COOPERATIVISMO E AGRICULTURA FAMILIAR: O ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES DA COOPERATIVA COOPLESA Universidade Federal Rural de Pernambuco Luis Antônio da Silva Soares, bolsista PIBIC e Profa. Doutora Maria Luiza Lins e Silva Pires, orientadora INTRODUÇÃO: Como discutido na literatura, as cooperativas não apontam apenas para a remuneração igualitária dos trabalhadores-donos das empresas cooperativas, mas também para a criação de formas de sociabilidade solidárias baseadas no trabalho colaborativo, na participação democrática e na tomada de decisões sobre as empresas (BOAVENTURA, 2002). Enquanto movimento social, o cooperativismo herda o poder de crítica e a contestação que motivaram a sua origem no período de revolução industrial e, enquanto atividade econômica, é desafiado a responder aos imperativos de capitalização de mercado, especialmente nesse período conhecido como globalização da economia, como destacado por Pires (2004). Ao que observa Cavalcanti (1995), “ciência, sociedade e tecnologia necessitam ser associadas para explicar as características e especificidades do processo de globalização em seus múltiplos cenários”. Assim, num contexto de produção e circulação das mercadorias marcado por forte competividade, as cooperativas agrícolas tendem a introduzir novos métodos organizacionais e gerenciais desenvolver alianças, estabelecer fusões e aquisições de empresas, que busquem parceiros e conquistem novos mercados, procedendo de forma semelhante às empresas capitalistas (PIRES, 2000). A impossibilidade de adequação às regras de mercado e o endividamento entre outros fatores, tendem a comprometer o dinamismo de uma cooperativa, sendo responsável, muitas vezes pelo sua dissolução. Nessa perspectiva, Crúzio(1999), destaca alguns aspectos responsáveis pelo insucesso das cooperativas agropecuárias brasileiras: a) a dificuldade de “autogestão” do empreendimento coletivo; b) as superposições dos poderes deliberativo e executor em relação ao poder máximo da Assembleia Geral de Sócios; c) os descompromissos com as ações e os resultados administrativos com as decisões do Conselho de Administração; d) a sucessiva cooptação econômica do poder fiscal em relação à investigação dos poderes deliberativo. São questões que, de certa forma, têm se refletido no processo de dissolução da Cooperativa dos Produtores de Leite de Sanharó (COOPLESA), nosso objeto de estudo. Os dados colhidos durante as entrevistas elencam uma série de dificuldades administrativas responsáveis pela dissolução da estrutura cooperativa. Dentre essas dificuldades, o débito com os funcionários foi identificado como a principal delas. Assim, para a atual administração, o arrendamento, em caráter de urgência, para um período de cinco anos, foi a solução encontrada para a continuidade das atividades da empresa, seja em relação ao prosseguimento de fornecimento de leite pelos antigos associados, seja para a manutenção dos serviços habitualmente operados pela empresa. Segundo um dos informantes e ex-associado da COOPLESA, “ninguém mais queria a direção da COOPLESA,[..] a única solução que a gente teve no momento foi essa - o arrendamento”. Metodologia : A pesquisa foi realizada por meio de ampla revisão bibliográfica dos principais conceitos aqui trabalhados - cooperativismo, agricultura familiar e mercados. Para a realização deste trabalho, foi utilizado como objeto de pesquisa uma empresa de laticínios, situada no município de Sanharó, agreste pernambucano. A partir desta seleção, foram realizadas visitas, observação das atividades desenvolvidas pela empresa e entrevistas aos seus dirigentes e associados, a partir de um roteiro previamente elaborado. Discussão e Resultados A COOPLESA, que era uma cooperativa com um corpo social constituído por 22 associados, mudou, a partir do mês de agosto de 2011, a sua constituição para empresa privada, sob a responsabilidade de um antigo associado. Tal como na época que era cooperativa, esta empresa permanece com o mesmo nome de fantasia, conservando também as mesmas atividades - a produção e comercialização de queijo manteiga e de coalho, mussarela, ricota e manteiga. Mas, apesar da diversificação da produção, as questões administrativas, relativas ao gerenciamento e ao fornecimento de matéria prima, não foram capazes de impedir a dissolução da COOPLESA, enquanto empresa cooperativa Diante da indiferença dos órgãos públicos e do poder local, o arrendamento foi feito a um sócio da cooperativa, que por já dispor de experiência no ramo de laticínios, tendo outra empresa do gênero na região, interessou-se em dar prosseguimento às atividades da COOPLESA. Diferentemente de uma empresa privada, a cooperativa é compreendida como uma sociedade de pessoas que se organizam a partir de uma empresa de propriedade de todos, gestão democrática com o objetivo principal de gerar emprego e renda para seus associados, de forma solidária e igualitária. Assim, contrariando tal perspectiva, a COOPLESA já não atende mais ao interesse do conjunto dos associados, mas a um único empresário da região, com experiências nesse ramo de negócio, como já salientado. Conclusão: Foi observado que a cooperativa COOPLESA não obedeceu aos elementos essenciais no que tange as atribuições concernentes ao cooperativismo agrícola, em termos de: a) participação nos mercados; b) participação dos associados na dinâmica da cooperativa; c) estímulo à mobilização dos agricultores em torno de inovações organizacionais e tecnológicas; d) impactos sobre o fortalecimento de um tecido socioeconômico no local, já debatido por Pires (2007), repercutindo também nas questões relativas a autogestão da empresa e da cooptação econômica por outros setores salientadas por Crúzio (1999). Nesse sentido, verificou-se que a transição da condição de cooperativa para empresa privada nos moldes instituídos pela COOPLESA significou, para os associados, uma situação provisória, capaz de resolver emergencialmente um momento de crise. Porém as implicações desse processo, em termos de impactos sobre o território e sobre a vida das famílias dos associados permanecem como objeto de próximas investigações. Pois, como destaca Schneider (2009), as cooperativas surgem para “satisfazer as necessidades das suas famílias e da população” e não apenas para atender estritamente a questões econômicas. A Ampliação da participação democrática e a criação de novas formas de sociabilidade solidárias, como já salientado por Boaventura (2002), corroboram essa ideia. REFERÊNCIAS: CAVALCANTI, J. S. B. Globalização e agricultura: processos sociais e perspectivas teóricas. Estudos de sociologia, Rev.do Prog. De Pós-graduação em sociologia da UFPE, Recife. Vol.1(2), 1995, P. 106-118. CRÚZIO,OLIVEIRA.Por que as cooperativas agropecuárias e agroindustriais brasileiras estão falindo?.São Paulo. Revista de Administração de Empresas,1999,P 18-26. PIRES, M. L. Cooperativismo e dinâmicas produtivas em zonas desfavorecidas. O caso das pequenas cooperativas agrícolas do sul da frança. Sociologias, Porto Alegre,ano 13, jan/abr. 2011, P. 228-261. PIRES, Maria Luiza; AMORIM, João Batista; ALBUQUERQUE, Pedro; JUSTE,Yasmina. Cooperativismo, agricultura familiar e redes sociais na reconfiguração dos espaços rurais. Trabalho apresentado no XIV Congresso Brasileiro de Sociologia, na UFRJ, Rio de Janeiro, no período de 28-31 de julho de 2009. SANTOS, B. S. Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 2002, p.29-68. SCHNEIDER, S. Adversidade da Agricultura Familiar. Rio Grande do Sul.Universidade Federal do Rio Grande do Sul,2006,P 219-243.