UFPR 2012 — 2ª Fase Filosofia A citação abaixo é referência para as questões 01 e 02: "Se há, então, para as ações que praticamos, alguma finalidade que desejamos por si mesma, sendo tudo mais desejado por causa dela, e se não escolhemos tudo por causa de algo mais (se fosse assim, o processo prosseguiria até o infinito, de tal forma que nosso desejo seria vazio e vão), evidentemente tal finalidade deve ser o bem e o melhor dos bens. Não terá então uma grande influência sobre a vida o conhecimento deste bem? Não deveremos, como arqueiros que visam a um alvo, ter maiores probabilidades de atingir assim o que nos é mais conveniente? Sendo assim, cumprenos tentar determinar, mesmo sumariamente, o que é este bem, e de que ciências ou atividades ele é o objeto. Aparentemente ele é o objeto da ciência mais imperativa e predominante sobre tudo. Parece que ela é a ciência política". (Aristóteles, Ética a Nicômaco,1094a18-28). 01- Com base em que razões Aristóteles afirma que aparentemente o melhor dos bens é o objeto da ciência mais imperativa e predominante sobre tudo? Comentário O conhecimento acerca do sumo bem se reveste de um caráter eminentemente prático, pois seu conhecimento tem “uma grande influência sobre a vida”. Assim, a primeira das razões é sobre a utilidade desse conhecimento, o que o vincula a um aspecto utilitário, que envolve a decisão e a vontade dos indivíduos na condução de suas ações. A política, como ciência imperativa, deve evitar a indecisão dos homens e suas ações, e ainda mais, deve orientá-las tendo em vista o bem comum, ou seja, a vida coletiva dos homens que habitam uma mesma comunidade e são unidos por laços, sociais e políticos. Outra razão é a de que o melhor dos bens indica o móvel último de toda ação humana, ou seja, a realização e satisfação de todo desejo e vontade, sendo assim o objeto da ciência mais imperativa, 02 - Que razões Aristóteles alega para justificar a afirmação de que a ciência mais imperativa e predominante sobre tudo parece ser a ciência política? Comentário A política é a ciência mais imperativa e predominante porque é a ciência capaz de estabelecer finalidades para as ações de cada indivíduo que compõe a coletividade. Ou seja, é a ciência capaz de estabelecer o sumo bem para a ação de cada cidadão, de forma a realizar o sumo bem para o corpo da coletividade. 03 - Qual é a razão filosófica que faz com que Descartes, na Quarta Parte do Discurso do Método, tenha que demonstrar a existência de Deus? Comentário O chamado argumento ontológico apresenta papel fundamental na obra cartesiana, pois a partir da representação da idéia de perfeição, atributo relativo à divindade, deduz-se a existência dessa perfeição, pois o que é perfeito deve necessariamente existir, ou, em outras palavras, a existência é um predicado implicado diretamente pela idéia de perfeição. Dessa forma, a representação da idéia de perfeição indica um ser que existe necessariamente fora da consciência humana, o que garante a validade das representações do espírito humano, na medida em que se referem a realidades efetivas fora desse espírito. 04 - No parágrafo inicial do Discurso do Método, Descartes escreve: "O poder de bem julgar e distinguir o verdadeiro do falso, que é propriamente o que se denomina o bom senso ou a razão, é naturalmente igual em todos os homens [...] destarte, a diversidade de nossas opiniões não provém do fato de serem uns mais racionais do que outros, mas somente de conduzirmos nossos pensamentos por vias diversas e não considerarmos as mesmas coisas". Você concorda com essa afirmação? Justifique sua resposta. Página 1 Comentário (Sugestão de resposta) A tese de que a razão é igual para todos os homens baseia-se na idéia de um inatismo, de modo que a razão, como elemento inato e natural ao homem, é igualmente distribuída entre todos os representantes dessa espécie. No entanto, nos parece que a racionalidade humana apresenta enorme diversidade em função dos diferentes contextos históricos e civilizacionais que a humanidade apresenta, sendo possível que indivíduos submetidos a programas escolares mais rígidos, pro exemplo, possam mostrar maior desempenho intelectual. Curso Dom Bosco — Cobertura Vestibular 2011 — www.dombosco.com.br/curso UFPR 2012 — 2ª Fase 05 - Na Quarta Parte do Discurso do Método, Descartes afirma: "Pois, enfim, quer estejamos em vigília, quer dormindo, nunca nos devemos deixar persuadir se não pela evidência de nossa razão. E deve-se observar que digo de nossa razão e de modo algum de nossa imaginação, ou de nossos sentidos". Por que, para Descartes, não devemos nos deixar guiar nem pela imaginação nem pelos sentidos? Comentário Pois a imaginação e os sentidos representam modalidades da consciência cujas representações são passíveis de dúvida, de modo que apenas as representações puramente racionais apresentam-se como evidentes, e assim, indubitáveis. 06 - Considere a afirmação de Rousseau abaixo: "Por serem os laços da servidão formados unicamente pela dependência mútua dos homens e pelas necessidades recíprocas que os unem, é impossível subjugar um homem sem antes tê-lo colocado na situação de não poder viver sem o outro, situação essa que, por não existir no estado de natureza, nele deixa cada um livre do jugo e torna inútil a lei do mais forte". (Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens, primeira parte) Levando em conta o trecho acima, explique: Por que, segundo Rousseau, seria difícil explicar ao homem selvagem o que é a servidão e a dominação? Comentário À medida que a servidão e a dominação dependem do estabelecimento de laços de dependência mútua, e à medida que o homem no estado de natureza é totalmente independente, autônomo e isolado, não é possível explicar a esse homem o que seriam a dominação e escravidão, pois tais relações seriam impossíveis para o homem natural. Além disso, uma explicação implica numa exposição racional de argumentos, o que o homem natural não apreenderia, visto que a racionalidade não consta dentre seus atributos naturais. 07 - Segundo Rousseau, que efeitos se seguiram à instituição da propriedade privada? A afirmação de Nietzsche citada abaixo é referência para as questões 08 a 10. "Esse impulso à formação de metáforas, esse impulso fundamental do homem (...), quando se constrói para ele, a partir de suas criaturas liquefeitas, os conceitos, um novo mundo regular e rígido como uma praça forte, nem por isso, na verdade, ele é subjugado e mal é refreado. Ele procura um novo território para sua atuação e um outro leito de rio, e o encontra no mito e, em geral, na arte". (Nietzsche, Sobre Verdade e Mentira no Sentido Extra-Moral) Comentário O desenvolvimento progressivo da desigualdade social e da diferença entre as classes dos ricos e pobres. Além disso, o caráter natural do homem se corrompe definitivamente, a ponto do homem original não poder mais ser resgatado. 08 - Nietzsche afirma que o conhecimento humano é resultado desse "impulso à formação de metáforas". Em consequência dessa afirmação, como Nietzsche avalia a "verdade do conhecimento", a relação do conhecimento com a "realidade" ou a "essência das coisas"? Comentário Como o conhecimento humano é resultado do impulso humano para a formação de metáforas (e logo a seguir relacionado com o impulso humano para se auto-enganar), o conhecimento humano surge em Nietzsche como relativo apenas ao homem, com limitada capacidade de estabelecer qualquer evidência mais consistente com a efetividade (a realidade em si, tomada de forma objetiva). Assim, o conhecimento humano seria apenas uma metáfora, uma imagem de uma verdade possível, a qual poderia ser traduzida tanto pelo domínio dos conceitos quanto pelas narrativas míticas. 09 - De acordo com Nietzsche, a "praça forte" dos conceitos é construída pelo "homem racional" por meio da igualação de impressões distintas e individualizadas, que se transformam assim em "formas" universais. Qual seria a finalidade dessa construção? Comentário Permitir o estabelecimento de regras possíveis para a vida em sociedade, bem como poder contar com os efeitos benéficos da verdade e sua aparente utilidade. Os conceitos, ao estabelecer uma padronização das experiências individuais, tornariam possível sua compreensão objetiva e o estabelecimento de uma verdade socialmente dada e admitida. 10 - Em contraste com o "homem racional", como Nietzsche caracteriza o "homem intuitivo" ou "artístico"? Página 2 Comentário O homem intuitivo ou artístico não apenas adquire uma condição na qual a ilusão, e a máscara do conhecimento conceitual é atenuada, como também é capaz de apreender a própria existência como processo; ou seja, uma realidade em que o devir se concretiza na própria experiência, e onde os compartimentos conceituais antes impedem o fluxo da experiência do que contribuem para sua compreensão. Curso Dom Bosco — Cobertura Vestibular 2011 — www.dombosco.com.br/curso