Rev. Bras. Fisiot. V oi. I, No. 2 (1996) 51-60 ©Associação Brasileira de Fisioterapia 51 Reabilitação na Lesão do Ligamento Cruzado Anterior: Uma Revisão da Literatura . , . 1 e G .A . p·llll-2 V . C . D lOlllSlO 1 Fisioterapeuta, Professor e Supervisor de Estágio na área de Ortopedia e Traumatologia da Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP Mestrando em Bioengenharia- EESC/FMRP-USP 2 Fisioterapeuta, concluinte do curso de aprimoramento em Ortopedia e Traumatologia da Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP Universidade de Ribeirão Preto- UNAERP, Av. Costábile Romano, 2201 14.096-380 Ribeirânia, Ribeirão Preto- SP Recebimento: 1.4.96 Resumo. Este trabalho apresenta uma revisão atualizada da literatura a respeito da lesão do Ligamento Cruzado Anterior e seu tratamento, abordando desde a fisiologia articular, mecanismo de lesão, diagnóstico, reconstrução ligamentar e tratamento fisioterápico, sendo estes últimos com ênfase a partir da técnica de Dejour, atualmente a mais utilizada pelos cirurgiões devido às características favoráveis de resistência e cicatrização do enxerto. A reabilitação é abordada com análise de vários protocolos de tratamento, seus resultados e diferenças, buscando um melhor entendimento com bases no conhecimento científico. Palavras-chave: reabilitação, ligamento cruzado anterior, lesão, reconstrução Abstract. This research presents an up-to-date review ofliterature regarding to the front cruciate ligament injury and its treatrnent, by approaching since joint physiology, injury mechanism, diagnosis, ligament reconstruction and physiotherapeutic treatrnent, and the last two ones focused on Dejour' s technique: the most used procedure among surgeons nowadays due to favorable features of graft resistance and healing. The rehabilition is presented by assessing severa! protocols oftreatment, their results and contrasts, expecting a better comprehension based on scientific knowledge. Keywords: rehabilitation, anterior cruciate ligament, injury, reconstruction Introdução A lesão e o tratamento do ligamento cruzado anterior (LCA), estão sendo bastante discutidos atualmente e, sem dúvida, são o destaque entre as lesões de joelho. Tal fato deve-se ao importante papel biomecânico que este ligamento exerce no joelho e da grande incidência de lesões em atletas de alto nível, exigindo dos pesquisadores estudos mais aprofundados e propostas de tratamento que sejam eficientes. Com a evolução das técnicas cirúrgicas houve um aprimoramento das técnicas fisioterápicas, tomando possível uma reabilitação mais precoce, evitando-se desta forma complicações relativamente comuns há alguns anos. Entretanto, o sucesso da fisioterapia neste tipo de lesão não é, ainda, totalmente fundamentada cientificamente e tão pouco a conduta é a mesma em diferentes lugares. Endereço para correspondência: R. Heitor Chiarello, 436 - ap. 22, 14.020-520 Jd. Irajá- Fone (016) 623.8902 Nossa intenção é mostrar uma revisão atualizada sobre o assunto, passando pela fisiologia articular, tipos de lesão, quadro clínico, evolução, complicações do tratamento conservador e cirúrgico, até diversas propostas de reabilitação, atualizando esses vários aspectos sem imposição de regras ou verdades absolutas. Desta forma acreditamos estar contribuindo para que cada fisioterapeuta elabore suas conclusões e que haja uma constante busca de bases científicas que forneçam subsídios para a opção da melhor conduta no seu tratamento. Fisiologia Articular O ligamento cruzado anterior (LCA) possui, dentro da biomecânica importante papel na estabilidade do joelho. Auxiliado pelo ligamento cruzado posterior (LCP), ele mantém o contato das superficies articulares do fêmur e da tíbia, nos movimentos de flexo-extensão. 52 Dionísio & Pini Durante a flexão o LCA é responsável pelo deslizamento do côndilo femural para frente e seu rolamento para trás e corresponde ao fator passivo que explica este mecanismo entre côndilos e platôs tibiais. Assim, como.no caso das fibras musculares, as fibras do LCA não são todas-solicitadas ao mesmo tempo. Trata-se de um verdadeiro recrutamento no decorrer do movimento devido a desigualdade no comprimento de suas fibras que variam de acordo com a posiÇão e local de inserção. Durante a flexão do joelho entre 90° e 120°, por exemplo, as fibras ântero-inferiores do LCA estão afrouxadas e as póstero-superiores estão tensionadas. Na extensão completa, o LCA como um todo está tenso, sendo, por isso, um dos "freios" da hiperextensão. Os movimentos de rotação, também tensionam o LCA. A rotação interna provoca um contato mútuo entre os ligamentos cruzados que se enrolam, tensionando-se mutuamente. A partir dos 15°20° de rotação externa o LCA começa a tensionar-se cada vez mais, enrolando-se sobre a face axial do côndilo femural extemo, quando a rotação externa prossegue. O LCA, portanto, está sempre tenso em algumas de suas fibras, independentemente da angulação de movimento em que o joelho se encontre 1•2 •3 . Força de gaveta anterior É definida como um puxão aplicado sobre a extremidade proximal da tíbia, através da força do quadríceps durante a extensão do joelho. É a força que possui o maior efeito de estresse sobre o LCA, explicando o porquê deste músculo ser considerado o antagonista do LCA 1• Alguns achados clínicos revelam um aumento do deslocamento tibial durante os últimos 30° de extensão após a lesão do LCA, portanto, o LCA é submetido a estresse de 30° a 0° de extensão4 . O deslocamento anterior também aumenta quando se requer maior força do quadríceps; par exemplo, um paciente submetido a uma série de exercícios-eom resistência progressiva para o quadríceps de 30 a 0° está expondo o LCA a níveis de estresse progressivo conforme a resistência é aumentada. Entretanto, levantar o membro inferior com angulação de joelho 5 maior que 30° de flexão não estressa o ligamento . Dando 6 suporte a este achado, Wilk e Andrews mediram o maior deslocamento tibial durante)este isocinético do quadríceps de 30°-15° de flexão. Tais fatos justificam os critérios de reabilitação na França em que exercícios em cadeia cinética aberta, onde os pés estão sem apoio e facilitam a translação anterior da tíbia em relação ao fêmur pela contração do quadríceps e pela ausência de contração simultânea dos isquiotibiais. Portanto, a utilização do dinamômetro isocinético está contra indicado antes dos 6 meses de pós-operatório (P.O.). Até este período todos os exercícios são realizados em cadeia cinética fechada (pé fica apoiado), aumentando assim, a compressão articular e produzindo uma ação simultânea entre isquiotibiais e quadríceps (co-contração), reduzindo pela metade a translação anterior da tíbia sobre o fêmur7 . Rev. Bras. Fisiot. A literatura8 aponta algumas solicitações do LCA, onde a maior encontrada é a corrida em descida, que tem solicitação igual a 125%. Porém, a bicicleta estacionária é uma das menores, sendo de 7% a solicitação do LCA. Conclui-se então que atividades de vida diária e exercícios que exponham o retalho de LCA a diferentes magnitudes de força de gaveta anterior podem resultar em graus diferentes de estresse tecidual 5 . Tensão do LCA e do retalho de LCA O comportamento biomecânico do LCA e do retalho do LCA foram estudados pela medida das mudanças no comprimento dos mesmos em diferentes condições experimentais 5, e o autor chegou às seguintes conclusões: O LCA não sofre estresse em rotação externa e flexão passiva. Na rotação interna e flexão passiva ocorre distensão do LCA mesmo com 120% de flexão, e chega ao máximo de distensão em tomo dos 15°. Em contração isométrica simulada do quadríceps com flexão menor de 45%, temos distensão do LCA e chega ao máximo aos 15° de flexão. Isto pode ser compreendido devido ao esforço necessário do quadríceps para manter a extensão e o LCA ser um fator restritivo à translação anterior da tíbia. Portanto, o quadríceps pode mudar o comprimento do LCA e exercícios isométricos em extensão devem ser evitados quando se quer evitar estresse no ligamento. Com relação aos retalhos, observa-se que existe um pronunciado aumento do percentual nos primeiros 120° de flexão e a mudança do comprimento é menor que 1,O mm em condições experimentais, sendo insuficiente para ocorrer ruptura. Entretanto é necessário uma correta colocação cirúrgica do retalho, ou seja, a posição deve ser semelhante à posição do ligamento original, chamado de ponto isométrico. A localização cirúrgica resulta em uma aproximação do comprimento e tensão constantes em qualquer movimento do joelho. Isometria perfeita, porém, é praticamente impossível de ser conseguida cirurgicamente. Então, alguns cirurgiões elegeram que uma distensão menor que 2 mm durante os primeiros 90 de flexão seria um bom critério para uma fixação isométrica aceitável. Mecanismos de Lesão do LCA Podemos dividir os mecanismos de lesão em lesões associadas e isoladas. As lesões associadas são: Um traumatismo em valgo, mais flexão e rotação externa, acarretam, sucessivamente, seguindo uma força crescente: lesão do LCM, LCA e desinserção do menisco medial 1. Este mecanismo de lesão é muito comum em esquiadores e pode vir associado à lesão da musculatura da pata de ganso que tenta conter o valgo. Quando ocorre um deslocamento completo através de hiperextensão maior que 30°, há rotura primeiro do LCP (Ligamento Cruzado Posterior) e depois do LCA9 . V oi. I. No. 2, 1996 Reabilitação na Reconstrução do LCA Uma força posterior direta contra a extremidade superior da tíbia provoca um deslocamento anterior enquanto o joelho é fletido, e produz a lesão do LCA geralmente associada com uma lesão oculta do LCP e cápsula articular9 . As lesões isoladas são: Durante o movimento forçado de flexão, varo, rotação interna, os ligamentos cruzados enrolam-se, o compartimento lateral se abre e o côndilo interno do fêmur pressiona o LCA, lesando-o7 . A rotação interna da tíbia quando o joelho é estendido pode produzir uma rotura isolada do LCA pois tanto a porção póstero-lateral quanto a ântero-medial deste ligamento estão tensas neste movimento 9 . Diagnóstico Uma rotura isolada do LCA é considerada incomum, e o aparecimento da mesma deve estar associado com roturas intersticiais de outras estruturas estabilizadoras. Uma rotura antiga complicada por outras lesões ligamentares ou de menisco, geralmente, representa o resíduo de algo que antes foi uma lesão única9 . Os testes clínicos a seguir são os mais freqüentemente empregados para diagnosticar a insuficiência do LCA. • Sinal da Gaveta Anterior • Teste de Lachman • Pivot-Shift Test • Jerk Test Além desses exames clínicos, e na impossibilidade de realizar exames mais sofisticados como Tomografia, Ressonância Magnética, etc., dispõe-se atualmente do SAD (Subluxação Anterior Diferencial) que é uma medida radiológica 10 . Conseqüências a Lesão do LCA sem Reconstrução O LCA exerce sobre o joelho um importante papel estabilizador. Trabalhos têm sido feitos envolvendo indivíduos não submetidos a reconstrução após grave lesão do LCA e observando suas implicações 10•11 . As observações principais desses estudos são: • Adaptações no modo de andar, correr, subir e descer escadas têm sido observadas em pacientes com lesão do LCA. Isto ocorre numa tentativa de evitar acúmulo de força na região anterior da tíbia. Ocorrem diversas alterações metabólicas a partir destas adaptações que ainda não estão completamente entendidas. No entanto, há um aumento do consumo de 02 na ordem de 8% para a corrida a 150 m/min nos pacientes com lesão do LCA. Isto representa um significante "gasto" da corrida, porém, a caminhada não é afetada significativamente. A divergência entre o "gasto" normal e em pacientes com lesão do LCA é notada com o aumento da velocidade 11 . • Verificou-se ainda, que, nos casos de lesão do LCA, a sub luxação anterior da tíbia podia ser provocada pelo músculo quadríceps. Num portador de lesão de LCA, este movimento anormal de sub luxação ocorreria na marcha diária, pois durante 53 a fase de apoio a contração do músculo quadríceps é vigorosa e conseqüentemente as trações anteriores da tíbia são intensas. Esta agressão diária acaba por acarretar alteração cartilaginosa, inicialmente indolor, que com o passar dos anos progride expondo o osso subcondral rico em terminações nervosas e tornando-se doloroso. Este efeito nocivo da marcha, portanto, provocará a artrose, ao passo que os episódios de falseio provocarão a lesão meniscal em tomo de seis meses a dois anos pós-lesão. Portanto, a cirurgia de reconstrução do LCA, quando bem sucedida, elimina a instabilidade articular do joelho, reduzindo os riscos de artrose e lesão meniscal justificando a maior indicação cirúrgica nestas lesões 10• Evolução do Tratamento Cirúrgico nas Lesões doLCA Inicialmente era realizada a sutura do ligamento, havendo grande perda de elasticidade e dificuldade em reinserir-se os feixes do LCA coto a coto devido às diferenças no seu comprimento. Há mais ou menos dez anos eram utilizados para a reconstrução do LCA ligamentos sintéticos, devido à sua maior resistência em relação ao LCA. Contudo foi observado que, com a solicitação contínua do ligamento sintético durante os movimentos, havia um processo de degeneração após dois anos de cirurgia. Fragmentos destes ligamentos artificiais soltavam-se dentro da articulação irritando a membrana sinovial. Atualmente seu uso tem indicações restritas e precisas, não existindo até agora, substituto artificial para o LCA7 . Atualmente há várias técnicas para reconstrução do LCA lesado. A plastia extra-articular (Lemaire) utilizando o tensor da fáscia lata (TFL), onde a fáscia é passada por baixo do LCL (Ligamento Colateral Lateral) inserindo-se na tuberosidade tibial, recriando origem e inserção do LCA e impedindo o JERK. anterior 13 . Dentre as plastias intra-articulares podemos citar a técnica onde utiliza-se o tendão do músculo semitendinoso que reproduz a anatomia dos fascículos do LCA, realizando-se sua tenodese 9 •13 . Outra técnica intra-articular é a do tipo Kennett Jones, onde ocorre a utilização do 1/3 médio do tendão patelar, provocando a desinserção somente da região patelar, levando o novo ligamento através da falha da porção central do tendão, sendo inserido no côndilo lateral do fêmur descrita em 1963 9 , que em 1984 foi modificada por Dejour, onde este retira todo o 1/3 médio do tendão patelar com uma porção óssea da tuberosidade tibial e outra da patela, que serão introduzidos através de túneis na tíbia e no fêmur tentando reproduzir a localização anatômica do LCA 10, sendo mais indicada atualmente. Pode ser realizada por via artroscópica, diminuindo a agressão cirúrgica e acelerando a recuperação. Domit et a!. 13 , realizaram um estudo comparativo entre três técnicas para reconstrução do LCA: I. Dejour + Lemaire (com T.F.L.) 2. Dejour + Tenodese do semitendinoso 3. Dejour 54 Dionísio & Pini O trabalho concluiu que os resultados foram equilibrados entre as três técnicas. As plastias extra-articulares, portanto, só se justificam para prevenir um acidente com rotura do enxerto intra-articular, situação na qual o paciente encontraria-se com uma plastia a mais para impedir o pivot-shift. O reforço intra-articular com o semitendinoso pode ser útil apenas para aumentar a base de inserção do neoligamento, reproduzindo-se a morfologia dos feixes do LCA; ou seja, a utilização de um monofascículo do tendão patelar (técnica de Dejour), pode, isoladamente, reproduzir os resultados das outras duas técnicas. Contudo, é necessário ressaltar que esta técnica, apesar de mais aceita e eficiente5,13 , apresenta muitas complicações e desvantagens 14 , IS, 16 como veremos adiante. Considerações sobre Retalho do Tendão Patelar Utilizado na Técnica de Dejour Após sua implantação o retalho sofre uma sene de mudanças celulares resultando em um novo tecido ligamentar, não chegando contudo a adquirir a conformação microgeométrica do LCA normal. Uma vez que o retalho esteja cirurgicamente colocado, inicia-se o processo de cicatrização, que é caracterizado pela necrose avascular e por revascularização partindo da membrana sinovial. A revascularização dá suporte à proliferação de fibras colágenas que eventualmente tomam a aparência de um ligamento "normal" por volta de 12 a 18 meses de pós-operatório5. Resultados da Técnica de Dejour na Estabilidade Sagital A estabilidade sagital do joelho após a reconstrução com tendão patelar é considerada boa quando ao término de dois anos de pós-operatório, o deslocamento anterior da tíbia não ultrapassa 2,3 mm em relação do joelho não lesado. Quando esta diferença é igual ou maior que 3 mm o procedimento cirúrgico é considerado um fracasso 14 . Complicações da técnica de Dejour Coehn et al. 15 dividiram as principais complicações da técnica de Dejour da seguinte forma: I) Complicações intra-operatórias Fratura de pateta quando retira-se os blocos ósseos com martelo e formão. Fratura do platô tibial durante fresagem do túnel tibial com broca de 9 mm. Enxerto de tamanho inadequado devido à incompatibilidade entre blocos e túneis ósseos. Sulcoplastia insuficiente propiciando atrito entre enxerto e parede do sulco intercondiliano (este atrito é responsável por um estalido audível e que se resolve espontaneamente após 9 meses de pós-operatório). 2) Complicações pós-operatórias imediatas: Trombose venosa profunda Rev. Bras. Fisiot. Parestesia, que se resolve após 48 h de pós-operatório, devido ao uso prolongado do garrote(+ de 2 h). 3) Complicações tardias: Tendinite da pata de ganso Tendinite do tendão patelar Crepitação patelar Afrouxamento do enxerto após mínimo de l ano de pós-operatório. AIM (Amplitude Incompleta de Movimento) para extensão causada por: • bloqueio meniscal • aderência do tendão patelar • retração de isquiotibiais • insuficiência dos vastos • posicionamento inadequado do enxerto • reabilitação retardada ou inadequada. • Ruptura tardia do tendão remanescente • Artrose Força muscular após técnica de Dejour É importante avaliar o prejuízo para o joelho da obtenção do retalho patelar que causa uma lesão no mecanismo extensor. O modo de calcular este prejuízo é medindo o grau de força do quadríceps antes e após a cirurgia 16 . Existem poucos trabalhos que abordam o assunto. O teste precoce de força do quadríceps nos seis primeiros meses de pós-operatório não era realizado devido à força anterior exercida na tíbia durante a contração 1' 7 ,! 6. Após pesquisas, no entanto, provou-se que na contração isolada do quadríceps com angulação de 70° ou mais de flexão do joelho, ocorre uma força de gaveta posterior 16 . Isto deu aos pesquisadores segurança para medir a força do quadríceps no pós-operatório imediato e, através disso, conduzir um estudo de força do quadríceps nas várias fases após reconstrução por um período de três meses a sete anos. O estudo resultou nos seguintes achados: Após três meses de pós-operatório os pacientes apresentaram força do quadríceps menor que 50% em relação ao membro não lesado em homens e 33% nas mulheres. Em homens a força retomou a 78% ao término do primeiro ano e 85% ao final do seguimento (sete anos). Nas mulheres, ao final de cinco anos a força do quadríceps era de 70% em relação ao pré-operatório. Os outros músculos do membro inferior operado recuperaram totalmente a força anterior à cirurgia, tanto nos homens como nas mulheres. Conclui-se, portanto, que a técnica apresenta a desvantagem de provocar déficit de força no quadríceps. Supõe-se que este prejuízo seja em decorrência da retirada do retalho 16 . Reabilitação Devido à alta incidência de limitação da amplitude articular do joelho após reconstrução do LCA, alguns cirurgiões do Deaconess Hospital (Ohio, EUA) 17 começaram a movimentar Voi. I. No. 2, 1996 55 Reabilitação na Reconstrução do LCA precocemente os joelhos que, anteriormente eram completamente imobilizados a 20° de flexão até por volta do 21 o pós-operatório. O uso desta movimentação mostrou-se altamente eficiente e efetiva na restauração dos movimentos do joelho. Estes mesmos cirurgiões observaram que joelhos colocados em órtese após reconstrução tinham retorno mais rápido da mobilidade completa em relação aos joelhos completamente imobilizados. Com base nos achados acima, foi instituído neste hospital o programa de mobilização precoce do joelho após reconstrução do LCA (Tabela I). O programa consistia no uso de "CPM" (Mobilização Passiva Contínua) no pós-operatório imediato com angulação de 30 a 90° durante 8-12 h diárias. Nas 30-52 primeiras semanas de pós-operatório o trabalho de força e propriocepção objetivava habilidade para efetuar difíceis tarefas como correr, saltar, etc. Os exercícios resistidos eram incluídos de modo a não estressar o retalho com angulação sempre maior que 30° de flexão do joelho. Pacientes eram seguidos por um ano, pois a imobilidade presente ao término deste período é considerada permanente. Em comparação a este protocolo, iniciou-se outro estudo18 onde se verificou que aqueles pacientes desistentes ou aqueles que não seguiam corretamente o protocolo, ao mesmo tempo obtinham extensão completa mais cedo e retomavam as funções normais (sem desenvolver instabilidade); ao passo que o número de complicações foi maior nos que usaram o protocolo em vigência. Esses pacientes "desobedientes" foram, então, seguidos cuidadosamente através da escala de Noyes modificada, verificando informações subjetivas e, através de dinamômetro isocinético da marca Cybex, teste de Lackman, pivot-shift e mensuração da amplitude de movimento, as informações objetivas, não sendo verificada qualquer seqüela. Daí em diante foi-se avançando gradualmente o início da reabilitação, mantendo-se as informações objetivas e subjetivas para fins de comparação com as informações já obtidas. Baseados nos resultados satisfatórios a longo prazo, a equipe acima, deixou de usar as órteses, acrescentando-se o uso de carga segundo tolerância individual, pennitindo-se retorno às atividades assim que o paciente se sentisse pronto, ou seja, com estabilidade e confiança em realizar suas atividades. Durante os três anos seguintes a análise das observações objetivas e subjetivas confirmou a impressão clínica inicial de que amplitude de movimento era obtida mais rapidamente e completamente. Atrofias musculares eram prevenidas ou precocemente revertidas. Desta forma, foi modificado o programa de reabilitação para pacientes com reconstrução LCA denominado: Protocolo de Reabilitação Acelerada (Tabela 2). Este protocolo 18 encoraja o paciente a caminhar com extensão total e apoio do membro inferior operado já na primeira semana de pós-operatório. Na segunda semana os pacientes com flexão maior ou igual a 100° participam de uma série de exercícios do programa de fortalecimento muscular. Na quarta semana permite-se todo tipo de atividades de vida diária. Na oitava semana se o escore do dinamômetro isocinético da marca Cybex: perfaz 70% do membro não lesado se permite o Tabela 1. Protocolo de reabilitação pelo Deaconess Hospital. Tempo após Reconstrução Programa de Reabilitação 1o dia Crioterapia. CPM (30 a 90°) Mobilização da patela Exercícios para tornozelo Uso de órtese com flexo de 20° Marcha com 2 muletas sem descarga do peso Acrescenta exercícios isométricos para isquiotibiais Exercícios ativos para quadril Exercícios autopassivos de extensão e ativos de flexão do joelho. Co-contração de quadríceps e isquiotibiais 1a2 meses Acrescenta exercícios isométricos para quadríceps Exercícios ativo-resistidos para o quadril Bicicleta estacionária com carga gradual e progressiva 2 a 3 meses Acrescenta exercícios isométricos para quadríceps e isquiotibiais Ativo-resistido para os isquiotibiais Exercícios excêntricos para quadríceps (45°-90°) Exercícios proprioceptivos leves 3 a4 meses Reforço muscular global com ênfase para os isquiotibiais 3: 1 em relação ao quadríceps Exercícios proprioceptivos moderados Corrida no plano sem mudança de direção 4 a 8 meses Reforço muscular intensificado Alongamentos Exercícios proprioceptivos avançados (obstáculos Corrida com mudança de direção 8 a 12 meses Fase de condicionamento retorno aos esportes leves, desde que o paciente tenha recuperado a necessária agilidade e funcionalidade do membro. Uma série de biópsias do retalho obtidas a vários estágios diferentes não revelou nenhuma reação histológica adversa. Em 1992 foi publicado um trabalho sobre a experiência na Reabilitação do LCA no hospital de Belo Horizonte. O trabalho propõe um protocolo (Tabela 3) similar ao protocolo americano, porém, mais cauteloso em relação ao apoio sobre o membro operado nas primeiras quatro semanas 19 . Dionísio & Pini 56 Tabela 2. Protocolo de reabilitação acelerada. Tempo após Reconstrução Programa de Reabilitação 1o dia de P.O. Mobilização passiva 0-90° Órtese em extensão completa Apoio na marcha tanto quanto tolerado (sem muletas) 2 a 4 dias Pré-requisitos para alta hospitalar: mínimo de dor, extensão total, apoio total do peso sem muletas 7 a 10 dias Acrescenta alongamento de isquiotibiais com faixa, flexão ativa-assistida, retirada gradual da órtese para caminhar, subir, descer escadas 2 a 3 semanas Mobilização passiva de 0-110° Fortalecimento da panturrilha Atividades com carga 5 a 6 semanas Mobilização passiva de 0-130° Avaliação isocinética Início corridas leves, pular corda, exercícios de agilidade Uso de órtese somente durante esportes 10 semanas Mobilização passiva total Exercícios de agilidade Atividades esportivas específicas 16 semanas Dinamômetro isocinético da marca Cybex 4-6 meses Retomo a todos os esportes se o paciente estiver bem e se completou programa de corridas Controvérsias sobre o protocolo de reabilitação acelerada "Embora os resultados do programa acelerado sejam expressivos, não é completamente consistente com as bases científicas da cicatrização do retalho e com a biomecânica" 5 . Isto se justifica com base em: Estudos em macacos, realizados por Clancy et al. (apud Parker\ que demonstraram uma fraqueza do enxerto de LCA por volta da oitava semana de pós-operatório. O programa acelerado propõe o início das corridas, deslocamentos laterais e pular corda em um tempo em que as pesquisas científicas básicas indicam que o retalho está no ponto mais fraco durante a cicatrização. Mesmo assim, a estabilidade da articulação do joelho parece não ser afetada, havendo uma incongruência entre ciência básica da cicatrização do retalho e os achados clínicos do programa de reabilitação acelerada. Noyes et al. (apud Parker5) levantaram a hipótese de que atividades diárias submetem o LCA a forças não maiores que 454 N (100 lbs). Como a força máxima suportável pelo retalho do LCA é de 2.734 N (615 lbs), há uma margem de segurança Rev. Bras. Fisiot. de 80% em que o LCA suporta forças mais extenuantes. Tal fato pode explicar a capacidade do retalho em tolerar atividades aceleradas como pular corda, exercícios de agilidade, correr e retomar a qualquer atividade esportiva após quatro a seis meses de pós-operatório. Essas observações, no entanto, foram efetuadas em joelhos de cadáveres e se necessita muita cautela para aplicar estas observações na clínica. Acnoczky et a/. 20 , observaram que o retalho de tendão patelar em cães, após 20 semanas de pós operatório, possuía um diâmetro três vezes maior que o original. Atribui-se este aumento à deposição intensa de colágeno. Interessante notar que esses cachorros não eram imobilizados e iniciavam-se exercícios graduais com peso já na segunda semana de pós operatório. Foram medidos altos níveis de colágeno no Ligamento Colateral Mediai de cães treinados com exercícios. O aumento do metabolismo durante os exercícios pode, portanto, aumentar a síntese total do colágeno e, como de um modo geral os tendões e ligamentos são formados por 75-80% desta substância, ocorre conseqüentemente um aumento da força e cicatrização do retalho. São necessárias, no entanto, maiores pesquisas para se entender claramente a relação existente entre exercícios e cicatrização do retalho cirúrgico. Achados preliminares indicam que um retalho fixado corretamente pode ser fortalecido em pacientes que apoiem o peso sobre o membro e executam exercícios para quadríceps em cadeia cinética fechada 5 . A ausência de efeitos adversos na cicatrização do enxerto com a aplicação do programa acelerado pode ser, portanto, entendida em termos de isometria do retalho e dos efeitos benéficos de exercícios controlados no metabolismo do colágeno e no fortalecimento do retalho, como mostra o Esquema 1. Shelboume et al. 18 supõem, ainda, que a introdução precoce de atividades de vida diária normal pode causar um retomo mais rápido da celularidade funcional do retalho, ou seja, o Menor força de Retalho Maior força de Retalho Esquema 1. Situação metabólica em um tempo definido após a cirurgia. Fonte: Parker5 57 Reabilitação na Reconstrução do LCA V oi. I. No. 2, 1996 Tabela 3. Protocolo em vigor no Hospital Belo Horizonte. Tempo após Reconstrução Programa de Reabilitação Tempo após Reconstrução Exercícios ativos de extensão e flexão do joelho Crioterapia CPM 0-90° Exercícios proprioceptivos !Sem carga Estimulação elétrica em cocontração do quadríceps e isquiotibiais Marcha com apoio total Mobilização passiva de patela ADM de 0-110° Exercícios para o tornozelo 1 a 2 meses Uso de órtese em extensão Acrescenta exercícios isométricos para quadríceps e isquiotibiais Exercícios proprioceptivos leves Alongamentos 2 a 3 meses Exercícios ativo resistidos para o quadril Reforço muscular global com ênfase para os isquiotibiais Exercícios proprioceptivos moderados Exercícios auto-passivos de extensão e ativos de flexão do joelho Co-contração de quadríceps e isquiotibiais Acrescenta: exercícios ativoresistidos para isquiotibiais Exercícios excêntricos para quadríceps (30-90°) Marcha com duas muletas e apoio (20, 30 peso corporal) Corrida no plano sem mudança de direção 3 a4 meses Reforço muscular intensificado Bicicleta estacionária Exercícios proprioceptivos avançados Marcha com órtese e apoio parcial Corrida com mudança de direção ADM em tomo de 0-90° 2 a 4 semanas Programa de Reabilitação Acrescenta: Exercícios ativoresistidos para o quadril e isquiotibiais fibroblasto atinge o seu tamanho máximo procedendo sua maturação de forma acelerada, tornando o retalho viável precocemente. Tais explicações, entretanto, não passam de especulações e pesquisas ainda são necessárias para que se examine o comportamento do retalho durante a força de gaveta anterior que simula as condições extenuantes sofridas pelo ligamento durante atividades esportivas. Estas interrogações justificam a maior cautela em relação ao protocolo que as equipes de Shelbourne e de Hauteville, na 8 França, têm tem no seu programa de reabilitação do LCA . A protetor órtese é utilizada no pós-operatório imediato e um flexo de 5° no joelho é mantido até o 45° dia de pós-operatório. O apoio é iniciado com 50% peso corporal até o 10° dia, como mostra o protocolo na Tabela 4. A agressividade do protocolo acelerado poderá trazer prejuízos futuros, tais como: instabilidade do joelho devido à rotura ou frouxidão do enxerto com conseqüentes processos articulares degenerativos 7 . Propriocepção Propriocepção é como chamamos a capacidade de receber informações sobre o estado fisico do corpo, desde o compri- 4-6 meses Fase de condicionamento e treinamento específicos ao tipo e nível esportivo mento dos músculos, posição e angulação das articulações até pressão profunda dos pés. Estas informações são captadas através de vários receptores denominados proprioceptores, localizados profundamente em músculos tendões, ligamentos, fáscias e cápsulas articulares, originando impulsos proprioceptivos conscientes ou inconscientes. Estes últimos não despertam sensações, são usados para regulação muscular, através de reflexo miotático, enquanto que os impulsos chamados conscientes atingem o córtex cerebral permitindo a consciência da 22 sensação da posição do corpo e da atividade muscula~l, . Receptores tipo Golgi, Ruffini e Pacinni foram identificados nas inserções do LCA e mais especificamente na super12 ficie desse ligamento, ocupando 1% de sua área . A demonstração dessas terminações nervosas no ligamento sugerem que o LCA tem uma neurofisiologia e uma mecânica próprias e na deficiência deste ligamento há um decréscimo da propriocepção articular do joelho. Este decréscimo proprioceptivo agrava ainda mais a instabilidade, pois diminui a sensação de posição do joelho e conseqüentemen te o estímulo para a contração muscular protetora. Exemplo: quando a tíbia subluxa anteriormente, os músculos isquiotibiais se contraem (simulam biomecanicamen te a função do LCA). Na deficiência do LCA, com conseqüente prejuízo proprioceptivo, há 58 Dionísio & Pini Tabela 4. Protocolo em vigor no hospital de Hauteville, França ( 1995). Tempo após Reconstrução Programa de Reabilitação P.O. imediato Órtese com flexo 5° 8 primeiros dias CPM de 5° a 90° Crioterapia periódica Mobilização de patela Flexão ativa do joelho Extensão passiva do joelho 8° ao 21° dia Marcha com apoio de 50% do peso corporal e auxílio de muletas 21° dia ADM 5 a90 Trabalho muscular sem resistência Co-contração: skate em plano inclinado Fortalecimento de isquiotibiais (60-80°) 21 o ao 45° dia Conserva flexo protetor de 5° Apoio total Extensão total Alongamentos ADM 140° Exercícios proprioceptivos moderados Exercícios de fortalecimento e propriocepção intensificados Natação Corrida sem mudança de direção após 120 dia Saltos laterais Retoma a atividade esportiva progressivamente Após 6 meses Inicia fortalecimento de quadríceps em cadeia cinética aberta (Dinamômetro isocinético - Cybex) Após 8 meses Pode iniciar preparo para competições no esporte redução desta facilitação muscular protetora e aumento da instabilidade como resultado 12 . O controle muscular dinâmico diminui o tempo de resposta da reação muscular e, conseqüentemente, o estresse sobre estruturas ósseas, musculares, ligamentares e meniscais do joelho. Existe, portanto, forte indicação para reeducação proprioceptiva na reabilitação do joelho deficiente da ação do LCA com ou sem reconstrução ligamentar, com o objetivo de devolver a proteção articular através de treinamento reflexivo 12• 23 . Rev. Bras. Fisiot. Programa de Reeducação Proprioceptiva Cinco critérios de dificuldade são almejados ao curso desta reeducação 8 . Dentro de cada critério é gerado uma progressão crescente de dificuldade. Critério 1: Passagem da posição bipodal para a monopodal. É uma fase importante que necessita de um apoio total e condiciona a ausência de gavetas durante a marcha. Critério 11: Passagem do equilíbrio sobre solo estável para solo instável. Existem diferentes tipos de solos instáveis que podemos recriar facilmente a fim de complicar os exercícios de equilíbrio a dificuldade reside na mobilidade oferecida pelos solos: - mobilidades unidirecionais - mobilidades bidirecionais - mobilidades multidirecionais Critério 111: Os desequilíbrios provocados. A estimulação proprioceptiva por desequilíbrios provocados deve se ajustar sistematicamente aos auto-desequilíbrios do paciente. Nesta etapa deve-se suceder estímulos desestabilizantes imprevisíveis provocados por outro paciente, no mesmo estágio da reeducação, pelo fisioterapeuta, etc. Critério IV: Pé fixo e pé móvel A progressão do pé fixo para o pé móvel indo do deslocamento por pequenos saltos, associada geralmente quase ao final da reeducação. O pé no solo permite o trabalho de estabilização estática dos rotadores externos e internos do joelho. Critério V: A redução da informação periférica. Este último critério de dificuldade proposto consiste em atrapalhar as informações oferecidas pela visão ou ainda perturbar a concentração do paciente. Durante toda a reeducação proprioceptiva é necessário saber renovar os exercícios, evitando que com a automatização dos mesmos, o paciente fique desatento e perca o interesse no tratamento. É importante organizar o tratamento proprioceptivo de forma crescente, do mais fácil para o mais dificil, do mais simples para o mais complexo, sem jamais pular fases, correndo riscos desnecessários. A precipitação sem uma avaliação correta das condições musculares e do enxerto, podem levar a instabilidades agravando a lesão e regredindo todo o tratamento. Abaixo segue uma ordem crescente de dificuldade para exercícios proprioceptivos 12 : 1. Exercícios no plano com apoio bipodal 2. Exercícios no plano com apoio unipodal 3. Exercícios no plano inclinado com apoio bipodal 4. Exercícios no plano inclinado com apoio unipodal 5. Exercícios na tábua de equilíbrio com apoio bipodal 6. Exercícios na tábua de equilíbrio com apoio unipodal 7. Exercícios na prancha oscilante 8. Exercícios no balancinho com apoio bipodal 9. Exercícios no balancinho com apoio unipodal 10. Corrida no plano sem mudança de direção • Vol. I. No. 2, 1996 Reabilitação na Reconstrução do LCA 11. Exercício na cama elástica com apoio bipodal 12. Exercício na cama elástica com apoio unipodal 13. Exercício no skate 14. Exercício com alternância de planos, saltos e obstáculos 15. Corrida em circuitos. Os exercícios usados na reeducação proprioceptiva são predominantemente feitos em cadeia cinética fechada, pois a translação anterior da tíbia é reduzida pela metade, sendo a melhor forma de exercícios para o joelho após reconstrução do LCA. Discussão As incongruências entre a ciência básica do processo de cicatrização e os achados clínicos após uma reabilitação acelerada mostram claramente que o assunto não está esgotado e muito ainda há que se pesquisar5 . Persiste a controvérsia sobre um protocolo mais agressivo como preconizam os americanos do Deaconess Hospital e pela equipe de Shelboume ou um mais cauteloso como recomendam os franceses do Hospital Hauteville. Sabe-se que, na prática, o protocolo acelerado não é nocivo a isometria do retalho e não aumenta a instabilidade da articulação do joelho 5• 18 . A explicação reside provavelmente na fixação do retalho em uma posição isométrica similar à localização do LCA original, o que resulta em uma aproximação do comprimento e tensão constantes do retalho em qualquer movimentação do joelho 5 . Além disso, supomos que o reforço da fixação do retalho com parafuso, aumenta ainda mais a segurança na aplicabilidade de um protocolo mais precoce. Isometria absoluta, porém, é difícil de ser obtida cirurgicamente e um protocolo que propõe apoio total e saltos tão precocemente como é o caso do protocolo acelerado poderá trazer frouxidão do retalho que mesmo pequena ocasionará prejuízos futuros 7 . Conclusão É importante uma análise específica de cada caso e, quando a opção for por um protocolo mais agressivo, se faz necessária a confiança no sucesso da técnica cirúrgica, além do conhecimento dos possíveis riscos de tal opção. O trabalho em conjunto entre a equipe cirúrgica e fisioterapeutas, é, mais uma vez, de suma importância para a qualidade da reabilitação. Há consenso geral, como observamos neste trabalho, a respeito da necessidade dos exercícios serem aplicados em cadeia cinética fechada, até os primeiros seis meses de P.O., pelo menos. Deste modo, às forças de gaveta anterior sobre o retalho cirúrgico são minimizadas. Não há dúvida também, entre os pesquisadores, da importância da mobilização precoce nos casos de reconstrução do LCA. A cinesioterapia destaca-se cada vez mais, sobrepondo-se à imobilização que, se antes reinava absoluta, atualmente vai ocupando espaço cada vez mais restrito. 59 Diante desses fatos, é fundamental que o tratamento a ser administrado seja baseado nos conhecimentos científicos aliados ao bom senso e ao entendimento de que não há um protocolo absoluto, até porque cada indivíduo é um ser único, dotado de particularidades físicas e psicológicas que, sem dúvida, influenciam no resultado e evolução de qualquer terapia. Referências Bibliográficas I. KAPANDJI, I.A. O Joelho. In: _ _ . Fisiologia articular. 5" ed. São Paulo: Manole, 1990. v. 2. p. 74-157. 2. GRA Y, H.; GOSS, C. Junturas e Ligamentos. In: _ _ Anatomia. 29 3 ed. Rio de Janeiro: GuanabaraKoogan, 1985. p. 238-305. 3. O'RAHILLY, R. Coxa e Joelho. In: _ _ Anatomia humana básica. 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