumulto, situação de beligerância, motim, guerra civil), pode acontecer de a pátria-mãe valer-se (ou receber) de uma declaração de cunho internacional, que se chama reconhecimento de beligerância. O reconhecimento de beligerância ocorre quando uma parte da população se subleva (revolta) para criar novo Estado, ou então para modificar a forma de governo existente, ou quando os demais Estados resolvem tratar ambas as partes como beligerantes num conflito, aplicando as regras de Direito Internacional a respeito. Se a luta atinge vastas proporções, de tal sorte que o grupo sublevado se mostra suficientemente forte para possuir e exercer de fato poderes comparados aos do Governo do Estado, constitui-se um Governo responsável, que mantém sua autoridade sobre uma parte definida do território do Estado, possui uma força armada regularmente organizada, submetida à disciplina militar, e se mostra disposto a 54 direito_internacional.indb 54 2/1/2007 15:33:21 Direito Internacional respeitar os direitos e deveres de neutralidade, os Governos estrangeiros poderão pôr as duas partes em luta no mesmo pé de igualdade jurídica, reconhecendo-lhes a qualidade de beligerantes. Disso decorre a conferência das responsabilidades ao grupo insurreto de um Estado, no tocante ao direito da guerra. Também exonera a pátria-mãe de suas responsabilidades quanto ao grupo insurreto e passa a não tratá-lo como rebelde. O que significa que o grupo insurreto pode sofrer as sanções específicas para os casos de guerra (mesmo o Estado não estando numa guerra). Estes são direitos provenientes de convenções internacionais que disciplinam a guerra, punindo com regras especiais os infratores das normas de guerra. Perante outros Estados, a pátria-mãe não responde pelos atos do grupo insurreto (seqüestro de estrangeiros, seqüestro de cargas e transportes, por exemplo). Atualmente, temos um caso, aqui na América do Sul, com a Colômbia, em que está constituído um grupo paramilitar que domina determinada região territorial (as FARC – Forças Armadas Revolucionárias Colombianas), pleiteando o reconhecimento de beligerância como o passo inicial para constituir-se em um novo país. Uma vez reconhecido um Estado, a regra é que seja reconhecido o seu Governo quando ele mude. O reconhecimento de um novo Governo ocorre em razão das modificações da organização política de um Estado e são da alçada do Direito Interno (autonomia). No entanto, quando a modificação se dá em razão da violação da Constituição, por um golpe de Estado, é necessário o reconhecimento do novo Governo pela comunidade internacional, e isso se dá em razão exclusivamente de conveniências políticas. - Sobre a questão do reconhecimento surgiram duas doutrinas, observe! Unidade 3 direito_internacional.indb 55 55 2/1/2007 15:33:21 Universidade do Sul de Santa Catarina A doutrina Tobar (Ministro das Relações Exteriores do Equador) prega que só deve ser reconhecido o novo Governo após ter o povo escolhido livremente seus representantes, ou, no caso de revolução (tomada de poder pela força), a população já tenha aceitado o novo Governo. A doutrina formulada em Cannes, em 1922, que diz que o novo Governo deveria aceitar a proteção da propriedade individual, o reconhecimento das dívidas do Estado, a garantia de execução dos contratos e o compromisso da abstenção de propaganda subversiva contra outros países, para só então ser aceito. Na maioria dos casos, fica valendo a regra de que nos assuntos internos do Estado esse tem autonomia e que a comunidade internacional deve reconhecer o novo governante. Você já deve ter visto que quando há a posse de um novo (ou mesmo reempossado) Presidente da República aqui no Brasil (ou em qualquer parte do mundo), é feita uma solenidade de posse e uma festa comemorativa, em que participam os representantes de outros países (Chefes de Estados ou diplomatas). Esta é uma forma de se fazer o reconhecimento de um novo Governo. Sucessão de Estados - Você já percebeu que quando surge um novo país devem acontecer efeitos dessa novidade? Esses efeitos é que nos levam a estudar a sucessão de Estados. Sucessão é o conjunto de efeitos que decorrem da morte de um país. No caso da separação de Estados, esse fato gera efeitos para a pátria-mãe e para o Estado novo. Os tratados assumidos pela pátria-mãe não são transmitidos para o Estado novo, que deverá contratar seus próprios tratados. 56 direito_internacional.indb 56 2/1/2007 15:33:21 Direito Internacional O Estado novo receberá da pátria-mãe os bens públicos existentes na parte do seu território (ruas, rios, solo, subsolo, escolas, etc.). Mas nas questões financeiras o Estado novo assumirá as dívidas contraídas sobre a razão de seu território (por exemplo, um empréstimo feito para construir uma represa na região que agora pertence ao Estado novo). Quanto à legislação, o Estado novo criará a sua própria lei, assim como a pátria-mãe continuará exigindo, no seu território, a legislação até então em vigor. Quanto à nacionalidade, as pessoas que residirem no território do Estado novo deverão receber uma nova nacionalidade, ou poderão permanecer como nacionais da pátria-mãe, ou, ainda, poderão ter dupla nacionalidade. Um exemplo de separação de Estados é o caso da Indonésia e do Timor Leste. Para ver o mapa da Indonésia e do Timor Leste acesse o site <http://pt.wikipedia.org/wiki/Timor_Leste>. No caso de dissolução de Estados, como a pátria-mãe deixa de existir, somente haverá efeitos para os Estados novos, que contratarão novos tratados, pagarão as dívidas contraídas pela pátria-mãe, receberão as partes do patrimônio da pátria-mãe, conferirão novas nacionalidades e comporão novas leis internas. Um exemplo de dissolução de Estados é o caso da Tchecoslováquia, que deu origem a dois novos países: a República Tcheca e a Eslováquia. Para ver o mapa da Tchecoslováquia, da República Tcheca e da Eslováquia acesse o site <http:// pt.wikipedia.org/wiki/Tchecoslov%C3%A1quia>. No caso de fusão de Estados, ao contrário da dissolução, os Estados antigos deixarão de existir, criando um novo, que adotará uma nova nacionalidade, novas leis internas, novos tratados e absorverá as dívidas e o patrimônio dos Estados antigos. Unidade 3 direito_internacional.indb 57 57 2/1/2007 15:33:21 Universidade do Sul de Santa Catarina Exemplo de fusão é o caso da Alemanha, que fundiu as duas Alemanhas numa só. Para estudar um pouco sobre a história desse país, sobre a sua separação e a sua reunificação acesse o site: <http://pt.wikipedia.org/wiki/ Hist%C3%B3ria_da_Alemanha>. Por fim, há, ainda, uma situação que merece ser estudada, a da anexação de território de um Estado. Essa anexação pode se dar de forma total, quando um país anexa para si o território completo de outro Estado, como foi o caso do Tibet, que foi anexado pela China. Nesse caso, o Estado anexante (China) assume todos os bens e as dívidas do Estado anexado (Tibet), impõe ao anexado a sua legislação, os seus tratados e a sua nacionalidade (a nacionalidade do Estado anexado deixa de existir). No caso de anexação parcial (como o caso do Acre, que foi anexado pelo Brasil, da Bolívia), os bens e dívidas públicos referentes àquele território passam para o Estado anexante (Brasil), os tratados do anexante se estendem sobre o território anexado, bem como a legislação interna. Com relação à nacionalidade, a população pode ser beneficiada com a nacionalidade do anexante, em substituição à nacionalidade do Estado anexado, ou pode ser concomitante a essa, criando a situação de dupla nacionalidade, uma vez que a pátria de onde foi retirada a parcela do território continua existindo. Para estudar um pouco sobre a história do Tibet acesse o site: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Tibet>. 58 direito_internacional.indb 58 2/1/2007 15:33:21 Direito Internacional Direitos e deveres dos Estados Como cada Estado é uma peça dentro da sociedade internacional, as suas relações internacionais são relações de direitos e de deveres. Além do que consta nos tratados, que geram direitos e deveres entre as partes contratantes, existem direitos e deveres universais dos Estados, e que podem ser resumidos nos itens que seguem. São direitos dos Estados: o direito à existência e à igualdade formal, que consiste no direito que têm os Estados soberanos de serem iguais perante a lei internacional. Isso significa que cada Estado terá direito igualitário de voto e um não poderá reclamar jurisdição (poder) sobre o outro; o direito ao respeito mútuo, que é o direito de ser tratado com consideração e reconhecido como pessoa internacional; o direito à liberdade, que compreende a soberania externa (independência) e interna (autonomia). A soberania interna compreende os direitos de organização política, de legislação e de jurisdição sobre as pessoas, e de domínio sobre o território. A soberania externa compreende os direitos de ajustar tratados, de representação, de fazer a guerra e a paz; o direito de defesa e conservação, que consiste na prática de todos os atos necessários à defesa do Estado contra os inimigos externos ou internos. São deveres dos Estados: o dever moral de assistência mútua, por exemplo nos casos de calamidades e catástrofes; o dever jurídico de respeitar os direitos fundamentais dos outros Estados (tratados, soberania, etc.); Unidade 3 direito_internacional.indb 59 59 2/1/2007 15:33:22 Universidade do Sul de Santa Catarina o dever de não-intervenção, pois a intervenção é um ato abusivo, visando a imposição de uma vontade estranha ao Estado. Esse dever admite exceções, como a intervenção em nome do direito de defesa e conservação, para preservar os direitos humanos e, em caso de guerra civil, para proteção dos nacionais. É o caso da intervenção coletiva, prevista na Carta da ONU, que é promovida pelo seu Conselho de Segurança, em casos de ameaça à paz ou outros atos de agressão. Veja o caso do Haiti, em que está sendo feita uma intervenção coletiva, comandada pelo exército brasileiro, por designação do Conselho de Segurança da ONU. Responsabilidades dos Estados Todo Estado, como membro da comunidade internacional, ao se relacionar é responsável pelos seus atos, tantos os positivos, que causem bons efeitos, quanto os negativos, atos que causem danos a outros países. Na situação de dano, cabe à responsabilidade do Estado reparar o mal causado, tenha ele efeito moral (desrespeito ao Chefe de Estado de outro país, por exemplo) ou patrimonial (destruir a sede da Embaixada de outro país, por exemplo). 60 direito_internacional.indb 60 2/1/2007 15:33:22 Direito Internacional Você sabia? No Direito chama-se de responsabilidade objetiva a obrigação do Estado de manter os compromissos assumidos e reparar o mal injustamente causado a outrem, seja ele praticado por vontade do Estado ou não. O simples fato de um ato do Estado ter gerado um dano a outrem é suficiente para que se caracterize a responsabilidade do Estado. Esse ato pode ser por parte do Poder Executivo, quando decide, por exemplo, não cumprir um tratado; por parte do Poder Legislativo, quando edita uma nova lei que derruba (revoga) um tratado; ou, então, por parte do Poder Judiciário, quando se recusa a decidir conforme um tratado assinado pelo país. O ato lesivo, ainda, pode ser praticado pelos funcionários do Estado, por atos de indivíduos nacionais, mas de natureza internacional (atentado contra Chefes de Estado, por exemplo). A regra geral para cobrar a responsabilidade de um Estado é que, antes de esgotados todos os meios internos para reparação do dano, não seja feita a reclamação diplomática, que poderá ser feita em favor de um Estado, de seu nacional ou de pessoa que se encontre sob proteção diplomática. Os Estados possuem a obrigação de reparar os danos causados e de dar uma satisfação adequada (pedido formal de desculpas, manifestação de pesar). No entanto, existem circunstâncias que excluem a responsabilidade, como a legítima defesa, as represálias (atos ilícitos, mas que justificam o combate a outros atos ilícitos), a prescrição liberatória (levou tanto tempo para exercer o direito que o perdeu), a culpa do próprio lesado, a renúncia do indivíduo lesado, e o estado de necessidade, em nome do direito de conservação. Órgãos da representação internacional dos Estados Quando os Estados se relacionam, fazem isto por meio de seus órgãos de relações internacionais, que são o Chefe de Estado, o Ministro de Relações Exteriores e os órgãos da diplomacia do país. Unidade 3 direito_internacional.indb 61 61 2/1/2007 15:33:22 Universidade do Sul de Santa Catarina - A partir de agora você agora vai estudar um pouco sobre esses órgãos. Siga em frente! Chefe de Estado É o órgão encarregado das relações internacionais dos Estados (art. 84, VII e VIII, Constituição Federal Brasileira). As Constituições dos países fixam os poderes dos Chefes de Estado, que podem estar vinculados ao Parlamento (Congresso). Para que o Chefe de Estado possa desempenhar bem as suas funções de representante maior do país, ele recebe tratamento diferenciado, com prerrogativas e imunidades, entre elas a inviolabilidade da pessoa, de sua residência, seu carro, seus papéis, a isenção de impostos diretos nos países onde se encontra, e a isenção da jurisdição territorial (será julgado no seu país de origem) que poderá ser renunciada. Ministros das Relações Exteriores (Chanceler) São auxiliares dos Chefes de Estado na formulação e na execução da política exterior do país. É o chefe hierárquico dos funcionários diplomáticos e consulares do país. As funções do chanceler são de natureza interna e de caráter internacional. No caso do Brasil, cabe ao chanceler referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República junto ao Congresso. Possui atribuições especiais de receber agentes diplomáticos, ouvir e negociar propostas ou reclamações, assinar acordos internacionais, representar o país e gerenciar a atuação dos agentes diplomáticos (subordinados). 62 direito_internacional.indb 62 2/1/2007 15:33:22 Direito Internacional Missões diplomáticas De caráter político, destinam-se a manter boas relações com os outros Estados e a proteger os seus nacionais que estiverem no país em que estão sediadas. Os agentes diplomáticos se dividem em embaixadores (legados ou núncios), enviados, ministros ou similares, e encarregados de negócios. O corpo diplomático é o conjunto de agentes acreditados num mesmo Estado, sendo presidido pelo decano, o agente mais antigo. A sede da missão diplomática é a Embaixada, e encontra-se sempre localizada na capital do país. A missão é composta pelo chefe da missão, membros do pessoal diplomático, pessoal administrativo e técnico, e pessoal de serviço da missão. Cada Estado determina as qualidades e condições de idoneidade que devem possuir os agentes. No Brasil constitui-se de um corpo de funcionários de carreira. O documento de identificação desses funcionários é o passaporte diplomático e a credencial (carta de chancelaria) assinada pelo Chefe de Estado e referendada pelo Ministro das Relações Exteriores. Possuem os deveres de lealdade para com seu país, respeito e consideração às autoridades locais e às leis locais dos países onde cumprem missão, não-intervenção na política interna do país onde cumprem missão, não-participação em intrigas partidárias, proteger os interesses do país e de seus nacionais no Estado onde cumprem missão, manter o Estado de origem informado sobre as evoluções do Estado onde está acreditado. Esses agentes têm direito de representação, podendo falar em nome de seu Governo, manter relações amistosas, intercâmbio econômico, cultural e científico. Possuem prerrogativas e imunidades de inviolabilidade da pessoa e da residência, de jurisdição local e isenção de impostos. As missões diplomáticas terminam geralmente em virtude de ato administrativo do Governo ou de outro posto, de chamado de volta para a Secretaria do Estado, por demissão ou aposentadoria. Unidade 3 direito_internacional.indb 63 63 2/1/2007 15:33:22 Universidade do Sul de Santa Catarina A missão do diplomata também pode terminar em decorrência de o Estado de residência declarar o diplomata persona non grata (ou seja, revogar a autorização de exercício de atividade diplomática – agrément). Ocorrendo ruptura de relações diplomáticas, extinção do Estado acreditado, ou na hipótese de o Governo se decidir a fechar a missão, por considerá-la desnecessária, terminam as funções do agente diplomático. No exercício da atividade diplomática são aplicadas as disposições da Convenção de Viena sobre missões diplomáticas, de 1961. Delegações junto a organizações internacionais As delegações possuem funções semelhantes às missões diplomáticas, mas funcionam junto às organizações internacionais (ONU, OEA, Mercosul, por exemplo), gozando de imunidades de inviolabilidade e isenção fiscal, e seus membros, além dessas, de imunidade de jurisdição penal, civil, administrativa e isenção da legislação social. Repartições consulares São repartições públicas (Consulados) estabelecidas pelos Estados, mediante tratados, em portos ou cidades de outros Estados, com a missão de velar pelos interesses do país de origem, principalmente os comerciais, prestar assistência e proteção a seus nacionais, legalizar documentos, exercer a polícia da navegação com os portos nacionais, fornecer informações de natureza econômica e comercial sobre o país ou o distrito onde se acham estabelecidas. Poder conferido pelo Estado que recebe o Cônsul, para que ele exerça as atividades consulares. Nomeado um Cônsul (funcionário de carreira ou honorário) lhe é conferido o exequatur, reconhecendo-lhe a autoridade e a permissão para que entre em função. 64 direito_internacional.indb 64 2/1/2007 15:33:22 Direito Internacional As funções consulares constam da legislação interna dos países, podendo sofrer restrições de acordo com a legislação do Estado receptor. Possuem obrigações genéricas de proteção, informação e a de fomentar o desenvolvimento de relações com o Estado receptor, além das funções de emitir passaportes, conceder vistos, funções de notário e de oficial de registro civil, velar pela sucessão de nacionais, comunicar decisões judiciais e extrajudiciais, executar comissões rogatórias, controle e inspeção sobre embarcações de sua nacionalidade e prestar assistência às embarcações e aeronaves e às suas tripulações. Devem ainda respeitar as leis e as autoridades do Estado onde estão, evitando atos ofensivos, além de cumprir os deveres para com o seu país, recebendo em troca prerrogativas de inviolabilidade pessoal dos locais consulares, de imunidade de jurisdição e de isenção fiscal. A missão do funcionário consular termina com a demissão, a remoção, a aposentadoria, o falecimento, a anulação do exequatur e a declaração de guerra entre os dois Estados. Aplicam-se para a atividade consular as disposições da Convenção de Viena sobre Repartições Consulares, de 1963. SEÇÃO 2 - O Estado no plano físico Agora que você já conhece como se organiza o Estado no plano político, você vai estudar uma outra importante feição do Estado: o plano físico. Muitas vezes, o exercício de poder do Estado nos domínios do seu território, de seu espaço aéreo e de suas águas é fonte de conflitos internacionais, por quebra de convenções ou por invasão de fronteiras. Siga em frente e bom estudo! Unidade 3 direito_internacional.indb 65 65 2/1/2007 15:33:23 Universidade do Sul de Santa Catarina Domínio terrestre, fluvial, marítimo e aéreo Considera-se domínio do Estado a porção da superfície do globo terrestre sobre a qual o Estado exerce soberania. Essa soberania compreende os poderes de imperium (soberania sobre as pessoas) e dominium (soberania sobre o território). O território de um Estado pode ser íntegro (compacto, como o território brasileiro), desmembrado (dividido, como o território inglês, que possui uma parte nas Ilhas Falklands ou Ilhas Malvinas) ou encravado (dentro de outro país, como o Estado do Vaticano). Considera-se território o domínio terrestre, fluvial, marítimo, lacustre e aéreo. Você vai estudar, a partir de agora, um resumo de como as regras internacionais estão organizadas para definir o dominium do Estado. Domínio terrestre Especificamente o domínio sobre o território do Estado compreende a propriedade sobre o solo e o subsolo, delimitados pela fronteiras. Na Unidade 4 você irá estudar mais sobre essa comissão. A extensão de um Estado depende de seus limites e fronteiras. Os limites podem ser naturais (ex.: um rio) ou artificiais (ex.: um meridiano). Para a demarcação de uma fronteira elege-se uma comissão mista, técnicos dos países limítrofes, que seguirão regras ajustadas previamente em um tratado de delimitação de fronteiras para elaborarem os trabalhos de demarcação dos limites territoriais dos países vizinhos. 66 direito_internacional.indb 66 2/1/2007 15:33:23 Direito Internacional Tais trabalhos são consignados em atas e indicados em mapas. A linha divisória é demarcada por marcos, postes, balizas, bóias, etc. Existem fatores naturais que influem nos trabalhos de demarcação, que são as montanhas, os rios, as ilhas e os lagos ou mares internos, que devem ser observados quando da elaboração das regras para demarcação das fronteiras dos Estados. Você poderá ver que o território do Reino Unido é espalhado em diversos continentes pelo site: <http:// pt.wikipedia.org/wiki/Reino_Unido>. Já o território do Vaticano é encravado dentro da Itália, veja no site: <http://pt.wikipedia.org/wiki/ Vaticano>. Domínio fluvial O domínio fluvial diz respeito aos rios existentes no território do Estado. Esse domínio está regulado na Convenção sobre o Direito do Mar, assinada em 10 de dezembro de 1982, e que entrou em vigor no dia 16 de novembro de 1994. Nessa questão é necessário dividir os rios em duas categorias: os rios nacionais, como o Rio São Francisco, cuja nascente e foz percorrem somente o território de um Estado (o Brasil); e os rios internacionais, que passam por dois ou mais países, como é o caso dos rios contíguos, que correm entre os territórios de dois ou mais Estados (é o caso dos rios Paraná e Uruguai, que servem de limite entre o Brasil e os Estados do Paraguai, Argentina e Uruguai), ou os rios sucessivos, que atravessam os territórios de dois ou mais Estados (é o caso do Rio Amazonas e seus afluentes). As regras internacionais para os rios nacionais são as de que a soberania desse rio é exclusiva do Estado ao qual pertence, mas eles devem ser abertos à navegação internacional civil (comercial ou turística). Unidade 3 direito_internacional.indb 67 67 2/1/2007 15:33:23 Universidade do Sul de Santa Catarina Já a soberania nos rios contíguos deve ser compartilhada pelos Estados que margeiam o rio, respeitando uma linha divisória imaginária. Nos rios sucessivos, cada país tem o direito de exercer a soberania no limite do seu território, mas tem também o dever de utilizar o rio de forma adequada, sem causar danos aos demais países em que o rio passa. Referente à navegação internacional, a regra é que ela deve ser livre para navios civis (comerciais ou turísticos). Tal liberdade, no entanto, admite que o Estado ou os Estados exerçam soberania quanto à fiscalização, à permissão para pesca, passagem e desempenho de atividades. Domínio marítimo O domínio marítimo diz respeito ao mar territorial que margeia o solo do Estado. Esse domínio também está regulado na Convenção sobre o Direito do Mar, assinada em 10 de dezembro de 1982 e que entrou em vigor no dia 16 de novembro de 1994. As regras internacionais dizem respeito ao mar territorial, à zona econômica exclusiva e ao alto-mar. O mar territorial é a faixa marítima marginal à costa de um território, que se estende até certa distância. A extensão do limite do mar territorial passou, ao longo dos tempos, por uma evolução, iniciando como critério de medida o limite do raio visual, depois o alcance de um tiro de canhão, três milhas náuticas, doze milhas (critério internacionalmente aceito hoje), até duzentas milhas (alguns países, entre eles o Brasil, adotaram unilateralmente essa medida, mas não houve o reconhecimento da comunidade internacional, o que causou uma série de conflitos internacionais). No Brasil vigora, desde a expedição da lei 8.617/93, o limite de doze milhas. 68 direito_internacional.indb 68 2/1/2007 15:33:23 Direito Internacional São geralmente reconhecidos ao Estado marginal, os direitos de pesca, de polícia e de cabotagem. Cabe aos navios civis, em tempos de paz, o direito de passagem inocente, o que restringe a soberania do Estado. Os navios estatais de guerra não têm esse direito reconhecido. Cabotagem é a navegação mercante entre os portos de um mesmo país. O direito de livre passagem não impossibilita a adoção de medidas de segurança. Se as leis estabelecidas pelo Estado que margeia o mar territorial são violadas, o Estado tem o direito de perseguir o navio infrator com seus navios de guerra, o que poderá se estender até fora dos limites territoriais, chegando até a destruição do navio estrangeiro. A jurisdição que será aplicada no mar territorial é a do Estado marginal, e deriva da sua soberania, porém com certas restrições. Quando se trata de navios nacionais, todos os atos dependem da jurisdição de dito Estado. Se tratar-se de navios internacionais, os de guerra estão isentos da jurisdição do Estado, já os navios mercantes, obedecem a jurisdição do país em cujo mar territorial eles estão. Para ver mais informações sobre o mapa do Brasil com seu mar territorial, a zona econômica exclusiva e o alto mar, visite o site: <http://www.comciencia. br/reportagens/litoral/lit03.shtml>. A zona econômica exclusiva é a faixa marítima entre o mar territorial e o alto-mar na medida de duzentas a trezentas e cinqüenta milhas marítimas (no caso de plataforma), onde o Estado costeiro exerce direitos de soberania para fins de exploração dos recursos naturais, vivos ou não-vivos, de exploração e aproveitamento da zona para fins econômicos, como a produção de energia a partir da água, das correntes e dos ventos, bem como a jurisdição no tocante à colocação e utilização de ilhas artificiais (plataformas de petróleo), instalações e estruturas, investigação científica, marinha e proteção e preservação do meio marinho. Unidade 3 direito_internacional.indb 69 69 2/1/2007 15:33:23 Universidade do Sul de Santa Catarina A plataforma continental é uma planície (ou um planalto) submersa, que acompanha a costa de um Estado, onde a água pouco profunda se estende a uma distância considerável a partir da terra e depois da qual o leito do mar se precipita a grandes profundidades. São suscetíveis, em seu subsolo, de aproveitamento pelo homem de suas riquezas naturais. Fazem parte da soberania exclusiva do Estado, que a explora com exclusividade. A exploração da plataforma deve visar a obtenção dos recursos que ela oferece, de forma exclusiva ao Estado proprietário, mas sempre privilegiando princípios internacionais de livre navegação, de pesca, de instalação de oleodutos e cabos submarinos e de proteção a agentes nocivos ao mar. O Brasil dispõe sobre a matéria nos decretos nº 28.840/50 e nº 63.164/69. Na esfera internacional, a Convenção Sobre o Direito do Mar define como plataforma continental o leito do mar e o subsolo adjacente às costas, mas fora do mar territorial, até uma profundidade de 200 metros ou que possa ser feito o aproveitamento, e as situações análogas, adjacentes às costas das ilhas. O alto-mar é a porção dos oceanos e mares que segue após as zonas econômicas exclusivas. Ele não pertence a ninguém e o seu uso é comum a todos os países, tenham eles águas territoriais ou não. Vigora no alto-mar o princípio geral da liberdade dos mares, definido em 1958 na Convenção sobre o Alto-Mar, e compreende a liberdade de navegação, de pesca, de colocação de cabos e oleodutos submarinos e de sobrevôo. É quando um navio, por conta própria, percorre os mares com objetivo de cometer atos de violência e depredação. Sobre abalroamentos nessa área, se for possível auferir a culpa, o culpado responde pelos danos, se isso não for possível (casos de culpa recíproca ou de caso fortuito), quem sofreu paga seus próprios danos. São regras no alto-mar a repressão geral ao tráfico de escravos e à pirataria, a proteção internacional dos cabos submarinos, e a proteção a espécies transzonais e altamente migratórias (Convenção de 1982). 70 direito_internacional.indb 70 2/1/2007 15:33:23 Direito Internacional Domínio aéreo O domínio aéreo diz respeito ao exercício da soberania no espaço aéreo acima do solo e do mar territorial (quando há) do Estado. Sua extensão alcança os limites que uma aeronave (avião) pode alcançar. Sobre esse domínio foi elaborada a Convenção Internacional sobre Aviação Civil, em 07 de dezembro de 1944, que estabelece que cada Estado tem soberania exclusiva sobre o espaço aéreo acima do seu território, restringida pela concessão, em tempo de paz, da liberdade de passagem inocente, para aeronaves civis. Há também as liberdades de pouso, de embarque e de desembarque de passageiros e mercadorias. Navios e aeronaves Os navios e aeronaves podem ser classificados em dois tipos: os civis e os estatais. São considerados como imóveis, por ficção jurídica, uma vez que possuem nacionalidade e seu interior é considerado como uma extensão territorial do país ao qual tem a nacionalidade. Os navios e aeronaves possuem bandeira, nome, domicílio (local onde são inscritos), arqueação (formato) e papéis de bordo. Entre as aeronaves o principal elemento de identificação é a marca da nacionalidade (cores da pintura ou letreiro). - Mas você deve estar se perguntando, o que isso importa? Importa que tendo uma nacionalidade e sendo a extensão territorial de um país, as regras que valem dentro da embarcação ou do avião são as regras do seu Estado nacional, tendo esse a jurisdição sobre as situações (nascimentos, casamentos, óbitos, crimes, etc.) que acontecerem no recinto. Unidade 3 direito_internacional.indb 71 71 2/1/2007 15:33:24 Universidade do Sul de Santa Catarina Quando o navio/avião nacional estiver no domínio territorial do Estado nacional aplica-se exclusivamente a sua lei. Se os transportes estiverem em alto-mar, a regra de jurisdição é semelhante. Mas se o navio/avião estiver no domínio territorial de outro Estado, cabem duas considerações: se o transporte for civil, a jurisdição que será aplicada é a territorial, isto é, cabe ao Estado onde está o transporte aplicar suas normas; se o transporte for estatal, não se aplica a ele o direito de livre navegação ou passagem inocente. Ele só adentrará no domínio territorial do outro Estado mediante sua autorização. E esse, quando o recebe, sabe que dentro dele não poderá aplicar a sua jurisdição, por tratarse, justamente, de um navio ou de uma aeronave de representação do outro Estado. Acaso aconteça alguma situação no interior do transporte, competirá às autoridades da marinha ou da aeronáutica do Estado de origem aplicar as regras de seu Estado nacional. Áreas internacionais São consideradas áreas internacionais o alto-mar, o espaço ultraterrestre, os corpos celestes e a Antártida (Pólo Sul), uma vez que o Pólo Ártico é coberto apenas de gelo, sendo cabíveis as regras da zona econômica exclusiva e do alto-mar. Esses espaços são considerados patrimônio comum da humanidade, não podendo haver apropriação deles por parte de qualquer Estado. No caso da Antártida, há o Tratado da Antártida, assinado por vários países em 1959, cujo objetivo é o de possibilitar a utilização do território da Antártida para fins pacíficos, preservando e conservando os recursos vivos, e proibindo explorações nucleares e lançamento de resíduos radioativos. 72 direito_internacional.indb 72 2/1/2007 15:33:24 Direito Internacional SEÇÃO 3 - O Estado no plano pessoal No estudo do plano pessoal do Estado você vai conferir o conceito de nacionalidade e o que ele implica na relação indivíduo X Estado. Você também vai estudar como o Brasil concede e tira a nacionalidade brasileira e como é o tratamento do Estado Brasileiro para brasileiros no exterior e para estrangeiros no território nacional. Esta parte tem ainda um complemento relativo aos casos de crimes cometidos por estrangeiros em território nacional ou por brasileiros em território estrangeiro. Estude bem esta parte e prepare-se para suas futuras viagens internacionais! Nacionalidade: aquisição, perda, relações do nacional quando está em território estrangeiro A população do Estado soberano é o conjunto de pessoas instaladas em caráter permanente sobre seu território. Essa população forma a comunidade do país, sobre a qual o Estado exerce jurisdição territorial (dentro do seu território, incluindo nacionais e estrangeiros) e jurisdição pessoal (sobre os nacionais que estão fora do seu território). Os nacionais são as pessoas submetidas à autoridade direta de um Estado, às quais se reconhecem direitos civis e políticos, e se deve proteção além das fronteiras. Já os estrangeiros são as pessoas que têm a nacionalidade de seu país de origem, mas que vivem (ou apenas se encontram) no solo de outro Estado. Considera-se apátrida aquele indivíduo que, por algum motivo, perdeu a sua nacionalidade ou não teve o direito de adquiri-la. A nacionalidade é um vínculo político entre o Estado soberano e o indivíduo, que faz desse um membro da comunidade constitutiva da dimensão pessoal do Estado. A nacionalidade pode ser originária, quando decorrente do nascimento, ou adquirida, quando provém de uma mudança de nacionalidade. Unidade 3 direito_internacional.indb 73 73 2/1/2007 15:33:24 Universidade do Sul de Santa Catarina A cada Estado incumbe legislar sobre sua própria nacionalidade, desde que respeitados os princípios e as regras de Direito Internacional sobre o assunto. Cada país, então, fi xa suas regras sobre a nacionalidade, tanto para concedê-la, como para cancelá-la. No tocante à aquisição da nacionalidade originária, aquela que deriva do nascimento, duas teorias se aplicam: a do jus soli, que determina que a nacionalidade seja conferida em razão do local de nascimento (direito do solo), não importando, nesse caso, a nacionalidade dos pais da criança; e a do jus sangüinis, que determina que a nacionalidade seja conferida em razão da nacionalidade dos pais da criança, não importando, neste caso, o local onde nasceu o indivíduo. Atualmente, a maior parte dos Estados adota os dois sistemas (ou sistema misto), no intuito de evitar que aconteçam casos de apatridia originária. Na aquisição de nacionalidade derivada ou adquirida, cada país estabelece também as regras de concessão de naturalização, ou seja, como concederá a sua nacionalidade a pessoas que não nasceram no seu território e nem são filhos de seus nacionais. Os sistemas legais dos países admitem a naturalização por meio de pedido, que se dá mediante o preenchimento das condições que cada país estipula (decurso de tempo, conduta legal e moral, adaptação à língua e aos costumes locais, etc.). Admitem a naturalização por imposição ou por benefício de lei, como nos casos de anexação territorial, fusão, dissolução ou separação de Estados, e admitem também a concessão da nacionalidade derivada por via do casamento. Geralmente, a aquisição de uma nova nacionalidade faz com que o indivíduo perca a nacionalidade de origem, devendo optar por uma delas e renunciar a outra. Mas quando isso não acontece, o indivíduo passa a ter dupla nacionalidade. O fato 74 direito_internacional.indb 74 2/1/2007 15:33:24 Direito Internacional de um indivíduo ter dupla nacionalidade, sejam elas originárias ou adquiridas, pode ser encarado como um problema para os Estados, uma vez que o indivíduo passa a ser súdito de dois países, devendo obrigações a ambos, o que pode ser um fato complicador quando, por exemplo, ambos os Estados se acham no direito de convocar esse nacional para compor suas forças de defesa em caso de guerra. A concessão da nacionalidade de um Estado a um indivíduo traz a ele uma relação de direitos e deveres com o Estado, permanecendo esse no território nacional, ou mesmo quando se encontra em solo estrangeiro. Lembre-se que todo cidadão nacional deve obediência às leis de seu país, uma vez que o Estado exerce sobre ele o seu poder de jurisdição, mesmo que esteja em território alheio. O exercício da jurisdição do Estado pode dar-se por meio do jus avocandi (direito de chamar de volta, avocar), quando o Estado se considera autorizado a chamar de volta o nacional, por motivos de ordem pública ou militar, ou quando o nacional pratica um crime ou delito e o Estado se julga competente para julgá-lo. De outra forma, o indivíduo também tem direitos perante o Estado, que passa a ter o dever de prestar ao seu nacional, quando em território alheio, o que se chama de proteção diplomática, que acontece quando um outro Estado deixa de oferecer ao nacional o mínimo de direitos, e o Estado desse passa a ter o dever de intervir em seu favor. A proteção se manifesta por meio de comunicações por escrito ao Ministério das Relações Exteriores do outro Estado, e tem como objetivo evitar um prejuízo ao indivíduo, ou obter a sua reparação. Essa pode se dar no caso de um nacional estar sendo julgado no estrangeiro por um crime e o Estado não lhe oferecer o direito de se defender. Nesse caso cabe ao país de sua nacionalidade intervir em seu favor, exigindo que o Estado onde está transcorrendo o processo lhe permita apresentar a sua defesa. Dependendo da política externa de cada país, o próprio Estado poderá fornecer advogado para a defesa de seu nacional. Unidade 3 direito_internacional.indb 75 75 2/1/2007 15:33:24 Universidade do Sul de Santa Catarina O tratamento que o Estado deve dar aos seus nacionais não deve admitir distinções entre natos (nacionalidade de origem) ou naturalizados (nacionalidade adquirida). Mas, conforme a lei interna de cada país, poderá haver situações privativas para os nacionais natos. Também, entre os Estados poderá haver situações de benefícios mútuos para os nacionais de seus países. Brasil e Portugal possuem um tratado de benefícios (estatuto da igualdade) para os portugueses e brasileiros nos seus territórios, possibilitandolhes o exercício dos direitos civis e políticos em ambos os países, desde que esses direitos lhes sejam conferidos nos seus Estados de origem. No caso do tratamento da nacionalidade pelo Estado brasileiro, aplica-se o artigo 12 da Constituição Federal (BRASIL, CF, 2006): Da Nacionalidade: Art. 12 - São brasileiros: I - natos: a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país; b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil; c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira; II - naturalizados: a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral; 76 direito_internacional.indb 76 2/1/2007 15:33:24 Direito Internacional b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira. § 1º - Aos portugueses com residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor dos brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos nesta Constituição. § 2º - A lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituição. § 3º - São privativos de brasileiro nato os cargos: I - de Presidente e Vice-Presidente da República; II - de Presidente da Câmara dos Deputados; III - de Presidente do Senado Federal; IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal; V - da carreira diplomática; VI - de oficial das Forças Armadas; VII – de Ministro de Estado e da Defesa. § 4º - Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que: I - tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional; II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos: a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira; b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis. Unidade 3 direito_internacional.indb 77 77 2/1/2007 15:33:25 Universidade do Sul de Santa Catarina Esse artigo estabelece a nacionalidade de origem no seu inciso I, sendo que a alínea a trata da concessão da nacionalidade originária pelo sistema do jus soli, com exceção dos filhos de indivíduos que estejam aqui a serviço de seu país (diplomatas, por exemplo). As alíneas b e c estipulam a nacionalidade originária pelo sistema do jus sangüinis. Assim, pode-se ver que o Brasil adota os dois sistemas, evitando a apatridia. No inciso II, a Constituição estabelece os casos de concessão de nacionalidade adquirida (naturalização). Estabelece a nacionalidade derivada aos que na forma da lei adquirirem a nacionalidade brasileira. Essa lei é o Estatuto do Estrangeiro, lei nº 6.815/80, e exige quatro anos de permanência no país e o preenchimento de outras condições como boa conduta, por exemplo. Estabelece a alínea a que aos indivíduos originários de países de língua portuguesa será exigida a permanência mínima de um ano ininterrupto e idoneidade moral, uma vez que esses estrangeiros são provenientes de países com língua e cultura similares às nossas. Na alínea b desse inciso temos a situação dos estrangeiros que não preenchem as condições da alínea a. Para esses, a lei exige, então, a permanência no solo brasileiro por 15 anos e a falta de condenação penal. No parágrafo primeiro do artigo 12, a Constituição estabelece a igualdade de tratamento para os portugueses no Brasil, na mesma linha do que estabelece o tratado da igualdade mencionado acima, com exceção para as situações específicas de brasileiros natos. No segundo parágrafo, a Constituição decreta o tratamento igualitário entre natos e naturalizados brasileiros, ressalvando-se os casos previstos na própria Constituição e que aparecem logo em seguida, no parágrafo terceiro, que lista os cargos que somente os brasileiros natos poderão ocupar, entre eles o de Presidente da República. No quarto parágrafo, a Constituição estipula os dois casos de perda da nacionalidade brasileira. O primeiro diz respeito ao cancelamento da nacionalidade, por parte do Governo brasileiro, para os estrangeiros naturalizados brasileiros. O segundo caso trata da perda da nacionalidade brasileira para brasileiros natos ou naturalizados que adquiram outra nacionalidade. Isso significa que ao adquirir a segunda nacionalidade os brasileiros 78 direito_internacional.indb 78 2/1/2007 15:33:25 Direito Internacional renunciam à nacionalidade brasileira. No caso de aquisição de outra nacionalidade, existem duas exceções em que o Brasil aceita a dupla nacionalidade, previstas nas alíneas a e b do inciso II do parágrafo 4º do artigo 12 da Constituição Federal, e que são os casos de uma segunda nacionalidade originária (muito comum no Brasil para os descendentes de italianos, uma vez que a Itália confere a sua nacionalidade por jus sangüinis), ou de exigência da aquisição de nacionalidade do país em que está o brasileiro para sua permanência lá ou para o exercício de direitos civis (poder casar-se, por exemplo). Tratamento do estrangeiro em solo nacional: vistos, deportação, expulsão, extradição Um dos direitos consagrados ao ser humano, registrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 10/12/48 pela Assembléia Geral das Nações Unidas – ONU, é o de livre locomoção dentro das fronteiras de cada Estado. Além dessa regra prevista no artigo XIII, o seu parágrafo segundo estabelece que toda pessoa tem o direito deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a esse regressar (SABATOVSKI; FONTOURA; FOLMANN, 2002. p. 189). - Neste caso é preciso uma legislação que defenda o cidadão, não é mesmo? Com base nesse princípio, consagra-se ao cidadão o direito a imigração, que é quando um estrangeiro se domicilia no território de um Estado, se instalando no país com ânimo definitivo. Cada Estado, no entanto, tem soberania para definir internamente as regras de receptividade de estrangeiros, mas deverá abrir suas fronteiras aos estrangeiros, exceto quando for para preservar o interesse da própria conservação. Unidade 3 direito_internacional.indb 79 79 2/1/2007 15:33:25 Universidade do Sul de Santa Catarina Os países estabeleceram como documento de identidade internacional o passaporte, que é um documento de natureza policial, entregue pela autoridade competente e destinado a garantir a livre passagem de seu portador de um lugar a outro. Para permitir a entrada, estada e saída legalmente de cada país, adotou-se o sistema de vistos. Assim, pode ser dado visto a um indivíduo em caráter permanente (imigrante), temporário (para trabalho, estudo) em carater de turismo ou trânsito, em caráter diplomático, oficial ou de cortesia (especial para representantes do Estado ou convidados ilustres do país). No Brasil, os vistos estão definidos nos arts. 4º a 19 da lei 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro). O Brasil adota o sistema de visto de entrada, que é solicitado pelo estrangeiro junto a um Consulado ou Embaixada brasileiros no exterior, e que tem a validade de cinco anos, e o sistema de visto de permanência, que é dado pela autoridade aduaneira brasileira, nos portos, aeroportos e em postos aduaneiros de fronteiras, em razão do motivo da estada do estrangeiro. Quando a autoridade, por qualquer motivo, não concede o visto pretendido pelo estrangeiro, esse não é aceito dentro do território nacional e deve retornar ao país de origem, nem chegando a ingressar em solo brasileiro, situação conhecida como repatriação. O fato de ser estrangeiro em um país, dá ao cidadão o reconhecimento de direitos decorrentes de duas circunstâncias: a personalidade humana e a situação do Estado como membro da comunidade internacional. Os direitos que devem ser reconhecidos ao estrangeiro são os direitos do homem ou individuais, isto é, a liberdade individual e a inviolabilidade da pessoa, com todas as conseqüências daí decorrentes, tais como a liberdade de consciência, de culto, a inviolabilidade do domicílio, o direito de comerciar, o direito de propriedade, etc., além de direitos civis e de família. Os estrangeiros, em regra, não têm direitos políticos fora de seu país natal. Mas há Estados que concedem esses direitos a determinados estrangeiros, possibilitando-lhes o direito de votar e serem votados. 80 direito_internacional.indb 80 2/1/2007 15:33:25 Direito Internacional Os estrangeiros também têm deveres perante o Estado em que se encontram, como o pagamento de impostos e o respeito às leis locais, sendo que o seu desrespeito é passível de punição. Quanto à jurisdição civil e comercial, aplica-se a lei local do país onde se encontram, especialmente tratando-se de ações reais sobre imóveis. Quanto à jurisdição criminal, em princípio, sujeitam-se os estrangeiros aos tribunais locais (princípio da territorialidade). No Brasil, o Estatuto do Estrangeiro disciplina a matéria nos artigos 95 a 110 e 125 a 126. Nas relações entre o estrangeiro e o Estado em que se encontra surge a possibilidade de algumas ações do Estado para retirar o indivíduo de seu território. Poderão ser aplicados os institutos da deportação, da expulsão e da extradição. A deportação de estrangeiros é uma forma de exclusão, do território nacional, daquele estrangeiro que aqui se encontra após uma entrada irregular, geralmente clandestina, ou cuja estada tenha-se tornado irregular, por exemplo, por excesso de prazo (quando deixou expirar o prazo do visto sem pedir a renovação). Quem cuida das exclusões são as autoridades locais (no Brasil é a Polícia Federal que cuida desse assunto), sem envolvimento da cúpula do Governo. O deportado pode voltar ao país desde que regularizada sua situação. A deportação dos estrangeiros pelo Estado Brasileiro está prevista no Estatuto do Estrangeiro, artigos 57 a 64. A expulsão dos estrangeiros consiste no direito do Estado de expulsar os estrangeiros que não se submetem às leis locais ou às medidas de polícia que lhes são impostas. Os atos que podem determinar a expulsão são: ofensa à dignidade nacional, mendicidade e vagabundagem, atos de devassidão, prática de crimes, propaganda subversiva, provocação de desordens, conspirações, espionagem, intrigas contra países amigos ou entrada ilegal no território nacional (quando já não couber a deportação). Unidade 3 direito_internacional.indb 81 81 2/1/2007 15:33:25 Universidade do Sul de Santa Catarina A expulsão pressupõe um inquérito que é realizado no âmbito do Ministério da Justiça, e ao longo do qual se assegura ao estrangeiro o direito de defesa. Verificado no inquérito a existência da circunstância que motiva a expulsão, cabe ao Presidente da República decidir, ao final, sobre a expulsão, e materializá-la por meio de decreto presidencial, que será publicado no Diário Oficial da União, determinando, em seguida, a retirada do estrangeiro do território do país. A expulsão importa na impossibilidade de retorno ao país. Só a edição de um decreto futuro, revogando o primeiro, faculta ao expulso o retorno ao Brasil. A volta do expulso, sem sua revogação, ao Estado, poderá resultar em sua prisão. A expulsão dos estrangeiros pelo Estado Brasileiro está prevista no Estatuto do Estrangeiro, artigos 65 a 75. A extradição de estrangeiros é o ato pelo qual um Estado entrega um indivíduo estrangeiro, acusado de fato delituoso ou já condenado como criminoso, a outro Estado para ser julgado e/ou punido. Um Estado deve concordar com a extradição, salvo se a julgar injusta ou irregular. A extradição pressupõe sempre um processo penal. O fundamento jurídico de todo pedido de extradição é um tratado de extradição celebrado entre os dois países envolvidos, no qual se estabelece que, em presença de determinadas condições, o Estado requerido entregará a pessoa reclamada (criminoso) ao Estado requerente. Na falta de tratado, poderá ser firmada uma promessa de reciprocidade, que poderá ser acolhida ou rejeitada pelo Estado, pois é um mero acordo de cavalheiros. O Estatuto do Estrangeiro disciplina a matéria nos artigos 76 a 94. Aplicam-se ainda as regras da Convenção de Havana de Direito Internacional Privado, assinada em 1928, arts. 344 a 381. Para a realização da extradição são observadas as seguintes condições: a) quanto ao lugar da infração – em geral, os atos criminosos foram praticados fora do Estado requerido e dentro dos limites territoriais do Estado requerente (princípio da territorialidade); 82 direito_internacional.indb 82 2/1/2007 15:33:25 Direito Internacional b) o fato deve ser punível nos Estados requerente e requerido – o Estado requerido não concederá a extradição quando a infração ou a pena estiverem prescritas; c) o fato de ainda não ter sido julgado no Estado requerido – não se concede a extradição por fato que determine o pedido e que esteja sob julgamento ou já julgado no país requerido; d) o não julgamento por tribunal de exceção – a extradição não será concedida se o delito for julgado no tribunal de exceção no país requerente. O crime deve ser julgado pelos tribunais legalmente constituídos dentro do país requerente; A prescrição da pena acontece quando o Estado levou tanto tempo para terminar o processo-crime que esse já não terá mais validade. É como um perdão da pena pelo fato de o Estado ter sido inerte por tanto tempo. e) a nacionalidade do indivíduo extraditando – não importa se o Estado extraditar um estrangeiro, mas sendo um nacional seu, por regra geral, o Estado se nega a extraditar. Admite-se exceções, como é o caso de envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes. A falta de extradição não pode gerar a de punição, sendo obrigação do Estado que se nega a extraditar aplicá-la; f) trata-se de indivíduo condenado à morte no país onde cometeu o delito – a regra é que os países que não admitem a pena de morte negam a extradição ou só a concedem mediante a substituição da pena; g) condições particulares do extraditando – o extraditando é um Chefe de Estado, não se admite a extradição. Quando não é mais, dependendo da situação, admite-se a extradição; h) quanto à gravidade das infrações – os atos mais graves dão origem à extradição. As infrações terão que ser puníveis nos Estados requerente e requerido. Excluem-se dos tratados de extradição certas categorias de delitos, Unidade 3 direito_internacional.indb 83 83 2/1/2007 15:33:26 Universidade do Sul de Santa Catarina como os crimes políticos (exceção ao terrorismo), delitos de imprensa e contra a religião, delitos militares e puramente militares (abandono de posto, insubordinação, deserção, covardia), e delitos especiais, como os de caça e pesca, as contravenções fiscais, etc. No Brasil, os pedidos de extradição passam pela análise de dois órgãos: o Supremo Tribunal Federal (STF) verifica se o pedido de extradição apresenta as condições de legalidade exigidas pela legislação interna e pelo tratado que vigora entre os dois países. Se verificada a legalidade, o Presidente da República define, por último, sobre o cumprimento do tratado e a entrega do indivíduo às autoridades estrangeiras. Direito Penal Internacional O Direito Penal Internacional foi concebido como forma de punir, internacionalmente, os atos considerados pela comunidade internacional como nocivos a essa sociedade. Assim, foram celebradas convenções que buscam punir os criminosos e coibir as práticas delituosas por todo o globo terrestre. Nessa vertente, cabe fazer a distinção entre os crimes internacionais e os crimes comuns cometidos no estrangeiro por nacionais ou cometidos no território nacional por estrangeiros. Os crimes internacionais são aqueles definidos em tratados internacionais e puníveis pelos tribunais penais internacionais. São os casos de crimes de ameaça à paz, crimes de guerra, genocídio, tráfico internacional de entorpecentes, tráfico de escravos, de mulheres e crianças, terrorismo, segregação racial. Tratando-se de crimes comuns cometidos no estrangeiro por nacionais ou cometidos no território nacional por estrangeiros, aplicam-se as regras de Direito Penal Internacional, advindas do Direito Internacional Privado, que definem a competência para julgamento e aplicação de lei penal. 84 direito_internacional.indb 84 2/1/2007 15:33:26 Direito Internacional No caso de crimes nacionais, sobre os quais há uma disputa de Estados para o seu julgamento, podemos dizer que o Direito Penal Internacional passa a definir quais regras penais serão aplicadas aos atos dos indivíduos, definindo que país é competente para julgá-los e que legislação deverá ser aplicada no julgamento, para garantir a repressão dos delitos nas relações internacionais. Neste sentido é importante conhecer que elementos de conexão deverão ser utilizados. Esses elementos são fornecidos a partir da aplicação dos princípios relativos à competência de julgar. a) Princípio da territorialidade – o delito será punido pelo Estado em cujo território foi praticado. A lei do local onde foi cometido o ato é que o define como crime. Tal princípio decorre da soberania do Estado, pois esse tem a jurisdição sobre as pessoas (nacionais ou estrangeiras) que se encontram em seu território. O princípio da territorialidade é defendido pela razão de que a pena é mais útil se for mais próxima do crime, no tempo e no espaço, o que fará com que tenha maiores repercussões e, em conseqüência, seja produzido o efeito de intimidação. O Estado cujo território foi praticado o crime é mais capacitado para puni-lo, o que pode ser mostrado pela facilidade para o recolhimento de provas. No Código Penal Brasileiro esse princípio encontra-se consagrado no artigo 5º, conforme segue: (BRASIL, CF, 2006): Art. 5º. Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. § 1º. Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. Unidade 3 direito_internacional.indb 85 85 2/1/2007 15:33:26 Universidade do Sul de Santa Catarina § 2º. É também aplicável a lei brasileira nos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. b) Princípio da extraterritorialidade – é a exceção ao princípio da territorialidade, porque mesmo que o crime tenha ocorrido no território de um Estado ele não é competente para julgá-lo. São os casos dos agentes diplomáticos, do pessoal administrativo e técnico da Missão Diplomática, dos funcionários de organizações internacionais, dos Chefes de Estados e Ministros das Relações Exteriores, dos cônsules, e os casos de tropas estrangeiras (que devem jurisdição ao Estado de sua bandeira). O princípio da extraterritorialidade pode ainda ser convencionado pelos Estados por meio de tratados para conceder imunidade a determinadas pessoas civis. c) Princípio da pessoalidade ou da nacionalidade – é aquele em que a jurisdição penal do Estado se exerce com fundamento na nacionalidade do agente ou da vítima do crime. A base desse princípio é que as leis penais são elaboradas levando em consideração os padrões morais dos nacionais, o que significa que elas devem ser aplicadas sempre aos nacionais, não importando o local do delito. A utilização desse princípio dá-se nos casos que constituem exceção ao princípio da territorialidade, evitando que o crime fique impune, e encontra-se no artigo 7º do Código Penal (BRASIL, CF, 2006): Código Penal Brasileiro Art. 7º. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I – (...) II – os crimes: a) (...) 86 direito_internacional.indb 86 2/1/2007 15:33:26 Direito Internacional b) praticados por brasileiro; c) (...) § 1º. (...) § 2º. Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato punível também no país em que for praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. § 3º. A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior: a) não foi pedida ou foi negada a extradição; b) houve requisição do Ministro da Justiça. d) Princípio da competência real, ou de proteção, ou objetivo – visa a punição do delito, seja qual for a nacionalidade do agente ou da vítima, ou o local do crime. O que importa é a nacionalidade do bem jurídico atingido pelo delito (em razão da importância que as leis internas de um país lhe dão), é assim uma defesa de que o Estado considera fundamental, sendo admitido a título excepcional e complementar. O que está em jogo aqui é o interesse do Estado como ente público. É previsto no artigo 7º do Código Penal (BRASIL, CF, 2006): Unidade 3 direito_internacional.indb 87 87 2/1/2007 15:33:26 Universidade do Sul de Santa Catarina Código Penal Brasileiro: Art. 7º. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I – os crimes: a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil; II - (...) § 1º. Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. § 2º. (...) § 3º. (...) e) Princípio da competência universal – é aquele que permite a qualquer Estado punir qualquer delito. O fundamento dessa teoria é ser o crime um mal universal, e, por isso, todos os Estados têm interesse em coibir a sua prática e proteger os bens jurídicos da lesão provocada pela infração penal. Está previsto no artigo 7º do Código Penal (BRASIL, CF, 2005): Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: [...] II - os crimes: 88 direito_internacional.indb 88 2/1/2007 15:33:26 Direito Internacional a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; [...] § 2º. Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato punível também no país em que for praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. f) Princípio da representação – estende ao país da nacionalidade de navios e aeronaves privados o direito de julgar crimes cometidos em território estrangeiro e não punidos pelas leis do local do crime. Asilo político É o acolhimento, pelo Estado, de estrangeiro perseguido em outro país por causa de dissidência política, de delitos de opinião ou por crimes que relacionados com a segurança do Estado não configuram quebra do Direito Penal Comum. O asilo político, na sua forma perfeita e acabada, é territorial: concede-o o Estado àquele estrangeiro que, havendo cruzado a fronteira, colocou-se no âmbito espacial de sua soberania, e aí requereu o benefício. Mas o asilo pode dar-se na forma diplomática, isto é, no caso de ter sido solicitado junto a uma Embaixada ou a um Consulado do país asilante dentro do território onde este estrangeiro se encontra. Unidade 3 direito_internacional.indb 89 89 2/1/2007 15:33:26 Universidade do Sul de Santa Catarina Os pressupostos do asilo político são a natureza política dos delitos e o estado de urgência. Aplicam-se as Convenções de Havana, de 1928, de Montevidéu, de 1933, e de Caracas, de 1954. O asilo político está previsto no Estatuto do Estrangeiro, nos artigos 28 e 29. SEÇÃO 4 - As características da Santa Sé A Santa Sé é a personalidade jurídica do Estado do Vaticano. O Estado do Vaticano é um Estado encravado dentro da cidade de Roma, capital da Itália. É atualmente considerado como um Estado, pela comunidade internacional, sendo seu Chefe de Estado o Papa. Até 1870 o poder papal se dividia em temporal, sobre os Estados pontifícios, possuindo a Santa Sé personalidade internacional, territórios e poder de mando; e espiritual, da Igreja Católica, exercido além das fronteiras do território da Santa Sé. Em 1870 o poder do Papa cedeu lugar ao poder do Rei, gerando a queda do poder temporal (político) do Papa. Em face disso, alguns países passaram a negar a personalidade internacional da Santa Sé. Tempos depois foi criada a Lei das Garantias, que assegurou ao Papa a “personalidade internacional”, como representante espiritual da Igreja Católica, com prerrogativas de Chefe de Estado. Em 11 de fevereiro de 1929 foram concluídos os Tratados de Latrão (cidade italiana), que deram a base legal da autoridade soberana do Papa, reconheceram a soberania da Santa Sé, criando a cidade do Vaticano, com independência e autonomia próprias, e reconheceram, também, certas prerrogativas ao Papa e propriedades à Santa Sé. A Santa Sé possui soberania sobre as pessoas que têm residência fi xa na cidade do Vaticano, mas não lhes confere nacionalidade. 90 direito_internacional.indb 90 2/1/2007 15:33:27 Direito Internacional Admite receber representação diplomática de outros países, e no caso de ruptura de relações de países acreditados na cidade do Vaticano com a Itália, o costume é que os diplomatas sejam retirados do Vaticano. Apesar de ser considerado legalmente como um país, o Estado do Vaticano possui algumas diferenças com os demais. Como é um país com território minúsculo e totalmente encravado, passa a ter uma relação de dependência de fato da Itália, seja para fins de ingresso e saída de pessoas e mercadorias, seja para fins de defesa. Também, uma das suas diferenças com os demais países é que não confere nacionalidade. Todos os indivíduos que residem no território do Vaticano permanecem com a sua nacionalidade anterior. Figura 3.1: Mapa do Estado do Vaticano. Fonte: Guia Del Mundo, 2006. Figura 3.2: Praça de São Pedro. Fonte: Vatican, 2006. Unidade 3 direito_internacional.indb 91 91 2/1/2007 15:33:27 Universidade do Sul de Santa Catarina SEÇÃO 5 - As organizações internacionais: conceitos e características As OIGs – Organizações Internacionais Governamentais são conjuntos de Estados soberanos, que se reúnem e criam, por meio de um tratado constitutivo, uma nova personalidade jurídica, diferente das personalidades dos Estados que a compõe. A essa personalidade jurídica os Estados estipulam objetivos, delegam poderes e determinam uma estrutura para que o seu funcionamento possa ser tal que atinja os objetivos previstos. A partir de sua criação, a OIG passa a funcionar e desempenhar o papel para o qual foi criada. Ela o faz por intermédio de pessoas que vêm a ser os representantes dessa organização. E, assim como os Estados, esses representantes são agentes habilitados para celebrar obrigações, por meio de tratados, em nome da OIG, e, assim o fazendo, estão agindo na medida dos poderes delegados pelos seus Estados-membros. Cada OIG pode apresentar características diferentes. Mas algumas características das OIGs são comuns, entre elas o fato de serem constituídas por Estados soberanos, o fato desses Estados estarem participando por livre vontade, de terem o mesmo objetivo que os une na OIG, e a condição de ter uma personalidade jurídica própria. Algumas OIGs têm caráter universal, como a ONU – Organização das Nações Unidas, e outras têm caráter regional, como o Mercosul – Mercado Comum do Sul. Umas podem ter um caráter meramente político, como o Grupo de Cairns, e outras podem ter o caráter meramente econômico, como o FMI – Fundo Monetário Internacional. Algumas podem ser ainda cooperativas, nas quais o nível de soberania delegado à OIG é baixo, e outras podem ser integracionistas, em que o nível de soberania delegado à OIG passa a ser maior. 92 direito_internacional.indb 92 2/1/2007 15:33:29 Direito Internacional Atualmente há um grande número de OIGs espalhadas nos diversos continentes do globo. E paralelamente às OIGs a sociedade internacional ainda conta com a atuação de ONGs – Organizações Não-Governamentais que têm atuação além das fronteiras de um só país, como é o caso da Cruz Vermelha e Crescente Vermelho, dos Médicos Sem Fronteiras, do Green Peace, da Anistia Internacional, da Human Rights Watch e de tantas outras, cada qual com uma finalidade. Algumas organizações internacionais de caráter universal ou regional Apesar do grande número e da importância das organizações internacionais, algumas merecem, pela sua destacada atuação, um pouco do nosso estudo. Entre as OIGs de caráter universal, certamente a que mais se destaca é a ONU, criada em 1945, em São Francisco, EUA, por meio de um tratado que uniu os países que combateram o eixo durante a Segunda Guerra Mundial, em torno de dois objetivos maiores: a manutenção da paz mundial e o desenvolvimento dos povos pela cooperação e pelo respeito aos direitos humanos. Esses objetivos e toda a estrutura de organização da ONU foram selados na Carta da ONU, ou Carta de São Francisco. Atualmente a maioria dos países do globo participa dessa organização. Para que seus objetivos sejam alcançados, foi criada uma estrutura central da ONU, composta por cinco órgãos. Assembléia Geral – composta por todos os membros da ONU, pode discutir qualquer assunto dentro do seu campo de atuação. Toma decisões aprovadas pela maioria de dois terços dos presentes sobre questões “importantes” e por maioria simples sobre outros assuntos. Cada membro representa um voto. Unidade 3 direito_internacional.indb 93 93 2/1/2007 15:33:29 Universidade do Sul de Santa Catarina Conselho de Segurança – órgão principal para manutenção da paz e segurança internacionais. Possui cinco membros permanentes (China, França, Rússia, Inglaterra e EUA, que foram os países aliados na Segunda Guerra Mundial e que combateram os países do eixo) e dez países-membros não-permanentes, que ocupam cadeiras no Conselho em sistema de rodízio. As decisões são tomadas por no mínimo nove dos quinze membros, sendo que aos permanentes é concedido o direito de veto, o que significa derrubar a decisão tomada por maioria, impossibilitando a ação. Conselho Econômico e Social – possui 54 membros e atua como coordenador das diversas agências especializadas criadas pela ONU para atingir a cooperação internacional em áreas econômicas e sociais. Conselho de Tutela - objetiva a fiscalização e a administração dos territórios colocados sob tutela da ONU, uma vez que ainda não atingiram capacidade plena como Estados. Corte Internacional de Justiça – principal órgão judiciário da ONU, oferece normas legais para solucionar os casos que lhe forem apresentados. Você vai estudar mais sobre a CIJ na Unidade 4. Secretariado – administrado pelo Secretário Geral, que é um indivíduo aprovado pela Assembléia Geral da ONU, possui tarefas de administrar a organização e de promover a mediação nos conflitos. Além dessa estrutura central, a ONU possui uma série de órgãos e agências especializadas que desenvolvem as ações da organização, formando um grande sistema. Com finalidade de cooperação econômica, formam o sistema ONU o BIRD – Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento, o FMI – Fundo Monetário Internacional, a OMPI – Organização Mundial da Propriedade Intelectual, a FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, a ONUDI – Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial, a OMC – Organização Mundial do Comércio e o GATT – Acordo Geral de Tarifas e Comércio. 94 direito_internacional.indb 94 2/1/2007 15:33:30 Direito Internacional Com a finalidade de promover a cooperação social, formam o sistema a OIT – Organização Internacional do Trabalho, a Unesco – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, a OMS – Organização Mundial de Saúde, o UNHCR – Alto Comissariado para Refugiados e o Unicef – Fundo das Nações Unidas para a Infância. Para a cooperação na área das comunicações e transportes estão a UPU – União Postal Universal, a UIT – União Internacional de Telecomunicações, a OACI – Organização da Aviação Civil Internacional e a OMI – Organização Marítima Internacional. Para cooperação com fins específicos, encontram-se a AIEA – Agência Internacional de Energia Atômica, a OMM – Organização Meteorológica Mundial e a OMT – Organização Mundial de Turismo. Além da ONU, destaca-se na esfera regional, para o continente americano, a OEA – Organização dos Estados Americanos, que foi criada nos mesmos objetivos da ONU, só que focados para o continente americano, em 1948, em Bogotá. Sua estrutura está organizada em órgãos que são: a Assembléia Geral, a quem cabe decidir a ação e a política da organização; o Conselho Permanente, para finalidade de manutenção da paz americana; o Conselho Interamericano Econômico e Social; o Conselho Interamericano de Educação, Ciência e Cultura, a Secretaria Geral; que promovem entre os membros relações econômicas, jurídicas, sociais, educacionais e outras; a Comissão Jurídica Interamericana; a Comissão Interamericana de Direitos Humanos; e a Corte Interamericana de Direitos Humanos que promovem o respeito e a defesa dos direitos humanos. Como organismos auxiliares na OEA estão: a Comissão Interamericana de Mulheres, o Instituto Indigenista Interamericano, o Instituto Interamericano de Ciências Agrícolas, o Instituto Interamericano da Criança, o Instituto Pan-Americano de Geografia e História, e a Organização PanAmericana de Saúde. Ainda na América, podemos citar como OIGs importantes a ALADI – Associação Latino-Americana de Integração e Desenvolvimento, o BID – Banco Interamericano de Unidade 3 direito_internacional.indb 95 95 2/1/2007 15:33:30 Universidade do Sul de Santa Catarina Desenvolvimento, a ODECA – Organização dos Estados Centro-Americanos, o MCCA – Mercado Comum CentroAmericano e o Caricom – Comunidade do Caribe. Em outros continentes, podem ser mencionadas a UE – União Européia, a OCDE – Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte, a Liga Árabe, e a OUA – Organização dos Estados Africanos. Globalização e regionalização: organizações internacionais de caráter econômico Pode-se dizer que o fenômeno atual da globalização aparece com a quebra do sistema bipolar de organização de poderes que o globo apresentava até o final dos anos oitenta. Com a queda do muro de Berlim e o fim do regime socialista da extinta URSS, que deu origem à Rússia e à criação de outros tantos países do leste europeu. A partir daí, com a multipolarização de forças (Estados Unidos, a China, o Japão e a União Européia como exemplos de centros de poder), o avanço da tecnologia e da ciência, a criação e disseminação da internet, a melhoria dos sistemas de transportes e dos meios de comunicação, geraram este fenômeno da globalização. Por outro lado, percebe-se um novo enfoque da soberania estatal, com o enfraquecimento do Estado-nação, e a importância das organizações internacionais, como novo sujeito no plano internacional. A globalização ou mundialização é o crescimento da interdependência de todos os povos e países da superfície da terra (VESENTINI, 1998, p. 69). A abertura do mercado competitivo gerado pela globalização apresenta fatores positivos e negativos, pois por um lado amplia as possibilidades de negócios para o mundo todo e, por outro, amplia também os possíveis concorrentes de uma organização. Como meio de conviver com a globalização, surge um movimento antágono, a regionalização, que é o agrupamento de países em torno de interesses comuns de cooperarem economicamente e integrarem-se em blocos econômicos, tentando proteger as suas economias dos efeitos nocivos da globalização, criando benefícios entre si, e competindo em bloco 96 direito_internacional.indb 96 2/1/2007 15:33:30 Direito Internacional com os outros países do globo. Trata-se da união de países no intuito de somarem forças, através de trocas de mercadorias, tecnologia e capital, para competirem mais fortalecidos num mundo global, em diferentes níveis de integração, como define CASELLA (1996, p.34): a zona de livre comércio, a união aduaneira, e o mercado comum. A partir do mercado comum, surge a possibilidade de evolução subseqüente rumo a mercado interno orgânico ou mercado único, podendo chegar a uma união econômica, onde, além da supressão de barreiras, seja institucionalizada a unidade e organicidade do mercado abrangido por esse território, podendo alcançar os patamares de união monetária, ou mesmo de grau maior ou menor de união política. Em razão destas formas de agrupamento, há alguns blocos econômicos (OIGs com finalidade econômica), que são destaque na atualidade: a União Européia, o NAFTA – Tratado de Livre Comércio da América do Norte, e o Mercosul – Mercado Comum do Sul. Mas, não são estas as únicas OIGs com finalidade de integração econômica, a exemplo da ALCA, do Pacto Andino, da Asean, etc. A União Européia é o bloco com nível de integração mais avançado. Nasceu em 1951, com o Tratado de Paris (participaram a França, Alemanha, Itália e os países do BENELUX, Bélgica, Holanda e Luxemburgo). Para atingir seus objetivos, os Estados-membros criaram órgãos de caráter supranacional, com completa independência, destacando-se a Alta Autoridade, que emitia decisões de caráter obrigatório. Em 1957 foi criada a Comunidade Econômica Européia – CEE (ALMEIDA, 1996), que, em 1993 foi substituída pela União Européia, por meio do Tratado de Maastrich. Atualmente a União Européia possui 25 países-membros. Supranacional é o órgão que recebe a delegação de soberania dos Estados e tem o poder de decidir por eles. Os Estados simplesmente acatam o que foi definido no órgão supranacional, sem necessidade de ratificar a decisão. Assim, desde 1º de novembro de 1993, vigora na Europa o Tratado da União Européia ou Tratado de Maastrich, que instituiu a União Européia. Neste tratado os objetivos traçados são os de implementação de uma moeda única (o euro, que entrou em vigor em janeiro de 1999), como finalidade da união monetária, a implantação de uma união social e política e a instituição de uma cidadania da União e de uma política comum de defesa. Unidade 3 direito_internacional.indb 97 97 2/1/2007 15:33:30 Universidade do Sul de Santa Catarina O NAFTA pode ser definido como um acordo de cooperação objetivando a integração comercial entre os três parceiros, Estados Unidos, Canadá e México (SEITENFUS, 1997), através de uma zona de livre comércio, sendo que sua implantação deu-se em janeiro de 1994. O Mercosul nasceu em decorrência de uma série de tratados bilaterais argentino-brasileiros de caráter econômico. Em 26 de março de 1991 foi assinado o Tratado de Assunção, que criou o MERCOSUL — Mercado Comum do Sul, com a participação dos quatro países: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Em 17 de dezembro de 1994, em Ouro Preto, Minas Gerais, foi celebrado o Protocolo que leva o nome da cidade, revisando as instituições do Mercosul. O Protocolo de Ouro Preto conferiu, ainda, ao Mercosul a condição de personalidade jurídica de Direito Internacional (OIG). Em 1996, Chile e Bolívia associaram-se ao Mercosul, com o status de “parceiros”. Síntese Nesta unidade você aprendeu que para ser considerado um Estado, a entidade deverá possuir um território determinado por fronteiras aceitas pela comunidade internacional (domínio terrestre, fluvial, marítimo e aéreo), uma população permanente (formada por nacionais, sejam natos ou naturalizados, e estrangeiros em situação regular de permanência), um Governo soberano (estruturado de forma unitária ou composta no modelo federativo, com autonomia e independência) e o reconhecimento internacional como um Estado, feito pelos outros países, com os quais passará a manter relações internacionais. Você aprendeu, também, que a partir do momento que o Estado passa a ser reconhecido, ele tem direitos e obrigações perante a comunidade internacional e, por essa razão, assume a responsabilidade pelos seus atos. Aprendeu, ainda, que para realizar os atos internacionais em nome do Estado existem os órgãos de representação, que são o Chefe do Estado, o Ministro das Relações Exteriores, os diplomatas e cônsules. 98 direito_internacional.indb 98 2/1/2007 15:33:31 Direito Internacional O Estado pode fiscalizar o ingresso e a permanência de pessoas em seu território, e, no caso de irregularidades, pode valer-se da deportação e da expulsão dos estrangeiros. Deve ainda comprometer-se na perseguição dos criminosos, evitando a impunidade dos crimes, o que ele deve fazer por meio da extradição, da punição pelos tribunais internacionais penais, ou no caso de punição pelos tribunais nacionais, aplicar algum princípio penal que lhe possibilite punir o culpado. Você pôde estudar nesta disciplina que não cabe a extradição por crime político, e que nos casos de crimes ou perseguições políticas, o que cabe é o asilo político. Com relação à Santa Sé, você estudou aqui que o Estado do Vaticano é considerado, apesar de suas peculiaridades, um Estado pela comunidade internacional. E que além dos Estados, as OIGs desempenham um importante papel, organizando melhor a sociedade internacional. Essas OIGs podem possuir uma abrangência mundial ou regional, e podem servir de meio para integrar economicamente os países. Unidade 3 direito_internacional.indb 99 99 2/1/2007 15:33:31 Universidade do Sul de Santa Catarina Atividades de auto-avaliação Agora que você está no final da unidade, vamos exercitar o que você aprendeu. 1) Imagine que hoje a Palestina é um Estado plenamente constituído. Como é possível descrever a situação de criação desse novo país? E quais os efeitos que a sua criação gerará? 2) Imagine-se na seguinte situação: você está viajando a trabalho em um navio grego, que está transportando mercadoria brasileira (você fez a venda dessa carga e deve acompanhar o seu transporte). A carga foi embarcada via Porto de Itajaí, de onde você zarpou. Já dentro do navio, vem a acontecer um crime de homicídio de um dos funcionários do navio, de nacionalidade italiana, sendo que você está sendo acusado de tê-lo cometido. Como será definida a situação da legislação a ser aplicada e da jurisdição do Estado que pode punir esse crime, caso o momento do crime se verificar em três diferentes tempos: a) se o crime aconteceu enquanto o navio estava em mar territorial brasileiro? b) se o crime aconteceu quando o navio estava em alto-mar? c) se o crime aconteceu quando o navio estava no mar territorial de outro país (Portugal, por exemplo)? 100 direito_internacional.indb 100 2/1/2007 15:33:31 Direito Internacional 3) Crie uma tabela comparativa entre repatriação, deportação, expulsão e extradição, apontando as características mais marcantes e que diferenciam uma situação da outra. Tratamento dado ao estrangeiro Característica Repartição Deportação Expulsão Extradição Unidade 3 direito_internacional.indb 101 101 2/1/2007 15:33:31 Universidade do Sul de Santa Catarina Saiba mais Sobre o processo de intervenção da ONU no Haiti (MINUSTAH), procure mais informações no site oficial da ONU <http://www.un.org/Depts/dpko/missions/minustah/> ou no site do Exército Brasileiro <http://www.exercito.gov. br/04Maoami/missaopaz/minustah/indice.htm>. Sobre a questão do Tibet, assista ao filme Sete Anos no Tibet. Sobre a Palestina, procure informações no site <http://www. palestina.com.mx/>, que está disponível em espanhol. Sobre a questão das FARC, procure informações no site <http:// www.farcep.org>, disponível em espanhol. Sobre o ingresso na carreira diplomática do Brasil, veja o site do Ministério das Relações Exteriores (<www.mre.gov.br>), clicando em Instituto Rio Branco. Sobre a ONU, visite o site <http://www.onu-brasil.org.br/>. Sobre o Mercosul, visite o site do Ministério das Relações Exteriores do Brasil (<www.mre.gov.br>) ou o site oficial do Mercosul (<http://www.mercosur.org.uy>). Sobre a União Européia, visite o site <http://europa.eu.int/ index_pt.htm>. Sobre questões de punição em outro país e proteção diplomática, assista ao filme Justiça Vermelha. Leia no Saiba mais do AVA a Lei 6.815/80. 102 direito_internacional.indb 102 2/1/2007 15:33:31 UNIDADE 4 Conflitos internacionais Objetivos de aprendizagem Conhecer como são tratados os casos de conflitos entre os países e quais são os possíveis meios utilizados para a solução desses conflitos. Compreender quais são os meios de solução de conflitos, como são utilizados e a diferença entre cada um deles. 4 Seções de estudo Seção 1 As causas dos conflitos internacionais. Seção 2 Meios pacíficos de solução de conflitos internacionais. Seção 3 Meios bélicos de solução de conflitos internacionais. direito_internacional.indb 103 2/1/2007 15:33:31 Universidade do Sul de Santa Catarina Para início de estudo Você viu, nas unidades anteriores, quem são os sujeitos do Direito Internacional Público e como eles se inter-relacionam por meio de tratados. Agora, você vai estudar como esses sujeitos agem quando há um conflito de interesses. - Imagine uma simples situação: dentro do Mercosul, um dos países deixa de cumprir um dos termos do tratado. Isso gera um conflito perante os demais países do bloco. Como pode ser resolvido esse conflito? Parece complicado não é? - Agora imagine uma situação que há anos vem causando um dos maiores problemas mundiais da atualidade: a questão do território da Palestina. Que meio pode ser utilizado para resolver esse conflito? Depois de conhecer os meios disponíveis, volte a se perguntar: por que esse conflito ainda não foi resolvido? Como você pôde perceber, esta unidade de estudo trata de um tema bastante complexo. E, como você vai perceber ao longo do estudo, certa concordância e certa parcela de concessão de soberania devem existir para que os meios oferecidos pelo DIP possam alcançar a solução de um conflito internacional. Caso contrário, bem... você vai estudar! SEÇÃO 1 - As causas dos conflitos internacionais No plano internacional, sendo o Estado o seu grande sujeito, e convivendo esse em situação de igualdade com seus pares, outros meios são utilizados para a solução dos litígios, diferentes do meio utilizado pelo Estado no plano interno, que é o Poder Judiciário. 104 direito_internacional.indb 104 2/1/2007 15:33:31 Direito Internacional Esses litígios podem ter como causas de caráter jurídico a violação dos tratados, o desconhecimento, por um Estado, dos direitos do outro, ou a ofensa dos princípios de Direito Internacional na pessoa de um cidadão estrangeiro. Podem ser originados, ainda, por motivos políticos, como choques de interesses políticos ou econômicos ou ofensas à honra ou à dignidade de um Estado. Existem vários meios reconhecidos pelo Direito Internacional como legítimos para o fim pretendido, que é o de solucionar os conflitos entre os Estados. Os meios mais recomendados para a solução de um conflito internacional, independente do motivo de sua origem, são os meios pacíficos, mas também são considerados outros, de caráter coercitivo e bélico, estudados pelo Direito Internacional Público. Para melhor entendê-los, os doutrinadores costumam classificálos de várias formas. Eles estão divididos em duas categorias: os meios pacíficos, que são todos aqueles em que não há a declaração de guerra, incluindo-se aí os meios diplomáticos, os meios judiciários, a arbitragem e os meios coercitivos; e o meio bélico, que é aquele em que há a declaração de guerra de um sujeito contra outro. Ambos você estudará nas seções que seguem! Unidade 4 direito_internacional.indb 105 105 2/1/2007 15:33:31 Universidade do Sul de Santa Catarina SEÇÃO 2 - Meios pacíficos de solução de conflitos internacionais Os meios pacíficos de solução de controvérsias – ou conflitos – internacionais são divididos nos seguintes, conforme ensina Accioly (1996): meios diplomáticos – as negociações diretas, os congressos e conferências, o sistema de consultas, os bons ofícios e a mediação; meios judiciários – os tribunais internacionais permanentes, as comissões de inquérito e conciliação, e as comissões mistas; a arbitragem; meios coercitivos – a retorsão, as represálias, o embargo, o bloqueio pacífico, a boicotagem e a ruptura de relações diplomáticas. A negociação direta é o meio mais usual de solução de conflitos, e, geralmente, o de melhor resultado. Prevê o contato direto entre os envolvidos, sem a intermediação de nenhuma outra força externa ao litígio. Essas negociações variam segundo a gravidade do problema, e naqueles de menor importância basta, na maioria dos casos, um entendimento verbal entre a missão diplomática e o Ministério das Relações Exteriores local. Nos casos mais graves, porém, a solução poderá ser alcançada mediante entendimentos entre altos funcionários dos dois Governos, os quais poderão ser os próprios Ministros das Relações Exteriores. Na maioria dos casos, a solução da controvérsia constará de uma troca de notas (ACCIOLY, 1996). As negociações diretas podem ser resumidas no entendimento direto, em sua forma simples, entre os Estados envolvidos no litígio. 106 direito_internacional.indb 106 2/1/2007 15:33:32 Direito Internacional Os congressos e conferências ocorrem quando a matéria em litígio interessa a diversos Estados, ou quando se procura a solução de um conjunto de divergências ou questões. Atualmente, é comum que a solução de problemas coletivos resulte de reuniões da Assembléia Geral das Nações Unidas, que se apresenta como um foro de reunião universal, mas existem em outras organizações internacionais regionalizadas, a exemplo a OEA – Organização dos Estados Americanos, sendo geralmente utilizadas como foro de encontro para solução de litígios entre os países americanos. O sistema de consultas adotado no continente americano, por via principalmente da previsão contida na Carta da OEA, pode ser definido como um sistema de troca de opiniões entre dois ou mais Estados interessados direta ou indiretamente num litígio internacional, no intuito de alcançarem um acordo (ACCIOLY, 1996). O que esse nome (sistema de consultas) significa não é senão um entendimento direto programado. Não há, no caso da consulta, intervenção substancial ou sequer instrumental de terceiro Estado. As partes consultam-se mutuamente sobre seus desacordos e o fazem não de improviso, mas porque previamente o haviam combinado, como uma escala de agendas. Dessa forma, o chamado sistema de consultas nada mais é do que a previsão – normalmente expressa em tratado – de encontros periódicos nos quais Estados trarão à mesa de discussões suas reclamações mútuas, acumuladas durante o período, e buscarão solucionar, à base desse diálogo direto e programado, suas pendências (REZEK, 1996). Unidade 4 direito_internacional.indb 107 107 2/1/2007 15:33:32 Universidade do Sul de Santa Catarina Os bons ofícios são a tentativa amistosa de uma terceira potência, um terceiro Estado, ou de várias potências, no sentido de levar os Estados litigantes a se porem de acordo (ACCIOLY, 1996). Para Rezek (1996), cuida-se, de um entendimento direto entre os contendores, facilitado pela ação amistosa de um terceiro. Esse – o chamado prestador de bons ofícios – é um sujeito de Direito Internacional, um Estado ou organização, embora não seja raro que se individualize coloquialmente a iniciativa, indicando o nome do Chefe de Estado ou o Ministro que exterioriza esse apoio instrumental aos litigantes. Instrumental, aqui, vale dizer que o terceiro não propõe solução para o conflito. Na realidade, ele sequer toma conhecimento das razões de uma ou de outra das partes: limita-se a aproximá-las, a proporcionar-lhes, muitas vezes, um campo neutro de negociação, por haver-se convencido de que a desconfiança ou o ressentimento reinantes impedirão o diálogo espontâneo entre os Estados contendores. Neste meio de solução de litígios percebe-se, diferente dos anteriores, a presença de um terceiro, não envolvido no conflito, mas que interfere no sentido de promover o bom entendimento dos litigantes. Na mediação também se verifica a presença de um ou mais Estados, entre os Estados-partes do conflito, na busca de uma solução amistosa para o litígio. Desta vez, a pedido das partes, ou por oferecimento próprio, uma terceira potência intermedia diretamente a conclusão do óbice. O mediador desempenha a função de apontar às partes os benefícios de adotarem um acordo como solução do conflito, bem como oferece argumentos favoráveis e desfavoráveis às razões que envolvem a causa. De acordo com Rezek (1996, p. 347), tal como sucede no caso dos bons ofícios, a mediação importa o envolvimento de terceiro no conflito. Aqui, entretanto, esse não atua instrumentalmente aproximando as partes: ele toma conhecimento do desacordo e das razões de cada um dos contendores, para finalmente proporlhes uma solução. É imprescindível que o mediador conte com a confiança dos Estados envolvidos no litígio. Ao final das negociações, ele 108 direito_internacional.indb 108 2/1/2007 15:33:32 Direito Internacional emite um parecer (ou uma proposta), indicando um final para o conflito, o que não obriga os contendores. Esses sentem-se livres para acatar a proposta, se a achem satisfatória, agindo, a partir de então, nos termos que foram acordados. No entanto, basta que uma das partes se recuse aceitar a proposta – o que não resulta em qualquer ilícito – que restará fracassado esse meio de resolver o litígio. O mesmo ocorre com os demais meios diplomáticos, pois todos eles são baseados na vontade dos Estados contendores de conciliarem-se. Caso os meios sejam eficientes, resolvendo o conflito, veremos a existência de um acordo ao final do processo, que é mais uma característica dos meios diplomáticos. O meio judiciário caracteriza-se pela jurisdição, que é um foro especializado e independente que examina litígios (os conflitos) à luz do Direito e profere decisões obrigatórias. Assim definidos por resolverem os conflitos à luz do Direito, com imparcialidade, gerando uma sentença que dá solução ao litígio, os tribunais permanentes (as Cortes Internacionais de Justiça), as comissões internacionais de inquérito e conciliação, e as comissões mistas apresentam-se como meios judiciários ou judiciais de solução de conflitos internacionais. Na solução judiciária você pode observar a presença da concessão de parcela da soberania dos Estados envolvidos no conflito, no sentido de aceitarem e reconhecerem a decisão de uma corte já existente como obrigatória, antes mesmo de estarem cientes de seu resultado. Ocorrido o fato conflituoso, as partes em litígio contam com a existência, já prévia ao conflito, de uma corte (ou tribunal) permanente de solução de conflitos, com estrutura própria, regras próprias e juízes independentes, cujo objetivo seja o de julgar conforme as regras de Direito Internacional, na busca da justiça, o que o fazem a partir de um processo preestabelecido e cujas sentenças são obrigatórias para as partes. Unidade 4 direito_internacional.indb 109 109 2/1/2007 15:33:32 Universidade do Sul de Santa Catarina Podem ser autores de um processo junto a uma corte de justiça internacional um Estado ou uma organização internacional. A primeira corte permanente de que se tem registro é a Corte Centro-Americana de Justiça, criada em 1907, com funcionamento entre 1908 e 1918. Inicialmente instalada em Cartagena, teve sua sede transferida para San José da Costa Rica. Era constituída por cinco juízes, um de cada país-membro do centro-americano (Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua). Tinha jurisdição ampla, recebendo pedidos de indivíduos e pessoas jurídicas. Durante sua existência, julgou dez casos, dos quais cinco referentes a indivíduos. A Corte Permanente de Justiça Internacional (CPJI), vinculada à Liga das Nações (antecessora da ONU) foi fundada em 1921 e instalada na cidade de Haia, Holanda. Teve seu funcionamento até 1940, com extinção em abril de 1946, após a criação da Corte Internacional de Justiça (CIJ) da ONU, estabelecida no mesmo local, que lhe sucedeu. A CPJI, sucedida pela CIJ, apesar de não ter sido a primeira corte permanente a ser criada, tem sua importância por ser um tribunal de caráter universal, ao contrário da Corte Centro-Americana, que atendia conflitos regionais entre seus membros. Além disso, sua existência dá-se até os dias atuais, continuando a prestar um importante serviço à comunidade internacional. É interessante notar que o Estatuto da CIJ, com 70 artigos, é baseado ipsis verbis (tal qual) no Estatuto da CPJI, em razão da preocupação de ser mantida a numeração dos artigos, permitindo, assim, a solução de continuidade na jurisprudência emanada da Corte. Os juízes da CIJ são em número de quinze, não sendo admitidos dois de mesma nacionalidade, todos efetivos (não há suplência), com mandato de nove anos, permitida a reeleição, e procedendose à renovação pelo terço a cada três anos. Isto significa que a cada três anos termina o mandato de cinco juízes. Preserva-se, de tal modo, certa continuidade, evitando-se a mudança abrupta de todo o quadro 110 direito_internacional.indb 110 2/1/2007 15:33:32 Direito Internacional Conforme a regra do artigo segundo do Estatuto da Corte, será ela composta de um corpo de juízes independentes, eleitos sem atenção à sua nacionalidade, dentre pessoas que gozem de alta consideração moral e possuam as condições exigidas em seus respectivos países para o desempenho das mais altas funções judiciárias ou que sejam jurisconsultos de conhecida competência em Direito Internacional (RANGEL, 1993, p. 57). Os membros da Corte são eleitos pelo Conselho de Segurança e pela Assembléia Geral, de uma lista de pessoas apresentadas pelos grupos nacionais da Corte Permanente de Arbitragem. A competência da CIJ é relativa aos litígios que envolvem os Estados, não tendo por competência a solução de controvérsias que envolvam organismos internacionais ou particulares. É necessário, no entanto, que os Estados que busquem a Corte, para solução de seus conflitos, aceitem a sua jurisdição, por via de tratado, por via tácita (ajuizando questão ou contestando-a), ou por cláusula facultativa de jurisdição obrigatória. No primeiro e terceiro casos, não há como, depois de firmado o compromisso, o Estado, unilateralmente, deixar de reconhecer a competência da Corte, sob pena de descumprimento do tratado. Os processos perante a Corte e seus procedimentos estão determinados nos artigos 39 e seguintes do Estatuto da Corte, e constam dos seguintes itens: A Corte Permanente de Arbitragem teve determinada sua criação em 1899, pela Convenção de Haia, passando a funcionar em 1907, quando repetiu-se a Convenção. É uma instituição particular, à qual podem recorrer os Estados litigantes, em caso de arbitragem. Nesse caso, os Estados devem eleger a Corte como competente para dirimir um conflito já existente ou que possa vir a acontecer. Esta deve ser inserida, facultativamente, como uma cláusula, no corpo de um tratado geral, e que obrigue os Estados signatários a se utilizarem da corte como meio de solução de futuros litígios. a) o idioma utilizado é o francês e o inglês, mas a pedido das partes, poderá a Corte determinar a utilização de outro; b) as questões submetidas à Corte serão apresentadas em forma de notificação do acordo especial, ou por petição escrita dirigida ao Escrivão, contendo, em ambos os casos, o objeto da controvérsia e a indicação das partes; c) as partes serão representadas por agentes, com a assistência de consultores ou advogados, assegurados a todos os privilégios e imunidades necessários ao livre exercício de suas atribuições; Unidade 4 direito_internacional.indb 111 111 2/1/2007 15:33:32 Universidade do Sul de Santa Catarina d) recebida a petição ou a notificação, o escrivão procederá a sua comunicação aos demais interessados, bem como notificará os membros da ONU, por intermédio do Secretário-Geral, além de quaisquer outros Estados com direito a comparecer perante a Corte. Um Estado externo ao conflito, mas que entender que a decisão afetará seus interesses de ordem jurídica, poderá intervir na causa, mediante pedido à Corte, que acatará ou não a sua intervenção. Da mesma forma, poderão intervir no processo os Estados signatários de uma convenção que estiver sob pedido de interpretação; e) a Corte poderá indicar, conforme as circunstâncias do litígio, medidas provisórias para preservar o direito das partes, informando disso as partes e o Conselho de Segurança; f) o processo terá duas fases, uma escrita e outra oral. A fase escrita compreenderá a comunicação à Corte e às partes conflitantes de memoriais, contra memoriais, réplicas, peças e documentos encaminhados ao escrivão, que providenciará a ciência às demais partes envolvidas no litígio. O processo oral consistirá na audiência, pela Corte, de testemunhas, peritos, agentes, consultores e advogados. Se houver necessidade de citar pessoas, que não os agentes, consultores e advogados, a Corte contará com a colaboração dos Estados em cujo território deva se proceder ao ato. O mesmo procedimento ocorrerá no caso de prática de outros atos no território dos Estados; g) as audiências serão, em regra, públicas. De cada audiência será lavrada ata, assinada pelo escrivão e pelo Presidente da Corte (que é competente para dirigir os debates), que dará fé ao ato; h) à Corte incumbirá proferir decisões sobre o andamento do processo, a forma e o prazo em que cada parte terminará suas alegações, além das medidas necessárias para a apresentação das provas, podendo recusar-se a receber novas provas fora do prazo, a menos que as outras partes com isso concordem; 112 direito_internacional.indb 112 2/1/2007 15:33:33 Direito Internacional i) a Corte poderá determinar, à sua escolha, a qualquer indivíduo, companhia, repartição, comissão ou outra organização, a tarefa de proceder a um inquérito ou a uma perícia; j) o processo poderá correr à revelia, no caso de não comparecimento à Corte da parte processada ou de ausência de sua defesa; k) encerrados os debates, a Corte recolher-se-á de forma privativa e secreta para proferir a decisão; l) as questões levadas à Corte serão decididas por maioria dos juízes presentes, e, no caso de empate, pelo Presidente ou seu substituto para o caso. Na sentença constarão as razões de seu fundamento e o nome dos juízes que tomaram parte na decisão. A sentença será assinada pelo Presidente e pelo escrivão, devendo ser lida em sessão pública após a notificação dos agentes representantes dos Estados envolvidos; m) a sentença só será obrigatória para as partes envolvidas, sendo definitiva e inapelável. No entanto, admite pedido de interpretação, no caso de controvérsia quanto ao seu sentido ou alcance; n) da sentença caberá pedido de revisão, até dez anos contados de sua data, observados os procedimentos do artigo 61 do estatuto da Corte, e no caso de descobrimento de algum fato suscetível de exercer influência decisiva sobre a sentença já proferida; o) em regra, cada parte pagará suas custas no processo, podendo, no entanto, decidir diferentemente a Corte. Pode, ainda, a Corte ser acionada para emitir parecer consultivo (e não decisório) sobre qualquer questão jurídica. Além da Corte Internacional de Justiça, algumas organizações internacionais possuem tribunais administrativos, como a OIT, o Banco Mundial, a OEA (cujo tribunal tem por sigla OASAT) e a própria ONU (UNAT), nos quais resolvem-se problemas Unidade 4 direito_internacional.indb 113 113 2/1/2007 15:33:33 Universidade do Sul de Santa Catarina concernentes à função pública internacional, oriundos da relação entre a organização internacional e um prestador de serviços ou funcionário contratado. Direito Comunitário é a ordem jurídica própria das Comunidades Européias, embora, no estado atual da evolução da integração européia o Direito Comunitário não abrace as ordens jurídicas internas dos Estados-membros e se componha apenas do direito gerado pelos tratados que instruíram as três comunidades e por aqueles que os completaram e modificaram, ou seja, o Direito Comunitário originário, e pelos atos jurídicos provindos dos órgãos comunitários, que desenvolvem e aplicam tratados, quer dizer, o Direito Comunitário derivado. Existe ainda, a Corte de Justiça da União Européia, especializada em assegurar a correta aplicação e interpretação do Direito Comunitário nos conflitos oriundos das relações na União Européia. Existem também, as Cortes Européia e Interamericana, nas questões relativas a direitos humanos. E, ainda, o Tribunal Internacional do Direito do Mar, recentemente criado pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, assinada a 10 de dezembro de 1982, em Montego Bay (Jamaica). As Comissões Internacionais de Inquérito e Conciliação são comissões criadas para facilitar soluções de litígios internacionais ou para elucidar fatos controversos, por meio de uma investigação imparcial e criteriosa (ACCIOLY, 1996, p. 422). Criadas na Primeira Conferência da Paz, em Haia, em 1899, as comissões foram utilizadas na solução de diversos litígios internacionais: em 1904, entre a Inglaterra e a Rússia, durante a Guerra Russo-Japonesa; em 1916, num conflito entre Holanda e Alemanha, pelo afundamento de um paquete (navio) holandês; em 1952, num conflito de navegação entre Bélgica e Dinamarca. As comissões, em geral, são formadas por cinco membros, sendo dois de cada parte conflitante e o quinto escolhido de comum acordo das partes. Os procedimentos podem ser definidos pela própria Comissão ou podem ser adotadas as regras contidas na Convenção de Haia, de 1907. Admite-se geralmente o contraditório (defesa), devendo as partes ser representadas por seus agentes. A missão das comissões é a de conciliar as partes, devendo, para isso, após o exame dos fatos e do litígio, apresentar um relatório, com conselhos e sugestões que permitam um acordo entre os litigantes e estipulando um prazo para sua manifestação. Seu papel é consultivo e seu poder encontra força na persuasão das partes. 114 direito_internacional.indb 114 2/1/2007 15:33:33 Direito Internacional As comissões mistas foram muito usadas no século passado como forma de solução de litígios, sendo que os Estados litigantes compunham comissões com seus representantes, sem a participação de terceiros, definindo, por meio de tratado, regras para a atuação dessas comissões, que geravam um relatório propondo o fim do conflito. Forma primitiva de arbitragem, sua esfera de ação abrangia questões de fronteiras entre os Estados e reclamações de particulares por danos sofridos, pessoais ou patrimoniais. A arbitragem pode ser definida como o meio de solução pacífica de controvérsias entre Estados, em que os Estados litigantes escolhem livremente, por meio de um compromisso arbitral, uma ou mais pessoas, que julgarão o conflito, por meio de um procedimento (estabelecido no próprio compromisso arbitral) e da observância de normas ou de eqüidade, o que resultará numa decisão formatada num laudo, que as partes se comprometem a cumprir, mesmo antes de saber o seu resultado. A arbitragem é considerada uma via jurisdicional, mas não judiciária, de solução de controvérsias. Funciona como um tribunal ou uma instância ad hoc de julgamento criada para dirimir apenas uma questão, com prazo de funcionamento do início dos procedimentos para solucionar o conflito até o encerramento desses, momento em que deixa de existir. Significa nomeada para o ato. Meio de solução mais antigo do que a própria criação do Estado Moderno, a arbitragem já era conhecida nas cidades gregas. Não é considerada meio judicial exatamente pelo fato de não ser permanente, nem institucionalizada. Assim, o tribunal arbitral, ou o árbitro, é escolhido pelas partes, nomeado por elas para julgar aquele conflito específico, remunerado por esse serviço e dispensado da função após o término do litígio. Unidade 4 direito_internacional.indb 115 115 2/1/2007 15:33:33 Universidade do Sul de Santa Catarina Quando da existência de novo conflito, se as partes decidirem por solucioná-lo via arbitragem, convocam novo tribunal, ou selecionam novo árbitro. Daí definem as regras as quais deverá o árbitro seguir procedimentos e prazos podendo chegar a definir que direito deverá ser levado em consideração, ou mesmo a dispensa de julgamento com base em direito positivado, caso em que a decisão poderá ser tomada tendo por base a eqüidade. A arbitragem é escolhida pelas partes litigantes como meio de resolverem o conflito entre elas existente, por meio de tratado específico, denominado compromisso ou compromisso arbitral, ou de uma cláusula compromissória ou cláusula arbitral existente em um tratado geral. O compromisso arbitral é um tratado acessório a outro tratado (principal) ou decorrente de uma relação jurídica lesada (atos de violação de direitos de um Estado contra outro Estado), que tem por objetivo definir a arbitragem como forma de solução do litígio oriundo do tratado principal, ou da violação de direitos. O compromisso é um tratado bilateral em que os contendores: a) descrevem o litígio entre eles reinante; b) mencionam as regras do direito aplicável; c) designam o árbitro ou o tribunal; d) eventualmente estabelecem prazos e regras de procedimento; e) comprometem-se a cumprir fielmente, como preceito jurídico obrigatório, a sentença arbitral. No caso do compromisso arbitral, verifica-se a existência primária do conflito e secundária do compromisso, uma vez que sua configuração só teve sentido em razão do conflito aparente. Não havendo entre as partes concordância, via negociação direta, ou outro meio diplomático, para resolver o litígio, o consentimento mútuo passa a existir no momento de decidir o meio a ser utilizado para a resolução da lide. Cumpre ressaltar que para 116 direito_internacional.indb 116 2/1/2007 15:33:33 Direito Internacional a validade do compromisso é necessário observar os requisitos fundamentais para a confecção de tratados quanto à capacidade das partes e de seus agentes signatários, a forma, a licitude do objeto do tratado e a manifestação livre do consentimento. Já a cláusula compromissória não é apresentada como tratado acessório, uma vez que compõe o próprio texto do tratado principal. Isso significa que as partes resolvem contratar sobre determinada matéria, lavrando o termo do tratado e concordam, neste mesmo ato, que, na possibilidade de existir futuro conflito acerca dos termos daquele pacto, resolverão o litígio pela forma arbitral. A cláusula poderá descer a detalhes, como os já explicitados no compromisso arbitral, ou apenas comprometer as partes no uso da arbitragem. No caso da cláusula, a arbitragem é definida antes da existência do conflito, o que já a diferencia do compromisso arbitral. Em muitos casos, as partes resolvem, por meio de tratados gerais de arbitragem, escolher esse meio para resolver quaisquer espécies de conflitos entre si, ou mesmo de uma gama de relações que se originam de tratados-lei, como é o caso do Tratado de Assunção, que cria o Mercosul. O que se verifica na arbitragem é que o Estado, por meio do compromisso (via tratado ou cláusula), cede parcela de sua soberania para o árbitro ou tribunal arbitral, assim como no caso das cortes internacionais, no sentido de contratar uma decisão, antes mesmo de conhecê-la, passando a esse terceiro o poder de decidir pelo Estado. Não é outro o seu consentimento, que o de acatar, desde o início, a sentença arbitral, e comprometer-se a cumpri-la, seja ela favorável ou desfavorável às suas pretensões. Podemos dizer que a arbitragem tem como principais características o acordo de vontades das partes, para a fi xação do objeto do litígio e o pedido de sua solução a um ou mais árbitros; a livre escolha dos árbitros; e a obrigatoriedade da decisão. Unidade 4 direito_internacional.indb 117 117 2/1/2007 15:33:34 Universidade do Sul de Santa Catarina A escolha dos árbitros cabe, então, às partes envolvidas no litígio, uma vez que esses devem ser da confiança de ambas as partes. A escolha das partes poderá recair sobre uma pessoa (árbitro) ou sobre várias (tribunal arbitral). Esta poderá ser feita de comum acordo pelas partes, ou, na ausência de concordância, cada qual indicará os seus árbitros, em número igual, e esses elegerão um superárbitro, que geralmente funciona como presidente do tribunal e voto de desempate. Podem ser árbitros reis, chefes de Estado, diplomatas, juristas, técnicos na matéria em causa ou qualquer pessoa da confiança das partes. Para facilitar o procedimento de escolha dos árbitros e das regras de arbitragem, foi criada, pelas Convenções de Haia, de 1899 e de 1907, a Corte Permanente de Arbitragem. Localizada na cidade que sediou a convenção, trata-se não de uma Corte permanente de justiça (como a CIJ), mas de uma secretaria patrocinada pelos Estados que compõem a entidade, que tem por objetivo disponibilizar uma lista de possíveis árbitros a qualquer Estado. Essa lista é formada por indicação dos Estados membros da Corte, cada qual indicando, no máximo, quatro pessoas. No entanto, o fato de ser membro da Corte ou de indicar árbitros, não obriga o Estado a recorrer a ela sempre que estiver litigando. O procedimento utilizado no processo de arbitragem é regulado pelas partes, bem como os próprios árbitros poderão formulá-lo. No entanto, poderão escolher de seguir o procedimento oferecido pela Corte Permanente de Arbitragem. O procedimento da Corte, estipulado nas Convenções de Haia, compreende uma parte escrita e outra oral. Os debates orais poderão ser feitos em público ou não, a critério das partes. As decisões do tribunal serão tomadas em secreto, por maioria dos votos dos seus membros. A sentença arbitral é definitiva. Dela não cabe recurso a não ser que para tal haja previsão no compromisso. 118 direito_internacional.indb 118 2/1/2007 15:33:34 Direito Internacional Pode, ainda, ser a decisão objeto de nulidade ou anulação, nos seguintes casos: quando o árbitro ou o tribunal arbitral exceder, evidentemente, os seus poderes; quando a sentença for o resultado da fraude ou da deslealdade do árbitro ou árbitros; quando a sentença tiver sido pronunciada por árbitro ou árbitros em situação de incapacidade, de fato ou de direito; quando uma das partes não tiver sido ouvida, ou tiver sido violado algum outro princípio fundamental do processo; a ausência de motivação da sentença. A sentença pode, também, sofrer pedido de interpretação ou aclaramento. Mesmo definitiva, a sentença é obrigatória, porém não é executória. Primeiro por falta de uma autoridade internacional incumbida de assegurar a execução das sentenças. Segundo, porque o poder do árbitro encerra-se na definição da solução do litígio. Ele não possui uma milícia que obrigue o Estado perdedor a executar o laudo. O cumprimento da sentença, isto é, a sua execução, baseiase na honradez e boa-fé dos Estados-partes em observar o compromisso assumido quando da assinatura do tratado arbitral ou da cláusula de arbitragem. O descumprimento gera um ato ilícito, passível de repulsa nos moldes conhecidos pelo Direito Internacional. Os meios coercitivos encontram-se entre as soluções pacíficas de controvérsias (diplomáticas, judiciárias ou arbitrais) e a luta armada (guerra ou solução bélica). São meios de que os Estados muitas vezes se valem como sanções, por não terem os outros Estados dado cumprimento aos compromissos assumidos, ou como meio de forçar o cumprimento de decisões. Unidade 4 direito_internacional.indb 119 119 2/1/2007 15:33:34 Universidade do Sul de Santa Catarina A retorsão pode ser definida como o ato por meio do qual um Estado ofendido aplica ao Estado que tenha sido o seu agressor as mesmas medidas ou os mesmos processos que esse empregou ou emprega contra ele. É, pois, uma espécie de aplicação da pena de talião (REZEK, 1996, p. 435). Podem ser causas legítimas de retorsão o aumento exagerado de direito de importação, a proibição ou o dificultamento de circulação de produtos, interdição de acesso a portos de navios do Estado agressor, a concessão de vantagens a nacionais de um Estado em detrimento a nacionais de outros países, etc. Os atos praticados pelo Estado, em retorsão a outros, estão geralmente dentro de sua esfera jurídica e nem sempre se caracterizam como prática de ato contrário ao Direito Internacional. As represálias são medidas coercitivas, contrárias a certas regras de Direito Internacional, adotadas por um Estado em resposta aos atos ilícitos contra ele praticados por outro Estado. Não se configuram como um delito, por se tratarem de reações a outros delitos. As represálias podem ser positivas, no sentido de prática de ato pelo Estado que se defende, ou negativas, quando este se abstém de cumprir obrigação, prejudicando o Estado agressor. As represálias só devem ser admitidas em caso de violação flagrante do Direito Internacional por parte do Estado que a recebe. Devem constituir atos de legítima defesa, proporcionais ao dano sofrido pelo Estado que a pratica e devem cessar quando conseguida a solução do conflito original. O embargo consiste no seqüestro, em tempos de paz, de navios e cargas de nacionais de um Estado estrangeiro, ancorados em águas territoriais ou portos do Estado que se utiliza dessa coerção. Esse tipo de embargo não deve ser confundido com o embargo de príncipe, geralmente motivado por questões sanitárias, judiciais ou policiais. 120 direito_internacional.indb 120 2/1/2007 15:33:34 Direito Internacional O bloqueio pacífico ou bloqueio comercial é utilizado para impedir, por meio das forças armadas de um país, as comunicações com os portos ou as costas de um outro país, ao qual se pretende obrigar a proceder de determinado modo. O Instituto de Direito Internacional, em 1887, indicou como condições para que o bloqueio seja considerado legítimo: a) que os navios de pavilhão estrangeiro de terceiros Estados, que não os bloqueados, possam entrar livremente na área de bloqueio; b) que o bloqueio seja declarado e notificado oficialmente e mantido por força suficiente; c) que os navios violadores do bloqueio sejam suscetíveis somente de seqüestro, sendo que findo o bloqueio sejam restituídos, com suas cargas, aos proprietários, mas sem direito à indenização. A boicotagem é comumente vista nos dias atuais. Trata-se da ruptura das relações comerciais com o Estado ofensor, impossibilitando-o de fazer trocas comerciais (importar ou exportar) com os demais países. A Carta da ONU prevê em seu artigo 41 a possibilidade de uso de boicote para tornar efetiva suas decisões no caso de ameaças à paz mundial. Foi o caso do boicote imprimido contra o Iraque após a Guerra do Golfo. A ruptura de relações diplomáticas ou cessão temporária das relações oficiais entre os Estados é usada como sinal de protesto contra o Estado ofensor do Direito Internacional ou como meio de coerção para o cumprimento de compromissos. A ruptura das relações materializa-se pela entrega de passaportes ao agente diplomático do Estado a que se aplica, ou pela retirada, da capital de tal Estado, do agente diplomático do Estado que lança mão desse recurso. Unidade 4 direito_internacional.indb 121 121 2/1/2007 15:33:34 Universidade do Sul de Santa Catarina SEÇÃO 3 - Meios bélicos de solução de conflitos internacionais A guerra pode ser conceituada como a luta armada, durante certo lapso temporal, entre dois ou mais Estados. Geralmente inicia-se com uma declaração oficial de guerra e termina com um tratado de paz. A Carta das Nações Unidas, em seu preâmbulo, enfatiza o valor que se dá, atualmente, à guerra, quando menciona o propósito de “preservar as gerações futuras do flagelo da guerra”, e, em seu artigo segundo, item 3, estabelece que “todos os Membros deverão resolver suas controvérsias internacionais por meios pacíficos, de modo que não sejam ameaçadas a paz, a segurança e a justiça internacionais” (RANGEL, 1993, p. 31-33). Direito de guerra. Isto é, o jus in bello, que nasce do direito de soberania de cada Estado de fazer a guerra, deixou de ser um direito livremente exercido pelos países e transformou-se num dever: de não fazer a guerra, enquanto houver possibilidade de resolver pacificamente um conflito internacional. - Isso quer dizer que de um direito exercido a belo prazer pelo Estado, passou a ser o último meio de que se deve valer o Estado para resolver suas pendengas, o que é excelente, você não concorda? Pela comunidade internacional foram feitas várias convenções no sentido de humanizar a guerra e atribuir direitos e deveres aos Estados beligerantes. Dessas convenções conclui-se que a comunidade internacional, atualmente, busca a preservação das relações amistosas entre os Estados, o que se percebe pela valorização dos meios diplomáticos, judiciários e arbitrais de solucionar os conflitos. Veja as convenções que se seguiram ao longo dos tempos. Normas Costumeiras (séc. XVI): visavam proteger os feridos e enfermos, os médicos, enfermeiros e capelães, os hospitais, os prisioneiros de guerra e a população civil. 122 direito_internacional.indb 122 2/1/2007 15:33:34 Direito Internacional Declaração de Paris, de 1856: dispõe sobre a guerra marítima, proibindo a pirataria e protegendo navios mercantes civis. Convenção de Genebra, de 1864: marco inicial do direito humanitário. Declaração de São Petersburgo, de 1868: proíbe o uso, na guerra terrestre, de certas armas. Declaração de Bruxelas, de 1874: dá garantias às pessoas que não participam do combate. Conferência Internacional da Paz, em Haia, de 1899: proibição dos balões para lançamento de bombas e emprego de gás asfi xiante. Convenções de Haia, 1907: lança regras proibitivas à guerra, protegendo certas pessoas e lugares e proibindo o uso de certas armas. Pacto da Sociedade das Nações, 1919: limita-se a fazer da guerra uma alternativa secundária e não mais uma opção perfeitamente legítima de solucionar conflitos. Pacto de Paris, 1928 (ou Pacto Briand-Kellog – Ministros das Relações Exteriores da França e dos EUA): condenava o recurso da guerra como meio de solução de conflitos. Carta da ONU, 1945: proibição da guerra (art. 2º, § 4º). Convenções de Genebra, 1949: apontava a guerra como ilícito internacional. Protocolos de Genebra, 1977: alargavam os horizontes da proibição da guerra, incluindo as guerras de libertação nacional. Adesão do Brasil aos Protocolos de 1977, em 1992. Unidade 4 direito_internacional.indb 123 123 2/1/2007 15:33:34 Universidade do Sul de Santa Catarina Síntese Nesta unidade você estudou que existem muitos meios de solução de conflitos, mas eles basicamente se dividem em dois grupos: os pacíficos e os bélicos. Os meios pacíficos podem obter o fim do conflito pelo acordo (meios diplomáticos, com ou sem a ajuda de terceiros países), por uma decisão (meios judiciários e arbitragem) ou pela força (meios coercitivos). E, se nada resolver a situação, cabe a utilização do meio bélico, ou seja, a declaração da guerra. Os meios diplomáticos utilizados diretamente pelos Estados conflitantes são: as negociações diretas, os congressos e conferências, e o sistema de consultas. Contando com a participação de um terceiro não envolvido no conflito, aparecem como meios diplomáticos os bons ofícios e a mediação. Mas quando há a necessidade de buscar-se uma decisão, pois o acordo já não é mais possível, os Estados podem recorrer a meios judiciários, como os tribunais internacionais permanentes, as comissões de inquérito e conciliação, e as comissões mistas. Ou, ainda, valer-se da arbitragem. Para forçar o cumprimento de um acordo ou decisão, os Estados podem recorrer ao uso de meios coercitivos: a retorsão, a represália, o embargo, o bloqueio pacífico, a boicotagem e a ruptura de relações diplomáticas. E, se ainda assim, não for resolvido o conflito, cabe a declaração de guerra, sendo que a comunidade internacional celebrou diversas convenções internacionais na busca de suavizar os efeitos da guerra, tentando humanizá-la e discipliná-la. 124 direito_internacional.indb 124 2/1/2007 15:33:35 Direito Internacional Atividades de auto-avaliação Agora que você está no final do capítulo, vamos exercitar o que você aprendeu. 1) Faça numa tabela a distinção entre a solução judiciária e a arbitragem. Meios de solução de conflitos Características Solução judiciária Arbitragem 2) Diferencie retorsão de represália. 3) Diferencie a atuação do mediador da atuação do árbitro. Unidade 4 direito_internacional.indb 125 125 2/1/2007 15:33:35 Universidade do Sul de Santa Catarina Saiba mais Para saber mais sobre a Corte Internacional de Justiça da ONU, visite o site: <http://www.un.org/spanish/aboutun/organs/icj. htm>. Para saber mais sobre o Tribunal Europeu, visite o site da União Européia, no endereço <http://www.europa.eu.int/institutions/ court/index_pt.htm>. Para saber como são resolvidos os conflitos no Mercosul, e ver algumas decisões que envolvem o Brasil, visite <http://200.40.51.219/msweb/principal/contenido.asp>. 126 direito_internacional.indb 126 2/1/2007 15:33:35 UNIDADE 5 Direitos humanos 5 Objetivos de aprendizagem Compreender a proteção internacional dos direitos humanos, trazendo para a discussão um histórico das principais convenções internacionais de proteção aos direitos humanos e como as principais organizações internacionais atuam no sentido de garantir a proteção a esses direitos. Conhecer o quanto a sociedade internacional tem se preocupado com esse assunto inerente à condição humana. Seções de estudo Seção 1 Classificação dos direitos humanos. Seção 2 A proteção internacional dos direitos humanos. direito_internacional.indb 127 2/1/2007 15:33:35 Universidade do Sul de Santa Catarina Para início de estudo Agora que você já sabe como o Direito Internacional é criado, quem são os sujeitos do DIP e como esse ramo do Direito gerou meios para solucionar pacificamente os conflitos entre países, poderá, conhecer um pouco o que se tem trabalhado, no plano internacional, para definir e proteger os direitos humanos. Muitas vezes você pode pensar que, apesar desses esforços, ainda é possível ver, rotineiramente, agressões às pessoas e ao meio em que vivem, como são as situações de tortura, de racismo, de pobreza, entre outras. Outras vezes você pode pensar que os Estados pouco fazem pela proteção aos direitos humanos e que as ONGs, como a Cruz Vermelha e a Human Rights Watch, têm exercido um papel mais importante do que os Estados na proteção dos direitos do homem. — Mas, imagine só, se o que existe de bom, em termos de tratados internacionais, de organismos internacionais e de mecanismos de proteção dos direitos humanos não existissem? Aí sim, estaríamos à beira do caos não é mesmo? Agora você irá estudar um pouquinho sobre esse tema que é tão importante! 128 direito_internacional.indb 128 2/1/2007 15:33:35 Direito Internacioanal SEÇÃO 1 - Classificação dos direitos humanos Primeiramente cabe dizer que são considerados direitos humanos aqueles direitos que são inerentes à condição humana, seja como indivíduo, seja como ente social. Com a evolução das convenções internacionais, que trataram de reconhecer os direitos humanos e criar mecanismos de proteção, foi-se formando uma classificação desses direitos em direitos de primeira geração, de segunda geração e de terceira geração. São reconhecidos como de primeira geração os direitos mais primários do ser humano como um ser individual. São reconhecidos como de segunda geração os direitos do homem como um ser social, que vive em comunidade e que precisa ter acesso a determinados direitos para integrar-se com dignidade. E os direitos de terceira geração são os considerados direitos coletivos ou difusos, que não dizem respeito a apenas um indivíduo ou a um grupo social, mas a toda uma coletividade, sem necessidade de quantificação de seus membros. Dessa forma, classificam-se os direitos humanos em: direitos de primeira geração – são os direitos emergentes do direito à liberdade, em oposição à ação dos Estados. Compreendem os direitos civis e políticos, nos quais estão inseridos o direito à vida, à nacionalidade, à liberdade de movimento, ao asilo, à liberdade de opinião e de atividades políticas. Proíbem a tortura, o tratamento cruel, desumano e degradante, e a escravidão; direitos de segunda geração – são os direitos econômicos, sociais e culturais, nos quais se inserem os de cunho trabalhista (condições justas e favoráveis de trabalho), o direito de sindicalização, o direito à educação, à cultura, a um nível adequado de vida, à seguridade social; Unidade 5 direito_internacional.indb 129 129 2/1/2007 15:33:35 Universidade do Sul de Santa Catarina Identificação de culpa em um ato ilícito. direitos de terceira geração – caracterizam-se por serem desfrutados de maneira coletiva. São os direitos à paz, a um ambiente sadio (proteção ao meio ambiente), ao desenvolvimento e ao patrimônio comum da humanidade. O eventual desrespeito dos direitos humanos de primeira e segunda geração, mesmo encontrando dificuldades para reparar o dano causado, implica a fácil identificação de responsabilidade: o Estado e seus agentes é que respondem pelas infrações. No caso dos direitos de terceira geração, a imputabilidade é problemática, na medida em que tanto os queixosos, quanto os culpados são de difícil identificação (SEITENFUS; VENTURA, 1999, p. 131). SEÇÃO 2 - A proteção internacional dos direitos humanos A proteção internacional dos direitos humanos caracteriza-se pela construção de convenções internacionais, sejam elas de cunho universal ou regional, que tentam definir ou listar quais são os direitos humanos que a convenção quer proteger e como os Estados que dela participam devem agir para que essa proteção aconteça de fato. Assim, as principais convenções internacionais de proteção aos direitos humanos são: no âmbito da ONU, a Carta da ONU, de 1945, a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1948, a Convenção para a prevenção e a repressão do crime de genocídio, de 1948, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966 e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de 1966; no âmbito da OEA, encontramos no ano de 1948 várias convenções sendo assinadas, que são a Carta da OEA, a Declaração Americana dos Direitos e 130 direito_internacional.indb 130 2/1/2007 15:33:35 Direito Internacioanal Deveres do Homem, a Convenção Interamericana sobre a Concessão de Direitos Políticos à Mulher e a Convenção Interamericana sobre a Concessão de Direitos Civis à Mulher. Em 1964, foi celebrada a Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, e, em 1969, a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), certamente um dos mais completos tratados de proteção de direitos humanos do mundo. Em 1985 foi assinada a Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura; no que se refere à Europa, há a Convenção Européia para proteção dos direitos humanos e das liberdades individuais, de 1950; no que se refere à África, há a Carta Africana dos direitos do homem e dos povos, de 1981. Conforme ensinam Seitenfus e Ventura (1999, p. 129-131), a redação da Carta Constitutiva das Nações Unidas e de organismos regionais, como a Organização dos Estados Americanos, faz surgir um Direito Internacional convencional de proteção aos direitos fundamentais do homem. Os Estados permanecem sendo os sujeitos do Direito Internacional. Porém a proteção que é devida ao indivíduo, que se torna sujeito de Direito Internacional em certos casos, transformase em paradigma dessa nova fase do Direito Internacional. A Carta da ONU explicita que um de seus propósitos consiste em promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião (art. 1º, § 3º). Por sua vez, a Carta da OEA enfatiza que os Estados americanos proclamam os direitos fundamentais da pessoa, sem fazer distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo (art. 3º, § k). A assinatura, em 10 de dezembro de 1948, no âmbito da Assembléia Geral das Nações Unidas, de um documento sob o título Declaração Universal dos Direitos do Homem constituiu um marco referencial para a proteção internacional dos direitos humanos. Unidade 5 direito_internacional.indb 131 131 2/1/2007 15:33:36 Universidade do Sul de Santa Catarina Trata-se de uma declaração emanada em forma de resolução da Assembléia Geral. Infelizmente, as declarações possuem um peso político e moral, descartando-se a obrigatoriedade jurídica. Por sinal, não foi previsto nessa declaração um instituto de controle da aplicabilidade das normas sugerindo uma escassa eficácia. Ampliando o conteúdo da declaração de 1948, foram redigidos, no âmbito das Nações Unidas, a partir de 1966, os Pactos sobre direitos civis, políticos, econômicos e sociais. A mudança fundamental introduzida pelo sistema de pactos consiste na possibilidade de eficácia de execução, pois tais documentos se beneficiam de força jurídica convencional, o que a declaração de 1948 não tinha. Dois textos sobressaem-se, no que concerne à implementação dos direitos do homem: o Euro-ocidental, firmado em 1950, que institui uma Corte Européia de Direitos Humanos (Estrasburgo); e o das Américas, firmado em 1969, criando uma Corte Interamericana de Direitos Humanos, localizada em São José da Costa Rica. O caso europeu apresenta uma importante peculiaridade. Conforme a Convenção Européia de Proteção aos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, de 4 de novembro de 1950, todo indivíduo, organização não-governamental ou grupo de particulares, pode litigar diretamente junto à Comissão de Direitos do Homem, órgão vinculado à Corte de Estrasburgo (artigo 25). Essa Comissão desempenha, na verdade, papel de “filtro” em relação aos processos que chegarão definitivamente à Corte, construindo uma fase preliminar do rito. A jurisprudência da Corte estendeu essa capacidade às pessoas jurídicas, inclusive às sociedades comerciais. A Comissão e a Corte de Direitos Humanos da OEA (Pacto de San José da Costa Rica) seguiram o mesmo caminho. Como mecanismos internacionais de proteção aos direitos humanos aparecem: o Comitê de Direitos Humanos da ONU – composto de 18 membros eleitos para mandatos de quatro anos, tem por objetivo fazer com que os direitos previstos 132 direito_internacional.indb 132 2/1/2007 15:33:36 Direito Internacioanal na Convenção sobre Direitos Civis e Políticos sejam aplicados, recebendo relatórios dos Estados sobre sua aplicação e examinando questões de descumprimento do pacto. O Comitê, por meio de bons ofícios, tentará aproximar as partes de uma solução amigável do conflito. Não logrando êxito, poderá ser composta uma Comissão de Conciliação. Os Estados poderão, ainda, utilizar-se de outros meios de solução de controvérsias; a Comissão Interamericana de Direitos Humanos – OEA – composta de sete membros eleitos para mandatos de quatro anos, tem por objetivo promover a observância e defesa dos direitos humanos. A Comissão, por meio de processo, comunicará o Estado infrator, buscando chegar a uma solução amigável do conflito, e, em não alcançando a solução, poderá fazer recomendações ao Estado, para solucionar o conflito, com prazo para atendimento do relatório emitido. O particular poderá ser o autor de uma denúncia perante a Comissão; a Corte Interamericana de Direitos Humanos – OEA – composta por sete juízes eleitos para mandatos de seis anos, a Corte é sediada em San Jose, Costa Rica. Tem por função conhecer qualquer caso de interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos. Resolve conflitos por meio da solução judiciária, emitindo sentenças definitivas e inapeláveis. Nos casos de sentenças indenizatórias, a decisão da Corte serve como título executivo judicial, procedendo-se sua execução no território do Estado infrator, junto ao Poder Judiciário interno. Unidade 5 direito_internacional.indb 133 133 2/1/2007 15:33:36 Universidade do Sul de Santa Catarina Cabe, ainda, ressaltar a proteção internacional dos trabalhadores, realizada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), criada em 1919, junto com a Liga das Nações. Desempenha papel fundamental na elaboração das normas laborais e de controle do seu respeito. A OIT procura dar conteúdo concreto e tornar prática corrente certos direitos fundamentais do homem, em particular os de cunho social e econômico. As normas contidas nas Convenções e nas recomendações da OIT objetivam estabelecer níveis comuns de proteção laboral. Além da OIT, existem ainda organismos ou agências especializados da ONU, como o Alto Comissariado para Refugiados (ACNUR), a Comissão de Direitos Humanos e a Unesco. Síntese Nesta unidade você aprendeu que a proteção de direitos humanos é um tema relativamente jovem na agenda da sociedade internacional, pois os primeiros instrumentos que trataram do assunto surgiram a partir de 1945. De lá para cá muito se evoluiu na tentativa de consolidar o cumprimento dos direitos humanos, mas apesar das inúmeras convenções que tratam do assunto, muito ainda há a ser feito. Você estudou nesta unidade a classificação dos direitos humanos, em primeira geração (direitos do indivíduo como ser humano), segunda geração (direitos do indivíduo como ser social) e em terceira geração (direitos de uma coletividade). Estudou, também, como as OIGs estão tratando este tema, sendo que no caso da OEA já houve a evolução ao ponto de ser criar um tribunal permanente de justiça para julgar as infrações aos direitos humanos dentro dos Estados americanos, e além disso você pôde perceber que as OIGs e as ONGs desempenham um papel importante na defesa dos direitos humanos. Agora para reforçar seu estudo realize as atividades de autoavaliação que seguem. 134 direito_internacional.indb 134 2/1/2007 15:33:36 Direito Internacioanal Atividades de auto-avaliação 1) No site <www.presidencia.gov.br> (procure em legislação – constituição) você encontrará o texto da Constituição Federal Brasileira. Verifique nos artigos 5º ao 11 uma relação de direitos. Tente classificar três deles dentro dos direitos humanos de primeira geração e três deles de segunda geração. 2) No Brasil, você acha que os direitos humanos são respeitados? Pense em situações que você conheça em nível nacional, estadual ou mesmo municipal. Unidade 5 direito_internacional.indb 135 135 2/1/2007 15:33:36 Universidade do Sul de Santa Catarina Saiba mais Sobre a regulamentação dos direitos humanos na ONU, visite o site: <http://www.un.org/spanish/hr/>. Sobre o trabalho da Human Rights Watch no site em português: <http://www.dhnet.org.br/w3/hrw/>. 136 direito_internacional.indb 136 2/1/2007 15:33:36 UNIDADE 6 Conflitos de leis Objetivos de aprendizagem Conhecer os conflitos de normas existentes nas relações internacionais de caráter privado, além das soluções encontradas pelos sistemas jurídicos para evitar, minimizar ou resolver esses possíveis conflitos. Compreender o Direito Internacional privado brasileiro, ou seja, como o Direito Brasileiro resolve os conflitos de normas nas relações privadas internacionais. Entender como se aplicam as teorias de remessa e os elementos de conexão, decifrando que legislação nacional será aplicada num caso privado de relações internacionais. 6 Seções de estudo Seção 1 Os conflitos de leis e as formas de solução. Seção 2 Principais elementos de conexão presentes na legislação brasileira. direito_internacional.indb 137 2/1/2007 15:33:36 Universidade do Sul de Santa Catarina Para início de estudo No final desta disciplina você entrará na seara do Direito Internacional Privado. Imagine-se visitando um cliente em outro país e oferecendo um produto fabricado no Brasil. Você pretende vender esse produto ao seu cliente, mas, conhecendo um pouco como o mundo dos negócios lícitos funciona, você se enche de perguntas... Será que esse cliente é legalmente capaz para fazer o negócio? Será que o produto está legalmente habilitado para ser vendido no país onde estou? Será que tenho que fazer um contrato escrito, será que o cliente cumprirá com o pagamento? Será que posso usar esse contrato para processar o cliente no caso de inadimplência ou de qualquer outro problema? Qual será a legislação que devo aplicar para sanar essas dúvidas, e qual será o juízo competente para o caso de processo? Nossa, são tantas perguntas e detalhes para realizar esse negócio, não? Pois é, por isso é que foi criado o Direito Internacional Privado, para ajudar você a elucidar todas essas dúvidas. Vamos atrás das respostas? 138 direito_internacional.indb 138 2/1/2007 15:33:37 Direito Internacional SEÇÃO 1 - Os conflitos de leis e as formas de solução Comecemos por conceituar o Direito Internacional Privado (DIPRI) como o conjunto de preceitos reguladores das relações de ordem privada da sociedade internacional. É o confronto de normas tendentes a conjugar leis de diferentes países, indicando a lei competente a ser aplicada no caso concreto. O objetivo do DIPRI é definir qual lei será aplicada nos confl itos legais internacionais de ordem privada. É o ramo da ciência jurídica que tem por objetivo definir e regular a condição legal das pessoas físicas e jurídicas, seus bens, atos e direitos, visando aplicar-lhes as leis e sentenças dos seus respectivos países, em conexão com as dos países que as recepcionam. Por fim, segundo Souto (2000, p. 94), o chamado Direito Internacional Privado tem por missão escolher que norma deve ser aplicada a certa situação quando podem ser invocados dois ou mais sistemas normativos para a regulação da mesma. A nacionalidade é um conceito importante nesta questão, pois na maioria dos casos estaremos trabalhando com pessoas físicas e jurídicas de diferentes nacionalidades. Se você já se esqueceu desse conceito volte para a Unidade 3. Os conflitos de normas são as situações em que, por determinada conjuntura, há a possibilidade, ou não, de se aplicar duas ou até mais legislações de diferentes países. É o que você estudará com o DIPRI. Com uma boa pesquisa legislativa você descobre facilmente qual dessas leis será a que deve ser aplicada. Assim, com a aplicação da lei correta, realiza-se um negócio revestido de todas as formalidades legais exigidas para que se torne um ato jurídico perfeito e acabado, gerando os efeitos desejados pelas partes contratantes. Esses conflitos podem aparecer sob dois prismas: o da eficácia, quando surge aí um conflito no espaço, e o da vigência, quando surge um conflito no tempo. Unidade 6 direito_internacional.indb 139 139 2/1/2007 15:33:37 Universidade do Sul de Santa Catarina — Quando estamos numa situação problema, isto é, em que as pessoas que estão realizando o negócio têm diferentes nacionalidades, residem em diferentes países e estão realizando um negócio fora de seu território de origem, cabe saber qual é a lei que deve ser aplicada, não é mesmo? Pode acontecer que tanto a lei do país de nacionalidade ou de residência das pessoas possa ser aplicada, quanto a lei do Estado onde elas estão realizando o negócio. Daí percebemos um conflito positivo de competência legal. Ou pode ainda acontecer que nenhuma das legislações seja competente para ser aplicada. Temos então um conflito negativo de competência. Para que saibamos resolver tanto o conflito positivo como o negativo, temos de conhecer as regras de DIPRI, que são parte do ordenamento jurídico de cada país e nos indicam como agir. Imagine a seguinte situação: Um argentino, residente na Argentina, está viajando a trabalho numa feira internacional, na qual representará os produtos de uma empresa argentina. A feira está acontecendo em São Paulo, Brasil. Nessa feira ele faz contato com um inglês, que vive no Chile, e está visitando os estandes, com interesse de identificar produtos que possam ser comprados por sua empresa chilena e distribuídos no Chile com exclusividade. O argentino e o inglês vêm a fechar um contrato de compra e venda internacional ali mesmo na feira. Agora observe! Indivíduo 1 – Argentino, residente na Argentina, representa empresa argentina. Indivíduo 2 – Inglês, residente no Chile, representa empresa chilena. Local onde está acontecendo o contrato – São Paulo, Brasil. Pode acontecer que tanto a lei do país de nacionalidade (Argentina e Inglaterra) ou de residência (Argentina ou Chile) das pessoas possa ser aplicada, quanto a lei do Estado onde elas estão realizando o negócio (Brasil). 140 direito_internacional.indb 140 2/1/2007 15:33:37 Direito Internacional Para começar a definir a situação, começaremos sempre a fazer a análise pela lei do local onde a situação está acontecendo. Neste caso, será pela lei brasileira. Dentro do ordenamento jurídico de cada país temos as leis de DIPRI (que são chamadas de leis de foro) e o restante das normas jurídicas (que são chamadas de leis de fundo). A Lei de Foro é o conjunto de artigos que tratam de dois assuntos: como resolver os conflitos de leis no tempo e como resolver os conflitos de leis no espaço (aqui definindo a teoria de remessa que o país adota e o elemento de conexão que deve ser utilizado em cada caso). — E Lei de Fundo, você sabe o que é? A Lei de Fundo é a gama de legislação que disciplina toda a ordem de situações dentro do território do país (penais, trabalhistas, civis, tributárias, previdenciárias, processuais, etc.). Voltando à situação descrita no exemplo anterior, comece analisando a lei de foro brasileira, porque o contrato está acontecendo em São Paulo. A primeira pergunta é se cabe a lei brasileira nesse contrato de compra e venda. Verificando a Lei de Foro Brasileira você verá dois assuntos: a teoria da remessa e o elemento de conexão que o Brasil utiliza no caso de criação de obrigações (contrato). Segundo a Lei de Foro Brasileira (Lei de Introdução ao Código Civil – LICC), a teoria que o Brasil adota é a chamada teoria do envio. Existem duas teorias de remessa: a teoria do envio e a teoria do reenvio. Unidade 6 direito_internacional.indb 141 141 2/1/2007 15:33:37 Universidade do Sul de Santa Catarina A teoria do envio acontece quando não é possível utilizar a lei do próprio país (por indicação do elemento de conexão nacional), essa permite a remessa da pesquisa para a Lei de Fundo de um outro país. — Você já consegue definir a teoria do reenvio? Observe! A teoria do reenvio faz a remessa para a Lei de Foro do outro país e, se essa Lei de Foro indicar, por meio de seus elementos de conexão, a lei de um terceiro país, deverá ser feita a pesquisa nesse terceiro país, e assim sucessivamente, até que se encontre o país cuja Lei de Foro indique como competente para o caso a sua Lei de Fundo. Por isso, essa segunda teoria se chama de reenvio, porque permite tantas remessas quanto forem necessárias, diferentemente da primeira teoria que só permite a primeira remessa, buscando diretamente a Lei de Fundo do outro país. Abaixo uma representação das teorias: Conforme você pode perceber a seta que sai da Lei de Foro Brasileira está indicando a competência da Lei de Fundo Argentina. Esse fenômeno chamamos de envio. Assim, a lei brasileira recepciona a lei da argentina para ser aplicada num caso concreto. 142 direito_internacional.indb 142 2/1/2007 15:33:37 Direito Internacional Conforme você pode perceber a seta que sai da Lei de Foro Brasileira está indicando a competência da Lei de Foro Argentina. Mas a Lei de Foro Argentina indica como competente, por força de seus elementos de conexão, a Lei de Fundo Brasileira. Esse fenômeno chamamos de reenvio. Assim, a lei brasileira recepciona a lei da argentina, que indica novamente a Lei de Fundo Brasileira, para ser aplicada num caso concreto a lei brasileira, mesmo que inicialmente essa mesma tenha indicado a lei da argentina. A teoria do envio está prevista no artigo 16 da LICC (BRASIL, LICC, 2006): Art. 16 - Quando, nos termos dos artigos precedentes, se houver de aplicar a lei estrangeira, ter-se-á em vista a disposição desta, sem considerar-se qualquer remissão por ela feita a outra lei. O artigo indica que, nos casos dos artigos anteriores (7 ao 15), que estabelecem os elementos de conexão da lei brasileira, se tiver que ser buscada a lei estrangeira, essa busca será feita diretamente na Lei de Fundo, porque esse artigo não permite que seja feita a busca em “qualquer remissão por ela feita a outra lei”. Então, o segundo passo da pesquisa é saber o elemento de conexão da lei brasileira, que, nesse caso específico, está no artigo 9º da LICC, que diz: Art. 9º - Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-seá a lei do país em que se constituírem. (BRASIL, LICC, 2006) Unidade 6 direito_internacional.indb 143 143 2/1/2007 15:33:37 Universidade do Sul de Santa Catarina Nesse caso, o elemento de conexão é o local da constituição da obrigação. Isto é, o local onde o contrato está sendo feito é o Brasil, portanto, o elemento de conexão indica como competente para o caso a própria Lei de Fundo Brasileira, ou seja, se aplicaria o Código Civil Brasileiro. Elemento de conexão é um instituto jurídico (nacionalidade, território, domicílio, situação do imóvel, local onde acontece um fato, local onde é ajuizada uma ação) escolhido pelo legislador de um país e ajuda a determinar (conectar) qual é a lei a ser aplicada num caso entre nacionais e estrangeiros ou que sua celebração e execução aconteça em países diferentes. No caso que estamos analisando, pode ser que a lei chilena ou argentina também tivessem elementos de conexão que indicassem elas próprias para serem utilizadas. Estaríamos aí frente a um conflito positivo de competência. Se a lei brasileira, ao invés de indicar como elemento de conexão o país em que se constituir a obrigação, tivesse indicado o país em que se cumprirá a obrigação, caberia a lei de fundo do Chile. Neste caso, a lei brasileira seria negativamente competente (ou incompetente) para ser aplicada no caso. E seria competente a lei chilena, sendo feita a remessa diretamente à Lei de Fundo Chilena, ou seja, ao Código Civil Chileno. No entanto, se o Brasil adotasse, ainda nessa situação, a teoria do reenvio, seria feita a remessa, inicialmente, à Lei de Foro Chilena. Verificando os elementos de conexão que a Lei de Foro Chilena indica, poderiam se configurar duas situações: a primeira, em que o elemento de conexão chileno indicasse, também, o país de cumprimento da obrigação, remetendo para a sua própria Lei de Fundo a pesquisa; a segunda, em que o elemento de conexão do Chile indicasse elemento de conexão diferente, que poderia ser o do país em que se constituísse a obrigação, devolvendo a competência para a Lei de Fundo Brasileira, ou que indicasse como elemento de conexão o país de origem dos produtos, no caso a Argentina, caso em que seria feita a remessa para a Lei de 144 direito_internacional.indb 144 2/1/2007 15:33:38 Direito Internacional Foro Argentino, que poderia indicar a sua própria Lei de Fundo ou a Lei de Foro de outro país, fazendo mais uma remessa. — A teoria do reenvio parece complicar mais a pesquisa, não é mesmo? No entanto, ela respeita a soberania do ordenamento jurídico estrangeiro por inteiro, ao passo que a teoria do envio faz um corte no ordenamento estrangeiro, destacando e rejeitando as suas regras de foro. Quando acontece um conflito de normas no tempo, temos a realização de um ato (um contrato) na vigência de uma lei e a execução desse ato (contrato) na vigência de uma nova lei. Nesses casos a LICC prevê que a lei mais nova sempre será aplicada, a não ser que se trate de três situações: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. No caso de direito adquirido, significa que, quando a lei nova entrou em vigor, o direito do indivíduo já tinha se materializado conforme o que preceituava a lei mais antiga, adquirindo o direito. — E ato jurídico perfeito, você sabe o que é? O caso de ato jurídico perfeito diz respeito aos atos que, ainda na vigência da antiga lei, já tinham sido finalizados, cumprindo todas as formalidades legais para sua concretização que a lei antiga exigia. — E quanto à coisa julgada, você já conhece este conceito? A coisa julgada diz respeito aos processos que já se encontravam julgados ainda na vigência da antiga lei e que não seja possível mais nenhuma forma de recurso da sentença. Unidade 6 direito_internacional.indb 145 145 2/1/2007 15:33:38 Universidade do Sul de Santa Catarina Não se enquadrando em nenhuma dessas situações, o artigo 6º da LICC prevê que a lei nova seja aplicada aos casos: Art. 6º - A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. (BRASIL, LICC, 2006) SEÇÃO 2 - Principais elementos de conexão presentes na legislação brasileira Agora que você já conhece o que são elementos de conexão e o que é a teoria do envio, vamos conhecer os principais elementos de conexão utilizados pela lei brasileira. O primeiro elemento de conexão que nos interessa é aquele que diz respeito às pessoas, que define o início e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família. As leis pessoais (que dizem respeito às pessoas) podem ser definidas por três diferentes elementos de conexão: pela lei da nacionalidade da pessoa; pela lei do território em que se encontre; pela lei do local de seu domicílio. Na Legislação Brasileira foi escolhido como elemento de conexão o domicílio (residência) do indivíduo para determinar as leis pessoais, conforme o artigo 7º da LICC: Art. 7º - A lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família. (BRASIL, LICC, 2006) 146 direito_internacional.indb 146 2/1/2007 15:33:38 Direito Internacional Assim, na situação-problema, para identificar se os sujeitos envolvidos eram ou não capazes civilmente para realizarem o contrato, deve-se procurar pela lei do domicílio deles. No nosso exemplo, para o argentino, como reside na Argentina, deve-se pesquisar a lei argentina para saber se ele já é civilmente capaz. Para o inglês, como sua residência é no Chile, deve-se pesquisar a lei chilena para saber da sua capacidade civil. Como o Brasil adota a teoria do envio, basta buscar diretamente a Lei de Fundo do Chile e da Argentina. Para as pessoas jurídicas, a LICC estabelece como elemento de conexão a lei do país em que se constituíram, ou seja, onde a pessoa jurídica for inscrita: Art. 11 - As organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as sociedades e as fundações, obedecem à lei do Estado em que se constituírem. (BRASIL, LICC, 2006) A legislação aplicável para os atos em geral e para as obrigações tem como elemento de conexão a lei do local em que se constituíram, isto é, o lugar onde esses atos venham a acontecer. O artigo 9º da LICC é que trata desse elemento: Art. 9 - Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. § 1º. Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato. § 2º. A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente. (BRASIL, LICC, 2006) Conforme o artigo, o local em que se constituir a obrigação é o elemento que define a lei a ser aplicada. Mas se a obrigação for feita em outro país e tiver que ser executada no Brasil, deverão ser respeitadas as exigências que a Legislação Brasileira tiver para o cumprimento da obrigação. Essa regra também vale quando a obrigação for contraída aqui no Brasil para ser cumprida em outro país. Unidade 6 direito_internacional.indb 147 147 2/1/2007 15:33:38 Universidade do Sul de Santa Catarina Quando se faz uma proposta e essa é aceita pela outra parte, de um outro país, vale como local do contrato o domicílio do proponente. Já quando o assunto diz respeito a bens imóveis, aplica-se a lei do local onde está situado o imóvel. Assim, se for o caso de transferência de imóvel, de questões de posse sobre o bem, sempre será aplicada a lei do país em que estiver situado o imóvel, conforme prevê o artigo 8º da LICC: Art. 8º - Para qualificar os bens e regular as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados. (BRASIL, LICC, 2006) No caso de bens móveis, aplica-se a lei do país do domicílio do indivíduo que possui o bem. O parágrafo primeiro do artigo 8º da LICC é que define: § 1º. Aplicar-se-á a lei do país em que for domiciliado o proprietário, quanto aos bens móveis que ele trouxer ou se destinarem a transporte para outros lugares. Significa registrar na própria certidão de casamento, no cartório onde aconteceu o matrimônio, a separação ou o divórcio, decretados judicialmente. No Brasil este procedimento implica, antes, na homologação de sentença pelo SUpremo Tribula Federal. Nos casos de casamento, aplica-se o critério do domicílio para definir as leis pessoais dos noivos, e o critério da territorialidade (onde acontece o ato) para definir lei que regulará o ato do matrimônio. No caso de anulação do casamento, vale a lei do primeiro domicílio conjugal. Já no caso de dissolução do vínculo, por separação judicial ou divórcio, vale qualquer dos domicílios dos cônjuges, não sendo necessário entrar com o processo somente no local onde aconteceu a celebração do casamento. Mas é necessário que seja feita a averbação do divórcio junto à autoridade em que foi celebrado o casamento, observando o que diz a lei desse país para esse tipo de ato. Ainda, no caso de sucessão, o artigo 10 da LICC estabelece como elemento de conexão para regular o direito à herança, a lei do país em que era domiciliado o defunto: Art. 10 - A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que era domiciliado o defunto ou o 148 direito_internacional.indb 148 2/1/2007 15:33:38 Direito Internacional desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens. (BRASIL, LICC, 2006) Para o processo de inventário, vale a lei do país em que for dada a entrada o processo. E, para determinar a capacidade de ser herdeiro ou legatário, vale a lei pessoal desses. Nas questões comerciais, o que vale é a lei pessoal do comerciante para definir sua condição de comerciante, bem como a lei do local dos atos definem se eles são atos caracterizados como comerciais ou como civis. Legatária é a pessoa que recebe uma doação de um falecido, por declaração de última vontade ou por testamento. Quanto à definição de competência para julgar, define-se a jurisdição pelo domicílio do réu ou pelo local de cumprimento da obrigação. Também se define pela localização do imóvel, se disser respeito a ações relativas a esse tipo de bem. O artigo 12 da LICC é que define esses elementos de conexão: Art. 12 - É competente a autoridade brasileira quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação. § 1º. Só a autoridade judiciária brasileira compete conhecer das ações relativas a imóveis situados no Brasil. (BRASIL, LICC, 2006) Ainda, com relação ao cumprimento, no Brasil, de atos processuais provenientes de outros países, há a necessidade que estes atos recebam, do STF – Supremo Tribunal Federal, o exequatur, que é o reconhecimento de legitimidade e autoridade do ato. O parágrafo segundo do artigo 12 da LICC é que estabelece esta formalidade: § 2º. A autoridade judiciária brasileira cumprirá, concedido o exequatur e segundo a forma estabelecida pela lei brasileira, as diligências deprecadas por autoridade estrangeira competente, observando a lei desta, quanto ao objeto das diligências. (BRASIL, LICC, 2006) Já para o levantamento de provas judiciais, vale a lei do país onde estas provas foram produzidas, não se admitindo provas que lei Unidade 6 direito_internacional.indb 149 149 2/1/2007 15:33:38 Universidade do Sul de Santa Catarina brasileira desconheça (produzidas sob tortura, por exemplo). O artigo 13 da LICC é que estabelece este elemento: Art. 13 - A prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar quanto ao ônus e aos meios de produzir-se, não se admitindo os tribunais brasileiros provas que a lei desconheça.(BRASIL, LICC, 2006) Para o cumprimento, no Brasil, de sentenças estrangeiras, a LICC estabelece como exigênciá, no artigo 15, a homologação da sentença pelo STF: Art. 15 - Será executada no Brasil a sentença proferida no estrangeiro, que reúna os seguintes requisitos: a) haver sido proferida por juiz competente; b) terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado a revelia; c) ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a execução no lugar em que foi proferida; d) estar traduzida por intérprete autorizado; e) ter sido homologada pelo Supremo Tribunal Federal. Parágrafo único. Não dependem de homologação as sentenças meramente declaratórias do estado das pessoas. (BRASIL, LICC, 2006) 150 direito_internacional.indb 150 2/1/2007 15:33:39 Direito Internacional Síntese Nesta última unidade você estudou que nas relações privadas de caráter internacional deve ser pesquisada a legislação correta referente a vários aspectos que envolvem essa relação. Para tanto, são estabelecidos nos países regras de Direito Internacional privado, nas leis de foro, que definem a teoria de remessa e os elementos de conexão. As teorias de remessa podem ser a do envio, quando a pesquisa é feita diretamente na Lei de Fundo estrangeira, ou a do reenvio, quando a pesquisa é feita na Lei de Foro estrangeira, obedecendo as possíveis remessas que essa lei fizer à lei de outro país ou devolvendo a competência à lei do próprio país de onde se iniciou a pesquisa. Você viu que no caso do Brasil adota-se a teoria do envio. No Brasil, os elementos de conexão utilizados são: o domicílio para leis pessoais, o local da constituição das pessoas jurídicas para definir a sua personalidade, o local do ato para as obrigações, o local da situação do bem para imóveis, o último domicílio do defunto para definir regras de sucessão. Nas questões processuais, valem o domicílio do réu, o lugar de cumprimento da obrigação e a situação do bem imóvel. Aplicando esses elementos de conexão e a teoria do envio às situações vivenciadas aqui no Brasil, mas que envolvam pessoas domiciliadas fora do país ou estrangeiras, é possível identificar qual é a lei correta a ser aplicada no caso. Agindo assim, você sempre estará resguardado legalmente para os casos de problemas judiciais Unidade 6 direito_internacional.indb 151 151 2/1/2007 15:33:39 Universidade do Sul de Santa Catarina Atividades de auto-avaliação 1) Resolva a seguinte situação: Alberto, domiciliado em seu país de nacionalidade (o Chile) comprou, no Brasil, de um russo, residente na Venezuela e que estava aqui no Brasil de férias, um imóvel situado no Peru. Quantas legislações deverão ser levadas em conta para a realização desse negócio jurídico (deve ser contado tanto o contrato quanto a sua execução)? Justifique a sua escolha. ( ( ( ( ( ) Uma. ) Duas. ) Três. ) Quatro. ) Cinco. 2) Com base nessas informações hipotéticas, responda as questões abaixo. Legislação alemã – maioridade civil aos 16 anos, elemento de conexão para definir leis pessoais é a territorialidade, os contratos são regidos pela lei do foro de eleição. Legislação Brasileira – maioridade civil aos 18 anos, elemento de conexão para definir leis pessoais é o domicílio, os contratos são regidos pela lei do local do ato. 152 direito_internacional.indb 152 2/1/2007 15:33:39 Direito Internacional Legislação egípcia – maioridade civil aos 21 anos, elemento de conexão para definir leis pessoais é a nacionalidade, os contratos são regidos pela lei do local da sua execução. Situação 1: numa relação jurídica entre uma brasileira, residente no Egito, e um alemão, residente na Alemanha, que esteja sendo realizada no Brasil, a partir de qual idade as partes serão consideradas capazes? Analise sobre dois prismas. a) Utilizando a teoria do envio. b) Utilizando a teoria do reenvio. Situação 2: numa relação contratual entre uma brasileira, residente no Egito, e um alemão, residente na Alemanha, que esteja sendo realizada no Brasil, para execução no Egito, qual será a lei a ser aplicada no contrato? Analise sobre dois prismas. a) Utilizando a teoria do envio. Unidade 6 direito_internacional.indb 153 153 2/1/2007 15:33:39 Universidade do Sul de Santa Catarina b) Utilizando a teoria do reenvio. Situação 3: numa relação contratual entre uma brasileira, residente no Egito, e um alemão, residente na Alemanha, que esteja sendo realizada no Egito, para execução no Brasil, qual será a lei a ser aplicada no contrato? Analise sobre dois prismas. a) Utilizando a teoria do envio. b) Utilizando a teoria do reenvio. 154 direito_internacional.indb 154 2/1/2007 15:33:39 Direito Internacional Saiba mais Sobre as regras internacionais de DIPRI, conheça o Código de Bustamante, ou Código de Direito Internacional Privado, ou Convenção de Havana, que é um tratado internacional que busca uniformizar a aplicação dos mesmos elementos de conexão nos países americanos, evitando conflitos de normas. Baixe a convenção no site <http://www2.mre.gov.br/dai/bustamante. htm>. Unidade 6 direito_internacional.indb 155 155 2/1/2007 15:33:39 direito_internacional.indb 156 2/1/2007 15:33:39 Para concluir o estudo Caro aluno: Enfim chegamos ao final do estudo deste livro, mas espero que seus estudos de Direito Internacional tenham apenas iniciado. Este livro, como todo trabalho no mundo do conhecimento, é limitado. Muito mais poderia ter sido escrito, mas o objetivo maior aqui é o de introduzi-lo na área do Direito Internacional. Então, pequenas porções foram suficientes. Como você está concluindo esta disciplina, pôde saborear cada porção de conhecimento aqui trazido. Com certeza, você passou pela experiência de gostar mais de um tema do que de outro. Mas lembre-se: todos são temas importantes na área. Como professora conteudista, espero que tenha conseguido traduzir, em linguagem atraente, os conhecimentos básicos da disciplina, dentre os quais destaco os tratados internacionais, a figura do Estado e os meios de solução de conflitos. Como apaixonada pelo Direito Internacional e pelas relações internacionais, espero que você também tenha se apaixonado pelo DIP e pelo DIPRI. E que goste, na sua carreira profissional, de estar sempre lendo algo sobre o tema. Agora lanço um desafio: abra um jornal e leia as notícias internacionais. Com certeza, você terá condições de fazer uma leitura muito mais interessante delas e, em alguns casos, conhecendo o que você já conhece, poderá fazer previsões acertadas. Bons estudos, continue na sua caminhada e sucesso. E não se esqueça de utilizar os conhecimentos em benefício da humanidade. direito_internacional.indb 157 2/1/2007 15:33:39 direito_internacional.indb 158 2/1/2007 15:33:40 Sobre a professora conteudista Milene Pacheco Kindermann Graduada em Direito pela UNISUL - Universidade do Sul de Santa Catarina. Especialista em Teoria Econômica e em Dogmática Jurídica, ambas pela UNISUL. Doutora em Derecho y Ciências Sociales pela Universidad del Museo Social Argentino, de Buenos Aires, Argentina. Professora de Direito Internacional Público e de Direito Internacional Privado no Curso de Relações Internacionais da UNISUL, no campus de Tubarão. Coordenadora do Curso de Relações Internacionais da UNISUL. direito_internacional.indb 159 2/1/2007 15:33:40 direito_internacional.indb 160 2/1/2007 15:33:40 Referências ALMEIDA, E. A. P. de. Mercosul e União Européia: estrutura jurídico-institucional. Curitiba: Juruá, 1996. ACCIOLY, H.; SILVA, G. E. do N. Manual de Direito Internacional Público. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. BRASIL. Constituição Federal. <http://www.presidencia.gov.br> acesso em janeiro de 2006. BRASIL. Lei de Introdução ao Código Civil. Decreto-Lei no 4.657, de 04/09/1942. <http://www.presidencia.gov.br> acesso em janeiro de 2006. BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei no 2.848, de 07/12/1940. <http://www.presidencia.gov.br> acesso em janeiro de 2006. BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei no 5.172, de 25/10/1980. <http://www.presidecia.gov.br> acesso em janeiro de 2006. CASELLA, P. de B. Mercosul: exigências e perspectivas – integração e consolidação de espaço econômico (1995-20012006). São Paulo: LTr, 1996. MELLO, C. D. de A. Direito Internacional da integração. Rio de Janeiro: Renovar, 1996. MONSERRAT FILHO, J. O que é Direito Internacional. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986. RANGEL, V. M. Direito e relações internacionais. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. REZEK, J. F. Direito Internacional Público: curso elementar. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. SABATOVSKI, E.; FONTOURA, I. P.; FOLMANN, M. (org.). Constituição Federal 1988 e convenções internacionais. Curitiba: Juruá, 2002. SEITENFUS, R. A. S. Manual das organizações internacionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997. SEITENFUS, R.; VENTURA, D. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. SOUTO, C. Introdução crítica ao Direito Internacional Privado. 2. ed. Porto Alegre: S.A.Fabris, 2000. direito_internacional.indb 161 2/1/2007 15:33:40 direito_internacional.indb 162 2/1/2007 15:33:40 Respostas e comentários das atividades de auto-avaliação Confira se sua resposta atingiu a expectativa desejada. Se você ficou muito distante da resposta reveja o conteúdo, sugerimos que não passe adiante sem ter se apropriado do assunto: Unidade 1 1) Usando a teoria dualista, o Estado não fica obrigado a inserir o tratado dentro do seu ordenamento jurídico de imediato, porque os direitos vivem em dois ambientes distintos, que só se inter-relacionam quando há convergência entre as duas normas. Nesse caso, como há divergência de normas, prevalece a norma interna e há a necessidade de esperar que a legislação interna se modifique, proibindo o uso de armas de fogo pelo cidadão comum, para que o tratado possa ser aplicado no território do país. 2) Usando a teoria monista internacionalista, o Estado trata os dois direitos como um só e, nesse caso, dá preferência para o Direito Internacional. Na prática, o tratado prevalece sobre a lei interna e passa a ser proibido o uso de armas de fogo pelo cidadão comum dentro do território do país, dando cumprimento ao Direito Internacional e derrubando (revogando) a lei interna. 3) No caso de uso da teoria monista nacionalista, o Estado trata os dois direitos como um só e, neste caso, o tratado fica condicionado ao tratamento (importância) que a norma interna (geralmente a Constituição do país) lhe der. Assim, assinado o tratado, devem-se obedecer as regras de internalização (como entra no ordenamento interno) do tratado e saber em que posição legal ele será usado. Após esse processo, passa a valer o tratado dentro do país. Até o processo ser terminado, ainda vale a lei interna. direito_internacional.indb 163 2/1/2007 15:33:40 Universidade do Sul de Santa Catarina Unidade 2 1) Praticamente todos os atos unilaterais podem incidir sobre um tratado. É o caso do reconhecimento, quando os Estados criam uma organização internacional e os demais Estados que não participam do tratado, reconhecem a criação dessa organização como uma personalidade nova no cenário internacional. O protesto também pode ser feito perante um tratado, quando um Estado, que não participa do tratado, se sente ofendido pelo que está sendo acordado no tratado, protestando. A notificação incide quando uma parte do tratado quer informar oficialmente a outra parte (ou as outras partes) de algum ato, por exemplo, a ratificação do tratado. A renúncia incide diretamente no tratado quando um dos países que tem um direito ou uma vantagem a receber no tratado renuncia a esse direito. A denúncia incide no tratado quando um país membro do tratado resolve retirar-se do pacto, deixando de fazer parte daquele tratado. A adesão, ao contrário da denúncia, incide num tratado quando um Estado quer entrar para o grupo que compõe o tratado, pedindo o seu ingresso no tratado. 2) O tratado somente passa a vigorar no território nacional após a publicação do decreto presidencial no Diário Oficial da União, que introduz o texto do tratado, conforme foi assinado na primeira fase do processo, dentro do ordenamento jurídico interno. Somente depois disso é que nós brasileiros passamos a usar o tratado como lei interna. 3) Dependendo do assunto do tratado, ele pode assumir três posições diferentes. Se for um tratado em matéria de direitos humanos, ele vai passar a vigorar como uma emenda à Constituição, derrubando todas as leis contrárias ao seu conteúdo, que estiverem abaixo da Constituição. Se for um tratado em matéria tributária, ele vai obedecer a Constituição, mas vai revogar as leis complementares mais antigas e todas as leis abaixo das leis complementares (leis ordinárias, leis delegadas, etc.). Já, se for um tratado em qualquer outra matéria, ele vai entrar em vigor na posição de lei ordinária, obedecendo o que dispõem a Constituição e as leis complementares. Vai revogar as leis ordinárias mais antigas (anteriores ao tratado) e vai revogar as leis inferiores (leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções). 164 direito_internacional.indb 164 2/1/2007 15:33:40 Direito das Sucessões Unidade 3 1) Se a Palestina atualmente fosse um Estado plenamente reconhecido, essa situação se daria por separação da pátria-mãe, neste caso Israel, que permaneceria existindo, mas com diminuição de seu território. A autoridade palestina (OLP), atualmente reconhecida, seria o Governo soberano do país, com poderes de autonomia e independência. A Palestina poderia conceder nova nacionalidade à população que reside em seu território, seja em sistema de nacionalidade exclusiva ou com dupla nacionalidade. Celebraria novos tratados, herdaria de Israel os bens públicos referentes ao seu território, mas também as dívidas concebidas em função de seu território. 2) Trata-se de crime ocorrido a bordo de embarcação civil e não estatal. Nesses casos, aplica-se o princípio da territorialidade, se o navio estiver em mar territorial brasileiro, serão aplicadas a lei e a jurisdição brasileiras. Se estiver em alto-mar, será aplicada a lei do seu território de origem, ou seja, como em alto-mar considera-se patrimônio comum, sendo que nenhum Estado tem jurisdição nessa área, o que vale é a legislação e a jurisdição do Estado do navio, ou seja, como o navio é grego, valerão a legislação e a jurisdição gregas. Já se o navio estiver em mar territorial de outro país, como Portugal, vale a lei do país em que se encontra, pelo princípio da territorialidade. Assim, no terceiro caso, serão aplicadas a lei e a jurisdição portuguesas. 3) Tabela comparativa entre repatriação, deportação, expulsão e extradição: Repatriação Deportação Expulsão Extradição O estrangeiro já é rejeitado, por medida de polícia, antes do ingresso no país, nem chegando a entrar. Pode retornar ao país novamente. O estrangeiro é pego em situação irregular dentro do território do país e retirado por medida de polícia, sendo que pode retornar ao território do país, uma vez regularizada a sua situação. O estrangeiro está no território regularmente (ou não) e comete atos nocivos ao país, como um crime, sendo processado, condenado, e tendo decretada a sua expulsão pelo Chefe de Estado, via decreto, o que o impossibilita de retornar futuramente ao país. O estrangeiro está regular no território do país, mas está sendo requerido por outro país, em cujo território cometeu um crime. Por força de tratado de extradição, verificadas as condições necessárias, esse indivíduo é entregue ao país solicitante, podendo retornar após ter cumprido sua pena. 165 direito_internacional.indb 165 2/1/2007 15:33:40 Universidade do Sul de Santa Catarina Unidade 4 1) Solução judiciária Arbitragem Existe antes do conflito. Pode existir antes ou após o conflito. Pode ser convencionada ou aceita tacitamente. Só existe mediante convenção (compromisso arbitral ou cláusula compromissória). Os juízes são permanentes na Corte e não podem ser escolhidos pelas partes. Os árbitros são livremente escolhidos pelas partes. O procedimento é o previsto no estatuto da Corte, não podendo ser modificado pelas partes. O procedimento é escolhido pelas partes envolvidas no litígio, quando da elaboração do compromisso arbitral. A decisão da Corte é baseada no Direito Internacional e vira jurisprudência internacional. A decisão arbitral pode ser baseada em direito ou em eqüidade e somente se aplica a cada caso em particular. 2) A retorsão é conhecida como a Lei de Talião (olho por olho, dente por dente), e consiste na aplicação, quando possível, da mesma medida coercitiva, forçando o outro país a voltar a trás ou deixar de praticar o ato ofensor. Já a represália é conhecida como legítima defesa e aplica-se quando não é possível a retorsão, ou seja, não dá para agir na mesma moeda, mas é preciso agir coagindo o Estado ofensor a parar com a ofensa, por meio de outro tipo de ato agressor. 3) O mediador, assim como o árbitro, é uma pessoa da confiança das partes, mas sua atuação se diferencia do árbitro porque ele busca solucionar o conflito convencendo as partes a chegarem num acordo, enquanto que o árbitro chega à solução do conflito por meio de uma decisão (laudo arbitral) imposta. O mediador faz a figura do “advogado do diabo”, falando a favor e contra ambas as partes, isto é, advoga em favor de ambas, mostrando os prós e contras da situação conflituosa e os benefícios de se chegar a um acordo. Já o árbitro funciona como um verdadeiro juiz, dizendo quem tem o direito a quê. Unidade 5 1) Você deve ter visto que praticamente todo o artigo 5º trata de direitos de primeira geração (por exemplo, incisos IV, V e o caput do artigo) e os de segunda geração você encontra facilmente no artigo 6º e 7º. 166 direito_internacional.indb 166 2/1/2007 15:33:41 Direito das Sucessões 2) A segunda questão é de livre resposta. Unidade 6 1) A resposta correta é quatro. Observe: o negócio (contrato) está sendo feito no Brasil, portanto, a primeira lei a ser pesquisada é a do Brasil, pois aqui é o local do ato. Como o negócio envolve imóvel, cabe a lei do local do imóvel, para o cumprimento do contrato, isto é, para a transferência posterior do imóvel. Como o imóvel está situado no Peru, a segunda lei a ser utilizada é a do Peru. Para que esse negócio tenha validade é preciso saber se as partes são capazes para realizar o contrato. E isso é visto a partir da lei pessoal de cada parte contratante. Como o elemento de conexão que define as leis pessoais é o domicílio, deve ser feita a pesquisa na lei do domicílio de cada contratante. Assim, para Alberto aplica-se a lei de seu domicílio, sendo que a terceira lei a ser consultada é a lei do Chile. Já para o vendedor, apesar de ser russo, aplica-se a lei do seu domicílio, sendo que a quarta lei a ser consultada é a da Venezuela. Portanto são quatro leis a serem pesquisadas. 2) Situação 1. a) Como o negócio está acontecendo aqui no Brasil, utilizando-se a teoria do envio, deve-se buscar diretamente na lei de fundo do outro país, caso haja remessa. Neste caso, a lei brasileira indica como elemento de conexão para leis pessoais o domicílio. Assim, a brasileira que está contratando é residente no Egito. Para ela, então, aplica-se a legislação de fundo egípcia. Assim, ela tem que possuir mais de 21 anos para poder contratar. Já o Alemão é residente na Alemanha e para ele se aplica a lei de fundo alemã. Portanto, o Alemão tem que possuir mais de 16 anos para poder contratar. b) Como o negócio está ocorrendo no Brasil, utilizando-se a teoria do reenvio, deve-se buscar a Lei de Foro do outro país, e, se essa fizer remessas, deve-se atender a essas remessas. Nesse caso, a lei brasileira indica como elemento de conexão para leis pessoais o domicílio. No caso da brasileira, seu domicílio é o Egito, então deve-se pesquisar a Lei de Foro do Egito. A Lei de Foro egípcia indica como elemento de conexão para leis pessoais o critério de nacionalidade. Assim, sendo a brasileira nacional do Brasil, a lei que se deve buscar é a Lei de Foro Brasileira. Como ela já foi pesquisada, vemos aqui a ocorrência do fenômeno da devolução. Por isso, aplica-se a ela a Lei de Fundo Brasileira. Portanto, para fazer este negócio, ela deve ter mais de 18 anos. Já para o alemão, a Lei de Foro Brasileira indicará a Lei de Foro 167 direito_internacional.indb 167 2/1/2007 15:33:41 Universidade do Sul de Santa Catarina Alemã. Essa, por sua vez, indica como elemento de conexão o critério da territorialidade. Sendo o território onde está acontecendo o ato o território brasileiro, há a devolução para a lei brasileira. Assim, também para o alemão aplica-se a Lei de Fundo Brasileira, exigindo-se que ele tenha mais de 18 anos para realizar o negócio. Situação 2. a) Neste caso, como o negócio está sendo feito no Brasil, a legislação de foro brasileira indica como elemento de conexão o local do ato. Como o local do ato é no Brasil, significa que a lei brasileira de fundo é competente para ser aplicada ao caso, não havendo necessidade de remessa à lei estrangeira, seja pela teoria do envio ou pela teoria do reenvio. b) Neste outro caso, como o negócio está sendo feito no Brasil, a legislação de foro brasileira indica como elemento de conexão o local do ato. Como o local do ato é no Brasil, significa que a lei brasileira de fundo é competente para ser aplicada ao caso, não havendo necessidade de remessa à lei estrangeira, seja pela teoria do envio ou pela teoria do reenvio. Situação 3. a) Neste caso, o negócio está sendo feito no Egito. Como a Lei de Foro Egípcia indica o elemento de conexão “lei do local da execução” para reger os contratos, há que se buscar a lei deste local de execução (no caso o Brasil), para ser aplicada. Como a teoria do envio não admite novas remessas, neste caso será aplicada, no Egito, diretamente a Lei de Fundo Brasileira. b) Neste caso, o negócio está sendo feito no Egito. Como a Lei de Foro Egípcia indica o elemento de conexão “lei do local da execução” para reger os contratos, há que se buscar a lei desse local de execução (no caso o Brasil), para ser aplicada. Como a teoria do reenvio remete para a Lei de Foro do outro país, deve-se verificar o elemento de conexão da Lei de Foro Brasileira. Essa indica como elemento de conexão o “local do ato”. Como o ato está acontecendo no Egito, a Lei de Foro Brasileira indica a lei egípcia como a lei a ser aplicada, ocorrendo a devolução. Nesta situação, a lei cabível é a Lei de Fundo Egípcia. 168 direito_internacional.indb 168 2/1/2007 15:33:41