GERENCIAMENTO DE RESIDUOS SÓLIDOS COM ALTA CARGA ORGÂNICA NA
EUROPA E NO BRASIL
Forster-Carneiro, T.1; Isaac, R.L.1; Pérez, M.2
1.
2.
Departamento de Saneamento e Ambiente. Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo, CP.
6021. Universidade Estadual de Campinas –UNICAMP. 13083-970, Campinas Brasil.
Departamento de Tecnologías del Medio Ambiente. Facultad de Ciencias del Mar y Ambientales, C.P. 11510.
Universidad de Cádiz - UCA, Campus Rio San Pedro, Cádiz, Espanha.
ABSTRACT
A comparative analysis between the situation in Europe and Brazil regarding the
management of solid waste with high organic load is presented. In Europe, the
management of solid waste is focused on recovery and production of energy. The
difficulties of energy generation in this continent combined with increasing energy
consumption in the last three decades were favorable to solid waste recycling and
thermal recovery. In Brazil, public and private companies have had to search for a
solution both environmentally and economically suitable for the disposal of solid
waste considering the deficit of the landfills system. In São Paulo State where the
largest amounts of solid waste are generated, high costs of transportation and final
disposal strengthen the recommendation of solid waste use as feedstock in other
processes.
Keywords: solid wastes, legislation, treatment, disposal, bioenergy
1. INTRODUÇÃO
1.1.
Resíduos com alta carga orgânica
Os resíduos sólidos com alta carga orgânica são, principalmente, os resíduos
sólidos urbanos (RSU) e lodos, resíduos procedentes da produção animal e resíduos
da agroindústria. No Brasil, os RSU são definidos como material, substância, objeto
ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, no estado
sólido ou semi-sólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas
particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em
corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente em face da
melhor tecnologia disponível. Consideram-se também como RSU os lodos
procedentes dos serviços públicos de saneamento básico (gerados nas atividades
de tratamento de água e esgoto) no estado semi-sólido (BRASIL, 2010). Os resíduos
da produção animal e os resíduos da agroindústria são classificados quanto à sua
origem, de acordo com a Lei 12.305/2010 de resíduos sólidos, como resíduos
agrossilvopastoris. Resíduos estes gerados nas atividades agropecuárias e
silviculturais, incluídos os relacionados a insumos utilizados nessas atividades.
Na União Européia os resíduos foram definidos e classificados no “Catálogo
Europeu de Resíduos (CER)”, aprovado pela Comissão Européia em 1994. De
acordo com o CER, os resíduos sólidos são definidos como: RSU são classificados
como municipais e resíduos similares, aos procedentes de comércio e indústria
recolhidos pela coleta seletiva; os lodos procedentes das estações de tratamento de
água e esgoto são considerados um resíduo específico, sendo também chamados
de lodos aquelas águas residuais de lavagem com alta porcentagem de sólidos em
suspensão e procedentes das diversas atividades agroindustriais; os resíduos rurais
se dividem em resíduos sólidos ou líquidos, principalmente, esterco (bovino, suíno,
avícola, caprino e ovino), procedentes das atividades pecuárias (reprodução,
engorda, abate, laticínio, etc.); os resíduos agroindustriais se dividem em resíduos
sólidos (restos de vegetais e frutas, palha de arroz, caroço de azeitona, etc.) e
líquidos (óleos, soros, lodos de limpeza, etc.) procedentes das indústrias de
alimentos (sucos, vinícolas, etc.). O fato de uma substância estar incluída no CER
não implica que esta será considerada um resíduo, são as circunstâncias que
determinam tratar-se de um resíduo ou um subproduto. Devido a essa dificuldade a
Comissão Européia teve que aprovar um novo documento esclarecendo que, alguns
resíduos do setor rural e agroindustrial, como por exemplo, o soro de queijo, o
esterco bovino ou suíno, ou os restos vegetais, entre outros, deveriam ser
considerados subprodutos perante os aspectos legais e não resíduos com alta carga
orgânica.
1.2.
Cenário dos resíduos sólidos
Nas últimas décadas, tanto na União Européia quanto no Brasil houve uma
profusão de novos produtos nas grandes cidades (latas, recipientes plásticos,
eletrodomésticos, pneus e muitos outros itens descartáveis), assim como, um
significativo aumento da produção de lodo procedente das construções de novas
estações de tratamento de água (ETA) e tratamento de esgoto (ETE). Tanto os
produtos da chamada indústria "descartável" de alimentos processados, como os
lodos contribuíram a um aumento significativo na produção de resíduos sólidos. Por
outro lado, a intensa atividade pecuária e da agroindústria têm provocado um
desequilíbrio ambiental por concentrar grande quantidade de animais num reduzido
espaço; ou por concentrar indústrias que geram uma grande quantidade de resíduos
numa mesma área específica.
Assim, uma gestão ineficiente destes resíduos pode gerar contaminação
atmosférica por emissão de gases do efeito estufa e amônia; contaminação do solo
por excesso de nitrogênio e fósforo, e alta permanência de microrganismos
patogênicos; contaminação da água subterrânea por nitratos. A destinação final
ambientalmente adequada destes resíduos é uma operação complexa que exige a
interface com outras áreas de conhecimento e de atividades.
Considerando-se que o aterro sanitário é atualmente o método de destinação
dos resíduos sólidos mais utilizados no mundo, existe um elevado potencial de
captura e aproveitamento do metano. Os projetos que comprovam a adicionalidade
de créditos de carbono em aterros, através da recuperação e queima do metano,
configuram-se como projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL).
1.3.
Marco Legislativo
A primeira lei aprovada na União Européia relacionada com os resíduos
sólidos é de 1975, cenário em que os países do norte desse continente já estavam
comprometidos com a incineração ou a reciclagem, enquanto que os países do sul,
devido a problemas econômicos, optaram pelo aterro sanitário como método de
tratamento. Desde então diversas leis e normas têm sido publicadas pela Comissão
Européia com a finalidade de promover a gestão sustentável dos resíduos.
Atualmente, a Lei 2003/35/EC (institui a Lei 96/61/EC) de prevenção e controle
integrado da contaminação tem importante implicação no gerenciamento de
resíduos sólidos garantindo o crescimento sustentável do agronegócio (projetos
MDL) (European Commission, 1996).
O Brasil possui leis voltadas para a conservação ambiental desde 1981, com
a criação da Política Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA. Em 1988, surgiu a
Resolução CONAMA nº 5, para regulamentar as obras de sistemas de
abastecimento de água e esgoto. A partir desta resolução surgiram nos anos
seguintes outras resoluções voltadas a uma política de tratamento dos resíduos e,
uma série de normas técnicas publicada pela Associação Brasileira de Normas
Técnicas – ABNT, que incluem: NBR 10004 (Classificação de Resíduos Sólidos);
NBR 10005 (Procedimento para obtenção de extrato lixiviado de resíduos sólidos),
NBR 10006 (Procedimento para obtenção de extrato solubilizado de resíduos
sólidos), NBR 10007 (Amostragem de resíduos sólidos). Recentemente, a Lei nº
12.305 (02 de agosto de 2010) instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos,
dispondo sobre seus princípios, objetivos e instrumentos, bem como sobre as
diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, às
responsabilidades dos geradores e do poder público e aos instrumentos econômicos
aplicáveis (BRASIL, 2010).
1.4.
Gerenciamento de resíduos sólidos
O gerenciamento de resíduos sólidos contempla um conjunto de ações
exercidas, direta ou indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, tratamento e
destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final
ambientalmente adequada dos rejeitos. De acordo com plano municipal de gestão
integrada de resíduos sólidos, todas as ações devem ser realizadas de forma a
considerar as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, com
controle social e sob a premissa do desenvolvimento sustentável.
Resíduos com alta carga orgânica (RSU, lodos e resíduos da produção
animal e agroindustrial) devem ser tratados mediante processos biológicos de
digestão anaeróbia (“biometanização”) e/ou compostagem (processo aeróbio), já
que seguem um mesmo padrão de comportamento químico e podem ser tratados
com essa tecnologia, principalmente aquela com aproveitamento energético
(Forster-Carneiro, 2005). Observa-se na Europa a intensificação do uso de digestão
anaeróbia no tratamento de RSU e lodos de ETE, já que alguns problemas
operacionais decorrentes da ineficiente coleta seletiva ocorridos na década de 1980,
foram superados. Atualmente, muitos países da Comunidade Européia que já
possuem estações de tratamento de RSU e lodos, com aproveitamento energético,
estão investindo na co-digestão, isto é, digestão anaeróbia que utiliza no tratamento
mais de um resíduo com alta carga orgânica e, normalmente faixa termofílica de
temperatura (55◦C) e digestão seca, isto é, alto teor de sólidos (20 a 30%) (ForsterCarneiro, T., 2005). Estas estações de tratamento, conhecidas como TMB
(Tratamento Mecânico e Biológico), empregam no produto final obtido pela digestão
anaeróbia, principalmente, os métodos de centrifugação, secagem e compostagem,
para a obtenção de um produto final livre de microorganismos patogênicos. Por
outro lado, alguns países do sul da Europa, onde existe uma grande necessidade de
recuperar áreas degradadas, predomina a simples compostagem para o produto
final da digestão anaeróbia.
No Brasil, o sistema de tratamento mais utilizado é o de aterro sanitário. Estes
não respondem a hierarquia de prioridades definidas na recente Lei 12.305 quanto à
destinação final ambientalmente adequada de resíduos com alta carga orgânica. No
entanto, aterros que recuperam metano nas grandes cidades ou aqueles
implantados em pequenos municípios onde existiam lixões a céu aberto, também
poderiam ser considerados sistemas adequados de tratamento. O sistema de
digestão anaeróbia de lodos de ETE está bastante desenvolvido, mas ainda são
poucas as iniciativas visíveis com respeito à destinação final ambientalmente
adequada do lodo digerido. Também existe um número bastante reduzido de
unidades de compostagem e reciclagem instalada no País, para o tratamento do
RSU e, algumas iniciativas privadas com respeito ao tratamento anaeróbio de
resíduos procedentes da atividade rural de suinocultura.
2. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL, Lei N° 12.305 de 02 de agosto de 2010 - Política Nacional de Resíduos
Sólidos (PNRS).
European Commission, (1996). European Council Directive 96/61/EC on integrated
pollution prevention and control. Official Journal L 257, 0026–0040.
Forster-Carneiro, T. (2005). Digestión anaerobia termofílica seca de residuos sólidos
urbanos: estudio de las variables del proceso en el arranque y estabilización del bioreactor. Tesis de Doctorado, Universidad de Cádiz, España, p. 405.
Download

gerenciamento de residuos sólidos com alta carga orgânica