La Actividad Financiera del Estado 1.0 OBSERVAÇÕES O texto a seguir constitui o primeiro capitulo de meu livro Curso de Direito Tributário publicado no Brasil pela Editora Librus (Goiânia, Goiás, Brasil). Estamos disponibilizando este texto em língua portuguesa como contribuição e retribuição ao Emagister. 1.1 A atividade financeira do Estado O Estado é a representação política de uma coletividade determinada de pessoas. Em verdade, o homem, em sua dimensão sóciopolítica, reclama a existência deste ente coletivo, como imperativo do viver em sociedade. Usando outra expressão, pode-se dizer que o Estado é a pessoa (social ou coletiva) em relação a qual se reconhece uma posição de superioridade em face das demais pessoas (individuais) dentro de determinado território. Daí dizer-se que o Estado constitui-se o ente social investido de poder soberano sobre a população assentada em seu território. A finalidade essencial do Estado é apontada como sendo a realização do bem comum dos indivíduos que integram a comunidade política que ele representa. De se destacar que nos Estados modernos, configurados nos moldes de Estados Democráticos de Direito, a soberania estatal se erige como emanação da vontade – sempre soberana – dos súditos que, livremente, constituem e determinam a forma de ser e de atuar do Estado. Assim, é o Estado um instrumento criado pela coletividade, para a atuar em favor dela, tendo em vista os valores que ela própria escolheu e definiu como sendo aqueles que irão dirigir o seu caminhar coletivo. Daí a cláusula fundamental que estipula que ‘todo poder emana do povo’. O Estado Democrático emana do povo. O seu Direito também emana do povo. Com efeito, a comunidade política utiliza do Estado para estipular as regras de convívio social e o cumprimento de diversos objetivos de 1 Jorge Bezerra – [email protected] seu interesse. Daí dizer-se que o Estado é a ordem jurídica soberana que visa o bem comum do povo1, assim entendido como aspiração maior daquela comunidade, na forma como ela o define. Para cumprimento das finalidades que são reconhecidas pela comunidade como próprias do Estado, este desenvolve diversas atividades públicas. Dentre as atividades geralmente recomendadas ao Estado, destacam-se o provimento da segurança e a garantia da ordem interna, a defesa externa, a elaboração das leis, a distribuição da justiça, etc. Além destas atividades, ditas essenciais, o Estado Moderno, cada vez mais caracterizado como Estado Social, assume uma gama de atividades complementares que envolvem desde a realização de obras de infra-estrutura até a prestação dos mais diversos serviços públicos. A esse respeito merece citação o ilustre tributarista Aliomar Baleeiro, quando diz que “com o progresso da civilização acentua-se no Estado, além da função de órgão político monopolizador do poder, o caráter de sistema orgânico de serviços públicos para satisfazer as necessidades gerais da população” 2. Naturalmente, para consecução de todos estes objetivos sociais, pelos quais o Estado se justifica, são necessários recursos monetários em quantidade suficiente. Estes recursos, como veremos, o Estado pode obtêlos, ora vendendo determinados produtos ou serviços, em condições idênticas aos particulares, ora exigindo destes, de forma compulsória, na sua qualidade de poder soberano, determinadas somas pecuniárias. Além disso, considerando o grande volume de dinheiro movimentado pela máquina pública, necessário se faz o planejamento e a programação financeira visando a melhor aplicação destes recursos, mediante os quais a prestação estatal se materializa. 1 “Estado é a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território” (DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 1995, p.102) 2 Uma Introdução à ciência das finanças, 6ª Edição, Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1969, p. 16 2 La Actividad Financiera del Estado Desta forma, o Estado desenvolve um conjunto de ações que visam o suporte financeiro para o cumprimento de sua função social, ações estas que se desdobram em três campos: o da receita, o da gestão e o da despesa públicas. A este conjunto de ações estatais, assim consideradas, denominamos atividade financeira do Estado. Noutras palavras, a atividade financeira do Estado consiste na atuação estatal que tem por objetivo a obtenção, a gestão e a aplicação de recursos financeiros necessários à realização dos fins sociais do Estado. Portanto, a Atividade Financeira do Estado compreende os seguintes campos: Receita Pública obtenção dos recursos financeiros junto aos particulares Gestão administração dos recursos obtidos Despesa Pública o emprego ou aplicação dos recursos obtidos 1.2 A Receita Pública Certamente, dos três campos em que se desenvolve a atividade financeira do Estado, apenas o da receita pública assume relevância para o estudo do Direito Tributário. Para Aliomar Baleeiro3, receita pública é a entrada de recursos que, “integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, vem acrescer seu vulto, como elemento novo e positivo”. Logo, é importante salientar que receita pública não se confunde com entrada de recursos. Esta seria gênero, aquela seria espécie, uma vez que existem entradas ou ingressos de recursos que correspondem a meros “créditos de caixa”, como cauções, fianças, depósitos judiciais, empréstimos 3 Obra citada, p. 130. 3 Jorge Bezerra – [email protected] contraídos, que são representativos de entradas provisórias que devem ser, oportunamente, devolvidas. Portanto, os ingressos públicos constituem a generalidade das quantias recebidas pelo órgão estatal, mesmo que tenham caráter transitório, ao passo que as receita públicas são recebidas em caráter definitivo, significando um acréscimo ao patrimônio público. A Receita Pública classifica-se em originária e derivada, (Classificação Alemã): Receita pública originária é a decorrente do exercício de atividade econômica pelo Estado, o qual, se equiparando ao particular, lança mão de empreendimentos (empresariais) ou explora bens pertencentes ao seu patrimônio (patrimoniais). Receita pública derivada é obtida pelo Estado por meio do poder coercitivo, como expressão de sua soberania, o que o autoriza a retirar parte do patrimônio dos particulares como forma de manter as suas finalidade sociais. Com efeito, há outras formas de se considerar as receitas originárias e derivadas: semanticamente, originária é a receita que tem origem no próprio patrimônio estatal, uma vez que o Estado usa seus bens ou recursos como ponto de partida para obtenção destas receitas e derivada é a receita que advém do patrimônio dos particulares, significando uma transferência patrimonial destes para o Estado. Podemos observar ainda que a receita originária tem caráter contratual, isto é, decorre de um acordo de vontades entre o Estado e o particular, ao passo que na obtenção da receita derivada prevalece única e exclusivamente a vontade do Estado, este autorizado pelo mandamento legislativo, independentemente da vontade do particular – tem esta, portanto, caráter estritamente legal. 4 La Actividad Financiera del Estado Além disso, as receitas originárias decorrem de uma manifestação própria do jus gestiones (direito de gestão) por parte do Estado, pelo qual ele pode dispor livremente4 de seus bens e realizar negócios em situação similar a dos particulares. Assim é que ao Estado é dado alienar bens de seu patrimônio mobiliário e imobiliário bem como criar empresas, quando para isto autorizado5, e delas obter receitas. Quando a receita originária é obtida a partir da venda bens do patrimônio estatal ou quando o Estado, em razão de contrato, percebe os frutos destes bens, como no caso de aluguéis e arrendamentos, ou ainda, quando recebe juros de aplicações financeiras de seus capitais, a receita é classificada como originária patrimonial. Quando proveniente dos lucros obtidos por empresas estatais, em razão da venda de produtos ou serviços aos particulares, classifica-se como originária empresarial. Por outro lado, as receitas derivadas são obtidas em razão do jus imperii (poder de império) do Estado, que outra coisa não é senão uma forma de manifestação da soberania estatal, pela qual ele pode impor obrigações, regras de conduta e limitações aos seus súditos. Em razão desta expressão de poder, o Estado exige a transferência compulsória de recursos dos particulares paras os cofres públicos. No quadro classificatório das receitas derivadas, temos: • tributos • penas pecuniária (multas)6 4 Embora a receita originária decorra de atuação estatal tipicamente sob o regime de direito privado, é de se ver que a disposição de bens do Estado está submetida a regras gerais impostas à administração pública, especialmente a realização de licitação (cf. art. 37, XXI, da CF). 5 Em razão do princípio da livre iniciativa, privilegiado em nossa Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado é excepcional, restrita aos monopólios estatais e à prestação direta de alguns serviços públicos ou quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo conforme definidos em lei. 6 Alguns autores questionam a classificação das penas pecuniárias como receitas derivadas. No entanto, considerando que estas constituem o gênero das receitas obtidas compulsoriamente pelo Estado, não há como negar, dentro da disciplina aqui exposta, que este 5 Jorge Bezerra – [email protected] • confisco • reparações de guerras7 Naturalmente, para a finalidade do nosso estudo, interessamnos os tributos, cujo conceito conheceremos mais adiante. 1.3 Delimitação do objeto material do Direito Tributário Do ponto de vista epistemológico, cada ciência se assenta sobre uma base material própria que constitui o seu objeto de estudo ou apreciação. Além disso, cada disciplina científica apresenta um método próprio de investigação, colhendo o seu objeto material sob um prisma específico, peculiar e exclusivo. Assim, a distinção essencial bem como a classificação das qualificativo é perfeitamente aplicável às penas pecuniárias em geral, mesmo diante do caráter punitivo que lhes é próprio ou ainda, para alguns, do aspecto educativo que lhes deve ser adicionado. Basta ver que decorrem do jus imperii, têm caráter compulsório e são exigidas por força de lei. Assim não há que se cogitar da causa ou da finalidade desta modalidade de receita (ingresso definitivo) para mudar-lhe a classificação. 7 Uma outra classificação de receita pública, estabelecida com base no fato de que a atividade financeira do Estado se traduz por um conflito entre o interesse público e o privado, é a do economista norte-americano Edwin Seligman, citada pelo eminente tributarista Rubens Gomes de Souza (Compêndio de Legislação Tributária, Ed. Resenha Tributária, São Paulo, 1975, p. 11). Seligman classifica as receitas públicas em preços quase-privados, preços públicos, taxas, contribuições e impostos. Vejamos: Preços quase-privados: constituem as receitas cobradas pelo Estado em atenção à manifestação exclusiva do interesse dos particulares, sendo o interesse público é meramente acidental. Preços públicos: constituem as receitas cobradas pelo Estado em atenção à manifestação principal do interesse dos particulares, atendendo secundariamente à manifestação do interesse público. São as chamadas tarifas públicas. Ex.: Correios, Tarifa telefônica, Tarifa de energia elétrica, etc. Taxas: constituem as receitas cobradas pelo Estado principalmente no interesse público. O interesse do particular, embora existente é sobreposto pelo interesse coletivo. Ex.: Pedágio, Taxa de lixo, etc. Contribuições: constituem as receitas cobradas pelo Estado preponderantemente no interesse público, sendo que o interesse do particular está presente na contrapartida ou benefício que determinada atividade estatal pode propiciar. Ex.: Contribuição de Melhoria de Asfalto, etc. Impostos: constituem as receitas cobradas pelo Estado atenção à manifestação exclusiva do interesse público. O interesse específico do particular não existe. Ex.: Imposto sobre importação de bens, etc. Comparando os conceitos emitidos por Seligman com os da classificação alemã, pode-se perceber que os “preços quase-privados” e os “preços públicos” correspondem à modalidades de receitas originárias, enquanto que as “taxas”, as “contribuições” e os “impostos” representam receitas derivadas. 6 La Actividad Financiera del Estado ciências se faz tanto pela análise do seu objeto como pelo método tomado para conhecê-lo. Direito positivo x Ciência do Direito 1.3.1 Direito Financeiro Segundo o magistério de Ruy Barbosa Nogueira “várias ciências podem ter como objeto material de estudo o mesmo assunto, desde que cada uma aprecie ou trate este sob aspectos ou primas deferentes, isto é, de forma peculiar”, sendo que as “ciências que têm por objeto material de estudo o mesmo assunto são ciências afins, mas diferenciadas pela forma que cada uma estuda a matéria”8. Neste sentido, destacamos que a atividade financeira do Estado é, a um só tempo, objeto de estudo da Ciência das Finanças, que a aprecia sob o enfoque teórico-especulativo e do Direito Financeiro, que a considera sob a ótica jurídica. A Ciência das Finanças situa-se dentro do campo das ciências econômicas, ao passo que o Direito Financeiro integra o rol das ciências jurídicas. Assentado isto, podemos estabelecer que o Direito Financeiro é o ramo do direito que estuda os aspectos jurídicos da atividade financeira do Estado. Assim, o Direito Financeiro abrigará a atividade financeira do Estado como seu objeto específico de estudo, explorando-o do ponto de vista jurídico. É claro que, em termos absolutos, nenhuma ramo do conhecimento humano constitui compartimento estanque, sendo certo que as formulações obtidas a partir do Direito Financeiro terão repercussão em outras áreas do conhecimento, tais como contabilidade pública, economia e administração do setor público, cujos conceitos e formulações, quando atinentes ao objeto do Direito Financeiro, serão também juridicamente tratados por ele. A própria Ciência das Finanças que, dentro de seu método científico 8 Curso de Direito Tributário, 9ª Edição, São Paulo: Saraiva, 1989, p. 2. 7 Jorge Bezerra – [email protected] próprio, não deixa de apreciar aspectos políticos e jurídicos que envolvem a economia pública, serve de conteúdo informativo ao Direito Financeiro no exame detalhado do seu conteúdo específico. Isto tudo sem falar na interação do Direito Financeiro com os vários ramos das ciências jurídicas, especialmente o Direito Administrativo e Tributário, além dos demais ramos do direito público e privado. Dito isto, salientamos que é assente na doutrina a conceituação do Direito Financeiro, como já o fizemos linhas atrás, destacando o tratamento da atividade financeira sob a ótica jurídica. Fonrouge ensina que o Direito Financeiro “é o conjunto de normas jurídicas que regula a atividade financeira do Estado em seus diferentes aspectos: órgãos que a exercem, meios em que se exterioriza e conteúdo das relações que originam”9. Celso Ribeiro Bastos, de maneira sintética, explicita que o “Direito Financeiro é a disciplina jurídica da atividade financeira”10. Harada estabelece que “o direito financeiro é o ramo do Direito Público, que estuda a atividade financeira do Estado sob o ponto de vista jurídico”11. Zelmo Denari, adaptando a definição formulada por Theotônio Monteiro de Barros assevera que o Direito Financeiro é “o ramo do Direito Administrativo que regula a atividade desenvolvida pelo Estado na obtenção, gestão e aplicação dos meios materiais necessários à realização de seus fins”12. 9 Apud HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Atlas, 1995, p. 25. 10 Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. 6. ed. ampl. e atual., São Paulo: Saraiva, 1998, p. 16. 11 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Atlas, 1995, p. 25. 12 Curso de Direito Tributário. 8. ed., São Paulo: Atlas, 2002, p. 21. 8 La Actividad Financiera del Estado 1.3.2 Direito Tributário O Direito Tributário, como o leitor já pode depreender, mantém íntima relação com o Direito Financeiro, este, cujo objeto de exploração científica é integrado pela atividade financeira do Estado em toda a sua extensão, englobando a receita, a gestão e a despesa pública, conforme já demonstrado. O campo material reservado ao Direito Tributário é mais restrito, limitado apenas ao revestimento jurídico sobreposto a uma parte da atividade financeira do Estado ou, mais especificamente, às relações jurídicas que se estabelecem entre o Estado e o particular para a obtenção de uma parcela das receitas públicas, dentro do conjunto das receitas derivadas, quais sejam, aquelas que se inserem no conceito de tributos. Ou seja, ao Direito Tributário não interessa toda a atividade financeira do Estado – objeto do Direito Financeiro –, mas apenas uma fração desta, vinculada à receita pública. Também não lhe apraz toda a receita pública, mas apenas uma porção desta, enquadrada no conjunto das receitas ditas derivadas. Por fim, não o atraem todas as receitas derivadas, mas tãosomente a parte destas que se classifica como tributos. É claro que, tendo em vista a obtenção dos tributos, o Estado desenvolve uma atividade administrativa específica, designada por atividade ou função tributária. Esta atividade, que se situa no campo do Direito Administrativo não integra o objeto material do Direito Tributário, uma vez que este se restringe ao estudo das relações jurídicas estabelecidas entre o Estado (credor) e o particular (devedor) com vistas ao auferimento das receitas chamadas tributos. Portanto, a fração da atividade administrativa designada por atividade financeira do Estado e a parcela desta atividade designada por 9 Jorge Bezerra – [email protected] atividade tributária escapam, em seu sentido material, ao objeto do Direito Tributário13. Dito isto, podemos estabelecer que o objeto do Direito Tributário é constituído pelo plexo normativo que regula as relações jurídicas (entre o Estado e os particulares) das quais derivam a obtenção dos tributos. Assim, tendo em vista que a norma de Direito Financeiro apanha a atividade financeira do Estado e aplica aos seus elementos e à sua dinâmica efeitos de natureza jurídica, constituindo este plexo normativo o objeto do Direito Financeiro, é de se ver que o estudo da relação tributária, como evento daquela atividade financeira, se insere também dentro do âmbito do Direito Financeiro, donde se conclui que o Direito Tributário é uma parte ou uma sub-especialização daqueloutro ramo jurídico. Neste sentido, assevera Ruy Barbosa Nogueira que “Não só o Direito Tributário é a parte mais importante e desenvolvida do Direito Financeiro, como é a que efetivamente contém e trata da grande problemática entre fisco e contribuinte que dimana do fenômeno financeiro da receita tributária”14 Posição semelhante é apresentada por Kiyoshi Harada, que, com acerto, pontua: “O Direito Tributário disciplina um dos objetos do Direito Financeiro, qual seja, a receita pública, e nesta apenas aquela concernente à derivada, isto é, a receita tributária. Daí por que 13 ALESSI e STAMMATI consideram que o Direito Tributário é constituído pelo complexo de normas jurídicas que disciplinam a função tributária dos entes públicos (apud DENARI, op. cit., p. 24.). Parece-nos, no entanto, que este seria um excelente conceito para o direito administrativo tributário e não para o Direito Tributário material (Cf. Dino JARACH, op. cit. p. 52-53) A atividade administrativa, que aqui se designa por atividade tributária ou função tributária, corresponde ao conjunto de atos administrativos referentes ao planejamento, à arrecadação e à fiscalização dos tributos, configurando ora um prius, ora um posterius em relação à relação jurídica tributária ou, ainda, ora se sobrepondo a ela, do pondo de vista estritamente administrativo. Isto quer dizer que as atividades ao planejamento e os estudos técnicos que o precedem, bem como as regras relativas ao modus operandi da administração no que respeita à arrecadação e à fiscalização dos tributos são matérias que constituem objeto do Direito Administrativo e não do Direito Tributário. 14 Op. cit, p. 18. 10 La Actividad Financiera del Estado os autores costumam dizer que o Direito Tributário é capítulo do Direito Financeiro, o qual constitui a disciplina jurídica de toda a atividade financeira do Estado. Como decorre de seu conceito, o Direito Tributário limita-se a regular as relações jurídicas entre o fisco e o contribuinte [...] que dimanam do fenômeno tributário.”15 Manifestação similar pode ser encontrada em diversos autores pátrios.16 Feitas estas observaçõs, destacamos agora o conceito do célebre professor Rubens Gomes de Sousa, que adotamos sem ressalvas, segundo o qual o “Direito Tributário é o ramo do direito público que rege as relações jurídicas entre o Estado e os particulares, decorrentes da atividade financeira do Estado, no que se refere à obtenção de receitas que correspondam ao conceito de tributos”17. O conceito, como não poderia deixar de ser, delimita com precisão o âmbito do Direito Tributário. A fórmula conceitual do professor Rubens Gomes Souza, visando estabelecer um conceito analítico, situa o Direito Tributário no amplo universo do direito e, em seguida, individualiza o seu objeto, destacando-o como parte da atividade financeira do Estado. Assim, partindo do geral nos remete para o particular. Decompondo a estrutura conceitual, temos: ramo do direito público – Esta expressão nos remete para a inserção do Direito Tributário no compartimento do jus publicus. Há diversos critérios para a classificação de uma disciplina 15 Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Atlas, 1995, p. 153. 16 Geraldo Ataliba, que negava autonomia científica ao Direito Tributário, o tinha como subramo do Direito Administrativo (Hipótese de Incidência Tributária. 5. ed., 1998, p. 35 e 37-38). Esta posição pode ser explicada historicamente pelo fato de que o Direito Administrativo (um dos primeiros ramos do direito público, ao lado do Direito Constitucional) deu origem ao Direito Financeiro e este ao Direito Tributário. 17 Compêndio de legislação tributária. São Paulo: Resenha Tributária, 1975, p. 40. 11 Jorge Bezerra – [email protected] jurídica como integrante do ramo do direito público ou do direito privado18 e o próprio professor Rubens Gomes de Souza alinha três: (1) o da pessoa titular do direito: se o titular do direito regulado por certa norma for um particular, a norma é de Direito Privado; se for o Estado, ou alguma entidade governamental, cuidar-se-á norma de Direito Público; (2) o da natureza do interesse protegido: se o interesse protegido pela norma é individual, trata-se de norma de direito privado; se cuida de proteger o interesse da coletividade, o domínio é do Direito Público; e (3) o da natureza dos efeitos da norma: se a norma é de caráter compulsório, ou seja, se ela obriga ou proíbe, tratase de dispositivo de Direito Público; se é permissiva, isto é, se ela admite que se faça ou não alguma coisa, cuida-se de norma de Direito Privado. rege as relações jurídicas entre o Estado e os particulares – uma das características marcantes do direito público é evidenciada no antagonismo Estado × Particular, assinalado pelo conflito entre o interesse coletivo e o interesse individual. Certo é também que o tributo, em razão de sua própria natureza, tem sua exigência jungida a uma relação jurídica obrigacional específica que vincula o Estado (sujeito ativo) e o particular (sujeito passivo), sendo que em torno da imposição tributária surgem também outras relações jurídicas desta mesma natureza. relações jurídicas [...] decorrentes da atividade financeira do Estado – ao admitir que as relações jurídicas que interressam ao Direito Tributário são decorrentes da atividade 18 A distinção entre direito público e direito privado é clássica e remonta aos romanos. J. Cretella Júnior ensina que estes preocuparam-se em dividir o direito, “mostrando, na classificação dicotômica de ULPIANO, reproduzida por JUSTINIANO, que o estudo deste compreende dois ramos principais: o público e o privado, sendo o primeiro o que tem por finalidade a organização da república romana e o segundo o que diz respeito ao interesse dos 12 La Actividad Financiera del Estado financeira do Estado e, portanto, nelas se inserem, o autor do conceito também admite, implicitamente, que o ramo jurídico conceituado faz parte do Direito Financeiro. no que se refere à obtenção de receitas que correspondam ao conceito de tributos – o arremate do conceito conduz à precisa delimitação do âmbito material do Direito Tributário, restrito às relações jurídicas que se referem à obtenção dos tributos. O tributo pode ser definido como uma prestação patrimonial obrigatória, instituída a favor do Estado (órgão político que representa a comunidade) mediante lei, vale dizer, com o consentimento de todos. É claro que o tributo não se confunde com as prestações patrimoniais decorrentes de sanções, porque o tributo não tem caráter punitivo. O aspecto legal do tributo ou sua instituição mediante lei nos remete necessariamente ao campo jurídico-formal delimitador da imposição tributária, ficando evidenciado que o tributo deve ser instituído por lei e que ele se insere dentro da ordem legal e, portanto, se circunscreve a esta ordem, obedecendo todo o seu regramento. particulares”. (Curso de direito romano: o direito romano e o direito civil brasileiro. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 25). 13