Guilherme Jonas Costa da Silva POUPANÇA EXTERNA, CONTROLE DE CAPITAIS E PERFORMANCE MACROECONÔMICA: TEORIA E EVIDÊNCIA Orientador: Dr. José Luís da Costa Oreiro CURITIBA - PR 2004 2 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE ECONOMIA CURSO DE MESTRADO EM ECONOMIA POUPANÇA EXTERNA, CONTROLE DE CAPITAIS E PERFORMANCE MACROECONÔMICA: TEORIA E EVIDÊNCIA Dissertação apresentada por Guilherme Jonas Costa da Silva ao curso de Mestrado em Desenvolvimento Econômico da Universidade Federal do Paraná, como exigência parcial para a obtenção do título de mestre. Orientador: Professor Dr. José Luís da C. Oreiro. CURITIBA – PR 2004 3 POUPANÇA EXTERNA, CONTROLE DE CAPITAIS E PERFORMANCE MACROECONÔMICA: TEORIA E EVIDÊNCIA Guilherme Jonas Costa da Silva Dissertação submetida ao curso de Mestrado em Desenvolvimento Econômico da Universidade Federal do Paraná, como exigência parcial para a obtenção do título de mestre em economia. Aprovada por: ______________________________________________ Dr. José Luís da Costa Oreiro (UFPR - Orientador) ______________________________________________ Dr. Luiz Fernando Rodrigues de Paula (UERJ) ______________________________________________ Dr. José Gabriel Porcile Meirelles (UFPR) Curitiba, 12 de agosto de 2004 4 Dedico este trabalho ao meu pai, o senhor José Guilherme Souza da Silva 5 Agradecimentos A Deus pela vida, pela saúde e pela oportunidade de avançar mais um degrau nessa caminhada. Ao meu orientador Professor José Luís da Costa Oreiro, uma pessoa idônea e íntegra, um excelente profissional, um exemplo a ser seguido. Obrigado, por compartilhar parte de seus conhecimentos e do seu tempo, fundamentais para a elaboração deste trabalho. Agradeçolhe ainda por estar sempre por perto na qualidade de amigo e conselheiro. Aos professores Luiz Fernando R. de Paula e José Luís da C. Oreiro por terem me dado a oportunidade de trabalhar como pesquisador assistente no PRONEX (IE-UFRJ), pela oportunidade de escrever diversos trabalhos juntos, trabalhos estes que tiveram uma importância inestimável na minha formação profissional. Aos Professores José Gabriel Porcile Meirelles e ao Doutorando do Manuel Carlos de Castro Pires (Instituto de Economia - UFRJ) pela atenção e informações despendidas na realização da parte econométrica do trabalho. Um agradecimento especial ao meu grande amigo Fabio Hideki Ono pela ajuda prestada a elaboração das simulações computacionais e pelo prazer de poder ter trabalhado junto em diversos artigos. Aos professores Luiz Fernando R. de Paula e José Gabriel Porcile Meirelles que gentilmente aceitaram o convite de fazerem parte da banca examinadora. Aos professores Ramón Garcia Fernandes, José Gabriel Porcile Meirelles, Marcelo Luiz Curado, Maurício Aguiar Serra, Luiz Alberto Esteves e demais professores que de forma direta ou indireta contribuíram para minha formação acadêmica. A secretária do Mestrado em Desenvolvimento Econômico Ivone Portela, pela atenção e paciência despendida ao longo do mestrado. Aos amigos conquistados durante o mestrado Marcos Wagner, Arthur Coelho, Kronghon Regueira, Terezinha Saracini, Marcio Cruz, Fabrício Missio, Breno Lemos, Rodrigo Padilha, Eufrásio Sabonete, Inácio Guerberoff e demais colegas que por falta de espaço não pude mencioná-los. 6 Evidentemente, nenhuma palavra exprimiria a minha gratidão aos meus pais pela confiança e carinho despendidos ao longo de minha vida, por isso faço um agradecimento especial aos dois, o Sr. José Guilherme S. da Silva e a Sra. Ana Janille M. C. da Silva. Agradecimentos eternos pelos incentivos e pela compreensão da ausência quase constante do convívio do lar, aos meus irmãos Guilherme Jorge, Guilherme James, Fernando Motta, Marcelo de Oliveira, Gabriel de Oliveira e a Sônia, mãe do meu irmãozinho Gabriel. Ao meu grande amor Kelly Nassu, pelo incentivo e apoio durante esses dois anos de namoro e convivência. Por fim, ao CNPq pelo apoio financeiro durante o mestrado em economia. 7 SUMÁRIO Resumo ................................................................................................................................... 9 1 - Introdução ....................................................................................................................... 10 2 – Poupança Externa, Fluxo de Capitais e Vulnerabilidade Externa: A Experiência Recente da Economia Brasileira......................................................................................................... 15 2.1 - Introdução................................................................................................................. 15 2.2 – O Consenso de Washington e a Abertura Externa da Economia Brasileira............ 16 2.3 - O Modelo de Crescimento com Poupança Externa.................................................. 17 2.4 – A Experiência Recente de Crescimento com Poupança Externa da Economia Brasileira........................................................................................................................... 19 2.5 – As Críticas a Estratégia de Crescimento com Poupança Externa da Economia Brasileira........................................................................................................................... 30 5.6 - Conclusão ................................................................................................................. 33 3 – Controle de Capitais: Teoria e Evidência Internacional................................................. 34 3.1 - Introdução................................................................................................................. 34 3.2 – Liberalização da Conta de Capital e Performance Macroeconômica: uma Revisão da Literatura Empírica Recente ........................................................................................ 35 3.3 – A Teoria Econômica dos Controles de Capitais...................................................... 40 3.4 – A Experiência Recente de Controle sobre o Ingresso de Capitais: o Caso do Chile .......................................................................................................................................... 46 3.5 – A Experiência Recente de Controle sobre a saída de Capitais: O caso da Malásia 51 3.6 - Conclusão ................................................................................................................. 55 4 – Política Cambial, Fluxo e Controle de Capitais no Brasil.............................................. 56 4.1 - Introdução................................................................................................................. 56 4.2 – Política Cambial e o Caráter Endógeno dos Controles de Capitais no Brasil ......... 57 4.3 – Controle de Capitais e seus Desdobramentos: uma Estimação com Vetores Auto Regressivos (VAR) a partir da Experiência Recente da Economia Brasileira ................. 69 8 4.4 – Implicações Macroeconômicas da Legislação Cambial: a Crítica de Franco & Pinho Neto ........................................................................................................................ 78 4.5 – Por uma Moeda Plenamente Conversível: a Crítica de Arida ................................. 79 4.6 – Por Uma Moeda Parcialmente Conversível: uma Crítica a Arida........................... 82 4.7 - Conclusão ................................................................................................................. 84 5 – Crescimento Endógeno, Endividamento Externo e Controle de Capitais em Economias Emergentes: Cenários Macroeconômicos ............................................................................ 85 5.1 - Introdução................................................................................................................. 85 5.2 – A Estrutura Básica do Modelo Teórico ................................................................... 87 5.3 – Endividamento Externo e Equilíbrios Múltiplos: a Dinâmica do Modelo no Longo Prazo ................................................................................................................................. 93 5.4 – Análise da Estabilidade ........................................................................................... 96 5.5 – Dinâmica e Resultados das Simulações Computacionais........................................ 98 5.6 - Conclusão ............................................................................................................... 106 6. Considerações Finais ...................................................................................................... 107 7. Bibliografia..................................................................................................................... 110 9 Resumo Este trabalho tem por objetivo é analisar a estratégia de crescimento da economia brasileira na década de noventa. Os resultados mostram que a estratégia não foi bem sucedida, ao contrário comprometeu o crescimento do país, gerou instabilidade macroeconômica e uma situação de vulnerabilidade externa. Apresenta-se neste trabalho o controle de capitais como uma política alternativa para melhorar a performance macroeconômica da economia brasileira. Para tanto desenvolve-se uma discussão da teoria dos controles de capitais, fazse uma análise da experiência nacional e internacional com controle de capitais e elabora-se um modelo macrodinâmico de inspiração pós-keynesiana para demonstrar que a introdução dessas medidas restritivas sobre o fluxo de capitais permite melhorar a performance macroeconômica e reduzir a vulnerabilidade externa das economias emergentes. Uma conclusão importante extraída do modelo é que os controles de capitais não afetam a estabilidade da posição de equilíbrio com baixo endividamento. Dessa forma, não há razão objetiva para se acreditar que a adoção desses controles possa contribuir para aumentar a instabilidade das economias emergentes. Palavras-chave: Poupança Externa; Controle de Capitais; Performance Macroeconômica. 10 1 - Introdução A economia brasileira na década de noventa, implementou o novo modelo de crescimento, que contemplou um grau de abertura comercial e da conta de capitais substancialmente maior, com o objetivo de proporcionar a princípio a estabilidade de preços, um aumento da produtividade e uma diminuição da sua vulnerabilidade externa. O objetivo geral deste trabalho é fazer uma análise da estratégia de crescimento adotada pela economia brasileira na década de noventa, com intuito de mostrar evidências de que estratégia de crescimento com poupança externa não foi bem sucedida, ao contrário, comprometeu o crescimento do país, gerou instabilidade macroeconômica e uma situação de vulnerabilidade externa. A análise baseia-se no argumento de que essa estratégia manteve a economia brasileira semi-estagnada e sob constante ameaça de crise no balanço de pagamento. Os objetivos específicos deste trabalho são: • Apresentar os controles de capitais como uma política alternativa para melhorar a performance macroeconômica das economias emergentes; • Fazer uma análise da experiência nacional e internacional com controle de capitais; • Elaborar um modelo macrodinâmico de inspiração pós-keynesiana para demonstrar que a introdução dessas medidas restritivas sobre o fluxo de capitais permite melhorar a performance macroeconômica e reduzir a vulnerabilidade externa das economias emergentes. Para atingir os objetivos propostos, o trabalho foi estruturado em seis capítulos: além desta introdução, apresenta-se no segundo capítulo uma análise da estratégia de crescimento adotada pela economia brasileira. No capítulo seguinte, desenvolve-se uma discussão sobre a teoria de controle de capitais, apontando algumas evidências bem sucedidas da adoção dessas medidas em economias emergentes, notadamente, no Chile e na Malásia. No quarto capítulo, analisa-se a experiência brasileira de controles de capitais mostrando evidências de que essas medidas podem ser eficazes no sentido de estimular o crescimento da economia brasileira. No quinto capítulo, apresenta-se um modelo macrodinâmico de inspiração pós-keynesiana no qual a taxa de crescimento do produto real é uma variável endógena com o objetivo de se analisar os efeitos da introdução de controles 11 de capitais sobre a performance macroeconômica de economias emergentes. Por fim, as conclusões sumarizam os resultados obtidos ao longo do trabalho. A discussão referente a estratégia de crescimento da economia brasileira é na verdade uma breve contextualização do modelo adotado na década de noventa, onde são detalhados os pressupostos e os resultados alcançados pelo país. Os fundamentos dessa estratégia estão, em boa medida, associados às recomendações do “Consenso de Washington”, cujo objetivo era sanear as economias latino-americanas altamente endividadas. Os pressupostos implícitos do modelo de crescimento com poupança externa são: i) a poupança que determina o investimento; ii) as economias em desenvolvimento possuem insuficiência de poupança, portanto, não restaria outra opção senão contar com a poupança externa para financiar o crescimento; iii) a obtenção de poupança externa requer uma maior abertura comercial e financeira da economia. A economia brasileira no início da década de 1990 caminhou para uma abertura comercial e financeira maior do que a vigente na década de 1980, elevou a taxa de juros e valorizou a taxa de câmbio. Com efeito, as autoridades monetárias lograram êxito na geração de poupança externa, contudo, essas políticas não se traduziram em crescimento. No terceiro capítulo busca-se encontrar evidências na literatura internacional de que a regulação preventiva da contas de capitais contribui para melhorar a performance macroeconômica do Chile e da Malásia. No contexto de significativa instabilidade dos fluxos de capitais de curto prazo, notadamente nos países emergentes, torna-se pertinente entender melhor as medidas recentemente tomadas pelo Chile e pela Malásia para controlar os capitais para contornar os efeitos deletérios da liberalização. A análise empírica internacional realizada mostrou que de fato os controles sobre o influxo de capitais adotado pela economia Chile contribuiu para melhorar a performance macroeconômica do país, na medida em que conseguiram conter a apreciação da taxa de câmbio a ponto de financiar seus déficits em transações correntes fundamentalmente com investimento direto estrangeiro. Por isso, tem sido citado freqüentemente como um caso de uso efetivo de controle sobre o influxo de capitais. 12 O caso da Malásia é particularmente interessante por ter logrado êxito em controlar a saída dos capitais durante uma crise financeira, em fixar a taxa de câmbio, reduzir a taxa de juros e atenuar a recessão. Apesar de muito criticada na época de sua adoção, tem sido recentemente avaliada de forma positiva em função dos resultados alcançados. A economia brasileira ao longo da década de 1990 caminhou para uma abertura crescente da conta de capitais com intuito que melhorar o crescimento econômico. Esse processo tornou o país mais suscetível as crises cambiais/financeiras, que foram combatidas com medidas incipientes de controle de capitais que visavam estimular à captação de recursos e/ou flexibilização dos prazos de captação. Na verdade, as autoridades monetárias utilizavam basicamente duas medidas: i) a alíquota de IOF incidente sobre várias operações financeiras, como fundos de renda fixa, operações interbancárias e constituição de disponibilidades no país; ii) o prazo médio mínimo de amortização para novos empréstimos, renovações e prorrogações. A análise econométrica desenvolvida nesse capítulo mostrou evidências de que o país poderia ter gerados resultado bastante satisfatórios, no sentido de melhorar a performance macroeconômica, caso tivesse utilizado os controles de capitais de forma mais severa. Em síntese, apesar das evidências não serem conclusivas, pode-se afirmar a princípio que os controles de capitais influenciam as variações na taxa de câmbio e na taxa de juros. Portanto, caso as autoridades monetárias intensificassem o uso dos controles de capitais no Brasil, poderiam tornar a taxa de câmbio relativamente mais estável e reduzir a variação da taxa de juros, conseqüentemente, melhorar o crescimento econômico do país. Por fim, no último apresenta-se um modelo macrodinâmico de inspiração póskeynesiana que teve por objetivo mostrar que os controles de capitais influenciam positivamente a performance macroeconômica das economias emergentes. Para tanto, parte-se dos modelos desenvolvidos por Oreiro (2004) e Oreiro & Guerberoff. Uma limitação importante dessas análises é que a taxa de crescimento do produto real é tomada como exógena. Em outras palavras, ambos os modelos não especificam os determinantes do crescimento de longo-prazo das economias capitalistas. 13 Nesse contexto, o presente capítulo é uma contribuição no sentido de eliminar essa deficiência dos referidos modelos. Com efeito, desenvolve-se um modelo macrodinâmico semelhante aos desenvolvidos por Oreiro (2004) e Oreiro & Guerberoff (2004) no qual a taxa de crescimento do produto real é uma variável endógena. Dessa forma, pode-se reavaliar o impacto da introdução dos controles de capitais sobre a dinâmica de longo-prazo de economias emergentes, levando-se em conta as possíveis interações desses controles sobre a performance macroeconômica dessas economias. Mais especificamente, o modelo aqui apresentado tem por objetivo analisar o impacto dos controles de capitais sobre a trajetória temporal da lucratividade, do endividamento externo, da taxa doméstica de juros, do crescimento econômico, do nível de utilização da capacidade produtiva e das exportações líquidas. A complexidade imposta pelo grande números parâmetros do modelo, a única forma de se analisar a estabilidade das posições de equilíbrio de longo prazo é por intermédio de simulações computacionais. para uma certa constelação de valores economicamente plausíveis para os parâmetros do modelo, o equilíbrio com baixo endividamento foi estável, ao passo que o equilíbrio com alto endividamento mostrou-se instável. Esse resultado contrasta fortemente com os resultados obtidos por Oreiro (2004) e Oreiro & Guerberoff (2004). Com efeito, nos modelos apresentados por esses autores, o equilíbrio com alto endividamento era estável, ao passo que o equilíbrio com baixo endividamento era instável do tipo trajetória de sela. Daqui se segue que um resultado importante da endogenização da taxa de crescimento do produto real é tornar estável o equilíbrio com baixo endividamento. O impacto da introdução dos controles de capitais sobre as trajetórias de equilíbrio das variáveis em consideração foram: i) permitir uma redução do valor de equilíbrio de longo-prazo da taxa de juros, uma aceleração da taxa de crescimento do produto real e um aumento do nível de utilização da capacidade produtiva; ii) o efeito positivo dos controles sobre a taxa de crescimento permite que o endividamento externo como proporção do estoque de capital seja reduzido, de forma que a vulnerabilidade 14 externa da economia também é reduzida; iii) O único efeito deletério das medidas restritivas sobre o fluxo de capitais é um aumento do déficit em transações correntes. Uma outra conclusão importante extraída do modelo é que os controles de capitais não afetam a estabilidade da posição de equilíbrio com baixo endividamento. Dessa forma, não há razão objetiva para se acreditar que a adoção desses controles possa contribuir para aumentar a instabilidade das economias emergentes. 15 2 – Poupança Externa, Fluxo de Capitais e Vulnerabilidade Externa: A Experiência Recente da Economia Brasileira 2.1 - Introdução Durante muitos anos, as autoridades econômicas da economia brasileira implementaram políticas para colocar o Brasil novamente na trajetória de crescimento econômico sustentável. Mas, com a crise da dívida em 1982 e o conseqüente esgotamento do modelo de substituição de importações, houve a necessidade de um redirecionamento das políticas implementadas pelo país. Era quase que consensual no final da década de oitenta que o país deveria implementar políticas com vista a liberalizar a economia e começar sua inserção no mercado internacional. Com efeito, a economia brasileira caminhou para uma abertura crescente da conta de capitais na expectativa de gerar a poupança externa necessária para complementar a insuficiência de poupança interna do país e, conseqüentemente, coloca-lo novamente na trajetória de crescimento sustentável. Os fundamentos da estratégia de desenvolvimento da economia brasileira na década de noventa estão, em grande medida, associados às recomendações do paradigma conhecido como “Consenso de Washington”. O modelo de crescimento com poupança externa baseia-se fundamentalmente no pressuposto de que os países em desenvolvimento tem uma carência de poupança doméstica que só pode ser eliminada com poupança externa. A obtenção de poupança externa requer a abertura comercial e da conta de capital. A partir da implantação do plano real, o país de fato aumentou a poupança externa, mas as custas de uma elevação das taxas de juros internas (que atraiu capital de curto prazo) a qual somou-se uma posição favorável do país na captação dos investimentos diretos. Nesse contexto, este capítulo tem por objetivo analisar a estratégia de crescimento da economia brasileira na década de noventa, seus fundamentos e os resultados alcançados. 16 2.2 – O Consenso de Washington e a Abertura Externa da Economia Brasileira Durante muitos anos, acreditou-se que o caminho para reduzir a vulnerabilidade externa na América Latina seria por intermédio do processo de Industrialização por Substituição de Importações. O objetivo era proteger a indústria nascente, a fim de permitir o país se industrializar e, posteriormente, introduzir setores tecnologicamente mais avançados e com maior valor agregado. Contudo, segundo Franco (1998), a experiência da economia brasileira mostrou que este não era o melhor caminho para atenuar a suscetibilidade do país a choques adversos, tendo em vista que ficaria mais difícil para a economia brasileira aumentar o superávit comercial na magnitude necessária para fazer o ajustamento diante de uma crise externa, tornando-a mais propensa à instabilidade macroeconômica. Portanto, esse modelo de crescimento, ao contrário, tornaria o país mais vulnerável as incertezas do mercado. As economias latino-americanas buscaram implementar políticas econômicas para que o país retomasse a trajetória de crescimento econômico. Mas, com a crise da dívida de 1982 e o conseqüente esgotamento do processo de substituição de importações, houve a necessidade de um redirecionamento das políticas adotadas pelos países em desenvolvimento. Os graves problemas macroeconômicos, aliados aos baixos níveis de crescimento, a queda na produtividade dos fatores e os resultados observados pelas economias do sudeste asiático influenciaram os economistas brasileiros a refletirem sobre propostas alternativas de política econômica. A partir desse diagnóstico, os gestores da política econômica optaram por mudar a estratégia de crescimento da economia brasileira, começaram a direcionar as políticas a fim de implantar um novo modelo, baseado no processo de abertura comercial e financeira da economia. Os fundamentos da estratégia de desenvolvimento da economia brasileira na década de noventa estão, em grande medida, associados às recomendações do paradigma conhecido como “Consenso de Washington”, cujo principal objetivo era sanear as economias latino-americanas altamente endividadas. O “Consenso de Washington” estabeleceu um conjunto de medidas de política econômica que nortearia as economias em 17 desenvolvimento a fim de que aproveitassem melhor as oportunidades geradas pela globalização e evitassem os “inconvenientes” das políticas do Estado. O Consenso de Washington consistia numa lista de dez reformas da política econômica para conduzir os países latino-americanos ao desenvolvimento econômico1. Essas políticas tinham por objetivo proporcionar as economias latino americanas fontes alternativas de financiamento externo para a retomada do crescimento. Inicialmente, as políticas adotadas pelos governos da América Latina estavam apoiadas em quatro supostos2: 1. A estabilidade de preços cria condições para o cálculo econômico de longo prazo, estimulando o investimento privado; 2. A maior abertura comercial impõe disciplina competitiva aos produtores domésticos, forçando-os a realizar ganhos substanciais de produtividade; 3. As privatizações e o investimento estrangeiro removeriam gargalos de oferta na indústria e na infra-estrutura, reduzindo custos e melhorando a eficiência; 4. A abertura da conta de capital, associada à previsibilidade quanto a evolução da taxa real de câmbio, atrairia poupança externa em escala suficiente para complementar o esforço de investimento doméstico e para financiar o déficit em conta correntes. O pressuposto implícito no “Consenso de Washington” é que, os países em desenvolvimento possuem insuficiência da poupança doméstica tornando-se, portanto, necessário a participação da poupança externa como fonte complementar de financiamento dos investimentos. 2.3 - O Modelo de Crescimento com Poupança Externa A economia brasileira na década de noventa, implementou o novo modelo de crescimento, que contemplou um grau de abertura comercial e da conta de capitais substancialmente maior do que o vigente. O objetivo era fazer com que o país observasse a princípio, um aumento da sua produtividade e uma diminuição da sua vulnerabilidade externa. 1 2 Para obter mais detalhes sobre as reformas, consultar Williamson (2004). Belluzzo & Carneiro (2004b). 18 Para entender a intuição do modelo de crescimento com poupança externa parte-se de algumas identidades macroeconômicas. Numa economia aberta, a renda nacional é igual ao dispêndio interno e externo em bens e serviços produzidos por fatores de produção domésticos, mais as transferências unilaterais, menos a renda líquida enviada para o exterior3: Y = C + I + G + (X – M + T - R) (1) em que Y = renda nacional; C = consumo; I = investimento; G = gasto do governo; X = exportações; M = importações; T = transferências unilaterais; R = renda líquida enviada ao exterior. Assumindo que: (X – M + T - R) = TC (2) onde TC = saldo do balanço de pagamentos em transações correntes Rearranjando (1), demonstra-se que os excessos de dispêndio sobre a renda podem ser compensados pela captação de poupança externa, que é contabilmente igual ao déficit em transações correntes do balanço de pagamentos. Y – (C + I + G) = TC => (Y - C – G) - I = TC (3) Sabe-se também que: (Y - C – G) = Si = poupança interna Do exposto, segue que: Si – I = TC (4) Se + Si – I = 0 (5) O pressuposto desse modelo é que a poupança determina o investimento, de forma que, o crescimento pode ser financiado em boa medida com poupança externa. Conforme observado nas identidades descritas acima, o déficit em transações correntes reflete, por definição, a insuficiência de poupança interna para dado nível de investimento. O excesso de investimento sobre a poupança interna é coberto pela captação de poupança 3 Para mais detalhes do modelo de crescimento com poupança externa, consultar Aurélio (1999). 19 externa. Assim, para a economia brasileira melhorar a sua performance macroeconômica, necessariamente deveria incorrer em déficits em transações correntes. A partir desse modelo, conclui-se que o maior crescimento econômico pode se dar a partir de um maior volume de investimento e de inovação tecnológica, financiado em grande medida por poupança externa. Os investimentos, ou melhor, acréscimos ao estoque de capital produzem tanto mais crescimento quanto maior a relação incremental capital/produto. 2.4 – A Experiência Recente de Crescimento com Poupança Externa da Economia Brasileira Durante toda a década de 1970, o financiamento do crescimento se deu em grande medida com recursos públicos, mas após a crise de 1982, a participação tanto da poupança pública quanto a poupança externa caíram drasticamente, reduzindo a participação do Estado na economia. No período de 1982-1994 a responsabilidade do crescimento da economia brasileira recaiu fundamentalmente sobre a poupança privada. Conforme observa-se no Gráfico 1 e na Tabela I, essa situação ainda não foi revertida, o que aconteceu recentemente foi uma substituição de poupança interna por poupança externa. Todavia, em 1997, a economia brasileira começou a lograr déficits em transações correntes superiores a 4% do PIB, o que num segundo momento poderia fragilizar as contas externas. A evolução da poupança agregada do país até 1999 mostra que houve uma redução da mesma para a casa dos 19% do PIB. 20 Gráfico 1 Poupança Agregada da Economia Brasileira no período 1970-2002 25,00% 20,00% Percentual 15,00% 10,00% 5,00% 0,00% 1970-82 1983-89 1990-94 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 -5,00% -10,00% Anos Pública Externa Privada Fonte: Franco (1998) e Ipeadata. Tabela I - Poupança Externa e Poupança Agregada da Economia Brasileira na década de 1990 Discriminação 1990 1992 1994 1995 1996 1997 1998 1999 Poupança 1% -2% 0% 3% 3% 4% 4% 3% 21% 21% 22% 21% 19% 19% 19% 19% Externa Poupança Agregada Fonte: Indicadores do Banco Mundial (2001) A década de noventa pode ser caracterizada para o Brasil, como um período em que o país voltou a ter acesso ao mercado financeiro internacional, de forma que a restrição de liquidez e de financiamento externo que caracterizou a década anterior foi revertida. Segundo LICHA (2000), a partir de 1994 o fluxo de capitais tornou-se muito volátil, ocasionando uma série de crises cambiais provocadas pela fuga desses capitais originadas em mudanças nas expectativas dos agentes. 21 Segundo Paula, Oreiro & Silva (2003) o movimento dos fluxos de capitais no Brasil no período recente mostra a forte volatilidade desses fluxos, com impactos instabilizadores sobre o comportamento e a determinação da taxa de câmbio nominal. Em particular, os capitais de curto prazo e os capitais de portfólio são bastante sensíveis a mudanças nas condições de risco e liquidez do mercado financeiro internacional e foram responsáveis por fortes saídas de capitais em momentos críticos de especulação cambial. O Gráfico 2 mostra o comportamento dos principais componentes da conta financeira do balanço de pagamentos no Brasil, para o período 1990-20024. Os dados foram agregados trimestralmente, o que permite uma análise mais detalhada do fluxo de capitais no período recente. Uma das diferenças da nova metodologia é a supressão da rubrica “capital de curto prazo”, que fica agora agregada na rubrica “outros investimentos”. Gráfico 2 Fluxo de Capitais: 1990-2002 50000 40000 30000 20000 4 trim 02 1 trim 02 2 trim 01 3 trim 00 4 trim 99 1 trim 99 2 trim 98 3 trim 97 4 trim 96 1 trim 96 2 trim 95 3 trim 94 4 trim 93 1 trim 93 2 trim 92 -20000 3 trim 91 -10000 4 trim 90 0 1trim 90 Fluxo 10000 -30000 -40000 -50000 Trimestre I.1)Investimento Direto(líquido) I.2)Investimento em Carteira I.4)Outros Investimentos Fonte: Banco Central do Brasil 4 Este segue nova metodologia do balanço de pagamentos, adotada a partir de janeiro de 2001, cujos critérios de classificação segue a metodologia do Manual do Balanço de Pagamentos do Fundo Monetário Internacional (FMI) 22 O aumento do fluxo de capitais no Brasil resultou, basicamente, da conjugação de quatro fatores (Soihet, 2002): (i) normalização das relações do país com a comunidade financeira internacional, por meio da regularização da renegociação da dívida externa com os bancos credores e da conclusão, em abril de 1994, da regularização dos empréstimos atrasados nos moldes do Plano Brady; (ii) advento do Plano Real a partir de julho de 1994, que resultou, inicialmente, em uma maior estabilidade macroeconômica no país; (iii) queda da taxa de juros internacional nos países desenvolvidos, o que os levou a procurar oportunidades mais atraentes em países em desenvolvimento; (iv) maior abertura no que diz respeito à movimentação de capital, através da liberalização na estrutura normativa que rege a entrada e saída de capitais estrangeiros no Brasil. A economia brasileira nos últimos anos vem apresentando um comportamento do tipo “stop and go”. O Gráfico 3, apresenta a performance macroeconômica do Brasil década de 1990, onde se constatou que o país cresceu mais de 4% apenas nos primeiros anos do Plano Real, a partir de então tem sido marcada por uma tendência a semiestagnação. Gráfico 3 P roduto Interno B ruto da Econom ia Brasileira na década de 1990 8 6 4 2 0 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 -2 -4 -6 P eríodo P IB:var.realanual Fonte: Ipeadata 1998 1999 2000 2001 2002 2003 23 O desempenho da economia brasileira na década de noventa foi fortemente influenciado pelo mercado internacional de capitais por intermédio da atração de capital estrangeiro para financiar as contas externas a partir da manutenção de taxas de juros elevadas. As implicações desse tipo de política são consideráveis sem contar que torna o país extremamente suscetível e dependente desses fluxos de capitais, pois refletem a liquidez internacional, tendo em vista que, nos períodos de escassez de liquidez internacional, o país é obrigado a adotar políticas restritivas. Evidentemente, quase todas as economias em desenvolvimento têm sofrido com as constantes crises no mercado financeiro internacional, no entanto, sabe-se que a intensidade dessas crises varia de acordo com a percepção de vulnerabilidade externa de cada país, devido a níveis em que se encontram as relações de endividamento. Desde o início da década de noventa, a economia brasileira vem testemunhando algumas mudanças, principalmente após 1994. Com a implementação do Plano Real5, a economia brasileira conseguiu controlar a alta inflação que impedia o desenvolvimento do país desde a década de 80. Mas, para isso, o país desestabilizou o balanço de pagamentos e manteve a taxa de juros real em patamares significativamente elevados. Para Batista Jr. (1999) os elementos centrais do Plano Real foram assentados na combinação de uma acentuada valorização cambial com aceleração da abertura comercial, que não teria sido possível sem a farta disponibilidade de capitais externos. A abertura comercial constituiu-se basicamente em redução das barreiras ao comércio e diminuição dos custos dos importados no país, o que implicaria em acirramento da concorrência e intensificação da reestruturação da indústria brasileira. A ancoragem cambial adotada tinha por objetivo manter o câmbio valorizado a fim de baratear os produtos importados, incentivando a concorrência. O governo estava apostando que esse desequilíbrio seria provisório, tendo em vista que o crescimento substantivo de importações de bens de capital implicaria num aumento dos investimentos e da competitividade das empresas nacionais, revertendo o cenário desfavorável. Segundo Franco (1998) seria justamente o processo de abertura, através de seus efeitos sobre o dinamismo tecnológico do país, que definiria os contornos básicos do novo ciclo de crescimento. 5 Conjunto de medidas que tinha por objetivo conter o avanço da inflação. 24 Em que pese o superávit observado recente na balança comercial, fruto principalmente da desvalorização cambial ocorrida em 2002, nota-se que ao longo dos últimos anos, o país logrou déficits comerciais sucessivos. Além disso, uma parcela significativa do déficit em conta correntes é proveniente do setor de serviços, que tendem a se elevar em períodos futuros, devido as remessas de juros e lucros. (Gráfico 4) Gráfico 4 Saldo Acumulado em Transações Correntes: 1991-2002 20000 10000 19 3T 91 19 1T 91 19 3T 92 19 1T 92 19 3T 93 19 1T 93 19 3T 94 19 1T 94 19 3T 95 19 1T 95 19 3T 96 19 1T 96 19 3T 97 19 1T 97 19 3T 98 19 1T 98 19 3T 99 19 1T 99 20 3T 00 20 1T 00 20 3T 01 20 1T 01 20 3T 02 20 02 1T US$ milhões 0 -10000 -20000 -30000 -40000 Trimestre Transações correntes (saldo) Balança comercial (saldo) Serviços e rendas (líquido) Fonte : Banco Central do Brasil A intensificação da vulnerabilidade externa da economia brasileira fica evidente quando se observa a evolução do indicador Déficit em Transações Correntes/PIB. Apesar desse indicador ter oscilado e até sinalizado alguns déficits nos primeiros anos da década de noventa, percebe-se que a partir da implantação do Plano Real, esse indicador atingiu valores críticos, ultrapassando a barreira de 4% do PIB6.(Gráfico 5) 6 O Banco Mundial aponta que, uma tendência prudente do déficit em transações correntes deve ser de no máximo 4% do PIB. 25 Gráfico 5 Saldo em Transações Correntes/PIB: 1990-2002 2,00% 1,00% NOV/2002 ABR/2002 SET/2001 FEV/2001 JUL/2000 DEZ/1999 MAI/1999 OUT/1998 MAR/1998 AGO/1997 JAN/1997 JUN/1996 NOV/1995 ABR/1995 SET/1994 FEV/1994 JUL/1993 DEZ/1992 MAI/1992 OUT/1991 MAR/1991 -2,00% AGO/1990 -1,00% JAN/1990 US$ milhões 0,00% -3,00% -4,00% -5,00% -6,00% Período Saldo em Transações Correntes/PIB Fonte: Banco Central do Brasil Segundo Paula & Alves Jr.(1999) muitas das críticas dirigidas ao Plano Real referem-se às conseqüências do padrão de financiamento dos déficits em transações correntes e dos compromissos financeiros assumidos no passando recente, tendo em vista que a manutenção de taxas de juros elevadas, apesar de atrair capitais externos, promove uma apreciação real do câmbio. Os efeitos desta configuração de política econômica contribuiu para o aumento da fragilidade financeira externa do país7, à medida que a dependência de obtenção de financiamentos externos - para evitar crises de balanço de pagamentos - estaria aumentando. Apesar do inegável êxito dos formuladores do Real no combate a inflação, deve-se considerar os custos da estabilização para a economia brasileira. Percebe-se que uma série de indicadores piorou, como o insuficiente crescimento da economia brasileira e 26 o aumento do nível de desemprego. Entre os principais problemas, destaca-se também o crescimento insuficiente das exportações que culminou no desequilíbrio da balança comercial, o que intensificou os desequilíbrios em transações correntes, já que historicamente o Brasil é “deficitário” na balança de serviços. Com isso, aumentou a necessidade de atrair capital estrangeiro para fechar o balanço de pagamentos. A adoção da política de juros elevados para atrair capital estrangeiro acabou promovendo um significativo aumento da dívida interna e externa e uma redução dos investimentos produtivos. O Banco Central tem sido obrigado a elevar a taxa de juros para reverter o fluxo de saída de capitais e impedir o aumento da inflação devido à desvalorização do câmbio, acabando por afetar tanto o crescimento econômico quanto o volume da dívida pública.8 Observando-se o grau de endividamento público (Gráfico 6), percebe-se que em 2002, o indicador atingiu níveis críticos. O rápido crescimento da relação dívida pública/PIB nos primeiros meses de 1999 e no segundo semestre de 2002, foi resultado da combinação de taxa de juros reais elevadas e baixo crescimento do produto. 7 A fragilidade financeira externa de uma economia está relacionada à sua maior (ou menor) suscetibilidade à ocorrência de crises do balanço de pagamentos. 8 Oreiro, Sicsú & Paula (2003). 27 Gráfico 6 Dívida Pública (% PIB) : 1991-2002 70 60 % PIB 50 40 30 20 10 2002 07 2002 01 2001 07 2001 01 2000 07 2000 01 1999 07 1999 01 1998 07 1998 01 1997 07 1997 01 1996 07 1996 01 1995 07 1995 01 1994 07 1994 01 1993 07 1993 01 1992 07 1992 01 1991 07 1991 01 0 Período Dívida - total - setor público - líquida ( % PIB ) Fonte: Ipeadata A elevação das taxas de juros, na medida em que eleva o componente financeiro do déficit operacional e amplia a fragilidade financeira do governo brasileiro, torna a manutenção desta política, a longo prazo, insustentável, tendo em vista que expõe a economia às flutuações cambiais. A insustentabilidade da dívida pública a longo prazo proveniente do programa de ajustamento macroeconômico implementado pelo Plano Real torna a economia brasileira vulnerável a uma crise cambial9. O potencial de crescimento (comprometido por políticas econômicas equivocadas) e uma situação de vulnerabilidade externa são os principais fatores geradores da desestabilização macroeconômica10. A observação desses indicadores sinalizava, em alguma medida, aos gestores da política econômica os problemas nos fundamentos da economia brasileira, que a deixava exposta a um ataque especulativo, já que houve um 9 Curado, 2001. Entende-se por Vulnerabilidade Externa a incapacidade da economia enfrentar as flutuações externas. 10 28 aprofundamento do processo de internacionalização e um aumento do grau de mobilidade de capital, fatores que favorecem a difusão de crises por contágio. Segundo Simonsen & Cisne (1995) para avaliar a vulnerabilidade externa da economia brasileira, o indicador dívida externa/exportações é muito interessante, pois mostra a capacidade da economia gerar dólares, de modo a que se possa fazer uma avaliação da capacidade de pagamento dos compromissos externos por um país. Observando-se o Gráfico 7, percebe-se que em praticamente toda a década de 90, exceto em 1999, o indicador situou-se em torno de 400%, um nível que o economista Mario Henrique Simonsen considerava crítico, ou seja, a partir do qual o Brasil estaria altamente propenso a sofrer um ataque especulativo11. Gráfico 7 Indicador de Vulnerabildade Externa: 1990-2002 600% 500% 400% 300% 200% 100% 2002 T4 2002 T1 2001 T2 2000 T3 1999 T4 1999 T1 1998 T2 1997 T3 1996 T4 1996 T1 1995 T2 1994 T3 1993 T4 1993 T1 1992 T2 1991 T3 1990 T4 1990 T1 0% Trimestre Divida Externa Total/Exportações Fonte: Banco Central do Brasil 11 A situação externa de um país da seguinte forma: um país com uma relação divida externa/exportações inferior a 2 está em situação confortável, entre 2 e 4 está em situação duvidosa, enquanto se for superior a 4 está em situação crítica. (Simonsen & Cisne, 1995) 29 Nesse contexto, em janeiro de 1999, a economia brasileira sofre um ataque especulativo contra a sua moeda implicando numa profunda desvalorização da taxa de câmbio e na mudança do regime cambial. Contudo, a economia ainda carecia de uma âncora que guiasse as expectativas dos agentes privados quanto a determinação do nível de preços e da taxa de inflação. Ciente disso, o governo brasileiro anunciou o regime de metas inflacionárias, onde caberia ao Banco Central implementar as políticas monetárias a fim de manter a inflação dentro dos intervalos preestabelecidos. Assim sendo, esperava-se que este regime eliminasse as distorções sobre os preços decorrentes da forte desvalorização cambial promovida pelo ataque especulativo. Apesar da significativa desvalorização cambial ocorrida em princípios de 1999, os déficits na balança comercial persistiram, demonstrando a capacidade limitada de ajuste dos desequilíbrios comerciais apenas por intermédio das alterações na taxa de câmbio. Em que pese os superávits recentes na balança comercial, observa-se que o Brasil tem uma capacidade limitada de gerar saldos comerciais, resultado do reduzido desenvolvimento tecnológico do produto nacional associado a um padrão de especialização voltado para setores pouco dinâmicos no comércio internacional12.Nos últimos anos, este fato ficou mais evidente, percebeu-se que a economia brasileira tem dificuldade de ajustar os saldos comerciais apenas via desvalorização cambial, fruto do caráter estrutural do desequilíbrio externo, ou seja, da falta de competitividade do produto nacional. A política comercial e a falta de competitividade externa foram fatores determinantes para a intensificação do déficit em transações correntes que a economia brasileira apresentou recentemente, aumentando a sua dependência do financiamento externo. As recentes experiências sugerem que o aumento do endividamento de curto prazo cria problemas especiais para a manutenção da estabilidade financeira. Por um lado, a manutenção de taxas de juros elevadas intensifica o endividamento público sendo necessário um ajuste fiscal significativo. Por outro lado, a atração de capital de curto prazo torna a economia suscetível à mudanças das expectativas dos investidores internacionais. 12 No tocante aos problemas estruturais dos déficits comerciais, não entraremos no mérito da questão por fugir aos objetivos do trabalho. Para mais informações, consultar Xavier (2000) e IEDI (2003). 30 Os problemas relacionados com movimentos de capital internacional ocorrem quando há uma fuga repentina de capital de um certo país, desvalorizando a moeda local. Caso o país possua condições sólidas, com dívida interna e externa administradas em patamares sustentáveis, a conseqüência de uma súbita saída de capitais não é tão significativa. Mas, havendo a possibilidade de calote da dívida interna e externa devido à estrutura do endividamento ser essencialmente de curto prazo, as implicações macroeconômicas são intensas. Nesse caso, o país pode, e deve, controlar seus próprios empréstimos buscando ao máximo alongar o perfil da dívida, para se proteger do risco cambial associado à choques externos. Portanto, a questão central na elaboração de uma estratégia para enfrentar esse problema deve estar ancorada numa regulação preventiva e numa sólida administração financeira. A maior parte dos países latino-americanos, com notável exceção do Chile, que estabeleceu claros limites ao ingresso de capitais, seguiu a estratégia de crescimento com poupança externa. Dos países que seguiram essa estratégia, todos sofreram uma crise: o México, em 1994; o Brasil, em 1999; e a Argentina, em 2001. (Bresser & Nakano, 2003) 2.5 – As Críticas a Estratégia de Crescimento com Poupança Externa da Economia Brasileira A teoria convencional do crescimento geralmente aceita o pressuposto de que as economias em desenvolvimento13 com mobilidade perfeita de capitais crescerão mais depressa, tendo em vista que a poupança aumentará o investimento e, conseqüentemente, dinamismo dessas economias, fazendo-os atingir os níveis de crescimento observados pelos países desenvolvidos. Nas palavras de Romer (1996): “An issue that has attracted considerable attention in empirical work on growth is whether poor countries tend to grow faster than rich countries. There are at least three reasons that one might expect such convergence. First, the Solow model predicts countries converge to their balanced growth paths. Thus to the extent that differences in output per worker arise from countries being at different points relative to their balanced growth paths, one would expect the poorer countries to catch up to the richer. Second, the Solow model implies that the rate of return on capital is lower in countries with more capital per worker. Thus there are incentives for capital to 13 Que, portanto, possuem um retorno relativamente maior sobre o capital. 31 flow from rich to poor countries; this will also tend to cause convergence. And third, if there are lags in the diffusion of knowledge, income differences can arise because some countries are not yet employing the best available technologies. These differences might tend to shrink as poorer countries gain access to state-of-art methods.” (Romer, 1996, 30p.) O pressuposto implícito nessa visão é que os países em desenvolvimento não possuem poupança interna suficiente para financiar o desenvolvimento econômico e que, portanto, não restaria outra opção se não contar com a poupança externa. O modelo de crescimento com poupança externa não se sustenta porque está consolidado em bases frágeis, tendo em vista que não é a poupança que determina o investimento, mas o investimento que determina a poupança. Nas palavras de Possas (2001): “A poupança não financia o investimento, inicialmente porque ela não precede nem temporal nem logicamente, o investimento (inexiste logicamente uma poupança ex ante); ela é por definição um fluxo de rendimentos simultâneo ao investimento e por ele determinado. Segundo porque quem financia o investimento é o crédito, este sim, um estoque – de poder de compra, criado ex nihilo pelo sistema bancário – que precede lógica e temporalmente o investimento ...” (Possas, 2001, 108p) Segundo Bresser-Nakano (2003), o pressuposto de que a economia brasileira não teria outra opção se não contar com a poupança externa não é verdadeira pois, a questão central não é proporcionar-lhes poupança, mas criar um ambiente econômico estável e seguro, em que os empresários possam investir, expandir a capacidade industrial e gerar a poupança necessária. A tese defendida por Bresser-Nakano está fundamentada nos resultados encontrados por Feldstein & Horioka (1980), que mostraram evidências de que há uma forte correlação entre poupança interna e investimento, e não entre poupança externa e investimento. Portanto, a idéia é que a longo prazo o ingresso de poupança externa não aumentará, necessariamente, a taxa de investimento, tendo em vista que um país não pode tomar emprestado indefinidamente quando existe um limite ao endividamento externo14. No curto prazo, Bresser-Nakano (2003, 13p.), observaram que um país só pode se beneficiar da poupança externa, se na fase de tomada de empréstimo, todos os recursos 32 disponíveis forem produtivamente investidos na economia. “Em outras palavras, se na fase de tomada de empréstimos o país tiver uma razoável estabilidade macroeconômica, um programa forte de investimentos, com um governo engajado em políticas industriais, tecnológicas e comerciais ativas e competentes, além de uma dívida externa dentro dos limites de endividamento, realmente a disponibilidade de poupança externa representará um fator positivo na promoção do crescimento econômico”. No entanto, a maioria dos países da América Latina, no momento em que observou-se o retorno do fluxo de capitais, não haviam atingido as condições básicas para que a poupança externa se correlacionasse positivamente com o crescimento. A entrada de capitais valorizou as moedas locais, aumentou o poder aquisitivo da população e intensificou o déficit em transações correntes, que é financiado com o ingresso de mais capital, gerando um círculo vicioso, resultando numa maior instabilidade macroeconômica. Para Bresser-Nakano (2003, 19p.), “as previsões da estratégia de crescimento com poupança externa não deram certo, não porque os mercados não fossem livres, ou porque o ajuste fiscal não tenha sido suficiente (embora sempre pudesse ter sido melhor), mas porque tal estratégia não leva à estabilidade macroeconômica e a credibilidade, ao contrário, ela leva à manutenção da instabilidade derivada da fragilidade financeira do setor externo”. Bresser-Nakano (2003) defendem que para a economia brasileira sair dessa situação, deve-se fazer um ajuste fiscal forte acima dos níveis de geralmente exigidos pelo FMI, combinado com redução da taxa de juros interna e desvalorização da moeda (taxa de câmbio realista) numa magnitude suficiente para estabilizar o equilíbrio intertemporal nas contas externas. O obstáculo central a ser enfrentado pelos países que adotaram a estratégia de crescimento com poupança externa é a restrição externa, mas isso não significa que os países irão superá-las por meio de empréstimos adicionais. Ao contrário, esses países precisam aumentar as exportações ou comprometer-se com a substituição competitiva das importações a fim de reduzir as relações da dívida externa e atingir o equilíbrio das contas externas. 14 Em outras palavras, um país não pode incorrer em déficits sucessivos na conta corrente, tendo em vista que acaba gerando novas dívidas que depois de um certo nível de endividamento começa a ter efeitos negativos sobre a estabilidade macroeconômica e o crescimento econômico. 33 5.6 - Conclusão A análise realizada ao longo deste capítulo mostrou que apesar das políticas implementadas na década de noventa terem obtido êxito na geração de poupança externa (principalmente) via aumento da taxa de juros, notou-se que essa política comprometeu o potencial de crescimento do país, gerou instabilidade macroeconômica e uma situação de vulnerabilidade externa, que culminou numa crise cambial. A estratégia de crescimento com poupança externa não se sustentou porque está consolidada em bases frágeis, tendo em vista que não é a poupança que determina o investimento, mas o investimento que determina a poupança. Para Bresser-Nakano, a questão central não é proporcionar poupança a economia brasileira, mas criar um ambiente econômico estável e seguro, em que os empresários possam investir, expandir a capacidade industrial e gerar a poupança necessária. O desempenho da economia brasileira na década de noventa foi bastante influenciado pelo mercado internacional de capitais devido a necessidade de atração do capital estrangeiro para financiar as contas externas. As implicações desse tipo de política são consideráveis sem contar que deixou o país extremamente dependente desses fluxos de capitais, que são muito voláteis, pois refletem a liquidez internacional. Contudo, uma opção interessante para a economia brasileira enfrentar esse problema deve começar por uma regulação preventiva e numa sólida administração financeira. 34 3 – Controle de Capitais: Teoria e Evidência Internacional 3.1 - Introdução As economias emergentes têm freqüentemente enfrentado períodos de grande instabilidade no mercado financeiro internacional. As incertezas e a excessiva volatilidade do fluxo de capitais se devem, em boa medida, aos constantes choques ocorridos na economia mundial e a elevada vulnerabilidade externa derivada da necessidade de financiar os grandes déficits em transações correntes. A literatura empírica recente não chegou a um consenso a respeito da relação entre abertura da conta de capital e performance macroeconômica. Alguns autores argumentam que, na verdade, a liberalização está associada a um aumento da fragilidade financeira e a incidência de crises cambiais/financeiras. No contexto de significativa instabilidade dos fluxos de capitais de curto prazo, notadamente nos países emergentes, torna-se pertinente entender melhor as medidas recentemente adotadas por alguns países para controlar os capitais e contornar os efeitos deletérios da liberalização. Para tanto, desenvolve-se inicialmente uma discussão da teoria econômica dos controles de capitais, os tipos, os objetivos e seus desdobramentos. Para efeito de discussão empírica sobre controle de capitais, realiza-se uma análise do caso do Chile (1991-98), que tem sido citado freqüentemente como um caso de uso efetivo de controle sobre o influxo de capitais. O caso da Malásia (a partir de 1998) é particularmente interessante por ter logrado êxito em controlar a saída dos capitais durante uma crise financeira. Apesar de muito criticada na época de sua adoção, tem sido recentemente avaliada de forma positiva em função dos resultados alcançados. 35 3.2 – Liberalização da Conta de Capital e Performance Macroeconômica: uma Revisão da Literatura Empírica Recente Até a primeira metade da década de noventa era quase consensual, que o processo de abertura da conta de capital era importante para as economias emergentes, mas especulava-se como deveria se dar a inserção desses países no processo, pois acreditava-se que se não fosse realizado com cautela e de forma gradual, os resultados poderiam ser desastrosos. Segundo Franco & Neto (2004) essa decisão tem que ser tomada quando o processo de estabilização estiver consolidado, os fundamentos econômicos estiverem solidificados e o sistema financeiro doméstico estiver forte, caso contrário seria uma aventura imprudente. Segundo o autor, as autoridades monetárias domésticas devem pensar em qual a melhor estratégia e o melhor momento para o país adotar o regime de conversibilidade plena da conta de capitais. As evidências a respeito das externalidades positivas da liberalização até meados da década de 1990 eram aceitas pela maioria dos acadêmicos, mas quando uma sucessão de crises cambiais começou a ocorrer no final da década passada, reacendeu a discussão. Nas palavras de Edwards (2001): “The opening of domestic capital markets to foreigners is, perhaps, the most reviled aspect of this “consensus.”... Indeed, a number of academics have argued that the free(er) mobility of private capital during the 1990s was behind the succession of crises that the emerging markets experienced during that decade. According to this view, increased capital mobility inflicts many costs and generates (very) limited benefits to the emerging nations. It has been argued that, since emerging markets lack modern financial institutions, they are particularly vulnerable to the volatility of global financial market” (Edwards, 2001, 1p.). A literatura empírica recente está longe de chegar a um consenso sobre a correlação entre liberalização da conta de capitais e performance macroeconômica, por diversos fatores, tais como as diferentes metodologias utilizadas para o cálculo da liberalização e o tamanho e a heterogeneidade da amostra. 36 A literatura acadêmica convencional, freqüentemente argumenta que o aumento do crescimento econômico de um determinado país será resultado do aumento da liberalização financeira das economias. Dennis Quinn (1997), realizou recentemente um trabalho pioneiro, utilizando abordagens estatísticas, com intuito de perceber se há ou não uma correlação robusta entre a liberalização da conta de capitais e o crescimento econômico de longo prazo. Para captar a liberalização da conta de capitais, o autor elaborou um índice para mensurar o grau de abertura da conta de capitais a partir da evolução de controles e restrições à conversibilidade. Os dados de 64 países (20 países desenvolvidos e 44 emergentes) para o período de 1958-89 foram utilizados na análise15. O resultado, segundo o autor, é que de fato há uma associação robusta entre liberalização financeira internacional e o crescimento econômico. Juntamente com o investimento e o nível de renda inicial as variáveis que poderiam ser incluídas na análise dos determinantes do crescimento de longo prazo. Nas palavras de Quinn (1997): “To my knowlegge, this is the first systematic demonstration of a robust correlation between change in capital account regulation and long-run economic growth. The results suggest to economic growth. It joins investiment and initial level of income as variables that should be included in analisis of the determinants of longrun economic growth” (Quinn, 1997, 537p.). Um trabalho freqüentemente citado na literatura internacional é o de Rodrik (1998). O autor realiza uma análise estatística para avaliar a relação entre liberalização da conta de capitais e performance macroeconômica. A amostra utilizada era de quase 100 países desenvolvidos e em desenvolvimento. O indicador de liberalização da conta de capital era definido como a proporção de anos durante 1975-1989 em que a conta de capital do país esteve livre de todas as restrições. Rodrik concluiu que não há evidência alguma de que os países sem controles de capitais cresceram mais rapidamente. Portanto, a liberalização da conta de capital não tem nenhuma relação significativa com o desempenho macroeconômico no longo prazo. Rodrik testou também a hipótese de que a liberalização da conta de capital pôde ter tido efeitos benéficos nos países com instituições fortes, e novamente, os resultados não foram significativos. 37 Edwards (2001), utilizando uma metodologia semelhante à desenvolvida por Dennis Quinn, analisou empiricamente a relação entre o desempenho econômico e a mobilidade da conta de capitais. O autor estava interessado em compreender duas questões fundamentais, a primeira é se há alguma evidência de que uma mobilidade maior da conta de capital está associada (após controlar para outros fatores) com o crescimento mais elevado. A segunda questão é, será que os efeitos da liberalização da conta de capital sobre o crescimento são iguais para todas as economias. Edwards, a fim de capitar a heterogeneidade de cada região (país) considerou seis grupos de países (utilizando à classificação das estatísticas financeiras internacionais do FMI): (1) industrializados; (2) africanos; (3) asiáticos; (4) europeus não-industrializados; (5) Middle East e (6) América latina e Caribe. O período de análise foi 1975-1997. Os resultados surpreenderam, a correlação positiva entre liberalização e crescimento se dá apenas nas economias industrializadas e nos países emergentes mais ricos. Nas palavras de Edwards (2001): “Although this analysis is preliminary, the results reported in this paper suggests, quite strongly, that the positive relationship between capital account openness and productivity performance only manifests itself after the country in question has reached a certain degree of development. A plausible interpretation is that countries can only take advantage, in the net, of a greater mobility of capital once they have developed a somewhat advanced domestic financial market” (Edwards, 2001, 16p.). Segundo alguns autores, o problema é que os países pobres não têm instituições desenvolvidas o suficiente para controlar eficientemente um grande volume de movimento de capital e, portanto, não estão preparados para desfrutar dos benefícios da liberalização da conta de capital. Atualmente, as implicações da liberalização da conta de capital sobre o crescimento estão entre as questões mais controversas da literatura monetária e financeira internacional. Os estudos prévios da questão foram, em sua maioria inconclusivos, porque as análises não distinguiram o fato de que os efeitos na liberalização sobre o crescimento se dão através de dois canais que operam com diferentes graus de intensidade em diferentes tempos e lugares. 15 Mais detalhes sobre a metodologia do índice pode ser encontrado em Quinn (1997). 38 Eichengreend & Lebrang (2002) argumentam que, quando os mercados financeiros estão funcionando bem e outras distorções estão ausentes, os fluxos de capitais fluem tranqüilamente para os setores com elevada taxa de retorno. Com efeito, a liberalização da conta de capital conduz a uma alocação mais eficiente dos recursos e ao crescimento econômico mais rápido. Por outro lado, quando há problemas no mercado financeiro doméstico e internacional – instabilidade financeira em particular – a abertura financeira traz conseqüências que não são boas, pois aumenta a suscetibilidade do país a uma crise, tendo provavelmente um efeito negativo sobre o crescimento. Dessa forma, o impacto da liberalização da conta de capitais sobre o crescimento é mais provável de ser positivo quando os mercados financeiros domésticos são bem desenvolvidos e regulados e as operações do sistema financeiro internacional estão tranqüilas e estáveis. Caso contrário, quando o mercado financeiro doméstico não é bem desenvolvido, o país estará sujeito a crises e a relação entre liberalização e crescimento é negativa. Para provar seus argumentos, Eichengreend & Lebrang (2002) estimaram um modelo utilizando dados de 21 países no período 1880-1997. Esses dados incluem os períodos do padrão ouro, das crises das décadas de 1920 e 1930, da relativa estabilidade dos anos de Bretton Woods, e do pós-1971. O objetivo era captar uma maior variação na estrutura e performance do sistema financeiro internacional. Ao estimarem a regressão para encontrar os determinantes do crescimento no período em consideração, observaram que há uma relação positiva dos controles de capitais com o crescimento nos momentos de maior instabilidade financeira, notadamente nos períodos de crise. Contudo, os efeitos positivos da manutenção da conta de capital aberta sobre o crescimento dominam os efeitos dos controles. Nas palavras de Eichengreend & Lebrang (2002): “Our results suggest that the net effect is context specific: it is positive in periods of financial instability, when the insulating capacity of controls is precious, but negative when crises are absent and the direct effect an open capital account the positive effect on resource allocation and efficiency - tends to dominate” (Eichengreend & Lebrang, 2002, 23p.). 39 Os resultados dos autores sugerem que os efeitos positivos da liberalização da conta de capital sobre crescimento são mais significativos na maior parte do tempo, principalmente quando o país possui mercado financeiro doméstico bem desenvolvido. O efeito dos controles de capitais sobre o crescimento são importantes apenas em momentos de instabilidade financeira. Prassad et al (2003) realizaram um estudo recentemente para apreender, entre outras coisas, os efeitos da globalização financeira sobre o crescimento. Apesar dos modelos teóricos identificarem possíveis canais dos efeitos positivos da liberalização da conta de capital sobre a performance macroeconômica, não se pode generalizar. Os resultados encontrados mostram que a Jordânia e Peru encontram-se entre os países com pior desempenho em termos de taxa de crescimento do produto per capita no período de 1980-2000 e são países que possuem suas conta de capital significativamente aberta. Por outro lado, Prassad et al (2003) observaram que países como Mauritius e Botswana lograram taxas de crescimento muito elevadas e não possuem suas contas de capital totalmente abertas. O exame das evidências encontradas pelos autores mostrou que é difícil estabelecer uma relação causal forte e robusta da liberalização da conta de capitais e performance macroeconômica. Tornell, Westermann & Martinez (2004), realizaram um trabalho com o intuito de apreender a relação entre liberalização, crescimento e fragilidade financeira. Os autores mostraram os países em desenvolvimento que liberalizaram o comércio, liberalizaram na seqüência a conta de capital, a qual tem conduzido a um aumento da fragilidade financeira e a incidência de crises. Contudo, a liberalização financeira também tem conduzido a um maior crescimento do PIB. Na literatura empírica recente, há um relativo consenso da relação positiva entre liberalização comercial e crescimento, mas o mesmo não acontece com relação aos efeitos positivos da liberalização financeira sobre o crescimento, em grande medida, porque a liberalização financeira está associada ao risco imposto pelo excessivo fluxo de capitais, lending booms e crises. 40 Para testar a relação entre liberalização financeira e crescimento, Tornell, Westermann & Martinez (2004), realizaram uma bateria de testes econométricos. Para tanto, incorporaram a variável liberalização a regressão padrão de crescimento. Os resultados apontaram que a variável liberalização entra significativamente ao nível de 5% em todas as regressões estimadas, evidenciando que a liberalização financeira melhora de fato a performance macroeconômica dos países. Além disso, os autores constataram que a liberalização financeira é relativamente mais importante para o desempenho macroeconômico do que a liberalização comercial. Os autores argumentam que esse resultado deve-se ao fato da liberalização acelerar o desenvolvimento do sistema financeiro, aumentando assim o financiamento dos investimentos das firmas. A liberalização comercial e financeira está associada com um crescimento de longo prazo através dos efeitos positivos sobre o funcionamento do mercado financeiro. Contudo, os autores argumentam que a liberalização financeira aumenta a fragilidade financeira e a incidência de crises nessas economias. 3.3 – A Teoria Econômica dos Controles de Capitais A literatura aponta que a livre movimentação de capitais permitiria uma alocação internacional de capitais mais eficientes que fluiria dos países desenvolvidos, com abundância de capitais, para os países em desenvolvimento, com escassez crônica de poupança para financiar os projetos de investimentos cuja produtividade do capital seria relativamente maior. Mais especificamente, os fluxos de capitais resultariam em três benefícios: i) Evitar quedas profundas no consumo nacional durante uma desaceleração cíclica devido a possibilidade de tomar emprestado do resto do mundo, durante períodos de queda na renda; ii) Permitiria países tomar emprestado de forma a aprimorar a habilidade de produzir bens e serviços; 41 iii) Estimularia a busca por maior eficiência, fruto de uma maior competição nos mercados domésticos que resultaria da permissão de firmas estrangeiras a investirem localmente. (Neely apud Paula, 2003, 11-12p.) A liberalização financeira ocorrida nas últimas duas décadas, embora tenha ampliado a capacidade de endividamento/financiamento dos países, resultou, também em inúmeras crises financeiras, principalmente nas economias emergentes16. Este fato se deve, em grande medida, ao excessivo fluxo de capitais, que costuma ser muito elevado em relação ao tamanho de seus mercados financeiros. A maioria das economias emergentes, em função do elevado endividamento interno e externo, baixos níveis das reservas internacionais e reduzidos tamanhos dos mercados financeiros domésticos, são altamente vulneráveis a mudanças nas condições e humores do mercado financeiro internacional. Nessas circunstâncias o impacto da liberalização da conta capital sobre essas economias seria imprevisível. Para a CEPAL (2002, 61-62p.) a absorção por uma economia de um volume excessivo de capitais, necessariamente geraria efeitos desestabilizadores, tais quais: i) a valorização da taxa de câmbio real; ii) o déficit em transações correntes maior do que o recomendável; iii) aumento na oferta monetária; iv) os preços dos mercados de ações e imobiliários elevam-se de maneira desmensurada; e v) a poupança externa torna o lugar da interna. Quando se verificam esses fenômenos, o país receptor penetra em uma zona de fragilidade, em que fugas de capitais e ataques especulativos à moeda nacional podem ser precipitadas por alterações nas condições dos países industrializados ou por alguma “má notícia”, econômica ou política, concernente á esfera nacional ou regional, ou mesmo proveniente de lugares remotos do mundo em desenvolvimento. Paula (2003, 13p.) argumenta que, qualquer estratégia alternativa para o crescimento sustentado e financeiramente estável deve passar por esforço sistemático e planejado de diminuição da vulnerabilidade externa e da dependência em relação ao capital estrangeiro. Para tanto, o governo deve reduzir o déficit em transações correntes, o que requer a geração de um superávit significativo na balança comercial. Concomitantemente, deve-se evitar um influxo significativo de capitais no país, em particular de capitais voláteis 16 Pudwell, 2004. 42 de curto prazo, que provavelmente irá advir em uma conjuntura de retomada do crescimento econômico. Segundo Paula (2003) os defensores da adoção de controles de capitais baseiam-se, em geral, na abordagem keynesiana, o ponto de partida é o pressuposto de que os mercados não são eficientes. A literatura pós-keynesiana, apoiada em insights originais de Keynes (1964) e Kaldor (1980), afirma que os mercados financeiros – sob incerteza nãoprobabilística – são intrinsecamente instáveis, em função da precariedade do conhecimento dos agentes sobre o futuro, o que faz com que o estado de confiança dos agentes seja subjetivo e freqüentemente mutável17. Segue, portanto, daí a importância da adoção dos controles de capitais, para prevenir e atenuar o fluxo excessivo de capitais de curto prazo. Paralelamente, deve-se tentar atrair os capitais de maturidade mais longa, tendo em vista que estes na maioria das vezes estão correlacionados positivamente com os investimentos produtivos. As medidas restritivas sobre o fluxo de capitais podem ser utilizadas como instrumentos temporários ou permanentes, e podem ser divididos em seletivos ou extensivos. Os controles de capitais seletivos cobrem determinadas modalidades de operações financeiras relacionadas a fluxos externos. Os controles extensivos são mais abrangentes, cobrem todas as operações financeiras. Os controles utilizados como instrumentos temporários servem como instrumentos transitórios no contexto de um processo gradual de liberalização financeira ou de incertezas no mercado internacional, até que o ambiente torne-se mais propício para a integração da economia com o mercado mundial. Os controles utilizados como instrumentos permanentes são usados para garantir uma maior estabilidade econômica e financeira ao país. Os controles de capitais são classificados em controles diretos ou administrativos (quantitativos), e controles indiretos ou de mercado (baseados em preços). Os controles de capitais diretos ou administrativos restringem determinadas transações financeiras e transferência de fundos através da completa proibição ou limites quantitativos explícitos. Esse tipo de controle impõe proibições ou limites para a atuação de 17 As mudanças nas expectativas dos agentes podem ser induzida por profecias autorealizáveis, comportamentos de manada ou efeito contágio. 43 investidores. Por exemplo: i) um país pode proibir que investidores estrangeiros apliquem recursos na sua bolsa de valores; Portanto, os controles administrativos procuram afetar diretamente o volume de determinadas transações financeiras. Os controles de capitais indiretos ou de mercado (baseados em preços) desencorajam o movimento de capital e as transações associadas tornando-as mais onerosas. Esses controles funcionam via desestímulo impondo custos para determinados tipos de operação financeira. Assim, um governo pode cobrar uma taxa de investidores estrangeiros que queiram aplicar na bolsa de valores. Segundo Paula (2003) os controles baseados em preços podem ser diferenciados de modo a desestimular certos tipos de transação ou maturidades. Essas medidas restritivas impostas sobre o fluxo de capitais podem ser implementadas tanto na entrada quanto na saída: i) a implementação desses controles na entrada, justifica-se pela função preventiva visando evitar os efeitos indesejáveis do fluxo excessivo de capitais; ii) no caso da implementação das medidas restritivas na saída, o objetivo é onerar à fuga de capitais, tenta-se desvincular a ligação entre as taxas de juros interna e externa. Segundo Neely (1999): “Controls on capital inflows and outflows provide some slack for monetary policy discretion under fixed exchange rates, but in opposite directions. Controls on capital inflows, which allow for higher interest rates, have been used to try to prevent an expansion of the money supply and the accompanying inflation, as were those of ... Chile during the 1990s. In contrast, controls on capital outflows permit lower interest rates and higher money growth ... They most often have been used to postpone a choice between devaluation or tighter monetary policy, as they have been in Malaysia, for example.” (Neely, 1999, 23 p.) A instabilidade financeira/cambial típica da experiência mundial recente fez alguns órgãos conservadores, como o FMI, defenderem a possibilidade, em certas circunstâncias, do uso temporário de certos tipos de controles de capitais18. Muitos argumentos têm sido avançados na literatura econômica para justificar o uso dos controles de capitais, os principais são que essas medidas podem ajudar a reduzir as pressões sobre a taxa de câmbio, preservar a autonomia da política monetária e garantir uma maior estabilidade macroeconômica. Nas palavras de Ariyoshi et al (2000): 18 Oreiro, 2004. 44 “The effectiveness of capital controls has frequently been assessed on the basis of their impact on capital flows and policy objectives, such as maintaining exchange rate stability, providing greater monetary policy autonomy, or preserving domestic macroeconomic and financial stability.” (Ariyoshi et al, 2000, 5 p.) As recentes propostas de introdução de controle de capitais no Brasil estão indo na mesma direção. Segundo Paula, Oreiro e Silva (2003), as medidas restritivas sobre o fluxo de capitais são úteis por três motivos, quais sejam: • Garantir uma maior autonomia da política monetária. O controle de capitais permite a implementação de políticas monetárias domésticas, tendo em vista que os fluxos de capitais tornam-se menos sensíveis a taxa de juros, permitindo que as autoridades monetárias se voltem para os objetivos econômicos domésticos, por exemplo, estímulo aos investimentos produtivos; crescimento econômico; elevado nível de emprego; e estabilidade da taxa da taxa de inflação. • Reduzir a vulnerabilidade externa da economia. A fragilidade externa de uma economia está relacionada à sua maior (ou menor) suscetibilidade à ocorrência de crises do balanço de pagamentos, ou mais especificamente ao “grau de vulnerabilidade de uma economia às mudanças nas condições de financiamento oriundas de alterações nas taxa de juros externas” e nas condições de liquidez do mercado financeiro internacional (Paula & Alves Jr., 1999). • Manter a estabilidade da taxa de câmbio. Os impactos dos fluxos de capitais de curto prazo sobre a taxa real de câmbio ocorrem por intermédio do saldo em transações correntes do balanço de pagamentos. O aumento do fluxo de entrada de capitais de curto prazo irá resultar numa apreciação da taxa real de câmbio, implicando num déficit em transações correntes, que se suficientemente forte, pode comprometer a solvência externa da economia19. Do exposto, segue-se que os fluxos de entrada de capitais de curto prazo podem colocar as condições necessárias para a ocorrência 19 A capacidade de pagamento dos compromissos externos de uma economia é medida usualmente pela razão dívida externa/exportações. 45 de uma crise de endividamento externo, em virtude dos seus efeitos sobre a taxa real de câmbio e o saldo em transações correntes20. Apesar dos benefícios potenciais dos controles de capitais, seu uso pode implicar em alguns custos (Ariyoshi et al, 2000, 6p.): i) As restrições sobre os fluxos de capitais, particularmente quando eles são abrangentes ou diversos, podem interferir nas decisões dos investimentos de maturidade mais longa em ingressar no país; ii) As efetivas implementações das medidas de controles de capital podem implicar em custos administrativos significativos, particularmente quando o cálculo é feito a partir das políticas do governo de eliminar as potenciais tentativas dos capitais de burlar os controles; iii) Há também o risco de que as mudanças nos mercados financeiros domésticos provocados pelos controles possam adiar ajustamentos necessários nas políticas ou atrapalhar a adaptação do setor privado às mudanças na economia internacional; iv) Finalmente, os controles podem aumentar as percepções negativas do mercado (sinalizaria a possibilidade de suspender os pagamentos ao exterior no futuro), trazendo maiores custos e mais dificuldades para o país acessar fundos estrangeiros. Contudo, a adoção de controle de capitais pode ser uma das peças fundamentais para uma mudança na estratégia de crescimento de uma determinada economia, tendo em vista que, diminui a vulnerabilidade externa, seleciona os fluxos de capital que se deseja absorver priorizando os investimentos produtivos ou de maturidade mais longa, e confinando os capitais especulativos a volumes administráveis, isolando, em algum grau, o país dos choques externos. 20 Uma forte apreciação do câmbio real pode resultar numa dinâmica explosiva para a relação dívida externa/PIB na medida em que gera uma redução na relação transferência líquida de recursos para o exterior/exportações. Ver Simonsen e Cysne (1995). 46 3.4 – A Experiência Recente de Controle sobre o Ingresso de Capitais: o Caso do Chile A estratégia de crescimento da economia chilena desde meados da década de 80 tem sido via exportações. Essa estratégia foi sustentada através da combinação da liberalização comercial e do esforço do governo em manter a taxa de câmbio real desvalorizada (Edwards, Gregório & Valdés, 2000). Mas, em princípios da década de 1990 a economia chilena começou a sofrer com os efeitos instabilizadores da liberalização da economia, a taxa de câmbio estava sendo pressionada pelo excessivo influxo de capitais e pelo rápido aumento da produtividade, além disso, o governo estava perdendo a autonomia da política monetária, o que prejudicava o combate à inflação. Nesse contexto de apreciação da taxa de câmbio real e perda do controle da política monetária, o governo chileno introduziu em junho de 1991 a exigência de reserva não remunerada (URR)21. Essa medida de regulação fundamenta-se em três importantes características: i) são controles administrativos que funcionam via desestímulo, na medida em que impõem custos sobre certas operações; ii) afetam especificamente o ingresso de capitais; iii) são elaborados para ter mais impacto sobre os capitais de curto prazo do que sobre os capitais de longo prazo. A economia chilena optou por manter uma regulação preventiva da conta de capitais, acreditando que o ingresso maciço desses capitais poderia trazer efeitos deletérios para a economia. Segundo Ffrench-Davis & Villar (2003), os efeitos deletérios se dariam da seguinte forma: “Capital flows reduce the autonomy of domestic economic autorities to jointly manage the real exchange rate (pesos per dollar) and the interest rate and aggregate demand. Large capitals inflows tend reduce both the exchange rate (pesos per dollar) and the interest rate, and to worsen the external balance, while capital outflows tend to increase both macro-prices and to improve the external balance. As far as capital flows to development economies have been proved to be highly procyclical, the real 21 A URR representava uma parcela dos recursos que ficavam retidos no Banco Central do Chile, na moeda de origem do contrato sem nenhum tipo de remuneração por prazos que variavam de três a doze meses. A história da exigência de reserva não remunerada sobre o influxo de capitais no Chile pode ser encontrada em Edwards, Gregório & Valdés, 2000. Mais detalhes, consultar Ffrench-Davis & Villar (2003). 47 exchange rate, the real interest rate and aggregate demand become highly procyclical too.” (Ffrench-Davis & Villar, 2003, 1 p.) A proposta de regulação da conta capital implementada pela economia chilena visava três objetivos: i) reduzir a suscetibilidade da economia doméstica a mudanças no mercado financeiro internacional; ii) desencorajar o ingresso de capitais de curto prazo e estimulando o influxo de capitais de maturidade mais longa; iii) garantir uma maior autonomia das políticas monetária e cambial para agirem de modo contra-cíclico ao fluxo de capitais. Nas palavras de Schneider (2000): “In June 1991, Chile instituted controls on capital inflows in order to pursue several policy objectives. The first of these was to limit the country’s exposure to a surge in capital inflows and avoid the consequent pressure for real exchange rate appreciation that would undermine the country’s competitiveness. Secondly, the authorities hoped that the controls would lengthen the maturity structure of the country’s external liabilities by discouraging more volatile short-term capital flows. Thirdly, it was hoped that controls would enable Chile to pursue a more independent monetary policy that would enable the authorities to target the inflation rate while preventing a sharp appreciation of the real exchange rate” (Zahler apud Schneider, 2000, 58p.). Entre outras coisas, o governo tinha por objetivo manter a taxa de câmbio competitiva para não fragilizar as contas externas, estimular o crescimento da economia e garantir uma estabilidade macroeconômica, criando dessa forma um ambiente econômico e financeiro seguro para os investidores estrangeiros direto ingressarem no país. As autoridades chilenas adotaram simultaneamente controles diretos, através da exigência de tempo mínimo de permanência para os capitais que ingressavam no país, e controles indiretos, via Exigência de Reserva não Remunerada (URR) que envolveu inicialmente um encaixe no Banco Central de 20% dos capitais que entravam no país22. Paralelamente aos controles sobre o ingresso, o Chile instituiu regras para a saída do investimento direto e das aplicações em portfólio de papéis de renda fixa e variável. Nesse caso, os capitais só podiam ser repatriados para os países de origem após três anos da data de ingresso. A política de controle de capitais no Chile manteve-se flexível com relação a URR, conforme observa Schneider (2000): 48 “The Chileans maintained a flexible policy with regard to the URR. During the period when it was in operation (June 1991 - September 1998), 31 the Central Bank of Chile altered the rate of the requirement, the categories of inflow that were subject to it, the denomination of the reserve deposit and fee payment, the holding period and the restrictions to rolling over maturing investments” (Gallego et al. Apud Schneider, 2000,59p.) Durante a fase inicial dessa política o depósito da URR foi estipulado em 20% sobre os empréstimos externos, sendo sustentado por um prazo mínimo de 90 dias e máximo de um ano. Isso significa que um agente que, por exemplo, tomar emprestado US$1 internacionalmente terá que depositar 20 centavos de dólar no Banco Central do Chile em uma conta sem render nenhum juro. Em maio de 1992 o governo chileno alterou significativamente essa política, aumentou a URR para 30% e o período estipulado para o capital ficar represado foi fixado em um ano. Além disso, o controle de capitais foi estendido a todos os créditos, independente do prazo de maturidade. Em julho de 1995, o governo implementou novas mudanças no controle de capitais, tornou o mercado secundário ADR’s (American Depositary Receipts) sujeitos a URR. Nos anos seguintes o Banco Central chileno continuou com a política, mas a autoridade falhou em acomodar a URR em 30%, tendo em vista que a oferta de créditos havia aumentado para os países emergentes após o término da crise do México23. Paralelamente, o Chile instituiu regras para a saída do investimento direto e das aplicações em portfólio de papéis de renda fixa e variável. O governo tornou o investimento direto sujeito a URR por acreditar que este poderia ser um canal, potencialmente especulativo, de fuga de capitais. Nesse caso, os capitais só podiam ser repatriados para os países de origem após três anos da data de ingresso, posteriormente, essa exigência foi reduzida para um ano. Quando a crise asiática começou em 1997, os fundamentos econômicos da economia chilena estavam deteriorados, esse fato certamente contribuiu para aumentar a 22 23 Edwards, Gregorio & Valdés (2000). Ffrench-Davis & Villar (2003, 3p.). 49 intensidade da crise sobre a economia chilena, observando-se uma significativa saída de capitais privados (Gráfico 8). Nas palavras de Ffrench-Davis & Villar (2003): “When the Asian crisis began in late 1997, therefore, the fundamentals of the Chilean economy were much weaker than they had been during the tequila crisis of 1995. This fact certainly contributed to increase the magnitude of the crisis of 1998 and 1999 when, as we will see, private capital outflows were quite large, including funds of the domestic private social security institutional investors”(Ffrench-Davis & Villar, 2003, 3p.). Com o intuito de ajustar a política de controle de capitais ao ambiente vigente no mercado financeiro internacional, a exigência de reserva foi reduzida a 10% em junho de 1998 e posteriormente caiu para zero. Gráfico 8 Fluxo de Capitais e o Financiamento da Conta de Transações Correntes no Chile: 1990-2002 5000 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992 -5000 1991 0 1990 US$ milhões 10000 -10000 Período Transações Correntes Investimento Direto Estrangeiro Reservas Internacionais Outros Capitais Privados Fonte: Ffrench-Davis & Villar (2003) Contudo, convém salientar que a economia chilena durante praticamente toda a década de 1990 financiou seus déficits em conta corrente com investimento direto estrangeiro. 50 O caso chileno é particularmente interessante por ter mostrado que a capacidade administrativa não é suficiente para assegurar o sucesso do regime de controle de capitais, deve-se paralelamente, encaixar essas medidas dentro de uma estrutura ampla de políticas. Segundo Schneider (2000), as medidas restritivas utilizadas no Chile foram complementadas por um conjunto flexível de políticas, tais quais: “Chile’s unremunerated reserve requirement (URR) was supplemented by a flexible policy that allowed a degree of real exchange rate appreciation and sterilized inflows in conjunction with a tighter fiscal policy” (Schneider, 2000, 43p.). Apesar dos controles de capitais no Chile terem sido motivo de um grande debate, fazendo-se um balanço preliminar das evidências até então encontradas, conclui-se que os controles garantiram uma maior independência da política monetária e melhoraram a estrutura de maturidade dos capitais que ingressam no país, apesar de não terem sido eficientes em conter a excessiva apreciação da taxa de câmbio24. Além disso, pode-se dizer que os controles de capitais implementados no Chile foram, em alguma medida, importantes para melhorar o desempenho da economia (Gráfico 9). Gráfico 9 Crescimento Econômico no Chile: 1985-1999 14,00 12,28 12,00 10,63 10,56 Porcentagem 10,00 8,00 7,12 5,60 6,00 6,59 7,97 7,31 7,41 6,99 7,39 5,71 3,70 4,00 3,37 2,00 Período Chile Fonte: Banco Mundial 24 Schneider (2000, 66p.) 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992 1991 1990 1989 1988 1987 1986 (2,00) 1985 (1,09) 51 Apesar de não haver evidências empíricas conclusivas da importância dos controles de capitais para a performance macroeconômica, o fato é que o país logrou taxas de crescimento relativamente melhores, cerca de 7,7% no período de 1991-1998 (controle de capitais), ao passo que no período de 1985-1990 o país cresceu em média 6,8%. Budnevich & Le Fort (1997) chegaram a concluir que, em alguma medida, as regulações sobre a conta de capital impulsionaram o crescimento da economia chilena: “The country has registered a successful macroeconomic performance, with the success partly owing to effective capital account regulation. The effectiveness of the regulations in shown in that a once and that the currency appreciation followed by a depreciating trend has been avoided, and that the currency account deficit has been kept at sustainable levels. In other words, capital account regulations have avoided the overshooting (over appreciation) of the real exchange rate that would have occurred with large amounts of short-term capital inflows” (Budnevich & Le Fort, 1997, 1p.). 3.5 – A Experiência Recente de Controle sobre a saída de Capitais: O caso da Malásia Recentemente, as economias do leste asiático enfrentaram uma grave crise financeira, que causou muitos estragos na região, prejudicando significativamente suas performances macroeconômicas (Gráfico 10). 52 Gráfico 10 P erform ance M acroeconôm ica da C oréia do Sul,da Tailândia e da M alásia na Década de 1990 15,00 10,00 5,00 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 (5,00) (10,00) (15,00) P eríodo Indonésia M alásia Tailandia Fonte: Banco Mundial A crise asiática começou afetando a Tailândia em setembro de 1997, em seguida a Coréia do Sul em janeiro de 1998 e, posteriormente, em agosto de 1998 a Malásia foi duramente afetada25. Na tentativa de atenuar os impactos da crise financeira de 1997-98, a Tailândia, a Coréia do Sul e a Indonésia solicitaram a ajuda do FMI. A Malásia lançou mão de uma ferramenta diferente dos demais países, as autoridades impuseram controle de capitais, fixaram a taxa de câmbio e cortaram os juros. A crise financeira asiática começou aproximadamente em setembro de 1997 e se intensificou em dezembro de 1997, quando houve uma forte reversão do fluxo de capitais para a região. Em resposta a crise, as autoridades da Malásia optaram por implementar uma política ortodoxa, aumentando a taxa de juros e flexibilizando a taxa de câmbio. Mas, essas políticas não estavam surtindo efeitos, o consumo e a demanda por 25 Kaplan & Rodrik, 2001. 53 investimento despencaram, como resultado da saída de capitais. Para acabar com a especulação contra o ringgit, o governo instituiu o controle de capitais em 1º de setembro de 1998. A Malásia estava preocupada em controlar a saída de capitais e evitar uma depreciação excessiva da moeda. Para tanto baniu por um período de um ano, toda a repatriação de investimentos estrangeiros. Nas palavras de Neely (1999): “The controls banned transfers between domestic and foreign accounts and between foreigns accounts, eliminated credit facilities to offshore parties, prevented repatriation of investment until September, 1, 1999, and fixed the exchange rate at M 3.8 per dollar. Foreign exchange transactions were permitted only at authorized instituitions and required documentation to show they were for current account purposes.” (Neely, 1999, 22 p.) Após o período mais crítico da crise asiática, o Banco Central da Malásia mudou a regulação sobre as restrições ao capital substituindo uma interdição completa por um imposto gradual. Em fevereiro de 1999, as autoridades monetárias instituíram que todo os capitais que ingressaram na Malásia antes dessa data, ficariam sujeitos aos seguintes impostos sobre o capital retirado (Kaplan & Rodrik, 2001): 1. 30% se a repatriação for nos primeiros 7 meses após a entrada no país; 2. 20% se a repatriação estiver entre 7 a 9 meses após a entrada no país; 3. 10% se a repatriação estiver entre 9 a 12 meses após a entrada no país; e 4. 0% se a repatriação for realizada um ano após da entrada no país. Para os fundos que entraram na Malásia depois de 15 de fevereiro de 1999, o capital tinha liberdade de entrada e saída sem taxas, entretanto, os lucros foram tributados com uma taxa de 30% se repatriado num período inferior a um ano da entrada e 10% se repatriado após um ano da entrada. Os controles de capitais eram um conjunto complexo de medidas que desencorajavam os capitais de curto prazo, mas tornava livre a transação com os capitais de maturidade mais longa. Acreditava-se que a política monetária ganharia uma maior autonomia para permitir ao Banco Central baixar a taxa de juros sem provocar fuga de capitais e, consequentemente, uma desvalorização excessiva da moeda. 54 As autoridades da Malásia trabalharam duramente para que essas medidas restritivas não afetassem os investimentos de maturidade mais longa. Na verdade, a preocupação era com os possíveis impactos dos controles de capitais no longo prazo sobre o ingresso de capital futuro, particularmente, sobre o investimento direto estrangeiro, a qual o país é altamente dependente. Apesar da Malásia ter se utilizado de um instrumental diferente do ortodoxo, obteve resultados tão bons quanto à Coréia do Sul e a Tailândia. Kaplan & Rodrik (2001) encontraram indícios de que os controles de capitais na Malásia foram efetivos no segmento financeiro e promoveram um alívio nas políticas monetária e fiscal, além de permitirem uma recuperação mais rápida da economia. Mas, a questão da efetividade das medidas restritivas sobre o fluxo de capitais na Malásia é bastante controversa, tendo em vista que se passaram poucos anos após a experiência da Malásia com o uso dos controles de capitais. No entanto, pode-se afirmar que a princípio os resultados da implementação dos controles de capitais na saída foram satisfatórios. Nas palavras de Schneider (2000): “The controls on outflows imposed in late 1998 were effective in eliminating the offshore ringgit market. The restrictions on the internationalization of the ringgit were essential in achieving this objective, especially the freezing of external ringgit accounts. The absence of speculative pressure on the ringgit, following the imposition of controls and the currency peg, in an environment of significantly relaxed monetary and fiscal policy is evidence of the controls' effectiveness. No parallel market has emerged and evasion and avoidance of controls through measures such as misinvoicing appear minimal. More studies are required to estimate the effectiveness of the controls”. (Schneider, 2000, 75p.). O controle de capitais implementado pela Malásia tornou-se um caso clássico, por ter sido utilizado durante a crise financeira de 1997-98. Com o aprofundamento da crise em agosto de 1998, as autoridades econômicas da Malásia anunciaram um pacote de medidas restritivas que seriam impostas sobre o fluxo de saídas de capitais. A partir de setembro de 1998, nenhum investidor doméstico ou estrangeiro pôde durante seis meses retirar recursos do país. Em 1999, passado o período de maior turbulência no mercado internacional, o governo substituiu o controle vigente por outro de natureza de mercado, qual seja, quem saísse antes de seis meses pagaria uma taxa. A respeito da eficácia dos controles dos controles de capitais na Malásia, acredita-se que os resultados foram bons na 55 medida em que contribuíram para conter as pressões especulativas sobre a taxa de câmbio e preservar a autonomia da política monetária. 3.6 - Conclusão A guisa de conclusão, o capítulo mostrou que a literatura empírica recente está longe de chegar a um consenso a respeito da associação positiva entre a liberalização da conta de capital e performance macroeconômica. Conforme evidenciado no tópico anterior, para que o Brasil se beneficie da liberalização é necessário, entre outras coisas, que o processo de estabilização esteja consolidado, os fundamentos econômicos solidificados e, por fim, que o sistema financeiro doméstico esteja forte. Atualmente, a maioria das economias emergentes não possuem as condições necessárias para se beneficiar do processo de globalização sem gerar instabilidade macroeconômica. Nesse contexto, os controles de capitais podem ser uma alternativa para o país, na medida em que contribui para garantir uma maior autonomia da política monetária, reduzir a vulnerabilidade externa e estabilizar a taxa de câmbio. Dessa forma, um determinado país poderia utilizar a taxa de juros para atingir os objetivos domésticos, como o crescimento econômico, sem que houvesse uma fuga maciça de capitais. Os controles de capitais podem também ser utilizados para evitar uma apreciação da taxa de câmbio, aumentar as exportações e, consequentemente, estimular o crescimento da economia. A análise desenvolvida ao longo do capítulo mostrou que os controles de capitais no Chile e na Malásia contribuíram, em boa medida, para atenuar a intensidade das crises sobre os países, reduzir a vulnerabilidade externa e melhorar sua performance macroeconômica. 56 4 – Política Cambial, Fluxo e Controle de Capitais no Brasil 4.1 - Introdução A economia brasileira ao longo da década de 1990 caminhou para uma liberalização crescente da conta de capitais sem que houvesse a recíproca na forma de crescimento econômico. A abertura da economia produziu em alguns momentos instabilidade macroeconômica, fruto principalmente das crises cambiais/financeiras ocorridas na década passada que foram atenuadas com medidas incipientes de controles de capitais. Nesse capítulo realiza-se uma análise das medidas restritivas impostas sobre os fluxos de capitais adotados no Brasil no período 1991- 2002. Adicionalmente, tenta-se encontrar evidências empíricas sobre os potenciais benefícios dos controles de capitais para a economia brasileira. A revisão da literatura recente desenvolvida no final desse capítulo é útil para entender como anda a discussão do tema no Brasil. Essa discussão foi reintroduzida inicialmente por Arida (2003), o autor afirma que a conversibilidade da conta de capitais tem implicações sobre o risco de default dos compromissos externos das empresas domésticas, o que acaba reduzindo o prêmio de risco e, consequentemente, a taxa de juros. Mas, as evidências apresentada por Oreiro, Paula e Silva (2004) mostram que o efeito da conversibilidade da conta de capitais se dá no sentido oposto ao sugerido pelo autor. A experiência histórica mostra precisamente o contrário: ao longo da década de 1990, o Brasil caminhou na direção de uma conversibilidade crescente da conta de capitais, sem que houvesse uma tendência de redução no risco-país ou na taxa real de juros doméstica. Possivelmente o alto grau de abertura da conta capital no Brasil é um dos fatores que contribuem para que a taxa nominal e real de juros no país esteja entre as mais altas do mundo 57 4.2 – Política Cambial e o Caráter Endógeno dos Controles de Capitais no Brasil26 Desde o início da implantação do Plano Real, o governo brasileiro contou com a forte presença de capitais externos para financiar o balanço de pagamentos, mantendo com isso as reservas internacionais e a taxa de câmbio nos níveis desejados. Apenas em alguns episódios, notadamente de crises econômicas no mercado internacional, as reservas foram utilizadas para evitar pressões sobre o câmbio. As medidas de controles de capital implementadas pelo governo brasileiro eram de caráter essencialmente preventivo, no sentido de ajustar os fluxos de capitais as necessidades impostas pelas expectativas dos agentes e pela conjuntura econômica no mercado mundial. Os controles de capitais tomaram a forma de medidas administrativas (mudanças nos prazo médio mínimo de amortização para empréstimos) e medidas baseadas em preços (variações no IOF) que foram continuamente revisadas para evitar que os participantes do mercado encontrassem maneiras de burlar as medidas restritivas sobre o fluxo de capitais. No entanto, os controles de capitais no Brasil não foram eficientes em conter as pressões contra a moeda doméstica. Nas palavras de Schneider (2000): “The experience of Brazil illustrates the ineffectiveness of controls in an environment of pervasive macroeconomic imbalances. A complex mixture of direct and indirect controls was largely ineffective in stemming inflows, shifting their composition towards longer-term flows and providing a greater degree of monetary independence. The inability of the state to reign in large fiscal deficits fuelled expectations of continued inflation and resulted in widening interest rate differentials. These interest differentials combined with a stable exchange rate to induce large inflows of capital. The imposition of direct and indirect capital controls in mid-1993 and their intensification under the Real plan in 1994 had little effect on the rising level of inflows” (Schneider, 2000, 43-44p.). Nos momentos de maior turbulência no mercado internacionais eram adotadas medidas visando o estímulo à captação de recursos e/ou flexibilização dos prazos de 26 Uma descrição sucinta sobre a política cambial e os controles de capitais adotados pela economia brasileira na década de 1990 encontram-se nos relatórios e no site do Banco Central do Brasil, de onde foram extraídas algumas das informações e dados utilizados na análise que se segue. 58 captação. Assim, as autoridades monetárias reduziram a alíquota de IOF incidente sobre várias operações financeiras, como fundos de renda fixa, operações interbancárias e constituição de disponibilidades no país. Paralelamente, reduziam o prazo médio mínimo de amortização para novos empréstimos, renovações e prorrogações. Nos primeiros anos da década de 1990, o Brasil implementou um programa de liberalização da economia e abertura ao exterior, não obstante a conjuntura desfavorável ao comércio e os desdobramentos da crise política interna. Em 1991, foram tomadas diversas medidas a fim de incentivar à entrada de capitais estrangeiros, tanto no aperfeiçoamento de mecanismos já existentes como na instituição de novos instrumentos de captação, proporcionando aos agentes econômicos estrangeiros várias alternativas para suas aplicações. Paralelamente, a política cambial brasileira passou por ajustes para acompanhar o processo de mudanças em implementação no país, visando entre outras coisas adaptar a política econômica ao processo de abertura da economia ao exterior. O Banco Central atuou regularmente no mercado doméstico, com o objetivo de corrigir desequilíbrios eventuais provocados por fatores de ordem interna e externa, com efeitos indesejáveis nos mercados financeiros e de câmbio. Em agosto de 1991, a autoridade monetária introduziu modificações no seu relacionamento com o mercado de câmbio, passando a operar através de leilões informais para compra ou venda de câmbio, exclusivamente com instituições dealers. Este mecanismo objetivou manter a taxa de câmbio mais ajustada às condições de oferta e demanda de divisas do mercado, estimulando a competitividade, facilitando o acesso e oferendo maior transparência às operações interbancárias de câmbio. Para estimular o ingresso de capital estrangeiro, em 1992 as autoridades econômicas do país extinguiram a incidência do imposto suplementar de renda sobre as remessas ao exterior de lucros e dividendos. As baixas taxas de juros externas, associadas as condições prevalecentes na economia brasileira, notadamente no que diz respeito aos níveis reais das taxas de juros e de câmbio, foram fatores decisivos para a retomada dos ingressos de capitais, tanto na forma de empréstimos quanto de investimentos, principalmente no segundo semestre. Contudo, as incertezas econômicas decorrentes da crise política levaram a que os fluxos de 59 recursos externos apresentassem retração, sem comprometer as reservas internacionais do país, que se mantiveram elevadas, na ordem de US$ 19 bilhões, no conceito caixa e de US$ 23,8 bilhões, no conceito liquidez internacional. Essa situação confortável das reservas permitiu a autoridade monetária adotar algumas medidas, tais quais, elevar para 30 meses o prazo médio mínimo de permanência no país de recursos captados na forma de empréstimos e para 60 meses o de isenção fiscal sobre as remessas de seus encargos, equiparando-se esses prazos com as formas de captação via colocação de títulos, cujos limites médios mínimos de permanência já haviam sido elevados em abril. Em 1993, a economia brasileira continuou o processo de liberalização cambial e integração de mercados, implementando diversas medidas (Resolução nº 1985, de 28.06.93; Circular nº 2350; e a Circular nº 2296, de 30.03.93). Para se ter uma idéia do impacto das medidas adotadas sobre a economia, no segundo semestre de 1993, a média mensal de ingressos de investimentos em portfólio situou-se em US$ 1,8 bilhão, valores bem superiores aos registrados no primeiro semestre, quando foram apurados US$ 656 milhões. O fluxo de capitais de curto prazo registrou um superávit na ordem de US$154 milhões, portanto, relativamente menor do que o valor observado em 1992, que foi de US$ 2,6 bilhões. Os investimentos diretos estrangeiros no país foram de US$ 7,2 bilhões, um valor muito elevado, principalmente se compararmos ao ano anterior, que registrou um volume de aproximadamente US$ 3,1 bilhões. Em essência, as medidas restritivas implementadas sobre o fluxo de capitais que ingressavam no país, foram incipientes e direcionadas apenas para controlar os capitais que visavam exclusivamente a rentabilidade associada às taxas de juros. No contexto da administração do ingresso de recursos externos, a ampliação dos prazos mínimos para a captação de empréstimos em moeda não apresentou grandes resultados, tendo em vista que as poupanças externas passaram a ingressar em maior volume na forma de investimentos em portfólios. Esse comportamento está evidenciado no exame dos fluxos de ingressos de empréstimos e de investimentos em portfólio, que em conjunto respondem por mais de 80% das contratações de câmbio de compras financeiras. A impossibilidade de redução mais drástica do diferencial das taxas de juros internas e externas, que serviria de 60 desestímulo natural ao ingresso de poupança externa, levou a implementação de medidas que permitissem aliviar o impacto monetário do setor externo. A política cambial em 1994 apresentou características bastante peculiares, principalmente em função do plano de estabilização e dos controles de capitais endógenos27 implementados a fim de corrigir os desequilíbrios do mercado de divisas. O ambiente macroeconomicamente mais estável criado após a introdução do Plano Real, implicou num aumento significativo do influxo de capitais, havendo a necessidade do governo intervir de forma preventiva nesses fluxos. O objetivo era reduzir a participação dos capitais de curto prazo e alterar a composição dos fluxos de capitais no país. Durante todo o ano, houve um aumento da entrada de capitais externos no país, gerando uma elevada oferta de divisas, a qual não era totalmente absorvida pelo mercado, em função da demanda por divisas estar reprimida. Para corrigir esse desequilíbrio, a autoridade monetária optou por adotar uma política de acúmulo de reservas. Apesar dos altos custos associados à manutenção de grandes níveis de reservas internacionais, as autoridades econômicas utilizaram essa política como um instrumento para atenuar movimentos especulativos contra a moeda nacional, melhorar as condições para consolidação da nova moeda, além de constituir uma garantia para a liquidação dos compromissos da dívida externa com os credores internacionais, minimizando os riscos de default. A introdução da nova moeda acompanhada da manutenção de uma política de juros reais elevados no contexto de uma conta capital aberta intensificou a forte entrada de capitais de curto prazo, o que pressionou a taxa de câmbio, contribuindo para rápida deterioração das contas externas. O Banco Central atuou no mercado implementando diversas medidas relacionadas às operações de empréstimos externos e investimentos em portfólio. A autoridade monetária aumentou a alíquota do Imposto sobre Operação Financeira (IOF), através da Portaria nº 534 de 10/10/94, no tocante a entrada de recursos externos: • 27 De 3% para 7%, no caso de aporte sob a forma de empréstimos; O “caráter endógeno dos controles de capitais” se dá quando um determinado governo reage aumentando o controle nos períodos de boom e liberalizando nos períodos de crise. 61 • De 5% para 9%, no caso de aplicações direcionadas aos Fundos de Renda Fixa - Capital Estrangeiro (FRFCE); • De zero para 1%, quando se tratasse de investimento em títulos e aplicações em valores mobiliários. Em dezembro de 1994, com a eclosão da crise cambial mexicana, houve uma reversão do fluxo de capitais, ocasionando uma fuga dos investidores estrangeiros para o mercado norte-americano, expressa na saída de capitais de portfólio. Essa forte saída de capitais do mercado brasileiro ocorreu devido às expectativas pessimistas dos investidores com relação aos países emergentes. A instabilidade nos mercados financeiros observados no início de 1995 afetou o fluxo de capitais para os países latino-americanos, tendo conseqüências significativas sobre o movimento de capitais no Brasil, resultando em uma saída líquida de capitais. Contudo, ao longo de ano ficou evidenciada a capacidade do país superar as condições desfavoráveis e passar a atrair novamente poupança externa. As políticas implementadas com vistas a criar um ambiente favorável para ingressos de capitais de maturidade mais longa destinados a investimentos produtivos geraram ingressos líquidos de investimentos estrangeiros, notadamente, os investimentos diretos, cuja participação passou de 20,6% em 1994 para 63,1% em 1995. As principais medidas adotadas ao longo de 1995 para eliminar os entraves aos ingressos de capitais estrangeiros foram, a redução dos prazos médios mínimos de amortização para a tomada de novos empréstimos, redução da alíquota de IOF incidente sobre as várias modalidades de capitais externos, além do estabelecimento de limites para flutuação da taxa de câmbio. Os constantes déficits observados na balança comercial preocupavam o governo, pois não era prudente permitir indefinidamente a deterioração da conta corrente, tendo em vista que existe um limite para o endividamento externo. Em função da necessidade de consolidar o plano de estabilização, não seria razoável ajustar a balança comercial apenas com ajustes na taxa de câmbio, por isso buscou-se melhorar as condições para os exportadores, eliminando as restrições impostas a algumas operações. A estratégia foi permitir uma gradual desvalorização do real, sem que houvesse uma sinalização ao 62 mercado da perenidade dessa política, para não interromper o processo de busca de maior eficiência, que se traduziria em ganhos de competitividade. No primeiro semestre de 1995, a política de minidesvalorizações cambiais combinada com uma forte elevação na taxa de juros conseguiu normalizar os mercados financeiros e retomar fluxo de capitais externos. Mas, no segundo semestre, houve um aumento da oferta de divisas, que começava a ameaçar a condução da política econômica, devido à expansão monetária associada a essa entrada de capitais. Em função disso, o governo implementaram políticas visando à obtenção fluxos cambiais mais adequados, tais quais: 1. Elevação do IOF nas operações de empréstimos externos, de 0% para 5%, e nas aplicações em fundos de renda fixa-capital estrangeiro, de 5% para 7%; 2. Instituição de alíquota de IOF de 7% sobre as operações de constituição de disponibilidade de curto prazo e as operações entre instituições no país e no exterior, ambas no segmento de taxas flutuantes; e 3. Eliminação da alternativa de os investimentos estrangeiros direcionarem recursos para os mercados de liquidação futura. Com efeito, os fluxos cambiais passaram a ter maior equilíbrio, criando condições favoráveis para a implementação da política econômica pelo governo. Para manter o fluxo de capitais sobre controle e melhorar a qualidade do capital que ingressava no país em 1996, o Banco Central continuou a estabelecer alíquotas do IOF inversamente proporcionais ao prazo das operações sobre os empréstimos em moeda estrangeira, ou seja, paralelamente ao aumento do ônus sobre capitais de curto prazo, a autoridade monetária estimulou os investimentos de maturidade mais longa, visando aumentar a participação desses na composição dos fluxos de capitais. Assim, o decreto nº 1814, buscou estimular a permanência desses capitais no país pelo prazo mínimo de um ano, aplicando alíquota zero de IOF sobre resgates efetivados após esse período e alíquota máxima de 10% no caso dos resgates efetuados antes desse prazo. As medidas implementadas pelas autoridades monetárias tinham por objetivo manter os fluxos de capitais externos em níveis que viabilizassem a continuidade do financiamento do crescente déficit em transações correntes, sem que a execução da política monetária fosse prejudicada. O resultado foi satisfatório, pois se registrou uma queda 63 significativa o fluxo de capitais estrangeiros de curto prazo se comparado ao obtido em 1995. Durante praticamente todo o ano de 1997, o ambiente econômico manteve-se favorável para o ingresso de recursos externos, contudo, no último trimestre os reflexos da crise asiática começaram a chegar ao país, fazendo com que à demanda por divisas crescesse significativamente. A equipe econômica tomou medidas para atenuar os impactos sobre a economia brasileira, tais quais, elevação da taxa de juros e o anuncio de um pacote de medidas de austeridade fiscal. Paralelamente, o governo lançou mão de diversas medidas de controle do fluxo de capitais visando estimular a permanência dos capitais externos no país, quais sejam, a redução dos prazos médio mínimos de amortização de novos empréstimos, de três para um ano, e de um ano para seis meses, o prazo médio de renovações e prorrogações. As alíquotas do IOF foram reduzidas para diversos tipos de operações. Além disso, manteve-se o diferencial entre a taxa de juros internos e externos de modo a garantir a atratividade do mercado doméstico ao capital estrangeiro. Essas medidas acabaram conseguindo manter a flutuação cambial dentro da tendência almejada, revertendo às expectativas dos agentes econômicos com relação às mudanças na política cambial e aos movimentos de perda de reservas. Todavia, os impactos da crise asiática sobre a economia brasileira podem ser claramente demonstrados quanto observamos o saldo da conta de capitais. Os ingressos líquidos de capitais em 1997 totalizaram US$ 26,1 bilhões ante aos US$ 34,2 bilhões observados no ano anterior. Os investimentos estrangeiros diretos líquidos mantiveram-se equivalentes a aproximadamente 50% do déficit em transações. O investimento estrangeiro líquido em portfólio encerrou o ano com um saldo de US$ 5,3 bilhões, após ter atingido um saldo de US$ 8,1 bilhões em setembro. Em suma, as diversas medidas adotadas garantiram a atratividade do mercado doméstico ao capital estrangeiro, reafirmaram a política cambial e aumentaram a captação de recursos externos. A manutenção das reservas cambiais num patamar elevado e o quadro saudável do sistema financeiro doméstico foram decisivos para estabilizar o fluxo de capitais e reverter as expectativas pessimistas do mercado. 64 Em função dos choques ocorridos no mercado financeiro internacional, em 1998, a variação dos fluxos de capitais externos foi grande, pressionando a taxa de câmbio. Contudo, os incrementos nos investimentos diretos foram fator importante para os ingressos líquidos de recursos externos ao longo de 1998, apesar das saídas dos investimentos em portfólio no país de aproximadamente US$ 3,8 bilhões. O primeiro semestre de 1998, pouco depois da crise asiática, a economia brasileira retornou ao nível de reservas pré-crise asiática, chegando a alcançar US$ 74,7 bilhões. Mas, com a eclosão da crise da economia russa, o país viveu novamente momentos de instabilidade. Os impactos da crise russa sobre a economia brasileira foram significativos, tendo em vista que retraiu drasticamente o fluxo de recursos externos. O governo procurou incentivar o ingresso de capitais através do aumento da taxa de juros doméstica, redução do prazo médio mínimo de amortização dos empréstimos externos e a baixa incidência de IOF sobre os ingressos de moeda estrangeira. Tais medidas visavam o restabelecimento de um volume de reservas que proporcionasse uma maior confiança dos agentes econômicos, mas acabou não logrando êxito, dada a percepção dos operadores de mercado de que o país tinha sérios desequilíbrios macroeconômicos, além do fato de que o governo não havia executado as medidas fiscais que havia prometido ao final de 1997. A conjugação desses fatores internos com a conjuntura externa desfavorável, a despeito do programa de assistência financeira coordenada pelo FMI, levou os agentes econômicos a apostar que a política cambial do governo não seria capaz de reverter a trajetória de rápida queda nas reservas internacionais a partir de setembro de 1998. Assim, em janeiro de 1999, ocorreu o ataque especulativo contra o real, que culminou na crise cambial brasileira (Gráfico 11), fazendo com que a equipe econômica fosse obrigada a mudar o regime cambial vigente e introduzir um novo. 65 Gráfico 11 Evolução da Taxa de Câmbio no Brasil: 1994-2002 4 Taxa de Câmbio 3,5 3 2,5 2 1,5 1 0,5 2002 11 2002 07 2002 03 2001 11 2001 07 2001 03 2000 11 2000 07 2000 03 1999 11 1999 07 1999 03 1998 11 1998 07 1998 03 1997 11 1997 07 1997 03 1996 11 1996 07 1996 03 1995 11 1995 07 1995 03 1994 11 1994 07 0 Período Taxa de Câmbio Fonte: Ipeadata Com a crise cambial da economia brasileira, a política cambial sofreu uma nova mudança, quando foi adotado o regime de câmbio de livre flutuação, formalmente anunciado pelo comunicado nº 6565 de 18.1.1999, que previa intervenções eventuais e limitadas no mercado, de forma a evitar a taxa de câmbio oscile excessivamente no curto prazo. As regras de intervenção do Banco Central no mercado de câmbio, nesse regime cambial, foram fixadas por meio da Circular nº 2.884, de 6.5.1999, e da Circular nº 2.888, de 20.5.1999, segundo as quais as intervenções do Banco Central são conduzidas entre dealers, instituições credenciadas a operar no mercado de câmbio e de títulos da dívida pública, via operações interbancárias de compra e de venda de divisas, realizadas diretamente ou por leilão eletrônico ou telefônicas. A partir da mudança do regime cambial, o Banco Central adotou medidas para adequar o funcionamento do mercado à nova característica da política cambial, evitando flutuações cambiais bruscas num curto espaço de tempo, segurando com isso uma maior desvalorização do real. Entretanto, essas políticas foram tímidas e tiveram impactos 66 limitados, tendo em vista que os investidores mantiveram-se retraídos, à espera do desenrolar dos acontecimentos. Como observado nos meses seguintes, a escassez relativa de dólares continuou pressionando para a taxa de câmbio, atingindo em março o pico de 2,17 reais por dólar. As medidas adotadas pelo Banco Central foram todas voltadas para incentivar o retorno e a permanência de capitais, inclusive os de curto prazo. A autoridade monetária reduziu para zero o Imposto de Renda sobre Fundos de Renda Fixa para investidores estrangeiros e reduziu a alíquota do IOF de 2% para 0,5% para aplicações em Fundos de Renda Fixa. As diversas medidas implementadas pelo governo após a crise cambial brasileira conseguiram, aos poucos, restabelecer a confiança dos investidores, reforçando a tendência de entrada capitais no país. O cenário interno e externo no primeiro semestre de 2000 estava relativamente favorável, as cotações do dólar descreveram trajetória descendente, oscilando entre mínima de R$1,71 e máxima de R$1,865. Mas a partir do segundo trimestre, a conjuntura externa constitui-se em fonte de pressão sobre a taxa de câmbio, por um lado, a economia norte americana apresentou sinais de crescimento com reflexos inflacionários, gerando incertezas no mercado internacional quanto a novos aumentos das taxas de juros internacional. Por outro lado, a instabilidade política e econômica da Argentina também contribuíram para a deterioração do cenário externo no período. O movimento de capitais em 2000 caracterizou-se pelo aumento dos investimentos no país, principalmente sob a forma de investimentos estrangeiros diretos e pela reversão de fluxos líquidos de empréstimos de médio e longo prazo. Com relação aos investimentos estrangeiros diretos líquidos no país, o valor alcançado chegou a US$30,6 bilhões, maior valor já registrado, reflexo do ingresso de recursos autônomos (US$26,5 bilhões) e dos investimentos em privatizações (US$7,1 bilhões), dos quais US$3,7 bilhões destinados à aquisição do Banespa e US$2,3 bilhões ao setor de telecomunicações. A crescente deterioração do cenário externo em 2001, proveniente do agravamento da situação política e econômica da Argentina, as incertezas quanto à recuperação da economia norte-americana e os atentados em 11 de setembro foram as 67 principais fontes externas de pressão sobre a taxa de câmbio culminaram numa excessiva depreciação da moeda nacional no segundo semestre. No cenário interno, a crise energética pressionava o nível da taxa de câmbio, tendo em vista que poderia restringir significativamente a atividade produtiva. Com efeito, esperava-se uma redução no ritmo de ingresso nos investimentos diretos, o que poderia gerar dificuldades para o financiamento do déficit em conta corrente, mas a piora das condições de financiamento externo, contudo, foi limitada. Os Investimentos Estrangeiros Diretos, embora tenham se situado em patamar inferior ao necessário para o completo financiamento das transações correntes, aproximaram-se desse montante, pois totalizou US$22,6 bilhões, enquanto o saldo em transações correntes foi de pouco mais de US$23 bilhões. A excessiva volatilidade do dólar preocupava as autoridades monetárias, para se ter uma idéia no início do ano estava cotado em R$1,95, em 21 de setembro de 2001 o dólar apresentou sua maior cotação ao atingir R$2,80. Para conter a pressão sobre a taxa de câmbio, o governo brasileiro optou por realizar um empréstimo junto ao FMI no valor de US$ 2 bilhões para intervir no mercado de câmbio. O governo editou diversas medidas para “controlar” o fluxo de capitais estrangeiros, expressa na edição do regulamento do Registro Declaratório Eletrônico (RDE) e à consolidação das normas referentes à imposição de penalidades por irregularidades associada a capitais estrangeiros. A Resolução 2.883, de 30.8.2001, definiu critérios para imposição de penalidades por irregularidades, relacionadas ao fluxo de capitais estrangeiros. As violações abrangidas e as respectivas punições são as seguintes: a) prestação incorreta ou incompleta de informações no prazo previsto em regulamento, R$25 mil ou 1% do valor a que se relaciona a incorreção, o que for menor. Caso a correção ou complementação não seja realizada no prazo determinando pelo Banco Central, a multa será cobrada em dobro; b) ausência de destaque no balanço de empresas da parcela do capital e dos créditos registrados no Banco Central e não apresentação ou atraso nas informações solicitadas no censo de capitais estrangeiros, R$50 mil ou 2% do valor dos destaques não realizados ou das informações não declaradas, o que for menor; 68 c) descumprimento do prazo para registro de capitais no Banco Central, R$125 mil ou 5% do valor sujeito à registro, o que for menor; d) prestação de informação falsa, R$250 mil ou 10% do valor a que se refere a informação, o que for menor. Em qualquer dos casos, poderá haver parcelamento no montante da multa, a critério do Banco Central. Os diversos choques enfrentados pela economia brasileira, especialmente após os atentados em 2001, sinalizava ao governo a importância de adotar medidas restritivas mais enérgicas sobre o fluxo de capitais, já que o câmbio se mostrou muito volátil em momentos de instabilidade financeira, prejudicando as metas impostas pelo regime de metas de inflação. O câmbio continuou oscilando muito em 2002, a taxa situava-se no início do ano num patamar próximo a R$2,35/US$, em dezembro estava quase R$4,00/US$. Diversos fatores concorreram para tal fenômeno, tais quais, as incertezas do processo eleitoral brasileiro, o aprofundamento da crise da Argentina, o rebaixamento da classificação do país por agências de risco internacionais, a crise no mercado acionário norte-americano, a partir da descoberta de uma série de fraudes contábeis em grandes empresas, bem como a guerra do Iraque. Com o ambiente interno e externo desfavorável, os investimentos estrangeiros diretos líquidos no país caíram de US$22,5 bilhões em 2001, para US$16,6 bilhões em 2002. Os investimentos estrangeiros em portfólio totalizaram US$4,8 bilhões em 2002, bem superior ao US$1 bilhão registrado no ano anterior. No tocante as reservas internacionais no conceito liquidez internacional, totalizara US$37,8 bilhões com crescimento de US$2 bilhões no ano. Com base nesse histórico podemos concluir que os controles de capitais adotados no Brasil no período 1991- 2002 foram essencialmente endógenos, aplicados sobre a entrada de recursos estrangeiros e feitos fundamentalmente por intermédio da cobrança de IOF sobre os ganhos das aplicações financeiras no país. Portanto, eram principalmente controles baseados em preços, sob a forma de uma taxação direta sobre a entrada de capitais externo, que foram continuamente revistos. Em outras palavras, o governo reagia aumentando o controle nos períodos de boom e liberalizando nos períodos 69 de crise. Dessa forma, os fluxos externos de recursos acabavam por determinar o nível dos controles de capitais, ao invés de serem determinados pelo nível dos referidos controles.28 4.3 – Controle de Capitais e seus Desdobramentos: uma Estimação com Vetores Auto Regressivos (VAR) a partir da Experiência Recente da Economia Brasileira Desde a crise da dívida externa, no final de 1982, que provocou, entre outras coisas, a interrupção das concessões de empréstimos voluntários, a economia brasileira contou apenas com recursos acordados em processos de renegociação da dívida. Nesse período, os empréstimos voluntários restringiram-se a uma reduzida parcela de desembolsos de matriz para filial. Entretanto, esse cenário começou a mudar em 1990, a crescente liberalização da conta de capital implementada durante a década de noventa foi marcante para a economia brasileira. O retorno do fluxo de capitais para as economias emergentes refletiu uma maior integração financeira do mercado mundial, aliado a um amplo processo de desregulamentação do sistema financeiro. A captação dos fluxos de capitais justificava-se pelos benefícios desses fluxos para a performance macroeconômica de um país, mas que poderia trazer sérios problemas para as contas externas. Em virtude da elevada instabilidade financeira/cambial, a economia brasileira apresentou sérias dificuldades para administrar a política econômica. Considerando-se os problemas que a excessiva volatilidade dos fluxos de capitais acarretam para a condução da política econômica, tem-se defendido o uso do controle seletivo de capitais. Segundo Cardoso & Goldfajn (1998) e Cardoso (2000) a adoção dessas medidas de controle de capitais desencoraja certas formas de capitais. Para avaliar a evolução das medidas implementadas sobre o fluxo de capitais ocorridas na economia brasileira ao longo da década de noventa, utiliza-se o Índice de Controle de Capitais (ICC) elaborado por Cardoso & Goldfajn (1998). Esses autores construíram indicadores com o intuito de medir as mudanças mensais ocorridas na legislação que afetam o fluxo de capital por intermédio das alterações ocorridas no controle a entrada e a saída de capital. 28 Paula, Oreiro e Silva (2003). 70 Seguindo Cardoso & Goldfajn (1998), há duas medidas de controle de capital, ∆CC1 e ∆CC 2 , definidas como combinações lineares de mudanças nas restrições sobre fluxos de saída e fluxos de entrada de capitais29: ∆CC1 = ∆RI − 0,5.∆RO (1) ∆CC 2 = ∆RI + 0,5.∆RO (2) sendo que (i) ∆RI é uma medida imposta sobre o fluxo de entrada de capitais, em que uma mudança na legislação que venha a reduzir tais fluxos, como um aumento no IOF sobre entrada de capitais, recebe valor igual a 1, enquanto que uma mudança na legislação direcionada para estimular o fluxo de entrada de capitais recebe um valor igual a –1; (ii) ∆RO é uma medida que capta variação legislação sobre a saída de capitais, em que qualquer mudança na legislação que vise afetar a redução nos fluxos de saída de capitais recebe valor igual a 1, e qualquer mudança que liberalize a saída de capitais recebe o valor igual a –1. Analisando-se a evolução dos dois indicadores acima em 1990/2001, pode-se observar que houve – como tendência geral - uma gradual e crescente abertura da conta de capital da economia brasileira no período, confirmando os achados de Cardoso & Goldfajn (1998), Soihet (2002) e Oreiro, Paula & Silva (2004). Em termos gerais, os controles de capitais no Brasil foram utilizados para assegurar que a implantação do Plano Real fosse tranqüila, sem que o ambiente econômico mais estável e seguro para os investidores pressionassem a taxa de câmbio. Essas e outras medidas restritivas sobre o fluxo de capitais tinham por objetivo melhorar a qualidade do fluxo de capitais que ingressavam no país. Nas palavras de Ariyoshi et al (2000), de certa forma, esse objetivo foi alcançado: “These and subsequent control measures aimed at improving the quality of the capital flows to Brazil by attempting to change their composition from short-term to long-term inflows, by either restricting or banning investments in certain assets, 29 Ambos os indicadores, ∆CC1 e ∆CC2, permitem respostas contrárias nos fluxos de entrada e saída de capitais a mudança em ∆RO ao estabelecer um peso neste de 0,5: a primeira medida assume que restrições sobre saída de capitais tem um impacto maior sobre a saída do que sobre a entrada de capitais, enquanto que a segunda medida assume que o impacto sobre os fluxos de entrada das restrições sobre saída de capitais domina os efeito dessas restrições sobre os fluxos de saída. 71 increasing the entrance tax on certain types of portfolio inflows, or using other measures to increase the maturity of permissible investments in Brazil. Restrictions were imposed on the size and maturity of export credit, which was seen as a channel to circumvent restrictions on capital inflows. Capital outflows were also further liberalized.” (Ariyoshi et al, 2000, 45-46p) Contudo, ao longo dos primeiros anos da década de noventa, a eficiência das medidas restritivas sobre o fluxo de capitais no Brasil foi limitada. Nas palavras de Ariyoshi et al (2000): “The main lesson from the Brazilian experience seems to be that the effectiveness of capital controls might be limited in an environment where the sophistication of the financial markets reduces the cost of circumvention relative to the incentives for circumvention. In the long run, repeated attempts by the authorities to restrict capital inflows were unsuccessful, since capital continued to find ways to enter the economy, particularly in view of the persistent incentives provided by interest rate differentials that remained high in the absence of fiscal adjustment.” (Ariyoshi et al, 2000, 46p) Para avaliar o comportamento das medidas incidentes sobre o fluxo de capitais ao longo da década de noventa, divide-se a análise da seguinte forma (Soihet, 2002, seção 3.2): de janeiro de 1990 a julho de 1994 a maioria das medidas relacionada a controle de capitais foi liberalizante; de agosto de 1994 a dezembro de 1996 houve um misto de medidas liberalizantes com medidas restritivas; já a partir de 1997, percebeu-se um claro predomínio de medidas liberalizantes. De fato, como se pode perceber com base no Gráfico 12, o caráter endógeno dos controles de capitais parece bastante evidente, sendo que, em particular, a partir de 1997, em função das sucessivas pressões especulativas sobre o real, houve um nítido incentivo por parte do governo a favorecer a entrada e manutenção do capital no país. A experiência recente da economia brasileira mostrou que o país caminhou para uma liberalização crescente da conta de capitais, sem que houvesse uma tendência de melhora no desempenho macroeconômico. 72 Gráfico 12 Índice de Controle de Capitais: 1990-2001 20 jan/01 jan/00 jan/99 jan/98 jan/97 jan/96 jan/95 jan/94 jan/93 jan/92 jan/91 Variação Acumulada -20 jan/90 0 -40 -60 -80 -100 -120 -140 -160 Período CC1 (acumulado) CC2 (acumulado) Fonte: Elaborado a partir de Soihet (2002) Observando-se o Gráfico 12 percebe-se que houve uma crescente liberalização da conta de capitais no Brasil. Com efeito, segundo Oreiro, Paula & Silva (2004) houve um aumento da variação da taxa de câmbio e da taxa de juros, conseqüentemente, o desempenho macroeconômico da economia brasileira no período na década ficou comprometido. O Gráfico 13, mostra que houve uma tendência decrescente da taxa de crescimento do produto industrial ao longo da década de noventa: 73 Gráfico 13 Taxa de Crescimento Anual do Produto Industrial no período de 1992-2003 20,0% 15,0% 10,0% % 5,0% setembro 2003 fevereiro 2003 julho 2002 dezembro 2001 maio 2001 outubro 2000 março 2000 agosto 1999 janeiro 1999 junho 1998 novembro 1997 abril 1997 setembro 1996 fevereiro 1996 julho 1995 dezembro 1994 maio 1994 outubro 1993 março 1993 -10,0% agosto 1992 -5,0% janeiro 1992 0,0% -15,0% Período Taxa de Crescimento Fonte: IBGE Para efeito do exercício econométrico, com intuito de observar entre outras coisas, o impacto dos controles de capitais sobre a taxa de câmbio e a taxa de juros, utilizase à metodologia Vetores Auto-Regressivos (VAR). Essa metodologia é útil por possibilitar a análise das relações dinâmicas entre variáveis endógenas, sem definir a priori a ordem de determinação e causalidade. A discussão do modelo de Vetores Autoregressivos foi introduzida por Christopher Sims (1980), no seu trabalho seminal intitulado “Macroeconomics and Reality”. Uma das principais contribuições do trabalho de Sims (1980), entre outras coisas, foi tornar os modelos de equações simultâneas capazes de analisar as inter-relações entre as variáveis macroeconômicas e seus efeitos a partir de “choques” que provocam ciclos na economia, isto é, esses modelos foram capazes de analisar a importância relativa de cada “surpresa” (ou inovações) sobre as variáveis do sistema macroeconômico. Esta é a 74 abordagem empírica que possibilita um maior entendimento de como as variáveis macroeconômicas respondem a esses “choques”, simultaneamente30. Cada equação definida pelo VAR nada mais é que uma regressão por Mínimos Quadrados Ordinários (MQO) de uma determinada variável em variáveis defasadas de si própria e de outras variáveis componentes do modelo. Dessa forma, a metodologia VAR permite verificar quais as defasagens de uma variável são significativas na determinação do comportamento de uma outra, e vice-versa. O exercício a ser realizado, tem por objetivo estimar um modelo de Vetores Autoregressivos (VAR) com o intuito de apreender a influência da liberalização sobre as variáveis macroeconômicas chaves do país, e vice-versa, no período jul/1994-dez/2001. Para tanto, selecionou-se dados mensais no período em consideração das seguintes variáveis: Índice de Controle de Capitais, da Taxa Básica de Juros e da Taxa de Câmbio31. onde, ICC1t mostra o Índice de Controle de Capitais, calculado pelo autor a partir de Soihet (2002); JuroSelict é a taxa de juros SELIC acumulada no mês anualizada - Banco Central do Brasil; Txcambiot é a taxa de câmbio comercial para venda (média) - Banco Central do Brasil. Inicialmente, foram realizados os testes de ADF para se detectar a estacionariedade ou não das séries temporais. Observe que a taxa de juros foi estacionária em nível, mas por conveniência metodológica32, optou-se por trabalhar com a primeira diferença da mesma, conforme Tabela III. 30 Maia (2001, 2-3p.) O período de análise foi escolhido pela disponibilidade de dados. 32 Decidiu-se trabalhar todas as variáveis com variações. 31 75 Tabela III – Teste de Raiz Unitária - ADF Discriminação Defasagens Constante Tendência ADF DW N° de 1% Critical 5% Critical Observações Value Value TxCâmbio 2 sim sim -2,25 1,96 87 -4,07 -3,46 DTxcâmbio 1 não não -7,86* 1,96 87 -2,59 -1,94 ICC1 11 sim sim -2,81 2,00 78 -4,08 -3,47 DICC1 2 não não -3,12* 1,99 86 -2,59 -1,94 JuroSelic 12 sim não -2,93** 1,96 77 -3,52 -2,90 DJuroselic 0 não não -15,29* 2,19 88 -2,59 -1,94 Nota: * e ** indicam significância aos níveis de 1% e 5% respectivamente. “D” indica a primeira diferencia da variável. Os valores críticos para a rejeição da hipótese nula de raiz unitária foram gerados do pacote econométrico Eviews 3.1. Para selecionar o melhor modelo VAR para as quatro variáveis, toma-se como base o Critério de Schwarz (CS). Essa estatística e útil para determinar o número de defasagens a incluir no VAR, já que leva em consideração a soma dos quadrados dos resíduos, o número de observações e o número de estimadores do parâmetro. Portanto, quanto menor o valor do SC, melhor será o modelo33. Dessa forma, a Tabela IV indica que o melhor modelo é aquele com uma defasagem tomando como referência principal o Critério de Schwarz. Tabela IV - Seleção do Modelo para o VAR Discriminação Log Likelihood Akaike Information Criteria Schwarz Criteria 4 Defasagens -704,64 17,50 18,62 3 Defasagens -727,22 17,61 18,47 2 Defasagens -750,68 17,74 18,34 1 Defasagem -774,02 17,86 18,20 Notas: Variáveis utilizadas na análise foram: Índice de Controle de Capitais, Taxa Básica de Juros e Taxa de Câmbio Comercial. Amostra corresponde a jul/1994 – dez/2001. O Teste de Causalidade de Granger examina se os valores defasados de uma determinada variável ou grupo de variáveis desempenham algum papel na determinação de outras variáveis no sistema. Dessa forma, a rejeição da hipótese indica que tais defasagens são importantes na previsão de uma determinada variável. A hipótese de que a variável X 33 O Critério de Schwarz minimiza os erros de forma logarítmica e o critério de informação de Akaike de forma linear. 76 não causa o PIB a Granger podia ser testado simplesmente através da regressão do PIB sobre os valores defasados do próprio PIB e da variável X, examinando em seguida se o coeficiente da última variável é significativamente diferente de zero (Johnston & Dinardo, 2000). A Tabela V nos mostra que a taxa de câmbio determinou no período considerado a taxa de juros, o que é razoável se pensarmos inicialmente que as taxas de juros foram utilizadas num primeiro momento para atenuar as crises internacionais/cambiais e após 1999 a taxa de juros passou a ser utilizada para combater a inflação (regime de metas de inflação). Discriminação Tabela V - Causalidade de Granger DICC1 DSELIC DTXCAMBIO DICC1 - 0.19785 0.97573 DSELIC 0.29862 - 0.48680 DTXCAMBIO 0.46433 0.06430 - Nota: Os valores menores do que 10% indicam a rejeição da hipótese nula. Ou seja, aceita-se a hipótese que a variável na coluna causa, no sentido de Granger, a variação discriminada na 1ª linha. Segundo Johnston & Dinardo (2000) as funções resposta ao impulso permitem calcular as reações em cadeia de um determinado choque. A idéia é a seguinte, suponha um sistema de 1ª ordem com duas variáveis: y1t = a11 y1 , t −1 + a12 y 2 , t −1 +ε 1t (1) Y2t = a 21 y1 , t −1 + a 22 y 2 , t −1 +ε 2t (2) Uma alteração em ε 1t tem um efeito imediato de um para um em y1t , mas não tem efeito em y 2t . No período seguinte, essa alteração em y1t afeta y t ,t +1 através da 1ª equação, mas também afeta y 2,t +1 através de segunda equação. Esses efeitos em cadeia se repercutem no tempo. Este vetor estabelece um choque de um desvio padrão na 1ª equação, mantendo todos os outros choques constantes. As respostas a um impulso de um desvio padrão em ε 1 no ICC estão representadas na Figura 1. Em suma, os resultados mostram que a taxa básica de juros (SELIC) responde negativamente a um impulso no ICC, portanto, um aumento nos 77 controles de capitais pode diminuir a variação na taxa de juros no curto prazo. A idéia evidenciada é a de que os controles podem ajudar as autoridades monetárias a reduzir a taxa de juros sem que haja uma fuga maciça de capitais do país. Observou-se também que a taxa de câmbio não respondeu a um choque no ICC, contrariando a tese de Arida (2004) de que as medidas restritivas sobre o fluxo de capitais causariam um desajuste no mercado cambial, podendo até precipitar um ataque especulativo. Figura 1 – Funções Impulso-Resposta (DICCt, DSELICt, DTXCAMBIOt)34 Response to One S.D. Innovations ± 2 S.E. Re s pons e of DICC1 to DICC1 2. 5 2. 5 2. 0 2. 0 2. 0 1. 5 1. 5 1. 5 1. 0 1. 0 1. 0 0. 5 0. 5 0. 5 0. 0 0. 0 0. 0 -0. 5 1 -0. 5 1 -0. 5 1 2 3 4 5 6 Re s p o n s e o f DCAM BIO to DICC1 2 3 4 5 6 Re s p o n s e o f DCAM BIO to DCAM BIO 16 16 12 12 12 8 8 8 4 4 4 0 0 0 -4 1 2 3 4 5 6 Re s pons e of DSELIC to DICC1 2 3 4 5 6 1 Re s p o n s e o f DSEL IC to DCAM BIO 6 4 4 4 2 2 2 0 0 0 -2 2 3 4 5 6 4 5 6 2 3 4 5 6 Re s p o n s e o f DSEL IC to DSEL IC 6 1 3 -4 1 6 -2 2 Re s p o n s e o f DCAM BIO to DSEL IC 16 -4 34 Re s pons e of DICC1 to DSELIC Re s p o n s e o f DICC1 to DCAM BIO 2. 5 -2 1 2 3 4 5 6 1 2 3 4 5 6 Convém lembrar que a ordem das variáveis foi desconsiderada por não afetarem os resultados encontrados. 78 Em suma, apesar das evidências não serem conclusivas, pode-se afirmar a princípio que o Índice de Controle de Capitais (ICC) influencia as variações na taxa de câmbio e na taxa de juros. Portanto, caso as autoridades monetárias intensificasse o uso dos controles de capitais no Brasil, poderia gerar resultados bastante satisfatórios, tornando a taxa de câmbio relativamente mais estável e uma redução da variação da taxa de juros, conseqüentemente, melhorando a performance macroeconômica da economia brasileira. 4.4 – Implicações Macroeconômicas da Legislação Cambial: a Crítica de Franco & Pinho Neto O Brasil durante muitos anos e por diversos fatores manteve um arcabouço regulatório de caráter restritivo que mudou pouco nas últimas décadas. Segundo Franco & Pinho Neto (2004) as regras cambiais brasileiras começaram a mudar de fato na década de 1990. Este processo iniciou-se com a separação dos mercados de câmbio, que veio a fornecer o fundamento para a criação do “dólar turismo” e em seguida o “mercado de câmbio de taxas flutuantes” apartado do mercado principal, chamado de “mercado de câmbio de taxas livres” e conhecido como o “comercial”. Mas foi em 1992 que o “princípio da inconversibilidade” sofreu seu primeiro ataque frontal, com as normas que modificaram a sistemática de funcionamento das contas de não residentes (CC5) abrindo-se em importante precedente de conversibilidade da conta de capitais, embora fossem conversíveis apenas pelo mercado de câmbio flutuante. A evolução da legislação cambial no Brasil tem sido bastante gradual no que tange ao tratamento prévio das saídas de capital. A nova arquitetura da CC5, estabelecida em 1992, representava uma revolução no regime cambial brasileiro. Não obstante, a CC5 passou a ser registrada no SISBACEN, onde suas movimentações eram observadas. Mas, é importante salientar que, apesar das dificuldades com a dívida externa, especialmente nos anos 80, a sistemática cambial associada a investimentos de maturidade mais longa jamais sofreu interferência. Franco & Pinho Neto (2004, 32p.) argumentam que, quando se trata de investimento direto, é difícil argumentar que os controles cambiais em geral, e a Lei 4.131/62 em particular fazem crescer de forma proibitiva e indevida o chamado “Risco-Brasil” e afugentam esta classe de investidores estrangeiros. 79 Apesar de não haver consenso na literatura empírica sobre a relação entre liberalização da conta de capital e crescimento econômico, é fato que as restrições administrativas remanescentes na conta corrente e na conta de capital limitam, em alguma medida, a propensão ao comércio das empresas, a captação de recursos externos e o desenvolvimento do país. Apesar da literatura empírica identificar outros fatores como determinantes para o elevado grau de concentração das exportações brasileiras, a legislação cambial funciona como uma barreira para que as pequenas e médias empresas se tornem exportadoras e gerem divisas para o país. A simplificação da legislação cambial brasileira pode melhorar a performance macroeconômica do país. Segundo Franco & Pinho Neto (2004, 3p.) deve-se repensar a regulamentação cambial brasileira em geral, e da conta de capitais em particular, neste novo contexto internacional de ricas e complexas relações financeiras internacionais, onde predominam taxas de câmbio flutuantes e voláteis, e uma miríade de novas preocupações de natureza regulatória, nada tem de pacífico. De um lado, permanece em aberto a velha discussão sobre os méritos macroeconômicos da liberalização da conta de capitais e seu adequado “sequenciamento”, discussão esta que renasceu em novas bases em vista da experiência recente. De outro, novos desafios no interior da própria esfera regulatória, especialmente no domínio tributário e prudencial, viriam a conferir dimensões inteiramente novas ao debate sobre conversibilidade na conta de capitais. De fato, ao longo da década de 1990, houve um avanço importante no sentido de permitir uma maior liberalização da conta de capitais, mas ainda há muito por fazer. Franco & Pinho Neto (2004) defendem um aprofundamento da abertura da conta de capital de forma gradual e responsável. Este processo deve começar pelo desenvolvimento das instituições, passar pela sistematização das normas cambiais, de modo a eliminar suas contradições, e terminar com um significativo aperfeiçoamento das regras vigentes no mercado cambial. 4.5 – Por uma Moeda Plenamente Conversível: a Crítica de Arida A discussão recente sobre as implicações dos controles de capitais para a economia tem sido direcionada para dois pontos. O primeiro ponto é que se acredita que as 80 medidas restritivas sobre o fluxo de capitais aumentam a percepção de risco por parte dos investidores, o que acaba gerando a necessidade de superávits primários ainda maiores. O segundo ponto refere-se aos efeitos dos controles de capitais sobre o mercado cambial, na medida em que os agentes antecipam as medidas, que tem um caráter essencialmente endógeno. Arida (2003a) em trabalho recentemente publicado na Revista de Economia Política afirmou que a manutenção de regimes de mobilidade de capitais restrita, mesmo com taxas de câmbio flutuante sinaliza aos credores internacionais a própria desconfiança do Banco Central quanto à solidez do padrão monetário doméstico. Portanto, a possibilidade de implementação de medidas restritivas sobre o fluxo de capitais sinalizaria a pouca confiança do próprio tesouro na sua capacidade de honrar os compromissos financeiros internos. A adoção de medidas restritas transmitiria uma mensagem implícita de que, em determinadas circunstâncias, pode não haver reservas suficientes para sustentar o câmbio. A percepção negativa dos agentes é manifestada através de prêmios de risco elevados. Nas palavras de Arida (2003 a): “Os elevados prêmios de risco, interpretados pelo Banco Central como resultantes de avaliação exógena do mercado sobre os fundamentos e justificadores, portanto, de sua prudência, em boa medida apenas refletem a leitura que ele, Banco Central, está sinalizando do próprio mercado (...). O círculo vicioso faz com que os prêmios de risco permaneçam elevados e suba por conseqüência o superávit primário necessário para estabilizar a moeda. Dito de outra forma: a estabilização com conversibilidade restrita exige um superávit fiscal maior do que o necessário sob livre conversibilidade” (Arida, 2003 a, 141p.). O efeito dos controles sobre o prêmio de risco teria implicações diversas sobre a economia brasileira. Inicialmente, aumentaria a taxa de juros doméstica, pois sendo válida a paridade descoberta da taxa de juros, a taxa de juros nominal deve ser igual a soma da taxa de juros internacional com o risco-país e a expectativa de desvalorização cambial. Pelo efeito acima, um aumento no risco-país e/ou uma expectativa de depreciação excessiva da moeda doméstica devido à possibilidade de imposição de restrições à livre mobilidade de capitais, resultaria em taxas reais de juros domésticos mais elevadas. Com efeito, restringiria a atividade produtiva e por conseqüência o crescimento da economia. Um aspecto secundário da argumentação de Arida é que os controles de capitais são vistos como uma “solução ineficiente” para os problemas cambiais resultantes de 81 imperfeições de mercado. Segundo Arida (2004), a racionalidade dos controles de capitais em câmbio flutuante para os seus defensores advém da crença de que sem essas medidas restritivas sobre o fluxo de capitais haveria uma migração da poupança para o exterior, depreciando a moeda aumentaria a vulnerabilidade a processos especulativos que poderiam levar a apreciações ou depreciações exageradas. Na verdade, os controles prestariam um desserviço ao bom funcionamento da economia. Arida (2004) argumenta que a possibilidade de introdução de controles por via administrativa agravaria os desajustes no mercado cambial, tendo em vista que os agentes podem antecipar a introdução dos controles de capitais e mudar seu curso de ação exatamente por anteciparem a introdução dos mesmos. Suponha uma situação em que houve uma desvalorização da moeda, uma instituição financeira doméstica que tenha empréstimos contraídos no exterior tratará de adquirir moeda estrangeira muito antes de seu vencimento, mesmo que a uma taxa de câmbio que lhe pareça excessivamente depreciada, para não correr o risco de ficar inadimplente no caso de decretação de bloqueio administrativo de remessas. Portanto, a expectativa da introdução de controles aumenta a demanda por ativos em moeda estrangeira, criando uma demanda por precaução que de outra forma não existiria, e termina por agravar o processo de desvalorização em curso. O Brasil, segundo o autor, passou por um problema semelhante em 2002, as linhas de crédito comercial e bancário deixaram de ser renovadas, mesmo que parcialmente, sem que tivesse havido qualquer modificação na política macroeconômica. À parte o efeito traumático da moratória Argentina, a parada súbita refletiu a convicção dos mercados de que o Governo Lula seria populista (políticas fiscais e monetárias excessivamente expansivas) e que as autoridades recorreriam ao controle de capitais. Se não tivesse havido o medo da imposição de controles de capital, a mera deterioração das expectativas sobre a trajetória futura das políticas fiscal e monetária teria causado uma depreciação da moeda, não uma parada dos financiamentos. A existência de um quadro normativo que assegura ao Banco Central o poder de impor controles administrativos agrava as distorções existentes. Assim, os poupadores tenderão a manter sua poupança em uma jurisdição mais respeitadora dos direitos de propriedade se tal opção lhes for facultada. 82 Arida (2003 b), sugeriu um programa de conversibilidade plena da moeda que serviria para reduzir o prêmio de risco pago pelo governo. A vantagem da adoção do regime de conversibilidade livre é que estaria sinalizando ao mercado a confiança do Banco Central em sua política, na sua capacidade de honrar seus compromissos e atender toda a demanda por divisas. O regime de plena conversibilidade da moeda, por um lado, afastaria o fantasma da moratória externa, por outro, cortaria drasticamente os custos de transações com o mercado externo, gerando um ganho de eficiência para a sociedade como um todo. Se a adoção de um regime de plena conversibilidade for percebida como não sustentável ao longo do tempo, não terá efeito algum sobre a demanda por ativos na jurisdição doméstica por parte de poupadores externos. Mas se for percebida como um anúncio crível, melhorando a qualidade percebida do padrão monetário doméstico e afastando os temores de uma futura imposição de controles de saída de capitais, os dois grupos aumentarão sua demanda por ativos na jurisdição doméstica, e a taxa de câmbio, tudo o mais constante, deverá se apreciar. Para que seja percebida como um sinal de confiança no padrão monetário doméstico, deve ser acompanhada por um conjunto de políticas macroeconômicas sustentáveis e respeitadoras dos direitos do poupador, evitando-se qualquer forma de confisco ou bloqueio de liquidez e mantendo-se a inflação sob controle através da aderência determinada ao sistema de metas inflacionárias. Isto nos remete ao formato pré-anunciado e gradativo pelo qual a conversibilidade plena poderia ser introduzida no Brasil. 4.6 – Por Uma Moeda Parcialmente Conversível: uma Crítica a Arida Recentemente alguns economistas brasileiros têm defendido a tese de que o Brasil deveria adotar a plena-conversibilidade da conta de capital do balanço de pagamentos, com intuito de reduzir o prêmio de risco em função da zeragem do risco de conversibilidade, permitindo assim uma redução expressiva do patamar de equilíbrio da taxa de juros doméstica e, dessa forma, um aumento do investimento e uma aceleração do crescimento econômico. Esses argumentos foram levantados, inicialmente, por Arida (2003a, 2003b) e Bacha (2003) em artigos publicados pela Revista de Economia Política. A crítica 83 acadêmica a tese de plena-conversibilidade da conta de capitais foi feita, entre outros, por Beluzzo e Carneiro (2004a) e por Oreiro, Paula e Silva (2004). Neste último artigo argumentou-se que (i) os supostos efeitos da plena-conversibilidade da conta de capitais sobre o prêmio de risco país não encontram respaldo ou antecedente na literatura internacional especializada sobre o referido tema; o que sinalizaria a ausência de uma fundamentação teórica mais consistente para a mesma; (ii) testes econométricos preliminares sobre a relação entre prêmio de risco Brasil e o grau de conversibilidade da conta de capitais, tal como medido pelo índice proposto por Goldfajn e Cardoso (1998), mostram que o nível de conversibilidade da conta de capitais não tem nenhum impacto estatisticamente significativo sobre o prêmio de risco. Arida (2004) em artigo mais recente detalha suas críticas a possibilidade de introdução de controles de capital no Brasil. Ono et ali (2004) avaliaram os novos argumentos desenvolvidos por Arida e observaram que: (i) Na verdade, a economia brasileira, desde o início da década de 1990, tem caminhado para uma situação de conversibilidade crescente da conta de capitais sem nenhum efeito perceptível da mesma sobre o prêmio de risco. No exercício econométrico realizado, o risco país mostrou-se mais relacionado com variáveis de outra natureza como, por exemplo, a variação na taxa de juros doméstica, a variação nas reservas internacionais e na taxa nominal de câmbio. Na verdade, a ausência de controles de capitais mais severos nos momentos de crises econômicas e financeiras pode ter sido um dos fatores responsáveis pela excessiva volatilidade do prêmio de risco; (ii) segundo, não há um consenso na literatura empírica recente a respeito da associação positiva entre liberalização financeira e crescimento econômico. O exercício econométrico, utilizando-se dados em painel, avaliou o efeito de um regime de plenaconversibilidade da conta de capitais sobre a taxa de crescimento da renda per capita num grupo de 61 países. Os resultados apontam para uma relação inversa entre conversibilidade e crescimento econômico, ou seja, países com a conta de capitais conversíveis estiveram mais propensos a apresentar reduções na taxa de crescimento da renda per capita. Dessa forma, conclui-se que não existem argumentos de natureza teórica ou empírica que sustentem a tese de que a plena conversibilidade da conta de capitais traria consigo uma redução significativa dos prêmios de risco ou uma melhora da performance 84 macroeconômica do país, na verdade os efeitos podem se dar precisamente no sentido oposto ao sugerido por Arida e Bacha. 4.7 - Conclusão As evidências encontradas com base no histórico descrito nesse capítulo mostram que, se as autoridades monetárias utilizassem de forma mais severa os controles de capitais, a economia brasileira poderia melhorar seu desempenho macroeconômico. O problema é que os controles de capitais no Brasil foram essencialmente endógenos, aplicados sobre a entrada de recursos estrangeiros e feitos fundamentalmente por intermédio da cobrança de IOF sobre os ganhos das aplicações financeiras no país. O caráter endógeno dos controles de capitais deve-se ao fato do governo reagir aumentando os controles nos períodos de boom e liberalizando nos períodos de crise. Dessa forma, os fluxos externos de recursos acabavam por determinar o nível dos controles de capitais, ao invés de serem determinados pelo nível dos referidos controles. No tocante a discussão teórica, esse trabalho mostrou fortes evidências de que os argumentos levantados, por Arida (2003a, 2003b) e Bacha (2003) carecem de fundamentação teórica e empírica. A crítica acadêmica a tese de plena-conversibilidade da conta de capitais foi feita, entre outros, por Belluzzo e Carneiro (2004a) e por Oreiro, Paula e Silva (2004). Neste último artigo argumentou-se que (i) os supostos efeitos da plenaconversibilidade da conta de capitais sobre o prêmio de risco país não encontram respaldo ou antecedente na literatura internacional especializada sobre o referido tema; o que sinalizaria a ausência de uma fundamentação teórica mais consistente para a mesma; (ii) testes econométricos preliminares sobre a relação entre prêmio de risco Brasil e o grau de conversibilidade da conta de capitais, tal como medido pelo índice proposto por Goldfajn e Cardoso (1998), mostram que o nível de conversibilidade da conta de capitais não tem nenhum impacto estatisticamente significativo sobre o prêmio de risco. 85 5 – Crescimento Endógeno, Endividamento Externo e Controle de Capitais em Economias Emergentes: Cenários Macroeconômicos 5.1 - Introdução Os defensores da liberalização da conta de capital freqüentemente argumentam que o crescimento econômico pode ser estimulado ou induzido pela poupança externa. Como foi visto no capítulo 2, Bresser & Nakano (2003) criticaram essa tese de que a poupança externa é necessária para o crescimento dos países emergentes. Para esses autores, o financiamento do crescimento por intermédio da poupança externa tende a gerar uma redução da taxa de crescimento de longo prazo das economias emergentes em função do aumento explosivo do endividamento externo, tornando essas economias mais suscetíveis a crises do balanço de pagamentos. A formalização dos argumentos de Bresser & Nakano foi feita por Oreiro (2004) por intermédio da construção de um modelo macrodinâmico de inspiração póskeynesiana no qual se analisam os mecanismos econômicos pelos quais o endividamento externo pode gerar uma performance macroeconômica caracterizada por uma baixa utilização da capacidade produtiva e ciclos de expansão e contração do nível de atividade econômica. As hipóteses básicas desse modelo são as seguintes: i) a taxa desejada de crescimento do estoque de capital é uma função (não-linear) do endividamento externo como proporção do produto real; ii) o prêmio de risco país é endógeno, sendo uma função direta do nível do endividamento externo. Nesse arcabouço teórico demonstra-se a existência de duas posições de equilíbrio de longo-prazo, a primeira caracterizada por um baixo nível de endividamento externo e um elevado grau de utilização da capacidade utilizada; e a segunda caracterizada por um elevado nível de endividamento externo e um baixo grau de utilização da capacidade. A análise de estabilidade do modelo demonstrou que o equilíbrio com baixo endividamento é instável (do tipo trajetória de sela), ao passo que o equilíbrio com alto endividamento – para uma certa constelação de parâmetros do modelo – é estável, sendo que a economia apresentará um movimento oscilatório amortecido em torno dessa posição. 86 A instabilidade cambial e financeira observada recentemente no mercado financeiro internacional ressuscitou a discussão sobre a importância dos controles de capitais para as economias emergentes. Nesse contexto, Oreiro & Guerberoff (2004) adaptaram o modelo de Oreiro (2004) para analisar o impacto da introdução de controles de capitais sobre a trajetória temporal de uma série de variáveis macroeconômicas (taxa de juro, exportações líquidas e grau de utilização da capacidade produtiva), bem como o efeito dos mesmos sobre o nível de fragilidade externa da economia. Os resultados do modelo de Oreiro & Guerberoff (2004) mostraram que o papel do controle de capitais em uma economia pode ser muito mais complexo do que a simples análise de efeitos instantâneos e de curto prazo poderiam sugerir. Assim, nos estágios iniciais da dinâmica, o controle de capitais tende a aumentar o nível de utilização da capacidade produtiva. Ao longo do tempo, no entanto, esse aumento no nível de utilização da capacidade leva a uma deterioração das contas externas, que produz um aumento do endividamento externo e uma redução do nível de utilização da capacidade produtiva. Uma limitação importante das análises de Oreiro (2004) e Oreiro & Guerberoff (2004) é que a taxa de crescimento do produto real é tomada como exógena. Em outras palavras, ambos os modelos não especificam os determinantes do crescimento de longoprazo das economias capitalistas. Nesse contexto, o presente capítulo é uma contribuição no sentido de eliminar essa deficiência dos referidos modelos. Com efeito, ao longo deste capítulo será desenvolvido um modelo macrodinâmico semelhante aos desenvolvidos por Oreiro (2004) e Oreiro & Guerberoff (2004) no qual a taxa de crescimento do produto real é uma variável endógena. Dessa forma, pode-se reavaliar o impacto da introdução dos controles de capitais sobre a dinâmica de longo-prazo de economias emergentes, levando-se em conta as possíveis interações desses controles sobre a performance macroeconômica dessas economias. Mais especificamente, o modelo aqui apresentado tem por objetivo analisar o impacto dos controles de capitais sobre a trajetória temporal da lucratividade, do endividamento externo, da taxa doméstica de juros, do crescimento econômico, do nível de utilização da capacidade produtiva e das exportações líquidas. 87 Para tanto, o capítulo foi estruturado em seis seções, incluindo a presente introdução. Na seção 2 apresenta-se a estrutura básica do modelo teórico utilizado. A seção 3 apresenta a dinâmica da dívida externa e os equilíbrios múltiplos. A seção seguinte está dedicada a análise da estabilidade de curto e longo prazo do modelo. Na seção 5 são feitas algumas simulações computacionais com o objetivo de comparar as trajetórias temporais das variáveis macroeconômicas de interesse no caso em que há perfeita conversibilidade da conta de capitais e no caso em que os controles de capitais são introduzidos. A seção 6 sumariza as conclusões obtidas ao longo do capítulo. 5.2 – A Estrutura Básica do Modelo Teórico O presente modelo parte do trabalho de Oreiro (2004). A versão original do modelo de Oreiro apresenta uma economia na qual (i) o investimento em capital fixo é positivamente influenciado pela razão dívida externa/PIB em função do efeito positivo da maior diversidade de fontes de financiamento sobre o risco do tomador; (ii) a mobilidade de capitais é perfeita, ou seja, vale a assim a chamada “paridade descoberta da taxa de juros”; (iii) o prêmio de risco país é endógeno, variando em conformidade com a dívida externa como proporção do PIB. Consideremos uma economia na qual as empresas tenham poder de mercado e fixem os seus preços com base num mark-up fixo sobre os custos de produção (cf. Taylor, 1989, p.21). Dessa forma os preços domésticos são determinados com base na seguinte equação: p = (1 + τ )[ wb + ep 0* a 0 ] (1) Onde: p é o nível de preços doméstico, w é a taxa de salário nominal, p* é o nível de preços internacional, e é a taxa nominal de câmbio, b é o requisito unitário de mãode-obra, a0 é o requisito unitário de matérias-primas importadas e τ é a taxa de mark-up. Seja r a taxa de lucro e u o grau de utilização da capacidade produtiva. Pode-se demonstrar que a taxa de lucro é dada por: 88 r= τ u 1+τ (2) Assim, pode-se observar que a lucratividade é uma função crescente do markup35 e do grau de utilização da capacidade produtiva. O mercado de bens está em equilíbrio quando a oferta agregada for igual ao nível de produção das firmas: pC + pI + pE = pX (3) Onde: pC é o valor nominal dos gastos de consumo, pI é o valor nominal dos gastos de investimento, pE é o valor nominal das exportações líquidas e pX é o valor nominal do nível de produção. Adicionalmente, supõe-se a existência de duas classes sociais (capitalistas e trabalhadores) que se diferenciam entre si com base na classe de rendimentos (lucros e salários) e com base na propensão a consumir da renda disponível. Assume-se que os trabalhadores “consomem tudo o que ganham” de forma que a sua propensão a consumir é igual a um36. Por outro lado, os capitalistas consomem uma fração cp dos seus rendimentos (os quais são constituídos unicamente de lucros), poupando uma fração sp =(1-cp) da sua renda. Sendo assim, o valor nominal dos gastos de consumo é dado por: pC = wbX + (1 − s c )rpK (4) Substituindo (4) em (3) tem-se que: I E + − s c r − qa 0 mr = 0 K K (5) ep * τ onde q = é a taxa real de câmbio e m = é a participação dos lucros na renda. 1+τ p Nesse modelo, a taxa de crescimento do estoque de capital (I/K = g) é uma 35 O mark-up é tido como constante por depender de variáveis estruturais como: i) grau de monopólio; ii) o nível das barreiras à entrada de novos competidores na indústria; e iii) o grau de substitutibilidade entre os produtos das firmas de uma mesma indústria. 36 Ou seja, a sua propensão a poupar é igual a zero. 89 função positiva de um componente autônomo (α 0 )37, da diferença entre a taxa de lucro e taxa de juros (α 1 [r − i ] ) e por fim de um componente que depende do endividamento externo como proporção do estoque de capital (α 2 zψ )38. Iremos assumir que um aumento do endividamento externo como proporção do estoque de capital irá resultar num aumento menos do que proporcional do I/K, ou seja, ψ<139. I = α 0 + α 1 [r − i ] + α 2 z ψ K 0 <ψ < 1 (6)40 O endividamento externo como proporção do estoque de capital foi incorporado à função investimento com o intuito de apresentar as restrições de financiamento à decisão de investimento em capital fixo. Com efeito, tendo por base a teoria da decisão de investimento de Hyman Minsky (1975), o investimento desejado pelas firmas pode aumentar em função quer de uma redução do risco do tomador ou quer por uma redução do risco do emprestador. Nesse contexto, o acesso ao mercado internacional de capitais poderia atuar no sentido de aumentar o investimento desejado pelas firmas à medida que a diversificação das fontes de financiamento contribuiria tanto para a queda do risco do tomador como para a queda do risco do emprestador. As exportações líquidas dependem de um componente autônomo ( ε 0 )41 e negativamente do nível de utilização da capacidade produtiva, pois supõe-se que o aumento da atividade econômica implica num aumento das importações, o que reduz o saldo da balança comercial. Assim, pode-se escrever a função da seguinte forma: E = ε 0 − ε 1u K (7)42 Considera-se que o prêmio risco é endógeno, sendo dado pela seguinte equação: 37 O qual reflete, por exemplo, o “animal spirits” dos capitalistas. A esse respeito ver Keynes (1936, cap.12). z=D/K é o endividamento externo como proporção do estoque de capital. 39 Isso porque estamos supondo, em conformidade com a experiência das economias emergentes, que uma parte dos capitais externos é utilizada para a aquisição de ativo não-reproduziveis como, por exemplo, terras. 40 A respeito dos fundamentos dessa função investimento ver Oreiro (2004). 41 O qual depende, entre outras variáveis, da taxa real de câmbio. Como estamos supondo a existência de um regime de câmbio fixo bem como rigidez de preços tanto a nível doméstico como internacional, segue-se que a taxa real de câmbio pode ser tratada como constante e, dessa forma, incorporada ao componente autônomo da função de exportações líquidas. 38 90 ρ = ρ 0 + ρ1 z (8) Onde: ρ0 >0; e ρ1 >0. A equação (8) mostra que o prêmio risco é uma função crescente da dívida externa como proporção do estoque de capital. A idéia é que quanto maior for o endividamento externo maior será o volume de compromissos externos do país na forma de juros e amortização sobre o principal, aumentando assim o risco de default (Oreiro, 2004). No modelo original, Oreiro (2004) assume que há mobilidade perfeita da conta de capitais. No presente modelo, contudo, iremos supor que a autoridade monetária adota medidas de controles sobre o fluxo de capitais, não valendo mais a hipótese da paridade descoberta da taxa de juros. A implicação fundamental dessa hipótese é que a taxa de juros doméstica pode se distanciar do patamar determinado pela paridade descoberta da taxa de juros. A principal razão para a adoção das medidas restritivas aos fluxos de capitais é precisamente evitar que o fluxo excessivo de capitais prejudique a condução da política monetária. Os controles de capitais permitem que as autoridades monetárias tenham um maior autonomia maior para fixar a taxa básica de juros num patamar coerente com os objetivos domésticos quais sejam, crescimento, emprego e inflação. Para fechar o modelo, deve-se especificar os determinantes da taxa de juros doméstica. Com base em Oreiro & Guerberoff (2004) a taxa de juros doméstica será formada por uma média ponderada entre a “taxa de juros desejada” pelo Banco Central, ou seja, o nível da taxa de juros doméstica que é compatível com o atendimento dos objetivos da política econômica doméstica, e o valor dado pela “paridade descoberta da taxa de juros”43. Do exposto, segue que a equação de determinação da taxa doméstica de juros é dada por: i = (1 − k )(i * + ρ ) + k i ; 0 < k <1 42 Nesse modelo, o efeito do câmbio é fixo e está sendo captado no termo ε 0 . 43 A ponderação reflete o nível dos controles de capitais (k). (9) 91 onde i é a taxa de juros desejada pelo Banco Central; e i * + ρ (onde i* é a taxa de juros internacional e ρ é o prêmio de risco-país) é o valor da taxa de juros doméstica compatível com a “paridade descoberta da taxa de juros” na ausência de controles de capitais e supondo um regime de câmbio fixo. Substituindo (8) em (9), obtemos a seguinte expressão: i = (1 − k )(i * + ρ 0 + ρ 1 z ) + k i (10)44 Substituindo (10) em (6), obtemos uma equação que determina o investimento como proporção do estoque de capital como função do endividamento externo e da lucratividade: I = g = α 0 + α 1 [r − (1 − k )(i * + ρ 0 + ρ 1 z ) − ki ] + α 2 z ψ K (11)45 Com base na equação (11), pode-se observar que a taxa de crescimento do estoque de capital (I K = g = taxa de crescimento do produto real ) depende da lucratividade e do endividamento externo. Assim, a relação entre a taxa de crescimento do estoque de capital e o endividamento externo pode ser visualizada a partir da Figura 2 abaixo46: 44 Ao ser incorporado no modelo a taxa de juros desejada pelo Banco Central, tem-se por objetivo introduzir a discussão da importância das características dos controles de capitais, ou seja, se estão sendo realizados na entrada e/ou na saída. Quando as autoridades monetárias tem por objetivo manter a taxa de juros desejada − relativamente mais elevada ( i ), possivelmente o país estará lançando mão dos controles de capitais para conter o ingresso ou desonerar a saída dos capitais. Caso as autoridades decidam por manter a taxa de juros doméstica num nível mais baixo, possivelmente o país esteja utilizando controles para conter a fuga ou estimular a entrada dos capitais no país. Em suma, quanto maior o controle de capitais, maior o peso da taxa de juros desejada pelo Banco Central na determinação do valor efetivo da taxa de juros doméstica. 45 Supondo que a relação técnica capital/produto é constante, temos que a taxa de crescimento do estoque de capital (I/K) é igual a taxa de crescimento do produto real (g). 46 Admitindo que (0<k<1), percebe-se os controles atuarão no sentido de deslocar para cima a curva representada na figura 1. As linhas tracejadas representam as curvas sem o impacto dos controles de capitais. 92 Figura 2 – Taxa de crescimento como função do endividamento externo g= I K z* z Diferenciando (11) com respeito à z, obtém-se: ( K) ∂I ∂z = ψα 2 z ψ −1 − (1 − k )α 1 ρ 1 (12) Colocando-se u em evidência na equação (2) e substituindo a resultante em (7) obtém-se: (1 + τ ) r E = ε 0 − ε1 K τ (13) • Substituindo (11) e (13) em (5), obtém-se o locus r = 0 : ( ) − 0 = γ + α1r + α 2 zψ − α 1 (1 − k )(i * + ρ 0 + ρ1 z − α 1k i − ε 1m −1r − s c r − qa 0 mr (14) onde γ ≡ α 0 + ε 0 . A equação (14) apresenta a taxa corrente de lucro para o qual a demanda agregada é igual à oferta. Trata-se do valor de equilíbrio de curto-prazo da taxa de lucro. Colocando r na equação (14) em evidência e diferenciando com respeito à r e z, obtemos a seguinte expressão: ( m ψα 2 z ψ −1 − (1 − k )α 1 ρ1 ∂r • = 2 ∂z r =0 ε 1 + s c m + qa 0 m − α 1 m ) (15) 93 ∂r O sinal de • dependerá de ψα 2 z ψ −1 − (1 − k )α 1 ρ1 , que varia com z . ∂z r =0 Assim, à medida que z aumenta, o sinal de ∂r passará de positivo para negativo, ∂z caracterizando uma relação não-linear entre a lucratividade e o endividamento externo. A relação entre endividamento externo e lucratividade pode ser visualizada por intermédio da Figura 3: Figura 3 - Lucratividade como função do endividamento r z* z 5.3 – Endividamento Externo e Equilíbrios Múltiplos: a Dinâmica do Modelo no Longo Prazo Para analisar a dinâmica de longo prazo dessa economia, parte-se da equação da dinâmica do endividamento descrita por Simonsen e Cisne (1995): D& = i e D − H (16) Onde: D é o estoque total de endividamento externo, H é a transferência líquida de recursos para o exterior e i e é a taxa de juros da dívida externa. Conforme Oreiro & Guerberoff (2004), a taxa de juros da dívida externa não é alterada pelo controle de capitais, sendo determinada, portanto, pela equação: 94 i e = i * + ρ 0 + ρ1 z (17) Diferenciando z com respeito ao tempo, obtemos a seguinte expressão: • • D K D z& = − K K K (18) • K onde é a taxa de crescimento do estoque de capital (g)47. K Substituindo (16) em (18), obtemos a seguinte expressão: z& = (i e − g ) z − H K (19)48 A transferência líquida de recursos para o exterior nada mais é, na economia em consideração, do que o valor das exportações líquidas H E = K K 49 . Substituindo 11 e 13 em 19, tem-se a expressão final para a dinâmica da dívida externa é dada por: ( ) 0 = i * + ρ 0 + ρ 1 z − α 0 − α 1 [r − (1 − k )(i * + ρ 0 + ρ 1 z ) − ki ] − α 2 z ψ z − ε 0 + ε 1 m −1 r (20) Colocando r na equação (20) em evidência e diferenciando com respeito à r e • z, tem-se o lócus z = 0 : Φ 0 + Φ 1 z − α 2ψz ψ −1 − α 2 z ψ ∂r • = ε 1 − zmα 1 ∂z z =0 − ε − i z − i α z + ( i − i )α 1 kz + α 2 z ψ +1 0 1 p p p 2 + α1m (ε 1 − zmα 1 ) 2 (21) Onde: − Φ 0 = i * + ρ 0 − α 0 − α 1 r + α 1i * + α 1 ρ 0 − α 1i * k − ρ 0α 1 k + α 1 k i >0; 47 Supondo que a relação capital-produto é constante ao longo do tempo, segue-se que a taxa de crescimento do produto real será igual a taxa de crescimento do estoque de capital. 48 Convém lembrar que no modelo original (Oreiro, 2004) a taxa de crescimento era exógena. 95 Φ 1 = (2 ρ1 + 2α 1 ρ1 − 2α 1 kρ1 ) >0 i p = i * + ρ 0 + ρ1 z >0. A equação (21) mostra que o efeito de um aumento do endividamento sobre a lucratividade depende do próprio nível de endividamento. Supondo que ε 1 − zmα 1 >0, o ∂r sinal de • dependerá do endividamento externo. Para um z é baixo, a inclinação é ∂z z =0 positiva, enquanto que para valores de z elevados, a inclinação é negativa. Uma das possíveis representações gráficas da dinâmica da dívida externa está descrita na Figura 4 abaixo: Figura 4 – Lócus de Equilíbrio da Dívida Externa r z* z Em steady-state tem-se que a taxa de lucro e o endividamento externo são constantes ao longo do tempo. Isso nos permite definir o lócus r& = 0 e o lócus z& = 0 , cujas inclinações são dadas respectivamente pelas equações (15) e (21). Dessa forma, como base nas equações (14) e (20), pode-se facilmente mostrar que uma das configurações possíveis de equilíbrio de longo-prazo da economia em consideração corresponderia à visualizada por intermédio da Figura 5. 49 Estamos supondo que o saldo da balança de serviços não-fatores é igual a zero. 96 Figura 5 – Equilíbrios Múltiplos r r1 r2 z& = 0 r& = 0 z1 z2 z Anteriormente foi demonstrado que o lócus que descreve as combinações de r e z para as quais o mercado de bens se encontra em equilíbrio. As curvas têm o formato aproximado de uma parábola com concavidade voltada para baixo. Na Figura 5 percebe-se a existência de duas posições de equilíbrio de longoprazo. A primeira caracterizada por uma lucratividade elevada (r1) e um baixo nível de endividamento externo (z1) – a qual chamaremos de equilíbrio com baixo endividamento - e a segunda caracterizada por uma lucratividade baixa (r2) e um alto nível de endividamento externo (z2). 5.4 – Análise da Estabilidade Para analisar a estabilidade dos pontos de equilíbrio de longo prazo da economia em consideração, utiliza-se a metodologia Traço-Determinante. Inicialmente lineariza-se o sistema de equações diferenciais na proximidade da posição de equilíbrio. 97 • • ∂r ∂r r = ( )(r − r *) + ( )( z − z *) ∂r ∂z • • (22) • ∂z ∂z z = ( )(r − r *) + ( )( z − z *) ∂r ∂z • (23) Onde: ( • α m − ε − s m − qa m 2 ∂r 1 1 c 0 ∂r = m ) (22a) • ∂r ψ −1 − (1 − k )α 1 ρ 1 ∂z = α 2ψz (22b) • (α 1 mz − ε 1 ) ∂z ∂r = − m (23a) • ∂z ψ −1 ψ ∂z = Φ 0 + Φ 1 z − α 2ψz − α 2 z (23b) A matriz de derivadas parciais é dada por: ∂r& J = ∂r ∂z& ∂r ∂r& ∂z ∂z& ∂z Dessa forma, o determinante e o traço da matriz Jacobiana são dados por: DET (J) = ( ∂&z ∂r& ∂r& ∂&z ) )–( ∂r ∂z ∂r ∂z 98 TR (J) = ( onde, ∂r& ∂&z + ) ∂r ∂z ∂&z ∂&z ∂r& ∂r& <0; =?; =?; =?. ∂z ∂r ∂r ∂z O sinal do determinante dependerá do nível de endividamento externo. Se DET(J)<0, o equilíbrio é instável do tipo ponto de sela (cf. Takayama, 1993). Por outro lado, se o DET(J) for positivo, o equilíbrio pode ser estável ou instável, dependendo do Traço da Jacobiana. Para o equilíbrio ser estável, o traço da matriz Jacobiana tem necessariamente que ser negativo. Caso o traço da matriz Jacobiana seja negativo, o equilíbrio será instável. No entanto, devido a complexidade imposta pelo grande numero de parâmetros, não e possível determinar de antemão o sinal do traço e do determinante da matriz Jacobiana. Sendo assim, a única forma de analisarmos a estabilidade das posições de equilíbrio de longo-prazo e por intermédio de simulações computacionais. Nesse contexto, tal como veremos na seção 5, para uma certa constelação de valores economicamente plausíveis para os parâmetros do modelo (vide Tabela I), o equilíbrio com baixo endividamento será estável, ao passo que o equilíbrio com alto endividamento será instável. Esse resultado contrasta fortemente com os resultados obtidos por Oreiro (2004) e Oreiro & Guerberoff (2004). Com efeito, nos modelos apresentados por esses autores, o equilíbrio com alto endividamento era estável, ao passo que o equilíbrio com baixo endividamento era instável do tipo trajetória de sela. Daqui se segue que um resultado importante da endogenização da taxa de crescimento do produto real é tornar estável o equilíbrio com baixo endividamento. 5.5 – Dinâmica e Resultados das Simulações Computacionais Para analisar a dinâmica do modelo e realizar as simulações computacionais, parte-se das equações diferenciais do modelo teórico anteriormente desenvolvido. Dessa 99 forma, é possível observar o comportamento das variáveis econômicas ao longo do tempo nos casos em que a economia tem plena convertibilidade da conta de capitais ou adota controles de capitais. Para a simulação computacional do modelo teórico atribuiu-se aos parâmetros valores economicamente plausíveis, com intuito de aproximar ao máximo o modelo da realidade das economias emergentes, tal como a economia brasileira. Para tanto, considerase o seguinte conjunto de parâmetros nos exercícios de simulação (Tabela VI): Tabela VI – Valores dos Parâmetros Utilizados na Simulação Computacional Parâmetro Discriminação Valor Parâmetro Discriminação Valor m Participação dos lucros na renda 0.5 α0 Determinante autônomo do investimento 0.01 i* Taxa de juros internacional 0.02 α1 Sensibilidade do investimento ao diferencial juros/lucratividade 0.6 ε0 Determinante autônomo das exportações líquidas 0.03 α2 Sensibilidade do investimento ao estoque da dívida 0.3 ε1 Sensibilidade das importações ao nível de atividade 0.5 i Meta de taxa de juros da política monetária autônoma 0.04 ψ Fator de decrescimento do investimento com endividamento 0.01 a0 Requisito unitário de matérias-primas importadas 0.5 ρ0 Prêmio de risco de países com investment grade 0.03 q Taxa real de câmbio 10 ρ1 Sensibilidade do prêmio de risco ao estoque da dívida 0.2 sc Propensão a poupar dos capitalistas 0.2 Para representar as variações no grau de mobilidade de capitais, toma-se o valor de k=0 quando há perfeita mobilidade de capitais e k=0.5 quando o país faz uso de controles de capitais. 100 Analisando-se o Gráfico de Força, nota-se claramente que o equilíbrio estável é o equilíbrio com baixo endividamento (Figura 6). A linha tracejada representa o lócus r& = 0 e a linha sólida o lócus z& = 0 . Figura 6 - Dinâmica do Modelo Sem Controles de Capitais Nota: Esse gráfico foi extraído do MAPLE. Figura 7 - Dinâmica do Modelo Com Controles de Capitais Nota: Esse gráfico foi extraído do MAPLE. 101 Conforme podemos visualizar na Figura 7 acima, a introdução de controles de capitais não afeta a estabilidade da posição de equilíbrio com baixo endividamento. Com base nos exercícios de simulação observamos que apenas o equilíbrio com baixo endividamento é estável, independentemente do regime de mobilidade de capitais. Os valores do traço e do determinante da matriz Jacobiana nas duas posições de equilíbrio são apresentados na Tabela VII abaixo: Tabela VII - Teste de Estabilidade das Posições de Equilíbrio Discriminação Equilíbrio I (Baixo Endividamento) Equilíbrio II (Alto Endividamento) Determinante(J) 0.43 (k=0.5) 0.32 (k=0) -0.43 (k=0.5) -0.32 (k=0) Traço (J) Resultado -3.22 (k=0.5) Estável -3.17(k=0) -2.94 (k=0.5) Instável (sela) -2.97 (k=0) Na Figura 8 e na Tabela VIII observamos a determinação dos valores de equilíbrio de longo-prazo da lucratividade e do endividamento externo no caso em que não há controles de capitais (k=0) e no caso em que existem esses controles (k=0.5). Conforme podemos constatar na figura e na Tabela abaixo, os controles de capitais atuam no sentido de aumentar a lucratividade de longo prazo da economia, ao mesmo tempo em que reduz o nível do endividamento externo. 102 Figura 8 – Valores de Equilíbrio de Longo-Prazo nos Casos com Controle e sem Controle de Capitais K=0.5 K=0 Nota: os resultados foram extraídos das simulações no MAPLE. Tabela VIII – Impactos dos Controles de Capitais sobre Lucratividade e Endividamento no Equilíbrio Baixo Discriminação K=0 K=0.5 Lucratividade 8,6 9,4 Endividamento Externo 32,1 31,1 Nota: os resultados foram extraídos das simulações no MAPLE. Na análise da dinâmica comparada observa-se o impacto da adoção de medidas restritivas sobre o fluxo de capitais sobre a taxa de juros, nível de atividade, o crescimento econômico e as exportações líquidas. Os resultados do modelo mostram que, no longo prazo, os controles de capitais podem ser uma ferramenta importante para melhorar a performance macroeconômica de economias emergentes. Como se pode observar na Tabela IX, os controles de capitais atuam no sentido de: i) reduzir o valor de equilíbrio de longo-prazo da taxa de juros; ii) acelerar o crescimento econômico; e iii) aumentar o nível de utilização da capacidade produtiva. O único resultado desfavorável da adoção de controles de capitais foi o aumento do déficit em transações correntes. No entanto, esse 103 aumento não é suficientemente forte para induzir um crescimento do endividamento externo como proporção do estoque de capital. Isso porque a adoção dos controles de capitais permitiu um aumento da taxa de crescimento do estoque de capital, o qual mais do que compensou o efeito sobre o endividamento externo de um maior déficit em transações correntes. Tabela IX – Dinâmica Comparada dos Regimes da Conta de Capital (t=10) Discriminação k=0 K=0.5 Taxa de Juros 0.10 0.07 Crescimento Econômico 0.29 0.32 Exportações Líquidas -0.05 -0.06 Nível de Atividade 0.18 0.19 Nota: os resultados foram extraídos das simulações no MAPLE. Com base nos gráficos da Figura 9, percebe-se que os controles de capitais tendem a estabilizar a taxa de juros num patamar mais baixo em comparação com o regime de plena-conversibilidade da conta de capitais. Por outro lado, os controles de capitais permitem a obtenção de um maior nível de utilização da capacidade produtiva e uma maior taxa de crescimento do estoque de capital relativamente a situação de mobilidade perfeita de capitais. 104 Figura 9 - Impacto dos Regimes da Conta de Capital sobre as Variáveis Macroeconômicas - Taxa de Juros Figura 9(a) [k = 0] Figura 9(b) [k = 0.5]. - Taxa de Crescimento do Estoque de Capital Figura 9(c) [k = 0] Figura 9(d) [k = 0.5]. 105 - Exportações Líquidas Figura 9(e) [k = 0] Figura 9(f) [k = 0.5]. - Nível de Atividade Figura 9(g) [k = 0] Figura 9(h) [k = 0.5]. Os resultados numéricos são, em geral, economicamente plausíveis, apesar de se observar algumas desproporções numéricas. O uso de controle de capitais mostrou-se 106 eficiente em manter a taxa de juros em um patamar mais baixo e estável no longo-prazo, relativamente à situação de plena-conversibilidade da conta de capitais. A estabilidade da taxa de juros num patamar menor quando se implementa medidas de controle de capitais, contribui para criar um ambiente econômico mais propício para o planejamento de longo-prazo, incentivando assim o investimento e crescimento econômico. Em resumo, as simulações computacionais do modelo teórico mostraram que medidas restritivas sobre o fluxo de capitais podem ser importantes como estratégia de retomada do crescimento das economias emergentes. Contudo, o crescimento gera, em alguns países, um saldo negativo na balança comercial. Sendo assim, a adoção de controles de capitais deve se dar em conjunto com medidas que visem tornar a matriz produtiva da economia menos dependente das importações de bens de capital, e com isso melhorar a elasticidade-renda importações dessas economias50. 5.6 - Conclusão O modelo apresentado ao longo deste capítulo mostrou que existem razões para se acreditar que os controles de capitais possam influenciar positivamente a performance macroeconômica das economias emergentes. A introdução de controles de capitais permite uma redução do valor de equilíbrio de longo-prazo da taxa de juros, uma aceleração da taxa de crescimento do estoque de capital e um aumento do nível de utilização da capacidade produtiva. O único efeito deletério dessas medidas restritivas a mobilidade de capitais é um aumento do déficit em transações correntes. Contudo, o efeito positivo dos controles sobre a taxa de crescimento permite que o endividamento externo como proporção do estoque de capital seja reduzido, de forma que a vulnerabilidade externa da economia também é reduzida. Uma outra conclusão importante é que os controles de capitais não afetam a estabilidade da posição de equilíbrio com baixo endividamento. Dessa forma, não há razão 50 Para um aprofundamento dessa questão Curado (2001) e Curado & Porcile (2002). 107 objetiva para se acreditar que a adoção desses controles possa contribuir para aumentar a instabilidade das economias emergentes. 6. Considerações Finais A análise realizada ao longo deste trabalho mostrou que apesar das políticas implementadas na década de noventa terem obtido êxito na geração de poupança externa, notou-se que essa política não se traduziu em crescimento, ao contrário comprometeu o potencial de crescimento do país, gerou instabilidade macroeconômica e uma situação de vulnerabilidade externa, que culminou numa crise cambial em 1999. A estratégia de crescimento com poupança externa não se sustentou porque está consolidada em bases frágeis, tendo em vista que não é a poupança que determina o investimento, mas o investimento que determina a poupança. Para Bresser-Nakano, a questão central não é proporcionar poupança a economia brasileira, mas criar um ambiente econômico estável e seguro, em que os empresários possam investir, expandir a capacidade industrial e gerar a poupança necessária. Contudo, uma opção interessante para a economia brasileira enfrentar esse problema deve começar por uma regulação preventiva e numa sólida administração financeira. Segundo Bresser-Nakano a maior parte dos países latino-americanos, com notável exceção do Chile, que estabeleceu claros limites ao ingresso de capitais, seguiu a estratégia de crescimento com poupança externa. Dos países que seguiram essa estratégia, todos sofreram uma crise: o México, em 1994; o Brasil, em 1999; e a Argentina, em 2001. A teoria econômica dos controles de capitais mostra evidências de que essas medidas podem ser importantes para garantir uma maior autonomia da política monetária, reduzir a vulnerabilidade externa e estabilizar a taxa de câmbio. Dessa forma, o país pode utilizar a taxa de juros para atingir os objetivos domésticos, como o crescimento, sem que haja uma fuga maciça de capitais. Além disso, os controles de capitais podem também ser eficientes em evitar uma apreciação da taxa de câmbio e, conseqüentemente, estimular o crescimento da economia. A análise desenvolvida no trabalho mostrou que os controles de capitais no Chile e na Malásia contribuíram, em boa medida, para atenuar a intensidade das crises 108 sobre os países, reduzir a vulnerabilidade externa e melhorar suas performances macroeconômicas. A discussão sobre a plena conversibilidade da conta de capitais foi introduzida no Brasil por Arida (2003a, 2003b, 2004). Este autor afirma que a conversibilidade da conta de capitais tem implicações sobre o risco de default dos compromissos externos das empresas domésticas, o que acaba reduzindo o prêmio de risco e, conseqüentemente, a taxa de juros. Mas, as evidências demonstradas por Oreiro, Paula e Silva (2004) afirmam que o efeito da conversibilidade da conta de capitais se dá precisamente no sentido oposto ao sugerido pelo autor. A experiência histórica mostra precisamente o contrário, ao longo da década de 1990, o Brasil caminhou na direção de uma conversibilidade crescente da conta de capitais, sem que houvesse uma tendência de redução no risco-país ou na taxa real de juros doméstica. Possivelmente o alto grau de abertura da conta capital no Brasil é um dos fatores que contribuem para que a taxa nominal e real de juros no país esteja entre as mais altas do mundo A abertura da economia produziu em alguns momentos instabilidade macroeconômica, fruto principalmente das crises cambiais/financeiras ocorridas que foram combatidas utilizando-se controles de capitais. O histórico das medidas de controles de capitais utilizadas pelas autoridades monetárias na década de 1990 desenvolvido no trabalho mostra que os controles de capitais no Brasil foram essencialmente endógenos, aplicados sobre a entrada de recursos estrangeiros e feitos fundamentalmente por intermédio da cobrança de IOF sobre os ganhos das aplicações financeiras no país. O caráter endógeno dos controles de capitais deve-se ao fato do governo reagir aumentando os controles nos períodos de boom e liberalizando nos períodos de crise. Dessa forma, os fluxos externos de recursos acabavam por determinar o nível dos controles de capitais, ao invés de serem determinados pelo nível dos referidos controles. No tocante a discussão teórica, esse trabalho mostrou evidências fortes de que os argumentos levantados, por Arida (2003a, 2003b) e Bacha (2003) carecem de fundamentação teórica e empírica. A crítica acadêmica a tese de plena-conversibilidade da conta de capitais foi feita, entre outros, por Beluzzo e Carneiro (2004a) e por Oreiro, Paula e Silva (2004). Neste último artigo argumentou-se que (i) os supostos efeitos da plena- 109 conversibilidade da conta de capitais sobre o prêmio de risco país não encontram respaldo ou antecedente na literatura internacional especializada sobre o referido tema; o que sinalizaria a ausência de uma fundamentação teórica mais consistente para a mesma; (ii) testes econométricos preliminares sobre a relação entre prêmio de risco Brasil e o grau de conversibilidade da conta de capitais, tal como medido pelo índice proposto por Goldfajn e Cardoso (1998), mostram que o nível de conversibilidade da conta de capitais não tem nenhum impacto estatisticamente significativo sobre o prêmio de risco. Por fim, apresentou-se um modelo macrodinâmico no último capítulo que teve por objetivo demonstrar que os controles de capitais influenciam positivamente a performance macroeconômica das economias emergentes. A introdução de controles de capitais permite uma redução do valor de equilíbrio de longo-prazo da taxa de juros, uma aceleração da taxa de crescimento do produto real e um aumento do nível de utilização da capacidade produtiva. Além disso, o efeito positivo dos controles sobre a taxa de crescimento permite que o endividamento externo como proporção do estoque de capital seja reduzido, de forma que a vulnerabilidade externa da economia também é reduzida. O único efeito deletério dessas medidas restritivas a mobilidade de capitais é um aumento do déficit em transações correntes. Uma outra conclusão importante extraída do modelo é que os controles de capitais não afetam a estabilidade da posição de equilíbrio com baixo endividamento. Dessa forma, não há razão objetiva para se acreditar que a adoção desses controles possa contribuir para aumentar a instabilidade das economias emergentes. 110 7. Bibliografia Alves Jr., A.J.; Ferrari Fº, F.; Paula, L.F.(2000). Crise Cambial, Instabilidade Financeira e Reforma do Sistema Monetário Internacional: uma abordagem pós-keynesiana. Revista de Economia Contemporânea. Rio de Janeiro, 4(1): 79-106p. Arida, P. (2003a). “Ainda a conversibilidade”. Revista de Economia Política, vol. 23, n. 3, 135-142p., jul./set. Arida, P. (2003b). “Por uma moeda plenamente conversível”. Revista de Economia Política, vol. 23, n. 3, 151-154p., jul./set. Arida, P. (2004).Aspectos Macroeconômicos da Conversibilidade: uma discussão do caso brasileiro. (mimeo) Ariyoshi, A., Habemeier, K., Laurens, B., tker-Robe, I., Canales-Kriljenko, J., Kirilenko, A. (2000). Capital Controls: Country Experiences with Their Use and Liberalization. Washington: IMF. Aurélio, M.M. (1999). 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