Influência do comércio internacional na arrecadação do ICMS Darcy Francisco Carvalho dos Santos Júlio Francisco Gregory Brunet Economistas. I - Comentários iniciais Este texto objetiva demonstrar os efeitos do comércio internacional na arrecadação do ICMS. O fato de apontar a contribuição negativa das exportações no montante do ICMS arrecadado não quer com isso afirmar que elas não são positivas para o crescimento econômico, para a geração de emprego e de renda e, indiretamente, para a própria arrecadação de tributos. II - Base geradora do ICMS A arrecadação do ICMS depende mais dos bens e serviços disponíveis (BSD) do que do PIB, propriamente. Os BSD são obtidos pelo acréscimo ao PIB das importações (M) e pela dedução das exportações (X). O produto interno bruto (PIB) é dado pela seguinte fórmula: PIB = C + I + X – M (1) Onde: C = consumo I = investimento. Os bens e serviço disponíveis são obtidos pela fórmula a seguir: BSD = PIB + M – X (2) Substituindo-se PIB por seus componentes, conforme equação (1), tem-se: BSD = C + I + X –M + M - X BSD = C + I (3) Como as importações são agregadas aos BSD seja como consumo, seja como investimentos, elas são de fundamental importância para a arrecadação do ICMS, que, dado um PIB constante, será tanto maior quanto menor for saldo na balança comercial do Estado. Para demonstrar esse fenômeno foi construída a Tabela 1 que fornece diversas hipóteses, em que são feitas simulações compostas por crescimento e decréscimo de exportações e de importações, mantido constante o PIB em 1100, assim: 1. Numa posição inicial, as exportações são de 300 e as importações de 200. Com isso os BSD são de 1000. A arrecadação do ICMS, sendo de 6% sobre essa base, será de 60 e corresponderá a 5,5% do PIB. O saldo da balança comercial é de 100. 2. Mantidas constantes as exportações e reduzindo-se as importações de 200 para 100, os BSD reduzem-se para 900. Com isso, a arrecadação cai para 54 e sua participação no PIB desce para 4,9%. O saldo na balança comercial passou de 100 para 200. 3. Nesta situação as exportações ficam constantes, aumentando as importações em 100. Com isso, o saldo da balança comercial passa para zero. A arrecadação do ICMS é a maior em termos absolutos (66) e relativos, pois passará a representar 6% do PIB que, por sua vez, é igual aos BSD. 4. Nessa hipótese, mesmo aumentando X em 100, mantidas as M constantes, o saldo na balança comercial passa para 200. Com isso tem-se novamente a pior arrecadação. 5. Nesta situação, mantidas as M constantes, houve uma redução das X e, com isso, um aumento dos BSD. Com o saldo na balança comercial zero, houve a maior arrecadação, igualando-se a situação 3, onde também foi zerada a balança comercial por um aumento de M. 2 Numa situação de PIB constante, o aumento de ICMS dependerá tanto do aumento das importações como da redução das exportações. Por isso, os ressarcimentos previstos na Lei Kandir sempre serão necessários, a menos que os estados aumentem suas importações, o que nem sempre é conveniente para a política macroeconômica. Tabela 1 Arrecadação do ICMS em função da variação das exportações e importações, mantido o PIB constante Variação hipotética: 100 unidades monetárias Nº 1 2 3 4 5 HIPÓTESES Descrição Posição inicial X constante e Redução de M X constante e aumento de M Aumento de X e M constante Redução de X e M constante C+I 1 1.000 900 1.100 900 1.100 X 2 M 3 300 300 300 400 200 200 100 300 200 200 PIB BSD ICMS 4=(1+2-3) 5=(4-2+3) 7=6%*5 1.100 1.100 1.100 1.100 1.100 1.000 900 1.100 900 1.100 60 54 66 54 66 ICMS/PIB Bal.Comercial 8=7/4 9=2-3 5,5% 4,9% 6,0% 4,9% 6,0% 100 200 200 - C=Consumo; I=investimentos; X= exportações; M=importações;BSD=Bens e serviços disponíveis. Considerando as hipóteses de que um aumento de 100 nas exportações implicará em aumento correspondente no PIB, conforme Tabela 2, constata-se que a arrecadação só aumentará quando ocorrer aumento de importações e se reduzirá quando essas diminuírem. Tabela 2 Arrecadação do ICMS em função de um crescimento das exportações e do PIB Variação hipotética: 100 unidades monetárias Nº 1 2 3 HIPÓTESES Descrição Aumento de X e M constante Aumento de X e aumento de M Aumento de X e redução de M C+I 1 1.000 1.100 900 X 2 M 3 400 400 400 200 300 100 PIB BSD ICMS 4=(1+2-3) 5=(4-2+3) 7=6%*5 1.200 1.200 1.200 1.000 1.100 900 60 66 54 ICMS/PIB Bal.Comercial 8=7/4 9=2-3 5,0% 5,5% 4,5% 200 100 300 C=Consumo; I=investimentos; X= exportações; M=importações;BSD=Bens e serviços disponíveis. Em outros termos, a arrecadação será tanto maior quanto menor for o saldo na balança comercial. Os altos saldos reduzem a arrecadação, tanto em valores absolutos como em relação ao PIB. Nada contra as exportações, tudo a favor. Só que em termos de arrecadação do ICMS, elas terão que vir acompanhadas de aumento das 3 importações ou de ressarcimento por parte do Governo Federal. Caso contrário, só um aumento das alíquotas internas poderá compensar as perdas de arrecadação provocada pelo descompasso entre exportação e importação. III - Conclusão: 1) Os estados dependem de um imposto, o ICMS, que tem elasticidade neutra ou negativa em relação ao produto; 2) Esse imposto sofre, conforme demonstrado, com o saldo comercial positivo, o que lhe imputa uma elasticidade negativa; 3) O crescimento do PIB decorrente das exportações pressiona por mais serviços dos estados – educação, saúde e segurança – que têm elasticidade positiva em relação ao produto; e também de infra-estrutura; 4) Assim, um estado exportador necessita de compensações federais por contribuir com o saldo comercial; 5) Essas compensações podem vir de três modos: ou agregar aos estados um imposto elástico em relação à renda; 6) Ou compensar-lhes com transferências adicionais em função do saldo e não em função das exportações (erro da Lei Kandir); 7) Ou aumentar alíquotas do ICMS de modo a compensar a parcela da renda (que é retida pelos exportadores) desonerada pelas exportações. 8) De outro modo a pressão sobre o gasto público decorrente do aumento da renda derivada das exportações não será compensada. Porto Alegre, 17 de janeiro de 2007. 4