Equipe de Saúde: arranjos e dispositivos Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 1 O objeto e o objetivo de trabalho na saúde Sobre o que trabalhamos? Gente, doenças, riscos, etc. Para que trabalhamos? Produzir saúde. Muitas das disputas e controvérsias obedecem a desacordos sobre esses dois pontos. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 2 O Objeto de trabalho na saúde Será quase sempre um certo sujeito (pessoas, territórios, comunidades) É sempre construído. Assim, ao longo da historia da humanidade houve variadas formas de se entender os modelos assistenciais, muito relacionados com as diferentes teorias que houve sobre a causalidade do processo de saúde- doença. Cada uma dessas teorias construiu um dado objeto de trabalho. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 3 Modelo explicativo - resposta tecnoassistencial Saúde/ doença Biologista Tipo de reposta problemas de saúde atenção médica seriam individuais e de base biológica Ecológico Relação agente – hospedeiro ambiente intervenção ambiental, intersetorial, promoção à saúde Social causa social econômica, e não uma variável social biológico, ecológico, saúde como questão social: políticas públicas. Propostas setoriais: Serviços de saúde. 4 Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 Os modelos e o SUS De alguma maneira, essas questões e diferentes visões permeiam o desenvolvimento histórico do SUS e até as lutas que lhe deram existência. Nos anos 80, no bojo do processo de luta pela redemocratização do País, estabeleceram- se as bases para a reforma sanitária brasileira. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 5 As diretrizes do SUS Uma política de caráter universal, baseada nos princípios da eqüidade e da integralidade, propondo-se uma rede hierarquizada. descentralizada e com controle social. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 6 SUS: nasce um sistema Propostas de organização fruto de uma reflexão nativa com um embate e/ou assimilação de certas recomendações de entidades internacionais (OPAS, OMS). Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 7 As tradições: o componente histórico político Relatório Dawson (1920). Conferência de Alma-Ata (1978). Políticas de Welfare State. Paradoxo do desmonte de políticas públicas neo-liberal e implantação do SUS. Uma política universal de caráter eqüitativo em um país do capitalismo periférico. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 8 As equipes: uma necessidade Não existe profissão capaz de dar conta de complexidade do trabalho em saúde sozinha. Desenvolvimento do conhecimento. Especialização: domínios tecnológicos estreitos. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 9 As equipes (composição segundo modelo) Médico-hegemônico/ individual privatista: médicos, enfermeiros, dentistas. Promoção à saúde: técnicos ambientais, epidemiólogos, engenheiros, educadores, sanitaristas, etc. Vigilância à (da) saúde: médicos, enfermeiros, dentistas, epidemiólogos, educadores, sanitaristas, etc. Ação programática/ Defesa da Vida/ Paidéia: médicos generalistas e de especialidades básicas (clínicos, pediatras, GO), enfermeiros, dentistas, epidemiólogos, educadores, sanitaristas, psicólogos, etc. Programa de saúde da família: médicos generalistas, enfermeiros, agentes de saúde. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 10 Desgaste do trabalhador de saúde Difere daquele dos trabalhadores manuais. Na saúde a maior parte do desgaste é subjetiva, pela necessidade intensa e constante de colocar em funcionamento defesas psíquicas que são ativadas pelo contato permanente com a dor e o sofrimento. No contexto brasileiro muitas vezes pela inserção em territórios marcados pela pobreza extrema e a violência urbana. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 11 As equipes (do que sofrem) A eterna batalha humana contra a morte (Freud). O mal-estar na cultura: sublimação. A difícil tarefa de esquecer. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 12 As equipes (uma solução e um problema) Agrupamentos nos quais a diferença é vivida como mortal. O outro como depositário de tudo o que há de ruim, como aquilo que me impede de desabrochar, o agrupamento como palco Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 13 As equipes (as defesas) As defesas psíquicas: formas de funcionamento psíquico para aliviar o sofrimento. Alguns sintomas são facilmente reconhecíveis em inúmeras equipes. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 14 Identificação Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 15 Identificação Objeto de trabalho e trabalhador se parecem: não há distância. Vínculo continuado ao longo do tempo: diferença positiva da clínica da Atenção Básica, e fonte de problemas. Auto-estima baixa, carentes, pedintes. Mecanismos defensivos de diferenciação: equipes com casca, representações congeladas dos usuários. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 16 Feios, sujos e maus... Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 17 Desumanização: a equipe cascuda Fechar portas, mal-trato, filas. diferenciação tão extrema: cria outra classe de humano. Compensação da auto-estima baixa com um mecanismo exagerado de abuso de poder (os usuários nada podem, eu posso tudo e qualquer coisa). Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 18 Indiscriminação: a equipe sem contorno A crise, a equipe perde-se entre o tudo e a impotência, não consegue se responsabilizar nem saber até onde vão suas atribuições (saúde é tudo!) Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 19 Não sustentação do vínculo Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 20 Vínculo: a diretriz escapulida PSF/ Adscrição de usuários. Rotatividade do pessoal. Mudança de processo de trabalho para pronto atendimento (evita o contato intersubjetivo prolongado). Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 21 Os entraves à realização da tarefa primária: as pessoas parecem estar sempre no lugar ou na função errada Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 22 Militante missionário Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 23 A saída ideológica Valores como escudo (não existem perguntas, só verdades). Ninguém seria tão bom, justo e abnegado. O trabalho é a vida. Cristaliza aos usuários no lugar de tutelados, protegidos, impotentes, dependentes (eternos filhos). Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 24 O trabalho em saúde As defesas psíquicas se estabelecem sobre tudo segundo o funcionamento institucional de cada local de trabalho e da composição de cada equipe. Dependerão também do tipo de dispositivo de gestão utilizado: – Espaços de gestão coletivos, momentos de troca e discussão, etc. contribuem para se evitar a cristalização dessas defesas. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 25 Gestão- subjetividade: a gestão como processo intermediário Arranjos: formas de organização que têm uma certa estruturação e permanência e a potencialidade de produzir fluxos na direção contrária do controle: Apoio matricial Equipes de referência, adscrição de usuários Colegiados de gestão e unidades de produção Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 26 Gestão- subjetividade Dispositivos: transitórios. Visam subverter as linhas de poder instituídas. Oficinas de planejamento Cursos/treinamentos/formação Análise/supervisão institucional Assembléias Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 27 Funções: Suporte Manejo Vírgula Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 28 A equipe com membrana seletiva: Pode processar aquilo que recebe como demandas ou cobranças. Consegue um lugar e um tempo para refletir. Suporta o mal-estar na cultura sem o transformar em sofrimento. Consegue formular projetos (reflexão sobre o objeto e objetivo do trabalho) Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 29 Conseguese dar ao trabalho um certo tom lúdico... Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 30 Estimular novos desafios e persistir naquilo que parece impossível... Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 31 Suportar as diferenças ... Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 32 ... As equipes conseguem crescer. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 33 Bibliografia utilizada Campos, G. W. S., 1994. Sobre a reforma dos modelos de atenção: um modo mutante de fazer saúde. In: Inventando a mudança na saúde. Cecílio, L.C. O. (org). São Paulo: Ed. Hucitec. Gomes da Silva, A., 1998. Modelos tecno-assistenciais em saúde: o debate no campo da saúde coletiva. São Paulo: Ed. Hucitec. Kaës, R., 1991. Realidade psíquica e sofrimento nas instituições. In: KAËS, R.; BLEGER, J.; ENRIQUEZ, E.; FORNARI, F.; FUSTIER, P.; ROUSSILLON, R. & VIDAL, J.P. (orgs.) - A instituição e as instituições. Tradução de Joaquim Pereira Neto. São Paulo: Casa do Psicólogo. pp. 1-39. Mendes-Gonçalves, R. B., 1994. Tecnologia e organização social das práticas de saúde. São Paulo: Ed. Hucitec. Onocko Campos, R, 2003. A gestão: espaço de intervenção, análise e especificidades técnicas. pp 122- 149. In: Saúde Paidéia, Campos, Gastão. São Paulo: Editora Hucitec. Onocko Campos, R., 2005. O encontro trabalhador usuário na atenção à saúde: uma contribuição da narrativa psicanalítica ao tema do sujeito na saúde coletiva. In: Ciência e saúde coletiva 10(3): 573- 583. Testa, M., 1993. Pensar em salud. Buenos Aires: Lugar Editorial. Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 34 Modelos de Atenção e Equipe de Saúde Fim [email protected] Rosana Onocko Campos - DMPS/ FCM - Unicamp - 2007 35