Comunicado nº 03/2012
Aos: Senhores prefeitos, procuradores gerais dos municípios e executivos de
Associações de Municípios.
Referente: Necessidade de Lei específica para delegação da regulação de serviços
públicos de saneamento básico
A Federação Catarinense de Municípios – FECAM e a Agência Reguladora
Intermunicipal de Saneamento – ARIS, diante da existência de questionamentos sobre
o tema, vem orientar os gestores públicos e procuradores municipais sobre a
impossibilidade jurídica dos Municípios firmarem convênio de delegação dos serviços
de regulação e fiscalização com entidades de regulação destes serviços sem a prévia
existência de lei municipal autorizativa.
Esta situação, que se mostra presente em alguns municípios catarinenses, tem
preocupado as Associações de Municípios e a própria FECAM, pois ofende o princípio
da legalidade, previsto no artigo 37, caput da Constituição da República. Enfim,
qualquer gestor público somente pode fazer aquilo que a lei lhe permite,
especialmente quando concernente à delegação de serviço público característico do
exercício de poder de polícia administrativo, tal como o de regulação e fiscalização do
saneamento básico.
Retira-se da Política Nacional de Saneamento Básico as seguintes regras:
Art. 8º Os titulares dos serviços públicos de saneamento básico poderão
delegar a organização, a regulação, a fiscalização e a prestação desses
serviços, nos termos do art. 241 da Constituição Federal e da Lei n. 11.107, de 6
de abril de 2005.
Art. 9º O titular dos serviços formulará a respectiva política pública de
saneamento básico, devendo, para tanto:
II - prestar diretamente ou autorizar a delegação dos serviços e definir o ente
responsável pela sua regulação e fiscalização, bem como os procedimentos de
sua atuação;
Ora, a delegação prevista nos artigos 8º e 9º da Lei federal n. 11.445/2007
somente podem ocorrer mediante LEI em sentido formal, na medida em que esta
delegação dá poderes à entidade de regulação para aplicar multas, interditar unidades
de prestação de serviços, definir tarifas, enfim, uma série de atividades de
competência original dos municípios.
O Decreto federal n. 7.217/2010 é ainda mais enfático em esclarecer em quais
situações pode dar-se a delegação da regulação e fiscalização dos serviços de
saneamento:
Art. 31. As atividades administrativas de regulação, inclusive organização, e de
fiscalização dos serviços de saneamento básico poderão ser executadas pelo
titular:
II - mediante delegação, por meio de convênio de cooperação, a órgão ou
entidade de outro ente da Federação ou a consórcio público do qual não
participe, instituído para gestão associada de serviços públicos.
§ 1º O exercício das atividades administrativas de regulação de serviços
públicos de saneamento básico poderá se dar por consórcio público constituído
para essa finalidade ou ser delegado pelos titulares, explicitando, no ato de
delegação, o prazo de delegação, a forma de atuação e a abrangência das
atividades a ser desempenhadas pelas partes envolvidas.
Portanto, tanto a Lei federal n. 11.445/2007 quanto o Decreto federal n.
7.217/2010, são claros em somente permitir a delegação das competências de
regulação e fiscalização por meio de convênio de cooperação, a órgão ou entidade de
outro ente da Federação, sendo ilegal qualquer outro modo de delegação dos serviços.
Ocorre que o convênio de cooperação, instrumento que pode dar margem à
delegação de serviço público ou de competência administrativa, prescinde de lei
específica autorizativa por parte do município, isto é, somente pode ser celebrado
após autorização em lei específica municipal. É o que de retira do artigo 241 da
Constituição da República:
Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão
por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os
entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem
como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens
essenciais à continuidade dos serviços transferidos.
O mesmo comando normativo é encontrado no Decreto federal n.
6.017/2007, que assim reza:
Art. 2º Para os fins deste Decreto, consideram-se:
VIII - convênio de cooperação entre entes federados: pacto firmado
exclusivamente por entes da Federação, com o objetivo de autorizar a gestão
associada de serviços públicos, desde que ratificado ou previamente
disciplinado por lei editada por cada um deles;
Deveras, todas as regras acima estabelecidas na Constituição da República e
da legislação nacional são fruto do princípio da legalidade, que, na clássica lição de
Hely Lopes Meirelles, é compreendido como “na Administração Pública só é permitido
fazer o que a lei autoriza” (in Direito Administrativo Brasileiro. 25ª. São Paulo:
Malheiros, 2000. p. 82).
Portanto, o município somente pode firmar Convênio com entidade de
regulação após a publicação de lei municipal autorizando a celebração do referido
convênio, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade (art. 37, caput da CRFB) e aos
artigos 8º e 9º da Lei federal n. 11.445/2007; 2º, VIII do Decreto federal n. 6.017/2007;
e 241 da Constituição da República.
O tema ganha relevância diante do atual texto da Lei de Improbidade
Administrativa (Lei federal n. 8.429/1992), que assim rege:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário
qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial,
desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das
entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
XIV – celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação
de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as
formalidades previstas na lei; (Incluído pela Lei nº 11.107, de 2005)
............
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os
princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições,
e notadamente:
I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele
previsto, na regra de competência;
Assim, a situação deve ser analisada com muito cuidado pelos municípios
catarinenses para a assinatura de convênio com agência de regulação. Somente após
lei específica municipal é que referido instrumento pode ser celebrado com qualquer
entidade de regulação.
Para aqueles municípios que já firmaram o convênio com entidades de
regulação sem a existência prévia de lei municipal autorizativa, recomenda-se que
encaminhem correspondência formal à respectiva entidade, informando da suspensão
imediata das atividades objeto do convênio, até publicação da lei autorizativa, que
deverá ratificar o convênio anteriormente já celebrado. Esta conduta busca evitar
qualquer responsabilização do gestor público responsável pela celebração do
convênio, sem prévia autorização legislativa.
Por fim, faz-se necessário frisar que este Comunicado não objetiva dificultar
ou impedir a atuação das diversas agências de regulação existentes em Santa Catarina,
especialmente na área do saneamento básico. Todavia, o processo de delegação de
competência não pode dar-se sem a observância das normas jurídicas, tal como
atualmente vem ocorrendo em alguns municípios catarinenses. A delegação da
competência municipal deve ser previamente autorizada pela Câmara Municipal, num
processo de transparência e legalidade, sem atropelos e ações temerárias.
A
Federação Catarinense de Municípios e
a Agência
Reguladora
Intermunicipal de Saneamento renovam sua disposição em colaborar na melhoria da
qualidade dos serviços públicos de saneamento básico, cujo papel das entidades de
regulação é essencial, contudo, sendo necessário o respeito aos princípios da
Administração, garantindo assim a segurança jurídica no processo de delegação.
Florianópolis, 18 de maio de 2012.
EDINANDO BRUSTOLIN
Consultor Jurídico
OAB/SC 21.087
ALEXANDRE ALVES
Diretor Executivo da
FECAM
DOUGLAS GLEEN WARMLING
Prefeito de Siderópolis
Presidente da FECAM
CELSO VEDANA
Diretor de Relações
Institucionais da FECAM
ANTÔNIO COELHO LOPES JÚNIOR
Prefeito de Capão Alto
Presidente da ARIS
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