8º Encontro da ABCP
01 a 04/08/2012, Gramado, RS
Área Temática: AT 07 – Participação Política
- Título do Trabalho:
A Democracia Deliberativa e a Pesquisa Empírica de Instituições Participativas
- Nome completo e instituição dos autores:
Rodrigo Rossi Horochovski (UFPR) – [email protected]
Augusto Junior Clemente (UFRGS) – [email protected]
1
A DEMOCRACIA DELIBERATIVA E A PESQUISA EMPÍRICA DE INSTITUIÇÕES
PARTICIPATIVAS
Resumo
A democracia deliberativa tem obtido espaço crescente na teoria democrática.
Considerada, num primeiro momento, excessivamente normativa e pouco descritiva
de processos reais, principalmente em sua formulação habermasiana inicial, a
perspectiva em exame vem sendo alvo de um esforço no sentido de sua
operacionalização em pesquisas empíricas (Chambers, 2009). O objetivo do paper é
realizar um balanço de estudos com esta proposta e voltados especificamente à
avaliação de instituições participativas brasileiras. Em especial, analisamos como
tais estudos mobilizam conceitos, categorias, dimensões e variáveis, visando tanto a
apreender os elementos substantivos e procedimentais das referidas instituições,
quanto a retroalimentar a reflexão teórica, mormente quanto às possibilidades de
concretização dos pressupostos deliberativos.
Palavras-chave:
participativas.
democracia
deliberativa,
pesquisa
empírica,
instituições
1. INTRODUÇÃO
A democracia deliberativa constitui uma das principais vertentes assumidamente
normativas da teoria democrática. Nos últimos anos, ela vem obtendo espaço
crescente no debate teórico, sendo, no entanto, frequentemente acusada de ser
excessivamente normativa e de não elucidar processos reais, principalmente em sua
formulação habermasiana inicial. Desse modo, uma das críticas mais comuns ao
arcabouço teórico em tela é endereçada a sua suposta prodigalidade em apontar os
“defeitos” dos sistemas concretos em termos de qualidade da democracia, a partir,
todavia, de parâmetros que seriam inaplicáveis – fundados em ideais de consenso
normativo, produzidos em deliberações pautadas na racionalidade comunicativoargumentativa – irrealistas como as próprias concepções oriundas da noção
rousseauniana de bem comum.
Em termos sintéticos, a maior limitação da democracia deliberativa enquanto teoria
social seria prescrever sem descrever, i.e., apresentar pouca ou nenhuma
aplicabilidade. Noutras palavras, a perspectiva em questão não teria aportado um
2
conjunto suficientemente robusto de pesquisas empíricas que testassem a validade
fática dos pressupostos da teoria no mundo vivido, para utilizar um vocabulário
tipicamente habermasiano.
A crítica relacionada à suposta carência de pesquisas empíricas que utilizem a
democracia deliberativa é pouco judiciosa. Adeptos da teoria demonstram já haver
número expressivo de estudos. Simone Chambers (2009), por exemplo, arrola e
avalia a profusão de trabalhos empíricos em áreas as mais diversas. Por outro lado,
o esforço de operacionalização dos conceitos pode fazer com que muitas das
propostas nesse sentido, que empregam uma gramática da deliberação, se afastem
dos pressupostos originais do corpus teórico da democracia deliberativa, conforme
aponta Claudia Faria (2010). Para a autora, as necessidades de adequar os
conceitos teóricos às exigências empíricas geram transformações em seu seio. A
partir de um movimento rumo à busca de evidências empíricas, ela passou a propor:
a) formas flexíveis de discursos enfatizando mais os resultados do que o processo
de deliberação (WARREN, 2002); b) outros tipos de atividades que funcionem como
influência sob condição de conflito de interesses, tal como a barganha e a
negociação – que passam ao largo da forma deliberativa de democracia
(MANSBRIDGE, 1999; 2007; 2009; MOUFFE, 2005); c) meios comunicacionais que
vão além do discurso racional – a retórica, a narrativa, etc. (YOUNG, 2001), e; d)
uma concepção pluralista de bem-comum.
Em contraposição, partindo da premissa de que as práticas democratizantes quando
confrontadas com a lógica sistêmica não necessariamente precisam sucumbir aos
seus imperativos, outro conjunto de autores passou a propor arranjos institucionais
intermediários e híbridos, a fim de gerar estabilidade a tais práticas, inaugurando
outra fase da agenda de pesquisa sobre participação social (COHEN e ROGERS,
1995; DRYZEK, 2000; AVRITZER, 1996, 2002; DAGNINO, 2000; FUNG e WRIGHT,
2003).
O importante a ressaltar é que se por um lado essa guinada empírica gerou ganhos
metodológicos, por outro a forma como elas são sugerida traz consigo
consequências importantes. Pois, segundo Faria (2010), a fim de operacionalizar os
conceitos deliberativos a estratégia desses autores é re-introduzir nos seus modelos
noções referentes ao auto-interesse, conflito, etc.. Esse movimento acaba por ter um
duplo sentido: aproxima a teoria deliberativa das abordagens pluralista e neo-
3
corporativa e distancia-se dos seus conceitos inaugurais: esfera pública e ação
comunicativa. As consequências dessa guinada para o potencial crítico da teoria
deliberativa nos faz questionar se essa opção por uma versão supostamente mais
realista vai gerar um potencial igualmente crítico para a própria teoria deliberativa.
a ausência da idéia de esfera pública, central na teoria deliberativa “clássica”
como lócus privilegiado de formação de uma opinião pública reflexiva que
envolve mobilização, tematização e interpretações de diferentes temas,
perspectivas e interesses, empobrece [...] a proposta supostamente “realista”
de deliberação democrática. Tal esfera, vale lembrar, também faz parte de
um sistema maior, caracterizado por diferentes níveis que comportam
diferentes tipos de comunicação e ação (FARIA, 2010, p. 12)
Vale ressaltar, contudo, que este e outros esforços no sentido de se realizar
balanços têm como alvo pesquisas realizadas fora em países estrangeiros. E no
Brasil? Em que medida se verifica entre nós este giro em direção ao empírico,
assinalado nas obras referidas acima? Cabe, pois, indagar se é possível captar um
crescimento dos estudos empíricos que tenham como base teórica a democracia
deliberativa, para o que é necessário inquirir, mais amplamente, qual é o estágio de
desenvolvimento desta agenda de pesquisas no país.
Neste paper, registramos alguns resultados preliminares de um projeto mais amplo,
cujo objetivo é realizar um balanço de estudos que se proponham à referida
operacionalização, sobretudo aqueles voltados à avaliação de instituições
participativas brasileiras. Desse modo, evitamos propositalmente a discussão
conceitual mais densa – há inúmeros trabalhos que o fazem – para tentar averiguar
a existência de tais estudos e analisar o que eles dizem.
Nosso primeiro passo foi realizar pesquisa de caráter bibliométrico, acerca da
produção brasileira publicada em português, sobre duas bases disponibilizadas na
internet:
Periódicos
Capes
(http://www.periodicoscapes.gov.br)
–
que
inclui
periódicos componentes do Scielo (Scientific Electronic Library Online) e do DOAJ
(Directory of Open Access Journals) – e Scholar.google (www.scholar.google.com).
Fizemos as buscas utilizando as expressões democracia deliberativa e as correlatas
deliberação e deliberação pública.
Constatamos não haver um acúmulo significativo de pesquisas nas quais a análise
de instituições participativas à luz dos pressupostos da democracia deliberativa seja
central, sobretudo na primeira base. Optamos, então, por inicialmente reorientar a
4
pesquisa no sentido de prospectar e caracterizar parte da produção sobre a
democracia deliberativa no Brasil. Trata-se de tarefa complexa e exaustiva, cuja
consecução demanda procurar material em bases mais amplas (não exclusivamente
acadêmicas) e estabelecer filtros bastante refinados. Para esta fase embrionária,
propomos um recorte, tendo como escopo o perfil das publicações, componentes
das bases bibliográficas compulsadas. Nas seções a seguir, descrevemos nossos
procedimentos de pesquisa e trazemos alguns achados iniciais. Vale salientar que
se trata de um trabalho em andamento. Pretendemos, em seu desenvolvimento
futuro, ampliar o escopo, realizando prospecção semelhante em outras fontes, como
bancos específicos de teses e dissertações além de livros.
2. A PESQUISA: PROCEDIMENTOS E RESULTADOS
A investigação visou a testar os procedimentos de pesquisa visando à realização de
uma investigação mais ampla sobre a própria agenda de estudos acerca da
democracia deliberativa no Brasil. Como mencionamos anteriormente, trata-se de
analisar a produção bibliográfica que tem a democracia deliberativa como base
teórica, no todo ou em parte. Para tanto, após uma leitura prévia do material
coletado, constituímos algumas dimensões para análise, descritas no quadro 1:
QUADRO 1 – Dimensões de análise da produção sobre Democracia Deliberativa
DIMENSÃO
SIGNIFICADO
Ano
Ano de publicação do trabalho.
Publicação
Nome/tipo do suporte de publicação do trabalho (dissertação
ou tese, livro, paper apresentado em evento etc).
Instituição do autor
Filiação institucional do(s) autor(es) do trabalho. Pode haver
mais de um autor.
Instituição da publicação
Instituição que sedia a publicação.
Estado da publicação
Estado da instituição que sedia a publicação.
Estado ou país da
Estado ou país da filiação institucional do(s) autor(es). No
instituição do autor
caso de múltipla autoria, a filiação também pode ser múltipla.
Gênero
Gênero – masculino ou feminino – do(s) autor(es).
Área de concentração da
Campo do conhecimento no qual a publicação se insere.
publicação
Área de concentração do
Campo do conhecimento no qual o(s) autor(es) se insere(m).
autor
Objeto
Fenômeno estudado no trabalho, seja ele conceito, instituição
e/ou processo.
5
Categorias/variáveis
Métodos
Finalidade
Autores-chaves
Conceito de democracia
deliberativa
Grau de adesão à
democracia deliberativa
Categorias/variáveis mobilizadas para operacionalização/
discussão dos conceitos.
Técnicas de coleta e análise de dados utilizadas.
Fim a que se destina a pesquisa, neste caso específico, se
ela descreve ou não instituições/processos participativos.
Autores aos quais o trabalho se referencia para construir seu
conceito de democracia deliberativa.
Conceito de democracia deliberativa que orienta as análises
realizadas no trabalho.
Grau de adesão à teoria democrática deliberativa, em função
do tom crítico eventualmente adotado, podendo ser forte (1),
médio(2) ou fraco(3).
Fonte: Elaboração própria.
A análise dessas dimensões possibilitou verificar a factibilidade do estudo e a
realização de inferências. Permitiu, principalmente, apontar quais são os potencias e
as possíveis lacunas na agenda de estudos em democracia deliberativa no Brasil, ao
menos no que se refere às bases avaliadas, que reúnem parte importante da
produção sobre a temática.
Nossas buscas resultaram em 27 textos em “Periódicos Capes” e 25, entre teses,
dissertações, capítulos de livro e papers apresentados em eventos (afora as
publicações constantes da primeira base que se repetiam na segunda), em
“Scholar.google”, num total de 52 trabalhos que atendiam o critério de serem
pesquisas publicadas no Brasil sobre democracia deliberativa – não contabilizamos
pesquisas estrangeiras ou que apenas mencionavam deliberações e processos
semelhantes, mas que não adotavam a perspectiva em tela como base teórica (vide
Anexo, ao fim do texto). O universo sobre o qual nos debruçamos é, portanto,
diminuto, inibindo diagnósticos mais amplos e impede afirmações mais taxativas
sobre a produção relacionada à democracia deliberativa. A leitura dos textos nos
propiciou, contudo, diversos achados, discutidos a seguir.
Os primeiros artigos disponibilizados eletronicamente em “Periódicos Capes” datam
de 2000 (Gráfico 1), não sendo encontrado material na íntegra de décadas
anteriores. Obviamente não há porque pensar que antes não se publicava sobre
democracia deliberativa nos periódicos examinados. Por um lado, esta data pode
indicar apenas o fato de muito recentemente os periódicos terem disponibilizado
suas edições integrais em versão eletrônica e online nas bases pesquisadas,
tornando-se, desse modo, acessíveis a um público mais amplo, anteriormente sem
6
acesso aos volumes de papel, até então obtidos somente por meio de aquisição,
individual ou institucional. Por outro lado, talvez seja possível conjecturar que a
produção anterior era realmente tímida ou não frequentava as páginas destes
periódicos. Podemos concluí-lo a partir da constatação de que os artigos
identificados não se distribuem uniformemente no tempo, na medida em que mais
metade deles concentra-se num período de apenas quatro anos, entre 2008 e 2012.
GRÁFICO 1 - Publicações por ano
5
6
3
4
1
2
1
1
1
3
2
1
4
3
1
1
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
GRÁFICO 2 - Publicações por ano
10
6
5
5
1
1
2002
2003
2
4
2
1
3
1
0
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google.
Na base “Scholar.google” verifica-se tendência semelhante, podendo-se, contudo,
perceber certa concentração da produção a partir de ano anterior, 2007 (Gráfico 2).
De todo modo, observando-se o conjunto, evidencia-se que uma agenda mais
robusta de pesquisas sobre democracia deliberativa é mais recente e claramente se
fortalece nos últimos cinco anos, período que concentra praticamente três quartos
da produção analisada. Embora se trate de uma amostra provavelmente pequena
quando se pensa no universo possível da produção sobre o tema, pode-se
vislumbrar nesta concentração temporal uma tendência de a democracia deliberativa
pouco a pouco estar atraindo a atenção de mais instituições e pesquisadores,
produzindo e submetendo sua produção tanto aos periódicos de mais alto impacto
quanto a eventos, programas de pós-graduação, etc. O monitoramento das bases
consultadas pode ou não confirmar esta tendência.
7
Não há concentração dos periódicos que aceitaram os 27 artigos presentes em
“Periódicos Capes” (Gráfico 3). Eles estão dispersos em 18 revistas diferentes,
sendo que as que mais absorveram produção foram Lua Nova e Revista Brasileira
de Ciências Sociais, com três artigos cada. Civitas, Dados, Revista de Sociologia e
Política publicaram dois artigos cada uma. Esses dados revelam que há um número
razoável de periódicos, de impacto acadêmico entre médio e alto, dispostos a
publicar material relacionado à democracia deliberativa, ainda que até o momento os
números globais sejam relativamente acanhados.
GRÁFICO 3 - Publicação
12
15
10
5
3
3
3
2
2
2
Lua Nova
RBCS
Opinião
Pública
Civitas
Dados
Revista de
Sociologia
e Política
0
Outros
GRÁFICO 4 - Tipos de publicação
10
8
8
6
5
2
0
Dissertações e
teses
Eventos
Artigos de
periódicos
Outros
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Em “Scholar.google”, diante da diversidade de suportes em que os trabalhos foram
publicados, analisamos justamente tais suportes (Gráfico 4). Observamos certa
concentração da produção em dissertações, teses e papers apresentados em
eventos, havendo, também, razoável produção de artigos de periódicos não
constantes da primeira base. A partir desses resultados é possível antever, para um
futuro próximo, um crescimento na submissão de pesquisas em democracia
deliberativa aos periódicos mais consagrados, fortalecendo esta agenda de estudos.
8
GRÁFICO 5 - Instituição da
publicação
15
18
20
10
10
5
GRÁFICO 6 - Instituição da
publicação
4
3
3
3
0
2
2
15
10
5
2
2
UFBA
UFMG
2
0
WAPOR Outras
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Quando analisamos as instituições das publicações em “Periódicos Capes”,
obtivemos resultado semelhante (Gráfico 5). CEDEC (Centro de Estudos de Cultura
Contemporânea) e ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa
em Ciências Sociais), que publicam Lua Nova e RBCS, respectivamente, aparecem
três vezes. É interessante verificar que a PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul), apresenta quatro registros, com artigos publicados em três
de seus periódicos; Civitas, Veritas e Psico. A UFPR (Universidade Federal do
Paraná), que edita a Revista de Sociologia e Política, e o IUPERJ (Instituto
Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, ligado à Universidade Cândido
Mendes), que editou os volumes de Dados consultados, aparecem com duas
menções. As demais 10 instituições aparecem uma vez cada. Não há, portanto,
concentração institucional dos periódicos. A produção do “Scholar.google”, por seu
turno, não apresenta qualquer concentração institucional (Gráfico 6). Apenas três
instituições publicaram mais de um trabalho e, ao menos nesta base, nota-se
tendência de dispersão, com várias instituições absorvendo a produção sobre
democracia deliberativa.
Em relação ao gênero dos autores, apuramos ligeiro predomínio masculino em
“Periódicos Capes”: são 16 homens e 10 mulheres – há artigos escritos por mais de
uma pessoa (Gráfico 7). Esse dado é interessante, quando se considera a
contribuição feminista ao debate da deliberação pública, notadamente nos EUA.
Considerando, no entanto, a produção presente em “Scholar.google”, as mulheres
são em número ligeiramente maior (Gráfico 8). Ainda que as amostras sejam
pequenas para generalização a respeito de gênero dos pesquisadores em
9
democracia deliberativa, é possível pensar que a produção emergente apresentará
perfil equilibrado entre homens e mulheres.
GRÁFICO 7 - Gênero do
autor
18
20
15
GRÁFICO 8- Gênero do
autor
20
16
Mulher
Homem
15
12
10
10
5
5
0
0
Mulheres
17
Homens
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Em “Periódicos Capes”, observamos uma leve concentração institucional no tocante
à autoria (Gráfico 9). Seis artigos são de pesquisadores relacionados à UFMG
(Universidade Federal de Minas Gerais). Como não há concentração de artigos em
área ou autor específico, é de se supor que este resultado reflita o acúmulo
quantitativo e qualitativo desta instituição em pesquisas no tema e se possa
entendê-lo como medida do reconhecimento público destes atributos. Afora a
UFMG, nenhuma instituição se notabiliza pela quantidade de artigos publicados,
podendo-se, contudo, destacar UFSC e USP, cada uma como filiação institucional
de três autores.
Como ocorre com a primeira base, os autores presentes em “Scholar.google”
também distribuem-se por diversas instituições, neste caso, por 30 (Gráfico 10). No
entanto, aqui também há certo destaque para a UFMG, instituição de seis autores, o
que fortalece a constatação de que esta universidade constitui-se num centro
bastante profícuo de produção no tema em exame.
10
GRÁFICO 9 - Instituição do
autor
17
20
10
GRÁFICO 10 - Instituição
do autor
30
20
20
6
3
3
6
10
2
0
2
2
UFBA
UFPR
0
UFMG UFSC
USP
UFPEL Outras
UFMG
Outras
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
A concentração geográfica é nítida quando se consideram os estados da produção
presente em “Periódicos Capes” (Gráfico 11). Onze artigos estão em publicações do
estado de São Paulo. O Rio Grande do Sul é o estado das publicações de seis
artigos. Ao se agregar os resultados para as regiões brasileiras, a concentração
geográfica se torna ainda mais evidente (Gráfico 12). Mais da metade dos artigos
aparece em revistas do sudeste. O sul também sedia número considerável, com
nove artigos. Nordeste e centro-oeste possuem apenas uma publicação cada.
GRÁFICO 11 - Estado da
instituição da publicação
20
GRÁFICO 12 - Região da
instituição da publicação
20
11
6
10
4
3
1
1
1
0
16
9
10
1
1
NE
CO
0
SP
RS
RJ
PR
BA
DF MG
SE
GRÁFICO 13 - Estado da
instituição da publicação
S
GRÁFICO 14 - Região da
instituição da publicação
10
20
5
5
3
3
5
2
2
2
1
1
1
0
10
10
6
2
2
NE
CO
5
0
SP
RJ
RS BA MG PR DF GO SC NA*
SE
S
NA*
*Não se aplica.
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
A dispersão se repete de alguma forma quando se consideram os estados das
instituições das publicações em “Scholar.google” (Gráfico 13). Ainda que São Paulo
11
apresente algum destaque, com cinco trabalhos, a produção distribui-se por nove
diferentes estados. Ao se agregar as publicações por região, certa concentração
aparece, contudo, com destaque para Sudeste e Sul como regiões que sediam a
maioria das publicações (Gráfico 14).
GRÁFICO 15 - Estado/país
da instituição do autor
10
7
5
5
GRÁFICO 16 - Região da
instituição do autor
7
3
3
3
PR
RS
SC Outros
20
10
0
SE
0
MG
SP
GRÁFICO 17 - Estado/país
da instituição do autor
20
10
0
14
10
4
2
2
2
2
2
S
3
1
2
NE
CO
Outros
Países
Gráfico 18 - Região da
instituição do autor
20
4
9
16
6
8
10
3
3
NE
CO
0
SE
S
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
A concentração geográfica também é visível quando se considera o estado/pais das
instituições dos autores. Minas Gerais se destaca, com sete artigos em “Periódicos
Capes” (Gráfico 15). São Paulo vem logo a seguir, com autores de cinco artigos. Em
cada um dos três estados do sul – Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul –
encontram-se filiações institucionais de autores de três artigos. O agregado regional
nos permite visualizar com maior intensidade a concentração geográfica: sudeste e
sul concentram a quase totalidade das instituições: a primeira com 14 artigos e a
segunda, com nove (Gráfico 16). A análise da produção do “Scholar.google” gera
resultados bastante semelhantes e confirma Minas Gerais como um centro de
produção em democracia deliberativa (Gráfico 17). O agregado regional apresenta
números semelhantes aos da primeira base (Gráfico 18). São Paulo, Rio Grande do
Sul, Paraná e Santa Catarina também se notabilizam, especialmente quando se
somam ambas as bases.
Interpretação ligeira desses números sugeriria que centros de outras regiões
praticamente não desenvolvem estudos em democracia deliberativa – hipótese que
12
consideramos remota senão descartável. Mais plausível é supor que eles não
acedam às publicações, por diversas razões. Pode-se, por exemplo, inferir um
controle da agenda de pesquisa em algumas instituições, que direcionam a
produção em um sentido diferente daquele dado a pesquisadores locais, talvez mais
dedicados a estudos menor alcance.
GRÁFICO 19 - Área da publicação
20
15
10
5
0
16
4
Ciências Sociais
Ciência Política
6
2
3
2
Sociologia
Filosofia
Ciencias Sociais
aplicadas
Outras
GRÁFICO 20 - Área da publicação
10
6
6
5
3
5
4
2
2
Opinião Pública
Serviço Social
0
Comunicação
CiÊncias Sociais Ciência Política
Administração
Outras
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
A área de concentração predominante em “Periódicos Capes” é ciências sociais,
com 16 registros (Gráfico 19). Destes, alguns periódicos especificam mais a área de
concentração, havendo quatro que se apresentam como de ciência política e dois de
sociologia. No entanto, publicações de diversas outras áreas recebem artigos sobre
democracia deliberativa (com algum destaque para a Filosofia, com três menções)
constituindo temática de revistas devotadas a campos os mais diversos, como
administração, economia, psicologia, meio ambiente, comunicação e serviço social.
Em “Scholar.google”, constata-se presença ligeiramente mais expressiva de
publicações na área de comunicação social, além de número razoável em ciências
sociais aplicadas (Gráfico 20). No entanto, aqui também observamos uma dispersão
de áreas, o que revela o caráter multidisciplinar e a variedade de aplicações da
democracia deliberativa.
13
GRÁFICO 21 - Área do autor
15
10
8
10
4
5
1
3
3
Filosofia
Comunicação
0
Ciência Política
Sociologia
Ciências Sociais
Outras
GRÁFICO 22 - Área do autor
10
8
6
6
4
5
3
2
0
Ciência Política
Comunicação
Meio ambiente
Administração
Sociologia
Outros
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Quando se observam as áreas de concentração dos autores dos artigos, a dinâmica
é semelhante, guardando, todavia, algumas diferenças sutis. Como no caso das
publicações, a maioria absoluta dos autores em “Periódicos Capes” apresenta-se
como sendo das ciências sociais (Gráfico 21). Salientamos, contudo, o expressivo
número de dez artigos escritos por cientistas políticos – boa notícia quando se leva
em consideração algumas tendências “hiper-realistas”, quando não de menoscabo a
teorias de corte normativo, que acometem nossa disciplina. Quatro são de
sociólogos e três de pesquisadores em filosofia. Há uma profusão de campos,
podendo-se encontrar artigos de pesquisadores em comunicação, administração,
economia, interdisciplinar, meio ambiente, psicologia e serviço social.
Em “Scholar.google”, a dinâmica é semelhante e os autores das publicações se
distribuem em 11 diferentes campos do conhecimento (Gráfico 22). Aqui também o
número de autores ligados à ciência política chama a atenção, assim como os de
comunicação, devendo-se enfatizar ainda a entrada da democracia deliberativa no
campo
de
pesquisas
ambientais.
Todavia,
somando-se
ambas as
bases
examinadas, a ciência política nitidamente se sobressai, ao menos na quantidade de
pesquisadores.
14
GRÁFICO 23 - Finalidade
GRÁFICO 24 - Finalidade
22
25
20
15
10
5
0
25
20
15
10
5
0
5
Descreve
instuições/processos
participativos
Não Descreve
instuições/processos
participativos
20
5
Descreve
instuições/processos
participativos
Não Descreve
instuições/processos
participativos
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Para os fins desta investigação, classificamos a finalidade dos trabalhos em
pesquisas que descrevem instituições/processos participativos e as que não o
fazem, tendo um caráter essencialmente prescritivo. A análise nos revela que
praticamente todos os artigos de “Periódicos Capes” enquadram-se nesta segunda
categoria, sendo preocupações centrais dos autores apontar insuficiências na teoria,
problematizar e redefinir conceitos, propor como instituições – conselhos gestores
de políticas públicas, por exemplo – devem funcionar à luz da democracia
deliberativa e assim por diante (Gráfico 23). Entre a produção constante do
Scholar.google, observa-se situação oposta, com um número significativamente
maior de pesquisas que descrevem instituições/processos participativos (Gráfico 24).
GRÁFICO 25 - Método de pesquisa
30
20
10
0
21
Pesquisa
bibliográfica
20
16
3
1
1
1
Pesquisa documental
Survey
Estudo de caso
Entrevistas
GRÁFICO 26 - Método de pesquisa
9
10
8
6
4
3
Observação
Pesquisa
quantitativa
Pesquisa
bibliográfica
0
Pesquisa
documental
Entrevista
Estudo de caso
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
15
Praticamente todos os artigos em “Periódicos Capes” consistem de pesquisas
bibliográficas (Gráfico 25). Três trabalhos se valem de pesquisa documental e
somente três podem ser considerados pesquisas de campo – um survey, um estudo
de caso e um composto de entrevistas. Esses resultados têm implicações
significativas para as análises em curso. Um leitor que toma o estado das
investigações exclusivamente pelo que se publica nos periódicos de maior impacto
acadêmico – que não tenha, portanto, o desprendimento de buscar outras bases
menos cotadas – provavelmente chegaria à conclusão de que são pertinentes as
críticas endereçadas à democracia deliberativa, como um campo de estudos pouco
descritivo e mesmo de cientificidade questionável. Pode-se buscar aí uma das fontes
que alimentam um senso comum que se generalizou sobre esta agenda de estudos.
Neste ponto, as duas bases analisadas diferem, no entanto, de maneira muito nítida,
com consequências essenciais para os objetivos desta investigação.
Se na base de artigos há um predomínio quase absoluto de discussões puramente
teóricas – talvez a principal crítica externa sofrida pela democracia deliberativa – em
Scholar.google constatamos a presença maciça de pesquisas empíricas sobre
instituições participativas, o que, afinal de contas, moveu nossa busca inicial (Gráfico
26). A questão que se coloca é a natureza e a qualidade dessas pesquisas, em sua
maioria pesquisas documentais. Poucas são as investigações que articulam outras
técnicas de coleta de dados, como entrevista, observação e etnografia, bastante
apropriadas, também, quando se trata de observar ações coletivas no âmbito de
instituições políticas.
Procuramos
identificar
os
autores-chave,
aqueles
que
são
centrais
nas
argumentações desenvolvidas nos artigos. Para esta análise, não nos detivemos no
caráter do diálogo que os textos estabelecem com os autores, se mais ou menos
crítico, mas sim no fato de eles estarem presentes no núcleo central do debate
realizado. Habermas, como era de se esperar, é o mais citado, sendo um autor
chave em 17 artigos de “Periódicos Capes” (Gráfico 27). Outros são, contudo,
bastante citados, como Leonardo Avritzer, Joshua Cohen, presentes em oito artigos
cada, James Bohman e John Rawls, referenciados em, respectivamente, sete e
cinco artigos. Diversos autores são referências importantes, sendo centrais em pelo
menos dois artigos: John Dryzek, Amy Gutmann e Dennis Thompson, Jon Elster,
Sérgio Costa, Archon Fung e Lígia Lüchmann.
16
GRÁFICO 27 - Autores-chave
40
30
20
10
0
30
17
8
8
7
5
4
3
4
4
2
2
2
2
GRÁFICO 28 - Autores-chave
30
20
10
0
25
17 16
7
7
7
6
6
5
5
4
3
3
3
2
2
2
2
2
2
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Os textos presentes no “Scholar.google” apresentam grande similaridade com os da
base “Periódicos Capes” no tocante aos autores-chave, cujas conceituações
norteiam os trabalhos (Gráfico 28). Aqui, como lá, Habermas tem grande destaque,
seguido por Avritzer. Os demais autores em geral repetem-se, com algumas trocas
de posição em relação às suas posições no ranking. Vale salientar, apenas, que a
primeira base talvez respeite mais o cânone da democracia deliberativa, com os
autores que se destacam nitidamente fazendo parte desta vertente teórica, o que
não ocorre, necessariamente, em todos os casos da segunda base bibliográfica
examinada.
De todo modo, considerando-se o conjunto dos trabalhos, nota-se que, salvo poucas
exceções, os referentes principais das pesquisas são autores da perspectiva teórica
em apreço. Por um lado, isso sugere que se trata de um campo com razoável grau
de amadurecimento, com um processo de teorização e conceituação consistente e
coerente. Por outro lado, pode-se pensar que, tal como ocorre em qualquer campo
de pesquisa, a democracia deliberativa tem seus próceres, cuja autoridade legitima
os argumentos de quem os cita.
17
GRÁFICO 30 - Conceito de
democracia deliberativa
GRÁFICO 29 - Conceito de
democracia deliberativa
Participação social
direta
Participação social
direta
0
Incorporação das
diferenças
12
Institucionalização/
democratização do
estado
19
Concepção
habermasiana pura
Incorporação das
diferenças
11
Institucionalização/
democratização do
estado
11
Concepção
habermasiana pura
0
0
2
5
10
15
20
6
0
5
10
15
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Como dissemos acima, abundam evidências de que a democracia deliberativa
forjou, ao longo de mais de cinco décadas de desenvolvimento, um campo teórico
razoavelmente amadurecido, que passou por importantes reelaborações de suas
concepções originais. Sem entrar num debate aprofundado, apontamos algumas
tendências, não opostas nem contraditórias, que muitas vezes se intersecionam.
Após a leitura dos 52 trabalhos que compunham nossas bases bibliográficas, na
qual aglutinamos as definições que os perpassam, categorizamos essas tendências
de um modo que nos fosse possível classificar a produção no tocante aos conceitos
adotados de democracia deliberativa. Estabelecemos, então, uma tipologia com
quatro possibilidades: 1) Concepção habermasiana pura; 2) Incorporação das
diferenças; 3) Institucionalização/ democratização do Estado; e, 4) Participação
social direta.
No primeiro tipo, foram classificados trabalhos que adotavam a noção habermasiana
original de democracia deliberativa, calcada na defesa de uma esfera pública na
qual os cidadãos, livres das coerções dos subsistemas político e econômico
governados pela razão instrumental e que teriam colonizado o mundo vivido,
participariam de processos discussão e deliberação cuja resultante seria o consenso
fundado na razão comunicativa. A deliberação pública esbateria as assimetrias de
poder que caracterizam o sistema e sua lógica: as decisões seriam produto do
18
melhor argumento, não reproduzindo simplesmente tais assimetrias Pressupõe-se,
aqui, um discurso de valor neutro, dado que os participantes, na troca de
argumentos, devem abandonar suas disposições e pressupostos iniciais. Habermas
pensou o agir comunicativo para espaços informais, sobretudo, do cotidiano.
Apenas seis trabalhos, todos na base “Scholar.google”, atêm-se exclusivamente a
esta definição (Gráfico 30).
Os tipos 2 e 3 formam concepções que nascem na esteira da crítica interna à própria
democracia deliberativa, promovendo, na verdade, seu aggiornamento, sem no
entanto romper com os pressupostos mais fundamentais da teoria.
Sob a expressão incorporação das diferenças, incluímos as definições que aduzem
os limites da concepção de uma esfera pública unívoca, neutra e racional que, no
limite,
pode
reproduzir
disposições
e
lógicas
masculinas,
ocidentais,
heteronormativas etc. As definições em pauta reconhecem que o processo
deliberativo aporta assimetrias e diversidades sociais, econômicas, culturais,
identitárias etc. Há que se falar, então, numa multiplicidade de esferas e de públicos,
cuja incorporação, com suas diferentes narrativas, razões e argumentos, é
obrigatória se se quer referir a um processo verdadeiramente deliberativo, que
promova empoderamento dos participantes. O consenso aqui não se direciona tanto
ao conteúdo da deliberação, mas ao reconhecimento e à consideração dos direitos e
das
diferenças
dos
participantes/concernidos,
em
especial
de
estratos
historicamente marginalizados/estigmatizados que supere a mera agregação de
preferências. Trata-se, naturalmente de uma síntese, reconhecidamente superficial e
arbitrária, mas cujo manto abriga autores distintos como Seyla Benhabib, Iris Young,
Nancy Fraser, James Bohman, Amy Gutmann e Dennis Thompson entre outros. Tal
conceito esta presente em 11 trabalhos em cada uma das bases bibliográficas
analisadas, quantidade bastante expressiva (Gráficos 29 e 30).
A categoria institucionalização/democratização do Estado abarca as concepções
segundo as quais a democracia deliberativa é uma proposta de superação dos
limites que a democracia representativa coloca às instituições políticas, sobretudo na
esfera estatal. Trata-se de visão procedimental, para a qual a construção de
instituições/processos participativos e deliberativos contribui para incremento da
qualidade da democracia, à medida que se propicie a máxima inclusão possível dos
concernidos nos processos decisórios. Os trabalhos nesta linha argumentativa – 19
19
em “Periódicos Capes” e 11 em “Scholar.google” – , em geral também incorporam os
elementos da categoria discutida acima e aportam conceituações de autores como
Seyla Benhabib, Joshua Cohen, Leonardo Avritzer, Boaventura Santos, Sérgio
Costa, entre outros.
No último tipo, participação social direta, classificamos dois trabalhos presentes em
Scholar.google que, na realidade, equivocadamente tratam os conceitos de
democracia deliberativa e democracia participativa, tal como definido por Carole
Pateman, como sinônimos. De todo modo, podemos afirmar as pesquisas sobre
democracia deliberativa no Brasil têm buscado incorporar e atualizar o debate
teórico que se faz no campo, incorporando críticas pertinentes às formulações
originais.
GRÁFICO 31 - Adesão à
democracia deliberativa
20
30
16
23
20
8
10
GRÁFICO 32 - Adesão à
democracia deliberativa
3
10
2
0
Média
Fraca
0
0
Forte
Média
Fraca
Forte
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Outra mensuração que fizemos foi o grau de adesão dos trabalhos à democracia
deliberativa. A ideia aqui foi ponderar como as pesquisas se relacionam com a teoria
em termos de concordância e crítica. Desse modo, avaliamos como forte a adesão
do texto que apresente forte concordância e um teor crítico baixo ou nulo em relação
à democracia deliberativa. A adesão média implica concordância e/ou crítica
moderada e a fraca, a presença de posições discordantes e/ou de críticas mais
intensas. Constatamos que pouco mais da metade dos artigos (16) em “Periódicos
Capes” aderem fortemente à Democracia Deliberativa, o dobro dos que apresentam
adesão média (Gráfico 31). Apenas três artigos apresentam adesão fraca, ou seja,
são nitidamente críticos da teoria em questão. Tal dinâmica é ainda mais intensa em
“Scholar.google”, em que praticamente todos os trabalhos apresentam adesão forte
e não há registro de adesão fraca (Gráfico 32). A existência de artigos da primeira
base que adotam tom mais crítico reflete o número significativamente maior de
20
discussões eminentemente teóricas, que indicam possíveis limites da democracia
deliberativa.
Nas análises, constatamos uma grande profusão de objetos e temas. Para os
propósitos desta investigação o que mais chama a atenção é, no entanto, o fato de a
maioria das pesquisas (27) constituir discussões teóricas voltadas à validez e aos
limites e possibilidades dos elementos constitutivos da democracia deliberativa. Isso
ocorre notadamente em “Periódicos Capes”. Raros são, nesta base, os estudos que
investigam processos deliberativos reais.
GRÁFICO 33 - Categorias/variáveis mobilizadas
25
20
15
10
5
0
21
10
8
6
6
6
6
5
4
2
2
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Para analisar as categorias/variáveis mobilizadas nas pesquisas, optamos por
avaliar somente os trabalhos que descrevem instituições/processos participativos
concretos. Desse modo, agrupamos as duas bases bibliográficas devido ao número
pouco expressivo de pesquisas empíricas em “Periódicos Capes”. Procedemos,
então, a uma categorização, em que termos por vezes ligeiramente diferentes foram
aglutinados. Mesmo assim, dezenas de categorias/variáveis emergiram (Gráfico 33).
É expressiva a quantidade de pesquisas que de alguma forma buscaram aferir a
efetividade e avaliar o desenho institucional e o funcionamento da deliberação, além
das implicações do processo para a gestão das políticas, num sinal de que
pesquisadores estão em busca dos resultados dos processos deliberativos e das
instituições participativas que se multiplicaram nas últimas décadas. Outro dado
interessante
é
a
existência
de
diversas
pesquisas
que
mobilizam
21
categorias/variáveis
como
inclusão/diferença,
democracia,
participação
e
accountability, sugerindo a preocupação das investigações com o potencial inclusivo
e de incremento da qualidade da democracia ofertado pelas experiências de
deliberação.
GRÁFICO 34 Instituição/processo
participativo
GRÁFICO 35 Instituição/processo
participativo
Conferência
0
Conferência
Comitês e consórcios
0
Comitês e consórcios
Orçamento Participativo
e assemelhados
0
Orçamento Participativo
e assemelhados
TICs
3
TICs
Conselho(s) gestor(es) de
política(s) pública(s)
3
Conselho(s) gestor(es)
de política(s) pública(s)
0
5
10
1
2
4
6
8
0
5
10
Fonte: elaboração própria a partir de Periódicos Capes e Scholar.google
Ainda considerando apenas as pesquisas empíricas, em sua maioria presentes em
“Scholar.google”, a instituição participativa mais pesquisada são conselhos gestores
de políticas públicas (Gráficos 34 e 35). Há, também, número significativo de
estudos cujo objeto são as TICs (tecnologias da Informação e da comunicação),
sobretudo a internet e seu uso, tanto por instituições tradicionais, como órgãos do
executivo e do legislativo, quanto como uma espécie de ágora virtual, que sedia o
debate público dos mais variados temas. Outros objetos de pesquisa identificados
foram orçamentos participativos e assemelhados (como audiências públicas
orçamentárias) e comitês e consórcios intermunicipais.
22
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O atual estado de nossas investigações, se não possibilitou a construção de um
repositório significativo de pesquisas que analisam instituições participativas à luz da
democracia deliberativa, objetivo que continuaremos a perseguir, ao menos permitiu
problematizar a afirmação comumente vinculada de que a democracia deliberativa
tem como uma de suas principais limitações prescrever e não descrever.
Aparentemente, após analisar dezenas de artigos que mobilizam o tema nas bases
congregam os periódicos de mais impacto acadêmico, a hipótese é verdadeira. No
entanto, ela precisa ser relativizada se considerarmos a produção presente em teses
e dissertações, artigos de periódicos de menor impacto e papers apresentados em
eventos, por exemplo, na qual a pesquisa empírica de instituições/processos
participativos brasileiros floresce.
Nas principais publicações, constata-se um predomínio quase absoluto de trabalhos
teóricos, de revisão de literatura, e uma ausência quase completa de estudos
empíricos, embora seja este um clamor da teoria, conforme nos assevera Chambers
(2009). Isso pode significar várias coisas, como, por exemplo, barreiras à entrada de
produção mais empírica nos periódicos mais consagrados (inclusive pode-se pensar
nisso como um desalento, que faz com que possíveis autores sequer submetam
seus trabalhos). De todo modo, esta produção, pouco comparece aos veículos de
maior difusão. Mesmo contribuições que teriam um objeto empírico (poder judiciário,
processo legislativo, democracia eletrônica, conselhos gestores etc), constituem
mais propostas de agenda de pesquisa e de operacionalização dos conceitos do que
sua aplicação propriamente dita. As publicações presentes em “Periódicos Capes”
precisam se abrir às pesquisas empíricas, sob pena de se legitimar uma crítica
pouco judiciosa à democracia deliberativa.
Em “Scholar.google”, onde se encontra uma produção que chamaríamos de
emergente, menos consagrada, não faltam análises de instituições, processos e
espaços concretos de participação, debate e mesmo de deliberação, formais ou
informais. Nesta base, é possível apreender uma profusão de objetos – ainda que
haja concentração nos tradicionais conselhos gestores de políticas públicas, os
estudos
abrem-se
às
transformações
sociais,
incorporando,
entre
outras
possibilidades, as Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) e as
23
potencialidades que elas abrem à deliberação pública. Vislumbra-se, no entanto,
pouca criatividade do ponto de vista metodológico. A grande maioria dos trabalhos
constitui estudos de caso cuja principal técnica de coleta de dados é a pesquisa
documental, sendo mais escassas pesquisas propriamente de campo com
entrevistas, observações e outras técnicas assemelhadas, aplicadas só ou
conjugadas.
Algumas características estão presentes nas duas bases pesquisadas. Em ambas, a
democracia deliberativa assoma como teoria e tema de investigação multidisciplinar,
aplicável a múltiplos objetos, em diversas áreas do conhecimento e com variegadas
alternativas de mobilização de categorias e variáveis. Certa concentração regional é
claramente identificável e alguns centros de produção e publicação nitidamente se
destacam, quase todos localizados em estados das regiões sudeste e sul do Brasil.
Uma benéfica busca pela atualização do debate teórico está em marcha, com os
pesquisadores incorporando as críticas internas às formulações originais da
democracia deliberativa.
De um ponto de vista mais teórico, o debate mais visível é entre noções mais
habermasianas, que destaca esferas informais e a produção de consensos a partir
de uma ideia de neutralidade discursiva, e uma que poderíamos denominar
coheniana, que critica justamente esses dois pontos, clamando pela necessidade de
institucionalização das arenas e ressaltando o processo inclusivo. A este último
ponto, soma-se a questão das diferenças, do reconhecimento dos múltiplos públicos
e esferas que compõem os processos de deliberação pública, também incorporada
ao debate teórico e cuja operacionalização é de alguma forma tentada nas
pesquisas empíricas. De todo modo, ao menos na produção empírica analisada, as
pesquisas não têm seguido as tendências mencionadas no início deste paper e que
preocupam Cláudia Faria, de afastamento dos pressupostos originais da teoria, mas
sim buscado aperfeiçoá-los, quando não radicalizá-los.
Mais do que achados definitivos, o estágio atual da pesquisa traz novas perguntas e
aponta a necessidade de, no futuro da investigação, tanto de monitorar a produção
publicada nas bases mais consagradas, constantes em “Periódicos Capes”, para
verificar a eventual inclusão de pesquisas empíricas, quanto de ampliar as bases
bibliográficas consultadas, com a análise de mais teses e dissertações, livros e
coletâneas, eventos, etc. Espera-se, com isso, capturar possíveis inovações, tanto
24
nos objetos investigados e categorias mobilizadas, quanto nas técnicas de coleta e
análise de dados e construir uma visão mais clara e abrangente do desenvolvimento
da agenda de pesquisa, especialmente empírica, em democracia deliberativa no
Brasil.
4. REFERÊNCIAS
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25
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SOUZA, J. Democracia hoje: novos desafios para a teoria democrática. Brasília:
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ANEXO - Trabalhos analisados
Perídicos Capes
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Godoy&aufirst=Amalia%20Maria%20Goldberg&auinit=&title=%20Estudos%20do%20CEPE&atitle=Descentraliza%C3%A7%C3%A3o%2C%20or%C3%A7
amento%20e%20os%20conselhos%20municipais&sici=&__service_type=&pid=%3Cmetalib_doc_number%3E021594633%3C/metalib_doc_number%3E
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