Leitões de baixo peso: o desafio de conciliar prolificidade e sobrevivência Durante as ultimas duas décadas os avanços genéticos na espécie suína culminaram com o desenvolvimento de matrizes chamadas hiperprolíficas, que se caracterizam por apresentar uma alta taxa ovulatória e um tamanho de leitegada cada vez maior. Tanto na Dinamarca, Holanda e Alemanha, como no Brasil, muitos produtores vêm obtendo 14-16 leitões nascidos vivos por leitegada. Entretanto, quanto maior for a leitegada, maior tem sido a o percentual de leitões pequenos (< 1150 g). Ou seja, o número alto de nascidos vem acompanhado de uma taxa maior de desuniformidade (20-30%). Como conseqüência, o nascimento de um percentual de leitões menores, mais leves e também mais fracos, tem sido acompanhado de um aumento substancial na mortalidade de leitões esmagados e/ou mal nutridos e fracos, antes do desmame. A mortalidade mais alta nos animais leves pode ser mais ou menos expressiva, pois é influenciada pela qualidade do atendimento a esses leitões leves, porém é sempre superior nessa categoria do que nas categorias de animais mais pesados. Portanto, o grande desafio atual é conciliar prolificidade e sobrevivência dos leitões. Leitões mais leves - fatores agravantes na amamentação: Além do efeito sobre a sobrevivência, o peso ao nascimento também interfere no peso ao desmame e no desempenho posterior até o abate. Adicionalmente, existem dificuldades que ocorrem entre a própria porca e o leitão durante o período de aleitamento, que afetam o peso de alguns leitões lactentes, o que pode ser observado entre 4 e 8 dias de vida. Podem ser enumerados os seguintes fatores comuns a todas as granjas: 1. Muitas vezes existem mais leitões do que tetas disponíveis. 2. Às vezes existem tetas suficientes, mas conforme o leitão vai se desenvolvendo, falta espaço físico debaixo do úbere. 3. O fluxo de leite não é uniforme ao longo do conjunto de tetas. As glândulas peitorais produzem mais leite e os leitões mais pesados são os que mamam nas tetas dianteiras. 4. Algumas porcas (especialmente as mais velhas) não expõem todas as tetas da fila inferior. 5. Algumas tetas individualmente podem estar danificadas ou não funcionais. 6. Existem fêmeas que simplesmente não podem produzir suficiente leite para o crescimento ótimo do leitão. 7. Matrizes em ambientes quentes não produzem tanto leite porque consomem menos alimento. Dessa forma, devido a alta quantidade de leitões nascidos vivos e às limitações da porca durante a amamentação, podemos observar uma grande quantidade de leitões pequenos e atrasados, em cada leitegada. Esses leitões de baixo peso ao nascimento são considerados pelos produtores como “leitões problema”. Segundo estudos atuais, os mesmos deveriam ser considerados como “leitões de oportunidade”, desde que, se programe um manejo tecnológico adequado com substitutos do leite, gerando ao final ganhos econômicos. Enxertia de leitões, o recurso mais tradicional: Do nascimento ao desmame leitões nascidos em grandes leitegadas tendem a ser menos pesados do que leitões de leitegadas pequenas. Esta diferença é a conseqüência de um menor peso médio ao nascer e, em alguns casos, de um menor suprimento de leite para cada leitão nas grandes leitegadas. Foi observado ainda que leitões mais pesados ao nascimento possuem uma vantagem competitiva em relação aos mais leves durante a mamada. As enxertias de leitões podem ser feitas para homogeneizar o peso e/ou número de leitões por leitegada. Devem ser feitas até o segundo dia de vida e limitarem -se ao máximo de dois leitões por leitegada. Existe uma técnica recomendada para a adoção de leitões mais leves por uma leitoa: - retirar os oito maiores leitões da leitoa; - distribuir cada dois desses oito leitões entre quatro porcas pluríparas, do mesmo lote semanal; - transferir para a leitoa dois dos leitões mais leves de cada plurípara que recebeu leitões da leitoa. Orientar as primeiras mamadas colocando os leitões mais fracos nas tetas dianteiras a fim de mamarem quantidades substanciais de colostro. Estudos recentes relatam que o significativo aumento do tamanho da leitegada tem aumentado a variação na ingestão de colostro entre os leitões. Ou seja, que a heterogeneidade do peso dos leitões também pode ser determinante para a variação da ingestão individual de colostro. O principal fator determinante para a ingestão do colostro é o peso ao nascer, pois está relacionado com a vitalidade e habilidade para estimular a glândula mamária e extrair o colostro. Colocar 11-12 leitões a mamar em cada leitoa, afim de bem estimular todas as glândulas mamárias. Luta contra a variabilidade de peso dos leitões ao nascimento: O primeiro esforço deve ser focado em medidas capazes de prevenir a ocorrência de leitões leves ao nascer. Segundo autores, como principais estratégias de intervenção para melhorar a uniformidade dos suínos estão sendo utilizadas abordagens nutricionais para fêmeas gestantes, visando reduzir a variabilidade de peso ao nascimento. Uma prática que começa a ser adotada é a seguinte: Alimentar a matriz a partir dos 80 dias (terço final) de gestação de acordo com suas necessidades individuais envolvendo: peso corporal, ordem de parto e número de fetos gestados (com base no parto anterior). As matrizes no terço da gestação final são divididas em três categorias conforme o número de nascidos no parto anterior: (A) NT<11; (B) NT>11 e NT>14; (C) NT>14. De modo que a categoria (A) recebe 3,0 kg de ração/dia; a categoria (B) recebe 3,2 kg e a categoria (C) recebe 3, 4 kg/ração/dia. Dessa forma trata-se o indivíduo e não o rebanho. Este tipo de manejo demonstrou ser capaz de reduzir em 48,5% o percentual de leitões nascidos com peso abaixo de 1,0 kg. Uma vez estabelecido o problema com o nascimento de leitões leves, além do tradicional enxertia ou adoção de leitões para uniformizar as leitegadas, alternativas de intervenções nutricionais e de manejo já estão disponíveis. Isto ocorre porque nos últimos anos, principalmente devido ao expressivo aumento da prolificidade e da variabilidade dos pesos ao nascimento, mais pesquisas passaram a ser realizadas em torno desse tema. Assim, surgiram dois tipos de novas tecnologias usadas com o substituto de leite que ajudam aos leitões pequenos: 1. Oferecer suplementos de leite: com comedouros manuais ou com um sistema automatizado de leite. 2. Os Centros de resgate (DECKS) para cuidados intensivos na criação de leitões mais leves (< 1,15 kg) desmamados aos dois dias de idade. Forma para subministrar suplementos de leite Os alimentos utilizados como substitutos do leite materno são formulações comerciais a base de leite em pó, altamente digestíveis, e especialmente desenvolvidos para esse sistema, contendo alto conteúdo em gamaglobulinas derivadas de plasma, sendo acidificados para prolongar sua vida útil. Possuem uma alta solubilidade, mesmo em água fria. A dose gira em torno de 150 g por litro de água à 55?C. 1. Oferta de suplementos de leite na própria cela parideira, em comedouros manuais ou automatizados: Coloca-se um “pote” de leite (sistema automatizado) ou um comedouro manual em cada cela parideira. Isto é somente para auxiliar a porca, não para substituí-la. Uma vez nascidos, os leitões devem mamar na porca durante 24 horas para estabelecer a posição de cada leitão sob o úbere antes que seja oferecido o substituto do leite. Deve-se oferecer o suplemento a partir de 24 horas após o nascimento até 14-19 dias de idade. No caso de se utilizar amas de leite para enxertia (porcas de segunda ou terceira parição) esta leitegada de leitões pequenos deve ser alimentada com leite durante os 19 dias. 2. Uso de Unidades de Resgate (caixas ou “decks”) para cuidados intensivos com suplementação láctea: O melhor lugar para criar os leitões nascidos leves (de 0,86 a 1,15 kg de peso) é dentro de uma Unidade de Resgate de Cuidados Intensivos, sendo alimentados com substitutos de leite. Dentro de uma Unidade de Resgate os leitões pequenos não podem morrer de fome ou morrerem esmagados por sua mãe. Para que uma Unidade de Resgate tenha êxito, os leitões devem receber colostro durante 48 horas desde seu nascimento. A amamentação segregada é uma boa estratégia para assegurar que os leitões pequenos recebam colostro. A Unidade de Resgate pode ser colocada sobre a cela parideira ou não. Utiliza-se uma caixa para cada 10-12 celas parideiras. Uma Unidade de Resgate pode abrigar de 12 a 15 leitões a partir do terceiro dia de vida. Estratégias de manejo possíveis: 1 - Baixo peso ao nascimento: 1 ou 2 leitões por porca – 2-3 dias de vida; 2 - Atrazados/mal nutridos: 1 ou 2 leitões por porca – 4-5 dias de vida; 3 - Leitegada total: introduzir uma leitegada inteira no abrigo aos 2 dias de vida e usar essa porca como nutriz. Todos os leitões devem ter mamado o colostro antes e o abrigo (unidade de resgate) deve ser lotado em uma única vez. O sistema é idealizado para desmamar 5-10% dos leitões nascidos. O suplemento de leite reduz a mortalidade pre-desmame em cerca de 20-30%. Um estudo reportou uma redução de 39.4% na mortalidade pre-desmame na progênie de fêmeas primíparas e adultas quando os leitões foram suplementados com substitutos do leite até 19 dias de idade. Isto significou 0,5 leitões a mais no desmame, por leitegada e 1,2 leitões a mais por porca/ano. A administração de suplementos de leite reduz o número de leitões pequenos ao desmame. Um estudo relatou que o número de leitões pequenos (< 3,6 kg) diminuiu em 52% quando os leitões foram suplementados com leite. As principais razões para realizar um programa de desmame com dois dias numa Unidade de Resgate de Cuidados Intensivos são: 1. Para salvar os leitões pequenos. 2. Para fazer com que esses leitões acompanhem o resto da leitegada. Isto deve produzir mais suinos uniformes na etapa de terminação. 3. Separar os leitões menores na Unidade de Resgate pode melhorar a saúde de todo o restante da leitegada, que permanece junto a sua mãe. Os leitões pequenos geralmente são os primeiros a adoecerem na leitegada, porque não podem receber o colostro de maneira adequada. 4. Criar os leitões pequenos na Unidade de Resgate com cuidados intensivos pode melhorar os pesos de desmame de todos os leitões que permaneceram com a porca, já que haverá mais leite da porca para repartir entre esses leitões. Estudos mostraram que 81% dos leitões pequenos (<1,15 kg) criados numa Unidade de resgate chegaram à venda como animais terminados, em comparação com 50% dos leitões pequenos que se criaram com amas de leite. Isto significaria ter 1500 leitões a mais para o mercado por cada 1000 porcas. Ao desmame os leitões criados na Unidade de Resgate eram 1,27 kg mais pesados do que os leitões criados em mães adotivas (amas de leite). Os leitões pequenos (< 1.15 kg) criados com mães adotivas em geral não crescem adequadamente até o final da terminação. Somente 50% destes leitões chegaram ao peso de mercado e os leitões que sobrevivem localizaram-se nas categorias mais baixas da curva de distribuição de peso. Assim, embora esses leitões criados por amas de leite também sejam salvos, parece que não apresentam desempenho ideal para obter os pesos adequados na terminação. Considerações finais: A nutrição da matriz nos períodos pré-gestacional e gestacional afeta o desenvolvimento embrionário e fetal, sendo extremamente importante para o nascimento de leitegadas saudáveis e uniformes. As fêmeas de alta prolificidade merecem atenção quanto à nutrição, visto que um número de fetos maior que a fêmea seja capaz de manter vivos até o parto poderá aumentar a competição entre os fetos por nutrientes, resultando em leitões mais leves ao parto. O trabalho para redução da variabilidade se justifica não só pela maior produção de leitões viáveis destinados à creche, mas também pela importância do efeito multiplicador dos pesos desde o nascimento até o abate. A maternidade é considerada como o segmento onde surgem e se agravam as principais causas de variabilidade na produção de suínos, as quais se perpetuam através das fases subsequentes de desenvolvimento/criação dos leitões. O melhor retorno de investimento quando se utiliza o substituto do leite, é alimentar com ele os 30% dos leitões de menor peso ao nascimento. O grande benefício do uso de alimentação substituta do leite não está na sala de maternidade, mas sim na área de terminação de suínos, ou seja, um rápido início do crescimento do leitão assegura um acabamento consistente do suíno na fase final. Literatura consultada: 1. de ALMEIDA F.R.C.L. 2009. Influência da nutrição da fêmea sobre a qualidade do leitão ao nascer. Acta Scientiae Veterinariae. 37 (Supl 1): s31-s33. 2. CABRERA, R. 2007. Piglet Growth Affected by Milk Supplement. Feedstuffs, Vol. 79, No. 13. March 26, 2007. 3. CABRERA, R., R. DEAN BOYD and J. VIGNES. 2003. Management of Early-Weaned (2-d), Artificially-Reared Low Birth Weight Pigs. North Carolina Swine Nutrition Conference. Swine News. December 2003. Vol. 26, No. 11. 4. DALLANORA, D., MACHADO G.S., BIONDO, N. 2010. Impacto da qualidade dos leitões desmamados sobre o desempenho posterior nas creches e terminações. Acta Scientiae Veterinariae. 38 (Supl 1): s171-s180. 5. DALLANORA, D. Manejo pré-parto em Suínos. In: Simpósio Brasil Sul de Suinocultura, Curso de Manejo de Maternidade, Chapecó, SC, 2011. 5.VIGNES, J.L. 2008. Utilización de la Tecnología de Sustitutos de Leche para superar las limitaciones productivas de la Cerda, Advanced Birthright Nutrition, Delano, Minnesota.