ANÁLISE DE EMPREENDIMENTOS DE HABITAÇÃO SOCIAL EM PRESIDENTE PRUDENTE-SP – UMA VISÃO AMBIENTAL Sibila Corral de Arêa Leão Honda Arquiteta e Urbanista pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre e Doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Docente e Coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade do Oeste Paulista (UNOESTE). Endereço: Rua Winston Churchill, 234 - Jardim Paulistano – Presidente Prudente – SP – CEP 19013-710 – Brasil – Tel.: (18) 3229-2016 – e-mail: [email protected]. 1 ANÁLISE DE EMPREENDIMENTOS DE HABITAÇÃO SOCIAL EM PRESIDENTE PRUDENTE-SP – UMA VISÃO AMBIENTAL INTRODUÇÃO O processo de urbanização no Brasil, nas últimas décadas, ocasionou uma série de problemas relacionados ao acesso à moradia e à carência de infraestrutura e de transporte. Desde o fim do século XIX, podem ser notados sérios problemas de acesso à habitação digna no país, com reprodução da segregação socioespacial (BONDUKI, 2004). A partir da década de 1930, no país, o Estado começa a desenvolver políticas de modernização, buscando ganhar apoio popular com atendimento a diversos aspectos da vida urbana, inclusive na área habitacional. No entanto, em 1964, com o regime militar, nova política habitacional foi lançada, que, em teoria, buscava facilitar o acesso à casa própria, e o Banco Nacional da Habitação (BNH) foi criado como agente financiador; sendo as Companhias de Habitação (COHAB) as responsáveis pela construção das unidades habitacionais. A partir do processo de redemocratização do país, ocorreu crise do modelo de política habitacional, e, em 1986, o BNH foi extinto. A discussão sobre a reforma urbana e a questão da habitação foi retomada. Em 1988, a nova Constituição Federal foi sancionada, com capítulo sobre política urbana e igualando o Município aos outros entes federativos (União e Estados), com atribuições específicas, como o controle do espaço urbano, e comuns, como a oferta de moradia. Durante a década de 1990, a preocupação com políticas urbanas passou a ser central, com a busca pelo “[...] desenvolvimento sustentável dos assentamentos humanos e a aquisição de abrigo adequado para todos”, segundo o programa UN-Habitat (ANTONUCCI, 2009, p.4). Esse documento indicou princípios para o enfrentamento das questões ambientais urbanas, voltados a estratégias de sustentabilidade, como o controle do uso e ocupação do solo urbano e ordenamento do território, contribuindo para a melhoria das condições de vida da população. Ao mesmo tempo, a questão da preservação ambiental aparece como aspecto fundamental na produção do espaço. Baseado neste contexto, este trabalho busca compreender a produção da habitação social, tendo como foco Presidente Prudente-SP, cidade no oeste paulista, na Alta Sorocabana; cuja base de colonização foi apoiada na produção agropecuária e na implantação da estação ferroviária no início do século XX, inaugurada em janeiro de 1919. Sua estrutura urbana foi diretamente dependente da abertura de dois loteamentos: Vila Goulart e Vila Marcondes. Em 1921, o município foi criado legalmente, como centro político e administrativo regional; e a expansão da malha ocorreu de forma mais dinâmica na direção sudoeste, como prolongamento da Vila Goulart. Entre as décadas de 1920 e 1960, a cidade apresentou significativa expansão territorial, sem planejamento e sem regularização legal. A partir dos anos 1960, ocorrem processos de moralização e legalização do espaço urbano. Entre 1960 e 1970, percebe-se aumento da população, com ampliação do quadro industrial e desenvolvimento das atividades terciárias (HONDA, 2011). Em 1968 foi construído o primeiro empreendimento de habitação social na cidade, financiado pelo BNH, o Parque Continental, com 142 unidades (casas unifamiliares), na franja urbana. E, em 1978, foi iniciado o segundo empreendimento, o Conjunto Bartholomeu Bueno de Miranda, também com financiamento do BNH. A partir de então, vários outros conjuntos habitacionais foram implantados na cidade. Entre os anos de 1978 e 1982, dez conjuntos foram aprovados e implantados na cidade. No entanto, após 1982, somente em 1987 outros conjuntos foram aprovados, lançados pela COHAB CHRIS, os conjuntos Jardim Mediterrâneo e Jardim Itapura, entregues em 1989 e 1990, respectivamente, estudo de casos neste trabalho. Em 1989, foi criada a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), da Secretaria de Habitação do Estado de São Paulo, que financiou seis conjuntos habitacionais na cidade entre 1990 e 1997. Nos anos de 1992 e 1993, três empreendimentos foram executados por meio de financiamento do Programa de Ação Imediata para Habitação (PAIH), do Governo Federal. E, na gestão municipal de 1993-1996, seis loteamentos foram abertos e seus lotes passados por meio de Concessão de Uso para famílias de baixa renda. No período (1968-1997), 12.219 unidades de moradia popular foram entregues na cidade, referentes a aproximadamente 25% das unidades residenciais urbanas no final da década de 1990 (HONDA, 2011). A partir desse percurso histórico, verifica-se a importância da análise dos locais de implantação dos empreendimentos, verificando a possibilidade de mitigação dos impactos ambientais; visto que, devido ao grande número de córregos e nascentes, pode haver fragilização do próprio processo de urbanização, na ampliação de áreas novas assim como na implantação de empreendimentos e loteamentos em áreas existentes na estrutura urbana. Além do fato da região ter clima quente e seco, o que pode ocasionar maior impacto com a diminuição das áreas verdes, naturais e projetadas. 2 A análise da estrutura natural que apóia a estrutura urbana é de extrema importância na busca da sustentabilidade no espaço construído, com o zoneamento ecológico como a base do processo de controle do uso e ocupação do solo, que não é verificado em Presidente Prudente-SP. Dessa forma, pontualmente, analisando a implantação de empreendimentos de habitação de interesse social, é possível verificar se tem ocorrido algum tipo de cuidado ambiental na aprovação desses empreendimentos. Tendo como foco empreendimentos aprovados entre os anos de 1989 e 1990, no município de Presidente Prudente-SP, os conjuntos Jardim Mediterrâneo e Jardim Itapura. OBJETIVOS O objetivo do trabalho é analisar a produção da habitação de interesse social em cidades médias, por meio da relação entre a localização de projetos de conjuntos habitacionais, a legislação municipal de uso e ocupação do solo urbano, e as características ambientais dos locais de implantação desses empreendimentos, tendo como estudo de casos dois empreendimentos no município de Presidente Prudente, entre os anos de 1989 e 1990 (Mediterrâneo e Itapura), a fim de relacionar possíveis áreas de implantação inadequada desses conjuntos residenciais. MATERIAIS E MÉTODOS A metodologia utilizada nesta pesquisa está baseada em análises e sínteses recorrentes e sucessivas, por meio de etapas de investigação científica simples e objetiva. Inicialmente, a pesquisa aprofundou a linha teórica, pressupondo uma avaliação lógica da problemática. A partir de então, a investigação passou para a fase prática, procurando efetuar a análise de casos estabelecidos, por meio de pesquisa documental e legal, levantamentos sobre as características ambientais locais, e mapeamentos. DISCUSSÃO No período posterior ao governo militar no Brasil, poucos empreendimentos de habitação social foram financiados, tendo ocorrido a extinção do BNH. Em Presidente Prudente-SP, após a finalização de conjuntos habitacionais em 1982, apenas a partir de 1987 outros foram lançados. A COHAB CHRIS possibilitou a execução de dois empreendimentos na cidade, um iniciado em 1987 e entregue em 1989, o Conjunto Habitacional Mediterrâneo, e outro lançado em 1988 e entregue em 1990, o Conjunto Habitacional Itapura. O Jardim Mediterrâneo é loteamento urbano, na região oeste da malha, próximo ao limite do município (Figura 1). Entre 1987 e 1989, foi construído o conjunto habitacional Mediterrâneo naquele loteamento previamente aberto, com 146 unidades habitacionais unifamiliares. Figura 1 – Mapa de localização do Jardim Mediterrâneo Fonte: Prefeitura Municipal de Presidente Prudente, 2002 O fato do conjunto ter sido construído em loteamento pré-existente é bastante significativo, proporcionando ocupação de área já urbanizada, reduzindo a pressão em relação à expansão urbana e sobre áreas não impactadas pela urbanização, além de proporcionar aos moradores infraestrutura urbana. No entanto, é importante destacar o fato que foi executado na área reservada para lazer e verde (Figura 2), ou seja, a Prefeitura Municipal alterou o uso legalmente aprovado, privatizando área pública. A ocupação de área verde também demonstra redução das áreas permeáveis da cidade, impactando sobre a infraestrutura urbana, sobre o clima urbano, e, consequentemente, sobre as áreas circunvizinhas urbanizadas e naturais. 3 Figura 2 – Planta do loteamento aprovado Fonte: Prefeitura Municipal de Presidente Prudente, 2002 Outra característica bastante marcante é o fato do conjunto habitacional estar contíguo a área de preservação permanente (APP), de córrego que deságua no Balneário da Amizade, represa na divisa dos municípios de Presidente Prudente e Álvares Machado (Figura 3). No entanto, há respeito em relação ao córrego e à APP, esta mantida com mata ciliar. Figura 3 – Conjunto habitacional e área de proteção permanente (APP) Fonte: Google Maps, 2011 O outro conjunto habitacional analisado, o Itapura, foi executado entre os anos de 1988 e 1990, na região leste da cidade. Da mesma forma que o empreendimento anterior, também se nota a implantação em loteamento previamente existente, o Jardim Itapura (Figura 4), assim como também foi construído em área reservada para lazer, reduzindo o percentual de área permeável na malha urbana. Figura 4 – Loteamento Jardim Itapura Fonte: Prefeitura Municipal de Presidente Prudente, 2001 O Conjunto Habitacional Itapura foi executado como conjunto de edifícios multifamiliares (Figura 5), com oferta de 389 unidades residenciais, resultando em alta densidade populacional. No entanto, é importante verificar que esse empreendimento foi implantado no divisor de águas, entre as bacias de dois córregos, mantendo-se distante de áreas de proteção ambiental, resultando em local de menor impacto (Figura 6). Nesse caso, também se verifica a alteração de uso pela Prefeitura Municipal, com privatização de área pública, redução das áreas permeáveis da cidade, e impacto direto sobre a infraestrutura urbana e sobre o clima urbano. 4 Figura 5 – Conjunto habitacional Itapura Fonte: Prefeitura Municipal de Presidente Prudente, 2001 Figura 6 – Localização do conjunto habitacional Itapura – no divisor de águas Fonte: Goolge Maps, 2011 Por meio dos levantamentos, percebe-se o descaso do Poder Público com as áreas reservadas para lazer e verde, alterando seu uso e privatizando-as, ignorando as legislações federal e municipal. No âmbito da legislação municipal, embora anterior à Constituição Federal de 1988, a cidade de Presidente Prudente já apresentava Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (PDDI) desde 1968, elaborado pelo Centro de Pesquisa e Estudos Urbanísticos (CPEU), da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP). Dessa forma, não pode ser verificada qualquer preocupação ambiental, assim como preocupação com a sociedade de forma ampla. Embora tenham sido analisados conjuntos habitacionais em extremos opostos da cidade de Presidente Prudente-SP, eles foram lançados e construídos na mesma época, pela mesma empresa, com aprovação nos anos de 1987 e 1988. As políticas públicas seguidas não vislumbravam o respeito à legislação aprovada, havendo maior peso a liberação de área para a construção de habitação, mesmo existindo outras áreas de vazio urbano na cidade. CONCLUSÕES Esta pesquisa visa a apresentar o inicio de levantamento sobre a ocupação do território urbano, comparando-o com as características ambientais locais naturais e de ocupação legal; tendo como estudo de caso dois conjuntos habitacionais aprovados e construídos em um período de transição na política pública nacional. Os conjuntos tratados foram executados em Presidente Prudente-SP, ambos em áreas reservadas a lazer em loteamentos existentes. Verifica-se o descaso municipal com a própria legislação, assim como com a legislação federal, e percebe-se que a falta de preocupação do Poder Público com as áreas legalmente reservadas pode gerar novos problemas urbanos, com graves impactos ambientais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANTONUCCI, D. ONU e 30 anos do UN-Habitat. 5o. Fórum de Pesquisa FAU-Mack. São Paulo: UPM, 2009. BONDUKI, N. Origens da habitação social no Brasil: arquitetura moderna, lei do inquilinato e difusão da casa própria. 4a.edição. São Paulo: Estação Liberdade, 2004. HONDA, S.C.A.L. Habitação de Baixa Renda como Produto do Capital - o Programa de Arrendamento Residencial (PAR) em Presidente Prudente-SP. São Paulo: UPM, 2011 (Tese de Doutorado). 5