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USO DAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: (H)A PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (?). Camilla Veruska da Silva [email protected] Nilviane Araújo Padilha [email protected] (UFPE) RESUMO Analisamos os porquês dos professores municipais da EJA resistirem à inclusão das Tecnologias de Informação e Comunicação. Identificamos as concepções deles quanto ao uso dessas tecnologias e sua formação docente. Para tanto, entrevistas semi‐estruturadas e visitas a três escolas do Recife apontaram a acomodação e a desmotivação como motivos pessoais e a precária infra‐estrutura, a razão dessa resistência. PALAVRAS‐CHAVE: educação – tecnologias – educação de jovens e adultos. ABSTRACT We analyzed the reasons why teachers of municipal EJA resist to the inclusion of Information Technology and Communication. We identified their conceptions about the use of these technologies and their academic formation. For this, semi‐structured interviews and visits to three schools of Recife showed accommodation and lack of motivation as personal reasons and precarious infrastructure. This is the reason for this resistance. KEY WORDS: education ‐ technologies ‐ young and adult education 1. INTRODUÇÃO No Brasil, a taxa de analfabetos, segundo o IBGE (apud MEC, 2007), é de 9,6%. Esse grande contingente constitui o público potencial dos programas de Educação de Jovens e Adultos (EJA), correspondente ao primeiro segmento do ensino fundamental. Estão inclusas pessoas que dominam, precariamente, a leitura e a escrita. Diante dessa situação, elas são impedidas de utilizar eficazmente essas habilidades para continuar a aprendizagem e para acessar 2
informações essenciais a uma inserção eficiente e autônoma, que em muitas das dimensões, caracterizam as sociedades contemporâneas. As disciplinas de Pesquisa e Prática Pedagógica (PPP), do curso de Pedagogia da UFPE, nos proporcionaram visitas às escolas municipais do Recife e observações da atuação dos professores em sala de aula na Educação de Jovens e Adultos. Observamos que o público que, geralmente, freqüenta as salas de aula na EJA é aquele que teve uma permanência muito curta na escola ou até não teve nenhuma passagem anterior por ela. Nessas observações, verificamos que grande parte dos alunos dessa modalidade da educação básica, incluindo os mais jovens, passa o dia inteiro trabalhando. As novas tecnologias de informação e comunicação trazem novas possibilidades à educação, exigindo uma nova postura do educador. Afirma Bastos (1997) que a educação no mundo de hoje tende a ser tecnológica, a qual vai exigir o entendimento e a interpretação de tecnologias. Assim sendo, preocupamo‐nos com o perfil do educador que está hoje em sala de aula, pois sabemos que com sacrifício, acumulando responsabilidades profissionais e domésticas ou reduzindo seu pouco tempo de lazer e descanso, os alunos se dispõem a freqüentar o curso, no turno da noite, na expectativa de melhorar suas condições de vida. A maioria nutre a esperança de continuar os estudos: concluir o que corresponderia ao Ensino Fundamental perdido e ter acesso a outros graus de ensino, habilitações técnicas e profissionais. Foi dentro desse universo que decidimos fazer a pesquisa. Já anteriormente falado, foram nas aulas de PPPs que pudemos ficar um pouco mais próximas do universo do professor da EJA. Observamos seu cotidiano, seu planejamento de aulas, os conteúdos que desejavam abordar. Para construção do nosso trabalho, foram necessárias visitas às salas de aula e de laboratório, observações e entrevistas com os professores. Fomos a campo com um olhar de curiosidade. De fato, precisaríamos conhecer a reação desses educadores no dia‐a‐dia, saber se há uso de tecnologias e se esta mudança ocorre não só em quem aprende, mas em quem ensina. No entanto, pensar em educação significa pensar no modelo de preparo para afrontar este mundo de complexidade e ininterrupta mudança, e essencial tomada de consciência dessa realidade, afirma Rodrigues (2002). Desse modo, toma‐se como objetivo geral desse estudo identificar os motivos e as razões que levam os professores das escolas públicas municipais a resistirem à inclusão das tecnologias de informação e comunicação (TICs) na Educação de Jovens e Adultos. Para alcançar tal objetivo, procurou‐se, também, averiguar a formação docente direcionada à EJA; a formação dos professores para o uso de tecnologias; as concepções dos professores da área de Educação de Jovens e Adultos quanto ao uso de tecnologias no ensino e verificar se há relação entre a acomodação dos docentes no uso de tecnologias e seu tempo de atuação na profissão. 3
Apresentamos como pressuposto dessa pesquisa que a resistência dos professores das escolas públicas municipais frente à inclusão de tecnologias de informação no ensino de Jovens e Adultos se dá por despreparo e/ou acomodação. Referindo‐se ao primeiro aspecto, os professores não se sentem capacitados o suficiente para elaborar e pôr em prática aulas com recursos tecnológicos diferentes. Quanto ao segundo, a acomodação, os professores alegam já possuírem as aulas prontas ou até de “cabeça”, não tendo a preocupação em planejar aulas diferentes da rotina porque já chegam cansados para as aulas à noite. 2. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Devido ao processo de redemocratização do país, após a ditadura de Vargas, a Educação de Jovens e Adultos passou a ocupar cada vez mais espaço na educação brasileira. A necessidade de aumentar as bases eleitorais era urgente para a sustentação do governo central, para integrar as massas populacionais de imigração recente e também para incrementar a produção. Os jovens e adultos que não se escolarizaram no tempo regular, buscavam cada vez mais recuperar esse tempo perdido. Vários programas foram criados ao longo do tempo para assistir a essa modalidade de ensino, dentre outros, os Movimentos de Educação e Cultura Popular nos anos 50 e 60; o MOBRAL em 70; a Fundação Educar na década de 80. A história da Educação de Jovens e Adultos, no Brasil, chega à década de 90 reivindicando a estabilização de reformulações pedagógicas que vêm se apresentando necessárias em todo o seu ensino fundamental. O público que tem procurado essa modalidade de educação é constituída, em sua maioria, de pessoas que já tiveram insucessos pela escola. Esta situação ressalta o grande desafio pedagógico, em termos de seriedade e criatividade, que a educação de jovens e adultos impõe: como garantir a esse segmento social que vem sendo marginalizado nas esferas sócio‐econômica e educacional um acesso à cultura letrada que lhe possibilite uma participação mais ativa no mundo do trabalho, da política e da cultura (RIBEIRO, 1997, p. 34). Segundo Ribeiro (1997), os programas mais atuais presumem um tempo maior de alfabetização garantindo que o jovem ou adulto alcance maior domínio das ferramentas da cultura letrada para que possa usá‐las no dia‐a‐dia ou prosseguir sua escolarização. Práticas de educação de jovens e adultos têm ressaltado, para seu sucesso, a necessidade de fortalecer a auto‐estima e a construção de identidade dos sujeitos que dela participam. Atendendo às parcelas da população cuja experiência na educação regular foi negada por sucessivas reprovações e evasões, o processo de escolarização de jovens e adultos deve representar uma contribuição para o resgate de dignidade e para a construção da cidadania crítica e participativa. 4
De acordo com Silva (2007), na perspectiva da educação problematizadora de Freire, todos os indivíduos estão ativamente envolvidos no ato de conhecimento. O ato pedagógico não consiste em informar o mundo, ao invés disso, educador e educandos criam, dialogicamente, um conhecimento do mundo. O educador deve ter como eixo central as relações de trabalho dos educandos, sua vida cotidiana, suas próprias experiências, ou seja, trabalhar com temas geradores/significativos e a formação da cidadania. É desse modo que Freire sugere o “conteúdo programático” do currículo dos programas de educação de adultos. “É através da intercomunicação que os homens mutuamente se educam [...]” (SILVA, 2007, p. 60). O educador de jovens e adultos deve ser solidário com os educandos, estar disposto a enfrentar dificuldades como desafios estimulantes, confiar na competência e na vontade de todos de querer aprender e ensinar. Ele deve procurar conhecer seus educandos, sua cultura, suas particularidades e o entorno próximo. Para responder a esses deveres, o educador terá de procurar conhecer cada vez mais os conteúdos a serem ensinados, reciclando‐se constantemente e, também, deverá refletir sobre sua prática continuamente, buscando maneiras de aperfeiçoá‐la. É de grande relevância beneficiar a autonomia dos educandos, incitá‐los a examinar freqüentemente seus avanços e suas privações, auxiliá‐los a tomar consciência de como a aprendizagem se efetua, para, assim, terem motivação para continuar estudando. 3. MUDANÇAS TECNOLÓGICAS E EDUCACIONAIS Com a modernização, a crise de produtividade e do desenvolvimento das inovações tecnológicas, as empresas tiveram que alterar os processos de organização da produção, de modo a substituir a produção em massa e em série que já estavam dando sinais de enfraquecimento por uma produção mais flexível. Com as mudanças tecnológicas e organizacionais do trabalho, nos anos 60/70, a eficiência produtiva surge como uma necessidade nesse novo contexto, implicando numa nova racionalização do trabalho, o qual passa a solicitar um novo tipo de trabalhador capaz de compreender e participar de um ambiente onde as decisões são mais complexas e as interações sociais mais numerosas. Na estrutura produtiva, percebemos a introdução de novas tecnologias que passam a serem utilizadas dentro do contexto de transformações. Dentro dessas novas tecnologias, temos a introdução da robótica, micro‐eletrônica, informática, automação, máquinas ferramentas com comando numérico, CAD (desenho assistido por computador) etc. As novas tecnologias da informação e comunicação têm três tipos de efeitos, segundo Sancho (2006, p. 16‐17): o primeiro, “altera a estrutura de interesses (as coisas em que pensamos); o segundo, muda o caráter dos símbolos (as coisas com as quais pensamos) e o terceiro modifica a natureza da comunidade (a área em que se desenvolve o 5
pensamento)”. No entanto, torna‐se difícil recusar o prestígio das tecnologias de informação e comunicação no formato do mundo atual, mesmo que este não traga resultados positivos a todos os indivíduos e a todos os grupos. A escola deve integrar as TICs porque elas já estão presentes e influentes em todas as esferas da vida social, cabendo à escola, especialmente à escola pública, atuar no sentido de compensar as terríveis desigualdades sociais e regionais que o acesso desigual a estas máquinas está gerando. Como irá a instituição escolar responder a este desafio? Integrando as TICs ao cotidiano da escola, na sala de aula, de modo criativo, crítico, competente. Isto exige investimentos significativos e transformações profundas e radicais em: formação de professores; pesquisa voltada para metodologias de ensino; nos modos de seleção, aquisição e acessabilidade de equipamentos; materiais didáticos e pedagógicos, além de muita, muita criatividade (BELLONI, 2001, p. 10). Diante desse contexto de acentuadas transformações tecnológicas e organizacionais da produção, os trabalhadores foram os elementos mais atingidos, notadamente no que diz respeito às novas exigências de formação: escolaridade e qualificação para o trabalho. Segundo Rodrigues (2002), encontramo‐nos sufocados em uma onda avassaladora de tecnologias. O nosso mundo não possui mais nada de natural, é totalmente artificial, gerado pelo homem. Portanto, “[...] considera‐se que sem uma educação adequada de formação para apropriação crítica desses dispositivos técnicos, corremos o risco de criar não uma sociedade de informação, mas uma sociedade de ciberexcluídos ou de cibernáufragos” (BELLONI, 2001, p. 29). 4. USO DAS TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO O conceito do uso da informática na educação teve início com o próprio ensino de informática e de computação. Em seguida, surgiu o conceito do ensino pela informática, no qual os computadores seriam empregados em diferentes níveis e modalidades assumindo funções definidas segundo a tendência educacional adotada. Segundo Macedo (2003), a informática é a tecnologia que atualmente vem exercendo maior pressão no sentido de alteração dos currículos escolares e também a que maior resistência tem encontrado por parte dos professores. Nos anos 90, houve uma “epidemia” nas escolas estaduais e municipais de computadores, porém, quando não instalavam os softwares, não tinham onde colocar os computadores ou não tinham pessoas com conhecimentos técnicos para que ajudassem os alunos e/ou os professores na sua utilização, deixando‐os sem funcionalidade e uso. Segundo Sancho (2006), as tecnologias de informação e comunicação (TICs) proporcionam uma educação aos alunos de forma crítica e independente, que saibam resolver seus problemas, discernir e respeitar os demais, comunicar‐se 6
com facilidade e trabalhar em cooperação, mas, para que isso se realize, terá que ter docentes formados com grande autonomia e critério profissional. Aos falarmos em formação profissional atualmente, segundo Macedo (2003), lidamos com conceitos totalmente distintos daqueles que conduzem nossas organizações curriculares clássicas. As habilitações hoje parecem não atenderem à nova dinâmica do processo produtivo, necessitando ser restauradas com a regalia de uma abordagem mais generalista do conhecimento. Na realidade educacional de hoje se observa um grande contingente de professores que não tem domínio suficiente de sua disciplina. E estes só terão condições de atuar [...] se lhe for oferecida oportunidade, durante a formação continuada, de aprofundamento em questões específicas de sua disciplina, que, assim os impulsione a adquirir autonomia pela própria aprendizagem (BRASIL, 2000, p. 129). Não basta, apenas, ter formação continuada; é preciso, também, existir apoio e incentivo por parte dos coordenadores, diretores e até colegas profissionais logo após serem introduzidos à nova atividade. Quando os professores não recebem apoio após algumas semanas, todo o entusiasmo e toda a empolgação que tiveram em integrar as tecnologias muitas vezes desaparecem. No entanto, o fator decisivo para os professores resistirem, ou não, à inclusão de tecnologias em suas salas de aula e começarem a trabalhar uma abordagem construtivista é o nível de apoio recebido dos administradores e dos outros professores da escola, diz Sandholtz (1997). Muitas experiências educacionais se restringem a colocar microcomputadores e programas (softwares educativos) nas escolas para uso em disciplinas que visam o preparo do aluno para o domínio de recursos da computação. Um professor competente procurará tirar proveito dessas atividades e escolherá softwares adequados às necessidades. A tarefa de transformar nosso complexo sistema educacional exige múltiplas ações. As mais importantes são as capazes de provocar impacto significativo na qualidade da formação e da prática do professor. Como as tecnologias são complexas e práticas ao mesmo tempo, elas estão a exigir uma formação do homem que remeta à reflexão e compreensão do meio social em que ele se circunscreve. Esta relação – educação e tecnologia – está presente em quase todos os estudos que têm se dedicado a analisar o contexto educacional atual, vislumbrando perspectivas para um novo tempo marcado por avanços acelerados (GRINSPUN, 2002, p. 25). A inclusão de uma pedagogia voltada à tecnologia e ao uso do computador precisa, além do preparo, a disponibilidade do professor. Sabemos que, diante das concepções dos professores, é uma tarefa árdua buscar motivação e interesse pela informática, e levá‐la a uma turma de pessoas adultas de diferentes históricos no fim de um dia cansativo de trabalho. 7
Para que isso possa fluir com motivação e garra, é preciso que os administradores das escolas (diretores e coordenadores) arrumem tempo para os docentes darem continuidade à especialização profissional. “Aprender a usar tecnologia e lecionar com uma abordagem construtivista não é algo que possa ser dominado em uma única oficina, independentemente de sua duração”, afirma Sandholtz (1997, p.159). Na sociedade contemporânea, em virtude da rapidez com que temos que enfrentar situações diferentes a cada momento, cada vez mais utilizamos o processamento multimídico. Até porque os meios de comunicação, principalmente a televisão, utilizam a narrativa com várias linguagens superpostas que nos acostumam, desde pequenos, a valorizar essa forma de lidar com a informação atraente, rápida, sintética, o que traz conseqüências para a capacidade de compreender temas mais abstratos de longa duração e de menos envolvimento sensorial. Portanto, ao pensar em educação tecnológica, deve‐se pensar na interação entre tecnologia e humanismo, visando à formação integral do indivíduo. A educação nunca foi tão valorizada como agora, quando tem, ao mesmo tempo, de enfrentar um dos mais formidáveis desafios. Os conceitos de “escola” como local de aprendizado, “mestre” como fonte de saber, “aluno” como objeto do aprendizado e as tradicionais “disciplinas” nunca foram tão questionadas. Por este motivo, o enfoque da educação tecnológica tem que contemplar a capacitação tecnológica e a valorização do ser humano [...]. (CARDOSO apud RODRIGUES, 2002, p. 221). 5. CONFIGURAR DADOS Nossos sujeitos da pesquisa foram professoras de Educação de Jovens e Adultos das escolas municipais do Recife. Coletamos dados quantitativos, no início do ano letivo (2008), em relação à quantidade de escolas com laboratórios que a prefeitura possui resultando em 120 escolas. Dessas, 82 possuem a educação de Jovens e Adultos. No total são 445 professores atuando nessa modalidade. A partir daí, escolhemos três escolas de RPAs distintas, sendo escolas conhecidas nos bairros onde estão bem localizadas. Foram escolhidas uma escola da RPA 4, uma da RPA 5 e uma da RPA 6. Fizemos uma observação (não‐participante) da prática das professoras durante a aula de informática, quando houve, em turmas de EJA nas escolas escolhidas. Registramos por escrito o cotidiano delas e dos alunos nessas aulas. Coletamos dados através de entrevistas semi‐estruturadas gravadas 1 e questionários 2 . Perguntamos às professoras qual a formação docente e se elas têm formação em EJA, se fizeram algum curso ou capacitação sobre o uso de tecnologias em sala, quanto tempo estão atuando na área de educação e em EJA, o que as motivou a optar por essa 1
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Duas professoras da escola da RPA 6.
Uma professora da escola da RPA 5, pois preferiu responder ao questionário por escrito.
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modalidade de ensino, se já usaram alguma vez o laboratório de informática, se acompanham os alunos durante essas aulas, a opinião delas em trabalhar com tecnologias em EJA, se conseguem conciliar o conteúdo programático com as aulas de informática etc. As três escolas citadas tinham desde a educação infantil ao ensino fundamental II e EJA. Uma delas tinha EJA educação especial. Havia, também, laboratórios de informática, pois foi nosso critério principal de escolha. Na escola da RPA 4 havia 7 computadores no laboratório, a sala era muito apertada e quente, havia 2 ventiladores, mas não davam conta. Na da RPA 5, havia 8 computadores e a sala também era apertada, as cadeiras não proporcionavam uma boa acomodação; na da RPA 6 havia o espaço (sala) para os computadores, mas esses estavam em conserto desde o início do ano. 6. ANÁLISE DOS SUJEITOS Sobre os sujeitos da nossa pesquisa, as professoras, fizemos uma breve tabela identificando‐as de acordo com a formação acadêmica, especialização, tempo de atuação e motivo de optar por trabalhar na EJA. Identificação das professoras A (RPA 4)
Formação Tempo de atuação 3
B (RPA 5) C (RPA 6) Pedagogia, Pedagogia, Pedagogia, licenciatura em especialização em especialização enfermagem, psicopedagogia e em especialização em educação psicopedagogia. pelo PROFAE. especial. 15 anos em 23 anos em educação e 2 anos educação e 20 Opção por EJA D (RPA 6) 23 anos de educação e 18 em EJA. anos em EJA. anos em EJA. Faixa etária Sobrou carga Tranqüilidade interessante. horária e optou dos alunos. pelos adultos. Na escola da RPA 4, a sala de informática é muito pequena, com formato de L e pouco ventilada. Há um estagiário para auxiliar a professora e existem 7 computadores e a maioria estava funcionando. 3
Em relação à professora A da RPA 4, no dia da nossa visita à escola, ela não pôde comparecer. A estagiária ficou substituindo-a. A
formação dessa era em Psicologia, porém estava cursando Pedagogia (3º período). Ela trabalha com educação há 10 anos. Não
conseguimos obter mais informações, pois a mesma não nos deu oportunidade.
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A turma de EJA era de alunos com necessidades especiais, a qual foi diferente das demais escolas visitadas. A turma era pequena e, nesse dia, foram apenas cinco alunos. Os alunos estavam conversando na sala de aula com a estagiária e um deles disse: “Fulano (outro aluno) nem vem hoje porque ele disse que não gosta dessas aulas de informática, prefere ficar em casa”. A partir dessa fala do aluno, retomamos Ribeiro (1997, p. 34) quando fala do “[...] grande desafio pedagógico, em termos de seriedade e criatividade, que a educação de jovens e adultos impõe [...]”. A atividade que os alunos fizeram no laboratório de informática (duração de 1 hora) foi digitar no word a tarefa que estava copiada numa folha de papel. Alguns terminaram de digitar muito cedo, e o estagiário colocou um jogo da memória (acertar os animais iguais) para um deles. Perguntamos: “que jogo é esse?” o aluno respondeu: “é de bichinhos”. A partir dessa fala vimos que os alunos não sabem qual o objetivo das atividades realizadas no laboratório. A professora B da RPA 5 não participou de nenhum curso voltado para a educação de jovens e adultos. Perguntamos sobre o uso o laboratório de informática, ela acha bom trabalhar com tecnologias de ensino em sala de aula, interessante, mas acha que esse público de adultos que freqüenta a EJA não se interessa muito por computador, pois é como se eles achassem que “não é aula de verdade, pensam que é brincadeira”. Sobre a sugestão de trabalhar com tecnologias na sala de aula, a professora B respondeu: Seria muito viável que pudéssemos participar de capacitações com professores específicos da área que pudessem efetivamente ensinar como se trabalhar usando o computador, fazer planejamentos sobre as aulas, ou seja, envolver os conteúdos didáticos com as tecnologias e trabalhar de uma maneira uniforme, assim, o que uma professora ministrasse para sua turma em uma aula todas as outras teriam que fazer o mesmo. Durante a aula no laboratório de informática, tivemos a oportunidade de conversar um pouco com o estagiário. Segundo ele, a professora itinerante 4 traz alguns jogos, em sua maioria envolvendo coordenação motora para aplicar aos alunos. Percebemos que não há um plano de aula diário ou semanal das aulas de informática. Os alunos passam toda a aula fazendo exercícios de ligar pontinhos sob orientação do estagiário, não havendo uma contextualização da atividade com os conteúdos trabalhados em sala ou os comandos tecnológicos para o dia‐a‐dia. Percebemos, mais uma vez, que os alunos não sabem o motivo de estarem fazendo àquelas atividades. Perguntamos ao estagiário se a professora da turma participava das aulas e a resposta foi negativa. Não presenciamos a professora B mediando os alunos e também não vimos as atividades de leitura que a professora itinerante sempre deixa na escola. 4
Professora itinerante: passa pelas escolas com o intuito de se reunir com os estagiários de informática para passar-lhes propostas
educativas de se trabalhar leitura nas aulas de informática.
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Percebemos o interesse daqueles alunos, com rostos cansados de trabalhar o dia inteiro, vibrando a cada ponto ligado, mas com o passar da noite eles começavam a se desestimular, pois diziam que a vista estava cansada e queriam parar. Os alunos saíam aos poucos e a aula ia se encerrando. Diante dessa observação, vimos a falta de apoio, o descompromisso e até a acomodação da professora no processo de formação dos alunos num momento de extrema relevância na vida educativa. Percebemos que, em alguns momentos, os alunos precisavam da professora e era para ela estar acompanhando todo o desenvolvimento para que eles tirassem suas dúvidas e relacionassem a atividade com o objetivo a ser atingido, conforme diz Sandholtz (1997). Referindo‐se à professora C da RPA 6, ela não participou de nenhum curso ou especialização voltado para essa modalidade, como também voltado às tecnologias. Ela apenas participa das capacitações que a prefeitura do Recife oferece, mas disse que “não dá aparato para utilizar em sala porque é mais teórico [...]”. Ela só sabe utilizar o programa Word. A respeito do uso do laboratório de informática, na escola, para abordar algum conteúdo, a professora C afirma que: No ano passado a gente vinha toda semana. Era uma vez por semana durante 1h. Mas não dava pra aproveitar muito porque ficavam 2, 3 alunos no mesmo computador. Nem todos queriam ir. Ficava metade na sala e a outra metade descia. Uns ficavam só olhando. Só tinham 3 computadores, porque os outros não estavam prestando. Nem todos queriam vir. Quando tinha uma coisa mais direcionada, vinha todo mundo. No final do ano melhorou. Não tivemos a oportunidade de observar as aulas de informática nessa escola, pois o laboratório estava sem os computadores. Disseram‐nos que a prefeitura recolheu‐os, no início do ano, porque estavam todos quebrados. De acordo com a professora, ela disse que acompanhava os alunos durante as aulas “porque o monitor o estagiário não ajudava. Não tinha noção nenhuma”. Perguntamos a opinião da professora C em trabalhar com tecnologias de ensino na EJA e assim respondeu: As tecnologias complementam o ensino, vai dá condições pra eles usarem no dia‐a‐dia. Tirar extrato no banco, celular. Tudo isso tem base em tecnologia, de entender os comandos. Alguns alunos tinham facilidade porque os filhos das patroas ensinavam, deixavam usar o computador, outros não. Alguns traziam alguma coisa de casa da internet como texto, conto. Trabalhava na sala o que eles traziam. Pedi pra os outros trazerem também mais coisas [...]. Tem muito lixo na internet também, pois nem tudo a gente pode acreditar. 11
Por fim, perguntamos uma sugestão para se trabalhar com TICs em sala de aula nas turmas de EJA. A professora respondeu: Era pra ter 1 dia somente voltado só pra o computador, a noite inteira. Eu acho que valia a pena, dá mais oportunidade. Os mais velhos não gostam, só os mais novos que gostam. Eles reclamam da letra pequena que força a vista. Resistem mais, mas acabam preferindo ir pra casa. A professora D da RPA 6 não fez nenhum curso ou especialização voltada para EJA. O que motivou a optar por essa modalidade foi “a tranqüilidade, principalmente, dos alunos. Me apaixonei, não quero mais sair. De dia eu só queria o infantil e à noite os meninos grandes”, afirma a professora. Ela já participou dos congressos de tecnologia na educação e disse que deu para aproveitar muita coisa de lá, mas não citou exemplos. Referindo‐se a cursos realizados para ajudar no uso das TICs em sala, ela disse que não fez curso de computador, mas na época que estavam implantando a TV escola, parabólica, foram dois professores e ela foi. Afirmou que sempre usa DVD, vídeo, música para os alunos refletirem. Em relação ao uso do laboratório de informática da escola, para abordar algum conteúdo trabalhado em sala, a professora disse que já usou nos anos passados, um dia na semana. O que eu acho errado é que os professores não acompanham os alunos. Os alunos ficam com o estagiário. A gente diz o que quer aos estagiários, mas... eles não sabem. Os alunos têm que saber ligar o computador, usar o Word. No final do ano, os alunos já estavam pesquisando na internet. A maioria aproveitou as aulas. Tinham oito bem interessados, queria abrir e‐mail, internet. Aí eu dizia: calma! Temos que andar no mesmo nível pra todos acompanhar. Eles iam pra lan‐house pagar pra entrar na internet. Eram bem interessados. Tem também os perigos da internet [...]. O pessoal da noite é meio travado pra computador. Tem que se familiarizar com o teclado, o mouse. Uns vêm pra aula, aí na outra aula não quer mais vir. Aí eu digo: ‘não, vamos, eu ajudo’. Eles descem para digitar a produção de texto, aí eu digo quando está em vermelho é quando tem alguma coisa errada, olhe direitinho, leia de novo. Os alunos mais idosos e do interior que chegaram há pouco tempo são mais retraídos. A fala da professora se fundamenta em CARDOSO apud RODRIGUES (2002, p. 221) quando ele diz que “a educação nunca foi tão valorizada como agora, quando tem, ao mesmo tempo, de enfrentar um dos mais formidáveis desafios [...]”. 12
Sobre o trabalho com tecnologias na educação de Jovens e Adultos, ela acha interessante, “mas os mais idosos, os matutinhos não querem, são mais retraídos”. Ela gosta de trabalhar com projetos e incluir as tecnologias no dia‐a‐
dia. A sugestão que a professora nos deu para trabalhar com as TICs em sala de aula foi “trabalhar sempre com projetos, introduzindo as tecnologias com os temas”. Portanto, percebemos que é necessário haver uma valorização maior e mais específica da educação de Jovens e Adultos e um comprometimento também maior quando esta educação está associada à tecnologia. O educador precisa entender que esses alunos tiveram pouquíssimo acesso à educação e agora estão inseridos num contexto social que vêem nas tecnologias de educação um grande passo, uma evolução significativa para todos. Ao realizar isso, eles não podem ser marginalizados nesse processo, pois é direito deles e um dever do professor. 7. ANÁLISE DOS ALUNOS EM RELAÇÃO ÀS AULAS DE LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA Em conversa com os alunos da escola da RPA 4 e da RPA 5, percebemos a falta de motivação deles em relação às aulas de informática, pois eram monótonas, a sala apertada, muito desconfortável (quente) e eles não sabiam o porquê de estarem ali digitando aquelas atividades ou ligando pontos. Isso aponta para falta de planejamento, o qual deveria fazer parte do cotidiano do professor. As aulas no laboratório de informática não podem ser aleatórias, elas precisam acontecer de forma sistemática, planejada e principalmente contextualizada, como afirma Silva (2007, p. 4) em relação à educação problematizadora de Freire. O planejamento é de extrema importância, pois ele vai aliar o conteúdo a ser trabalhado à criatividade do professor que nesse momento deve preparar uma aula dinâmica e envolvente no intuito de chamar a atenção dos alunos para os conhecimentos tecnológicos que, até então, para eles são insignificantes, visto que a maioria julga o computador como uma ferramenta para brincar. Os alunos que compõem a sala de EJA já encontram alguma dificuldade no aprendizado por diversos fatores, entre eles: cansaço, “vista” cansada. E quando esse aprendizado traz uma nova possibilidade, com o uso das tecnologias, o olhar do docente tem que ser diferenciado. 8. CONCLUSÃO Esse artigo foi fruto de uma preocupação, uma angústia que surgiu em nossa jornada acadêmica e que nesse momento torna‐se público para conhecimento, reflexão e pesquisa. Nosso foco, no referido estudo, foi identificar os motivos e as razões que levam os professores das escolas públicas municipais resistirem à inclusão das tecnologias de informação e comunicação (TICs) na Educação de Jovens e Adultos. 13
Em relação aos motivos, percebemos a questão da acomodação das professoras e a falta de motivação, independente do tempo de atuação na área (2, 20 e 18 anos), porém não obtivemos nenhum depoimento explícito nas entrevistas e questionários. Mas pudemos fazer algumas inferências sobre o assunto mediante revelações das próprias professoras. Das três professoras entrevistadas, duas possuem mais de 20 anos de formação, e a outra possui 15 anos. Todas estão trabalhando na área há bastante tempo e a motivação por trabalhar em EJA, segundo o relato da professora C, se deu por meio de uma necessidade de carga horária. Foi unânime o retorno das professoras quando conversamos sobre cursos e capacitações para que elas trabalhassem com tecnologias em sala de aula. Nenhuma delas havia participado de ações específicas sobre essa abordagem para ajudá‐las a usar em suas salas de aula, como também não procuraram participar. A professora B afirma que “gostaria muito de participar de cursos, mas o tempo não permite”. A professora C diz que “as capacitações não dão aparato para utilizar em sala porque é mais teórico”. Percebemos que a responsabilidade ora era passada para a prefeitura ora para os alunos quando elas diziam que os mais velhos não queriam participar das aulas, preferiam ficar na sala de aula ou em casa, como afirmou a professora A. De acordo com as professoras, as capacitações sobre tecnologias promovidas pela prefeitura eram deficientes e não lhe davam subsídios necessários para que trabalhassem em sala de aula e os alunos, por sua vez, eram resistentes ao uso dos computadores por serem “matutinhos” ou idosos e pelo cansaço do trabalho durante o dia. Diante desses depoimentos e do nosso sentimento enquanto pesquisadoras, constatamos que o despreparo é fato, mas a acomodação e a falta de motivação são os principais provocadores nessa problemática. Com esse trabalho, podemos refletir quanto à introdução de novas tecnologias na EJA, pois as mesmas não implicam necessariamente em mudanças curriculares, mas em mudanças de atitudes. Dispensar os professores de suas tarefas, mesmo que sejam algumas horas por mês, é um modo eficaz de incentivar o crescimento constante, de repensar e investir na sua própria formação, de reconstruir a sua identidade profissional diante das novas exigências postas à educação. Quanto às razões, a análise do discurso das professoras entrevistadas revela o despreparo, ausência de cursos específicos voltados para tecnologias de ensino, e a falta de condições materiais e estruturais, laboratórios desconfortáveis, computadores quebrados. Elas nos informaram que não há capacitações apropriadas voltadas para tal atividade, nem orientação que as ajudem a conhecer mais profundamente as tecnologias, poder se apropriar melhor e, assim, adquirir habilidades para aplicá‐las em sala de aula. Em uma sociedade tecnológica como a nossa, se faz necessário a especialização dos saberes, a colaboração interdisciplinar, o fácil acesso à informação e a consideração do conhecimento como algo de valor, de utilidade na vida. Isso se justifica segundo Brasil (2000). A promoção desse tipo formação, tecnológica, está falha ou não há formação adequada para que facilite o trabalho dos 14
professores em sala de aula. Para que a inclusão das tecnologias possa originar dos professores é necessário haver outras parcerias como afirma Sandholtz (1997). Portanto, consideramos a problemática abordada nesse trabalho relevante, primeiro pelo fato de entendermos que a educação precisa estar envolvida com os avanços tecnológicos, uma vez que a sociedade em que estamos inseridos exige esse envolvimento. Hoje, a comunicação se dá basicamente por meio de instrumentos tecnológicos, a inserção no mercado de trabalho não é diferente, pois o mínimo de conhecimento de informática é exigido na maior parte das profissões. Enquanto pedagogas, em formação, não poderíamos deixar de lado a preocupação em relação à inclusão de TICs nas salas de EJA, pois os professores não podem ficar a margem ao processo da evolução tecnológica. Enquanto facilitadores do conhecimento precisamos estar a frente das inovações tecnológicas buscando, sempre, o preparo e a motivação para levar aos alunos novos instrumentos de aprendizagem. 9. BIBLIOGRAFIA BASTOS, J. A. de S. L. A. Educação e Tecnologia. In: Educação & Tecnologia. Revista Técnico‐científica dos Programas de Pós‐Graduação em Tecnologia dos CEFETs PR/MG/RJ. Curitiba, CEFET‐PR, ano I. n. 1, abr. 1997. BELLONI, M. L. O que é mídia‐educação. São Paulo: Autores associados, 2001. BRASIL. Mistério da Educação. Secretaria de Educação a distância. Informática e formação de professores. Vol. 2. Brasília: Seed, 2000. GRINSPUN, M. P. S. Z. (org.). Educação tecnológica: desafios e perspectivas. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2002. MEC, Ministério da educação. Disponível em: <http://portal2.mec.gov.br/secad/index.php>. Acesso em: 07 dez. 2007. MACEDO, E. F. de. Novas tecnologias e currículo. In: MOREIRA, A. F. B. (org.). Currículo: questões atuais. 9 ed. São Paulo: Papirus, 2003. RIBEIRO, V. M. M. (coordenação e texto final). Educação de jovens e adultos: proposta curricular para o 1º segmento do ensino fundamental. São Paulo: Ação Educativa; Brasília: MEC, 1997. RODRIGUES, A. M. M. (org.). Educação tecnológica: desafios e perspectivas. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2002. 15
SANCHO, J. M., et al. Tecnologias para transformar a educação. Porto alegre: Artmed, 2006. SANDHOLTZ, J. H.; RINGSTAFF, C.; DWYER, D. Ensinando com tecnologia: criando salas de aula centradas nos alunos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. SILVA, T. T. da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2 ed., 10ª reimpressão. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. 
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O USO DAS TECNOLOGIAS DE INFORMAO E COMUNICAO: (H